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Em nossos estudos sobre as linhas gerais da eclesiologia dos Padres da Igreja, dividimos
em três excertos o conteúdo do vocábulo “Eclesiologia”, do Dicionário de Literatura
Patrística, organizado por Ângelo Di Bernardino. Na Parte I, oferecemos uma breve
introdução ao tema, enquanto que na Parte II, prosseguimos tratando da eclesiologia
patrística Pré-Nicena, ao passo que agora damos prosseguimento à última parte da série
de textos sobre eclesiologia patrística, referente ao período Pós-Niceno. Boa leitura!
1. Os Padres Gregos.
2. Os Padres Latinos
Também para Ambrósio de Milão (cerca de 339-397), como para Hilário, a Igreja
cresce quando diminui, vence quando é perseguida e enche a terra com a luz de sua fé e
de sua devoção (Hexa. 4, 7). Pois a Sagrada Escritura é o sacramento que apresenta aos
crentes o mistério de Cristo e da Igreja mediante sinais e figuras que ilustram o desígnio
eterno de salvação. Ambrósio comenta numerosas imagens tiradas da natureza e da
Bíblia mediante uma exegese alegórico-tipológica inspirada em Orígenes: lua, mar,
vinha mística, rebanho místico, povo de Deus, reino de Cristo, Jerusalém nossa, templo
de Deus, corpo de Cristo, esposa de Cristo: “Com ele (Cristo) casou a Igreja que, cheia
da semente do Verbo e do Espírito de Deus, deu à luz o corpo de Cristo, isto é, o povo
cristão” (Exp. Luc. 3, 38). Além disso, várias mulheres do AT (Eva, Sara, Rebeca) e do
NT (a samaritana, a viúva de Naim, a pecadora na casa de Simão, o leproso) não só são
imagens da Igreja, mas também figuras alegóricas: a mulher em Lc 13,21 santifica com
seu ensinamento espiritual as três partes do homem (corpo, alma, espírito); as duas
mulheres que amassam na mesma masseira indicam que “a Igreja é escolhida (por
Deus) e a Sinagoga é abandonada, ou então que se toma o sentimento bom e se
abandona o impuro” (Cain., 30; cf. Exp. Luc. 8, 52); portanto, em continuidade com
Orígenes, Ambrósio vê intimamente correlacionadas a Igreja e a alma humana (ecclesia
vel anima: De virg. 6, 8; Hexa. 6, 49; Myst. 37). Na ótica da história da salvação,
Ambrósio apresenta a Igreja histórica como uma sombra da verdade que
contemplaremos claramente depois da segunda vinda de Cristo (In Ps. 28, 25), e isso
não lhe impede de admitir que já agora a Igreja é uma teofania da Trindade invisível,
que quis manifestar-se plenamente em todo o corpo de Cristo (Exp. Lc. 1, 24 ss.; 2, 94;
10, 1 ss.). Ambrósio, estimulado pelo zelo excessivo pela interpretação alegórica,
cometeu o pequeno erro de esquecer que Paulo (Rm 11, 26) anunciou também a
salvação de todo o Israel.
O fato de Cristo ser a cabeça de seu corpo, da Igreja (Christus totus), não só garante
contra os donatistas a santidade radical e imutável da Igreja e a eficácia dos
sacramentos, mas também (contra os pelagianos) que ele é o mediador e o único doador
da graça. O homem recebe a graça da salvação só participando do ato redentor de
Cristo, que nos obtém todas as graças, e entra no corpo de Cristo através do batismo.
Com todos esses argumentos Agostinh coloca a teologia cristã nos antípodas da teologia
hebraica, em continuidade com toda a impostação traçada pelos ensinamentos do
apóstolo Paulo.
c. Leão Magno e Gregório Magno – Leão Magno, bispo de Roma de 440 a 461,
apresenta a Igreja como sacratum ou corpus Christi (Sermo 4, 1; Ep. 14, 11; Ep. 53, 4)
e coloca assim em realce, sobretudo, o aspecto de unidade orgânica da Igreja. Nesse
sentido a Igreja, segundo ele, é sempre uma communio sanctorum, isto é, não obstante
acolha também pecadores e seja formada por cristãos imperfeitos, não perde nunca
sua integritas; a Igreja é como uma continuação da encarnação de Cristo (Sermo 72, 3)
e, por isso, toda a vitalidade do crente deriva da presença da cabeça (Cristo) em seu
corpo (Sermo 63). Em virtude da união dos crentes com Cristo, fundada sobre o batismo
e sobre a fé, a paixão do Senhor se prolonga até o fim do mundo (Sermo 70, 5) e se
renova no curso da história da Igreja a vitória de Cristo sobre o mundo (Sermo 39, 3). A
Igreja, mater et schola veritatis (Sermo 52, 5) é chamada, de modo especial em seus
pastores, a manter viva em seus fieis a fé e a conduzir os mais espirituais a uma
compreensão mais profunda do mistério de Cristo (Sermo 76, 1). Por isso o mesmo
Cristo, presente em sua Igreja, sustenta os pregadores do Evangelho e os ministros dos
sacramentos (Ep. 167). Se Cristo não continuasse a exercer seu sacerdócio, na Igreja
não se teria nem sacerdócio nem sacrifício (Ep 80, 2). Só em virtude de sua presença
existe o único sacramentum pontificis nos fieis, nos pastores e de modo especial no
vigário de Pedro (Sermo 4, 1-2). Cristo não cessa de intervir na obra de seus ministros;
por isso, eles podem reacolher os penitentes na communio sacramentorum (Ep 108, 2).
Leão conseguiu dar uma clara formulação dogmática ao exercício do poder pessoal
(primatus) do papa na Igreja universal. Cristo, ao edificar a Igreja sobre Pedro, confiou
a ele o ministério pastoral e a tarefa de confirmar seus irmãos na fé (Mt 16, 13-19; Lc
22,32; Jo 21, 15-19); o primado, portanto, é devido à íntima união de Pedro com Cristo
(Ep. 10, 1). A continuação do ofício petrino no papa se baseia, segundo a mentalidade
jurídica de Leão, não no fato de que o papa ocupa a mesma sede nem sobre em que o
túmulo de Pedro está em Roma, mas no fato de ser herdeiro (haeres) de Pedro. Portanto,
o primatus ou principatus papal pode ser considerado idêntico ao ministério petrino:
a sollicitudo ominum ecclesiarum diz respeito à sede romana (Ep. 14, 11). O tema do
primado, além de seu aspecto teológico, em Leão tem também repercussões políticas.
Em um tempo de desintegração do Império Romano, sob a ideia do primado sente-se a
pulsação da ideja da Roma aeterna, caput orbis terrarum, transferida para o conceito
de Urbis sancta.
A eclesiologia de Gregório Magno, bispo de Roma de 590 a 604, assume como ponto de
partida a spiritualis intelligentia na leitura e interpretação da Bíblia. Gregório contempla
em toda a Sagrada Escritura o ministério da Igreja, e desta individualiza desde o início a
presença oculta na história da salvação. Também a equiparação ecclesia vel
anima demonstra que toda espiritualidade contém essencialmente um caráter eclesial,
que consiste na interiorização da essência e da vida da Igreja na vida pessoal do crente.
A expressão de Gregório “Sancta electorum Ecclesia in antiquam statum restauranda”
(Moral. 27, 26, 49), que deve ser considerada o pensamento central de sua concepção de
Igreja, significa que o retorno da humanidade à situação originária de contemplação de
Deus em comunhão com os anjos acontece na Igreja; ela, já em sua preexistência
celeste, era chamada a ser na terra e no céu a “suprema civitas ex angelis et hominibus”
(Hom. in Ev. 2, 34, 11); porém, o plano foi transtornado pelo pecado do homem. Da
“Igreja santa dos eleitos” (Moral. 13, 46) fazem parte também muitos daqueles que
viveram antes de Cristo e se salvaram por sua fé na futura paixão de Cristo, sofrida
também por eles, como por aqueles que vêm depois dela (Hom. In Ez. 3, 16). Gregório,
baseando-se sempre em seu método exegético da spiritualis intelligentia da Bíblia,
encontra na história o sentido literal, o oculto significado espiritual, o mysterium, de
modo que a Sagrada Escritura, lida eclesialmente, torna evidente o eterno no temporal e
o invisível no visível. Gregório, porém, não nega a historicidade da Igreja, mas quer
ajudar o homem pecador e, portanto, cego para o mundo espiritual a recuperar
a spiritualis intelligentia. Vê a Igreja como uma realidade “que se levanta contra a
glória deste mundo” (Hom. in Ev. 2, 32, 6). Seu objetivo pastoral leva-o a observar que
não só os milagres realizados junto dos túmulos dos santos demonstraram o esplendor
da Igreja (In Reg. 1, 104), mas também os pregadores que “cantam os louvores de Deus
onipotente com o esplendor de sua vida” (In I Reg. 2, 59).
FONTE:
Fonte: http://www.apologistascatolicos.com.br/index.php/patristica/estudos-
patristicos/1012-eclesiologia-patristica-parte-iii