Você está na página 1de 11
Scanned with CamScanner g0BRE 0 PROCESSO DE ESCREVE ORDERLANDS/LA FRONTERA : GENESE Eu estava em Vermont, era inverno, e neva) era muito branca. As pessoas eram init nee Acontecia de eu entrar numa loja e ficare! a rando porque nao tem tanta gente de cor a mnt Acho que porque 0 povo vermontés esta seat dat aver é -( a m preto-e-branco, nado davam muito conta de sacar essa mestiza no entre. Mais tarde, na primavera, enquanto eu caminhava pelas ruas de Montpelier, eu vi sacos coloridos brilhantes - sacos de lixo cheios de folhas caidas que haviam sido 1, Este ensaio, nunca antes publicado, comegou como uma palestra que Anzaldia deu na turma de Dorrinne Kondos, na Pomiono College em 6 de fevereiro de 1991. Cinco anos depois, ela revisoua palestra ea transcreveu para publicar. Devido a suas recorrentes questées de satide, bem como varios prazos de textos @ cunees ela arquivou esse ensaio para pul jesmo que ess blicagao futura. Mi Pe Anzaldua, texto ndo seja to burilado quan’o > sterior de re i ‘Borderlands/La Frontera, i de base {til sobre Bora’ iF se inclui rrgumel ane : escrita. Este ensaio pém inclut va aes ee if sobre sev poema a porderlands/La Frontera. est incluido em 151 Scanned with CamScanner recolhidas - em frente aos jardins das pes... muito bem presos, os nés muito bem da dos . OSs tGo arrumado e em ordem. Quase todas as ai ne andares, de madeira clara. Eu sentia muita ii, ; _ Texas. Nosudeste, chicanos viver.em casas & |-o queeu-chamo de arquitetura chicana, Cary estacionados nos jardins ou e tear mel cate dessaarguitetur. olum grandeconasecmee ! ore eno sudeste, e viver em New England. Por cans, d ela saudade, eu comecei a escrever Borderlands. vocé fica mais perto de casa quando esta mais longe. Como escritora, posso escrever sobre os luge. res depois de ter partido, mais do que quando ainds estava ld. Isso € ainda mais verdade quando escrevo sobre meu lar. Esses sentimentos de ser uma forasteire, ) umaalienigena, geraram em mim o impeto de explicar coisas a mim mesma € a outras pessoas. Comunicar )sentimentos frequentemente me faz sentir como uma chaleira deixando o vapor escapat. Ao mesmo tempo em que escrever e falar funcionam como valvula de escape, também sao acées politicas que brotam do impulso de subverter, resistir, educar € promover mudances ciando (meu Entdo deixei o racismo que estava viven' al era lecionar escrita criativa e estudos de™ eres no programa app? da Universidade de vermont) 2. Adult Dev iret para Pes, elopment Program, ou Programa de Desen¥® me 'Soas Adultas. [N.T.] Scanned with CamScanner — ser combustivel da minha escrita. Eu sentia raiva da homofobia e do preconceito de classe. Eu era a tinica mulher de cor, a tnica mulher da classe trabalhadora, atinica lésbica, ea unica professora que lecionava de forma nao académica. Naquela terra nevada eu me sentia como uma pessoa de outro planeta deve se sentir. Obviamente, alguns dos poemas em Borderlands/ La Frontera vieram num periodo anterior. Quando es- tava trabalhando num manus¢rito, eu olhava todos os meus arquivos para achar material adicional: Enquanto pesquisava por meus arquivos, eu diria “Olha, esse. texto € sobre o que significa crescer bilingue; pode caber na secdo sobre linguagem e identidade. Esse aqui € um poema sobre a opressio que mulheres sofrem, | esse outro sobre violacao dos corpos das mulheres”, Eu conecto a violacdo dos corpos das mulheres a vio- lacdo da terra, e ent&o a especifica apropriacdo de terras indigenas e chicanas no sudeste -e decido que ambos poemas podem integrar a secdo sobre perder Oterritério. Eu desejava difundir e também produzir conhe- cimento sobre chicanas/os e a fronteira para outras chicanas/os, pessoas de cor, e brancos como esses de N Jew England dentre os quais eu tinha vivido. Era para i as pessoas que nao faziam ideia do que significava se uma chicana de sétima geragao que nba crescido no i indo eu vivi no Brooklyn Texas perto da fronteire, OW ith Bend), tanto (ou em Boston, ou New Haven, ou Sout , 6 Scanned with CamScanner pessoas brancas quanto latinas frequ perguntavam: “Ei, quando vocé a Te ou “Vocé é latinoamericana tipo... da amen tm ou Central?”. Eu ouvi essas perguntas de een do Sy se achavam antenadas as comunidades e 2 te latinas, mas nao sabiam distinguir entre pe re to-riquenhas, cubanas, chicanas, ou mexicanas, a pequena cidade, Montpelier, Vermont, as pessoas nem sabiam que chicanos existiam. PROPOSITO Como eu disse antes, eu queria que Borderlands nao apenas difundisse, mas também produzisse conhe- cimento. Durante todo o tempo de minha educacao escolar quem produzia conhecimento eram as pessoas brancas de classe média e alta - aquelas que tinham nos estabelecimentos cientifi cos, eno mundo editorial e artistico. Eles produzem as teoriase os livros que liamos. Eles produzem os valores inconscientes, visées e assuncdes sobre a realidade, obre a cultura, sobre tudo. Nos internalizamos, nos ssimilamos essas teorias. Entdo tive um problema porque eu qué! obras: artisticas, produzir conhecimento, mas eu er nde gare aed uma mulher de uma ial que é lésbica. Como vocé ultrapass@ tod A a ee obstdculos? E eu queria fazé-lo do meu Ke. usando minha abordagem, minha linguage™. 154 poder nas universidades, ria produzit Scanned with CamScanner Oe ae a Eundo queria fazer o que Audre Lorde descreve como uso das ferramentas do sinh; eu ndo queria imitar o_ ©) sinhé. Ei queria escrever num estilo mestiza, no meu ) “proprio vern culo, € ainda usar os conhecimentos e historias das culturas brancas, de outras culturas ét. nicas. Eu queria ser capaz de lidar comcertas teorias, ser capaz de filosofar. Eu queria meu bolo e queria ) comé-lotambém. (indo ~Amaioria das pessoas nao consegue se safar fa°\ zendo tudo isso - pode ser que falte a elas a fé oua teimosia ou seus trabalhos estao sujeitos a avaliacdio ou indicagao ou elas esto ameacadas de outras ma- neiras. Pode ser que nao haja mercado para sua escrita, ou se hé mercado pode ser que elas nao consigam ter acesso a uma porta de entrada. Arte e literatura sao exclusividade. Se vocé é um/a docente de cor, espera-se que vocé haja como um professor branco. (Por exemplo, tevistas e periédicos frequentemente tém diretrizes bem especificas.) | | | Meus textos (e eu) fomos repetidamente rejeitados pelo metié masculino chicano, entdo decidi continuar com as editoras feministas porque elas haviam me apoiado. Depois de lecionar no sistema ptiblico de ensino no Texas, eu decidi (anos antes) que eu no seria uma académica profissional. Mas porque eu amava tanto lecionar (a parte que eu odiava era 0 aspecto administrativo disso), decidi que iria lecionar por pe- todos curtos (dar aula um més aqui, um semestre 14), 155, Scanned with CamScanner eassim sustentar minha principal Vocacao~ escrey Sendo freelancer, eu continuaria sendo minha arog ; chefe. Apesar de haver inconvenientes nessa formade ganhar o pao, ela me permite priorizar a escrita, Como uma sapatao de cor, eu tenho que artiscar muito em minhas aulas, palestras e falas, ena minha escrita. Eu pressiono os limites do que é aceitavel e tradicional nessas trés linhas de trabalho. Borderlands podia ter dado de cara no chao. E acessivel para de- terminados piiblicos mas inacessivel para outros, E acessivel ou inacessivel dependendo de q 1to trabalho vocé quer fazer ao lé-lo. HA muitas lacunas entre as passagens - seu estilo é elfptico e espiral. Eu comego com um tema, figura ou simbolo, e depois aquele simbolo vira um mote e talvez seja mencionado num capitulo préximo e entao aprofundado em outro capitulo; no capitulo final vocé volta de novo ao inicio, eo simbolo eventualmente termina reaparecendo em algum dos poemas. Quem lé tem que preencher muito as lacunas. Outra coisa que é dificil ou facil - de novo, depende [ se quem 1é sao chicanas/os que podem ler em espa- \ nhol, ou pessoas de cor e brancas que nao podem -é } a mudanga cédigo entre idiomas. Nao é confortavel se vocé nao sabe espanhol ou espanhol chicano; mesmo a “ abe as vezes se sentem desconforta- espanhol cue eee - Nao apenas faco mudanca de cédigo 156 Scanned with CamScanner idiomdtica, mas sacudo a/o leitor/a por af com mudanca de cédigo nos géneros textuais: misturando géneros, encruzilhando géneros de poesia a ensaio a narrativa aum pouquinho de andlise a teoria. A leitora tem que juntar tudo no final. Espero que ao ler o livro inteiro os poemas se integrem aos ensaios, assim o livro vai fazer sentido. ; Borderlands também é acessivel porque eu narro certos acontecimentos histéricos especificos - meu tio que foi enviado a outra margem, detido por la migra quando nao tinha documentos, minhas experiéncias como uma campesina. Eu te oferego contextos as teorias que delineio. As pessoas podem se alinhar especificamente a esses fragmentos de experiéncia de vida, podem se alinhar a dor. Assim a leitora é fisgada._, INTERAGAO ENTRE LEITOR/A E ESCRITORA Em Borderlands (assim como nos dois projetos lite- rarios em que estou trabalhando atualmente, Prieta, um romance/colecao de contos que chamo “autohis- torias”, e Lloronas, mulheres que lamentam: autorre- Presenta¢ées e a producdo de escrita, conhecimento identidades), eu pretendo problematizar a relacdo entre leitor/a, escritora e texto - especificamente o papel da leitora em dar sentido ao texto. £ a leitora (ea autora lendo como leitora) quem, de fato, faz as ConexGes, encontra os padrdes que sao significativos Para ela ouele. Hd uma margem de manobra para que 157 Scanned with CamScanner a leitora interaja com o texto, por causa dag ud Conforme vai lendo, a/o leitor/a pode ficar ie ou com raiva ou frustrada, e entao pode pensar « Semana passada tive uma conversa com uma namorg ou um namorado ou uma professora e foi sobre m sentimento de invisibilidade...”. Tais passagens ¢ Borderlands cativam a leitora ea fazem pensarem sy proprias experiéncias, especialmente experiénciase que ela/ele foi abusada ou violada intelectualment emocionalmente, ou fisicamente. Nesse sentido, Jeitora traz sua propria experiéncia para 0 texto. Acocriacao do livro, feita pela leitora, faz com qu uu autora perceba que nao sou a criadora tinica. Hi certas coisas que a autora monta para a leitora, mat aleitora é, em alguma medida, uma coautora. isso é ainda mais verdade quando a leitora responde ao ive através de uma escrita- com uma resenha, um artigo critico etc. O texto ndo é um texto fixo. As palavras \vao sempre ser as mesmas palavras, certo? Enquanto continuarem imprimindo o livro, as palavras perma: necerdo as mesmas. Mas o texto vai ser diferente 4 cada leitora e cada leitura. O texto vai se mover € revelar algo novo a cada vez que vocé lé-lo. Sevocé Jer Borderlands, por exemplo, daqui a dez anos, voce V2! teruma identidade diferente e, portanto, vai daraele stesso erates Scanned with CamScanner fundamental - vocé tera uma perspectiva diferente. - Talvez coisas que vocé perca na leitura atual irao & ressoar daqui a dez anos. Coi te empolgavam rimeira vez em que vocé leu o texto vocé nem vai notar durante a proxima leitura, Eu li Jane Eyre treze vezes desde que eu tinha nove anos até agora, treze vezes, e cada vez era uma leitura diferente porque minha identidade tinha mudado. Como feminista eu olide forma feminista - dei-lhe uma leitura feminista. Minha leitura feminista me dé uma interpretagao di- ferente sobre as personagens Jane e Bertha. Eu agora vejo coisas que ignorei quando era uma leitora jovem: as dinamicas raciais entre Rochester, Jane e Bertha, que é uma creole/mestiza da Jamaica. Eu agora tenho pesquisado como a sexualidade opera no romance eem como a sexualidade de Jane Eyre nao sé é reprimida mas também é projetada em Bertha, a louca no sétao, amulher selvagem. £ seguro para Jane Eyre ter uma sexualidade porque a sexualidade descontrolada é projetada. Eu agora vejo coisas no livro que eu nao via quando tinha doze, treze, quatorze, quinze, dezesseis q anos. Agora, como uma sapatdo feminista, eu vejo mais conscientemente através de uma perspectiva _ atenta, politizada. 159 Scanned with CamScanner ANasit ulcauan) eG) mestiCh, Es ALTERNANCIA DE Bae et a taken ale ae i Arey an gsTup0s CHICA TRUM u ae Rye 4s PY clas oe qoarizees UNITY ry Casares 7a UIP als suas) PAN upetuh aan Aste, SEXOALIDA tse ea) aad i a ANZALD! By yc. aul Aull um PAPEL Formative NO A hes Ciarcdse conse Scanned with CamScanner

Você também pode gostar