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FACULDADE DE EDUCAÇÃO DO PIAUÍ – FAEPI


Credenciada pela Portaria Ministerial nº 2.858 de 13/09/2004

Diário Oficial da União (D.O.U) de 16 de setembro de 2004, Seção 01, Página 11

CNPJ: 17.773.534/0001-53 Rua 13 de Maio, Bairro Pio XII – Teresina/Piauí

CURSO: Licenciatura Plena em Pedagogia

DISCIPLINA: Filosofia da Educação

PROFESSOR (A): _______________________________________________

ALUNO (A: _____________________________________________________

SANTA ROSA (GOVERNADOR EUGÊNIO BARROS) – MA

2022

FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO | Profa. Santana Xavier


PLANO DE ENSINO

DISCIPLINA: Filosofia da Educação CARGA HORÁRIA: 60 horas


CARGA HORÁRIA SEMANAL: 04

EMENTA: Teorias filosóficas. Filosofia – Educação – Sociedade. Os


fundamentos da Filosofia da Educação: elucidações conceituais. Senso
comum e conhecimento filosófico na prática docente. Diálogo VII da obra A
República (Platão). O mito da caverna. O pensamento filosófico
contemporâneo e as implicações na Educação. A Filosofia da Educação e sua
relação com a Educação Brasileira Contemporânea. Reflexão filosófica e práxis
educacional. Educação Libertadora enquanto Projeto Político-Social. A crise
atual da sociedade e a escola.
OBJETIVOS
OBJETIVO GERAL
 Entender os processos dos pensamentos filosóficos na educação de
modo a relacionar os conteúdos com a realidade cotidiana, fazendo
nexo entre a teoria e prática para, assim, ampliar a visão do mundo
através da interpretação das concepções que fundamentam a percepção
da realidade.

OBJETIVOS ESPECÍFICOS
 Conhecer e avaliar as principais ideias filosóficas dentro dos temas
apresentados;
 Analisar a Filosofia da Educação em função do desenvolvimento do
saber na sua totalidade e abrangência;
 Demonstrar como se dá a articulação entre a Filosofia e a Educação,
desde a origem do pensamento racional e a preocupação com o
conhecimento na Grécia antiga até os dias atuais.
 Abordar a influência e as contribuições das principais correntes
filosóficas para a elaboração das principais teorias do conhecimento e
suas implicações nos processos educacionais.

AVALIAÇÃO
A avaliação será de forma híbrida: formativa e somativa.
 Formativa: - Atividades presenciais com 80% de frequência. -
Apresentação das atividades em sala. Participação nos seminários e/ou
tarefas a fins. (Assiduidade e engajamento teórico nas etapas da
aprendizagem).
 Somativa: - Resolução de atividades e exercícios de pesquisa.
Qualidade na elaboração das atividades extraclasse, se houver.
 Atividade avaliativa final (objetiva e individual).
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1.Filosofia: conceituação, surgimento e linhas de


pensamento.

1.1.O que é Filosofia?

A palavra filosofia tem origem grega e é uma junção das palavras


“philos” (amor) e “sophia” (conhecimento), que significa amor ao conhecimento
ou, também, amor à sabedoria. Esta palavra foi utilizada pela primeira vez por
Pitágoras no século VI a.C., um filósofo e matemático bem conhecido.
Já a palavra filósofo significa o que ama a sabedoria e tem amizade
pelo saber, deseja saber. Assim a filosofia indica um estado de espírito da
pessoa que ama, isto é, deseja o conhecimento, o estima, o procura e o
respeita.

1.2.Como a Filosofia surgiu?

São diversos os fatores históricos que fazem parte do surgimento da


filosofia. São eles: a humanização dos deuses gregos, as viagens marítimas, o
desenvolvimento de uma economia comercial urbana, a utilização em larga
escala da moeda, a criação de um calendário laico, o uso do alfabeto, a
atividade política e o surgimento da razão.
O primeiro filosofo da história foi Tales de Mileto, no início do século VI
a.C., mas foi o Pitágoras quem criou o termo filosofia. Desde então, a filosofia é
a atividade que se dedica a compreender, identificar e comunicar a realidade
através de conceitos lógico-racionais.
A partir do final do século VII a.C., os primeiros filósofos, conhecidos
como filósofos pré-socráticos – recebem esse nome pois são os filósofos que
antecederam Sócrates – dedicaram-se à investigação sobre a natureza
(physis) e buscaram estabelecer princípios lógicos para a formação do mundo.
A natureza desmitificada (sem o auxílio das explicações míticas) era o objeto
de estudo, tendo como principal objetivo encontrar o elemento primordial
(arché) que teria dado origem a tudo o que existe.
No mesmo sentido, atuam as viagens marítimas, que revelam a
diferença entre os relatos míticos e as observações geográficas efetuadas. Por
conta de sua construção e localização geográfica, a sociedade grega tornou-se
um importante centro de comércio e uma potência marítima. Isso fez com que
os gregos tivessem contato com outras culturas. A filosofia nascida com esses
primeiros filósofos deu origem a uma produção de conhecimento e de
representação da realidade. Toda essa construção serviu como base para o
desenvolvimento da cultura ocidental.

1.3.Linhas de Pensamento da Filosofia

Lógica: trata da preservação da verdade e dos modos de se evitar a


inferência e raciocínio inválidos;
Metafísica ou Ontologia: trata da realidade, do ser e do nada;

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Epistemologia/Teoria do Conhecimento: trata da crença, da justiça e
do conhecimento;
Ética: trata do certo e do errado, do bem e do mal;
Filosofia da Arte ou Estética: trata do belo.

2.TEORIAS FILOSÓFICAS

2.1.TEORIA DOS DOIS MUNDOS

A teoria dos dois mundos (“mundo sensível e mundo inteligível ou


mundo das ideias”) destaca-se como o cerne do pensamento platônico.
O pensamento cartesiano nos remete e nos faz admitir um dualismo,
um momento de divisão de  dois mundos: de um lado, o mundo dos corpos
sensíveis e extensos, que possuem grandeza espacial e que podem se tornar
conhecidos através da matemática pura (da ciência); do outro lado, o mundo
racional, cuja essência é o próprio pensar.
Platão defendia o Inatismo, nascemos como princípios racionais e
ideias inatas. A origem das ideias segundo Platão é dada por dois mundos que
são o mundo inteligível, que é o mundo que nós, antes de nascer, passamos a
ter as ideias assimiladas em nossas mentes. Quando nós nascemos no mundo
conhecidos por todos, o mundo em que vivemos, denominado por Platão como
mundo sensível, nós já temos as ideias formuladas em nossas mentes, mas
muito guardadas que para serem utilizadas  é necessário “relembrar” as ideias
já conhecidas através do mundo inteligível.
Para Platão existem quatro formas
ou graus de conhecimento que são a
crença, opinião, raciocínio e indução. Para
ele as duas primeiras podem ser
descartadas da filosofia pois não são
concretas, sendo as duas últimas, as formas
de fazer filosofia. Segundo Platão, tudo se
justifica através da matemática e é através
dessa que nós chegamos a verdadeira
realidade. Para ele, o conhecimento sensível
(crença e opinião) é apenas uma alegoria
da realidade, como se fosse uma visão dos
homens da caverna do texto “Alegoria da Caverna” e o conhecimento
intelectual (raciocínio e indução) alcança a essência das coisas, as ideias. A
teoria dos dois mundos, apresentada por Platão, é sem dúvida, um grande
marco para a Filosofia.

2.2.A TEORIA DA “MAIÊUTICA” DEFENDIDA POR SÓCRATES

 “Maiêutica” (em grego “parto das ideias”), cujo objetivo é possibilitar ao


homem, o conhecimento de si mesmo. É um método próprio de análise
filosófica. É um método desenvolvido por Sócrates. A “maiêutica”, consiste em
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“fazer perguntas e analisar as


respostas de maneira sucessiva
até chegar à verdade ou
contradição do enunciado”. Desta
forma, este método faz com que as
pessoas comecem a pensar a
partir daquilo que não conhecem,
ou seja, pela ignorância. Daí a sua
famosa frase: “eu só sei que nada
sei”.
Sócrates, quando remonta
à maiêutica como arte filosófica, não apenas cria um problema posterior, como
encontra sérias dificuldades em seu tempo para contrapor o propósito sofista
da verdade alcançada pela retórica, então sugere que a verdade está no
interior do homem.
A  Maiêutica  "é o método que consiste em parir ideias complexas a
partir de perguntas simples e articuladas dentro de um contexto”. É a técnica
através da qual se consegue observar como é que uma ciência desconhecida
se transforma progressivamente em uma ciência conhecida. Segundo Platão,
Sócrates fora buscar a sua arte da maiêutica na sua mãe que era parteira.
 Na Grécia clássica só as mulheres que já não podiam dar à luz
estavam autorizadas a ajudar ao parto das outras. Sócrates considerava a sua
arte como a arte de parturejar; só que agora são homens que dão à luz e é do
parto das suas almas que se trata.  Sócrates revelava aos outros, aquilo que
eles próprios sabiam sem de tal terem consciência. Ele pretendia que o seu
questionamento sistemático levasse os outros a um ponto crucial de
consciência crítica, procurando a verdade no seu interior,
A maiêutica baseia-se na ideia de que o conhecimento é latente na
mente de todo ser humano, podendo ser encontrado pelas respostas a
perguntas propostas de forma perspicaz.

2.3.MÉTODO “PEDAGOGIZADOR” E A PRÁTICA EDUCACIONAL


VOLTADA PARA INTERSUBJETIVIDADE.

O modelo de conhecimento baseado na perspectiva da razão


instrumental promoveu uma educação com estilo “pedagogizador”, que se
resume a instruir, reproduzir um tipo de conhecimento que não é irrelevante
para as reais necessidades do aluno. Essa postura de educação está a serviço
de uma sociedade mercadológica e tecnocrática. Seus críticos vêm tentando
superar o estilo “pedagogizador” da educação. Lentamente, a educação vem
se constituindo sob um novo discurso pautado pela transformação, mas ainda
caminha sob a sombra do modelo “pedagogizador”. No Brasil, os desafios são

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enormes, porém contornáveis se forem adotadas políticas educacionais
adequadas, comprometidas com uma efetiva emancipação do sujeito.
A partir da Teoria da
Ação Comunicativa, pode-se
conceber o espaço da escola,
como o lugar de exercitar
a intersubjetividade entre
aluno/professor/escola/família e
comunidade, com o intuito de
discutir os rumos da sociedade,
isto é, a partir do momento em
que os indivíduos perceberem
como sujeitos e atores sociais,
poderão pensar que a
sociedade pode ser de outra
maneira, e agir de outra
maneira, refletindo  sobre os
problemas da sociedade,
interpretando, participando,
dialogando, enfim, buscando o
consenso em torno dos
interesses comuns.
 A prática da
intersubjetividade segundo a
proposta da Teoria da Ação Comunicativa permite a conciliação de dois
mundos: o mundo do sistema e o mundo da vida, onde a teoria e a prática
estão interligadas através de ações concretas, numa dinâmica comunicativa
entre os atores envolvidos visando novas racionalidades. Nesse sentido, um
modelo de educação calcado na intersubjetividade é o mais apto para a
construção de pessoas realmente esclarecidas, criativas e autônomas. É papel
da educação, compreender essas dificuldades e propor mudanças,  precisando
ser revista com urgência.   
Ao falarmos de uma educação guiada pela intersubjetividade, temos
em vista a valorização social, política, econômica e ética de uma reflexão sobre
os rumos da educação na complexidade das sociedades contemporâneas. A
educação deve contribuir significativamente com o processo de
desenvolvimento do aluno a partir da interpretação e análise crítica dos
fenômenos culturais do seu cotidiano, levando-os ao exercício de uma prática
de saber construtivo à sua vida.

3.FILOSOFIA – EDUCAÇÃO – SOCIEDADE


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A filosofia da educação é um ramo do pensamento que se dedica à


reflexão sobre os processos educativos, à análise do sistema educativo,
sistematização de métodos didáticos, entre
diversas outras temáticas relacionadas com
a Pedagogia. O seu escopo principal é a
compreensão das relações entre o fenômeno
educativo e o funcionamento da sociedade.
Ela preocupa-se com a problemática
educacional que ocorre em todos os segmentos da
sociedade pois trata-se, com efeito, de Filosofia da
Educação e não simplesmente de Filosofia porque
neste caso a filosofia se esvaziaria; não também da
Educação sem postura reflexiva porque neste caso
a Educação não seria um processo
intencionalmente conduzido.

4. Os fundamentos da Filosofia da Educação:


elucidações conceituais

Filosofia e Educação: elucidações conceituais e articulações (Cipriano


Carlos Luckesi)
Segundo o autor, a educação é exercida conforme conceitos teóricos, e
a prática pedagógica está vinculada a uma concepção filosófica, nos levando a
refletir sobre o significado de Filosofia na prática da vida humana.
Compreendendo que segundo Luckesi, Filosofia é um corpo de
conhecimento que envolve o ser humano. Esse conhecimento é construído
conforme o tempo, inspirações e buscas do significado do sentido de nossas
vidas. É a reflexão do nosso cotidiano, do simples ao complexo, desde a
compreensão de nossa existência até o processo de toda nossa vida,
oferecendo não só um entendimento, como também uma direção que nos dê
sentido para percorrermos com ações coerentes.
A filosofia, portanto, não é somente a interpretação do que já vivemos,
mas também a interpretação de nossos objetivos e desejos que estão por vir. É
a Filosofia que nos motiva a agir, além de servir como transformação e
revolução do nosso ser e da sociedade.
Quando temos o hábito de filosofar (procurar compreender nossa
existência e significado ao mundo) temos a tendência espontânea de viver
nosso cotidiano assumindo o “sendo comum”. Em primeiro lugar, devemos
entender que vivenciamos valores em todos os aspectos (familiar, profissional,
social...), e devemos questionar quais são esses valores, tomando consciência
das ações, assim entendendo qual direção que devemos tomar. 
Segundo Luckesi, devemos seguir da seguinte forma: devemos
providenciar um levantamento dos valores impostos. Posterior a isso, devemos

FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO | Profa. Santana Xavier


questionar criticamente esses valores e seus significados, para depois
desconstruir e  reconstruir esses valores, sempre com auxílio teórico e de
pensadores. A educação é movida e compreendida através de ações
idealizadas pela Filosofia, sendo que a educação se torna o veículo principal
para a divulgação e a promoção do conhecimento filosófico. 
Luckesi, compreende que os valores que direcionam a prática
educacional sustentam-se a partir de uma reflexão filosófica. Entende-se, por
tanto que precisamos de alguma compreensão valorativa da vida e o ato de
filosofar é necessário para nos conduzir com significado em nossas ações,
principalmente na área educacional.

5.Níveis de conhecimento: senso comum, conhecimento


científico e conhecimento filosófico

5.1.Senso comum

O senso comum possui uma importância enorme na história dos


problemas filosóficos, sobretudo por estar associado à experiência tradicional.
O senso comum suscita o equilíbrio entre os
elementos racionais e irracionais (ou
emocionais), presentes em todos os seres
humanos.
Na história da filosofia, o problema
do senso comum sempre foi um ponto de
enorme importância e grandes debates. Os
filósofos clássicos, como Sócrates, Platão e
Aristóteles, dedicaram-se a refletir sobre isso
e situar esse tema dentro dos problemas que
interessam à reflexão filosófica.
Também chamado conhecimento
popular, é o que resulta do cotidiano do ser
humano e caracteriza-se por ser: superficial,
sensitivo, subjetivo, assistemático e acrítico.
Por exemplo, o conhecimento que os camponeses têm sobre a época de
plantio e colheita, sem ter aprendido na escola.
Sendo assim, o senso comum é o tipo de saber que busca fornecer
orientação ao homem e não o deixar repetir os erros do passado. Por
intermédio da experiência, o homem pode exercer virtudes, como a prudência e
a paciência, e aprender a não se deixar levar por aventuras emocionais, que o
desviam para a irracionalidade, bem como não se deixar levar por “sonhos
racionais” de progresso a qualquer custo. Como disse o pintor espanhol Goya,
“O sonho da razão produz monstros”.
A partir do século XVII, sobretudo com o desenvolvimento da ciência
moderna e da filosofia racionalista cartesiana, o senso comum passou, de
forma geral, a ser identificado como “falta de rigor metodológico” e a ser
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rivalizado com o “senso crítico” ou “senso científico”. Dessa forma, até o início
do século XX, eram poucas as defesas filosóficas que se faziam do senso
comum, haja vista que a expressão havia sido alijada de seu sentido
tradicional.

5.2.Conhecimento científico

A ciência é um conjunto de conhecimento


socialmente adquirido ou produzidos,
historicamente acumulados, dotados de
universidade e objetividades, que permitem a sua
transmissão, e estruturados com métodos, teorias
e linguagem própria, que visam compreender e
possivelmente orientar a natureza e as atividades
humanas. Tem as seguintes características: real,
sistemático, verificável e falível.

5.3.Importância, limites e perigos do conhecimento científico

Não há dúvida nenhuma de que o avanço tecnológico resulta do


conhecimento e da investigação científica e que este proporciona melhores
condições de vida aos homens, algo que outrora parecia impossível, hoje pode
ser realidade comum. Portanto a tecnologia contribui para a melhoria das
condições de vida. Todavia, a ciência mostrou ao longo do tempo, que nem
sempre é favorável ao homem, a tecnologia pode originar entraves à vida
humana como na relação dos homens com as máquinas, o desemprego.

5.4.Conhecimento filosófico

Este tipo de conhecimento caracteriza-se pela intenção de ampliar


incessantemente a compreensão da realidade, no
sentido de aprender na sua totalidade, dar
explicações acerca da existência humana. Existem
outros tipos de conhecimento como:
Conhecimento teológico ou religioso:
aquele baseado na fé religiosa, acreditando que ela
detém a verdade absoluta.

FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO | Profa. Santana Xavier


Atividade 1:

Análise do diálogo VII “Mito da Caverna”, de Platão.


- Leitura do texto e resumo com a interpretação da alegoria da caverna, traçando
paralelos com a atualidade e apresentar em forma de seminário, roda de conversa,
entre outras formas de exposição do conhecimento.

Conhecimento mitológico: narrativo de significação simbólica,


transmitida de geração em geração considerado verdadeiro, autêntico dentro
de um grupo, tendo totalmente a forma de um relato sobre a origem de um
determinado fenômeno.
Conhecimento intuitivo: sendo a intuição o ato ou capacidade de
pressentir, é o conhecimento imediato de um objeto de ordem material ou
espiritual, este tipo de conhecimento é imediato e difícil de se fundamentar.

Leia parte do diálogo a seguir:


Diálogo VII
SÓCRATES. Figura-te agora o estado da natureza humana, em relação à
ciência e à ignorância, sob a forma alegórica que passo a fazer. Imagina os
homens encerrados em morada subterrânea e cavernosa que dá entrada livre
à luz em toda extensão. Aí, desde a infância, têm os homens o pescoço e as
pernas presos de modo que permanecem imóveis e só veem os objetos que
lhes estão diante. Presos pelas cadeias, não podem voltar o rosto. Atrás
deles, a certa distância e altura, um fogo cuja luz os alumia; entre o fogo e os
cativos imagina um caminho escarpado, ao longo do qual um pequeno muro
parecido com o tabiques que os pelotiqueiros põem entre si e os
espectadores para ocultar-lhes as molas do bonecos maravilhosos que lhes
exibem.
GLAUCO – Imagino tudo isso.
SÓCRATES – Supõe ainda homens que passam ao longo deste muro, com
figuras e objetos que se elevam acima dele, figuras de homens e animais de
toda a espécie, talhados em pedra ou madeira. Entre os que carregam tais
objetos, uns se entretêm em conversa, outros guardam em silêncio.
GLAUCO – Similar quadro e não menos singulares cativos!
SÓCRATES – Pois são nossa imagem perfeita. Mas, diz-me: assim
colocados, poderão ver de si mesmos e de seus companheiros algo mais que
as sombras projetadas, à claridade do fogo, na parede que lhes fica fronteira?
GLAUCO – Não, uma vez que são forçados a ter imóveis a cabeça durante
toda a vida.
SÓCRATES – E dos objetos que lhes ficam por detrás, poderão ver outra
coisa que não a sombras?
GLAUCO - Não.
SÓCRATES – Ora, supondo-se que pudessem conversar, não te parece que,
ao falar das sombras que veem, lhes dariam os nomes que elas
representam?
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GLAUCO – Sem dúvida.


SÓCRATES – E, se, no fundo da caverna, um eco lhes repetisse as palavras
dos que passam, não julgariam certo de que os sons fossem articulados pelas
sombras dos objetos?
GLAUCO – Claro que sim.
SÓCRATES – Em suma, não creriam que houvesse nada de real e
verdadeiro fora das figuras que desfilaram.
GLAUCO – Necessariamente.
SÓCRATES – Vejamos agora o que aconteceria, se se livrassem a um tempo
das cadeias e do erro em que laboravam. Imaginemos um destes cativos
desatado, obrigado a levantar-se de repente, a volver a cabeça, a andar, a
olhar firmemente para a luz. Não poderia fazer tudo isso sem grande pena; a
luz, sobre ser-lhe dolorosa, o deslumbraria, impedindo-lhe de discernir os
objetos cuja sombra antes via. Que te parece agora que ele responderia a
quem lhe dissesse que até então só havia visto fantasmas, porém que agora,
mais perto da realidade e voltado para objetos mais reais, via com mais
perfeição? Supõe agora que, apontando-lhe alguém as figuras que lhe
desfilavam ante os olhos, o obrigasse a dizer o que eram. Não te parece que,
na sua grande confusão, se persuadiria de que o que antes via era mais real
e verdadeiro que os objetos ora contemplados?
GLAUCO – Sem dúvida nenhuma.
SÓCRATES – Obrigado a fitar o fogo, não desviaria os olhos doloridos para
as sombras que poderia ver sem dor? Não as consideraria realmente mais
visíveis que os objetos ora mostrados?
GLAUCO – Certamente.
SÓCRATES – Se o tirassem depois dali, fazendo-o subir pelo caminho
áspero e escarpado, para só o liberar quando estivesse lá fora, à plena luz do
sol, não é de crer que daria grito lamentosos e brados de cólera? Chegando à
luz do dia, olhos deslumbrados pelo esplendor ambiente, ser-lhe ia possível
discernir os objetos que o comum dos homens tem por serem reais?
GLAUCO – A princípio nada veria.
SÓCRATES – Precisaria de algum tempo para se afazer à claridade da
região superior. Primeiramente, só discerniria bem as sombras, depois, as
imagens dos homens e outro seres refletidos nas águas; finalmente erguendo
os olhos para a lua e as estrelas, contemplaria mais facilmente os astros da
noite que o pleno resplendor do dia.
GLAUCO – Não há dúvida.
SÓCRATES – Mas, ao cabo de tudo, estaria, decerto, em estado de ver o
próprio sol, primeiro refletido na água e nos outros objetos, depois visto em si
mesmo e no seu próprio lugar, tal qual é.
GLAUCO – Fora de dúvida.
SÓCRATES – Refletindo depois sobre a natureza deste astro, compreenderia
que é o que produz as estações e o ano, o que tudo governa no mundo visível
e, de certo modo, a causa de tudo o que ele e seus companheiros viam na
caverna.
GLAUCO – É claro que gradualmente chegaria a todas essas conclusões.
SÓCRATES – Recordando-se então de sua primeira morada, de seus
companheiros de escravidão e da ideia que lá se tinha da sabedoria, não se
daria os parabéns pela mudança sofrida, lamentando ao mesmo tempo a
sorte dos que lá ficaram?

FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO | Profa. Santana Xavier


GLAUCO – Evidentemente.
SÓCRATES – Se na caverna houvesse elogios, honras e recompensas para
quem melhor e mais prontamente distinguisse a sombra dos objetos, que se
recordasse com mais precisão dos que precediam, seguiam ou marchavam
juntos, sendo, por isso mesmo, o mais hábil em lhes predizer a aparição,
cuidas que o homem de que falamos tivesse inveja dos que no cativeiro eram
os mais poderosos e honrados? Não preferiria mil vezes, como o herói de
Homero, levar a vida de um pobre lavrador e sofrer tudo no mundo a voltar às
primeira ilusões e viver a vida que antes vivia?

GLAUCO – Não há dúvida de que suportaria toda a espécie de sofrimentos


de preferência a viver da maneira antiga.

SÓCRATES – Atenção ainda para este ponto. Supõe que nosso homem volte
ainda para a caverna e vá assentar-se em seu primitivo lugar. Nesta
passagem súbita da pura luz à obscuridade, não lhe ficariam os olhos como
submersos em trevas?
GLAUCO – Certamente.

SÓCRATES – Se, enquanto tivesse a vista confusa — porque bastante tempo


se passaria antes que os olhos se afizessem de novo à obscuridade —
tivesse ele de dar opinião sobre a sombras e a este respeito entrasse em
discussão com os companheiros ainda presos em cadeias, não é certo que os
faria rir? Não lhe diriam que, por ter subido à região superior, cegara, que não
valera a pena o esforço, e que assim, se alguém quisesse fazer com eles o
mesmo e dar-lhes a liberdade, mereceria ser agarrado e morto?

GLAUCO – Por certo que o fariam.

SÓCRATES – Pois agora, meu caro GLAUCO, é só aplicar com toda a


exatidão esta imagem da caverna a tudo o que antes havíamos dito. O antro
subterrâneo é o mundo visível. O fogo que o ilumina é a luz do sol. O cativo
que sobe à região superior e a contempla é a alma que se eleva ao mundo
inteligível. Ou, antes, já que o queres saber, é este, pelo menos, o meu modo
de pensar, que só Deus sabe se é verdadeiro. Quanto à mim, a coisa é como
passo a dizer-te. Nos extremos limites do mundo inteligível está a ideia do
bem, a qual só com muito esforço se pode conhecer, mas que, conhecida, se
impõe à razão como causa universal de tudo o que é belo e bom, criadora da
luz e do sol no mundo visível, autora da inteligência e da verdade no mundo
invisível, e sobre a qual, por isso mesmo, cumpre ter os olhos fixos para agir
com sabedoria nos negócios particulares e públicos.

Fonte: Extraído de “A República” de Platão. 6º ed. Ed. Atena, 1956, p. 287-291


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5.5.O mito da Caverna

O Mito da Caverna é uma alegoria retirada de “A República”, de Platão,


que fala sobre o conhecimento verdadeiro e o governo político.
O autor narra uma história alegórica chamada de Mito da Caverna ou
Alegoria da Caverna em sua obra mais complexa, A República. O diálogo
travado entre Sócrates, personagem principal, e Glauco, seu interlocutor, visa a
apresentar ao leitor a teoria platônica sobre o conhecimento da verdade e a
necessidade de que o governante da cidade tenha acesso a esse
conhecimento.

A ideia de mito aqui aparece de maneira transformada. A filosofia não


implicou em um novo modo de conhecimento? Por que então recorrer ao mito?
Platão, percebendo a complexidade de partes bem relevantes de seu sistema
filosófico, e possuindo grande talento literário, se utilizou do mito para
esclarecer e para facilitar a compreensão de suas ideias mais difíceis. Forma
estratégica para a explicação de certas posições filosóficas, mas não apenas
isso: a forma alegórica permitiria também o enriquecimento da ideia que se
procura transmitir e/ou comunicar.

A maneira como se explica ou ainda se conta o mito, por meio do


diálogo entre dois personagens da passagem, Sócrates e Glauco, acrescentará
à dinâmica inerente ao texto, entendimento profundo e amplo, uma vez que a
exposição se serve inclusive do fato do autor, Platão, consegue através dos
diálogos, se antecipar a certas dúvidas que poderiam se reproduzir na cabeça
de qualquer homem comum em busca do conhecimento, ou seja, as dúvidas

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confrontadas pelos próprios leitores do autor. A forma de dialogar na
construção do texto, permite o esclarecimento recíproco das posições
antagônicas ou complementares de seus personagens, imprimindo a ele uma
dinâmica e uma riqueza maior sob a vestimenta de aparente simplicidade, no
entanto, sem trair ou negar a profundidade e a complexidade das ideias em
debate.

A estratégia de construção do texto se confunde com o modo e o


momento de elaboração das ideias. O mito, segundo Platão em sua visão
estratégica e literária, servirá como um meio para melhor compreender,
sintetizar e transmitir as ideias.

“O que o Mito da Caverna diz?”

No texto, Sócrates fala para Glauco imaginar a existência de uma


caverna onde prisioneiros vivessem desde a infância. Com as mãos amarradas
em uma parede, eles podem avistar somente as sombras que são projetadas
na parede situada à frente.
As sombras são ocasionadas por uma fogueira, em cima de um
tapume, situada na parte traseira da parede em que os homens estão presos.
Homens passam ante a fogueira, fazem gestos e passam objetos, formando
sombras que, de maneira distorcida, são todo o conhecimento que os
prisioneiros tinham do mundo. Aquela parede da caverna, aquelas sombras e
os ecos dos sons que as pessoas de cima produziam era o mundo restrito dos
prisioneiros."
Repentinamente, um dos prisioneiros foi liberto. Andando pela caverna,
ele percebe que havia pessoas e uma fogueira projetando as sombras que ele
julgava ser a totalidade do mundo. Ao encontrar a saída da caverna, ele tem
um susto ao deparar-se com o mundo exterior. A luz solar ofusca a sua visão e
ele sente-se desamparado, desconfortável, deslocado.
Aos poucos, sua visão acostuma-se com a luz e ele começa a perceber
a infinidade do mundo e da natureza que existe fora da caverna. Ele percebe
que aquelas sombras, que ele julgava ser a realidade, na verdade são cópias
imperfeitas de uma pequena parcela da realidade.
O prisioneiro liberto poderia fazer duas coisas: retornar para a caverna
e libertar os seus companheiros ou viver a sua liberdade. Uma possível
consequência da primeira possibilidade seria os ataques que sofreria de seus
companheiros, que o julgariam como louco, mas poderia ser uma atitude
necessária, por ser a coisa mais justa a se fazer.
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Segundo a narrativa, Mito da Caverna, todos os homens, desde o


nascimento até a própria morte, estariam acorrentados de tal forma a não olhar
para trás ou para os lados, vendo apenas a parede do fundo da caverna, lugar
em que, sob o efeito de uma grande fogueira às costas desses mesmos
homens, projetavam-se sombras. Os homens não sabiam ou não conseguiam
ver as coisas e os seres reais. Eles achavam as sombras uma expressão da
própria verdade. Como em um teatro de sombras, acreditavam no que viam,
condicionados desde o nascimento pela maneira tradicional em que viviam. Por
trás desses seres acorrentados, alguns homens se movimentavam, os sofistas
e os políticos, que manipulavam e se utilizavam da projeção das sombras para
o próprio benefício. Representavam aqueles que lutavam pela posse do poder
e contribuindo ativamente para a continuidade de tal situação. Já que
enganavam, iludiam, persuadiam e manipulavam os homens, que se
encontravam acorrentados à condição de ignorância, a se manter em tal
situação.
Em um certo dia, um homem conseguiu enfim se livrar das correntes
que o envolviam e com muito esforço, conseguiu sair da caverna, depois de
quase ficar cego com a luz do sol. Ele então finalmente, pôde vislumbrar a
realidade verdadeira. Tempos depois, acabou retornando à mesma caverna da
qual havia colocado tanto esforço para se livrar dela. Mas então, o que ele
queria, o que ele buscava? Seu objetivo era o de esclarecer os homens, revelar
a eles o que teve a oportunidade de conhecer. Mas, como foi recebido? Este
homem acabou sendo visto como um louco, e por isso, foi assassinado. Essa é
uma referência bem clara ao processo que envolveu Sócrates, que teria
morrido em função da ignorância do homem comum, ou seja, da maioria, e
pelo domínio e pela manifestação exercido sobre estes por parte de falsos
políticos e sábios ambiciosos.
Revisando: Para Platão, existiriam dois mundos. O primeiro era o
mundo sensível, constituído pelas formas concretas e materiais, apreendido
pelos nossos sentidos, ou seja, aquilo que ouvimos, vemos. O segundo mundo
era o das fôrmas ou das ideias perfeitas, chamado pelo autor de mundo
inteligível.
O mundo das ideias perfeitas, existentes e imutáveis, encontraria na
ideia do bem, representada pelo sol no Mito da Caverna, o seu mais importante
elemento constitutivo, ou ainda a ideia mais elevada em tal construção teórica.
Esse conhecimento partiria do senso comum, de um conjunto de
representações formadas a partir da ação enganosa dos sentidos.
Platão está dispondo, hierarquicamente, os graus de conhecimento
com essa metáfora e falando que existe um modo de conhecer, de saber, que
é o mais adequado para se pensar em um governante capaz de fazer política
com sabedoria e justiça.

FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO | Profa. Santana Xavier


"Os prisioneiros tinham acesso somente às sombras projetadas na
parede da caverna."

A República - o livro em que está contido o Mito da Caverna

A República é, talvez, a obra mais complexa e completa de Platão.


Composto por dez livros, a obra fala sobre as várias formas de governo e
política para chegar ao modelo político ideal, segundo Platão. Para chegar à
formulação de sua teoria, o filósofo passou por elementos característicos da
vida humana, como a estética, a arte e o conhecimento humano (que é
discutido no livro VII, o mesmo livro em que se encontra a Alegoria da
Caverna).
O Mito da Caverna é uma passagem da obra A República. Nessa
passagem, Platão acaba se utilizando de um mito ou alegoria, uma espécie de
narrativa que busca o esclarecimento de ideias complexas para o público leigo,
algo bem semelhante ao que Jesus fazia por meio das parábolas, com o
objetivo de explicar a essência de suas ideias.
Este diálogo foi escrito por Platão,
a quem podemos chamar de um
discípulo de Sócrates. Platão foi o
principal discípulo de Sócrates,
que foi o responsável por
imortalizar as ações e os
pensamentos do mestre em seus
‘diálogos’, uma obra considerada
tão importante no meio poético
16

quanto no meio filosófico, e ele pode ser considerado um dos mais


significativos filósofos de todos os tempos.
O longo diálogo narra a trajetória de Sócrates buscando estabelecer,
teoricamente, como seria o governo perfeito. O conhecimento é, para Platão, o
elemento primordial de um bom governante. Por isso, no livro VII de A
República, Platão afirma que o filósofo deve ser como o prisioneiro liberto da
caverna. Essas características são fundamentais para o governante: a busca
pela verdade."

Conclusões acerca do Mito da Caverna

A metáfora proposta pela Alegoria da Caverna pode ser interpretada da


seguinte maneira:
1- Os prisioneiros: os prisioneiros da caverna são os homens
comuns, ou seja, somos nós mesmos, que vivemos em nosso
mundo limitado, presos em nossas crenças costumeiras.

2- A caverna: a caverna é o nosso corpo e os nossos sentidos, fonte


de um conhecimento que, segundo Platão, é errôneo e enganoso.

3- As sombras na parede e os ecos na caverna: sombras e ecos


nunca são projetados exatamente do modo como os objetos que os
ocasionam são. As sombras são distorções das imagens e os ecos
são distorções sonoras. Por isso, esses elementos simbolizam as
opiniões erradas e o conhecimento preconceituoso do senso
comum que julgamos ser verdadeiro.

4- A saída da caverna: sair da caverna significa buscar o


conhecimento verdadeiro.

5- A luz solar: a luz, que ofusca a visão do prisioneiro liberto e o


coloca em uma situação de desconforto, é o conhecimento
verdadeiro, a razão e a filosofia."

Mito da Caverna visto nos dias de hoje

Trazendo a Alegoria da Caverna para o nosso tempo, podemos dizer


que o ser humano tem regredido constantemente, a ponto de estar, cada vez
mais, vivendo como um prisioneiro da caverna, apesar de toda a informação e
todo o conhecimento que temos a nossa disposição.

FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO | Profa. Santana Xavier


As pessoas têm preguiça de pensar. A preguiça tornou-se um elemento
comum em nossa sociedade, estimulada pela facilidade que as tecnologias nos
proporcionam. A preguiça intelectual tem sido, talvez, a mais forte
característica de nosso tempo. A dúvida socrática, o questionamento, a não
aceitação das afirmações sem antes analisá-las (elementos que custaram a
vida de Sócrates na antiguidade) são hoje desprezados.
A política, a sociedade e a vida comum deixaram de ser interessantes
para os cidadãos do século XXI que apenas vivem como se a própria vida
tivesse importância maior que a preservação da sociedade. As notícias falsas
estão enganando cada vez mais pessoas que não se prestam ao trabalho de
checar a veracidade e a confiabilidade da fonte que divulga as informações.
As redes sociais viraram verdadeiras vitrines do ego, que divulgam a
falsa propaganda de vidas felizes, mas que, superficialmente, sequer sabem o
peso que a sua existência traz para o mundo. A ignorância, em nossos tempos,
é cultivada e celebrada.
Quem ousa opor-se a esse tipo de vida vulgar, soterrada na ignorância,
presa na caverna como estavam os prisioneiros de Platão, é considerado
louco. Os escravos presos no interior da caverna não percebem que são
prisioneiros, assim como as pessoas que estão presas na mídia, nas redes
sociais e no mar de informações, muitas vezes ‘desinformantes’, da internet,
não percebem que são enganadas.

Vivemos na época do predomínio da opinião rasa, do conhecimento


superficial, da informação inútil e da prisão cotidiana que arrasta as pessoas,
cada vez mais, para a caverna da ignorância.

6.O pensamento filosófico contemporâneo e as implicações na


Educação

A Filosofia Contemporânea inicia-se


no século XIX e perdura até os dias atuais,
tendo como marca principal a crítica ao
cientificismo moderno e às estruturas
racionais.
A Filosofia Contemporânea,
cronologicamente, situa-se entre algum
período impreciso do século XIX até os dias
atuais. Alguns estudiosos preferem
Friedrich Nietzsche pode ser
classificar os pressupostos teóricos e
considerado um dos primeiros pensamentos filosóficos produzidos no
filósofos contemporâneos século XIX como parte da Filosofia Moderna.
18

Porém, permitindo-se fazer uma análise mais conceitual e amplamente


historiográfica do que estritamente positivista e cronológica, podemos conceber
que as produções filosóficas do século XIX aproximam-se muito mais daquilo
que foi produzido nos séculos posteriores do que nos períodos anteriores.
Ademais, o pensamento reinante no século XX, as escolas filosóficas,
as interpretações, a pós-modernidade, enfim, tudo o que há de diferente na
Filosofia Ocidental nos dias de hoje, que se destaca da Filosofia Moderna,
nasceu em obras de filósofos do século XIX, como Auguste Comte, Friedrich
Nietzsche, Søren Kierkegaard, Arthur Schopenhauer e Karl Marx."

6.1.Contexto histórico da Filosofia Contemporânea

Durante o Iluminismo, no fim da modernidade, havia uma crença


comum de que o avanço das ciências, das técnicas e do conhecimento aliados
à popularização desse conhecimento por meio da educação, trariam o avanço
moral da sociedade. O positivismo de Auguste Comte permanece, de certo
modo, numa linha iluminista, mas acrescenta a necessidade de um
conhecimento estritamente científico e de uma rigorosa ordem social para o
avanço social.
Como método historiográfico, o positivismo afirma a necessidade de
atenção aos fatos estritos da história como fonte única de conhecimento. Já o
materialismo histórico-dialético, de Karl Marx, afirma a necessidade de se
entender a história humana como história de sua produção material.
Discordando de algumas ideias iluministas que se fundem para iniciar o
pensamento liberal e concordando com outras, como o ideal da igualdade entre
os homens amplamente difundido durante a Revolução Francesa, Marx
fundamenta o socialismo científico com base em um pensamento político
prático e revolucionário. Dessa feita, o idealismo alemão, corrente filosófica da
modernidade representada por pensadores como Kant e Hegel, é duramente
criticado por Marx.
Talvez, contando os fatos históricos, os que mais influenciaram o início
do pensamento contemporâneo sejam as revoluções Francesa, Americana e a
Revolução Industrial. Em termos práticos, as revoluções políticas trouxeram um
novo modo de governar, afastando o autoritarismo do Antigo Regime, enquanto
a Revolução Industrial representou um imenso avanço técnico e científico para
a Europa.
De todos os pensadores que marcaram o início da contemporaneidade,
talvez esteja em Friedrich Nietzsche a maior ruptura com a filosofia tradicional
e uma grande enunciação do que viria no século XX. Um crítico mordaz do que
se tornou a filosofia produzida entre Sócrates e Kant (com exceção de
Spinoza), ou seja, quase toda a Filosofia ocidental."

FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO | Profa. Santana Xavier


Nietzsche criticou a pretensão do ser
humano de se chegar a uma verdade objetiva e
puramente racional, fundamentando o
conhecimento no que ele chamou de
perspectivismo. Além da crítica à teoria do
conhecimento e a fundação de um novo método
filosófico para entender o mundo, Nietzsche
elabora uma crítica aos sistemas morais que
pretendem estabelecer uma valoração unilateral e
desprezam a origem histórica e cultural dos valores
morais.
O intenso século XIX também acompanhou o nascimento de novas
ciências, como a Sociologia, a Antropologia e a Psicologia. Em meio ao avanço
técnico e às novas maneiras de explicar a realidade, o pensamento ocidental
foi se estabelecendo como um mote para o desenvolvimento futuro, apesar de
filósofos como Nietzsche duvidarem do suposto progresso alavancado pela
modernidade, que atingiria seu ápice no século XIX.
O século XX inicia com a suspeita de que as teorias iluministas e
modernas talvez não fossem tão certas. A Primeira Guerra Mundial foi um
desses fatores e o Holocausto foi o ápice do pessimismo contemporâneo em
relação à ciência e à técnica. Theodor Adorno e Max Horkheimer, no livro
Dialética do Esclarecimento, classificam o Holocausto como o máximo da
barbárie que a humanidade chegou devido ao que eles chamaram de “razão
instrumental”, ou seja, a utilização não reflexiva da ciência e das técnicas
visando a uma finalidade.
O capitalismo já vinha se utilizando da racionalidade como instrumento
de poder e o nazismo, por meio da câmara de gás e dos experimentos
científico cruéis que utilizavam prisioneiros de campos de concentração como
cobaias, marcaram a contemporaneidade como uma época em que o avanço
científico não garantiu o avanço moral humano.

6.2.O que caracteriza a Filosofia Contemporânea?

Podemos dizer que a principal marca da Filosofia Contemporânea é a


crítica aos modelos filosóficos desenvolvidos até a modernidade. Nietzsche, ao
criticar o padrão de racionalidade que, segundo ele, deixava de lado a potência
animal e natural do ser humano e ao apontar que a moral que nós tínhamos
como natural era fruto de uma inversão dos valores antigos, coloca em xeque
toda a história da Filosofia.
Para Jean-Paul Sartre, filósofo existencialista, a liberdade humana era
incondicional, de modo que o ser humano estaria, paradoxalmente, condenado
a ter essa liberdade. Para Sartre e para os existencialistas em geral, não havia
uma essência que definiria o ser humano (ao contrário do pensamento antigo e
moderno que afirmava a racionalidade como essencial ao animal humano).
Assim, para esse existencialista o que tornava o homem um ser angustiado e
desamparado, já que ele seria totalmente responsável por si mediante suas
ações. Segundo Sartre, o ser humano teria criado a ideia de Deus para se livrar
do peso da existência.
20

Filósofos mais recentes que iniciaram suas produções na segunda


metade do século XX, como Michel Foucault, Gilles Deleuze e Jacques
Derrida, fundam um pensamento que ficou conhecido como pós-estruturalista
(chamado por alguns, em tom de crítica, de pensamento pós-moderno). O pós-
estruturalismo visava a quebrar a estrutura formal de pensamento baseada na
razão e no método rigoroso, estabelecendo que a Filosofia deve atuar por meio
do pensamento livre para chegar às suas conclusões.

6.3.O que é a razão na Filosofia Contemporânea?

A Filosofia Contemporânea, em geral, tentou estabelecer um novo


padrão de racionalidade. Pensando que a razão não era aquela marca
tradicional do ser humano e que o impulso positivista poderia estabelecer uma
relação instrumental do ser humano com a racionalidade, a razão passa a ser
evocada como instrumento de emancipação intelectual por meio da reflexão
sobre a própria razão.
Os modernos encaravam a racionalidade como um instrumento que
permitiria ao ser humano dominar a própria natureza. Se o Holocausto foi a
marca da instrumentalização da razão como meio de domínio político, hoje,
também vemos que o domínio da natureza traz consequências catastróficas
para a humanidade, devido à degradação ambiental.
A Filosofia Moral e a ética contemporâneas
também passaram por um processo de revisitação e
reestruturação de seus sistemas teóricos morais por
perceberem que a razão não é garantia das ações
moralmente corretas. Aliás, o que se entendia como
ação moralmente correta até o século XIX passa a ser
questionado, por filósofos como Marx e Nietzsche,
que enxergam a necessidade de mudanças sociais
com a finalidade de, segundo os seus julgamentos,
estabelecer um novo tipo de sociedade, para Marx, e
um novo tipo humano mais forte, segundo Nietzsche.

6.4.Principais filósofos contemporâneos

Friedrich Nietzsche: o pensador alemão é um dos mais


característicos da contemporaneidade, por ter influenciado muitos filósofos e
correntes filosóficas importantes do século XX, como o existencialismo e o pós-
estruturalismo.
Martin Heidegger: o filósofo alemão estruturou uma crítica à técnica e
estabeleceu novo modo de se chegar a um conhecimento mediante uma nova
estrutura filosófica.
Theodor Adorno: também alemão, o pensador contemporâneo
questiona elementos políticos fundamentais da sociedade do século XX e
elabora uma crítica ao iluminismo.

FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO | Profa. Santana Xavier


Jean-Paul Sartre: um dos principais teóricos do existencialismo,
questionou o modo como o ser humano encarava a existência.
Simone de Beauvoir: filósofa existencialista e feminista, elabora as
primeiras teorias feministas do século XX, baseada no que ela chamou de
condição feminina.

Hannah Arendt: judia alemã perseguida pelo nazismo, falou sobre a


condição humana em meio aos conflitos globais e estudou profundamente o
totalitarismo.

Atividade 2 (em grupo):


Realizar uma pesquisa bibliográfica sobre alguns dos principais filósofos
contemporâneos e discorrer em sala sobre eles.

Michel Foucault: estudou os novos parâmetros da convivência


humana e da sociedade por meio da visão biopolítica, que são políticas
públicas que tratam da gestão e do controle tanto da vida quanto da morte.

7. A Filosofia da Educação e sua relação com a


Educação Brasileira Contemporânea

Infere-se, então, que o homem não é nada senão o que a educação faz
dele, não se pode negar o desenvolvimento tecnológico-científico da
humanidade assim como a importância de uma educação tecnológica.
Entretanto, é imprescindível resgatar a educação ético-moral e política na
formação do homem e suas bases reflexivas e indissolúvel da filosofia. A
cidadania é uma conquista que só acontece por meio da educação. A
dificuldade histórica de superar a condição de objeto manipulado, para atingir a
de sujeito consciente e organizado em torno de seus interesses expressa o
déficit de cidadania no mundo atual. O progresso da educação no âmbito da
sociedade é algo que sistematicamente precisa acontecer.
A situação atual da educação perpassa por diversos desafios e dilemas
que abarca desde a formação docente às práticas em sala de aula e à
sociedade como um todo, por isso a necessidade de se refletir acerca das
contribuições da filosofia na educação e/ ou da educação na sociedade.
Evidentemente, estamos circunstanciados de tecnologias, invenções e
descobertas diárias, que, através de investimentos em pesquisas, nos ajudam
a compreender o mundo a nossa volta. É comum não sabermos ou
esquecermos que, no passado, pouquíssimas pessoas tinham acesso à
educação. Apenas parte da sociedade detinham quase todo o conhecimento da
época.  
22

É praticamente impossível listarmos todas as contribuições da


educação para nossa sociedade, já que ela é a base de toda a nossa
civilização e seu desenvolvimento. Como exemplos, podemos citar os avanços
na medicina, que através de procedimentos, medicamentos e manipulações
genéticas, são responsáveis por quase duplicar a expectativa de vida humana;
o desenvolvimento de veículos de transporte, que "encurtaram" as distâncias
do planeta; a construção de casas prédios, e outras contribuições da
engenharia civil, que permitiu o aumento do índice demográfico em muitos
países; a tecnologia da internet, dos celulares, dos computadores e dos
aparelhos de televisão, que nos proporcionam a cobertura e divulgação de
acontecimentos ao redor de todo o globo, e facilita a comunicação entre
indivíduos distantes entre si.
É de extrema importância às contribuições da filosofia para o processo
educativo, bem como para a formação do indivíduo enquanto inserido na
sociedade, atribuindo a ele o poder de problematização e a visão crítica,
impulsionando o mesmo a ter a real perspectiva do mundo em que vive, bem
como as mudanças comportamentais e ampliação da consciência provenientes
dessa perspectiva, que contribuem para uma convivência sadio entre os
demais. Outrossim, cabe salientar a importância da valorização da filosofia na
grade escolar, como forma de incentivar os alunos a alcançarem o caminho da
prosperidade.

7.1.Contribuições da Filosofia para a Educação

A Filosofia oferece a reflexão para auxiliar nos problemas educacionais


que desafiam educadores, políticos, pais e a sociedade, como um todo. De
outro lado, a Educação, entendida num conceito amplo, oferece à Filosofia
problemas que se tornam cada vez mais complexos, inesperados e incertos
como a miséria, a fome, a violência, a corrupção, o individualismo, a
concorrência, a perda dos valores, a exclusão social e o analfabetismo. Apesar
dos avanços da ciência, das novas tecnologias, exigindo o novo “perfil” da
sociedade de um modo geral, persistem os velhos problemas acima citados,
orientando e desorientando a conduta e a educação do cidadão. Para esses
problemas, que na verdade são históricos e desafiam a atualidade, a Filosofia
da Educação contribui com um projeto filosófico.
Nesse sentido, o projeto filosófico para a educação da atualidade visa
tentar recuperar a falta de rumo e direção que a sociedade vem sofrendo,
dadas as exigências dos novos tempos, em que tudo se torna mercadoria, ou
seja, produto descartável e com prazo de validade. A título de ilustração, os
produtos eletrônicos, a TV, o celular, o vídeo, tudo vira produto descartável. É
contra essa lógica que persiste e insiste em fazer da própria vida do homem
um produto descartável que a Filosofia da Educação procura problematizar e
dar-lhe outro sentido, outra finalidade.
A Filosofia da Educação contribui com alguns questionamentos.
Considerando as exigências do século XXI, que tipo de homem a sociedade
está educando. Na verdade, podem-se antecipar várias interpretações que a

FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO | Profa. Santana Xavier


seguinte afirmação nos reservaria: o quê, a quem e como ensinar dependem
do “perfil” de cada ser humano que se pretende formar, que modelo de ser
humano se tem em mente.

8. Reflexão filosófica e práxis educacional

O trabalho docente é entendido como práxis que constitui a atividade


profissional. Ao mesmo tempo em que o educador desenvolve a sua atividade
profissional, contribui para que mudanças ocorram ao seu redor e,
simultaneamente, reconstrói-se pelas experiências. Nesse processo, ele
colabora com valores e práticas para a constituição identitária dos educandos.
Sendo assim, reafirma-se a relevância dos cursos de formação inicial,
tendo um papel fundamental no processo de (re)constituição da identidade
profissional dos futuros educadores. É nesse período de formação que muitos
educandos (re) constroem modelos, imagens, maneiras de ser, pensar e agir
na profissão. Logo, para Imbernón (2002, p. 60) apud André (2010, p. 126) “a
formação inicial pode contribuir para que o futuro educador construa uma
bagagem sólida nos âmbitos científico, cultural, contextual, psicopedagógico e
pessoal que deve capacitá-lo a assumir a tarefa educativa em toda sua
complexidade, atuando reflexivamente com a flexibilidade e o rigor
necessários”.
A sociedade contemporânea necessita de educadores comprometidos
com mudanças sociais – o desafio está em como fazer isso acontecer numa
sociedade globalizada que ganha dimensões cada vez mais complexas.
Refletir acerca dessa temática parece ser um discurso remoto, mas necessário,
visto que o educando dos dias atuais requer que o educador mude, busque
formação continuada junto com inovação e pesquisa.
A seguir, para a sua melhor compreensão é apresentado um esquema
sobre a formação do Educador, em que é necessário que este tenha o saber
da experiência, o saber pedagógico e o saber da disciplina.
24

Os desafios do
educador na
contemporaneidade são
inúmeros, a seguir é
apresentado pela
tempestade de ideias todos
os conceitos estudados até o
presente momento.
A docência é uma prática social que, para ser problematizada,
compreendida e transformada, precisa ser dialogada e construída nos
significados que emergem dos educadores e educandos que a concretizam
(VEIGA, 2014). Os desafios do educador são muitos, contudo Orso e
Lückmann (2015) sustentam que: A inovação na docência acontece quando: se
rompe com a forma conservadora de ensinar, aprender, pesquisar e avaliar; se
reconfigura saberes, procurando superar as dicotomias entre conhecimento
científico e senso comum, ciência e cultura, educação e trabalho, teoria e
prática; se explora novas alternativas teórico- -metodológicas em busca de
outras possibilidades de escolhas; se procura a renovação da sensibilidade ao
alicerçar-se na dimensão estética, no novo, no criativo, na inventividade; ganha
significado quando é exercida com ética (ORSO; LÜCKMANN, 2015, s/p.).
Quando se pensa em contemporaneidade, não há como negar que nas
últimas décadas sucederam novas formas de organização da produção, do
trabalho, de vida econômica e, consequentemente, no contexto escolar. Ao
educador instituem-se novos desafios, novas propostas vêm sendo planejadas
na busca de seu aprimoramento, bem como as transformações no mundo
contemporâneo aspiram profissionais com sólida formação reflexiva,
investigadora, criativa e que tenha um foco voltado para o raciocínio lógico do
educando; não mais fragmentada, superando a alienação, para que assim
possa focalizar uma educação de qualidade.
Podemos perceber o desafio que se coloca a uma educação que sonha
com a construção de um sujeito e uma sociedade crítica e democrática e o
aproveitamento de lacunas geradas pelas contradições atuais. Para isso, a
escola precisa acreditar na potencialidade da ação coletiva, em formação
continuada de seus educadores, para que eles possam quebrar paradigmas e
principalmente preparar os seus educandos para o futuro. Assim, construir-se-á
uma escola democrática, na qual a comunidade escolar pode apontar suas
necessidades, partilhar seus saberes e participar da construção de alternativas
que viabilizem as mudanças necessárias.

8.1.Relações entre abordagens e tendências pedagógicas da


educação: possíveis aproximações e contribuições.

Abordagens ou tendências pedagógicas são estudos teóricos ou linhas


de pensamentos vinculados ao processo de ensino e aprendizagem,
construídos ao longo dos tempos por diversos pensadores que se debruçaram
sobre o tema para explicar e fundamentar as relações que sustentam o
processo de ensino aprendizagem. Foram concebidas a partir de suas visões
de mundo, contexto histórico das sociedades em que estavam inseridos, tendo

FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO | Profa. Santana Xavier


como principal objetivo nortear o trabalho docente, adaptando-os a partir das
necessidades de ensino no âmbito social em que viviam. Neste sentido,
podemos dizer que as teorias, as concepções e as tendências pedagógicas
são as diretrizes que instrumentam e dão aporte para as ações de ensino e
aprendizagem na sala de aula, a partir de uma metodologia própria, levando
em consideração os diferentes aspectos sócio-políticos e ideológicos.
Segundo Rufino e Azevedo (2012), na área da Educação, há diversas
concepções, abordagens/tendências – algumas para criticar modelos
paradigmáticos tradicionais, outras para mantê-los, ou seja, nem sempre estas
perspectivas criticaram perspectivas anteriores. Estas concepções críticas ou
tradicionais resultam na prática pedagógica dos professores em sala de aula,
que, a partir de sua visão de mundo, experiências pessoais e, certamente,
conhecimentos, saberes e concepções advindas de seus cursos de formação,
vão buscar as referências para ancorar suas práticas. Porém, este
conhecimento não se apresenta como suficiente e, neste sentido, os
profissionais de educação acabam não fazendo uma reflexão de sua prática
docente.
A seguir, vamos analisar as abordagens tomando por referência os
conceitos utilizados por Mizukami (1986), a Abordagem Tradicional, a
Abordagem Comportamentalista, a Abordagem Humanista, a Abordagem
Cognitivista e a Abordagem Sociocultural, identificando elementos e correntes
teóricas que dão suporte para analisar o comportamento do professor em
situação de ensino e aprendizagem em sala de aula, na visão de Bordenave,
Libanêo e Saviani.

Síntese dos elementos relevantes encontrados em cada


abordagem
26

Fonte: Adaptado de Santos (2005) e Mizukami (1986).

9.Educação Libertadora enquanto Projeto Político-Social .

FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO | Profa. Santana Xavier


Segundo Santos (2005), a última abordagem apontada por Mizukami
(1986) é a abordagem sociocultural, tendo como objetivo incentivar a
consciência crítica do estudante. Nesta abordagem, o processo de ensino e
aprendizagem deve procurar a superação da relação opressor-oprimido, por
meio de propostas de socialização como oprimido e de transformação da
situação geradora de opressão, buscando o desenvolvimento de consciência
crítica numa relação dialógica entre educador e educando. A educação é
concebida como um constante ato de descoberta da realidade, por meio do
qual se percebe criticamente como se está sendo no mundo. Para Santos
(2005), o sentido da educação nesta abordagem é de formar o sujeito para
desenvolver seu posicionamento crítico perante as situações na qual ele vai
atuar.
28

Para Ribas e Moura (2006): Esta abordagem está centrada no estudo


do desenvolvimento humano enquanto um processo que se dá nas interações
sociais e foi bastante influenciada pelas contribuições de L. S. Vygotsky (1896-
1934). Esse autor propõe uma visão do desenvolvimento humano que destaca
o seu caráter inseparável das atividades sociais e culturais (RIBAS; MOURA,
2006, p. 130). Dentro desta visão, esta abordagem procura trabalhar o papel do
professor e do educando como agentes formadores fazendo uso de sua
criticidade, eliminando a situação opressor-oprimido. Professor e estudante são
vistos como sujeitos da aprendizagem, na qual o conhecimento é construído
em conjunto, levando em consideração o conhecimento e a experiência de vida
de cada sujeito.
No Brasil, um dos autores de maior referência neste tipo de
abordagem, que enfatiza aspectos sociopolítico-culturais, é Paulo Freire, com
sua preocupação com a cultura popular. O processo de ensino e aprendizagem
é mútuo, eis que o homem se vê como sujeito atuante no mundo e capaz de
transformá-lo para melhor. Esta concepção é a que mais se aproxima dos
referenciais teóricos da Educação do Campo. Segundo Santos (2005).
[...] Essa abordagem tem origem no trabalho de Paulo Freire e no
movimento de cultura popular, com ênfase principalmente na alfabetização de
adultos. Podemos caracterizá-la como abordagem interacionista entre o sujeito
e o objeto de conhecimento, embora com enfoque no sujeito como elaborador
e criador do conhecimento. Na abordagem sociocultural, o fenômeno 76 ·
educativo não se restringe à educação formal, por intermédio da escola, mas a
um processo amplo de ensino e aprendizagem, inserido na sociedade. A
educação é vista como um ato político, que deve provocar e criar condições
para que se desenvolva uma atitude de reflexão crítica, comprometida com a
sociedade e sua cultura. Portanto, deve levar o indivíduo a uma consciência
crítica de sua realidade, transformando-a e a melhorando-a. Dessa forma, o
aspecto formal da educação faz parte de um processo sociocultural, que não
pode ser visto isoladamente, nem tampouco priorizado (SANTOS, 2005, p. 23).
A abordagem sociocultural envolve o engajamento dos professores
com os aspectos sociais e políticos. Através de uma prática transformadora,
procurará fazer com que o estudante entenda seu papel social e político
desmitificando e questionando sua situação de sujeito oprimido e a cultura que
o domina. Nesta abordagem, o professor em conjunto com o estudante
organiza formas de valorizar a linguagem local e a cultura popular, criando
condições para que cada um deles analise seu contexto e produza cultura.

10. A crise atual da sociedade e da Escola

É possível afirmar que a população que hoje habita o planeta Terra


está vivenciando a maior crise de sua história. A pandemia provocada pela
Covid-19 atingiu a todos e, até dezembro de 2021 eram mais de 2 milhões de
contaminados apenas no Brasil.

FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO | Profa. Santana Xavier


Com altíssimo índice de contaminação e um número alarmante de
mortes, a pandemia exigiu o distanciamento social como única forma de
diminuir a rapidez do seu avanço e permitir um certo controle no atendimento
médico hospitalar das pessoas infectadas.
Mas esta pandemia não atinge a população somente com a ameaça
de sua sobrevivência física, ela ameaça também a sobrevivência social dos
homens. A crise instaurada se estende a todos os setores da sociedade, da
economia à cultura, das artes à produção industrial, da manufatura à
agropecuária, da alimentação aos transportes, das artes ao lazer, dos serviços
à produção de bens materiais, do sagrado ao profano.
A crise nas sociedades capitalistas se instaura quando os homens que
vivem nestas sociedades não conseguem resolver os problemas sociais que
eles próprios criaram. Com esta crise provocada pela Covid-19 não está sendo
diferente. Se, por um lado, a pandemia é provocada por um vírus, por outro, os
problemas sociais aflorados a partir dela são provocados pelo próprio homem.
A educação, depois da saúde, é o campo social mais atingido por esta
pandemia. Ao ser decretado o distanciamento social as escolas foram fechadas
e os agentes educacionais ficaram paralisados, sem saberem como agir. A
maioria das escolas públicas do mundo chegou ao final do primeiro semestre
letivo do ano de 2020 com as suas unidades de ensino fechadas. Algumas
dessas instituições, na segunda metade do mesmo ano, iniciaram timidamente
as aulas em regime remoto, por meio de tecnologias da comunicação.
Universidades e escolas de educação básica, particulares e comunitárias, em
sua grande maioria, iniciaram as aulas em regime remoto extraordinário logo
no início do isolamento social.
Mas as decisões tomadas foram e continuam sendo ditadas por
motivos políticos e empresariais. Se, por um lado, manter o isolamento social e
as escolas fechadas é uma questão de saúde pública, por outro, manter os
processos educativos em desenvolvimento, adotando alternativas que
possibilitem a participação de todos os estudantes é uma questão de política
educacional e, principalmente, uma questão que diz respeito à democracia.
Analisar esta crise, ainda em curso, não é tarefa fácil, o necessário
distanciamento histórico, nossas convicções, os discursos já formulados,
convicções já consolidadas, nos impediram de encontrar uma análise
operacional para o enfrentamento desta crise. Além disso, em momentos de
crise, quando os problemas sociais já existentes afloram e tornam-se explícitos,
os discursos ideológicos ganham grande recepção e circulação, polarizando as
opiniões.

10.1.Os desafios da crise na educação

Em primeiro lugar, devemos considerar que nas sociedades


capitalistas, em especial na maioria dos países pobres ou em vias de
desenvolvimento, a educação não é prioridade política dos governantes. Com
isso, a escola deixa à margem aqueles que não trazem em sua bagagem
intelectual o capital cultural e o capital financeiro que dão ao aluno as
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condições exigidas para acompanhar os programas que lhe são propostos no


percurso de sua escolarização.
Ainda que este discurso reprodutivista tenha sido criticado por seu viés
estruturalista na análise das hierarquias sociais, há que se concordar que a
escola, diante do aluno com algum tipo de dificuldade para acompanhar o que
lhe é proposto pelo professor, não sabe o que fazer com este aluno e,
deixando-o à margem, promove a sua exclusão do processo de escolarização
ou, aquele que nele permanece, passa a compor o contingente dos que
Bourdieu considerou como “excluídos do interior” (BOURDIEU, 2007, p. 217).
Em segundo lugar, mas não menos importante, a pandemia provocada
pela Covid-19 escancarou para o mundo as desigualdades sociais e, em
decorrência destas, as desigualdades educativas que já estavam postas. Não
foi a Covid-19 que instaurou os problemas que impedem o aluno pobre da
acompanhar o ensino por meio de plataformas virtuais.
A grande maioria dos alunos pobres já não conseguia acompanhar os
programas escolares com aulas presenciais, já tinha baixa frequência às aulas
e as escolas já não sabiam o que fazer com os alunos que, por suas precárias
condições materiais de vida, apresentavam dificuldade para atender as
demandas das escolas e passavam a compor os índices estatísticos de baixo
desempenho escolar.
Em terceiro lugar, no contexto histórico que estamos vivendo, com
todos os problemas sociais escancarados e agravados pela pandemia atual,
em especial com a saúde coletiva e com a educação pública, parece haver um
consenso de que não é mais possível pensar as ações educativas fora do uso
das tecnologias digitais.
Que estamos vivendo em uma era digital, ou em um tempo histórico
em que a tecnologia se faz presente no cotidiano da vida humana, não há
dúvida. Nesse contexto, a tecnologia digital passa a ser considerada como
nuclear e como determinante dos processos educativos escolares. Há um
discurso instaurado no campo da Educação que considera a tecnologia como
progresso a serviço da humanidade e da democratização da sociedade, como
algo que surge para beneficiar o homem e tornar mais fácil a sua sobrevivência
cotidiana.
Por ser parcialmente verdadeiro, este discurso se torna ideológico. Na
verdade, os avanços tecnológicos decorrem do progresso técnico necessário
para a continuidade dos processos de produção e, nos países capitalistas, este
aprimoramento técnico e tecnológico é condição necessária para o processo
de acumulação do capital.
Há um saber tecnológico mantido fora do alcance da maioria da
população, inclusive da própria escola, que se mantém como nicho à parte,
acessado por poucos e sob a tutela dos que investem capital financeiro neste
mercado. Há um poder econômico e um poder político de manipulação desse
mercado consumidor que cria o fetiche da tecnologia mantendo cativos seus
consumidores.

FILOSOFIA DA EDUCAÇÃO | Profa. Santana Xavier


Assim, as desigualdades sociais, as desigualdades educativas e a
avareza mercantilista na produção de tecnologias que criou um nicho de
mercado consumidor no campo da educação, agora ganharam dimensões
ainda maiores e estão na base dos problemas educacionais com os quais nos
deparamos neste momento de crise.
Na Educação, a crise atual vem promovendo alguns equívocos que
dificultam o entendimento das finalidades da educação escolar e das ações
docentes, afastando o professor do seu métier, ou dificultando o seu trabalho, e
deixando à margem do processo de escolarização a maioria dos estudantes.
Tais equívocos colocam em questão a própria sobrevivência das escolas.
Mais do que isso, coloca em questão a própria democracia, pois onde não há
escola não há democracia.

INFORMAÇÕES IMPORTANTES:
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11. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

ARANHA, M. L. de. Filosofia da Educação. 5.ed. São Paulo: Moderna, 2006.

CHAUÍ, Marilena. Convite à Filosofia. 14.ed. São Paulo: Ática, 2010.

GHIRALDELLI JUNIOR, Paulo. Filosofia e História da Educação Brasileira.


2.ed.São Paulo: Manole, 2009.

JARDIM, et al. Filosofia da Educação. Disponível no material didático: Filosofia da


Educação (JARDIM, et al, 2011) - Unidades I e
V; - http://pt.wikipedia.org/wiki/Filosofia_da_educa%C3%A7%C3%A3o. Acesso:
09/09/2022. 

LUCKESI, Cipriano Carlos. Filosofia da Educação / Cipriano Carlos Luckesi. – São


Paulo :Cortez, 1994. – (Coleção magistério 2° grau. Série formação do professor.
DISPONÍVEL EM:
http://www.biblioteca.sumare.edu.br/vinculos/PDF_OBRAS/3307_miolo.pdf

PORFÍRIO, Francisco. "Mito da Caverna"; Brasil Escola. Disponível em:


https://brasilescola.uol.com.br/filosofia/mito-caverna-platao.html . Acesso em 12 de
setembro de 2022.

RESUMO ESCOLAR. Disponível em


https://www.resumoescolar.com.br/filosofia/resumo-do-mito-da-caverna/ Acesso em
05/10/2022.

TIBALLI, Elianda Figueiredo Arantes. Crise da sociedade, crise da educação:


desafios políticos e perspectivas pedagógicas para a educação escolar. Revista
Educativa - Revista de Educação, Goiânia, v. 23, p. e8749, jan. 2021. ISSN 1983-
7771. Disponível em:
<http://seer.pucgoias.edu.br/index.php/educativa/article/view/8749/4972>. Acesso em:
10 set. 2022. doi:http://dx.doi.org/10.18224/educ.v23i1.8749

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