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MÓDULO 3

Como manter solos


saudáveis – PARTE 1
Sumário
Apresentação.................................................................................................................... 5
Introdução......................................................................................................................... 6
Aula 1 | Uso de plantas de cobertura.............................................................................. 7
3.1.1 Plantas de cobertura: o que são e para que servem?..................................... 7

3.1.2 Benefícios das plantas de cobertura................................................................ 9

3.1.3 Desafios do manejo de plantas de cobertura............................................... 12

Aula 2 | O plantio direto................................................................................................. 16


3.2.1 Plantio direto: o que é e para que serve?...................................................... 16

3.2.2 Vantagens do plantio direto........................................................................... 18

3.2.3 Desafios do plantio direto.............................................................................. 20

Referências...................................................................................................................... 24
Editorial
©2022 Ministério da Agricultura, Pecuária e Abastecimento

Todos os direitos reservados. Permitida a reprodução desde que citada a fonte.

Elaboração, distribuição e informações

MINISTÉRIO DA AGRICULTURA, PECUÁRIA E ABASTECIMENTO

Secretaria de Inovação, Desenvolvimento Sustentável e Irrigação (SDI)

Esplanada dos Ministérios, Bloco D CEP: 70043-900, Brasília/DF

https://www.gov.br/agricultura/pt-br

Coordenação Editorial

Coordenação-Geral de Mecanização, Novas Tecnologias e Recursos Genéticos


(CGTG) Departamento de Apoio à Inovação para Agropecuária (DIAGRO)
Embrapa Cerrados

Equipe Técnica

Ministério da Agricultura Pecuária e Abastecimento

Alessandro Cruvinel Fidelis

Valéria Burmeister Martins

Joaquim Dias Nogueira

Paulo Ramon Mocelin

Milena de Almeida Magalhães

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Embrapa

Arminda Moreira de Carvalho (Embrapa Cerrados)

Fabio Bueno dos Reis Junior (Embrapa Cerrados)

Guilherme Montandon Chaer (Embrapa Agrobiologia)

Iêda de Carvalho Mendes (Coordenadora Embrapa Cerrados)

Marcos Aurélio Carolino de Sá (Embrapa Cerrados)

Robélio Leandro Marchão (Embrapa Cerrados)

Projeto gráfico e diagramação:

Avante Brasil Informática e Treinamentos Ltda.

Este produto foi realizado no âmbito do Projeto de Cooperação Técnica BRA/


IICA/16/001 - MODERNIZAÇÃO ESTRATÉGICA - MAPA, em contrato celebrado
entre a AVANTE BRASIL INFORMÁTICA E TREINAMENTOS LTDA. e o INSTITUTO
INTERAMERICANO DE COOPERAÇÃO PARA A AGRICULTURA – IICA.

Os pesquisadores agradecem o auxílio de bolsas e financiamento de projetos


pela Embrapa (Projeto Bioindicadores Fase IV- 22.14.01.026.00), CNPq, FAPDF
(Fundação de Apoio à Pesquisa Científica e Tecnológica do Distrito Federal) e INCT-
Microrganismos Promotores do Crescimento de Plantas Visando à Sustentabilidade
Agrícola e à Responsabilidade Ambiental – MPCPAgro - (CNPq 465133/2014-4,
Fundação Araucária-STI 043/2019, CAPES).

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Apresentação
Solos saudáveis são solos biologicamente ativos, produtivos e resilientes, ou seja,
com melhor performance diante de problemas advindos de estresses abióticos (ex:
falta de chuva) e bióticos (ex: ocorrência de doenças). Além disso, solos saudáveis
produzem plantas mais nutritivas, possuem maior potencial de sequestro de carbono,
maior eficiência no uso de nutrientes e melhor capacidade de biorremediação de
pesticidas. Tudo isso resulta em maior lucratividade tanto no aspecto econômico
quanto no ambiental.

Mas como saber se o solo onde cultivamos nossas lavouras esta saudável ou
doente? O que fazer para manter solos saudáveis?

Para responder essas e outras perguntas, o Ministério da Agricultura Pecuária e


Abastecimento (MAPA), por meio da sua Coordenação de Bioinsumos e Novas
Tecnologias (CORBIO), reuniu um time de pesquisadores da Embrapa Cerrados
e Embrapa Agrobiologia. O curso foi dividido em 5 módulos onde são abordados
temas que vão desde a definição do conceito de saúde solo e como realizar esse
diagnóstico, até as práticas de manejo mais importantes para a manutenção de
solos saudáveis. Um destaque especial é dado para a Tecnologia de Bioanálise de
Solo (BioAS) lançada em julho de 2020 e que consiste na agregação as enzimas
beta-glicosidase a e arilsulfatase nas análises de rotina de solo. Por se tratar de
uma tecnologia inovadora e ainda nos estágios iniciais de adoção, a realização
desse curso tem por objetivo auxiliar os estudantes, produtores rurais, profissionais
de ciências agrárias, assistência técnica pública e privada a utilizar a tecnologia
BioAS como suporte para tomadas de decisão de manejo nas propriedades rurais

Desejamos a todos um excelente curso e que os conhecimentos adquiridos sejam


bastante úteis em suas vidas profissionais.

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Introdução
Olá! Sejam bem-vindos e bem-vindas ao Módulo 3 do curso Saúde do Solo,
Tecnologia BioAs e Sustentabilidade Agrícola.

Neste Módulo, vamos apresentar a primeira parte das técnicas que nos levarão saber
como manter os solos saudáveis através de duas aulas: na Aula 1, descreveremos
as vantagens e as limitações do uso de plantas de cobertura nos sistemas agrícolas;
já na Aula 2, vamos descrever as bases e as vantagens do sistema plantio direto
nos sistemas agrícolas.

Ao concluir este terceiro Módulo, você deverá ser capaz de:

• descrever como as práticas de manejo conservacionistas contribuem para


a manutenção de solos saudáveis
Esperamos que este conteúdo seja bastante proveitoso para todos! Bons estudos
e vamos lá!

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Aula 1 | Uso de plantas de cobertura

3.1.1 Plantas de cobertura: o que são e para que servem?


Plantas de cobertura são espécies cultivadas visando, em última análise, a melhoria
do ambiente de produção. O cultivo dessas plantas deve ser precedido de cuidados
agronômicos e também deve ser considerada a espécie a ser cultivada na sequência.
Como o próprio nome já indica, as plantas de cobertura têm a finalidade de (Cf.
LAMAS, s.d.):

• cobrir o solo;
• proteger o solo contra processos erosivos;
• proteger o solo contra a lixiviação e promover uma ciclagem mais eficaz de
nutrientes.

GLOSSÁRIO:

Lixiviação é o movimento de materiais solúveis na matriz do solo pelo efeito da


água que escorre e causa erosão ou a água que infiltra no solo em direção ao
lençol freático. Quando ocorrem ações físicas, a terra fica permeável de modo
grosseiro, acontecendo esse fenômeno, que também é chamado de lavagem.

Porém, as plantas de cobertura não se limitam a esses fins, já que muitas são
usadas (Cf. Lamas, idem):

• para pastejo;
• para produção de sementes;
• para silagem;
• como feno, e
• como fornecedoras de palha para sistema plantio direto.

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Lamas (ibidem) lembra que tão importante quanto a parte aérea (aquela que fica
acima da superfície do solo) das plantas de cobertura, são as suas raízes: “Os efeitos
das raízes na produtividade agrícola, ainda são pouco reconhecidos, embora seja
sabido sobre sua importância na construção do perfil do solo”, leciona.

PALAVRA DE ESPECIALISTA

Algumas espécies de plantas de cobertura como o milheto e as braquiárias


possuem a capacidade de reciclar, das camadas mais profundas do solo,
nutrientes essenciais para o crescimento e desenvolvimento das plantas que
serão cultivadas em sucessão e, no caso da maioria das leguminosas (soja,
feijão etc.), como fixadoras do nitrogênio atmosférico. Estas características
das plantas de cobertura podem contribuir para reduzir custos de produção,
especialmente com fertilizantes químicos, que além de impactarem o custo de
produção das culturas cultivadas para produção de frutas, pastagens, grãos,
fibras e energia, tratam-se de recursos naturais não renováveis.

As plantas de cobertura quando adequadamente utilizadas se constituem


em estratégia para melhoria dos atributos físicos, químicos e biológicos do
solo. Além do mais, são essenciais para incrementos de matéria orgânica do
solo, que é essencial na dinâmica desses atributos supracitados, principal
componente da fertilidade do solo. Isso ganha mais importância em solos
tropicais e intensamente intemperizados.

A capacidade produtiva do solo é altamente dependente do teor e qualidade


da matéria orgânica. Em geral, em área de alta produtividade são observados
elevados teores de matéria orgânica. A matéria orgânica é importante para
a maior retenção de água no solo, pela disponibilidade de nutrientes para
as plantas e agregação do solo. É o principal responsável pela retenção de
nutrientes por meio da capacidade de troca catiônica (CTC) em solos tropicais,
como os Latossolos.

(Fonte: LAMAS, op. cit., idem – adaptado – negritos e itálico nossos)

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GLOSSÁRIO:

Intemperizados: que sofreram com os efeitos de intempéries, ou seja, mau


tempo e/ou variações extremas das condições climáticas (temperatura, chuva,
vento, umidade, seca etc.).

3.1.2 Benefícios das plantas de cobertura


Além do que observamos até aqui, as plantas de cobertura (Cf. LAMAS, ibid.):

• contribuem para a melhoria dos atributos físicos, químicos e biológicos do


solo;
• auxiliam no controle de plantas daninhas, por possuírem efeito:

a) alopático: as plantas de cobertura interferem na germinação,


emergência e no crescimento das plantas daninhas, quer por exsudados
eliminados pelas suas raízes ou por substâncias liberadas quando da
decomposição da parte aérea, impedindo ou dificultando a emergência
e/ou germinação das sementes das plantas daninhas;

b) de cobertura do solo: a cobertura proporcionada pelas plantas de


cobertura se constitui numa barreira física, que limita a presença de
luz e impede a emergência das plantas daninhas por competição,
inclusive aquelas de difícil controle como é o caso da Buva. A Brachiaria
ruziziensis, é exemplo de uma espécie de planta de cobertura muito
eficiente no controle de plantas daninhas.

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GLOSSÁRIO:

Buva: Conyza bonariensis, conhecida popularmente como buva, voadeira,


rabo de foguete ou arranha-gato, é uma planta invasora encontrada com muita
frequência nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. É uma planta anual que se
reproduz por sementes que germinam no outono e inverno, com encerramento
do ciclo no verão, caracterizando-se assim como uma planta daninha de
inverno e verão. No Rio Grande do Sul, a buva apresenta-se como importante
planta daninha infestante de lavouras de trigo, soja e milho. A buva produz
grande quantidade de sementes, que apresentam características e estruturas
que conferem fácil dispersão, caracterizando a espécie como agressiva.

Brachiaria ruziziensis ou grama do Congo: é uma cultura forrageira que é


cultivada nos trópicos úmidos.

• de nematoides: as plantas de cobertura também auxiliam no manejo de


nematoides, um grave entrave da agricultura moderna. Crotalaria spectabilis
e Crotalaria ochroleuca, são exemplos de plantas de cobertura que auxiliam
no manejo dos principais nematoides que causam dano econômico às
espécies cultivadas para produção de grãos e fibras.

GLOSSÁRIO:

Crotalaria spectabilis: é uma leguminosa anual de primavera-verão cuja


principal característica é ser má hospedeira de nematoides.

Cotalaria ochroleuca: É uma leguminosa anual de primavera-verão de ciclo


relativamente longo. É agressiva e rústica, resistente às condições adversas
de clima e solo por causa das raízes profundas que rompem as camadas
adensadas do solo.

Nematoides: nematoda, nematelmintos, ou ainda nematelmintas, são um filo


de animais cilíndricos espetacularmente alongados, responsáveis por grandes
prejuízos de produtividade agrícola.

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• auxiliam no controle de doenças e de pragas, beneficiando diretamente as
culturas sucessoras: as braquiárias, são excelentes no manejo do mofo
branco, doença que está se tornando cada vez mais grave em várias regiões,
causando danos às culturas de feijão e algodão. Crotalaria spectabilis é
exemplo de uma planta de cobertura que auxilia no manejo do percevejo
castanho.

GLOSSÁRIO:

Mofo branco: O mofo-branco, ou podridão-de-Sclerotinia, é um doença causada


pelo fungo Sclerotinia sclerotiorum, normalmente atacando hastes e ramos,
causando amarelecimento, murcha, secamento de folhas, podendo inclusive
levar à morte da planta.

Percevejo castanho: as ninfas e os adultos de Scaptocoris castanea se ali-


mentam nas raízes e sugam a seiva. O ataque severo causa o definhamento e
morte da planta. Os sintomas de ataques variam com a intensidade e época do
ataque e muitas vezes são confundidos com deficiência nutricional ou doença
da planta. O hábito subterrâneo e a ocorrência esporádica desses animais di-
ficultam o controle. O controle biológico com o fungo Metarhizium anisopliae
apresenta bons resultados.

Quadro 1 – Oportunidades no uso de plantas de cobertura

Proteção adicional contra erosão do solo.

Proporciona alimento e proteção para organismos (micro, meso e macrobiota) do solo.

Proporção adequada de Carbono e Nitrogênio na palha (relação C/N) e teor de lignina adequados
para manter cobertura durante período seco e incrementar estoques de Carbono no solo.

Aumento do aporte de nitrogênio no agroecossistema, diminuindo a necessidade de fertilizantes


nitrogenados.

Efeito alelopático e competição sobre as plantas daninhas.

Aumento da matéria orgânica no solo, diminuição do encrostamento superficial e compactação


dos solos pela ação de raízes.

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Aumento da infiltração e retenção de água e da aeração pelo aumento da porosidade do solo
por meio do sistema radicular em decomposição.

Aumenta proteção contra raios solares, diminuindo calor no solo, a amplitude térmica e
oxidação da matéria orgânica do solo, consequentemente, melhorando a atividade microbiana
do solo.

Pode prover além da cobertura viva e morta, alimento para animais e humanos, permitindo
a integração lavoura-pecuária-floresta de atividades tal como o iLPF (Integração Lavoura-
Pecuária-Floresta).
Fonte: PASSOS & MARCOLAN (2013), adaptado.

3.1.3 Desafios do manejo de plantas de cobertura


A espécie de planta de cobertura a ser cultivada deve apresentar algumas
características (Cf. LAMAS, ibid.):
• ser de fácil estabelecimento;
• apresentar crescimento rápido;
• proporcionar boa cobertura do solo;
• não ser hospedeira preferencial de doenças, pragas e nematoides;
• permitir a colheita de grãos ou o pastejo animal no período de entressafra;
• apresentar sistema radicular vigoroso e profundo, e
• produzir matéria seca em quantidade e qualidade suficiente para a
semeadura direta.

Uma espécie de planta de cobertura que se adeque a toda e qualquer condição


ecológica, infelizmente, NÃO EXISTE.

Para cada ambiente, a depender da cultura sucessora, será necessário um conjunto


de espécies (ou mix de plantas) mais adequadas. Com base nos resultados do
experimento realizado por ARAÚJO et al. (2019, p. 76) com relação ao uso de plantas
de cobertura e microrganismos benéficos no desenvolvimento da soja, constatou-
se que não houve interação entre as plantas de cobertura e esses microrganismos;
além disso, os tratamentos com e sem aplicação de microrganismos não diferiram

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entre si. No experimento realizado, as misturas milheto + U. ruziziensis e milheto
+ U. ruziziensis + feijão-guandu proporcionaram as maiores produtividades
de grãos de soja (2.265 kg ha-1 e 2.440 kg ha-1, respectivamente), diferindo dos
demais tratamentos. As menores produtividades foram observadas na mistura
milheto + crotalárias (1.784 kg ha-1), no pousio (1.980 kg ha-1) e no mix de milheto
+ feijão-guandu (1.988 kg ha-1). Os tratamentos milheto + trigo mourisco, milheto
+ feijão-guandu e pousio não diferiram entre si, com produtividades de 2.014 kg
ha-1, 1.988 kg ha-1 e 1.980 kg ha-1, respectivamente. Esse estudo mostrou que a
produtividade da soja é beneficiada quando cultivada após as gramíneas milheto +
U. ruziziensis ou a mistura delas com o feijão-guandu, provavelmente devido aos
benefícios promovidos pela alternância de plantas de diferentes famílias na área de
cultivo. Os pesquisadores concluíram que o uso de microrganismos benéficos não
proporcionou incrementos significativos na produtividade da soja e que as misturas
milheto + U. ruziziensis e milheto + U. ruziziensis + feijão-guandu proporcionaram
as maiores produtividades de grãos de soja.

O uso de plantas de cobertura no sistema plantio direto é uma opção viável para
incrementos com sustentabilidade na produtividade da soja. Dados obtidos
por Carvalho et al., 2022 (informação pessoal) corresponderam a uma média
de produtividade da soja em rotação ao milho superior (71 sacas ha-1) à média
nacional (59 sacas ha-1), com uma tendência de maior rendimento quando cultivada
em sucessão ao feijão-bravo-do-ceará (76 sacas ha-1) seguido da sucessão com
o trigo (74 sacas ha-1). O sorgo cultivado em sucessão, entretanto, suprimiu a
produtividade da soja (65 sacas ha-1) nesse estudo.

Realizar um diagnóstico adequado das limitações atuais do sistema de produção


específico em que se fará o uso das plantas de cobertura também é uma fundamental
estratégia que apoia a escolha das espécies com maior e melhor potencial de
benefícios àquele sistema específico.

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PALAVRA DE ESPECIALISTA
Como toda espécie vegetal, as utilizadas como plantas de cobertura exigem
condições ambientais adequadas para seu crescimento e desenvolvimento.
Por exemplo, quando cultivada fora da época indicada, por ser sensível a
duração do fotoperíodo, a Crotalaria spectabilis, tem o seu crescimento
vegetativo reduzido, iniciando o período de formação de sementes quando as
plantas ainda estão com altura reduzida, diminuindo a produção de matéria
seca e aumentando as condições favoráveis à incidência de mofo-branco.
A tomada de decisão sobre o cultivo de uma espécie como planta de cobertura
deve ser precedida de um profundo conhecimento acerca da espécie em
questão para evitar qualquer tipo de frustração em termos de produção e
benefícios e até mesmo a disseminação de pragas, doenças e nematoides,
além da competição por nutrientes.
O cultivo de espécies de plantas de cobertura pode ser feito utilizando-se uma
única espécie, duas ou mais espécies semeadas ao mesmo tempo na mesma
área. A semeadura simultânea de mais de uma espécie sobre o ponto de vista
de melhoria da biodiversidade do sistema é inquestionável. No entanto, tudo irá
depender do propósito que se tem com o cultivo da planta de cobertura e das
espécies consorciadas, e principalmente, do sistema de produção, priorizando
sempre a cultura principal, que é o interesse prioritário do produtor rural.
É fato que o uso de plantas de cobertura tem uma certa “restrição” de boa
parte do setor produtivo, já que não resulta em retorno financeiro direto e
imediato. No entanto, os reflexos e entraves dos sistemas de produção atuais,
baseados em sucessão de cultivos (ex.: soja/milho), indicam de forma clara
o papel dessas espécies na diversificação e viabilidade dos sistemas de
produção, inclusive com retorno econômico e ambiental já comprovados.
(Fonte: LAMAS, op. cit., idem)

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Quadro 2 – Desafios no uso de plantas de cobertura

Aumento da produção de biomassa pode representar custos adicionais e dificuldade de manejo.

Pode representar como fonte de alimento e hospedeira alternativa de insetos pragas e doenças,
aumentando a população desses nos plantios subsequentes.

Alta relação C/N pode proporcionar deficiências temporárias de nitrogênio e outros nutrientes
pela mobilização de nutrientes, na cultura principal.

Liberação do nitrogênio deve ocorrer de forma sincronizada com a necessidade das culturas
de verão.

Uso de sementes de qualidade sem contaminação para não disseminação de plantas daninhas.

Efeito alelopático sobre as culturas principais de safra/verão.

Incremento de macroporos pode proporcionar maior lixiviação de nitratos, agroquímicos pela


percolação da água do solo para lençóis freáticos ou zonas fora do alcance das raízes das
plantas.

Criar microclima propício para certos tipos de microrganismos patógenos.

Exige maior capacidade gerencial e administrativa do produtor rural ao introduzir novas


atividades no calendário agrícola.
Fonte: PASSOS & MARCOLAN (2013), adaptado.

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Aula 2 | O plantio direto

3.2.1 Plantio direto: o que é e para que serve?


O Sistema de Plantio Direto (SPD) é uma forma de manejo do solo permeado ou
constituído por técnicas recomendadas para o aumento da produtividade, garantindo
a conservação ou o melhoramento continuado do ambiente de cultivo. Dentre as
técnicas do SPD destacam-se:

• Ausência ou mínimo revolvimento do solo;


• Cobertura do solo com palhada;
• Rotação de culturas.

O SPD é utilizado no Brasil desde a década de 1970 com excelentes resultados.

Diferentemente do SPD, no sistema convencional de cultivo é realizado o frequente


revolvimento do solo. O solo fica exposto ao sol, ao vento e à chuva até o estabe-
lecimento da cultura que será plantada. Observe esta comparação entre ambos os
sistemas:

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17
(Fonte: https://boaspraticasagronomicas.com.br/boas-praticas/plantio-direto/ Acesso em: 15 jun 2022.)

3.2.2 Vantagens do plantio direto


A adoção do sistema plantio direto traz benefícios agrícolas, econômicos e
ambientais para a sociedade como um todo: produção sustentável de grãos,
geração de emprego e renda. Veja alguns benefícios do sistema, segundo o Luiz
Carlos Hernani, da Embrapa Solos (EMBRAPA, 2021):

• Diminui ocorrência de erosão, aumentando a conservação do solo e da


água;
• Melhor germinação de sementes e melhor emergência de plantas;
• Há otimização do uso fertilizantes e corretivos;
• Mantém temperatura ideal do solo;
• Melhora a qualidade do solo;
• Traz aumento de matéria orgânica e de carbono do solo;
• Solo fica mais fértil com a reciclagem de nutrientes;
• Aumenta a atividade biológica e da estabilidade da estrutura do solo;

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• O desempenho animal é bastante melhorado com sistemas integrados em
SPD;
• Reduz a compactação do solo;
• Auxilia na infiltração da água e reposição da água subterrânea.
• Reduz custos de produção e melhor relação benefício/custo;
• Possibilita a Integração Lavoura-Pecuária-Floresta (ILPF);
• Pode ser adotado em pequenas, médias e grandes propriedades rurais;
• Traz economia de combustíveis, tempo e mão de obra;
• Promove aumento de produtividade e renda;
• Está entre os sistemas que promovem a redução de emissão de CO2 e de
outros Gases de Efeito Estufa.

O SPD foi incluído no Plano Setorial de Mitigação e de Adaptação às Mudanças


Climáticas. O objetivo foi a Consolidação de uma Economia de Baixa Emissão de
Carbono na Agricultura (Plano ABC) como parte do compromisso internacional
assumido pelo Brasil, em 2009, de reduzir suas emissões de Gases de Efeito Estufa
(GEE) entre 36,1% e 38,9% até 2020.

PASSOS & MARCOLAN (2013) ressaltam que a escolha adequada de plantas


de cobertura no SPD pode proporcionar retornos financeiros positivos aos
produtores. A Figura 1 abaixo expõe dados de experimento que avaliou
diferentes doses de nitrogênio combinadas com tipos de plantas de cobertura
diversos e pousio (ausência de plantas de cobertura) para a cultura do feijoeiro
no município de Selvíria, no Mato Grosso do Sul, com médias de duas safras
sem utilização de nitrogênio:

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Figura 1. Incrementos do lucro operacional pela utilização de plantas de cobertura em sucessão ao
feijoeiro. | Fonte: GERLACH, G. A. X. et al. (2013).

3.2.3 Desafios do plantio direto


O sistema de plantio direto é essencial para manter as características físicas,
químicas e biológicas, garantindo a sustentabilidade do solo. O SPD, a agricultura de
precisão e as modernas e mais eficientes técnicas de irrigação e biotecnologia são
exemplos de práticas e tecnologias usadas no campo as quais oferecem soluções
para alguns dos desafios atuais e futuros da agricultura. As práticas viabilizam a
exploração de agrossistemas produtivos, com uso reduzido de defensivos agrícolas
e as tecnologias contribuem para manter e até aumentar a produção, sem promover
o avanço do cultivo para novas áreas.

PALAVRA DE ESPECIALISTA

No Brasil, o maior e mais extraordinário desafio a ser enfrentado pelo Plantio


Direto é sua conversão em Sistema Plantio Direto. Contudo, esta conversão
depende da viabilização econômica da diversificação de culturas, em sistemas
de produção exclusivamente produtores de grãos. A diversificação de culturas
é a regra primordial da agricultura conservacionista, capaz de converter
Plantio Direto em Sistema Plantio Direto, pois é ela que viabiliza o abandono
permanente do preparo de solo.

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Na ausência do preparo do solo, com aração e gradagem, são as raízes
das plantas as responsáveis pelo condicionamento do solo para a próxima
semeadura. Portanto, a adoção do Sistema Plantio Direto requer diversificação
de culturas, com inclusão de espécies vegetais de abundante sistema radicular,
capaz de condicionar o solo para a safra seguinte. Neste sentido, culturas
como cereais de inverno e de verão se destacam pelo farto sistema radicular
que apresentam.

[…] os sistemas de produção exclusivamente produtores de grãos, encontram


dificuldade econômica para se diversificarem, sendo, a rigor, monocultivos.
Esta condição induz à adoção do Plantio Direto em detrimento do Sistema
Plantio Direto.

[…] Neste cenário, predomina o monocultivo de soja, a qual é desprovida de


sistema radicular com qualidade e quantidade hábeis para manter o solo
permanentemente sem preparo e prevenir, com eficiência, a degradação
biológica e física do solo.

A adoção da diversificação de culturas em sistemas de produção exclusiva-


mente produtores de grãos não depende apenas da decisão do produtor rural,
à exceção de poucos. Depende de conjuntura política, econômica e ambiental,
orientada à criação e ao desenvolvimento de novos mercados, com liquidez à
comercialização de grãos. Neste sentido, a agricultura brasileira, propagada
como de magnitude que evidencia o País como potência agrícola mundial,
carece de modernização da logística de pertinência e fundamentalmente de
incentivos à expansão e à diversificação da agroindústria, preferencialmente
inserida no âmbito do cooperativismo agrícola. No Brasil (…), há tecnologias
prontas para o cultivo de inúmeras culturas, com potencial para diversificar
os atuais sistemas de produção, puramente produtores de grãos. Entre es-
tas culturas, há commodities com demandas nos mercados nacional e in-
ternacional, porém com problemas internos de comercialização e liquidez.

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O sorgo granífero e os cereais de inverno são exemplos que ilustram este
cenário. Pode-se afirmar que o desenvolvimento, a inovação, a expansão e
a diversificação atual da agroindústria nacional, que constitui mecanismo
para criar e expandir mercados e oferecer liquidez à comercialização, não
corresponde com a capacidade, a competência, a aptidão e o potencial da
agricultura em desenvolvimento no País.

Assim, esse majestoso desafio a ser enfrentado pelo Sistema Plantio Direto
em sistemas de produção exclusivamente produtores de grãos, requer
instrumentos de cunho político e ambiental que viabilizem economicamente
a diversificação de culturas. Destaca-se, entretanto que a diversificação de
culturas nos sistemas integrados de produção, como integração lavoura/
pecuária, é assegurada pelo cultivo de espécies forrageiras e pastagens, cuja
economicidade é satisfeita pelos mercados de carne e leite, que se apresentam
em expansão e com liquidez garantida.
Fonte: DENARDIN & ANTUNES (Disponível em: https://www.embrapa.br/busca-de-noticias/-/
noticia/9697114/artigo---desafio-do-plantio-direto Acesso em: 15 jun 2022 - adaptado)

Segundo MOTTA & ASMUS (EMBRAPA, 2021), entre os fatores limitadores da


utilização do SPD o mais importante é o desconhecimento do conjunto de técnicas
que compõem este sistema. Isso gera “insuficiente motivação e entusiasmo, medo
de mudar e insegurança na tomada de decisão. O conhecimento e a experiência são
condições necessárias ao sucesso deste sistema”, conforme os estudiosos.

Já em relação às necessidades principais, os mesmos autores apontam que é ne-


cessário considerar também “a presença contínua da assistência técnica, a eficiên-
cia dos equipamentos (semeadora, roçadora, pulverizador, entre outros), o plane-
jamento do estabelecimento rural com a distribuição das formas de exploração de
acordo com a aptidão agrícola de cada gleba e a adequação necessária de toda a
propriedade”.

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Quadro 3 - Limitadores do Sistema Plantio Direto

dependência de herbicidas

ausência de rotação de culturas

ausência de consorciação de culturas

ausência de adequado planejamento que permita que operações como colher-semear ocorram
simultaneamente

aplicação preventiva de herbicidas

ausência ou não inserção no sistema de produção de plantas melhoradoras de múltiplas


funções (competem por luz, água e nutrientes e produzem substâncias alelopáticas, inibindo a
ocorrência de plantas daninhas, além de gerarem produtos comercializáveis alternativos)

máquinas e equipamentos ainda pouco eficientes e pouco funcionais para o Sistema

aparição de fitonematoides ainda frequentes por falta do pleno domínio do sistema


Fonte: Embrapa (2021)

Portanto, consoante o estudo de Motta e Asmus (op. cit., idem), “o manejo incorreto
(ausência de rotação e consorciação de culturas) tem sido o causador da maioria
das limitações e problemas associados ao Plantio Direto e não ao SPD”. E concluem
ressaltando que “grande parte desses entraves, podem ser solucionados após a
devida avaliação técnica especializada”.

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Referências
ANDRADE, C. M. S. de et al . Técnicas de plantio direto. In: SIMPÓSIO DE PECUÁRIA
INTEGRADA - Recuperação de pastagens: anais, 2., 2016, Sinop. Cuiabá: Fundação Uniselva,
2016. p. 54-92.

ARAGÃO, J. I. de et al . Dinâmica da decomposição de plantas de cobertura do solo.


In: JORNADA CIENTÍFICA EMBRAPA MANDIOCA E FRUTICULTURA – Pesquisa: despertando
mentes para a inovação e transformando o futuro: anais, 8., 2014, Cruz das Almas, BA.:
Embrapa Mandioca e Fruticultura, 2014.

ARAÚJO, F. C. de et al . Plantas de cobertura e microrganismos benéficos afetando o


desenvolvimento da soja. In: SEMINÁRIO JOVENS TALENTOS, 13., 2019, Santo Antônio de
Goiás: Embrapa Arroz e Feijão, 2019. p. 76

BOAS PRÁTICAS AGRONÔMICAS. Plantio Direto: prática revolucionária da agricultura


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Este produto foi realizado no âmbito do Projeto de Cooperação Técnica BRA/IICA/16/001 - MODERNIZAÇÃO ESTRATÉGICA - MAPA, em contrato
celebrado entre a AVANTE BRASIL INFORMÁTICA E TREINAMENTOS LTDA. e o INSTITUTO INTERAMERICANO DE COOPERAÇÃO PARA A AGRICULTURA
– IICA.

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