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Patologias em Construções de Betão

Technical Report · December 2001


DOI: 10.13140/RG.2.1.1854.0009

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Jorge de Brito
University of Lisbon
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APONTAMENTOS DA CADEIRA DE INSPECÇÃO E
REABILITAÇÃO DE CONSTRUÇÕES

MESTRADO EM CIÊNCIAS DA CONSTRUÇÃO

FACULDADE DE CIÊNCIAS E TECNOLOGIA DA UNIVERSIDADE


DE COIMBRA

PATOLOGIAS EM CONSTRUÇÕES EM BETÃO

Jorge de Brito

Dezembro de 2001
Prefácio

Estes apontamentos pretendem ser um apoio aos


alunos do Curso de Mestrado em Ciências da
Construção da Faculdade de Ciências e
Tecnologia da Universidade de Coimbra, no
domínio da patologia estrutural, com particular
ênfase nas construções que possuem estrutura de
betão armado e pré-esforçado e, dentro destas, nas
pontes.
O texto foi dividido fundamentalmente em duas
partes, sendo a primeira dedicada aos factores de
degradação de estruturas de betão e a segunda à
análise da sintomatologia estrutural.
Os apontamentos basearam-se fundamentalmente
em três textos do mesmo autor, “Patologia de
Estruturas de Betão - Degradação, Avaliação e
Previsão da Vida Útil”, Tese de Mestrado em
Engenharia de Estruturas (IST) [4], “Construction
for Durability”, capítulo de um livro a editar pela
ASCE “Concrete Bridge Management. From
Design to Service Life” [9], e “Degradação de
Estruturas de Betão Armado” [8], Texto de Apoio
ao Curso de Qualidade no Projecto de Estruturas
(IST), subsidiado pelo Fundo Social Europeu.
ÍNDICE

1. Considerações gerais 1
2. Patologia estrutural do betão 3
2.1. As acções climatéricas 4
2.1.1. Temperatura 5
2.1.2. Chuva, neve e gelo 8
2.1.3. Vento 10
2.1.4. Exposição ao sol 11
2.1.5. Humidade relativa 11
2.2. A agressividade do ambiente 12
2.2.1. Despassivação do betão 13
2.2.2. Corrosão das armaduras 17
2.2.3. Ataque químico do betão 20
2.2.3.1. Ataque dos ácidos 21
2.2.3.2. Ataque dos sulfatos 23
2.2.3.3. Ataque dos álcalis 25
2.3. As acções biomecânicas 26
2.3.1. Abrasão 27
2.3.2. Cavitação 28
2.3.3. Acções biológicas 28
3. Análise da sintomatologia estrutural 31
3.1. Considerações gerais 31
3.2. Betão 31
3.2.1. Fendilhação 31
3.2.2. Desagregação 44
3.2.3. Descasque 46
3.2.4. Coloração 48
3.2.5. Vazios e zonas porosas 49
3.2.6. Anomalias estéticas 49
3.3. Aço 50
3.4. Estruturas 51
3.4.1. Deformações 51
3.4.2. Assentamentos 52
3.4.3. Movimentos de terras 52
3.4.4. Infraescavações 52
3.5. Resumo das causas - efeitos 53
4. Conclusões 57
5. Referências 58
Mestrado em Ciências da Construção Disciplina de Inspecção e Reabilitação de Construções
Patologias em construções em betão por Jorge de Brito

PATOLOGIAS EM CONSTRUÇÕES EM BETÃO

1. CONSIDERAÇÕES GERAIS

Apesar de o betão armado não ser o único material estrutural a que se recorre para a
construção de edifícios de habitação, crê-se que, no nosso país e, em particular, nas décadas
mais recentes, constituirá a esmagadora percentagem. Nesse sentido, optou-se por
circunscrever estes apontamentos às construções de betão (armado e pré-esforçado). Em
relação a outros materiais de construção (alvenaria de pedra ou de tijolo, perfis metálicos,
madeira, etc.), será preparado um outro documento. Por outro lado, também não serão aqui
referidos aspectos relacionados com a patologia não estrutural, ao nível de revestimentos e
acabamentos, que em termos práticos será porventura mais frequente que a patologia
estrutural.

O betão armado, ao contrário do que se possa talvez pensar, é um material relativamente


sensível e que se degrada ao longo do tempo. Daí ser de esperar que as construções sofram um
natural envelhecimento provocado quer pelo meio ambiente (chuva, sol, vento, poluição) quer
pela utilização normal. No entanto, verifica-se frequentemente um envelhecimento precoce
das construções provocado por outros factores (naturais ou artificiais) e que interessa evitar.

Naturalmente, não se vai exigir às construções actuais um tempo de vida semelhante ao


de algumas pontes romanas (Fig. 1), ainda em serviço mais de 2000 anos após a sua
construção. Não são, no entanto, de aceitar situações de acentuada degradação 5 a 10 anos
após a construção, como acontece em alguns edifícios nas zonas limítrofes de Lisboa. Há
portanto vantagem em começar por clarificar determinadas noções [1].

“Durabilidade” é a capacidade de manter a funcionalidade de um determinado produto,


componente, elemento estrutural ou construção durante um tempo determinado.

“Funcionalidade” é a capacidade que esse mesmo elemento tem para cumprir as funções
para as quais foi concebido e construído.

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Patologias em construções em betão por Jorge de Brito

Fig. 1 - Ponte romana ainda em serviço

A “vida útil” (de um elemento estrutural ou material) é o período de tempo depois da


colocação em serviço durante o qual todas as suas propriedades excedem os valores mínimos
aceitáveis, se sujeito a uma manutenção rotineira.

“Factor de degradação” é qualquer factor externo que afecte negativamente as


características de comportamento dos elementos estruturais ou materiais.

“Patologia estrutural” é a ciência que estuda os fenómenos que afectam o


comportamento estrutural de uma construção.

Os próximos dois capítulos são dedicados, respectivamente, à identificação dos factores


de degradação associados à patologia estrutural do betão e à análise da sintomatologia que lhe
está associada.

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Patologias em construções em betão por Jorge de Brito

2. PATOLOGIA ESTRUTURAL DO BETÃO

Designa-se por “Patologia” a parte da medicina que estuda as origens, sintomas e


natureza das doenças [2]. Quando aplicado à construção civil, este termo designa a ciência que
estuda os fenómenos que afectam o comportamento de uma construção. A patologia é
dividida em estrutural e não estrutural. A “função estrutural” é entendida como a capacidade
que uma construção deve possuir para suportar com segurança as acções, normalmente com o
carácter de forças ou deformações impostas, que o meio ambiente ou os seus utentes lhe
aplicam [3].

Neste capítulo, far-se-á uma classificação dos fenómenos causadores de patologia no


betão (armado e pré-esforçado) relacionados com o meio ambiente. Alguns destes fenómenos
serão mais sucintamente referidos que outros por não se inserirem no âmbito das construções
correntes, por não ocorrerem normalmente em Portugal ou se considerar terem um interesse
menor para o curso.

Em simultâneo com a exposição dos processos de degradação, procurar-se-á sempre que


se achar conveniente explanar as medidas de índole preventiva que, quando aplicadas
atempadamente, permitem anular ou remediar drasticamente os efeitos patológicos descritos.

No entanto, é importante frisar aqui que os desastres e estragos mais espectaculares só


muito raramente são devidos a uma única causa. Quase sempre se devem a acasos que deram
origem à simultaneidade de actuação de vários efeitos patológicos que, em conjunto e em
interdependência, dão origem aos problemas [4]. Daí a grande dificuldade que por vezes se
sente em identificar a ou as causas de uma patologia em face do edifício danificado.

Circunscreveu-se a matéria essencialmente à patologia estrutural sendo apenas feitas


breves referências à patologia não estrutural. Isto deve-se às seguintes razões principais: a
patologia estrutural é a que está ligada aos prejuízos mais espectaculares e onerosos tanto em
bens como em vidas; a duração do curso não permite abordar ambos os temas com um
mínimo de profundidade.

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Patologias em construções em betão por Jorge de Brito

As principais causas de patologia estrutural no betão (armado e pré-esforçado)


diferenciam-se bastante no tempo de ocorrência: podem ocorrer antes da construção (erros de
projecto), durante esta (erros de execução), no decurso da exploração normal do edifício
(acções biomecânicas, acções do ambiente), em consequência de catástrofes naturais
imprevisíveis (acções de acidente) ou ainda pela vontade humana de uma forma activa
(alteração das condições de serviço) [4].

Neste capítulo, serão analisadas as causas de patologia relacionadas com o ambiente


(Fig. 2), e que se devem quer à influência do clima, quer à agressividade intrínseca ao
ambiente, quer ainda às acções biomecânicas sobre o betão. São referidos tanto o
envelhecimento natural das estruturas como a deterioração precoce devida a erros de
concepção ou à concentração de agentes agressivos.

Fig. 2 [5] - Acções do ambiente sobre o aço e o betão

2.1. As acções climatéricas

De uma forma directa ou indirecta, as condições climatéricas são responsáveis por uma
parte importante dos casos de patologia referenciados no dia a dia. Apesar disso, a causa
primeira é geralmente outra ligada a um erro humano: má concepção da estrutura, má

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Patologias em construções em betão por Jorge de Brito

pormenorização, erros de execução (principalmente na cura do betão), errada escolha dos


materiais ou outros. A debelação dos problemas que inevitavelmente surgem é bastante mais
onerosa que os cuidados, regras construtivas ou medidas de bom senso que os teriam evitado.

Enumeram-se de seguida as principais causas de patologia relacionadas com as


condições climatéricas.

2.1.1. Temperatura

A temperatura ambiente pode constituir problema para a durabilidade do betão por ser
muito baixa, muito alta ou por uma excessiva amplitude. Em qualquer dos casos, é
perfeitamente válido o argumento de que é possível prever a gama de temperaturas a que uma
determinada estrutura num determinado local estará sujeita durante o seu período de vida
esperado. Com esses dados, podem ser tomadas medidas de índole preventiva,
particularmente na escolha dos materiais e na compactação e cura do betão, pelo que nunca se
pode imputar unicamente à temperatura os defeitos eventuais que venham a surgir.

Analisam-se de seguida os efeitos negativos da temperatura no betão armado.

Frio excessivo

Os efeitos mais gravosos do frio excessivo no betão dão-se quando este é jovem e está
ainda na sua fase de endurecimento, podendo mesmo chegar a pará-lo completamente; por
outro lado, pode contribuir para que a água capilar solidifique no interior do betão.

O primeiro efeito deve-se à diminuição da velocidade de hidratação dos componentes


activos do cimento. O segundo só terá consequências graves se o betão estiver saturado com a
água de amassadura, em cujo caso o aumento de 9% em volume da água ao gelar gera tensões
internas altíssimas no betão, numa altura em que a resistência deste é bastante baixa. Sobre o
ciclo gelo-degelo se falará mais detalhadamente um pouco adiante.

A influência do frio excessivo no betão endurecido é bastante menor, em particular se

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Patologias em construções em betão por Jorge de Brito

este for compacto e resistente. Por um lado, a inércia térmica do betão é grande e, por outro,
só muito raramente o betão endurecido se encontra saturado de água. Estes factos, aliados à
maior resistência à tracção entretanto adquirida, fazem com que uma ocorrência isolada de
gelo no betão não tenha consequências de maior. Já o mesmo não se poderá dizer da
ocorrência repetida de ciclos gelo-degelo, situação pouco corrente em Portugal.

As medidas preventivas a tomar em relação à possível ocorrência de frio excessivo são:


utilização de aditivos incorporadores de ar ou aceleradores de presa, aquecimento dos
materiais constituintes do betão (água, inertes ou a própria argamassa), utilização de cimentos
de alto calor de hidratação, colocação temporária de cobertas nas superfícies expostas, evitar
betonagens a temperaturas muito baixas, curar convenientemente o betão jovem, etc..

Calor excessivo

O principal problema relacionado com as altas temperaturas é a desidratação do betão,


especialmente nas camadas superficiais. A desidratação será maior se, em simultâneo com o
calor excessivo, ocorrer humidade relativa ambiente baixa e exposição ao vento e ao sol. A
água tem tendência a migrar do interior da peça em direcção à sua superfície exterior. Isto tem
duas consequências principais:

 deficiência na hidratação dos componentes activos do cimento, dando origem à


desagregação do cimento com as consequentes baixas características mecânicas;
 o estado de tensões que se forma por retracção hidráulica e que pode levar à fendilhação
do betão e mesmo à sua rotura.

Outros eventuais problemas relacionados com o calor excessivo são:

 fendilhação de origem térmica após o arrefecimento de peças muito rígidas betonadas e


curadas a altas temperaturas;
 maior tendência para a formação de fendilhação por retracção ou assentamento plásticos;
 efeito negativo sobre a resistência mecânica a longo prazo apesar de permitir um aumento
mais rápido das resistências iniciais (Fig. 3);

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 aumento da água de amassadura necessária para conseguir a mesma trabalhabilidade do


betão, ou seja, aumento da relação água / cimento com todas as consequências negativas
daí advindas;
 aumento da velocidade das reacções químicas de ataque ao betão e às armaduras o que se
deve à maior mobilidade dos iões e moléculas no interior do betão (Fig. 4);
 aumento da retracção e da fluência do betão a longo prazo;
 diminuição da aderência entre o betão e as armaduras.

Fig. 3 [6] - Evolução da resistência do betão com a temperatura para 1 dia e 28 dias de idade

Fig. 4 [7] - Influência da temperatura média anual na agressividade relativa do ambiente


expressa em termos do recobrimento necessário

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Todos estes efeitos são particularmente sentidos no betão jovem, ficando bastante
atenuados no betão endurecido. Pode-se mesmo dizer que o comportamento deste é excelente
até à temperatura de 150 ºC [6].

As medidas preventivas a tomar em relação à possível ocorrência de calor excessivo


são: utilização de aditivos retardadores de presa e plastificantes, arrefecimento dos materiais
constituintes do betão (água ou inertes), cofragens, armaduras ou superfícies de betonagem,
utilização de cimentos de baixo calor de hidratação, regas contínuas das superfícies expostas,
protecção da exposição ao vento e ao sol, evitar betonagens a temperaturas muito altas, curar
convenientemente o betão jovem, etc..

Grandes amplitudes térmicas

Como se viu nas rubricas anteriores, as medidas preventivas em relação às baixas


temperaturas são frequentemente opostas e inconciliáveis com as que correspondem às altas
temperaturas. No betão não se consegue fazer milagres, pelo que, sendo as condições
extremas, o melhor que se consegue é uma solução de compromisso.

Pelo que foi dito, os efeitos patológicos e medidas a tomar para os prevenir, dependem
das condições climatéricas da altura da betonagem e terão muito a ver com a estação do ano.

Como medidas preventivas, aconselham-se as seguintes: evitar os meses do ano mais


rigorosos para execução de betonagens, reduzir a relação água / cimento, conseguir uma boa
compactação, utilizar uma dosagem de cimento suficiente para garantir uma boa resistência
mecânica e aumentar o tempo de cura.

2.1.2. Chuva, neve e gelo

A chuva e a neve podem contribuir para danificar o betão de duas formas: alterando a
relação água / cimento no betão fresco e / ou contribuindo para a saturação dos poros capilares
do betão com água.

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O primeiro efeito pode dar-se, quer pela molhagem dos materiais antes de estes serem
misturados, quer pelo depósito de água nas superfícies recentemente betonadas. A molhagem
dos sacos de cimento é particularmente perigosa por poder precipitar a hidratação daquele
antes da sua colocação em obra. Por outro lado, a exposição das armaduras às intempéries,
contribui para o início precoce da corrosão nas mesmas.

O segundo efeito dá-se geralmente em superfícies verticais expostas ao vento e às


intempéries e principalmente em superfícies quase horizontais nas quais os sistemas de
drenagem sejam deficientes. Para além de facilitar a penetração dos agentes agressivos, esta
água depositada pode solidificar, dando origem aos perigos a seguir descritos. Neste aspecto, a
neve é mais perigosa não só porque se deposita mesmo em superfícies bastante mais
inclinadas, como também porque está logo a uma temperatura próxima da solidificação. A
incidência diferenciada da água da chuva nas fachadas dos edifícios contribui também para
dar a estes um aspecto de sujos e mal conservados. Para evitar este efeito, há que escolher
texturas apropriadas das fachadas, fazer uma sua manutenção regular, conceber uma drenagem
adequada e principalmente evitar a existência de pequenas reentrâncias (Fig. 5).

Fig. 5 [7] - Existência de reentrâncias na fachada de edifícios, provocando deposição


diferenciada das águas das chuvas e das poeiras

O gelo é destas manifestações climatéricas a que pode ter efeitos mais perniciosos sobre
o betão e, em particular, o betão jovem. A água, ao solidificar, aumenta 9% em volume, pelo
que os efeitos mais graves no betão só se dão para coeficientes de saturação deste superiores a
0.9. É exactamente nas primeiras horas de cura do betão que essa saturação é necessária para a
total hidratação do cimento. Como coincide com as menores resistências mecânicas do betão,

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a solidificação de água nele contida nas primeiras horas é suficiente para levar à sua ruína por
fendilhação generalizada devido às tensões internas geradas. Acontece por vezes que a
resistência do betão aumenta ligeiramente após o degelo, mas o betão resultante é tão débil e
poroso que tem de ser demolido.

Como já foi referido atrás, a ocorrência isolada de gelo no betão endurecido não é, em
geral, motivo de preocupações mas, mesmo num bom betão, a repetição prolongada de ciclos
gelo-degelo acaba por provocar estragos (Fig. 6).

Fig. 7 [6] - Aumento de volume no betão em função do n.º de ciclos gelo-degelo

2.1.3. Vento

O vento tem quase sempre um efeito negativo sobre o betão. É fundamental assegurar
que, nas suas primeiras horas, a superfície exterior do betão não se desidrata completamente.
De facto, essa desidratação acompanhada de uma fraca resistência à tracção leva, em geral, a
largas fendas de retracção plástica. Isto deve-se à corrente interna de migração de água do
interior para a superfície para colmatar a insuficiência em água desta última, acompanhada de
uma tendência do betão para a diminuição do seu volume.

Neste processo, o vento tem um papel preponderante, principalmente em climas secos e


quentes e quando atinge velocidades apreciáveis. Em climas frios, o vento contribui para a
aceleração da perda de calor nos betões jovens, favorecendo assim a ocorrência de gelo no

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interior destes. O vento é ainda responsável pelo arraste de poeiras e eventuais agentes
agressivos e serve de veículo à poluição.

2.1.4. Exposição ao sol

A exposição ao sol contribui para o aumento da temperatura do betão, com todos os


efeitos patológicos daí decorrentes, e que são referidos na rubrica sobre os efeitos das altas
temperaturas no betão. Enumeram-se aqui alguns deles: perda de trabalhabilidade, aumento
das temperaturas internas durante a cura, maior retracção, maior relação água / cimento, maior
risco de fissuração, menores resistências finais, existência de regiões de betão mal
compactadas e porosas junto às armaduras por estas se encontrarem excessivamente quentes
aquando da betonagem, etc..

Deve-se procurar fazer as betonagens ao fim da tarde para que, nas primeiras horas, o
betão jovem não esteja exposto ao sol. Todos os materiais devem estar à sombra durante a sua
armazenagem, devendo, se possível, os depósitos de materiais ser pintados de branco.

2.1.5. Humidade relativa

A humidade relativa do ambiente é um factor de primeira importância, particularmente


na fase de cura e endurecimento dos betões jovens. Pode-se dizer que, de um modo geral, altas
humidades relativas do ambiente são benéficas para o betão, ainda que este corra o risco de
ficar permanentemente saturado e ser portanto mais susceptível a estragos devidos aos ciclos
gelo-degelo. Em contrapartida, as baixas humidades relativas registadas em ambientes secos
podem dar azo a uma série de efeitos negativos, em particular se surgirem conjugados com
ventos fortes e exposição ao sol. Dão origem a uma desidratação muito intensiva das
superfícies exteriores, provocando-lhes fendilhação devida à retracção plástica e podendo
originar fenómenos de hidratação incompleta do cimento.

Do ponto de vista dos processos de deterioração do betão endurecido, a humidade


relativa dentro do betão é muito mais importante que a humidade relativa ambiente. Em geral,
as duas coincidirão grosso modo, mas quando as condições climatéricas mudam

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frequentemente, a humidade relativa média no interior do betão é maior que no exterior, por
este material absorver água mais rapidamente do que a perde.

A influência da humidade nesses processos é pouco linear, podendo-se dizer que os


ataques químicos e o devido ao ciclo gelo-degelo serão tanto maiores quanto maior a
humidade relativa. No lº caso, a água funciona como um catalisador das reacções
transportando em solução os agentes agressivos. No 2º caso, isto deve-se à saturação dos
poros com água que, ao congelar e aumentar de volume, dá origem a estragos no betão. No
Quadro 1, apresenta-se de uma forma qualitativa a influência da humidade relativa nos
processos de deterioração do betão.

Quadro 1 [7] - Influência da humidade relativa nos processos de deterioração do betão

PROCESSO DE DETERIORAÇÃO
____________________________________________________________
HUMIDADE Corrosão do aço Ataque
RELATIVA Carbona- que está Ataque
EFECTIVA __________________________ do
tação carbonatado contaminado químico
por cloretos gelo

muito baixa (< 45%) 1 0 0 0 0


baixa (45 a 65%) 3 1 1 0 0
média (65 a 85%) 2 3 3 0 0
alta (85 a 95%) 1 2 3 2 1
saturação (> 95%) 0 1 1 3 3
Risco:
0 - insignificante 2 - médio
1 - pequeno 3 - alto

Os valores incluídos no quadro são agora comentados e explicados no sub-capítulo


sobre a agressividade do ambiente.

2.2. A agressividade do ambiente

Vai-se aqui analisar como a agressividade do ambiente pode constituir uma causa de
patologia no betão (armado e pré-esforçado) e quais as medidas a tomar. Começa-se por

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descrever os efeitos relacionados com a corrosão das armaduras que essa mesma
agressividade pode ter, tanto no betão, como no aço. De seguida, analisam-se os diversos tipos
de ataque a que o betão pode estar sujeito, associados às respectivas causas directas e às
medidas preventivas que, em cada caso, se deve tomar para anular ou minorar os efeitos
patológicos.

2.2.1. Despassivação do betão

O betão constitui a primeira e melhor protecção das armaduras contra a corrosão pela
passivação que lhes confere. Isto deve-se à sua alcalinidade que faz com que o pH da água
contida nos seus poros possa até ser superior a 12,5. Quando se atingem valores do pH desta
ordem de grandeza, forma-se uma camada oxidada em volta da superfície exterior das
armaduras, chamada película passiva. Esta película impede a dissolução do aço (Fig. 7). Deste
modo, a corrosão das armaduras torna-se impossível mesmo que estejam preenchidos todos os
outros pré-requisitos para que ela ocorra: essencialmente a presença de humidade e oxigénio.

Fig. 7 [7] - Protecção das armaduras pela alcalinidade do betão

O valor do pH não é constante ao longo do tempo e pode alterar-se localmente ou em


largas superfícies por três motivos principais: carbonatação, acção dos iões cloro e lixiviação
(arrastamento) dos álcalis por água em movimento. Esta última razão é a menos frequente e
ocorrerá em pontos fracos da estrutura e só com betões de qualidade inferior. A protecção à
corrosão perde-se quando acontece um dos seguintes fenómenos: o pH do betão diminuir para
menos de 9 junto à superfície das armaduras ou a concentração de iões cloro ultrapassar um
determinado valor crítico (Fig. 8).

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Fig. 8 [7] - Corrosão das armaduras após a dissolução da película passiva

Este valor crítico não é um valor fixo e depende de vários factores: o estado da
passivação ou carbonatação do betão, a qualidade deste, a humidade relativa do ambiente e a
sensibilidade à corrosão das armaduras (Fig. 9).

Fig. 9 [7] - Concentração crítica de iões cloro para as armaduras pouco sensíveis à corrosão

Anulada a protecção constituída pelo betão, para que a corrosão nas armaduras ocorra é
ainda necessário que exista humidade e oxigénio em quantidades suficientes, o que
geralmente acontece ao ar livre.

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A reacção química que traduz a carbonatação do betão é simplificadamente a seguinte:

CA (OH)2 + CO2 ------> CA CO3 + H2O

Como é o hidrogénio de cálcio que dá o carácter alcalino ao betão, a carbonatação tem


como consequência a diminuição do pH deste. A carbonatação dá-se da superfície exterior
para o interior (Fig. 10), dependendo a velocidade de propagação essencialmente da difusão
de carbono no seio do betão. Esta difusão só é possível em poros cheios de ar. Daí o facto de a
carbonatação não se dar em betões completamente saturados de água.

Fig. 10 [5] - Carbonatação progressiva do betão

A taxa de propagação da carbonatação é aproximadamente proporcional à raiz quadrada


do tempo e a sua profundidade tende a tempo infinito para um valor limite no interior do
betão (Fig. 11). Este valor aumenta com a permeabilidade do betão (o factor mais importante),
a quantidade de substância carbonatável e a humidade relativa do ambiente.

Quanto maior a relação água / cimento, maior a taxa de carbonatação. As fendas


transversais aos varões da armadura são praticamente inofensivas, se a sua espessura for
inferior a 0.2 a 0.3 mm. No entanto, fendas paralelas aos varões são sempre motivo de

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preocupação. A influência da fendilhação será tanto maior quanto menor o recobrimento e


mais alta a qualidade do betão compatível com esse recobrimento.

Fig. 11 [7] - Propagação da carbonatação com o tempo

A difusão de iões cloro livres (isto é, não combinados química ou fisicamente) é um


processo que, ao contrário da carbonatação, se dá em poros parcial ou totalmente cheios de
água. Como resultado do processo de difusão, a concentração de iões cloro decresce da
superfície para o interior do betão (Fig. 12). Daí que o ataque às armaduras seja tanto maior
quando mais próximas estas estiverem da superfície exterior, ou seja, quanto menor for o seu
recobrimento.

Fig. 12 [7] - Difusão dos iões cloro no betão

A taxa de penetração dos iões cloro no betão obedece a uma lei aproximadamente de
raiz quadrada em relação ao tempo, dependente essencialmente da profundidade de penetração
da água no betão e da permeabilidade da superfície exterior deste.

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Dá-se um enriquecimento da taxa de iões cloro no betão sempre que ocorrem situações
alternadas de molhagem e secagem deste. Os iões entram com a água no betão por sucção de
capilaridade e, quando esta seca, depositam-se (Fig. 13).

Fig. 13 [7] - Efeito da molhagem e secagem na difusão dos iões cloro

O aumento da relação água / cimento no betão contribui para uma maior permeabilidade
deste aos iões cloro. O mesmo se passa em relação aos aditivos incorporadores de ar.

A medida mais importante na prevenção da despassivação do betão, quer em relação à


carbonatação quer em relação aos iões cloro, é conseguir um bom betão, compacto e
impermeável. Para tal, muito contribui a diminuição da relação água / cimento, o aumento da
dosagem de cimento, a utilização de plastificantes e, principalmente, uma boa curva granulo-
métrica do betão. Em face das leis de propagação da carbonatação e da penetração dos iões
cloro no tempo, é fácil perceber a importância da utilização de um bom recobrimento.

2.2.2. Corrosão das armaduras

O processo de corrosão das armaduras é simplificadamente a conjunção de dois proces-

sos: o processo anódico (Fe ----> Fe++ + 2 e-) e o processo catódico (2 e- + 1/2 O2 + H2O ---

> 2 (OH)-) (Fig. 14). Para que o circuito eléctrico se feche, é preciso ainda um condutor (a
própria armadura) e um electrólito (o betão húmido). O produto final (Fe2 O3) é vulgarmente

designado por ferrugem e não tem qualquer contribuição para a resistência das armaduras.

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As condições para que este fenómeno se dê são fundamentalmente duas: a existência de


oxigénio (único produto consumido no processo de corrosão), por difusão através do
recobrimento das armaduras; a existência de água, para que o processo electrolítico se dê. Daí
que a corrosão não se dê nem em betão seco (por impedimento do processo electrolítico) nem
em betão permanentemente saturado de água (por falta de oxigénio), mesmo que a película
passiva das armaduras tenha sido destruída. Por outro lado, as condições ideais para a
ocorrência de corrosão são as situações alternadas de secagem e molhagem do betão.

Fig. 14 [7] - Corrosão das armaduras no betão

Existem diversos tipos de corrosão:

 corrosão generalizada - dá-se em quase toda a superfície das armaduras, dando origem a
fendilhação e descasque do betão mas comparativamente pequenas reduções nos
diâmetros das secções das armaduras; está geralmente associada à carbonatação;
 corrosão localizada (Fig. 15) - ocorre quando o filme passivo só é destruído em pequenas
áreas, dando origem a grandes perdas da secção útil dos varões e mesmo à rotura destes
sem estragos visíveis no betão; está geralmente associada à contaminação por iões cloro;
 corrosão provocando rotura frágil por um processo anódico - ocorre em armaduras pré-
esforçadas;
 corrosão provocando rotura frágil por processo catódico - fragilização por hidrogénio;
 corrosão química - não provoca danos graves nas armaduras.

Os dois efeitos negativos principais de corrosão das armaduras são:

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 a formação de fendilhação provocada pelas tensões internas geradas durante o processo


de corrosão que é altamente expansivo; estas tensões podem levar mesmo ao descasque
do recobrimento (spalling), deixando as armaduras a descoberto e acelerando
extraordinariamente o processo corrosivo;
 redução da sua secção efectiva e portanto da capacidade de carga do elemento resistente
acompanhada de uma diminuição do carácter dúctil do aço, da sua resistência à fadiga e
da sua aderência ao betão (Fig. 16).

Fig. 15 [7] - Modelo da corrosão localizada

Fig. 16 [6] - Redução da secção resistente das cintas do pilar até à sua total eliminação devida
ao descasque do betão provocado pela corrosão das armaduras

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Só as fendas de largura superior a 0.4 mm contribuem significativamente para o


processo de aceleração da corrosão, já que as outras acabam por se fechar por um processo de
auto-cicatrização. As fendas longitudinais às armaduras são mais perigosas que as
transversais.

O factor mais importante na protecção do betão armado é a qualidade do recobrimento a


qual depende essencialmente de dois factores: a sua espessura e a sua permeabilidade. Na
rubrica anterior, foram já referidas as implicações destes parâmetros na durabilidade do betão.
Resta acrescentar que a permeabilidade aumenta com a relação água / cimento, com uma
compactação e cura deficientes e com uma dosagem menor de cimento.

A taxa de corrosão depende ainda da humidade relativa (ver 2.1.5), da concentração de


iões cloro, da sensibilidade das armaduras à corrosão e da poluição do ambiente.

As medidas preventivas para evitar ou minorar os efeitos da corrosão das armaduras são
de dois tipos:

 normais - redução da relação água / cimento, cuidados na cura e na compactação,


aumento do recobrimento, aumento de dosagem de cimento, utilização de diâmetros
superiores, utilização de cimentos pozolânicos ou de alto forno e outras;
 especiais - utilização de aditivos plastificantes, pinturas à base de epoxi, inibidores de
corrosão, pinturas impermeabilizantes asfálticas, armaduras galvanizadas, protecção
catódica e outras.

2.2.3. Ataque químico do betão

Como já se referiu atrás, o macroclima à volta das estruturas tem apenas uma
importância relativa no que se refere à durabilidade. Muito mais importante é o microclima da
superfície exterior do betão (distâncias da ordem dos centímetros ou milímetros) nas peças ao
ar livre ou as condições que rodeiam as peças enterradas (conteúdo e agressividade dos solos).
Daí que num mesmo ambiente, possam ocorrer diferentes mecanismos de degradação com

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taxas de evolução radicalmente diferentes a poucos metros de distância (caso dos ambientes
marinhos ou de determinadas estruturas). No entanto, é óbvia a influência que o macroclima
tem no microclima. Daí o se considerar importante a classificação dos meios ambientes sob o
ponto de vista da sua agressividade, ainda que não exista ainda unanimidade sobre o assunto.

Referido este aspecto, vai-se agora descrever os diversos tipos de ataque a que o betão
pode estar sujeito e que serão sempre característicos dos ambientes muito agressivos.

Em relação a qualquer dos processos químicos que se descreverão de seguida, há umas


determinadas noções básicas comuns a todos eles, que se achou útil aqui referir.

A presença das substâncias agressivas no betão ou junto a ele, não chega por si só para
que se dê o ataque do betão. Não haverá reacção química se não houver transporte dessas
substâncias na direcção das substâncias reagentes existentes no betão. Para tal, a presença da
água sob a forma líquida ou gasosa é um pré-requisito indispensável para que o ataque do
betão tenha alguma importância no tempo de vida da estrutura.

A temperatura acelera as reacções, na medida em que provoca uma maior mobilidade de


iões e moléculas. Quanto mais alta a temperatura, maior a taxa de deterioração do betão (Fig.
4).

Mesmo quando existe em simultâneo água, altas temperaturas e substâncias agressivas,


o betão pode ter um bom comportamento do ponto de vista químico. De facto, um bom betão,
de alta densidade, baixa permeabilidade e boas características mecânicas, é o melhor travão ao
ataque químico.

2.2.3.1. Ataque dos ácidos

Inclui-se nesta designação uma variada gama de ataques do betão: ataques de ácidos
propriamente ditos, sais de amónia e magnésio, gases contidos na atmosfera, águas puras,
turvas ou ácidas e compostos fluidos ou sólidos de natureza orgânica tais como azeites,
gorduras, combustíveis, líquidos alimentícios, etc..

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O que se passa quando uma destas substâncias entra em contacto com o betão é uma
conversão de todos os compostos de cálcio (hidróxido, silicato hidratado e aluminato
hidratado) nos sais de cálcio do ácido reagente ou em novos compostos incoerentes ou
expansivos [7]. O resultado prático desta conversão é a destruição da capacidade aglutinadora
do cimento endurecido, que se desagrega com a maior facilidade, ou a sua fissuração
generalizada por acção dos sais expansivos (Fig. 17).

Fig. 17 [7] - Representação esquemática do ataque dos ácidos no betão

Há neste aspecto uma diferença fundamental entre o ataque dos ácidos e os dos sulfatos
e álcalis que serão referidos posteriormente. No primeiro, há uma conversão completa do
cimento endurecido com a destruição do sistema de poros. A permeabilidade do betão antes
do ataque é portanto de menor importância. Nos outros tipos de ataque, ela é o parâmetro
fundamental na prevenção e retardamento da deterioração do betão.

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Os factores que mais influenciam a taxa de reacção neste tipo de ataque são a
solubilidade do sal resultante e a capacidade de transporte dos agentes agressivos.

A protecção das estruturas em relação a este tipo de ataque deve ter por objectivo
principal evitar o contacto directo dos agentes agressivos com o betão. Para tal, recorre-se a
recobrimentos superficiais impermeáveis do tipo asfáltico, resinas asfálticas, etc.. Em
complemento, pode-se tomar outras medidas, ainda que menos eficazes: utilização de
cimentos de conteúdo rico em sílica e pobres em silicato tricálcico, cimentos pozolânicos, de
alto forno, super-sulfatados, aluminosos ou impregnados de polímeros ou fibras de aço
inoxidável ou plásticas, maiores e mais compactos recobrimentos, etc..

2.2.3.2. Ataque dos sulfatos

O ataque dos sulfatos pode dar-se das seguintes formas [7]:

 reacção química do ião de sulfato (substância reagente) com a componente aluminosa do


cimento portland (substância reactiva);
 transformação do hidróxido de cálcio em gesso;
 ataque do sulfato de magnésio sobre a gel hidratada do silicato de cálcio, produto da
reacção de hidratação do cimento com maior responsabilidade no ganho de resistências
deste.

Como característica comum destas reacções, tem-se o facto de serem todas altamente
expansivas gerando portanto elevadas tensões internas. O resultado prático é a desagregação
do betão através da perda do aglomerante pelo que os inertes ficam livres (Fig. 18). Outra
consequência é a formação de betões porosos e de alta permeabilidade.

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Fig. 18 [6] - Ataque dos sulfatos em tubagem de betão armado

Enquanto que no ataque dos ácidos o sistema poroso como um todo é destruído, porque
os ácidos reagem com todas as componentes do cimento, o ataque dos sulfatos dá-se apenas
sobre alguns dos componentes do cimento (Fig. 19).

Fig. 19 [6] - Representação esquemática do ataque dos sulfatos no betão

Os factores que mais afectam a taxa de deterioração do betão devida aos sulfatos são:

 as condições de exposição, função da quantidade de substância agressiva presente;


curiosamente, a existência de iões cloro tem um efeito moderador nesta reacção devido à
formação do sal de Fridell;

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 o tipo de cimento que determina a quantidade de aluminatos que podem ser atacados;
 a permeabilidade do betão que condiciona a taxa de transporte dos sulfatos;
 a quantidade de água presente;
 a temperatura ambiente que, ao contrário do que acontece nos outros tipos de ataque, faz
diminuir a intensidade do ataque dos sulfatos.

A protecção contra este tipo de ataque passa essencialmente pela diminuição da


permeabilidade e da susceptibilidade do cimento. Para tal, actua-se na relação água / cimento,
no tipo de cimento (os cimentos pozolânicos e os de alto forno são os mais indicados), no
tempo de cura, na espessura do recobrimento e na utilização de medidas especiais de
protecção (capas impermeáveis).

2.2.3.3. Ataque dos álcalis

O ataque dos álcalis é caracterizado pela formação de gel de álcali-sílica. Os álcalis


existem livres nas soluções alcalinas nos poros de betão apesar de estes se encontrarem em
geral saturados. A sílica pode ou não existir nos inertes dependendo a reactividade dos inertes
da quantidade de sílica existente.

O resultado prático deste ataque é a formação de fendilhação superficial generalizada


(Fig. 20) devido ao carácter expansivo da reacção, seguida eventualmente por desintegração
total. O gel formado não tem qualquer resistência mecânica e o betão perde as suas qualidades
mecânicas (Fig. 21).

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Fig. 20 - Fendilhação generalizada associada à reacção álcali-sílica

A diferença principal entre o ataque dos sulfatos e o dos álcalis é que, enquanto no
primeiro a substância reactiva está no cimento, no segundo está nos inertes.

Os factores que mais afectam a taxa de deterioração do betão devida a esta reacção são:

 as condições de exposição, função da quantidade de substância agressiva presente, da


existência de ciclos seco-molhado e frio-calor;
 a reactividade dos inertes, que depende da presença de sílica amorfa ou parcialmente
cristalizada;
 a quantidade e granulometria da substância reactiva;
 a concentração de álcalis na água dos poros, ou seja, a quantidade interna de substância
agressiva;
 o tipo de cimento e, em particular, o seu conteúdo em álcalis;
 a permeabilidade do betão que condiciona a taxa de transporte dos álcalis;
 a quantidade de água presente.

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Fig. 21 [7] - Representação esquemática dos ataques dos álcalis no betão

A prevenção deste tipo de ataque passa pela actuação na permeabilidade e tipo do ci-
mento e na escolha dos inertes. Para tal, são preferíveis cimentos de alto forno e pozolânicos e
inertes não reactivos (com baixos teores em sílica) e deve-se reduzir a relação água / cimento,
melhorar a cura e tomar as providências já conhecidas para conseguir um betão compacto.

2.3. As acções biomecânicas

Neste sub-capítulo, são analisadas as causas de patologia de origem biomecânica.


Assim, trata-se a erosão, provocada por abrasão ou por cavitação, e a acção biológica,
provocada quer por plantas quer por animais. Estas acções não são das mais comuns mas,
quando existem condições favoráveis para a sua actuação, podem levar a estragos
consideráveis.

2.3.1. Abrasão

Este processo de deterioração é típico de regiões localizadas que sofrem a influência de


factores exteriores, sob a forma de forças de pequena intensidade, mas que se repetem milhões
de vezes e que tendem a arrastar consigo as partículas superficiais do betão. São

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particularmente sensíveis à abrasão os finos que se vão soltando até que os inertes de maior
dimensão deixam de estar ligados à peça e acabam por se soltar também.

São exemplos deste tipo de erosão a acção do tráfego pedestre ou rodoviário (Fig. 22), o
escorregamento de objectos pesados, a acção de partículas pesadas suspensas em zonas de alta
velocidade de água e a acção de areias levadas pelo vento.

Fig. 22 [7] - Abrasão de cimento devida à acção de raspagem e percussão de pneus de


veículos motorizados

A taxa de erosão depende da quantidade, forma, tamanho e dureza dos sólidos


transportados, da velocidade de escoamento destes e da qualidade do betão.

As medidas preventivas passam sobretudo pela tentativa de obstar a condições


favoráveis à abrasão, evitando superfícies expostas ou criando protecções. Quando tal não é
possível, deve-se utilizar um betão com um índice elevado de inertes grossos resistentes à
erosão aglutinados com uma argamassa de cimento muito densa e uma relação água / cimento
baixa. Pode também utilizar-se inertes metálicos ou betão reforçado com fibras de aço.

2.3.2. Cavitação

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A cavitação está associada à existência de turbulência na água (ou no ar), devida à


existência de irregularidades exteriores impostas ao seu caudal livre. Dá-se, por exemplo, em
correntes rápidas de água sem transporte de sólidos significativo que, ao encontrar uma
mudança brusca de geometria na superfície de escoamento, formam lâminas de líquido com
tendência a destacar-se da superfície formando zonas de baixa pressão. Quando a pressão
estática da água se torna menor que a pressão do vapor, formam-se bolhas nessas zonas
(escoamento turbulento). Quando essas bolhas atingem zonas em que novamente a situação se
inverte, o vapor condensa-se nas bolhas e estas colapsam de repente. Esta “implosão” origina
ondas de pressão e impacto semelhantes às provocadas por uma explosão. O resultado é a
formação de zonas escavadas na superfície da peça [7].

Os inertes de maior dimensão são os mais sensíveis a esta acção.

A melhor forma de evitar estes efeitos é eliminar a sua causa, ou seja, os perfis de
escoamento descontínuos e de ângulos muito fechados. Em simultâneo, deve-se procurar obter
uma superfície exterior do betão resistente e sem irregularidades à custa de uma pasta de
cimento densa e de boas características mecânicas. Pode-se usar também betões contendo
fibras de aço ou impregnadas com polímeros.

2.3.3. Acções biológicas

Nesta rubrica, são analisadas patologias de ordem e consequências diversas mas que têm
em comum ter como causa primeira um organismo vivo, vegetal ou animal, mas que não o
homem. Delas salientam-se:

 ataque de algas, líquenes e musgos - em geral não provocam problemas de maior excepto
no que se refere à saturação de água das superfícies nas quais se encontram incrustados;
 ataque de moluscos - em zonas tropicais, detectaram-se casos de moluscos que se
incrustaram no betão à velocidade de 1 cm por ano [7];
 introdução de raízes de plantas e árvores no betão - estas introduzem-se nas fendas e
pontos fracos do betão e podem gerar tensões internas importantes, contribuindo para a
degradação acelerada do betão;

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 ataque biológico em sistemas de esgoto - em condições anaeróbias (sem oxigénio), o


sulfito de hidrogénio, que não é só por si muito agressivo para o betão, pode formar-se de
sulfatos ou proteínas contidas nos esgotos; dependendo do equilíbrio químico e da
turbulência do escoamento, este composto pode isolar-se da solução e ser oxidado por
acção bacteriológica, formando ácido sulfúrico (Fig. 23); este composto é altamente
agressivo e origina um ataque ácido no betão acima do nível do escoamento; a médio
prazo, a argamassa de cimento transforma-se completamente em gesso e perde todas as
suas características resistentes; as únicas medidas eficazes nestes casos são o tratamento
das águas, a utilização de camadas protectoras impermeabilizantes ou a substituição do
betão armado por outro material mais adequado; mesmo os betões mais compactos e
resistentes a ataques de ácidos não resistem muito tempo nestas condições;
 ataque de origem animal - para além do atrás referido (moluscos), o ataque destes agentes
é de muito pequenas consequências.

Fig. 23 [7] - Representação esquemática do ataque biológico do betão em sistemas de esgoto

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3. ANÁLISE DA SINTOMATOLOGIA ESTRUTURAL

3.1. Considerações Gerais

Define-se “sintomatologia” como o estudo dos fenómenos indicadores das doenças.


Quando aplicado ao betão (armado e pré-esforçado), este termo diz respeito ao estudo das
diversas manifestações de deficiência estrutural ou não que eventualmente permitem
identificar as causas de patologia ou pelo menos limitar o número de causas possíveis.

Esta é uma ciência extremamente complexa e sujeita a graves erros mesmo com técnicos
com largos anos de experiência. As dificuldades são entre outras:

 nem sempre os sintomas são claros, podendo confundir-se com o natural envelhecimento
dos materiais ou da estrutura;
 na realidade, as manifestações patológicas são menos identificáveis e tipificáveis que em
teoria;
 nem sempre as mesmas causas provocam os mesmos sintomas e os mesmos sintomas
podem ser devidos a várias causas;
 as deficiências só muito raramente se devem a uma única causa pelo que os sintomas
associados a cada causa se misturam;
 a única forma de aprender é com a experiência;
 faltam bancos de dados acessíveis aos técnicos interessados.

Vai-se de seguida analisar os principais sintomas de problemas no betão (armado e pré-


esforçado) que uma análise in-situ, visual ou com recurso a aparelhagem de ensaio, permite
detectar.

3.2. Betão

3.2.1. Fendilhação

Esta é a manifestação patológica mais comum no betão e também a susceptível de

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fornecer mais informação. Deve no entanto referir-se que a fendilhação não é necessariamente
um sintoma de patologia no betão estrutural. Dado o seu carácter de material composto e a
fraca resistência à tracção do betão, a fendilhação das estruturas de betão armado e mesmo de
pré-esforçado é inevitável e tem de ser aceite à partida.

As razões fundamentais da limitação da fendilhação são: aspecto estético do elemento


estrutural, protecção contra a corrosão e garantia da estanqueidade. Cada um destes aspectos
conduz a diferentes valores da largura máxima admissível das fendas.

As fendas podem ser classificadas de várias formas:

a) em função da sua causa

solidificação da água capilar


retracção plástica
antes da presa estado plástico do betão cura deficiente
do betão assentamento plástico
movimentos durante a falta de rigidez das cofragens
construção assentamento da base
inertes de retracção intensa
tipo de origem física retracção a longo prazo
fendas fluência
corrosão das armaduras
origem química ataque dos álcalis
após a presa carbonatação do betão
do betão
ciclos gelo-degelo
variações sazonais de temperatura
origem térmica
contracções logo restrições externas
após a presa gradientes internos
carregamento excessivo acidental
origem estrutural erros de execução ou de projecto
cargas de cálculo
assentamentos de apoio

b) em função da sua largura máxima [6]

microfissuras - até 0.05 mm


tipo de fendas fissuras intermédias - entre 0.05 mm e 0.4 mm
macrofissuras - mais de 0.4 mm

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c) em função do tratamento a que a sua reparação dá origem

mortas - estabilizadas, ou seja, sem movimentos ao longo do tempo


tipo de fendas (retracção plástica, assentamentos estabilizados, etc.)
vivas - não estabilizadas, com movimentos de índole cíclica ou uniforme-
mente crescentes (origem térmica, corrosão das armaduras, acções
directas, etc.)

São os seguintes os aspectos a considerar quando se analisa a fissuração do betão [6]:

 perceber se as fendas aparecem nos elementos estruturais ou apenas nos de enchimento;


 perceber se as fendas afectam o elemento resistente ou se se limitam ao acabamento;
 perceber se as fendas nos elementos estruturais são superficiais ou profundas;
 registar o aspecto geral da fendilhação, a sua orientação, número, frequência e sequência
de formação de forma a obter um quadro clínico que, comparado com um quadro padrão,
possa servir para determinar as causas da fendilhação;
 registar a largura máxima das fendas e compará-la com os valores máximos regulamentares;
 conhecer a evolução do estado de fendilhação do elemento estrutural ao longo do tempo o
que permite saber se esta estabilizou e portanto conhecer a segurança em serviço da
estrutura;
 conhecer as causas que deram origem à fendilhação antes de proceder à sua reparação;
 organizar e sistematizar a observação do estado de fendilhação da estrutura de forma a
que esta seja eficaz, contínua e cubra um intervalo de tempo suficiente para que os
resultados possam ser conclusivos.

De seguida, vai-se referir de forma bastante sumária os diversos tipo de fissuras de


acordo grosso modo com a classificação em função da sua causa. Procurar-se-á evitar repetir a
informação a fornecer num quadro-resumo mais adiante e ilustrar-se-á esquematicamente as
diferentes fissuras.

Fendilhação antes da presa do betão

É a que ocorre enquanto o betão está no estado plástico e que por vezes é recuperável se

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for efectuada uma revibração logo após o seu aparecimento.

Retracção Plástica

Estas fendas ocorrem quando a velocidade de perda de água por evaporação é superior à
velocidade com que a água chega à superfície por exsudação. São mais correntes em peças
esbeltas muito expostas (Fig. 24).

Fig. 24 [6] - As fendas devidas à retracção plástica têm tendência para aparecer na lâmina de
compressão (zona mais esbelta) nas lajes aligeiradas com blocos cerâmicos

Aumentam com a dosagem de cimento, a relação água / cimento, a classe do betão, a


proporção de finos e a exposição ao sol e ao vento.

Assentamento Plástico

Estas fendas devem-se ao processo de migração da água para a superfície exterior. Dá-se
uma diminuição do volume de betão que faz com que, por acção da gravidade, se dê um
assentamento do betão fresco ao mesmo tempo que a água exsudada chega à superfície.
Quando esse assentamento é impedido localmente pela armadura ou pela cofragem, dá-se a
fendilhação (Fig. 25).

Aumentam com a plasticidade da amassadura, a relação água/cimento, o teor em finos, a


dosagem de cimento e a diminuição do espaçamento da armadura.

Erros vários de execução

São comuns os seguintes erros origem de fendilhação:

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Fig. 25 [7] - Fendilhação devida ao assentamento plástico

 deslizamento do betão em lanços de escada muito inclinados;


 movimentos da cofragem mal projectada e escorada;
 deslocamento das armaduras durante a compactação do betão (Fig. 26);
 juntas de dilatação precocemente aplicadas;
 cura do betão deficiente;
 execução deficiente da betonagem sobre vazios.

Fig. 26 [7] - Fendilhação em consola devida a deficiente colocação ou escoramento da


armadura

Solidificação precoce da água capilar

Estas fendas devem-se à expansão de cerca de 9% que a água sofre quando passa a gelo
e às baixas resistências mecânicas do betão jovem.

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Fendilhação após a presa do betão

É a que ocorre após o betão ter endurecido, podendo ter as mais variadas origens e cujo
controle depende fundamentalmente da garantia de percentagens suficientes de armadura e da
sua pormenorização cuidada.

Efeitos diferidos

Estas fendas devem-se aos efeitos reológicos do betão. A fendilhação não ocorre
necessariamente no elemento que mais directamente sofre os efeitos diferidos mas em outros
que a ele estejam ligados (Fig. 27). As tensões geradas serão tanto maiores quanto mais rígida
for a estrutura.

Fig. 27 [6] - Fendas provocadas por retracção da viga num pórtico de pilares de pequena
rigidez

A retracção a longo prazo tem como características ser independente do carregamento e


dar-se ao longo do tempo devido à diminuição do volume do betão por perda de água. As fen-
das de retracção não têm sempre o mesmo aspecto dependendo este bastante da rigidez relati-
va dos elementos e dos confinamentos a que cada elemento está sujeito. Exemplos deste tipo
de fendilhação são os provocados por diferentes taxas de armadura superior e inferior no mes-
mo elemento, diferentes taxas de armadura em elementos paralelos, retracção diferencial em
pilares, variação de espessura em muros de suporte ou estruturas do tipo casca, diferentes com-
portamentos dos materiais (recobrimento de betão sobre peças de aço em estruturas mistas),
deficiências na homogeneidade do betão, má dosagem do cimento, emprego de betões sobre-
postos de diferentes características, vibração durante tempo excessivo (provocando segrega-
ção dos inertes), relações água/cimento altas, baixa resistência à tracção do betão, cura defici-

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ente, má granulometria com excesso de inertes grossos, diferenças de humidade entre camadas
superior e inferior, grande perda de água devida a ambientes muito secos, etc. (Fig. 28).

Fig. 28 [6] - Fendas provocadas pela retracção num muro de suporte

Aumentam com a dosagem de cimento, teor em finos, relação água / cimento, juntas de
betonagem, fluência do betão, temperatura e diminuem com a humidade relativa do ambiente
e com a introdução de juntas de retracção e armadura de pele.

Calor de hidratação

Estas fendas devem-se ao carácter de reacção exotérmica da hidratação do cimento


provocando um estado de tensões auto-equilibrado na secção. O gradiente de temperaturas
aumenta com o calor de hidratação e com a diminuição da temperatura exterior (Fig. 29).

Fig. 29 [7] - Distribuição não linear da temperatura devida ao calor de hidratação

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Aumentam com o calor de hidratação e a não existência de juntas de dilatação.

Ciclos gelo-degelo

Estas fendas têm características semelhantes às provocadas pela solidificação da água


capilar antes da presa do betão. Aumentam com o número de ciclos gelo-degelo.

Variações de temperatura

Verifica-se em geral que sempre que a diferença entra a temperatura ambiente e a do


núcleo do betão seja superior a 20 ºC, é de esperar que se produzam fendas de características
semelhantes às provocadas pelo calor de hidratação (Fig. 30).

Fig. 30 [6] - Fendilhação numa laje devida à diminuição da temperatura

Aumentam com a espessura das peças e a não existência de juntas de dilatação.

Corrosão das armaduras

O processo de formação de ferrugem é de natureza expansiva provocando fendilhação e,


numa fase mais adiantada, o próprio desprendimento do betão de recobrimento (Fig. 31).

39
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Fig. 31 [6] - Corrosão das armaduras principais num pilar com consequente desprendimento
do betão de recobrimento

As fendas diminuem com a utilização de um recobrimento suficiente, um betão


compacto e impermeável e um cimento de alto conteúdo em cal.

Ataque dos álcalis

As fendas devem-se ao ataque de inertes contendo sílica por soluções alcalinas dando
origem a um gel alcalino-silicioso e posterior fendilhação (Fig. 20).

Diminuem com a escolha correcta dos inertes e com a execução de um betão compacto e
impermeável.

Carbonatação do betão

O processo da carbonatação ou despassivação do betão origina tensões internas que


podem ser suficientes para dar origem a fendilhação. Este é, no entanto, um fenómeno
perfeitamente secundário sob este ponto de vista.

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Assentamentos diferenciais de apoio

A fendilhação devida a esta causa é tanto mais intensa quanto mais rígida for a estrutura
(vigas-parede e paredes) e maiores as tensões induzidas pelos deslocamentos impostos. Não
existe um exemplo-tipo deste tipo de fendilhação por esta depender em cada caso da estrutura
em questão, da localização das tracções e pontos mais fracos.

Erros de execução ou de projecto

São comuns os seguintes erros:

 concentração numa secção ou em secções muito próximas de amarrações e emendas de


varões;
 má execução das consolas curtas provocando esmagamento nas pontas e consequente
rotação das peças apoiadas (Fig. 32);
 deslocamento das armaduras durante a betonagem;
 deslocamento, má colocação ou inexistência de estribos ou cintas;
 má compactação do betão;
 percentagem excessiva de armadura em determinadas secções provocando fendilhação
longitudinal aos varões;
 não contabilização das forças de desvio;
 mudanças bruscas na geometria da peça.

Fig. 32 [6] - Fendilhação numa consola curta devida à sua execução deficiente

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Cargas de cálculo

As cargas de cálculo fendilham em geral o betão o que não é preocupante. No entanto,


se forem excessivas, darão origem a níveis de fendilhação inaceitáveis. A forma,
posicionamento e extensão das fendas depende do tipo de carga que as provoca. Pode, no
entanto, dizer-se que, de um modo geral, a fendilhação se verifica transversalmente às
armaduras colocadas para absorver as extensões desenvolvidas pelas acções. Ter-se-á então:

 fendas devidas à tracção simples - perpendiculares à direcção do esforço, atravessando a


peça carregada em toda a sua secção e de largura mais ou menos uniforme (Fig. 33);
 fendas devidas à compressão simples - paralelas à direcção do esforço e de traçado
irregular (Fig. 34);
 fendas devidas à flexão simples - quando não existe esforço transverso, são
perpendiculares ao eixo da peça, não atravessam toda a sua secção e aumentam da fibra
neutra para a mais traccionada (Fig. 35); quando existe esforço transverso, as fendas
tendem a inclinar-se na direcção dos apoios aumentando a inclinação à medida que se
aproximam do apoio (Fig. 36);
 fendas devidas à flexão composta com compressão - a primeira fibra a sofrer fissuração
pode ser a mais comprimida (Fig. 37);
 fendas devidas ao esforço transverso - a sua inclinação segue o antifunicular das cargas
actuantes dirigindo-se para os apoios (Fig. 38);

 fendas devidas à torção - inclinadas sensivelmente a 45º aparecendo nas diferentes faces
da peça formando uma linha helicoidal quebrada (Fig. 39);
 fendas devidas à falta de aderência aço-betão - paralelas às armaduras principais junto aos
apoios (Fig. 40).

Fig. 33 [6] - Rotura por tracção simples

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Fig. 34 [6] - Rotura por compressão simples

Fig. 35 [7] - Fendilhação associada à flexão circular

Fig. 36 [6] - Rotura por flexão simples com esforço transverso

Fig. 37 [6] - Fendilhação na zona de compressão associada à flexão composta

Fig. 38 [6] - Fendilhação associada ao esforço transverso

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Fig. 39 [7] - Fendilhação associada à torção

Fig. 40 [6] - Rotura com perda de aderência entre o aço e o betão

Carregamento excessivo acidental

Estas fendas devem-se quer a uma subestimação em projecto das cargas previstas de
cálculo quer a uma utilização indevida da estrutura não prevista no projecto inicial (Fig. 41).

Fig. 41 [6] - Fendilhação de uma laje devida a carga de punçoamento não prevista

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Falta de rigidez das peças

Estas fendas devem-se à deformação excessiva do elemento estrutural por utilização de


aços e betões de alta resistência e elementos pré-fabricados e/ou pré-esforçados sem
continuidade nos apoios.

Quadro-resumo

No Quadro 2 apresenta-se um resumo de classificação das fendas para os tipos


principais.

3.2.2. Desagregação

A desagregação do betão consiste na perda progressiva do carácter aglutinador do


cimento que faz com que os inertes fiquem livres da união que lhes era conferida pela pasta de
cimento. O fenómeno inicia-se à superfície dos elementos do betão com uma mudança na
coloração seguida de um aumento na largura das fendas entrecruzadas que vão surgindo. Em
simultâneo, dá-se um intumescimento das camadas exteriores do cimento devido ao aumento
de volume que este sofre que culmina na desintegração da pasta de cimento (Fig. 42).

Fig. 42 [7] - Desagregação de um provete atacado pelos sulfatos

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Quadro 2 [6][7][10] - Classificação das fendas


TIPO DE CARACTE- IDADE A LOCALI- PRINCIPAL CAUSAS SOLUÇÃO OBSERVAÇÕES
FENDAS RÍSTICAS QUE SE ZAÇÃO CAUSA (com SECUN- em todos
FORMA MAIS excepção da DÁRIAS os casos
COMUM restrição im- reduzir a
posta pelo resto restrição)
da estrutura)
Retrac- “Pele de cro- 30 minu- estradas secagem rápi- velocidade melhorar a podem chegar
ção plás- dilo” ou a tos a 6 e lajes da da superfí-lenta de ex- cura nas a ter largura
tica 45o em rela- horas do betão (e ar-sudação;tem primeiras considerável
ção aos can- madura próxi- po seco e horas (3 a 4 mm)
tos da laje ma da super- ventoso; cu-
fície) ra inadequa-
da; pessoal
inexperiente
Assenta- ao longo das 10 minu- secções es- excessiva condições reduzir a podem chegar
mento armaduras tos a 3 pessas;topo exsudação ambientais exsudação a ter largura
plástico horas de colunas; de secagem (aditivos considerável;
lajes aligeira- rápida; cura incorpora- sob as arma-
das;mudanças inadequada;dores de ar) duras fica
bruscas de pessoal inex-ou voltar a um vazio
geometria periente vibrar
Efeitos largas junto 1/2 dia paredes e excessivo rápido arre- reduzir o
térmicos a juntas de a 3 sema- lajes es- calor de hi- fecimento calor ou uti-
betonagem em nas pessas dratação;gra- lizar protecção ______
muros e depen- dientes de tem- térmica;criar
dentes do estado peratura muito juntas de dilata-
de coacção acentuados ção;colocar arma-
dura de pele
Retrac- semelhantes várias se- paredes e juntas defici- retracção diminuir a re- são em ge-
ção a lon- às de flexão manas ou lajes finas; tes ou ine- excessiva; lação água/ci- ral peque-
go prazo e tracção meses (má-mudanças xistentes cura defici-mento;melho- nas se a
xima entrebruscas de ente;inertesrar a cura;con- peça es-
os 10º e geometria de retracçãosiderar juntas tiver bem
40º meses) excessiva de retracção armada
Corrosão ao longo das mais de 2 pilares e pequeno re- betão de aumentar o re-são inicialmente
das ar- armaduras anos vigas;be- cobrimento; fraca qua-cobrimento;o-pequenas
aumen-
maduras podendo pro- tão pré- excesso de lidade bter um betão tando rapidamen-
duzir descas- fabricado cloreto de compacto e im- com o tempo;
casque do be- cálcio;utiliza- permeável;não podem formar-se
tão ção de água ou utilizar adi- no plano das ar-
inertes salga- tivos anti- maduras e não se-
dos congelantes visíveis do exterior
Ataque entrecruzadas mais de 5 locais inertes reactivos e cimen- não utilizar só ocorre com
dos ál- (“pele de cro- anos húmidos to de alto teor alcalino inertes rea- certos inertes
calis codilo”) poden- ctivos e se houver
do dar origem a humidade; há
descasque loca- exsudação de
lizado (popouts) uma gel

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Quadro 2 [6][7][10] - Classificação das fendas (continuação)


TIPO DE CARACTE- IDADE A LOCALI- PRINCIPAL CAUSAS SOLUÇÃO OBSERVAÇÕES
FENDAS RÍSTICAS QUE SE ZAÇÃO CAUSA (com SECUN- em todos
FORMA MAIS excepção da DÁRIAS os casos
COMUM restrição im- reduzir a
posta pelo resto restrição)
da estrutura)
Cargas dependem em qual- peças mais subestimação uso indevi- limitar o são pequenas se o
de cál- muito do tipo quer al- esforçadas das acções do da estru- uso da es- projecto está bem
culo de carga tura de cálculo tura trutura executado
Ciclo entrecruza- em qual- peças ex- baixa tempe- betão de utilizar adi- são muito
gelo- das podendo quer al- postas em tura associa- fraca tivos incorpo- largas
-degelo dar origem a tura climas frios da à satura- qualidade radores de ar; quando o
descasque ção dos poros obter um betão betão é
capilares compacto e im- jovem
permeável

As causas principais da desagregação do betão são o ataque dos sulfatos, cloretos e


ácidos. Como medidas preventivas para este tipo de fenómeno tem-se as seguintes:

 fabricar um betão muito compacto e impermeável;


 utilizar um cimento adequado ao meio ambiente;
 utilizar materiais impermeáveis que impeçam o contacto do betão com o meio ambiente.

3.2.3. Descasque

Este sintoma traduz-se pela rotura localizada do betão do recobrimento particularmente


em arestas salientes das peças deixando à vista a armadura longitudinal. As causas deste
fenómeno são essencialmente das seguintes naturezas diferentes:

 corrosão das armaduras (Fig. 43);


 existência de cargas excessivas (Fig. 44);
 pormenorização deficiente das armaduras (nós, zonas de ancoragem, topo das coberturas,
esquina das escadas);
 ciclo gelo-degelo (Fig. 45);
 formação de sulfo-aluminatos (Fig. 42);
 existência de inertes altamente reactivos (Fig. 46);
 acções do tipo mecânico em juntas de dilatação mal concebidas.

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Fig. 43 [6] - Descasque do bordo de uma laje provocado pela corrosão adiantada das
armaduras longitudinais

Fig. 44 [6] - Descasque local numa laje provocado por uma carga concentrada excessiva

Fig. 45 [6] - Descasque provocado pelos ciclos gelo-degelo

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Fig. 46 [11] - Descasque provocado pela reacção expansiva de um inerte grosso (popout)

As medidas de índole preventiva para evitar este tipo de fenómeno coincidem em cada
caso com as medidas relativas à fendilhação correspondente já referidas atrás.

3.2.4. Coloração

Na Quadro 3, apresentaram-se de uma forma esquemática as conclusões semi-empíricas


que se podem retirar da análise da coloração superficial de um elemento de betão armado.

Quadro 3 [12] - Coloração superficial do betão e suas causas


Mais clara Mais escura
alta <--------------relação água/cimento--------------> baixa
alto <---------------conteúdo em finos-----------------> baixo
alto <---------conteúdo em cloretos de cálcio----------> baixo
metal, contraplacado <-------------cofragem--------------> madeira
madeira exposta à radiação solar--------->
perda de água pela cofragem----------->
longo <--------------tempo de vibração-----------------> curto
<-----------------revibração
lenta <----------------taxa de secagem------------------> rápida
completa <-------------hidratação do cimento---------------> incompleta
alta <-------------porosidade do betão----------------> baixa
<----------------cura de vapor
introdução de ar------------------>

A coloração superficial do betão pode ainda dar indicações sobre a maior ou menor
presença de leitada, o ataque dos ácidos, sulfatos e álcalis, a existência em excesso de cal livre
(eflorescências), o ataque da poluição, o desenvolvimento de vida animal ou vegetal, a forma
de drenagem nas paredes verticais de betão, a exposição relativa à chuva e ao vento de zonas

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verticais, etc..

3.2.5. Vazios e Zonas Porosas

Os vazios e zonas porosas podem ocorrer junto às superfícies exteriores ou no interior


da massa do betão. No primeiro caso, são detectáveis à vista desarmada (Fig. 47). No segundo
podem-se detectar pelo ruído de percussão de um objecto sólido na parede exterior dos
elementos. As causas possíveis são: deficiente compactação, segregação dos inertes,
granulometria mal escolhida dos mesmos (deficiência de finos), falta de cimento, relação
água/cimento muito baixa (pequena trabalhabilidade) ou muito alta (exsudação), vibração
deficiente ou inexistente, vibração excessiva, efeitos dinâmicos da betonagem, cofragem mal
escorada ou de rigidez insuficiente, etc..

Fig. 47 [11] - Zonas porosas (honeycombing) (à esquerda) e bolhas de pele (bug-holes) (à


direita)

3.2.6. Anomalias estéticas

Do ponto de vista estético (para betão à vista), situações como coloração heterogénea,
zonas porosas e bolhas de pele (Fig. 47), manchas claras (finos) ou escuras (nós da madeira da
cofragem) e sujidades (eflorescências e manchas de ferrugem - Fig. 48) são anomalias a ter em
conta. Também as juntas de betonagem mal executadas (Fig. 49, à esquerda) e a má qualidade
das cofragens, dando origem a uma superfície muito irregular (Fig. 49, à direita) ou a crostas,
são situações inaceitáveis em betão à vista, estando ainda, no primeiro caso, potencialmente
associadas a anomalias de durabilidade.

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Fig. 48 - Eflorescências (à esquerda) e manchas de ferrugem (à direita)

Fig. 49 - Junta de betonagem mal executada (cold joint) (à esquerda) e superfície irregular (à
direita)

3.3. Água

O problema que mais seriamente afecta as armaduras é a sua vulnerabilidade à corrosão.


São sintomas dessa mesma corrosão as manchas de ferrugem de coloração característica na
superfície exterior dos elementos, a fendilhação e o desprendimento do recobrimento de
betão.

Detectada a corrosão, interessa determinar a sua extensão, intensidade e tipo


(generalizada ou localizada). A primeira caracteriza-se pelas pequenas perdas de secção e dá-
se ao longo de um comprimento razoável em cada varão. A segunda pode mesmo não dar
origem a descasque do betão mas corresponde a grandes perdas de secção útil do varão

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podendo mesmo levar à sua rotura (Fig. 50).

Fig. 50 [6] - Armaduras em adiantado estado de corrosão (com perda total de secção)

Em estruturas danificadas pelo fogo, grandes deformações nos varões são em geral um
sintoma de perdas inaceitáveis de resistência pelo que têm de ser substituídos.

3.4. Estruturas

Os sintomas de patologia aqui abordados referem-se à estrutura como um todo e não a


elementos ou materiais em particular. Estão em geral relacionados com estados últimos de
estabilidade ou equilíbrio ou estados limite de utilização.

3.4.1. Deformações

As deformações são dos sintomas mais frequentemente medidos em obra não só pela
facilidade de detecção e interpretação dos resultados como também pela importância das
conclusões que delas se tiram. Medem-se não só deformações verticais como também
horizontais assim como afastamentos da verticalidade. Para tal, recorre-se a níveis de água,
clinómetros, deflectómetros, fios-de-prumo ou raios laser.

As excessivas deformações verticais são normalmente um indicador de falta de rigidez.


Em situações após incêndios indicam ainda perda de propriedades das armaduras e/ou perda
de aderência entre o aço e o betão. As excessivas deformações horizontais indicam execução

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Patologias em construções em betão por Jorge de Brito

defeituosa, assentamentos diferenciais ou funcionamento inadequado ou não existência de


juntas de dilatação. Em situações após sismos podem indicar situações de colapso eminente.

3.4.2. Assentamentos

Os assentamentos de apoio podem ser uniformes ou diferenciais. Os primeiros são de


um modo geral inofensivos no que respeita aos estados limite últimos a não ser que atinjam
valores muito exagerados. Os assentamentos diferenciais, pelo contrário, podem introduzir
esforços muito importantes que podem levar à ruína de toda ou parte da estrutura. Em
qualquer dos casos, os assentamentos revelam problemas de fundações geralmente associados
a uma má concepção destas. Tal como acontece em relação às deformações, deve-se actuar tão
rapidamente quanto possível para que os estragos não se acentuem e possam levar a um estado
de rotura da estrutura.

3.4.3. Movimentos de terras

Os movimentos de terras dão-se em geral de uma forma repentina sucedendo-se a uma


forte chuvada ou aquando da aplicação de sobrecargas muito elevadas no topo de um talude.
Os estragos provocados são normalmente tão elevados que a única solução é a demolição total
ou parcial da estrutura afectada e respectiva reconstrução sempre complementadas com
medidas adequadas de estabilização das terras. Tal como os assentamentos, os movimentos de
terras revelam problemas de concepção inadequada das fundações.

3.4.4. Infraescavações

Este sintoma dá-se em estruturas fundadas em leitos de rios ou na costa marinha em


zonas em que a velocidade de caudal é ou pode ser bastante elevada e está muitas vezes
associado à existência de assentamentos de apoio. Mais uma vez, a causa primeira destes
problemas é uma concepção deficiente. As causas directas são a existência de um caudal
muito volumoso e de rápido escoamento associado a granulometrias com predominância de
finos nos solos na base e nas paredes laterais das fundações.

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3.5. Resumo das Causas - Efeitos

Apresenta-se de seguida um quadro de diagnóstico (Quadro 4) em que são resumidos os


sintomas a que o betão, o aço ou o elemento de betão armado como um todo apresentam em
função das diversas causas de patologia.

Quadro 4 [13] - Quadro de diagnóstico para o betão armado


SINTOMAS NO

_________________________________________
BETÃO AÇO
ELEMENTO
CAUSA CAUSA ESPECÍFICA
_________________________________________
flecha
GERAL excessiva

___________
a) b) c) d) e) f) g) h) i) j)
Tecnologia água contaminada (água salgada, óleos) X X X
do betão substâncias contaminantes no betão (serradura) X X X
aditivos inadequados X
inertes expansivos X X
ataque dos álcalis (inertes reactivos) X X X
mau acabamento das superfícies X X
betão permeável X X X
baixa temperatura durante a betonagem X X
Efeitos do ácido carbónico (vacarias, fábricas de cerveja) X
ambiente sulfito de hidrogénio (esgotos) X
ataque de sulfatos X X
gases de combustão X X
acção das ondas, correntes de água, cavitação X
ciclos de gelo-degelo X
ciclos seco-molhado X X
variações de temperatura (diárias e sazonais) X X
ataque electrolítico X X X
Problemas assentamento X
de assentamento diferencial X X X X X
fundação movimento lateral do solo X X X
movimento de levantamento do solo X X X X
gelo X X X
Erros na problemas na cofragem (falta de resistência,
execução rigidez ou escoramento, descofragem prematura) X X X
fraca resistência do betão (água misturada, erros
na amassadura, etc.) X X X X X
cura inadequada do betão (fraca resistência,
retracção e fluência excessivas) X X X
vibração excessiva (segregação dos inertes) X X X
betonagem excessiva (assentamento plástico
diferencial) X X
escolha errada da armadura X X X

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incorrecta colocação e quantidade da armadura X X X X


carga excessiva durante a construção X X X X

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Quadro 4 [13] - Quadro de diagnóstico para o betão armado (continuação)


SINTOMAS NO

_________________________________________
BETÃO AÇO
ELEMENTO
CAUSA CAUSA ESPECÍFICA
_________________________________________
flecha
GERAL excessiva

___________
a) b) c) d) e) f) g) h) i) j)
Erros de carga subestimada X X X X X
projecto resistência sobrestimada X X X X
rigidez sobrestimada X X X
não consideração de juntas de retracção X X
tratamento inadequado dos efeitos inelásticos X X X
método de análise estrutural incorrecto ou
inapropriado X X X X X
Má porme- erros na passagem de informação para os desenhos X X X X X
norização armadura excessiva X
mudanças bruscas nas dimensões das secções X X X
amarração das armaduras X X
recobrimento inadequado X X
problemas de ancoragem X X X
Tecnologia efeitos da temperatura (armazenagem em local frio;
da mau condicionamento do ar) X
construção revestimento (método de ligação à estrutura,
resistência e durabilidade) X
drenagem inadequada (não consideração de
gradiente de drenagem, drenos inadequados,
omissão de tubos de descarga) X X
superfícies inadequadas sob o ponto de vista da erosão X
Cargas não sismo X X X X X
previstas explosão de gás, rebentamento de bomba X X X X X
choque X X X X X
colapso de edifícios adjacentes X X X X X
cargas de impacto(ondas, forças internas no betão) X X X X X
a) fendas vivas; b) fendas mortas; c) descasque; d) intumescimento; e) descoloração; f) erosão da superfície; g)
corrosão; h) rotura; i) instantânea; j) permanente

Como nota final a este capítulo, não pode deixar de se chamar a atenção para o facto de
a sintomatologia aqui tratada ser fundamentalmente a associada a edifícios e outras
construções correntes de estrutura em betão. Em pontes e outras estruturas especiais, haveria
que referir problemas específicos como o assentamento do solo sob as lajes de transição (Fig.
51), deslizamento ou assentamento dos taludes junto aos encontros (Fig. 52), erosão /
infraescavação das fundações de pilares ou encontros (Fig. 53), anomalias de funcionamento
das juntas de dilatação (Fig. 54), aparelhos de apoio (Fig. 55) e drenos, entre muitos outros.
Algumas destas questões serão objecto de uma descrição mais pormenorizada em documento
a elaborar sobre a classificação das anomalias.

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Fig. 51 - Assentamento do pavimento sobre a laje de transição de uma ponte

Fig. 52 - Deterioração dos perrés no encontro de uma ponte

Fig. 53 - Erosão das fundações do pilar de uma ponte

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Fig. 54 - Desalinhamento vertical de uma junta de dilatação de ponte devido à acção de


batimento do tráfego

Fig. 55 - Deslocamento excessivo de um aparelho de apoio de ponte

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4. CONCLUSÕES

Neste documento, focaram-se os aspectos principais relacionados com as patologias


susceptíveis de ocorrer em construções com estrutura em betão. Assim, descreveram-se
exaustivamente as causas potenciais dos problemas nos elementos e materiais estruturais,
assim como na estrutura como um todo. Posteriormente, analisaram-se os sinais exteriores
desses mesmos problemas, denominados de sintomatologia. De um modo geral, não foram
tratadas as anomalias de carácter não estrutural, por si sós matéria suficiente para todo uma
disciplina neste mestrado.

O conhecimento quer das caudas quer do aspecto visível das anomalias é um passo
essencial para se perceber como surgiram e para se prescrever formas de as colmatar e
eliminar os respectivos efeitos. Estes assuntos serão aprofundados em documentos a elaborar
no âmbito desta disciplina, nomeadamente os referentes aos sistemas de classificação das
anomalias, aos sistemas e tipos de inspecção e à metodologia e técnicas de reparação.

Do presente documento, ressalta a extrema variedade dos fenómenos relacionados com a


patologia de estruturas de betão, a sinergia entre as várias causas de anomalias e o facto de os
sintomas não serem com frequência muito tipificáveis. De tudo isto resulta a grande
dificuldade normalmente associada ao diagnóstico dos problemas aqui descritos.

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5. REFERÊNCIAS

[1] L. Masters e E. Brandt, “Prediction of Service Life of Building Materials and


Components”, Matériaux et Constructions, V. 20, n.º 115, Paris, 1987
[2] J. Almeida Costa e A. Sampaio e Melo, “Dicionário da Língua Portuguesa”, 5ª Edição,
Porto Editora Lda., Porto, 1977
[3] J. Vasconcelos de Paiva et al, “Documento Introdutório do Tema - Patologia da
Construção”, 1º Encontro sobre Conservação e Reabilitação de Edifícios de Habitação,
Lisboa, 1985
[4] Jorge de Brito, “Patologia das Estruturas de Betão - Degradação, Avaliação e Previsão
da Vida Útil”, Tese de Mestrado em Engenharia de Estruturas, Lisboa, 1987
[5] H. Rezai-Jorabi, “Corrosion of Reinforcement in Concrete”, Polytechnic of Central
London, London, 1987
[6] M. Fernandez Cánovàs, “Patología y Terapéutica del Hormigón Armado”, 2ª Edição,
Editorial Dossat, Madrid
[7] CEB Bulletin n.º 166, “Guide to Durable Concrete Structures”, Comité Européen du
Béton, General Task Group n.º 20, Copenhagen, 1985
[8] Jorge de Brito, “Degradação de Estruturas de Betão Armado”, Curso de Qualidade no
Projecto de Estruturas (F.S.E.), Lisboa, 1987
[9] Fernando Branco e Jorge de Brito, “Construction for Durability”, capítulo do livro
“Concrete Bridge Management. From Design to Service Life”, ASCE, a publicar
[10] D. J. Pollock e E. A. Kay, “Concrete Construction in Hot Climates with Particular
Reference to the Middle East”, Handbook of Structural Concrete, Cap. 26, McGraw-Hill
Book Company, London, 1983
[11] J. C. Ropke, “Concrete Problems - Causes and Cures”, McGraw-Hill Book Company,
New York, 1982
[12] H. Rezai-Jorabi, “In-situ Assessment of Concrete Quality”, Polytechnic of Central
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[13] R. F. Warner, “Strengthening, Stiffening and Repair of Concrete Structures”, IABSE
Periodica 2/1981, Zurich, 1981

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