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NOTA DE ESCLARECIMENTO

Como o livro "Os Tutelados de Maria - Reuniões Mediúnicas de

Atendimento a Suicidas" , editado no ano de 2004, está esgotado, colocamos à

disposição dos interessados a versão digital da citada obra, porém com algumas

particularidades: os textos foram revisados conforme o novo Acordo Ortográfico

da Língua Portuguesa, bem como passaram por alterações, visando garantir um

melhor entendimento.

Esclarecemos, ainda, que a estrutura e o conteúdo da 1ª edição

foram mantidos.

Planaltina/DF, 30 de novembro de 2017.

Grupo Mediúnico de Atendimento a Espíritos Suicidas


Centro Espírita Maria Madalena (CEMA)
2
3

OS TUTELADOS DE MARIA
4

OS TUTELADOS DE MARIA
______________________

Reuniões Mediúnicas de Atendimento a Suicidas

Grupo Mediúnico de Atendimento a Suicidas do CEMA


5

Integrantes do Grupo Mediúnico de Atendimento a Suicidas que


participaram da Elaboração da Obra:
Daniel Magalhães de Lima
Edivan Coelho da Silva
Gonçalo Mourão Carlos
Halvécio Machado de Paiva
Nélia Gonçalves de Paiva
Rogério Caputo de Faria
Selma Abud Vieira

Projeto Gráfico
Éclat! Comunicação Ltda
61 - 447 6979

Impressão

Gráfica Edicel
61 - 485 1530

Dados Internacionais de Catalogação da Publicação (CIP)


__________________________________________________

Grupo Mediúnico de Atendimento a Suicidas do CEMA


Os Tutelados de Maria : Reuniões Mediúnica de
Atendimento a Suicidas - 1ª edição - Planaltina, DF, 2004.
244 p.

1. Espiritismo 2. Psicografia 3. Psicofonia 4.


Psicopictografia 1. Título

__________________________________________________

Índice para catálogo sistemático:

1. Espiritismo 133.9
6

Direitos de edição reservados ao Grupo Mediúnico de


Atendimento a Suicidas do CEMA
SUMÁRIO

A VISÃO DO SUICÍDIO AO LONGO DOS TEMPOS .............................................. 12


INTRODUÇÃO
Objetivo desta Obra................................................................................... 15

HISTÓRICO
O Centro Espírita Maria Madalena – CEMA................................................... 16

O Departamento de Divulgação e Artes – DDA ........................................... 16

Primeiras Vibrações pelos Espíritos Suicidas................................................ 17

Estruturação da Reunião de Vibrações........................................................ 19

A Reunião de Vibrações é Transformada em Reunião Mediúnica de


Atendimento a Espíritos Suicidas................................................................ 20

Primeiras Diretrizes para a Composição desta Obra...................................... 21

Dificuldades para a Elaboração e a Conclusão desta Obra............................ 22

Por que não ser uma Obra Psicografada..................................................... 23

Dinâmica para a Composição da Obra......................................................... 24


Os Mentores da Reunião Mediúnica de Atendimento a Espíritos
25
Suicidas....................................................................................................
O Grupo mediúnico.................................................................................... 26

Roteiro da Reunião de Atendimento a Espíritos Suicidas............................... 28

PRIMEIRA PARTE
O Suicida e as Modalidades de Atendimento................................................. 29

CAPÍTULO I
DESPERTANDO PARA A NOVA REALIDADE
1.1. O Resgate de Simão ........................................................................... 29
1.2. O Enforcado ....................................................................................... 31
8

CAPÍTULO II
SUICÍDIO ASSOCIADO ÀS DESILUSÕES AMOROSAS
2.1. Uma Estrada para Lígia ....................................................................... 34
2.2. No Repicar dos Sinos .......................................................................... 36
2.3. Um Dia...talvez ................................................................................ 40

CAPÍTULO III
HOMICÍDIO SEGUIDO DE SUICÍDIO
3.1. Nevoeiro de Ódio ................................................................................ 45

CAPÍTULO IV
O NIILISTA ANTE O SUICÍDIO
4.1. Reconstrução Perispiritual ................................................................... 49

CAPÍTULO V
SUICÍDIO ASSOCIADO AO FANATISMO RELIGIOSO
5.1. Equivocado Pastoreio .......................................................................... 52
5.2. Em Busca do Paraíso .......................................................................... 57
5.3. Engano Cruel ..................................................................................... 60

CAPÍTULO VI
SUICÍDIO POR USO DROGAS
6.1. Impossível Regresso ........................................................................... 66
6.2. Filhos do Abandono ............................................................................ 69
6.3. Uma Canção para Ivo ......................................................................... 73
Trechos da Carta Lida pelo Espírito Ivo........................................................ 75
6.4. Labirinto Mental ................................................................................. 77
9

CAPÍTULO X
O PRECONCEITO OBSTRUINDO O SOCORRO
10.1. Retratos do Passado ......................................................................... 93

CAPÍTULO XI
SUICIDAS EM ESTADO DE DEMÊNCIA
11.1. Brumas do Passado .......................................................................... 96

CAPÍTULO XII
SUICÍDIO INFANTO-JUVENIL
12.1. Carrossel Despedaçado ..................................................................... 101
Transcrição da Psicografia sobre o Suicídio de Serginho................................ 104
12.2. Acordes para um Despertar ............................................................... 105

SEGUNDA PARTE
Espíritos em Vias de Reencarnação.............................................................. 109

CAPÍTULO I
1. O Caso do Escritor ................................................................................. 109

CAPÍTULO II
2. Caso Adelaide ....................................................................................... 113

CAPÍTULO III
3. O Retorno de Pipoca .............................................................................. 116

CAPÍTULO IV
4. O Retorno de um Homossexual .............................................................. 120

CAPÍTULO V
5. O Retorno de Espíritos Suicidas Obsessores.............................................. 124

CAPÍTULO VI
6. Pablo, o Sedutor.................................................................................... 128

TERCEIRA PARTE
A PSICOGRAFIA NAS REUNIÕES DE ATENDIMENTO A ESPÍRITOS SUICIDAS................... 135
A Psicografia.............................................................................................. 135
10

1. CARTAS-DESABAFO
1.1. Depoimento Chamando a Atenção para o Perigo da ideia do
Suicídio...................................................................................................... 136
1.2. Depoimento de Filho Drogado, no Dia das Mães.................................... 137
1.3. Desabafo de Mãe................................................................................. 139
1.4. Carta-desabafo de um Trabalhador da Colônia Maria de Nazaré.............. 140
1.5. Carta desabafo – Suicídio por Desilusão Amorosa 1................................ 140
1.6. Carta–desabafo – Suicídio por Desilusão Amorosa 2............................... 142
1.7. Carta-desabafo de uma Enfermeira....................................................... 144
1.8. Carta-desabafo – Suicídio por Orgulho.................................................. 146
1.9. Carta-desabafo – Suicídio Infanto-Juvenil.............................................. 147

2. RELATO-SÚPLICA
2.1 Apelo para Renascer............................................................................. 149
2.2. Relato-súplica de uma Jovem Viciada.................................................... 149
2.3. Relato-súplica de Alguém que Cedeu à Sugestão de Espíritos
Obsessores................................................................................................ 150

3. MENSAGENS DE COLABORADORES DA EQUIPE ESPIRITUAL


3.1. Orientação para o Grupo...................................................................... 151
3.2. Mensagem de Fortalecimento nos Momentos de Crítica por ter sido
Criada uma Reunião Específica para Atendimento a Espíritos Suicidas............ 154
3.4. Mensagem de Alerta sobre a Necessidade da Realização do Culto no
Lar............................................................................................................ 154
3.5. Mensagem de Alerta............................................................................ 154
3.6. Mensagem de Encorajamento............................................................... 155
Uma Observação Importante...................................................................... 156
11

QUINTA PARTE
A ATUAÇÃO DA EQUIPE ESPIRITUAL NAS REUNIÕES DE ATENDIMENTO A ESPÍRITOS
SUICIDAS.................................................................................................... 178
Seleção dos Espíritos que serão Atendidos................................................... 178
Preparação para o Atendimento.................................................................. 179
A Ligação do Espírito com o Médium............................................................ 179
Preparação do Ambiente onde Ocorrerá a Reunião de
Atendimento............................................................................................. 179
Providências quando o Grupo Encarnado adentra a Sala onde se Processará
a Reunião.................................................................................................. 180
Dinâmica da Reunião.................................................................................. 181
Término da Reunião de Atendimento........................................................... 182

SEXTA PARTE
CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................................. 184
Urgência da Formação de Novos Grupos de Atendimento a Espíritos Suicidas 184
Pontos a serem Considerados para a Formação de Grupos de Atendimento a
Espíritos Suicidas ...................................................................................... 184
Detalhamento das Histórias ....................................................................... 186

SÉTIMA PARTE
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ........................................................................ 190
SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS PARA LEITURA......................................................... 193
12

Agradecimentos

A Deus, nosso Pai.


A Jesus, por ter confiado à Maria de Nazaré os filhos da desdita maior
para serem resgatados e conduzidos nas vibrações do amor incondicional (que
só as mães sabem ter) para os caminhos da renovação.
A Maria de Nazaré, por tê-los aconchegado ao Seu incomparável
coração de Mãe, tornando-se o Anjo Tutelar de todas as horas.
Aos Espíritos que confiaram a nós esta singela contribuição, que
poderá servir àqueles que desejarem se integrar à legião dos Servos de Maria.
Aos nossos familiares, nossos sustentáculos na Terra, diante das
provas que a reencarnação nos proporciona.
Em especial, aos Espíritos em tratamento que nos permitiram por meio
das suas dores, dos relatos dos sonhos desfeitos e das lágrimas com que
emolduraram as próprias histórias...
13

A Visão do Suicídio ao Longo dos Tempos

Em algumas sociedades, o ato suicida era visto como um ato de


bravura, chegando mesmo a ser incentivado em rituais religiosos.
Culturalmente, era tido como meio de se provar fidelidade a princípios atávicos.
Tal visão ainda é perpetuada por grupos que praticam atos terroristas, como os
que utilizam homens-bomba em seus atentados; bem como em certas seitas
religiosas espalhadas mundo afora que praticam o suicídio em massa.
Entretanto, ao longo da história da humanidade, é possível observar
também o repúdio e o desprezo aos suicidas - sentimentos advindos da
certeza, mesmo que inconsciente, de que somos eternos, de que a vida é uma
dádiva divina e de que não nos é permitido levar a termo uma encarnação. A
evolução
de sentimentos e atitudes define nossa condição de Espíritos, porém ainda é
tardia a nossa compreensão da alma humana. Isso fez com que a nossa
expressão de reprovação ao suicídio fosse tão cruel e desmedida ao longo dos
tempos.
Na sucessão dos séculos, os suicidas figuraram como criaturas sem
direito a funerais religiosos, dando-se aos seus despojos carnais um fim
punitivo lastimoso, como cortar a mão do cadáver e enterrá-la distante do
corpo; enterrá-los com uma pedra sobre a cabeça, o corpo e os pés e muitas
outras formas vexatórias de exposição pública que marcavam indelevelmente o
suicidado e seus familiares. Quando, porém, o ato não culminava na morte
física, aquele que a intentou, era marcado com a excomunhão da Igreja e com
o repúdio público.
14

Segundo Cassorla1, ainda na Idade Média, persistia o confisco dos


bens do suicida e o seu corpo era pendurado pelos pés, queimado e, após
isso, colocado em tonéis e jogado nos rios. Próximo aos nossos dias, em 1823,
na Inglaterra, ainda era hábito queimar o corpo do suicida nas encruzilhadas e
enterrá-lo com estacas fincadas no coração. Cassorla nos afirma também que
somente a partir dos séculos XVI e XVII é que houve uma diminuição da
repressão ao suicida, sendo que a Revolução Francesa, no século XIX, foi o
marco para que a Igreja viesse a se tornar mais tolerante em relação a essa
questão.
Atualmente, existe uma tendência religiosa de maior compreensão com
o suicida, porém, não desvinculada do juízo condenatório do ato. Na escola
das reencarnações, ainda hoje, esse registro de repulsa pelo suicida se faz
sentir, exteriorizando-se por meio de atitudes de indiferença, totalmente
desprovidas de caridade; seja por parte de muitos profissionais da área de
saúde que atendem às tentativas de suicídio com menor apreço que aos
demais casos; seja de profissionais da área policial, familiares e conhecidos,
num misto de indignação e desespero; seja no comentário maldoso e irrefletido
da multidão. Essa postura pode até mesmo estar presente, ainda que velada,
entre integrantes de reuniões mediúnicas de socorro a desencarnados que, na
censura oculta, impossibilitam amparo a esses desventurados. O registro
inconsciente a que nos referimos está arquivado em nossas almas, da mesma
forma que temos outros tantos registros que definem as nossas ações
cotidianas.
Somente agora, em todos os campos do saber, procura-se uma resposta
fidedigna para os atos destrutivos que muitos engendram sobre outros e
também sobre si mesmos. Estudos de profissionais das Ciências de Saúde e
das Ciências Sociais vêm colaborando para desfazer esses substratos mentais
de preconceito e desprezo, bem como a falta de auxílio especializado aos que
intentaram contra a vida, sem conseguir, no entanto, aniquilá-la.

1
ROOSEVELT, M. S. Cassorla. O que é o Suicídio, 4ª ed. São Paulo: Brasiliense, 1992, pág. 31, 101
p.
15

Vários programas de intervenção em crise psicológica e auxílio aos


familiares de suicidas vêm sendo desenvolvidos por universidades,
organizações não governamentais (ONGs), grupos religiosos, entre outros,
entre outros, numa tentativa de humanizar ações em torno desse drama, até
para que as religiões abram mais as suas portas para acolher os que estão à
beira do grande naufrágio.
É preciso que alijemos das nossas mentes esses resíduos mentais de
repúdio, pois a sobrevivência da alma após a morte do corpo físico e a doutrina
da reencarnação colocam-nos face a face com a efemeridade das posições
que assumimos no desenrolar das vidas sucessivas. À proporção que nos
elevamos na hierarquia da vida, despojamo-nos das impurezas da matéria e
das máculas incrustadas em nosso organismo espiritual pelo orgulho, pela
vaidade e pelo egoísmo. Quando atingirmos a perfeição, transfigurando-nos em
Espíritos Puros, fruiremos de inalterável felicidade, pois não mais estaremos
submetidos às necessidades e às vicissitudes da vida material. Isso significa
que a condição assumida pelo suicidado é transitória, pois nenhum Espírito
será eternamente suicida; ele está suicida.
As Casas Espíritas, como polos de divulgação e vivência do
Cristianismo Redivivo, necessitam ampliar os recursos socorristas aos que,
mesmo ante os apelos à continuidade da vida, aportaram na outra como
“clandestinos”2; para que eles possam encontrar alento em nosso coração, pois
também somos falhos e passíveis de outros tantos erros, enganos e atos
inconfessáveis, não nos sendo lícito, portanto, qualquer julgamento.
Como irmãos de caminhada, a fraternidade e a solidariedade
concitam-nos o amparo espiritual, assim como o auxílio aos familiares e o
esclarecimento. Que possamos dizer aos desertores da luta redentora: “Somos
irmãos, vamos juntos recomeçar! Maria vela por nós. Também já caminhamos
por esses caminhos e hoje estamos aqui novamente. A vida continua. Jesus
nos chama para uma nova oportunidade. O amanhã será diferente.
Confiança!”3

2
PEREIRA, Yvonne A. Memórias de um suicida..., op. cit., p. 133.
3
Palavras do doutrinador Olavo, integrante do nosso grupo mediúnico, em uma das reuniões de
atendimento aos suicidas.
16

INTRODUÇÃO

• Objetivo desta Obra


O quadro panorâmico da humanidade é aflitivo. A dor se alastra
intensamente pela Terra. Segundo estatísticas da Organização Mundial de
Saúde4 (OMS), cerca de 815 mil pessoas se mataram no ano 2000 em todo o
mundo – uma taxa de 14,5 para cada 100 mil habitantes. Isso significa um
suicídio a cada 40 segundos e 90 suicídios a cada hora. Da pequena parcela
mundial pesquisada, a cada dia, 2.160 Espíritos deixaram seus corpos físicos
de maneira abrupta e compareceram mutilados e ensandecidos diante da
verdade irrefutável de que ninguém pode fugir de si mesmo, pois somos
imortais. Eles são, antes de qualquer outra consideração, nossos irmãos.
Vários são os fatores biológicos, sociais, psicológicos e espirituais, entre
outros, que podem desencadear o suicídio, os quais não serão objeto de
estudo e análise nesta obra. Para aqueles que desejarem maior
aprofundamento sobre o assunto, sugerimos ao final, bibliografias
especializadas que poderão ser consultadas.
Deter-nos-emos ao fato em si e às diversas possibilidades de auxílio a
esses Espíritos no âmbito das reuniões mediúnicas, oferecendo os subsídios
necessários àqueles que estiverem dispostos a auxiliá-los.
Cabe registrar, ademais, que não tivemos com este livro qualquer
pretensão literária. A única pretensão é a de que as experiências aqui relatadas
possam servir de auxílio a todos aqueles que aspirem integrar-se ao grupo de
Espíritos que atendem em nome da Legião dos Servos de Maria 5,
disponibilizando os seus instrumentos mediúnicos para servirem de alívio aos
desventurados suicidas, pois, de acordo com relatos da própria Espiritualidade,

4
Relatório sobre a Saúde no Mundo, 2001 – Organização Panamericana da Saúde – Organização Mundial
de Saúde – ONU.
5
Designação dada aos trabalhadores da Colônia Maria de Nazaré no livro de PEREIRA, Yvonne A.
Memórias de um Suicida. 16ª ed. Rio de Janeiro: FEB, 1991, 568 p.
17

reduzido é o número de grupos mediúnicos que se dispõem ao exercício dessa


atividade.
O tempo urge, a hora é chegada! A charrua está pronta. Vasto é o
campo a ser arado.

HISTÓRICO

• O Centro Espírita Maria Madalena - CEMA


No dia 26 de junho do ano de 1961, no coração do Planalto Central, em
uma pequena cidade que se tornou berço da capital do Brasil – Planaltina - foi
criado o Centro Espírita Maria Madalena (Cema), com o objetivo de divulgar à
comunidade planaltinense a Boa Nova sob a ótica do Consolador Prometido.
Desde então, a Casa de Madalena converteu-se em mais um ponto de
luz para encarnados e desencarnados, fazendo-se representar por
trabalhadores que buscavam a prática do amor e da caridade.
Com o passar dos anos, novas vertentes de trabalho foram sendo
criadas, ampliando-se as possibilidades de divulgação da Doutrina Espírita, do
atendimento aos necessitados e da evangelização das criaturas.

• O Departamento de Divulgação e Artes - DDA


No ano de 1989, foi criado oficialmente o Departamento de Divulgação e
Artes (DDA) do Cema, regulamentando as atividades que já eram realizadas
pelo “Teatro Espírita Luzes da Esperança” (Teluzes) e pelo “Grupo de Canto
Maria Madalena” (GCMM).
Em outubro de 1988, o Teluzes estava ensaiando a peça teatral “Nascer
de Novo”, cujo enredo fora criado sob inspiração espiritual. A trama, baseada
no Evangelho Segundo o Espiritismo, capítulo IV, contava a vida de três
Espíritos em duas encarnações, mostrando que as provas e expiações vividas
por eles na última encarnação estavam diretamente relacionadas com a vida
pregressa dos mesmos, na qual se originaram todos os seus padecimentos.
18

As atividades do Teluzes eram divididas em três momentos: prece e


comentário do Evangelho Segundo o Espiritismo; estudo doutrinário do enredo
e o ensaio.
Durante os ensaios, integrantes do grupo começaram a sentir a
aproximação de Espíritos que, direta ou indiretamente, estavam ligados às
personagens, surgindo, assim, a necessidade de fazer preces pelos mesmos.
Entretanto, o grupo não se limitou a orar apenas por aqueles Espíritos; passou
a orar também por encarnados que estivessem na mesma situação das
personagens analisadas e interpretadas.
Decorridos não mais que três encontros em que tal procedimento fora
adotado, um Espírito se comunicou por meio de um dos integrantes do grupo, o
qual era também médium atuante da Casa Espírita, informando sobre alguns
fatos que estavam ocorrendo na esfera espiritual relacionados com o trabalho.
Cientificou a todos que, no decorrer dos ensaios, grande plateia espiritual se
achava na assistência, sendo composta de Espíritos que já haviam vivido
situações idênticas ou similares às retratadas. Entre aqueles Espíritos, alguns
tinham por objetivo ajudar os participantes do grupo na interpretação de seus
personagens; outros, entretanto, alheios à sua real condição espiritual, haviam
sido levados para o despertamento.
Ao findar-se a comunicação psicofônica, o grupo ficou bastante
emocionado com o incentivo à continuidade do trabalho que acabara de
receber, pois a expressão artística ali desenvolvida estava a serviço do
tratamento e da cura daqueles Espíritos.

Primeiras Vibrações pelos Espíritos Suicidas


Com o passar do tempo, o grupo começou a sensibilizar-se
especialmente com Espíritos suicidas. Após a estreia da peça teatral “Nascer
de Novo”, em dezembro de 1989, o grupo decidiu continuar com as preces;
mas, dali em diante, para os suicidas. Curiosamente, após essa decisão,
Espíritos suicidas começaram a se manifestar nas reuniões mediúnicas do
CEMA, tanto pela psicofonia como pela psicografia, justamente por intermédio
de médiuns que estavam integrados às atividades do DDA.
19

À época, o grupo mediúnico de desobsessão estudava o livro “O Céu


e o Inferno”6. Quando o estudo adentrou a parte das comunicações de
Espíritos suicidas, o intercâmbio com Espíritos pertinentes a esse grupo se
intensificou e sempre através de médiuns que integravam o Departamento de
Divulgação e Arte.
Faz-se necessário esclarecer que tal peculiaridade estava
diretamente relacionada com o manifesto desejo de os componentes daquele
Departamento auxiliarem os Espíritos suicidas, pois para esse serviço somente
são usados os médiuns que o aceitarem voluntariamente. Tal condição,
claramente estabelecida pela Espiritualidade7, relaciona-se com o fato de que o
suicida, em face da precariedade de seu estado, necessita da energia do
próprio médium8 para ser aliviado.
Em fevereiro de 1990, o TELUZES começou a preparação da peça
teatral “Por um Momento Apenas”, cujo enredo enfatizava a necessidade de
um olhar mais apurado sobre a evolução dos sentimentos na Terra, para que
julgamentos apressados não fossem feitos. Conclamava também à reflexão -
nem que fosse por um momento apenas - para que as esperanças pudessem
ser renovadas. O grupo, então, manteve as vibrações pelos suicidas que
passaram a ser mensais. Os atendimentos a Espíritos suicidas continuaram a
ser prestados periodicamente nas reuniões mediúnicas de desobsessão.
Embora fosse mais comum os grupos de suicidas com clichê mental relativos
aos momentos que antecederam ao ato desditoso, casos especiais também
eram levados para tratamento.
Em meados de março de 1991, em reunião mediúnica, um mentor
informou que alguns Espíritos que estavam sendo tratados por intermédio da
Arte seriam levados para exercitarem o seu aprendizado junto ao grupo
encarnado ligado ao Departamento de Divulgação e Artes. Além de adquirirem
valores ausentes em seu passado, suas experiências dolorosas serviriam de
aprendizado para o próprio grupo.

6
Kardec, Allan. O Céu e o Inferno. 52ª ed. Rio de Janeiro: FEB, 2003, 425 p.
7
PEREIRA, Yvonne A. Memórias de um Suicida. 16ª ed. Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira,
1991, Cap. VI., p. 138-141, 598p.
8
Idem, p. 140-141.
20

O acontecimento teve enorme repercussão no DDA, a ponto de


motivar o estudo sistemático da Arte Espírita como forma de auxílio a
desencarnados. Além disso, as atividades de vibrações pelos suicidas, que
naquela época já eram extensivas ao GCMM, foram melhor estruturadas. Três
meses depois, outra comunicação mediúnica informava que a Espiritualidade
Superior havia registrado a disposição do grupo, incentivando-o à
concretização de novos projetos.

• Estruturação da Reunião de Vibrações


No mês de novembro, ainda do ano de 1991, após a realização de
algumas vibrações dentro da nova proposta, cuja principal alteração foi a
reunião de todos os integrantes do Departamento de Divulgação e Artes em um
mesmo dia e horário, os mentores espirituais manifestaram o desejo de
estruturar o trabalho de vibrações pelos suicidas, uma vez que ele já estava
sendo feito por iniciativa do próprio grupo. Sugeriram, então, o estudo dos
livros O Evangelho Segundo o Espiritismo9 e Memórias de um Suicida10 , a fim
de que o grupo adquirisse o embasamento necessário para melhore
desempenhar as suas ações e para que a atividade de vibrações fosse dividida
em três partes: na primeira parte, vibrações pelos Espíritos no Vale dos
Suicidas ou locais similares na esfera espiritual para o despertar das
consciências; na segunda parte, vibrações pelos internos no hospital Maria de
Nazaré11 e demais organizações congêneres para o acreditar na renovação
interior; e, na terceira parte, vibrações pelos encarnados para suportarem as
provações. Cada um desses momentos poderia ser intercalado por uma
música12 cristã, de melodia suave, entoada pelo próprio grupamento como
doação de amor. Éramos, então, vinte componentes.

9
Kardec, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. 91ª ed. Rio de Janeiro: FEB, 1985, 456 p.
10
PEREIRA, Yvonne A. Memórias de um Suicida. 16ª ed. Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira,
1991, 568 p.
11
Idem, cap.III.
11
“A música representa importante papel na inspiração profética e religiosa. Ela dá o ritmo à emissão
fluídica e facilita a ação dos Espíritos elevados. É por isso que ela tem seu lugar nas reuniões espíritas,
nas sessões em que convém sejam precedidas por um hino apropriado às circunstâncias. Ocorre com
freqüência que os guias de grupos levam assistentes a entoarem um cântico, a fim de facilitar as
manifestações.” (DENIS, Leon. O Espiritismo na Arte. 2ª ed. Rio de Janeiro: Publicações Lachâtre, 1994,
caps. V, VI, p. 63-110.
21

Após aquela noite memorável, por três anos consecutivos (1992,


1993, 1994), no primeiro domingo de cada mês, o grupo estudou a bibliografia
recomendada, vibrou pelos suicidas e também por aqueles que estivessem em
situação de risco aqui na Terra.

• A Reunião de Vibrações é Transformada em Reunião Mediúnica


de Atendimento a Espíritos Suicidas
Em outubro de 1994, quando novas diretrizes espirituais foram dadas
para o trabalho, por vários motivos, o número de integrantes do grupo de
vibrações havia se reduzido significativamente. O grupamento contava, então,
com dez componentes.
A mensagem psicografada agradecia o auxílio prestado aos pupilos
de Maria – os suicidas – e enfatizava a dificuldade de arrebanhar medianeiros
para socorrer esses Espíritos, por meio da mediunidade direta; e que na Casa
de Madalena (CEMA) a equipe dos Servos da Legião de Maria obtivera a
aquiescência de médiuns para a realização desse tipo de atendimento.
Na sequência, a Equipe Espiritual solicitou que o trabalho, até então
de vibrações, fosse ampliado para reunião mediúnica, a qual poderia ser plena
e definitivamente implantada em três etapas: na primeira etapa, o grupo
deveria fazer um terceiro estudo do livro Memórias de um Suicida, dando
ênfase aos intercâmbios e auxílios descritos na citada obra e permitir a
comunicação de um único Espírito dentre os que seriam levados para
tratamento. Para tal mister, utilizar-se-iam de Franco, médium já afinado com o
atendimento a suicidas no trabalho mediúnico, bem como de Olavo,
doutrinador da reunião de desobsessão. Como este não fazia parte do
grupamento, deveria ser convidado a integrar a equipe de auxílio. Além da
experiência em sala mediúnica, demonstrara grande afinidade com o
atendimento a Espíritos suicidas nas reuniões mediúnicas de desobsessão do
CEMA, quando tivera a oportunidade de entrever com eles o diálogo fraterno e
elucidador. Os demais membros do grupo laborariam no auxílio vibratório ao
tratamento do Espírito e no estudo da terapêutica ministrada ao mesmo. Os
22

componentes do grupo deveriam, portanto, ser encaminhados aos cursos da


Casa Espírita, habilitando-se nos estudos da mediunidade.
Na segunda etapa, após seis meses de trabalho nos novos moldes,
as atividades deveriam ser avaliadas. Por fim, na terceira etapa, a equipe
espiritual se manifestaria sobre o auxílio a ser prestado pelo grupo em caráter
definitivo, cujo plano de trabalho deveria ser submetido à direção material da
Casa de Madalena, a fim de obter a permissão necessária para ser
concretizado. Antes de encerrar a mensagem, esclareceu que a equipe dos
Servos da Legião de Maria aguardaria a decisão do grupo se aceitaria ou não a
nova proposta de trabalho e que, caso a decisão fosse favorável, que o
grupamento fosse fixado e que fosse mantido o caráter de reunião mediúnica,
de acordo com o que preconiza as obras da Codificação Espírita. O grupo
exultou com as novas possibilidades de auxílio.
Em abril do ano de 1995, cumpriu-se a terceira etapa do planejamento
espiritual para atendimento a Espíritos suicidas: as diretrizes espirituais para a
fixação da reunião mediúnica em definitivo foram dadas. Além da estruturação
funcional, os integrantes do grupo foram distribuídos em funções específicas,
com as devidas orientações sobre o desempenho de cada uma.
Por motivos de ordem pessoal, houve um interstício em minha
participação no grupo de trabalho que se iniciou quando a reunião de vibrações
foi transformada, em caráter experimental, em mediúnica. Entretanto, este
interregno pouco durou, pois quando os mentores trouxeram as orientações
para que a reunião mediúnica fosse estabelecida em definitivo, caridosamente
eles me convidaram a retornar à equipe.

• Primeiras Diretrizes para a Composição desta Obra


Era janeiro de 1997. Primeiro domingo do mês. Primeira reunião de
auxílio do ano novo. Nosso grupo contava, então, com oito componentes. O
mentor Paulo, coordenador espiritual geral das nossas atividades, por
intermédio da psicofonia de Franco, informou-nos que o trabalho de auxílio, a
partir daquela data, entraria em uma nova fase. Deveríamos iniciar uma
reflexão profunda sobre tudo o que já havia sido realizado, com o objetivo de
23

aglutinar o material necessário para estudo do próprio grupo e também para


ser divulgado a outros grupos que se dispusessem a atender Espíritos suicidas.
Para tanto, as comunicações psicofônicas continuariam a acontecer, ao passo
que o atendimento seria intensificado através da psicografia. Concitou-nos à
humildade e ao sigilo sobre a nova tarefa, até que a mesma fosse concluída.
Esclareceu-nos, ainda, que a percepção de cada membro do grupo seria
ampliada, à medida que o trabalho fosse sendo desenvolvido.
No domingo seguinte, especificamente no dia 13 de janeiro de 1997,
reunimo-nos para iniciar os primeiros registros que comporiam esta obra.
Entretanto, não muito tempo depois, com a saída de mais um integrante, nosso
grupo foi reduzido a sete componentes; número este que se firmou até a
conclusão deste trabalho.

• Dificuldades para a Elaboração e a Conclusão desta Obra


Durante três anos (1988 – 1991), os integrantes do DDA fizeram
preces pelos suicidas. Do ano de 1991, quando a reunião de vibrações foi
estruturada e quando passamos a estudar a obra de Yvonne A. Pereira –
Memórias de um Suicida – até o momento em que ela foi transformada em
reunião mediúnica (1994), passaram-se mais três anos. De 1994 até 1996,
foram mais dois anos de estudo e labor. De 1997, quando recebemos as
primeiras diretrizes para composição desta obra até a sua conclusão, em 2004,
transcorreram-se mais seis anos, perfazendo assim, um total de quinze anos.
Naturalmente, durante esse período, muitos acontecimentos se deram na vida
dos integrantes do grupo. Alegrias, tristezas, dores, dificuldades, realizações...
Especificamente a mim, Clarisse, coube a responsabilidade de
escrevê-la. Não foram poucos os momentos em que eu, sentindo o peso do
compromisso, envolvia-me em pensamentos conflituosos, não me sentindo
capaz de concretizar o planejamento da Colônia Maria Nazaré. Às vezes,
sentia-me tomada por uma espécie de confusão mental e não conseguia o
ordenamento das ideias. Outras vezes, era como se fosse acometida por uma
paralisia mental, pois não sentia fluir nenhum tipo de pensamento, como se
minha mente nunca tivesse feito qualquer tipo de registro. Na maioria das
24

vezes, interrompia a escrita, questionando-me sobre o que havia sido


produzido até aquele ponto. Então, detinha-me, experimentando grande
angústia.
Em nossas reuniões mediúnicas, quando nos era dada a
oportunidade de questionamentos para possíveis elucidações sobre os casos
atendidos, ou mesmo sobre a obra a ser realizada, ao ouvir os mentores
reiterarem a importância da tarefa e da urgência em concretizá-la, entre
soluços que não conseguia abafar, confessava-lhes - e ao grupo também - os
meus sentimentos de incapacidade e o quanto não me sentia digna de
compartilhar de tão nobre empreitada.
Os mentores, no entanto, bondosamente, sempre me estimulavam a
prosseguir e a ter fé, afirmando que eu jamais estaria sozinha, pois os Servos
da Legião de Maria estariam ao meu lado, auxiliando-me. Quando submetia à
apreciação do grupo as páginas escritas e ouvia-lhes o parecer emocionado,
ganhava também ânimo novo para continuar. Mas, não somente eu passava
por dificuldades. Como se tratava de uma obra coletiva, as atribulações
pessoais vividas por qualquer um dos membros do grupo, fossem no campo
das enfermidades físicas, dos relacionamentos familiares, sociais, afetivos ou
financeiros afetavam direta ou indiretamente a execução da tarefa. Nos
momentos que pontuamos como de risco para nós mesmos, tivemos o amparo
e o auxílio da Colônia Maria de Nazaré por intermédio dos seus Legionários de
Amor. Além disso, em nossas reuniões mediúnicas, aprendíamos muito com o
relacionamento que mantínhamos com os nossos irmãos suicidas, granjeando
forças para as nossas lutas íntimas. Acima de qualquer coisa, porém,
prevalecia o nosso compromisso de oferecer a eles o melhor que houvesse em
nós para minimizar-lhes o sofrimento.

• Por que não ser uma Obra Psicografada


- Por que não ser uma obra psicografada? Inúmeras vezes fiz esta
pergunta, pois não conseguia entender o motivo pelo qual uma obra tão
relevante não chegasse até nós via psicografia. Não seria muito mais fácil? –
inquiria eu a todo momento.
25

Como nada fica sem resposta, embora muitas vezes não consigamos
percebê-la ou entendê-la, ela não se fez esperar. Em uma das nossas reuniões
de atendimento, quando o bloqueio em mim se fazia ainda mais fortemente
para a escrita, o mentor respondeu à pergunta que tanto me intrigava,
conforme transcrição a seguir:
(...) poderíamos psicografar uma obra, mas preferimos o retrato vivo de uma
situação possível na Terra, pois do contrário, uma obra psicografada traria tão
somente ideias de um trabalho a ser implantado; e neste caso, faltar-lhe-ia o
ornamento dos sentimentos e dos percalços que o grupamento enfrentou e essas
situações todas precisam ser ditas para que quando outros lerem-na, sintam que é
possível realizar o trabalho. E se um dia forem chamados a auxiliar outros grupos na
implantação de uma tarefa similar, não estarão contando algo que leram em um
livro, mas estarão falando de suas verdadeiras vivências. (...)”

Desde então, não toquei mais naquele assunto... Fortifiquei-me para a


tarefa, na certeza de que “o amor cobrirá a multidão de pecados”13.

• Dinâmica para a Composição da Obra


Todas as nossas reuniões eram gravadas em fitas cassetes; tanto as
comunicações dos Espíritos, quanto as avaliações que fazíamos ao final da
atividade. Em um domingo por mês, reuníamo-nos para estudar as fitas.
Nenhuma reunião mediúnica ficou sem que tenhamos feito a análise detalhada
dos seus acontecimentos.
No decorrer do mês, eu dedicava uma noite da semana para escrever
as histórias. Dentre os casos já analisados pelo grupo, selecionava um para
escrever sobre ele. Quando as primeiras barreiras foram rompidas, deu-se o
inusitado: eu vislumbrava as cenas que compunham a história que estava
sendo escrita; e, então, ia materializando-as, uma a uma, nas páginas em
branco que iam sendo preenchidas... relatava as peculiaridades... imprimia o
sentimento que minha sensibilidade era capaz de captar. Assim,
paulatinamente, todas foram sendo escritas... E quase sempre, acompanhadas
de muitas lágrimas. À medida que iam ficando prontas, eram submetidas à
análise do grupo.

13
I Epístola de Pedro 4:8.
26

É importante frisar que os casos foram divididos em grupos apenas


por questões didáticas e não por significar que cada caso esteja relacionado a
um grupo específico apenas; pois o mais comum é que uma mesma história se
encaixe em mais de um grupo.

• Os Mentores da Reunião Mediúnica de Atendimento a Espíritos


Suicidas
Embora soubéssemos que muitos Espíritos faziam parte da equipe
que era responsável pelo atendimento aos Espíritos suicidas em nossa Casa
Espírita, vamos designar aqueles que se apresentaram para nós ao longo dos
anos; não somente nos orientando na condução do trabalho, como também
nos consolando em momentos de dores e incentivando-nos nas nossas ações
no bem.
O Espírito Paulo era o coordenador geral da nossa reunião. Sempre
atencioso e cuidadoso, figurava-se para nós como um pai. Sentíamos por ele
grande respeito e admiração; ao mesmo tempo que a sua presença imprimia
em nós uma sensação de segurança. Sempre paciente, esclarecia nossas
dúvidas com bondade e respeito.
O Espírito Ricardo era o coordenador técnico das nossas atividades.
Muito firme em suas colocações, direcionava as nossas ações sempre que o
trabalho fosse sofrer qualquer alteração; além do que, era o responsável por
nos acompanhar nas horas que antecediam à nossa reunião. Na maioria das
vezes, ficávamos envergonhados quando ele se manifestava psicofonicamente
para nos alertar sobre a nossa invigilância. No entanto, sabíamos que zelava
por nossa segurança e harmonização, incansavelmente.
O Espírito Aloísio era o responsável pelos Espíritos vindos do
manicômio para estudo do grupo. Esclarecia-nos sobre a situação dos mesmos
e orientava-nos sobre os procedimentos adequados para atendê-los. Embora
tenha se comunicado poucas vezes em nossas reuniões, em função apenas
dos casos atendidos, granjeou de nós profunda simpatia pela dedicação
àqueles Espíritos enlouquecidos pela dor superlativa.
27

O Espírito Rosa era a representação da figura materna em nossas


vidas. Quanta doçura, meiguice e amor! Fora designada para nos amparar nos
momentos de dor. A sua presença em nossas reuniões era identificada por
Franco pelo perfume suave de rosas e pelo frescor de suave brisa.
O Espírito Marthan se manifestava com forte sotaque francês,
denunciando quão representativa havia sido a sua encarnação naquela
nacionalidade. Apresentou-se a nós como sendo o responsável pela
materialização desta obra, e que como tal, auxiliar-me-ia, pelos canais da
intuição, na sua escrita. Sempre que necessário, a sua voz inconfundível
ecoava em nossa sala, esclarecendo as minhas dúvidas, as dúvidas do grupo e
orientando-nos no que fosse necessário. Jamais eximiu-se de incentivar a mim,
particularmente, nos momentos de descrenças.

• O Grupo Mediúnico
Esclarecemos que os nomes sob os quais designamos a nós e ao
grupo são fictícios, a fim de que haja uma valorização maior dos conteúdos
aqui apresentados, do que das pessoas que foram instrumentos para a
concretização da obra. O nosso grupamento, no plano material, era assim
formado: Olavo e Estevão - médiuns doutrinadores; Lucíula e Franco -
médiuns psicofônicos, sendo que Franco era psicógrafo também; Laura -
médium psicógrafa; Marcos e eu - Clarisse – médiuns sustentadores.
Nesse ponto, entendemos ser necessário abrir um parêntese para
explicarmos a designação que acabamos de usar.
Nas reuniões mediúnicas, os médiuns que não são psicógrafos,
psicofônicos ou doutrinadores são denominados, por alguns autores, de
“assistentes”14; os quais têm suas potencialidades voltadas para manter a
harmonização do ambiente. Entretanto, em nossas reuniões de atendimento a
Espíritos suicidas, passamos a designá-los de médiuns “sustentadores”, pelo

14
JACINTHO, Roque. Doutrinação. 11ª ed. São Paulo: Editora Luz no Lar, 128 p.
PEREIRA, Yvonne A. Memórias de um Suicida. 16ª ed. Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira,
1991, Cap. VI, p. 163, 568 p.
16
FERREIRA, Aurélio B. Holanda. Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa. Editora Nova
Fronteira, 2ª edição, 1986, 1828 p.
28

fato de os mentores terem consagrado o uso desta expressão, incorporando-a


ao nosso “vocabulário”. Tal fato poderá ser comprovado por meio de algumas
transcrições que fizemos (psicofônicas e psicográficas) referentes a
orientações dadas pelos mentores aos médiuns “sustentadores”, no que tange
a forma de comportamento, procedimentos e preparação dos mesmos.
A nossa preocupação, no entanto, em usar a citada nomenclatura foi
enorme, em virtude, como já mencionamos, de não termos encontrado similar
expressão na literatura espírita consagrada.
Após várias discussões sobre o assunto, seguidas de posteriores
pesquisas em bibliografias específicas, recebemos, enfim, através da
psicografia de Franco, o esclarecimento necessário da equipe espiritual dos
Servos da Legião de Maria. O mentor Ricardo nos esclareceu que o termo
médiuns de “sustentação” foi por eles utilizada em seu sentido lato, ou seja, no
sentido de “soerguer, levantar, amparar”15; visto que na nossa reunião, além da
harmonização do ambiente, essa era a função específica dos médiuns
“assistentes”.
Elucidou-nos ainda que os médiuns assistentes também faziam o
trabalho de “sustentar” nas reuniões em que participavam; que a diferença
básica estava na clientela atendida, pois o Espírito suicida, dada a sua
condição e especificidade, exigia um trabalho mais direcionado dos
“sustentadores”, a fim de se viabilizar resultados mais positivos.
Mesmo depois do esclarecimento, atendendo a sugestão do próprio
mentor, continuamos buscando referências bibliográficas que pudessem apoiar
tal ideia. Após algumas pesquisas, encontramos a seguinte citação de
Emmanuel16 sobre o pensamento “Nossas emoções, pensamentos e atos são
elementos dinâmicos de indução. (...) Quando o pensamento, traduzindo,
assim, atividade anímica, reveste expressões de alegria e bom ânimo, de
entusiasmo e equilíbrio, semelhantes expressões se projetam no Tempo e no
Espaço e tomam o rumo da criatura em que pensamos, alcançando-a,

16
PERALVA, Martins. O Pensamento de Emmanuel. 5ª ed. Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira,
1994, p. 29-30, 232 p.
29

inevitavelmente. (...)”; que não apenas consolida o termo usado, como resume
de forma clara as potencialidades de que todos dispomos para auxiliar os que
sofrem.

• Roteiro da Reunião de Atendimento a Espíritos Suicidas


As nossas reuniões seguiam sempre o mesmo roteiro: a comunicação de
um mentor antes do atendimento, orientando-nos sobre os casos que seriam
trazidos para auxílio. Não demorou muito para entendermos que aquela práxis
estava em consonância com os objetivos da realização desta obra, já que
precisaríamos relatar nossas experiências para servirem de subsídios a outros
grupos que se dispusessem a atender Espíritos suicidas.
Foi assim que, logo que tivemos em mãos todo o material necessário à
composição desta obra, as comunicações dos mentores passaram a ser
esporádicas; possibilitando que um tempo maior pudesse ser dedicado aos
Espíritos a serem atendidos. Até então, a maioria dos casos nos era
apresentada rica de detalhamentos, com instruções específicas da terapêutica
a ser ministrada a cada um deles, demandando, obviamente, significativo
período de tempo.
Finda a fase de coleta de material, quando, então, já estávamos mais
adestrados no atendimento aos irmãos suicidas - após anos de estudo e de
preparação - passamos a trabalhar sem a comunicação constante dos
mentores. Os casos já não nos eram apresentados como antigamente, pois
embora devessem continuar sendo estudados, não tinham o mesmo fim a que
os outros se destinaram outrora: o de servir primeiro ao nosso aprendizado e a
composição desta obra.
30

PRIMEIRA PARTE

O SUICIDA E AS MODALIDADES DE ATENDIMENTO

Capítulo I

DESPERTANDO PARA A NOVA REALIDADE

1.1. O Resgate de Simão

Não havia mais tempo... O fogo dardejava línguas impetuosas por


todos os lados. Em um arrojo violento, rapidamente a tudo consumia. Os gritos
dilacerantes daquele homem eram abafados pelo ruído sinistro das chamas
famintas de destruição... Muito em breve, só existiriam cinzas e nada mais...
Os lampejos de lucidez de Simão eram obscurecidos pela loucura
advinda de não poder recuar, pois não havia mais tempo. A sua carne
queimava, provocando dores inenarráveis. Ante aquele padecimento, as
chamas pareciam ser eternas e inapagáveis, visto que consumiam a um só
tempo o seu corpo frágil e a esperança de que tudo, em breve, estivesse
consumado. Em meio àquele espetáculo pasmoso, surgiam em seus arquivos
mentais, à semelhança de flashes, doridas inquirições: “Não posso
compreender... Onde estão o esquecimento, a inércia e o desaparecer para
sempre? Por que esse estado fatídico se prolonga indefinidamente?”
Vivendo ininterruptamente essa situação, os gritos abafados de
Simão foram ouvidos na pequena sala, encontrando eco no coração amoroso
de todos os integrantes do grupo de auxílio. Após alguns minutos de
intercâmbio mediúnico, Olavo compreendeu que Simão vivia o clichê mental
dos momentos cruciantes do suicídio. Cônscio de que, neste caso, o diálogo
31

direcionado ao despertar do Espírito para a sua real situação por si só não


seria suficiente, piedosamente compartilhou da sua angústia e do seu sofrer,
oferecendo-se para socorrê-lo. Entrementes, mostrou-lhe a porta de saída e
ofertou as suas mãos para auxiliá-lo a sair daquela casa em chamas.
O nosso grupo, impregnado do desejo sincero de resgatá-lo daquele
padecimento atroz, mentalizou a porta aludida por Olavo. Qual não foi a nossa
emoção ao ouvir Simão gritar que, apesar das chamas, estava a visualizando.
Sofregamente, ele aceitou as mãos de Olavo, confiante de que iria, enfim, sair
de lá.
Quando Simão transpôs os umbrais da porta, acreditou que
milagrosamente poderia salvar a sua vida física. Fragilizado, deixou-se levar
daquele ambiente infernal, criado por sua própria mente, em decorrência do ato
suicida.
Com o objetivo de proporcionar-lhe um alívio imediato, mentalizamos
um manto balsamizante, com o qual envolvemos o seu corpo espiritual em
chagas... Ao sentir o suavizar das queimaduras, Simão se entregou ao sono
restaurador, pois não mais ouvimos qualquer lamento ou gemido. Em respeito
sacrossanto àquele irmão, velamos o seu sono por alguns instantes, até o
momento em que Olavo o entregou aos Servos da Legião de Maria, solicitando
que o recolhessem à Colônia Maria de Nazaré.
Quando estiver mais recuperado, certamente Simão compreenderá
que ele não conseguira salvar a sua vida física, como imaginara a princípio,
mas compreenderá que a vida é inesgotável e que uma nova etapa teve início
em sua trajetória de Espírito eterno.
É fato que, por tempo impreciso, as labaredas continuarão a consumir
a sua consciência espiritual. Entretanto, ele não estará sozinho... Mãos
abnegadas irão auxiliá-lo a reconstruir o ser derrocado, até que ele possa
recomeçar a sua jornada evolutiva.

***
32

O caso relatado retrata as condições em que se encontra a maioria


dos suicidas após o ato praticado; constituindo-se em um estágio inicial,
comumente chamado de “clichê mental”, o qual pode durar dias, meses, anos...
Tal estado foi muito bem explicado por Yvonne A. Pereira no livro “Memórias
de um Suicida”.
A importância de se tirar o Espírito dessa fase, prende-se a dois
motivos principais: 1) despertar o Espírito para a realidade do ato praticado, o
qual já foi consumado; 2) viabilizar o resgate do Espírito.
Em se tratando de reuniões mediúnicas, em alguns casos, faz-se
necessário conduzir o Espírito para que ele reviva o momento fatal; em outros,
como no caso relatado, tão somente retirá-lo do clichê, induzindo-o ao sono e
encaminhando-o para um posterior atendimento em Postos de Socorro da
Espiritualidade ou em Colônias Espirituais.
A justificativa para a diferenciação no atendimento está diretamente
relacionada ao grau de desequilíbrio em que se encontra o Espírito;
desequilíbrio esse provocado pelo ato do suicídio. No entanto, independente do
tipo de socorro que se dê ao Espírito, esse deverá ser movido pelo amor.

***

1.2. O Enforcado

Era noite alta, daquelas que parecem intermináveis àqueles que


acalentam a insônia inquietante. Túlio, encerrado no abismo de si mesmo, do
cume do monte, observava as luzes da cidade lá embaixo. O frio cortante
enrijecia os seus músculos. Os membros entorpecidos não obedeciam ao seu
comando mental. Num esforço sobre-humano, tentava inutilmente sair daquele
lugar. Sentia-se preso, sem possibilidade de libertação. Seus gritos de socorro
não chegavam a se exteriorizar, não encontravam eco no silêncio noturno, pois
não eram capazes de vencer as barreiras que separam os planos material e
espiritual.
O corpo de Túlio jazia inerte em cima do monte, dependurado em
uma árvore. O seu Espírito, em aflição profunda, não compreendia o motivo
33

pelo qual o seu corpo não reagia aos impulsos mentais emitidos. Em seu rosto,
a expressão de horror, a máscara da mais completa insanidade.
O enforcamento era uma realidade imutável e tornou-se uma carga
pesada em demasia, bloqueando a sua lucidez. Ele não podia compreender.
No entanto, admitia-se sozinho, necessitando de ajuda para voltar à sua casa e
retomar sua vida.
Há quanto tempo ele estava ali? Não sabia, pois perdera totalmente a
noção das horas e dos dias. Entretanto, a Misericórdia Divina que a nenhum
dos seus filhos deixa na orfandade, no momento adequado, conduziu Túlio ao
auxílio. Chegara o momento de ele despertar, de aceitar a verdade e iniciar a
reconstrução de si mesmo.
Entre brados de angústia e choro convulso, Túlio se manifestou em
nossa reunião. O seu panorama mental se restringia às luzes da cidade que ele
avistava ao longe e ao desejo incontrolável de voltar para lá. No entanto, à
medida que ele percebia que aquilo era impossível, por sentir-se preso àquele
lugar, sem saber a razão, mais e mais o seu desespero aumentava...
Olavo compreendeu que era preciso despertá-lo para a dolorosa, mas
inevitável realidade. Túlio precisava iniciar uma nova trajetória em sua vida.
Impregnando as palavras de grande doçura, característica sobressalente em
sua doutrinação, Olavo incitou-o a descobrir o motivo pelo qual ele estava
preso àquele lugar, sem conseguir voltar para casa. Decorrido algum tempo de
diálogo, sucedeu-se significativo silêncio. Na sequência, o bloqueio mental foi
rompido, pois Túlio levou a mão ao pescoço e, desesperadamente, sentiu o
laço apertado da corda a impedir sua respiração. Tudo lhe pareceu
interminável, pois de instante a instante, o laço mais se arrochava,
intensificando a sensação de sufocamento. Quando a agonia de Túlio alcançou
o auge, Olavo chamou-lhe a atenção para o barulho de passos que se
aproximavam. Alguém ouvira o seu clamor e iria tirá-lo dali.
Sintonizados com o trabalho da doutrinação, a sustentação
empenhava-se em dar forma viva às palavras pronunciadas por Olavo,
formando mentalmente os quadros de auxílio sugeridos. Por fim, oferecemos
as próprias mãos para que a corda fosse retirada do seu pescoço. Após a
34

remoção da corda, como que envolvido por ondas anestesiantes, Túlio se


entregou confiante ao grupo de auxílio, tal como criança nos braços da mãe.
Os Servos da Legião de Maria, vivendo a lição imorredoura de amor ensinada
por Jesus, cuidadosamente o levaram para a Colônia Maria de Nazaré 17.
Túlio, certamente, muitas vezes chorará diante da consciência
culpada. Entretanto, acalentará no âmago do seu ser a certeza de que está sob
a tutela de Maria e buscará a própria remissão ante a Justiça Divina. Nesse
esforço constante, fortificar-se-á para as lutas regenerativas num futuro
próximo, quando, então, não mais será resgatado de destroços, pois ressurgirá
mais reluzente das agruras vividas, podendo palmilhar uma nova estrada.

***

No primeiro caso relatado neste capítulo, o Espírito se encontrava preso


ao momento do suicídio, revivendo-o incessantemente, numa recusa patente
de encarar a nova realidade. Já no segundo, o Espírito bloqueou a sua
percepção para a ação cometida, necessitando do auxílio da doutrinação para
reviver o ato consumado.
Em reuniões mediúnicas (específicas de atendimento a suicidas ou
não), essa é a situação mais comum em que se encontram os Espíritos que
são acolhidos. Nesses casos, o procedimento mais utilizado para quebrar o
clichê mental é oferecer socorro ao Espírito, livrando-o da situação angustiosa
em que se encontra, à semelhança do que fez Olavo; ou induzi-lo a reviver o
ato insano, a fim de que se aperceba do que já ocorreu.

***

17
Como explicamos na Introdução a respeito de como este livro foi escrito, vislumbramos essa cena
quando escrevíamos a história de Túlio.
35

Capítulo II

SUICÍDIO ASSOCIADO ÀS DESILUSÕES AMOROSAS

2.1. Uma Estrada para Lígia

O crepúsculo descia sobre a Terra e, em breve, as sombras


envolveriam os seres viventes, cumprindo os desígnios do Criador. Lígia sentia
o coração opresso. A desesperança tornara-se uma figura forte, de proporções
avantajadas, e reinava soberana em sua vida. Na escuridão impassível,
sombras tenebrosas movimentavam-se em uma coreografia sinistra,
espreitando-lhe os movimentos, perseguindo-lhe o corpo cansado e
confundindo-lhe a direção a tomar. Ao seu redor, o silêncio favorecia o coro
sinistro das vozes íntimas que, mesmo abafadas em seu peito, gritavam-lhe a
desilusão sofrida. Não haveria mais alvorada...
− Que fazer agora? − perguntava a si mesma. Por que Júlio César
procedera daquela maneira? Quantas vezes, trêmula de emoção, escutara dele
juras de amor eterno? Como continuar vivendo, se a seiva que alimentava a
sua vida provinha daquele homem? Não, não conseguiria... Nada mais
importava. Sentia-se em vida a vegetar no vale da morte.
Com as dadivosas mãos que deveriam, ao longo dos anos, edificar
obras de amor e consolo, Lígia segurou, sem hesitação, o revólver. Submersa
em profunda letargia, comprimiu a arma contra o ouvido e, sem vacilação,
apertou o gatilho. Estava certa de que o estrondo descomunal faria calar para
sempre o eco das promessas ouvidas, que tudo se acabaria, enfim. Mas depois
sobreveio a dor insuportável, o sangramento em borbotões, a confusão mental
e a debilidade moral. Por fim, breve desfalecimento, seguido de angustiante
despertar.
O tempo passou a não mais existir para ela, pois o seu sofrer era
inalterável. O seu choro, antes convulso, passara a retilíneo lamento.
36

***

Não sabemos quanto tempo ela viveu essa situação após o suicídio.
Mesmo sendo meigamente acolhida por Olavo, recusou-se, a princípio, a
compartilhar a sua dor. Intimamente, já havia sentenciado a si mesma o
padecimento sem fim. Entretanto, aos poucos, aquela resistência foi sendo
vencida pelas nossas vibrações carinhosas.
Quando Lígia começou a relatar o seu drama, deixando-nos entrever
a sua fragilidade ante a desilusão amorosa, grande comoção se apoderou de
nós.
Para muitas mentes absorvidas pela realidade dos flagelos humanos,
o drama em foco poderia ser tomado à conta de futilidade. Cada ser é um
universo em si mesmo, não encontrando, na maioria das vezes, a
correspondência em outros universos-seres que o rodeiam. Dessa forma, o
respeito aos sentimentos das criaturas deve ultrapassar a visão restrita que
cada um tem sobre a vida e suas complexidades, pois os pontos de vista são
formados a partir daquilo que se é. Como ousar julgar ou mesmo questionar a
relevância do que é próprio de outro universo?
Já um pouco mais conscientes dessa realidade, nós, os Servos de
Maria − assim também são chamados os colaboradores encarnados −,
vibramos muito amor para auxiliar Lígia a resgatar dos destroços a esperança
e, assim, descerrar as trevas do seu coração. O tratamento que cabia àquele
Espírito era o de imprimir-lhe ânimo e coragem.
Olavo, então, falou-lhe da Bondade e da Providência Divinas que
permitem o raiar de um novo dia, após um período de sombras, oportunizando
a todos o recomeço. Disse-lhe que os sofrimentos são passageiros, pois são
como professores a ensinar a valorização do bem; que, como criatura de Deus,
ela havia sido criada para ser feliz, mas que, no entanto, a felicidade é uma
construção do dia-a-dia; que as pessoas erram, é verdade, mas que, em outras
oportunidades, elas poderão acertar; que a criatura deve ser, em primeiro
lugar, juíza de si mesma, mas não deve se julgar implacavelmente. Deve, sim,
ponderar todos os fatos e sentenciar a si mesma a possibilidade de retificação.
37

Enquanto Olavo falava, a sustentação dava vida às suas palavras,


mentalizando quadros bucólicos, nos quais se destacava a vida em toda
plenitude. No nascer e no pôr do sol, a certeza de que, a cada dia, novos
caminhos podem ser desbravados e outros horizontes podem ser buscados.
Por uma estrada infinita, margeada por gramíneas, flores e árvores, o vento
impulsiona o pólen para além do arco-íris, proclamando o milagre da vida...
Nessa cena simplória, mas grandiosa aos olhos sensíveis, a realidade
inalterável de que ninguém está sozinho e de que não caminhamos ao acaso.
Amorosamente, trabalhávamos na elaboração desses quadros
mentais, quando, de repente, percebemos que algo muito importante havia
acontecido... Lígia, com a voz embargada pela emoção, mencionou o nome do
seu avô. Era justamente aquela figura querida da sua infância que ela
vislumbrava caminhando em sua direção, pela estrada descrita. Impulsionada
pela força que só o amor é capaz de gerar, ela correu ao seu encontro e,
entregando-se ao seu carinho e à sua proteção, permitiu-se ser por ele
conduzida.
Naquele momento, Lígia deixou renascer dentro de si a esperança,
eliminando as trevas que imperavam sobre o seu coração. Ela voltaria a
acreditar na Humanidade, compreendendo que as pessoas são diferentes e
que poderia amar e ser amada novamente. Lígia iria, enfim, recomeçar a lição
da qual deveria abstrair o entendimento de que o amor é patrimônio legado por
Deus às suas criaturas e que terá as nuanças de acordo com a evolução do
coração que o sentir.
***

2.2. No Repicar dos Sinos

Helena era uma jovem bela, culta, inteligente e sensível. A excelente


educação que recebera, proporcionara-lhe o despertar da sensibilidade para as
artes. Aliada à educação intelectual, tivera rígida educação religiosa, cujos
preceitos, aquém da Bondade Divina, serviram de amarras à sua consciência
milenar.
38

Certa vez, conhecera um rapaz. Não resistindo ao magnetismo do


seu olhar e da sua voz, enamorou-se perdidamente por ele. Prontamente foi
correspondida em seu afeto, iniciando-se assim mais uma história de amor com
um “possível” final feliz. Amavam-se perdidamente, faziam planos e idealizaram
uma vida em comum.
Entretanto, um dia, sem saber o porquê, Helena foi subitamente
abandonada por ele. À mercê do desengano, o seu mundo interior ruiu. Entre
os destroços de uma felicidade aniquilada, ergueu um trono obscuro e rendeu
culto à dor suprema. Entregando-se aos braços da morte, apunhalou o próprio
peito.
Ao se comunicar em nossa reunião, o choro conturbado a impedia de
se exprimir, delatando-nos quão grande era o seu sofrimento. Aos poucos,
fomos compreendendo que os dogmas que embasaram as convicções
religiosas de Helena agravaram o seu estado íntimo, impossibilitando qualquer
forma de auxílio. Em sua retina espiritual, reluzia fortemente a condenação pelo
ato praticado, para o qual jamais haveria perdão18.
Olavo procurou dissipar a névoa que cobria aqueles olhos espirituais,
falando da Bondade Divina que a nenhuma de suas criaturas abandona.
Relembrou a parábola da ovelha desgarrada19 que motivou o pastor a procurar
incansavelmente por ela para reconduzi-la ao seu rebanho.
Tínhamos consciência do quanto seria difícil dissuadi-la do quadro
mental em que se emoldurara. No entanto, sabíamos também que a
Espiritualidade Maior tomara as providências necessárias ao seu despertar; e
que a nós competia a doação de fluidos a seu favor. Elaborando mentalmente
a imagem de Jesus, pastor das nossas almas, aguardávamos o desfecho
daquele atendimento.
Em dado momento, quando Olavo discorria mais firmemente sobre
esperança e recomeço, Helena gritou, pedindo que alguém impedisse os sinos
de repicarem. Em seguida, porque estariam ainda a tocar insistentemente, da

18
Segundo a convicção religiosa de Helena, o suicídio era tido, naquela época, como ato imperdoável aos
olhos de Deus e quem o cometesse não teria sequer o direito a um enterro cristão e estaria condenado às
penas eternas.
19
Lucas, capítulo 13, versículos 3-7. Bíblia Sagrada (versão digital). Seafox/Terra Santa/James
King/Vozes, 2005.
39

súplica passou à desesperação, sentindo-se enlouquecer. Depois, quase


extenuada, rogou que alguém fizesse alguma coisa, pois depois do que fizera,
não mais poderia entrar no recinto sagrado.
Intuitivamente, Olavo compreendeu que era preciso convencê-la a
entrar na igreja, para que os grilhões que a aprisionavam aos dogmas
religiosos pudessem ser partidos. Confiante que não estava sozinho no
trabalho a realizar, o doutrinador argumentou, motivando-a entrar na igreja.
Enquanto Helena se debatia no torvelinho da indecisão, assentindo e
recuando ao mesmo tempo, o planejamento espiritual para o seu despertar se
encaminhava para a finalização. Exclamações de deslumbramento revelavam
que os acordes de um órgão − oriundos do interior da igreja − eram ouvidos por
Helena, ao mesmo tempo em que ela verbalizava que um coro de vozes
entoava a sua música predileta, a mesma que ela gostava de cantar quando
também fazia parte dele.
Assim, não resistindo ao encantamento operado por aquela música,
ela finalmente entrou na igreja. Qual não foi a sua surpresa ao deparar com a
figura amorosa do seu avô envolta em um facho de luz. Extremamente carente
de aconchego, correu ao encontro daqueles braços, sentindo-se menina outra
vez. O reencontro de Helena com o avô era o elo que faltava para que o
socorro se concretizasse, uma vez que ele representava o retorno de Helena-
mulher à Helena-menina, retorno esse que faria revivescer dentro dela a
fragilidade infantil, sem culpas ou medos. Isso era fundamental para que a sua
crença na humanidade começasse a ser reconstruída, possibilitando-lhe a
ascensão espiritual.
Ante as indagações silenciosas do nosso grupo sobre o motivo pelo
qual o resgate de Helena fora feito por seu avô, ao fim do atendimento, por
meio da psicofonia, um mentor nos esclareceu sobre o fato.
Há muito tempo a mãe de Helena estava trabalhando no
planejamento do resgate da filha, pois ela mesma não poderia ajudá-la, visto
que a figura materna representava para a consciência culpada de Helena a
cobrança de uma responsabilidade não cumprida, agravando os sentimentos
de culpa e de vergonha da jovem. O avô − por tudo que significava para ela: a
40

doçura, a dedicação, o carinho, o aconchego, a proteção e a compreensão – foi


o instrumento de auxílio escolhido. Ele permaneceria ao lado dela, na fase
inicial de adaptação à nova realidade.
Este último pormenor não necessitaria ser comentado se o avô de
Helena fosse um trabalhador da Colônia Maria de Nazaré, mas esse não era o
caso. Portanto, com a aquiescência de Maria, todas as providências foram
tomadas para que ele pudesse ficar ao lado da neta durante o tempo que fosse
necessário.
Não nos foi dado conhecer as providências tomadas e nem recursos
empreendidos para que tal fato se desse. Não obstante, tal revelação concitou
em nós toda a grandeza daquela que acolhe em seus braços generosos os
filhos do infortúnio. Para nós, que apenas ensaiamos as primeiras lições na
escola do Amor Universal, o trabalho realizado naquela colônia de amor − onde
a renúncia e o altruísmo alcançaram níveis inimagináveis – suscita-nos
profundas reflexões...

***

Em ambas as histórias − “Uma estrada para Lígia” e no “No repicar


dos sinos” –, existem alguns pontos convergentes que achamos por bem
comentar.
As narrativas falam-nos da fragilidade de duas jovens que, diante de
uma desilusão amorosa, não mais viram perspectivas em suas vidas. Apesar
de não termos as datas precisas em que os fatos ocorreram, podemos inferir
que, à época em que se deram, o papel da mulher na sociedade ainda se
restringia à subserviência ao marido, ao lar e aos filhos. Portanto, a deserção
pelo suicídio poderia ter sido motivada pelos padrões culturais definidos para a
figura feminina. O resgate das duas jovens foi feito por seus respectivos avôs,
denotando a rigidez com que foram educadas. Eles, os avôs, preenchiam o
espaço vazio de afeto deixado pela educação ministrada pelos genitores.
Analisando esses dois aspectos, poderíamos deduzir que, diante das
imensas modificações que se operaram em nossa sociedade − quanto ao
41

papel das mulheres e à educação a elas ministrada −, o suicídio por desilusão


amorosa seria uma possibilidade remota nos dias atuais. No entanto, tal
premissa não é verdadeira, pois tais fatos podem ser encontrados nas páginas
dos noticiários com muita frequência.
Muitas vezes, tal modalidade de suicídio é motivada pelo amor mal
sentido, traduzido nas expressões de “amor-posse”; e, quando não
correspondidos, em expressões de “amor-ódio”. Assim, as suas exteriorizações
poderão ser de vingança ou de descrença com a vida.
Se hoje a religião vê com olhos mais complacentes a atitude
desesperada daqueles que não mais veem perspectivas na vida, a sociedade,
em contrapartida, lança um olhar fulminante de indiferença sobre essas
pessoas.
Faz-se imprescindível, então, que a nossa luta em prol da vida se
intensifique! Que a bandeira da solidariedade tremule em cada coração,
acenando àqueles que estão deprimidos e desesperançados. Que não
menosprezemos a dor alheia, por mais banal que nos pareça. Troquemos as
frases “Isso passa”, “Isso não é nada” por uma escuta mais atenta.
Consolemos, auxiliemos e esclareçamos à luz do Evangelho. Maria espera em
nós!

***

2.3. Um dia... talvez

O sol começava a se pôr. Em breve, a escuridão cobriria a Terra,


dissimulando as mazelas que, como ervas daninhas, se proliferavam ao sabor
das desigualdades sociais e da indiferença coletiva.
A igreja estava lotada e todos trocavam olhares inquiridores entre si...
A música tocava insistentemente. Para a alma sensível de Isabel, ao mesmo
tempo em que parecia prenunciar terrível desgraça, parecia zombar da
situação constrangedora a que estava exposta. Os acordes daquela melodia
haviam perdido o encanto, transformando-se em instrumentos de tortura e de
agonia.
42

A espera parecia secular... Os minutos passavam pesados,


arrastados... Por fim, a certeza de que Gustavo não chegaria... Não suportando
a pressão daquela situação, tresloucadamente Isabel fugiu da igreja.
Ao chegar à sua casa, no auge do desespero, dirigiu-se à cozinha e
lá, ainda vestida de noiva, embebendo de álcool a sua vestimenta, ateou fogo
ao próprio corpo. O sonho transformara-se em pesadelo.
Ouvíamos o relato daquela criatura, cujo padecimento moral
superava o trauma do próprio ato suicida, buscando aconchegá-la mentalmente
ao coração, pois compartilhávamos da sua desventura como amigos que
aprenderam a cultivar, ao longo da convivência, a flor da amizade sincera. Em
verdade, sentíamos como se o seu drama fosse um espelho trincado, no qual
mirássemos nossas lutas íntimas, tantas vezes fracionadas pela fraqueza e
pelo imediatismo, colocando-nos no limiar de um grande e perigoso abismo – a
exemplo do que afligia Isabel. É certo que os motivos não importam, pois serão
sempre frutos da nossa pusilanimidade, precipitando-nos ao mesmo precipício,
onde haverá “pranto e ranger de dentes”20.
Olavo exortou o Amparo Divino, a fim de que pudesse ser o portador
de esperança para Isabel. Como ela estivesse prisioneira dos fatos que fizeram
a história daquele dia fatídico, o diálogo se encaminhou para a conscientização
de que era preciso esquecê-los, substituindo-os por planos a serem
executados em futuro próximo. No entremeio da conversação, sem qualquer
censura ao noivo desertor, Olavo chamou a atenção de Isabel para o fato de
que, um dia, ela tomaria conhecimento dos reais motivos que impediram
Gustavo de recebê-la como esposa querida; e que, portanto, confiasse e
aguardasse.
A doutrinação, por experiências vividas anteriormente no tratamento
de casos semelhantes, persuadiu Isabel a voltar ao tempo de menina,
sugerindo-lhe gratas lembranças da sua infância. Era imperioso, na presente
situação, que o seu passado fosse reconstruído, para que, aos poucos, ela
pudesse edificar novamente a crença nas pessoas. Eu e Marcos
trabalhávamos atentamente na formação dos quadros sugeridos por Olavo, a

20
Mateus, capítulo 25, versículo 30. Bíblia Sagrada, op. cit.
43

fim de que eles pudessem se materializar ante a visão espiritual de Isabel,


quebrando as imagens dos acontecimentos funestos que haviam se
cristalizado em sua tela mental. Decorrido o tempo necessário ao atendimento,
visto que Isabel silenciara, Olavo, em fervorosa prece, entregou-a aos cuidados
daqueles que, amorosamente, laboravam em nome de Maria.
Ainda estávamos envolvidos pela emoção que o caso de Isabel
provocara em nós, quando outro atendimento teve início através do aparelho
mediúnico de Franco.
Inicialmente, ele murmurava vocábulos incompreensíveis para nós,
entremeados por doloroso pranto. Aos poucos, no entanto, fomos
compreendendo que ele falava de um compromisso importante para o qual não
chegara a tempo de cumprir: um casamento... o seu casamento! Para nossa
surpresa, tratava-se de Gustavo, o noivo de Isabel.
Gustavo repetia, seguidamente, que não tinha sido culpado de não
ter chegado a tempo para a cerimônia. Mas, intimamente, condenava-se e
desesperava-se por não poder reverter a situação.
Compreendendo o triste dilema daquele Espírito, Olavo falou-lhe de
esperança, de novas oportunidades e do zelo amoroso do Pai Celestial, que
permite que seus filhos reconstruam os projetos que ruíram em função dos
equívocos por eles cometidos. Portanto, chegaria o dia em que ele, Gustavo,
reencontraria a sua amada e poderia, então, explicar a ela tudo o que
acontecera.
Em um dado momento do diálogo, Gustavo, sentindo-se encorajado,
perguntou por Isabel, desejando saber onde ela estava. Olavo, então, disse-lhe
que ela estava bem e amparada, que, se ele quisesse ajudá-la também,
precisaria recuperar o próprio equilíbrio.
Naquele instante, Gustavo sentiu-se envolvido pelo perfume habitual
de Isabel... Percebemos, assim, que a equipe espiritual responsável pelo
socorro àquelas duas almas estava manipulando a fragrância usada por Isabel
para resgatar Gustavo. Louco de saudade e exaurido da busca improfícua, ele
começou a inalar sofregamente aquele odor e, aos poucos, foi se aquietando.
44

Dessa forma, curiosamente, aqueles dois Espíritos − Isabel e Gustavo −,


embora presentes à mesma reunião, não conseguiram perceber um ao outro.
Conforme as explicações do mentor ao final da reunião, via
psicofonia, o perfume de Isabel fora sentido por Gustavo, não porque ela
estivesse no mesmo ambiente que ele, mas porque fora o recurso usado para
auxiliá-lo. Esclareceu-nos, ainda, que o desencontro estava previsto no plano
reencarnatório do jovem casal, que, infelizmente, não conseguira vencer a
prova. Ela, ferida em seu orgulho de mulher preterida aos pés do altar, não
conseguira esperar por uma explicação e se suicidara. Ele, por não ter
chegado a tempo para o compromisso firmado e por ver a mulher amada
morta, não suportara a dor moral e fizera o mesmo.
Não se pode precisar nem quando e nem em que situação eles se
encontrarão novamente. O fato é que a atitude insana de ambos dificultou,
sobremaneira, a oportunidade de eles estarem juntos novamente. Mas, em
verdade, é da Lei que toda causa tem um efeito, que o amor é força suprema
que subsiste às intempéries originárias do orgulho e do egoísmo. O amor
redime, sempre e sempre.

***

Pairavam ainda no ambiente as vibrações emitidas aos irmãos atendidos.


Grande emoção persistia em nosso coração, quer fosse por termos
compartilhado do drama vivenciado, quer fosse pela oportunidade de
testemunhar, mais uma vez, a Bondade de Deus que, como Pai Amoroso,
jamais abandona os filhos que se desviam do caminho traçado por Ele.
O caso apresentado ao grupamento, naquela noite, era inédito: dois
Espíritos que se debatiam nas mesmas dores, interligados por grande amor,
mas, contraditoriamente, separados por colossal abismo, cavado em nome
desse mesmo amor. Duas vidas, dois destinos seguindo estradas paralelas,
cada qual envolvido nas próprias trevas e ambos condenados à penosa
solidão.
45

A Misericórdia Divina mostra-nos, porém, que as penas não são


eternas e que mesmo os filhos reincidentes em erros seculares serão
reconduzidos a novas estradas, de onde poderão reiniciar a caminhada.
Lucíula relatou ao grupo as impressões que teve no dia anterior à
reunião, quando foi acometida por profunda tristeza. Após o intercâmbio
mediúnico, compreendeu que a melancolia que sentira era decorrente da
aproximação do Espírito Isabel. Informou-nos, ainda, que momentos antes da
comunicação, por intermédio do seu aparelho mediúnico, pôde ver uma moça
em uma cadeira de rodas sendo conduzida até a nossa sala. Era Isabel.
Franco contou-nos que, durante a comunicação de Isabel, por mais
que tentasse, não conseguia se concentrar, pois já estava sentindo a forte
presença do Espírito que iria se comunicar por meio do seu aparelho
mediúnico. Curiosamente, teve a impressão de que tal Espírito teria uma
ligação com Isabel. Refletiu, intimamente, sobre essa situação, não sabendo ao
certo se ambos iriam se comunicar entre si. Entretanto, por meio da audiência,
um mentor lhe esclareceu que isso não poderia se dar, pois se tratava Espíritos
suicidas em profundo desequilíbrio. Como tais, a própria onda energética que
os envolvia, produzida pela consciência culpada, não permitiria que um
captasse a presença do outro. Assim, o reencontro poderia se dar só mais
tarde. Após receberem o tratamento adequado, tais barreiras, aos poucos,
iriam se desfazendo.
Marcos e eu, no decorrer de todo o trabalho, procuramos imprimir
ânimo e esperança aos irmãos comunicantes, mentalizando quadros cheios de
luz, vida e alegria. Também compartilhávamos da dor que sentiam, colocando-
nos na posição de “Cirineu”, no momento em que ele ajudou Jesus a carregar o
madeiro até o gólgota21.

***

21
Mateus, capítulo 27, versículo 32. Bíblia Sagrada, op. cit.
46

Capítulo III

HOMICÍDIO SEGUIDO DE SUICÍDIO

3.1. Nevoeiro de Ódio

Os dramas interiores em que as criaturas se debatem na rotina dos


seus dias são frequentemente temas dos noticiários policiais. Na maioria das
vezes, servem de assunto para o bate-boca comum, provocando nos leitores e
ouvintes as mais diversas reações: a crítica maliciosa, a indiferença, a revolta,
o desdém e a comiseração dos mais espiritualizados. No entanto, como fogo
ateado à palha seca, a tragédia do dia é facilmente esquecida, sendo
substituída no dia seguinte por outra, de iguais ou maiores proporções. O fato
agravante de tudo isso é que essas tragédias, ao contrário do que prega o
materialismo, têm continuidade no além-túmulo, quando os seus protagonistas
são absorvidos pelas próprias trevas interiores e dão vida ao “ranger de
dentes”. Mas a Bondade e o Amor Divinos, que a nenhuma de suas criaturas
deixa deserdada, abrem os braços misericordiosos aos infratores das sagradas
leis. Foi assim que o drama de Elaine foi relatado ao nosso grupo pelo mentor,
pois havia chegado o momento de subtraí-la do seu inferno interior.
Elaine, jovem esperançosa e sonhadora, idealizou um lar feliz, onde
pudesse amar e ser amada, e alicerçou no companheiro as bases da sua
felicidade. Entretanto, sem poder compreender o porquê, percebeu que tudo
não passara de um sonho, por longo tempo acalentado. A felicidade foi se
tornando, a cada dia, uma tênue miragem de contornos incompreensíveis,
enquanto as facetas de uma realidade incontestável foram se definindo com
mais clareza, torneadas pela decepção e a amargura. Cansada dos ultrajes
recebidos daquele a quem confiara a vida, entregou-se languidamente ao
desespero, tirando a vida do marido, a dos filhos e a sua própria.
47

O marido, totalmente atordoado, ao chegar ao plano espiritual e


tomar ciência dos fatos ocorridos, encheu-se de ódio pela companheira e
começou a obsediá-la, incutindo em sua mente perispiritual a sugestão de que
ela era uma loba. Ela, absorvida por remorsos cruéis, começou a assimilar a
sugestão persuasiva, deformando o seu próprio perispírito que, aos poucos, foi
tomando a forma de uma loba22.
Tal obsessão durou cerca de cinquenta anos. Envolvidos por teia
mental de emaranhados complexos e indefinidos, o sofrimento de ambos era
tão intenso que se afigurou para eles como sendo as penas eternas destinadas
aos filhos que seguiram o caminho do mal. No entanto, o sofrer não é eterno,
pois Deus destinou suas criaturas à felicidade, provendo-as dos meios
necessários para fazer germinar, dentro de si mesmas, a semente do amor
universal.
Para nossa surpresa, o mentor espiritual relatou-nos que algum
tempo atrás, o marido obsessor havia sido atendido em uma reunião de
desobsessão em nossa Casa Espírita, dando mostras de que, apesar do ódio
que ainda sentia, estava cansado daquela situação; que, durante o
atendimento, ele relatara à doutrinação que constantemente via diante de si
uma porta fechada, mas que jamais tivera a coragem de abri-la, por não saber
o que poderia existir além dela.
Diante do depoimento espontâneo, o médium doutrinador o encorajou
a abrir aquela porta. Após relutar durante algum tempo, ele finalmente decidiu
abri-la. Qual não foi a sua surpresa, ao deparar-se com os dois filhos,
nimbados de luz, convidando-o a transpor os umbrais que os separavam.
Cheio de emoção, ele gritou os seus nomes, entregando-se ao reencontro.
Naquele momento, ele compreendera que a vida não se extinguira,
pois podia sentir os filhos vivos, perfeitos e felizes, aconchegados em seus
braços! Tal foi a sua felicidade que o denso nevoeiro que cobria seus olhos
espirituais foi se dissipando; e ele pôde entender que o ódio que alimentara
durante todo aquele tempo o impedira de reconhecer que a vida era
inexaurível. Exausto e tomado por sentimentos diversos, permitiu-se, então, ser

22
Caso de zoantropia, em que o Espírito é induzido a tomar a forma de um animal.
48

conduzido a um Posto de Socorro da Espiritualidade para receber os primeiros


tratamentos.
Findava-se, assim, a perseguição obstinada à Elaine, pois aquele que
a mantivera presa às teias de ódio, por amor aos filhos, renunciara à vingança
e iria encontrar a própria paz. Ela, por sua vez, estaria liberta da terrível
possessão.
Decorrido algum tempo, após os esclarecimentos do mentor
espiritual, o Espírito Elaine se comunicou em nossa reunião. Quão deprimente
era o seu estado! Os seus uivos e a sua ferocidade denotavam o caso grave de
licantropia23. Enchemo-nos de amor e de piedade pela irmã prisioneira do
próprio destino.
Olavo, espargindo compreensão e ternura pela enferma, conduziu-
nos no trabalho de reconstituição daquele corpo perispiritual, num esforço que
se prolongou por duas reuniões. Somente no segundo atendimento, ela
retomou completamente a forma humana, e, em prantos, foi recolhida à
Colônia Maria de Nazaré.
Consciente da sua real situação perante a Justiça Divina, carregará
consigo o peso dos atos cometidos e a certeza de que deverá quitar os seus
débitos, pois ninguém pode fugir às leis de causa e efeito. O momento da
colheita sempre chega para aquele que semeou.
Certamente, não será fácil para Elaine. Mas, o amor incondicional de
Maria a sustentará nos momentos mais cruciais do retorno à carne, suscitando-
lhe coragem e esperança. No entanto, caberá a ela fazer a sua parte.

***

Destacamos neste capítulo, a Providência Divina cuidando de todas


as Criaturas viventes, confirmando as palavras de Jesus, quando Ele nos
afirmou que nenhuma das ovelhas que o Pai lhe confiou se perderia.
Antes que o Espírito Elaine fosse trazido à nossa reunião, os
mentores providenciaram para que o Espírito do marido assassinado – o qual

23
Caso específico de zoantropia, em que o espírito é induzido a tomar a forma de lobo.
49

se encontrava cheio de ódio e a obsediá-la – fosse resgatado em uma reunião


de desobsessão em nossa Casa Espírita, acendendo em seu coração a
centelha do perdão, que espargirá no futuro o clarão da Fraternidade Universal.
Emocionado, no momento em que fazíamos a avaliação das
atividades da noite, Olavo nos relatou que fora ele o doutrinador convocado
para auxiliar no resgate do marido obsessor naquela reunião; e que, por
acréscimo da Bondade Divina, tivera também a oportunidade de auxiliar o
Espírito Elaine. Porém, no momento em que fazia o atendimento a esse, jamais
imaginara que os casos estivessem interligados.
Esclarecemos que no primeiro atendimento a Elaine, quando o grupo
empreendeu todos os esforços possíveis para que ela pudesse retomar a
forma humana, não nos foi informado se o intento fora alcançado com êxito. No
entanto, intimamente, carregamos conosco tal interrogação até a realização da
próxima reunião (o que se deu trinta dias depois); quando novamente nós a
recebemos para dar prosseguimento ao trabalho de auxílio.
Ressaltamos que em casos de licantropia ou outros do gênero, a
conjugação dos esforços dos médiuns, principalmente dos sustentadores,
formando em suas telas mentais as imagens sugeridas pela doutrinação, é
essencial para auxiliar o Espírito a retomar a forma perispirítica humana.
Entretanto, é preciso ter a compreensão de que muitos atendimentos
demandam tempo e que, quase sempre, não teremos conhecimento dos seus
desdobramentos no plano espiritual.

***
50

Capítulo IV

O NIILISTA ANTE O SUICÍDIO

4.1. Reconstrução Perispiritual

A vaidade e o orgulho são rédeas perigosas ao coração exilado da fé


que se deixa por eles conduzir, acreditando cegamente na autossuficiência das
suas potencialidades. O caminho a percorrer torna-se curto demais para
aquele que acredita poder vencer as barreiras sozinho, pois as intempéries
logo surgem, violentas e poderosas, subjugando a pseudofortaleza existente.
Nesses momentos, se não houver a certeza de que mesmo após a derrocada
será possível o recomeço e de que a vida não será sepultada sob a terra úmida
e fria, o descrente não ensejará continuar. Em vez disso, optará pelo mergulho
inconsequente nas águas turvas e revoltas do suicídio, impulsionado pelo
“deus do nada”, pois sua visão se limita à efemeridade da vida do corpo físico e
à consequente inutilidade de suportar padecimentos.
Duílio, alimentando dentro de si a certeza do “nada” após a morte,
farto das derrotas que se repetiam em sua existência e irado contra uma
moléstia que, aos poucos, consumia o seu corpo, determinou o fim de sua
própria vida, jogando-se em uma caldeira fervente de metais. O seu corpo,
obedecendo às leis químicas, perdeu todas as propriedades físico-humanas e
cedeu suas moléculas a novas organizações moleculares que se formavam
naquele caldeirão. Mas o Espírito imortal, que conserva sua individualidade
após a morte e que não está sujeito às leis físicas da matéria densa, não se
desintegrou naquele tanque metálico. Entretanto, Duílio, que durante toda a
51

existência terrena alimentou dentro de si a Doutrina do Nada 24, acabou


plasmando em sua mente a desmaterialização completa do seu perispírito.
Dessa forma, ele “apresentou-se” na outra dimensão da vida sem qualquer
registro de sua individualidade espiritual, assim permanecendo até o momento
de ser generosamente socorrido.
Momentos antes de ele ser ligado ao médium, o mentor responsável
pela reunião da noite se manifestou psicofonicamente, esclarecendo a situação
em que o Espírito se encontrava, com o objetivo de que fosse prestado a ele o
auxílio adequado.
Olavo, então, com a firmeza necessária para que o socorro fosse
bem-sucedido, conduziu o grupo no trabalho de reconstituição do corpo
perispiritual de Duílio, pois ele se encontrava no Plano Espiritual como se não
existisse. Tínhamos em nós um coração disposto a doar e a consciência de
que isso era o mais importante. Por isso, procuramos unir os nossos
pensamentos aos do doutrinador, esforçando-nos para dar vida às suas
palavras, ao mesmo tempo em que colocávamos nossos fluidos à disposição
dos Técnicos Espirituais, a fim de que os manipulassem de acordo com a
necessidade do caso em atendimento.
A reconstituição do corpo perispiritual foi iniciada pelos pés, passando
em seguida por toda a anatomia humana. Quando o rosto foi concluído, ele
começou a apalpar-se, a sentir-se. O que se passou a seguir está além de
nossas possibilidades narrativas! No entanto, podemos afirmar que, naqueles
momentos, Duílio nascia para as verdades espirituais e que o olhar ansioso
que vertia para a nova realidade, resplandecia a beleza e o deslumbramento
que moldam as grandes descobertas.
Cuidadosamente, pois era um bem precioso ao Seu Criador, ele foi
conduzido à Colônia Maria de Nazaré, onde começaria a dar os primeiros
passos, reiniciando a caminhada evolutiva. Ele terá que aprender muito ainda...
Precisará reformular os seus conceitos e os seus dogmas, tão profundamente
arraigados à Doutrina Niilista.
***

24
Sobre a Doutrina Niilista, cf. KARDEC, Allan. O Porvir e o Nada. In: KARDEC, Allan. O Céu e o
52

No caso relatado, o trabalho realizado pelo grupamento foi o da


mentalização de toda a reconstrução do corpo perispiritual do irmão socorrido.
Cada integrante do grupo colocou à disposição dos Técnicos Espirituais os
fluidos disponíveis em sua organização físico-espiritual necessários à execução
da tarefa. Indubitavelmente, o amor foi o ingrediente essencial para o sucesso
da terapêutica aplicada a Duílio, que se encontrava com o perispírito bastante
danificado.
Faz-se necessário esclarecer que a desmaterialização do perispírito
estava apenas na mente de Duílio, tendo em vista a forma como vivera, as
coisas em que acreditava e o modo escolhido para o suicídio. A sensação do
“nada, do não existir” – que permanecera com ele – era o reflexo de como
ocorrera a sua desencarnação, ou seja, do derretimento do seu corpo material.
Por isso, ele não registrara absolutamente “nada” da sua nova situação. Era
absolutamente necessário, portanto, que tivesse a seu dispor outros órgãos
materiais, nos quais suas vibrações pudessem voltar plenamente animalizadas
para reproduzir no seu corpo perispiritual o que acontecera. Tal processo é
muito bem explicado por Yvonne A. Pereira, no livro Memórias de um suicida25.
Franco, que há muito está no exercício de doação aos irmãos
suicidas, relatou-nos que nunca havia experimentado as impressões que
ficaram nos primeiros momentos após o término da comunicação: ele sentiu
uma total ausência de pensamentos e até mesmo do próprio corpo. Era como
se ele não existisse... E isso não apenas para o mundo, mas para si mesmo!

***

Inferno. 30.ed. Rio de Janeiro: FEB, 1993.


53

Capítulo V

SUICÍDIO ASSOCIADO AO FANATISMO RELIGIOSO

5.1. Equivocado Pastoreio

O momento é grave. Aproxima-se o fechar deste milênio26, que


encerrará mais um ciclo espiritual na etapa evolutiva do homem. Nunca se
viram tantos questionamentos, tantas reflexões sobre o existir na Terra. Por
isso mesmo, nunca houve tantas pessoas tão perdidas, aferradas aos
conceitos reducionistas das filosofias materialistas e de muitas religiões. Ainda
distantes da compreensão das leis da reencarnação, não conseguem dar um
sentido à própria vida. O vazio existencial açambarcou de tal forma as
perspectivas futuras que parte considerável da Humanidade vagueia sedenta,
em busca de algo que a preencha, salvando-a do caos da desesperança.
Assim, muitos se entregam a pequenos achados, deixando-se
embriagar pela ilusão de resgatar valores já fugidios. Talvez por trazerem
consigo a intuição de que a criatura só se realizará em comunhão com o seu
Criador, muitos se entregam cegamente às práticas propostas por aqueles que
prometem levá-los à concretização dessa comunhão, ou seja, à “felicidade
eterna”.
Neste momento, portanto, o fanatismo religioso é ponto marcante na
vida do homem na Terra, que “sabe” ser preciso renovar-se de novas virtudes,
a fim de ser “eleito” pelo Senhor. Como ovelhinha a caminho do abate, deixa-se
conduzir pelo pastor que, deliberadamente, já decidiu o seu destino. Segue –
tal qual hipnotizado − ao encontro do abismo, onde ficará preso por tempos
indeterminados...

25
Cf. PEREIRA, Yvonne A. Memórias de um suicida. 16.ed. Rio de Janeiro: FEB, 1991, p. 160-167.
26
A reunião de atendimento ao Espírito protagonista desta história aconteceu no ano de 1998.
54

Raul, pastor de um desses rebanhos, conduziu-o ao precipício do


suicídio... Ao despertar no Plano Espiritual, deparou-se com a própria
consciência. Quanta agonia! Quanto tormento! Quantas dívidas contraídas para
os séculos vindouros e quão pouca esperança de paz para um espírito tão
endividado!
É da Lei que toda ação gera uma reação e que a colheita será de
acordo com a semeadura. Ouvíamos consternados a explicação do mentor da
noite que nos revelava que Raul sentia em si mesmo todas as dores e aflições
dos familiares de cada uma daquelas almas suicidas. Como se isso não
bastasse, sentia, de forma contínua e sem terminação, o veneno ingerido
corroer todo o seu sistema digestivo e os órgãos de fonação, gerando dores
alucinantes, que, sem trégua, pulsavam em ritmo frenético.
No estágio em que ora se encontrava, Raul já estava cônscio de que
somente poderia usufruir de um pouco de alívio se os seus seguidores
buscassem uma nova estrada. Desesperadamente lutava para despertá-los
para outra realidade. Porém, era inútil. A nebulosa psíquica constituída de
formas-pensamentos, irracionalmente assimiladas, envolvia-os totalmente,
impossibilitando a absorção de quaisquer outras ideias.
Feitos os devidos esclarecimentos, o Amigo Espiritual despediu-se de
nós, rogando-nos muito amor ao irmão a ser socorrido.
Após alguns momentos, então, o corpo material de Franco se
contorceu dolorosamente. Gritos de desespero, de suplício e de agonia
ressoaram no ambiente. Era Raul que gritava ao plano físico a sua
desventura... Tomado de intenso pavor, começou a nos relatar os quadros
espirituais que passaram a constituir a sua existência extrafísica, desde que a
sua consciência despertou para a responsabilidade dos atos praticados.
Uma legião de fiéis que obedeceram a sua orientação insana,
acreditando que o suicídio os levaria mais rapidamente à felicidade eterna,
seguia seus passos incessantemente. Ajoelhavam-se diante dele, em
reverência à sua “elevação espiritual”, enquanto clamavam pelo paraíso por ele
prometido. Em vão, ele os repudiava. Inócuas eram as ordens para que o
deixassem em paz, pois nada poderia fazer para ajudá-los. No auge do
55

desespero, tentava mostrar a eles sua incapacidade para orientá-los e, por


conseguinte, de continuar a ser o seu guia espiritual.
Não obstante, tudo havia sido consumado... O fanatismo criara
abismos colossais, nos quais os seus seguidores se debatiam impossibilitados
de serem resgatados. Encontravam-se como que hipnotizados, alheios a
qualquer realidade que não fosse a existência do pastor que lhes havia
prometido o Jardim do Éden27.
Nos intervalos entre os gritos desesperados e o relato da sua
dolorosa situação, Raul deixava escapar a dorida confissão de que ele jamais
seria digno de ter o Evangelho novamente em suas mãos. Para ele, o
julgamento já havia sido consumado e essa era a sentença dada por sua
consciência culpada. Mas ele se esquecera de que Deus não abandona
nenhuma de suas criaturas, que a sua divina atuação amorosa se faz por
intermédio de outras criaturas, tecendo no âmago de cada uma a teia da
fraternidade, para que esta possa, no suceder da eternidade, sustentar e unir
toda a sua criação.
Dando cumprimento à Providência Divina, Olavo redobrava sua
atenção para as palavras proferidas por Raul, no intuito de identificar nelas a
melhor forma de auxiliá-lo. Confiante de que Forças Superiores o guiavam,
definiu que a doutrinação iria esclarecer que somente ele, Raul, poderia
despertar a consciência daqueles que o seguiam. Mas, para que isso fosse
possível, era imperioso que ele buscasse em si mesmo o equilíbrio; uma vez
que Deus, Pai Amoroso e Bom, sempre dá a seus filhos uma nova
oportunidade.
Eu, embevecida também pelas palavras que ouvia, comecei a dar
formas concretas a elas; formas que iam se materializando diante da minha
retina espiritual. Vislumbrei, então, uma estrada cheia de flores, um céu límpido
e uma claridade diferente, capaz de absorver as trevas do mundo: era a
materialização da Bondade de Deus, das oportunidades que surgem a cada
momento. Era a estrada do recomeço e o horizonte de novas realizações!

27
Jardim em que Adão e Eva viveram, ou seja, paraíso.
56

No instante em que eu convidava Raul a seguir pela nova estrada,


Olavo encorajava-o a abrir um Evangelho, afirmando que nele se encontrava
toda a verdade, coragem e esperança que o impulsionariam a prosseguir. No
livro sagrado, ele encontraria os princípios que promoveriam o resgate
daqueles que foram lançados, por suas mãos, ao abismo do fanatismo. Era
imperioso, pois, que abrisse o livro e que o lesse com os olhos da alma, que
usasse os ensinamentos evangélicos para a reconstrução de homens novos,
transformados pelo poder do amor.
Enquanto a doutrinação se dedicava ao seu mister, rememorei que o
Espírito Aníbal de Silas28 mencionara que Jesus, quando de suas pregações,
por meio do seu magnetismo, proporcionava aos ouvintes a visualização do
que Ele falava. Por isso, mentalizei o Sermão da Montanha e este passou a se
desenrolar diante dos meus olhos espirituais com a nitidez que as minhas
limitações permitiam.
A princípio, Raul resistiu fortemente ao convite que recebia. Mas,
após o transcorrer de alguns momentos, aquietou-se profundamente. Olavo,
então, em sentida oração, rogou a Maria que o recolhesse em seus braços
amorosos.
***

Após o encerramento das comunicações psicofônicas, quando


fazíamos a avaliação, Franco nos falou sobre suas percepções mediúnicas no
decorrer da comunicação de Raul.
Em dado momento, vislumbrou uma Bíblia sem páginas, somente
com a capa. Imediatamente após, percebeu que alguém entregava outra Bíblia
a Raul, dessa vez com textos, e que outro começou a lê-la em voz alta.
Embora o Espírito não conseguisse compreender exatamente o que estava
acontecendo, experimentou uma sensação de bem-estar.
Tais informes promoveram em nós intensa emoção, haja vista terem
confirmado que a ação conduzida pela doutrinação e pela sustentação estava

28
PEREIRA, Yvonne A. Memórias de um suicida. 16. ed. Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira,
1991.
57

de acordo com o planejamento dos coordenadores espirituais, no que se refere


ao recurso que seria utilizado para o resgate de Raul.
Franco acrescentou, ainda, duas observações relevantes sobre a
comunicação de Raul: a primeira se referia ao fato de que, mesmo após o
término da comunicação, ele, médium, ainda se sentiu ligado ao Espírito,
sentindo as suas dores. Não havia conseguido compreender o motivo de tal
ocorrência, até Laura ler a mensagem psicografada, pois ela era justamente de
Raul! Dessa forma, após o encerramento da comunicação psicofônica, ele
recebera também o atendimento via psicografia.
A outra é que um dos Espíritos coordenadores do trabalho, por meio
da audiência, informou que Raul, muito em breve, renasceria e, novamente, se
tornaria pastor. Com essa providência, seria dada a ele a oportunidade de
reconduzir as almas que um dia ele desviara do caminho correto. Entretanto,
afirmou que a responsabilidade de Raul será ainda maior, uma vez que os seus
seguidores terão uma fé inabalável em seu messiado. Mas que, nesse
rebanho, também existirão alguns grupos que disseminarão a dúvida e a
discórdia, dificultando seus empreendimentos no campo espiritual; que a sua
vida será de grandes sofrimentos, pois, além de problemas orgânicos
gravíssimos, lhe faltará a preparação necessária para concretizar os ideais
altruístas.
Laura informou que intuitivamente recebeu a orientação para que
prestasse atenção nas comunicações que iriam acontecer, ao invés de colocar-
se à disposição para psicografar. Assim, a psicografia ocorreu somente após a
comunicação psicofônica de Raul, pois ele mesmo é que iria trazer elucidações
sobre sua situação, conforme mensagem transcrita a seguir:

Não podia imaginar quanto mal eu praticaria. Não entendi as


palavras de Jesus e as empreguei mal, induzindo outros ao erro.
Usei-as para infringir medo e não para levar a paz...
Sofro as consequências da minha insensatez. Assim
permanecerei, até que cada um daqueles a quem prejudiquei
possa encontrar o caminho de volta.
Não consegui abrir o evangelho que me ofereceram. Mas
entendi que só somente com ele poderei reconduzir os que
desencaminhei outrora.
58

Hoje, encontrei pessoas que me auxiliaram sem críticas ou


julgamento pelas loucuras que pratiquei. Se tivesse permissão
para ficar, sinto que poderia melhorar um pouco mais, antes de
voltar... Quero ficar, mas não posso! Tenho urgência em voltar. É
preciso voltar! Raul.

O Mestre falou-nos que a “felicidade não é deste mundo”29, mas,


mesmo assim, quase sempre, vivemos a ilusão de que a encontraremos na
satisfação dos nossos desejos mundanos.
Quando a dor e a dificuldade nos visitam, falando-nos de renovação,
quase sempre nos recusamos a ouvi-las e a aceitar que nos façam a
necessária companhia, mesmo que temporariamente. São nesses momentos
em que, faltando-nos a fé, poderemos nos resvalar para a fuga, perdendo-nos
em um vazio existencial.
Durante o tempo em que temos a bendita oportunidade de auxiliar,
compartilhando lágrimas e semeando esperança em coração de terreno
aparentemente estéril e endurecido, alargamos a capacidade de compreender
as palavras de Jesus quando Ele nos disse “homens de pouca fé”30.
Fortaleçamo-nos, pois, no serviço ao próximo, certos de que tudo
passa, que tudo se transforma, que a vida não cessa jamais, pois somos
eternos!

***

5.2. Em Busca do Paraíso

“Conhecereis a Verdade e ela vos libertará”31. Que grandes


ensinamentos Jesus encerrou nessas palavras! Mostrou-nos que quanto mais
tivermos a mente aberta para os esclarecimentos advindos de indagações
construtivas, que nos permitirão assentar as balizas de uma fé raciocinada,
maior será o luzeiro a projetar claridade em nossos caminhos, afastando as

29
KARDEC, Allan. Evangelho Segundo o Espiritismo. 91.ed. Rio de Janeiro: FEB, 1985.
30
Mateus, capítulo 5, versículos 19-21 e 25-34. Bíblia Sagrada, op. cit.
31
João, capítulo 8, versículo 32. Bíblia Sagrada (versão digital). Seafox/Terra Santa/James King/Vozes,
2005.
59

trevas da ignorância. Não haverá, então, espaço para inquirições vazias. Nosso
caminhar será firme e não temeremos os abismos da estrada, pois os nossos
olhos estarão abertos.
Dia após dia, novas seitas surgem em toda parte, sustentadas por
interesses que não nos cabe analisar, por não ser este o nosso intento e
porque também não nos compete examinar os motivos que levam as pessoas
a se filiarem a elas. Sabemos, entretanto, que o fanatismo é extremamente
perigoso, uma vez que pessoas fanáticas param de pensar e, subjugadas em
seu raciocínio, passam a agir de acordo com um conjunto de normas que
normalmente só interessam a quem as criou ou aprendeu a manipulá-las.
Portanto, por ser o fanatismo tão recorrente no campo religioso, suas
consequências podem ser funestas para a alma humana.
Pedro, homem esculpido pelas durezas da vida, pouco experimentou
gozos neste mundo, pois assim exigia a sua escalada evolutiva. No entanto, ao
sentir-se acuado em um mundo de interesses, em que prevalece a lei do mais
forte, viu-se impotente para alterar o curso da própria vida, deixando-se oprimir
pela tola vaidade. Em virtude da angústia que passou a consumir os seus dias,
buscou a religião como âncora de salvação.
O primeiro impulso de Pedro foi acertado, visto que o homem pode
encontrar na fé que professa o timoneiro fiel que o guiará pelo mar da vida,
conduzindo-o com segurança nas horas tempestuosas da sua existência.
Entretanto, fragilizado pelas dificuldades do dia-a-dia, pouco a pouco começou
a plasmar dentro de si o céu dos oprimidos e dos justos. Deixando-se dominar
por esse monoideísmo, ansiou alcançá-lo. Acreditava que o paraíso32 era a
recompensa da qual era merecedor!
Diuturnamente, deixou que aquela ideia se agigantasse dentro de si,
dominando a sua capacidade de análise e raciocínio. Eis que, assim, chegou
ao cume da sua insensatez, quando surgiram poderosas em sua mente as
tenebrosas indagações: “Se um dia aquele ‘céu’ lhe seria dado por direito, por
que esperar? Por que não abreviar uma espera, cujo desfecho já estava
definido?”.

32
Mesmo que “céu”: local onde habitam Deus, os anjos, os bem-aventurados e as almas dos justos.
60

Ah, desditoso Pedro! Como nos doeu sua situação espiritual, ao


apresentar-se entre nós, utilizando-se do aparelho mediúnico de Lucíula.
Desesperadamente, ao ver-se em um ambiente nebuloso, sombrio e sufocante,
rogava-nos o “céu” que havia sido prometido a ele, argumentando que tinha se
suicidado para usufruir das bem-aventuranças celestiais, como lhe era de
direito. Apesar do empenho que todos fazíamos para ajudá-lo, ele nada
percebia. Estava totalmente isolado em seu ambiente mental.
Olavo manipulava as palavras com sabedoria, procurando sensibilizá-
lo para o fato de que o céu tinha outras nuanças que ele ainda desconhecia,
mas que muito em breve iria descobri-las; que era preciso, pois, retornar e
encontrar o caminho verdadeiro e que nós estávamos ali para ajudá-lo a dar o
primeiro passo... Porém, as palavras de Olavo não provocaram qualquer
reação em Pedro, pois ele permanecia no mesmo alheamento.
Foi, então, que mentalizei o nosso grupo de mãos dadas, constituindo
um círculo. De nossas mãos espargiam uma luz azul de tonalidade muito forte
que era canalizada para o centro do círculo de onde se evadia, formando
safirina nuvem que suavemente se dissipava em chuva de luz sobre o irmão
atendido. Tal mentalização foi mantida em minha tela mental, até que se desse
o recolhimento de Pedro, fato que ocorreu alguns minutos depois. Entretanto,
nada nos indicou se ele saíra daquela alienação mental.
Ao despertar sob os auspícios de Maria, podemos inferir que por
algum tempo ele necessitará ser consolado, à maneira de uma criança que
teve o “doce” preferido arrebatado das mãos. No entanto, pouco a pouco,
compreenderá que o “céu” tão ansiosamente buscado está assentado na paz
que advém da consciência tranquila, como fruto do dever cumprido e do reto
proceder; da observância às Leis Divinas onde está gravado o código da
verdadeira felicidade.

***

No momento destinado à avaliação das nossas atividades, foi com


grande contentamento que Marcos e eu pudemos constatar que estávamos
61

bem sintonizados durante a realização do trabalho. Ao percebermos a situação


do Espírito comunicante, detivemo-nos na emissão de luzes para ele, tendo
sido esse o procedimento comum a nós dois. E não apenas nosso depoimento
comprovou tal sintonia. O mentor Paulo, por meio de mensagem psicográfica,
entre outros apontamentos, confirmou que o trabalho de sustentação havia sido
feito com a emissão de luz.
Quando Laura terminou a leitura da mensagem, ao trocarmos os
olhares, a mesma comoção estava sendo compartilhada por todo o grupo por
sabermos que, mesmo com tantas deficiências, podemos ser instrumentos de
auxílio àqueles que agonizam de dor.
Lucíula relatou que momentos antes de ocorrer a psicofonia, sentiu a
presença de Pedro, sem conseguir, no entanto, captar os seus pensamentos,
pois estavam muito embaralhados. No momento da comunicação, percebeu
que ele estava completamente alheio a tudo que o rodeava. Por isso, apesar
de ver o nosso grupo e nos solicitar auxílio para receber o “céu”, sua impressão
era de que nós não o ouvíamos e nem o víamos, e esse fato aumentava o seu
desespero.

***

5.3 Engano Cruel

A morte é ainda, para nós, uma fatalidade; a única certeza que temos
nesta vida. Inevitável. Um dia, sem inquirir se desejamos nos entregar aos seus
braços, chega-nos, altaneira e segura de si. A sua chegada, entretanto, é
caracterizada por grande relativismo: para uns, o nada; o padecer para sempre;
o sono profundo de pesadelos eternos; para outros, a compensação pelas
dores bem suportadas; a felicidade indescritível do reencontro; o sonho
transformado em realidade.
Cada qual vive edificando o próprio mundo, no exercício pleno do
livre arbítrio. Entretanto, existe um lugar-comum no universo de cada criatura.
Na ânsia por preenchê-lo, incansavelmente ela está sempre à procura de algo,
62

mesmo que não tenha consciência disso! É a busca de Deus, Senhor Absoluto
de tudo o que somos.
Desde os anais do tempo, na trajetória da história da Humanidade,
temos notícias das constantes lutas dos homens para reinar uns sobre os
outros. Nessa guerra pelo domínio, destacamos a maior de todas: a guerra
pela subjugação das consciências, principalmente nas áreas da Política,
Educação e Religião. Não nos prenderemos aqui a citações que
exemplificariam tal dominação nos campos mencionados, à exceção do
Religioso, por ser esse de interesse direto deste capítulo.
Em nome de um Deus e de uma fé, a raça humana dividiu-se em dois
grupos: o de perseguidos e o de perseguidores, sendo que tais posições se
alteraram numa reversão constante de papéis.
É inegável que os seguidores do Espiritismo já foram muito
discriminados e perseguidos por adeptos de outras religiões. Contudo, nem as
atrocidades cometidas pela Inquisição na Idade Média, à semelhança dos
circos romanos em que os cristãos eram devorados pelos leões, conseguiram
ofuscar as luzes resplandecentes do Cristianismo. Da mesma forma, a Doutrina
Espírita, por reviver o Cristianismo primitivo, sobre os pilares “Deus, Cristo e
Caridade”, tem ganhado o respeito e a admiração de muitos.
Como sempre acontecia no primeiro domingo do mês, estávamos
reunidos, colocando nossas possibilidades − ainda que muito restritas − à
disposição da Espiritualidade. Marthan nos saudou carinhosamente por meio
da psicofonia de Franco, proporcionando-nos enorme contentamento. A seguir,
com seu inconfundível sotaque estrangeirado, elucidou-nos sobre os casos
selecionados para atendimento. Era a primeira vez que se manifestava em
nossa reunião com aquele fim específico, embora soubéssemos que estava
sempre presente, visto que integrava o quadro de colaboradores de Maria.
Primeiramente, teceu alguns comentários a respeito dos agravantes
sofridos por aqueles que, direta ou indiretamente, lutaram contra as luzes que a
religião espalha, enfatizando os tormentos oriundos de uma consciência
desequilibrada; que alguns, mesmo se sentindo desventurados, conseguem
suportar o remorso e angariam forças para recomeçar. Outros podem chegar
63

ao desespero. Informou-nos que os Espíritos que seriam objeto da nossa


atenção e carinho naquela noite haviam sido ferrenhos perseguidores do
Espiritismo.
Tal informação nos deixou imensamente surpreendidos, pois estávamos
no mês de outubro, mês tão relevante no calendário espírita por ter sido nele
assinalado o nascimento do Codificador da Doutrina Espírita, Allan Kardec.
Diante de nossa surpresa, esclareceu-nos que a seleção dos casos havia sido
feita levando-se em consideração a data comemorativa em questão; que se
referiam ao Espiritismo por estarmos diretamente a ele ligados; mas que ser
alvo de perseguições não era prerrogativa apenas dos adeptos da Doutrina dos
Espíritos.
Orientou-nos que, no decorrer do atendimento, era imprescindível o
desprendimento de muita luz, a fim de que essa pudesse romper as espessas
sombras que circundavam os irmãos a serem socorridos. Além de amargar o
desengano pelo reconhecimento das suas faltas, pesava demasiadamente
sobre eles o fato de ter lutado contra a Luz33.
Pouco tempo depois das despedidas carinhosas de Marthan, pela
psicofonia de Lucíula, ouvimos as primeiras frases de uma preleção que,
talvez, já se repetisse por um razoável período de tempo, ininterruptamente...
O quadro mental no qual Adelmo estava aprisionado era o seguinte: em
uma praça pública, ele estava pregando fervorosamente. Não lhe faltava
fluência verbal, convicção e admirável poder de persuasão. Citava versículos e
mais versículos do Novo e do Velho Testamento, incitando os transeuntes
contra o Espiritismo. Retratava a Doutrina como sendo açambarcadora de
almas e a própria materialização de Satanás. Diante daquele discurso
interminável, as palavras de Olavo eram vãs, pois ele não as registrava.
Inicialmente, tentamos a formação de quadros mentais, mas logo
constatamos a improficuidade daquela ação. Foi, então, que rememorando a
orientação de Marthan, começamos a trabalhar com a emissão de muita luz. O
trabalho que passamos a desenvolver consistiu basicamente da mentalização

33
O termo “Luz” refere-se à Doutrina Espírita.
64

de suave luz azulada partindo do coração de cada membro do grupo em


direção ao irmão, a fim de envolvê-lo plenamente.
Enquanto isso, Olavo, atento às reações de Adelmo, sentiu que deveria
ser mais firme em suas colocações, a fim de conseguir algum êxito no auxílio
ao Espírito. Surpreendentemente, após a mudança de estratégia da
doutrinação, foi-nos possível, algum tempo depois, compartilhar do silêncio de
Adelmo. Silêncio que era um indicativo de que o clichê mental havia sido
desfeito. Silêncio que beneficiava não somente a ele, mas também ao nosso
grupo, pois as palavras da doutrinação enterneciam-nos o coração,
conclamando-nos à prática evangélica exemplificada por Jesus.
Até a finalização do atendimento, Adelmo não mais se pronunciou. Para
nós, era a confirmação de que ele se rendera aos impositivos do amor e da
caridade, embora não soubéssemos precisar a dimensão e o alcance da ajuda
que fora prestada a ele. Enquanto aguardávamos a manifestação de mais um
irmão a ser atendido, continuamos nos concentrando na emissão de luz.
Poucos minutos depois, adversamente a Adelmo, que seguramente
bradava as suas convicções religiosas, comunicou-se Luiz. Havia sido padre
em sua última encarnação. Demonstrava grande arrependimento, não por sua
perseguição ao Espiritismo, mas por sua omissão ao descobrir, ainda
encarnado, as luzes da Doutrina dos Espíritos. Sentindo-se fraco, incapaz de
deixar tudo para seguir novos caminhos, preferiu renegar a própria vida a ter
que fingir uma fé que não mais professava. Por isso, encontrava-se no Plano
Espiritual inteiramente consciente dos seus atos, mas de olhos fechados, por
sentir-se indigno de vislumbrar as cores, a luz, a vida, uma nova
oportunidade...
Carinhosamente, Olavo falou-lhe de esperança e de recomeço, quando
ele poderia, então, refazer o seu caminho, corrigindo os erros e iluminando
corações. Ao mesmo tempo em que a doutrinação o assistia, também nós o
envolvíamos em intensa luz. Foi assim que, em dado momento, depois de
muito relutar em aceitar as considerações da doutrinação, ouvimo-lo murmurar
algumas palavras que para nós não faziam muito sentido, mas que
significavam que ele havia aberto os olhos perispirituais.
65

Enchemo-nos, pois, de contentamento. A partir daquele instante, Luiz


poderia entrever novos horizontes, pois a Misericórdia Divina nos concede a
certeza de um novo amanhã e entrega em nossas mãos a responsabilidade de
plasmá-lo, conforme a nossa vontade.

***

Após o encerramento do atendimento mediúnico, quando fazíamos a


avaliação das nossas atividades, pudemos obter alguns esclarecimentos sobre
os espíritos socorridos.
Em relação a Adelmo, Lucíula – que permitiu o intercâmbio com o
plano material – relatou-nos que ele estava pregando em praça pública e que
segurava e mostrava a Bíblia a todo instante. Franco, entretanto, esclareceu-
nos que pôde vislumbrá-lo em um lamaçal, e que, portanto, o clichê mental de
que pregava em praça pública era, na verdade, uma fuga para não reconhecer
que não mais estava no plano material e que se encontrava em situações bem
adversas àquelas que ele havia pregado em vida.
Por meio da audiência, um dos coordenadores espirituais informou a
Franco que ambos, Adelmo e Luiz, tinham o mesmo tempo de desencarnação.
No entanto, o primeiro havia levado o seu compromisso na Terra de forma não
satisfatória, visto que muito falava, mas pouco ou quase nada praticava. Não
poucas vezes, aproveitou-se da sua condição de pastor de almas para explorar
pessoas. Entretanto, com o passar dos anos, teve a oportunidade de conhecer
os ensinamentos espíritas. Assombrou-se diante das revelações que o
colocaram em posição contraditória à própria fé. Não podendo conviver com
tamanho paradoxo − o que era e o que deveria ser − e não suportando a
verdade que mudaria todo o curso da sua vida, cobrando dele a
responsabilidade pelos atos executados, enlouqueceu e suicidou-se.
Quanto ao padre Luiz, apesar das suas imperfeições, procurava
vivenciar, mesmo que minimamente, aquilo que pregava. Apesar de o
conhecimento espírita ter tocado o seu coração, não se sentiu forte o suficiente
para professá-lo, pois isso significaria abandonar a ordem religiosa da qual
66

fazia parte. Para não enganar a ninguém, buscou no suicídio acalentar a


própria covardia, permanecendo de olhos cerrados até o instante do seu
resgate. No momento, porém, em que descerrou os olhos perispirituais, pôde
enxergar alguns irmãos que haviam pertencido na Terra à mesma ordem que a
sua. Eles, então, afirmaram que também haviam descoberto muitas verdades,
que estavam esperançosos no recomeço e convidaram-no a seguir com eles...
Vale ressaltar que todas as religiões são estradas de luz para o
homem na Terra e que, cada ser, de acordo com o seu grau evolutivo,
necessita de uma delas para nortear a sua jornada. Porém, a perseguição
religiosa gera o desequilíbrio e obstrui a oportunidade de o Espírito avançar em
sua marcha evolutiva.
O fato de Adelmo e Luiz receberem o socorro conforme o progresso
espiritual já conquistado nos proporcionou grandiosa emoção! Especialmente
naquela noite, repercutiu no âmago do nosso ser imortal a lição do Rabi da
Galileia de que devemos “amar o próximo como a nós mesmos”34. Esse amor
absoluto requer o perdão das faltas cometidas contra nós, extinguindo para
sempre qualquer marca de revolta ou revide − mesmo quando a calúnia e a
injustiça tentarem ferir impiedosamente os nossos mais puros sentimentos.
Avante, Espíritas! Sem temor! Compreender e aceitar as verdades
espíritas é, antes de tudo, aceitar a Paternidade Divina, cujos atributos são
ainda incompreensíveis para nós, homens de “pouca fé”35.

***

34
Mateus, capítulo 22, versículos 34-40. Bíblia Sagrada, op. cit.
67

Capítulo VI

SUICÍDIO POR USO DE DROGAS

6.1. Impossível Regresso

O mergulho na carne quase sempre apavora os que irão retornar,


pois estão conscientes de que estarão sujeitos às ilusões do mundo, que terão
de granjear forças para não resvalarem para o erro, contraindo novos débitos
ou agravando os já contraídos em existências anteriores.
A paternidade é verdadeiramente uma missão que, se bem cumprida,
será fator de grandiosa importância à vitória daquele que regressa, ávido por
reabilitar-se dos fracassos de outrora. Será como o farol altaneiro a guiar os
navegantes em noites escuras e como um porto seguro no bramir das
tempestades.
Túlio vivia o ardor da juventude plenificada de sonhos e esperanças,
ainda sem a conquista das experiências que moldam a personalidade e
conferem madureza à alma. Não estava preparado para vivenciar situações
que exigissem testemunhos de maturidade.
Certa tarde, ao chegar à sua casa, encontrou a sua mãe nos braços
de um homem que não era o seu pai. Sem compreender a atitude daquela que
lhe dera a vida e que lhe ensinara a ser bom e honesto, viu desabar diante de
si todos os valores que sustentavam a sua vida.
Aturdido, sentiu-se sufocado naquele ambiente que aprendera a amar
e respeitar, onde vivera momentos de alegria e de afeto, onde invariavelmente
se sentia seguro e amado... Então, desorientado, fugiu... Sem qualquer outro

35
Mateus, capítulo 14, versículo 31. Bíblia Sagrada, op. cit.
68

referencial, refugiou-se na rua, adotou os becos como o seu novo lar e buscou
nas drogas o seu alento. O seu jovem corpo, no entanto, fragilizado e
macerado pelos alucinógenos, sucumbiu à overdose. Túlio desencarnou em
condições muito difíceis, alimentando profundo ódio da sua genitora.
Adelaide, após a fuga de Túlio, arrependeu-se amargamente do ato
praticado. Subjugada por voraz remorso, começou a buscar soluções que
pudessem amenizar o seu suplício. Encontrou no trabalho assistencial um
pouco de consolo e reconforto. Prestando auxílio aos menos afortunados,
ajudava a si mesma a carregar a própria cruz, que, por sua invigilância, ficara
mais pesada.
Após anos de trabalho, de renúncia e de sacrifício, ela retornou ao
mundo espiritual. Ávida por reencontrar o filho perdido, procurou-o
desesperadamente, sem, entretanto, alcançar êxito. Mas a Bondade e a
Misericórdia de Deus mais uma vez entraram em ação...
Na sala de reuniões, Lucíula, com o coração cheio de amor, ofereceu
o seu aparelho físico para que o jovem Túlio pudesse haurir os fluidos de que
necessitava para ser auxiliado. Senti, no momento em que ele se manifestou,
mesmo sem ter pronunciado palavra alguma, que se tratava de alguém
aprisionado em uma grande revolta. Mentalmente, procurei aproximar-me dele,
porém não obtive sucesso, pois ele estava muito arredio. Imediatamente,
então, canalizei minhas energias na mentalização de flores reluzentes,
procurando envolvê-lo em uma atmosfera de luz. Justamente após a
mentalização, ele exteriorizou, pela primeira vez, a sua revolta, ordenando-me:
“Saia daqui!” No entanto, foi como se ele tivesse me implorado para amá-lo e
para compreendê-lo. Então, verdadeiramente, desejei libertá-lo das potentes
amarras do ódio a que estava preso.
Das flores reluzentes, passei a mentalizar cenas infantis e folguedos
juvenis, pois tinha plena convicção de que tais quadros criariam vida se o
auxílio a ele assim o exigisse. Olavo, por sua vez, procurou resgatá-lo daquele
abismo, falando sobre a necessidade de perdoarmos as ofensas, a fim de
encontrarmos a paz que alivia e renova o ser. Entretanto, ele parecia nada
ouvir... Quase no fim do atendimento, comecei a cantar em pensamento uma
69

cantiga de ninar, na esperança de romper as suas defesas e fazê-lo sentir-se


aconchegado ao meu coração.
Mesmo depois de a comunicação ter chegado ao final, no silêncio das
vibrações que se seguiu, continuei a cantarolar a canção, sem conseguir
interrompê-la. Tal atitude era incompreensível para mim, pois fugia aos
padrões normais de procedimentos.
Após encerrarmos a parte das comunicações mediúnicas, Lucíula nos
relatou que, durante o intercâmbio mediúnico, sentiu que o Espírito comunicante
estava, ao mesmo tempo, em dois lugares distintos. Interrogando mentalmente a
respeito do que estava acontecendo, recebeu intuitivamente o esclarecimento de
que Túlio já havia sido atendido e estava alojado em uma espécie de enfermaria.
No entanto, ele tinha constantemente uma espécie de convulsão (decorrente do
uso de drogas), o que o fazia retornar mentalmente ao local de sofrimento de
onde fora resgatado. Quando isso acontecia, ele se isolava, querendo lá
permanecer.
De acordo com esclarecimentos do mentor da reunião, através da
psicografia de Laura, Adelaide fora levada à reunião para tentar uma
aproximação com Túlio. Entretanto, por estar ainda muito absorto pela revolta,
ele não “quis” percebê-la. Por isso, o trabalho de despertamento continuaria a
ser feito, no sentido de fazê-lo voltar à infância, às lembranças do carinho e do
afeto que a sua mãe lhe dispensara, para que mais facilmente pudesse perdoar
e, assim, reiniciar a sua caminhada.
Somente após o relato de Lucíula e os esclarecimentos do mentor,
pude compreender o motivo pelo qual continuei a cantar a canção de ninar.
Túlio não havia sido despertado e o trabalho teria que continuar.
Sensibilizados com a triste história de Túlio, vibramos para que o seu
despertar fosse breve, muito breve. Para nós, ficou a lição de que, nesse
mundo de provas e expiações, a vigilância é o alicerce para que nos
mantenhamos firmes nos compromissos espirituais assumidos. “Orai e vigiai”36,
assim nos advertiu Jesus quando esteve em passagem por este vale de
lágrimas.

36
Mateus, capítulo 26, versículo 41. Bíblia Sagrada, op. cit.
70

***

O caso de Túlio foi um dos que não foi solucionado em nossa


reunião, visto que, a despeito do nosso esforço, o seu despertar não ocorreu.
Entretanto, tínhamos a certeza de que os recursos por nós empreendidos, de
alguma forma, haviam sido canalizados em benefício daquele irmão.
Por isso, não nos figurava como insucesso o nosso labor. Tivemos,
sim, a oportunidade de constatar, mais uma vez, que nossas atividades não se
situavam no campo do sobrenatural, onde a ordem natural das coisas pudesse
ser alterada, mas que tudo deveria seguir o seu curso, em harmonia com as
Leis de Deus, perfeitas e imutáveis.
Até o momento em que finalizamos esta obra, não nos foi dado a
conhecer mais nenhum fato relacionado a Túlio, nem mesmo se ele fora levado
a outras reuniões em nossa Casa Espírita para concluir o processo de
despertamento. Isso não nos trouxe qualquer apreensão, pois entre as muitas
lições que aprendemos ao longo dos anos, no mister das reuniões de
atendimento, está a de servir e passar, sem nos determos em inquirições
apenas para satisfazer às indagações no campo da curiosidade improdutiva.
Dentro de nós havia, porém, a certeza absoluta de que tudo
aconteceria no tempo certo, em completa harmonia com os desígnios de Deus.
E isso, em si mesmo, resumia tudo o mais...

***

6.2. Filhos do Abandono

Meninos e meninas perambulam pelas ruas... Estendem as mãos,


implorando por um pedaço de pão, por moedas que sobraram, por um gesto de
solidariedade ou, somente, por um olhar de compaixão.
Carregam consigo a insígnia da miséria. Muitos não têm nem mesmo
um passado, uma história para contar. Simplesmente nasceram e
sobreviveram à solidão e ao abandono. Talvez, em algum momento, tenham
sonhado com um mundo multicor, pintado com as cores do arco-íris, e não com
71

o acinzentado melancólico dos dias nublados ou com a escuridão que se


prolonga, mesmo após o nascer do sol. Um mundo, quem sabe, onde criança
possa adormecer no acalanto do amor, do afeto e da proteção, sem medo de
acordar e sem tempo para ser só... Um mundo onde criança possa,
simplesmente, ser criança!
O tempo se arrasta lento e pesado para eles. Não vivenciam a
alternância de fases, pois infância e adolescência se confundem, podendo
gerar personalidades com sérios comprometimentos comportamentais. Sem
nenhum referencial ou perspectiva de mudança, entregam-se aos vícios,
buscando o esquecimento das suas dores. Acabam sucumbindo, sem que
tenham conhecido o zelo, o carinho e o amor. Chegam ao Plano Espiritual
totalmente alheios à realidade em que se encontram, sem que alguém tenha
falado a eles que tudo passa, que essa vida é só um instante perante a
eternidade, pois ninguém morre...
Nessas condições, o Espírito de José se manifestou em nossa
reunião, sendo recebido afavelmente por Franco, que lhe emprestou o aparelho
físico. A princípio, manteve-se indiferente à tentativa de Olavo em estabelecer
um diálogo. Entretanto, a persistência do médium doutrinador, aliada às
vibrações do grupamento, fez com que a barreira que se interpunha entre
ambos fosse rompida.
Absorto por imensurável dor, José − em sua maneira simples de falar
− confidenciou a Olavo que jamais, no decorrer de sua vida, conhecera o
carinho e o conforto de um lar, que jamais sentira o afago de mãos amorosas
que o envolvessem e que o conduzissem pelos caminhos da vida,
despertando-o para os reais valores da existência. Sozinho no mundo, buscou
na “cola”37 o refúgio para a sua solidão e a solução para a sua desesperança.
No entanto, seu corpo frágil, embora jovem, não resistiu aos maus tratos...
Agora, em ninguém confiava e nada esperava. Desejava simplesmente uma
cama para repousar, pois o cansaço era intenso e o seu corpo debilitado se
agitava em febris convulsões.

37
Denominação vulgar que se dá à cola de sapateiro.
72

Diante de tão dolorosa situação, eu e Marcos mentalizamos uma


cama macia, com alvos lençóis para acomodar José. Para nosso júbilo, quase
imediatamente à mentalização, ele exclamou, entre surpreso e emocionado: “É
de verdade? Essa cama é de verdade?” − Afinal de contas, aquela poderia ser
mais uma das “visões” provocadas pelo uso da cola.
Não resistindo diante de tamanha carência material e espiritual, senti
profundo amor por aquela criatura e desejei imensamente suprir, ao menos um
pouquinho, tamanha carência.
Concebi, então, mãos amorosas − entre elas, as minhas e as de
Marcos −, colocando o seu débil corpo sobre a cama e aquecendo-o com
espessos cobertores. Logo em seguida, aconcheguei-o junto ao meu coração,
como a um filho querido. Como se eu quisesse recompensá-lo pela ausência
de carinho e afeto, tomei suas mãos entre as minhas e comecei a beijá-las. Oh,
meu Deus, como descrever o que os meus olhos espirituais viram naquele
instante? José tinha as mãos desfiguradas, carcomidas pela cola. Quase
instantaneamente pude perceber que o mesmo acontecera com o seu rosto.
Mais fortemente, então, o retive em meus braços, doando toda a energia que
pudesse emanar do coração maternal. Naquele instante, ele balbuciou algumas
palavras de agradecimento pela cama e pelo cobertor, confirmando, assim, que
a mentalização feita por nós havia sido materializada no plano espiritual para
resgatá-lo.

***

Franco relatou-nos, após o término da comunicação, que o Espírito


de José, mesmo desencarnado, continuava cheirando cola. Mas que, no
momento do atendimento, o que ele cheirava, imaginando ser a droga, era na
verdade uma substância que ampliava a sua consciência. Por isso, ele
começou a perceber que estava em um lugar sombrio e que, à distância, havia
uma cama com lençóis muito alvos e que uma mulher o chamava, identificando
tudo isso, inicialmente, como sendo uma miragem. Franco confessou que,
73

enquanto acontecia a comunicação, como médium chorou também à parte, ao


ver-se diante de uma criatura tão carente!
Um Espírito que fazia parte da equipe de resgate a José, pelos canais
da intuição, esclareceu a Franco que os espíritos que se suicidam pela
ausência de pais, carinho e um lar são tratados maternalmente, pois o que fica
registrado em suas consciências é o sentimento do “nada” e a ausência do
“tudo”; que, não apenas José, mas outros espíritos em condições similares
foram levados à reunião, especialmente naquela noite, tendo em vista o grande
acúmulo de vibrações amorosas em decorrência de estar sendo comemorado o
Dia das Mães na nossa Casa Espírita.
É fato que o acaso não existe e que a Justiça Divina garante o
equilíbrio de todas as coisas. Mas é inolvidável que a lei de amor nos impõe o
dever de nos amarmos e de nos ampararmos, como filhos do mesmo Pai. O
próprio Jesus nos alertou para o fato de que “é necessário que haja
escândalos, mas ai daquele homem por quem vem o escândalo”38. Portanto,
como não nos cabe qualquer julgamento, a Providência Divina nos possibilita,
como coletividade, o resgate de débitos passados, por meio do amparo e da
orientação à infância abandonada.
Casos de Espíritos como o de José, ao retornarem em uma próxima
encarnação, provavelmente voltarão com maior chance de valorizar o afeto, o
lar e a família, pois cultivando os valores nobres que só os sentimentos
elevados são capazes de produzir, mais facilmente estarão emoldurando a
forma que deverão ter como seres que alcançarão a perfeição.

***

No caso do despertamento de José, o trabalho da doutrinação,


vigorosamente apoiado pelo grupo, foi fundamental, visto que o Espírito ainda
se sentia entorpecido pelos efeitos da droga inalada.
Apesar de o trabalho da sustentação ter sido relativamente facilitado,
pois o Espírito manifestou claramente as suas necessidades mais imediatas,

38
Mateus, capítulo17, versículos 7-9. Bíblia Sagrada, op. cit.
74

gostaríamos de enfatizar a espontaneidade do carinho que dedicamos,


atendendo ao imperativo maior que vibrava no âmago do seu ser: sentir-se
afagado e sentir-se amado, ainda que tardiamente...
A despeito desse nosso comentário, gostaríamos de esclarecer que o
fizemos para ressaltar a imensa dor moral que acomete todo aquele que,
precipitando-se pelas portas da morte, compulsoriamente se surpreende diante
da vida infinda; e que, por esse motivo, requer de nós todo o acolhimento, toda
a compreensão e toda a fraternidade. Para que esses sentimentos possam
brotar puros de cada coração, precisamos nos eximir de toda e qualquer
medida de julgamento, na certeza de que só a Onisciência Divina está apta a
fazê-lo.

***

6.3. Uma Canção para Ivo

Um dia, Antonie Saint-Exupéry, de forma simples e suave, porém


repleta de sabedoria, abordou um dos aspectos mais complexos que envolvem
o âmago da criatura humana: o sentimento39. Após ter sido cativada pelo
“pequeno príncipe”, a “raposa”, agora dócil e confiante, proferiu ao seu novo
amigo, de forma irrevogável, o compromisso que aquele assumira com ela: “Tu
te tornas eternamente responsável por aquilo que cativas” 40. Aquelas palavras,
revestidas de inquestionável veracidade, ressoam sibilantes na lei de ação e
reação, em cujas bases a humanidade vai erigindo o próprio destino, dia após
dia, incessantemente...
Os ídolos nascem e tornam-se imortais, pois repercutem em si
mesmos milhares de “eus” que jaziam aprisionados no medo, na
insignificância, na introspecção e na impossibilidade de ser e de fazer. Quem
se posta à frente de uma multidão em burburinho, transmudando sonhos
singulares em coletivos, será responsabilizado pelos equívocos cometidos por

39
SAINT-EXUPÉRY, Antonie. O Pequeno Príncipe. São Paulo: Círculo do Livro: 1944.
40
Idem, ibidem.
75

todos os que compartilharam das suas ideias, atitudes e palavras, pois foram
cativados.
Ivo, em sua última encarnação, arrebanhara multidões! Fora músico e
cantor. Tornara-se um grande ídolo e desencarnara em face do excessivo uso
de bebidas alcoólicas e outras drogas. Só após ter decorrido muito tempo de
sofrimento e aprendizado, pôde perceber as consequências que as suas
loucuras, intransigências e fracassos produziram naqueles que o idolatraram.
Abatido por mordaz remorso, tinha consciência de que deveria fazer o
caminho de volta e que a nova caminhada seria cingida de intensas lutas e
copiosos sacrifícios... Confessou-nos que, no tempo que ora decorre − após ter
sido julgado e condenado por sua própria consciência −, só acalentava um
único desejo: poder voltar à Terra e fazer-se ídolo novamente. Para obter êxito
nesse empreendimento, estava estudando profundamente a música cristã, a
fim de usá-la como instrumento de auxílio. Nesses estudos, aprendeu a
reverenciar aquela que o recebeu nos braços e que, por acréscimo de
misericórdia, permitiu-lhe, naquela noite, mesmo ainda estando em processo
de burilamento para o necessário resgate da infração cometida, ser o portador
de uma mensagem endereçada ao nosso grupo.
Antes de fazer a leitura da carta, porém, revelou-nos a forma como se
deu o seu atendimento. À medida que Ivo desenvolvia sua narrativa,
reavivávamos o quadro mental que possibilitara o seu resgaste. Então, mais
uma vez, concebemos o ramalhete de outrora, cujas flores eram destituídas de
espinhos. O coração bateu-nos descompassadamente, ao sabermos que as
flores ofertadas a Ivo se transformaram em “doce chuvinha”, proporcionando-
lhe alento e paz; e que as nossas vozes, entoando a música “Ave Maria”, de
autoria do Grupo de Canto Maria Madalena, o despertara do torpor em que se
debatia, vitimado pelas sombras de interminável pesadelo.

***

A generosidade de Maria revelada pelo depoimento de Ivo, dando-


nos a conhecer os benefícios por ele recebidos em nossa reunião de auxílio,
76

enterneceu nossos corações. Desnecessário seria dizer o quanto aquele relato


produziu em nós mais estímulo para prosseguirmos em nossas atividades. No
entanto, julgamos relevante frisar esse fato, visto que muitas vezes, diante das
dificuldades pessoais, sentíamo-nos incapacitados para o trabalho. Quando
isso acontecida, colocávamos em dúvida se nossos parcos recursos estavam
tendo alguma utilidade para o auxílio direto ou indireto dos Espíritos em
sofrimento.
Assim, ficou evidente para nós que o amor que dedicávamos ao
trabalho e a seriedade com a qual o realizávamos eram capazes de se
sobrepor às nossas imperfeições de natureza espiritual, fazendo-nos
instrumentos úteis na grande obra do labor fraternal. Além das revelações
diretas de Ivo e da mensagem de que foi portador, pudemos compreender a
lição maior que ficou implícita nas entrelinhas de suas palavras: a deferência
com que a Legião dos Servos de Maria acompanhava as nossas angústias
mais secretas...
Transcrevemos a seguir alguns trechos da carta portada por Ivo:

Filhos queridos que tanto amamos,


Levamos até vocês o agradecimento sincero pela dedicação e
pela vontade que brotam no coração de cada um.
Muitos foram os atendimentos e os serviços prestados. Por isso, como
singela homenagem, apresentamos-lhes o resultado de um dos muitos
atendimentos feitos por esse grupo.
Abençoadas sejam as horas de auxílio dispensadas a esse
trabalho e as lágrimas vertidas nesse ambiente de amor, em favor
daqueles que não têm mais a noção do tempo e que se acham
ulcerados pelo mais doloroso martírio.
Ao completarmos mais esse ciclo de trabalhos, Paulo nos
apresentou relatórios satisfatórios; Marta elogiou-os pela sensibilidade e
pelo amor que dedicam; Ricardo nos contou da vontade de
implementarem, cada vez mais, as possibilidades de auxílio. Portanto,
diante de relatórios tão positivos, trouxemos na última reunião desse
grupamento, equipe especializada que observou as ações
empreendidas por todos, analisando com profundidade o auxílio
prestado.
Apesar de conhecermos todas as suas potencialidades,
queríamos nos cientificar de alguns detalhes maiores. Foi assim que
notamos também a gravidade de algumas questões inerentes ao grupo
e interferimos em favor de vocês.
77

Abençoamos os projetos salutares que delineavam auxílio e fizemos,


até mesmo, algo que poderíamos classificar como “mudança de rota”,
para que colisões desnecessárias não viessem a perturbar tão
abnegados filhos! Saibam, porém, que estamos cientificando vocês
dessa intercessão, não como algo que não merecessem, nem mesmo
que devessem saber por algum motivo menos importante, mas para que
soubessem do nosso apreço e do quanto necessitamos do
fortalecimento desse grupo.
Ao observá-los, sentimos a felicidade de notar o crescimento que
tiveram e a sinceridade que os acompanha. Grandes progressos
realizaram e, por isso, a partir de agora, o grupamento contará com
mais algumas possibilidades e mais um técnico que irá lhes mostrar
detalhes ainda não percebidos.
Especialmente aos irmãos da sustentação, com o passar do
tempo, traremos técnicas que aqui usamos e que iremos implementá-
las entre vocês também.
Muitas felicidades advirão da persistência no trabalho; persistência esta,
não do cumprimento de uma obrigação apenas, mas, como bem
observou Paulo, fruto do amor transmitido em todas as suas formas.
As lágrimas vertidas são reais. Não são produto de uma
comunicação mediúnica, forçadas pela dor de um irmão. São, sim,
lágrimas cúmplices que brotam espontaneamente, que nós aqui da
Colônia classificamos como doação.
Perseverem sempre, cada vez mais. Estaremos acompanhando
cada um dos seus passos, pois todos estão inscritos em nossos
quadros de auxílio e gostaríamos de recebê-los quando chegar o
momento do retorno à verdadeira vida.
Aqui encerramos a nossa carta, rogando ao Nazareno que seja
doce luz em nossas vidas.

Almejamos que o conteúdo dessa carta possa servir também de


incentivo tanto àqueles que já se dedicam a esse labor quanto aos que se
sentem impulsionados a abraçar a causa advogada por Maria de Nazaré, pois,
como nos foi revelado, mesmo a opaca luz que nos reveste a alma pode se
transmudar em claridade no caminho dos que vagueiam na mais completa
escuridão.

***
78

6.4. Labirinto Mental

A ânsia das criaturas em busca de si mesmas, às vezes, submerge-


as em um mar revolto de ilusões e enganos. Não saber qual o caminho a tomar
pode ser fruto de um comodismo, até mesmo inconsciente, cuja origem quase
sempre está na consciência culpada que anseia se redimir ante a própria vida.
Mas remissão é sinal de renúncia no campo das lutas terrenas. Para aqueles
que têm o horizonte limitado pela visão materialista, é preciso gozar a vida,
usufruindo todas as regalias que ela puder oferecer, pois o tempo passa célere
e, nessa perspectiva, renunciar é cultuar a inércia e a passividade. De tal sorte,
os conceitos embaralham-se na escala de valores e as criaturas perdem a
noção de responsabilidade consigo mesmas, colocando em xeque o direito de
viver.
Antenor vivia indiferente à responsabilidade que lhe competia ante os
compromissos assumidos. Era um homem simples que lutava com dificuldade
para sobreviver. Trabalhava como motorista de ônibus em uma grande
empresa, de onde tirava o sustento da sua família. Aos fins de semana,
costumava se reunir com os amigos para uma rodada de cerveja. No entanto,
com o decorrer do tempo, passou a não fazer mais diferenciação entre as
horas livres e as horas de labor. Constantemente, chegava embriagado ao
trabalho, negligenciando a tutela sobre as vidas que diariamente transportava.
Um dia, totalmente dominado pelos efeitos do álcool, não foi capaz de
controlar o ônibus que, após se chocar com uma carreta, levou a óbito todos os
passageiros e suprimiu a sua vida também. Desde então, passou a viver em
um inferno mental. Ininterruptamente, ouvia os gritos desesperados daqueles
que haviam perdido os entes queridos de forma tão abrupta. Acusações
tenazes, à semelhança de milhares de bombas a explodir a um só tempo,
repercutiam na sua casa mental, num intenso bombardeio. Via e revia os
corpos inertes e desfigurados pela violência com que foram arrebatados da
vida.
Não suportando mais tal suplício mental, Antenor acionou um
mecanismo de defesa em sua mente, bloqueando a revivescência de todo e
qualquer fato relacionado ao acidente que passou a negar veementemente.
79

Quanto tempo assim permaneceu, encarcerado na insânia da própria


consciência? Não sabemos precisar. No entanto, a Comiseração Paternal, que
reergue e reconduz ao caminho abandonado, havia chegado para ele.
Enclausurado em intrincadas teias mentais, Antenor foi conduzido à
nossa reunião de auxílio. As palavras que proferia, restringindo-se à formação
das mesmas frases, evidenciavam o seu desequilíbrio. O grupo, sem muita
dificuldade, diagnosticou que se tratava de um caso de bloqueio mental, pois
ele relatava que estava dirigindo um ônibus e que, apesar de ter bebido um
pouco, estava muito bem, que estava acostumado a fazer sempre aquilo, sem
perigo algum. Indefinidamente, repetia a mesma história...
Olavo, então, sugeriu-lhe que continuasse a viagem, uma vez que ele
afirmava estar muito bem. Inicialmente, Antenor demonstrava ignorar a
sugestão recebida. Mas, aos poucos, foi cedendo à influenciação de Olavo,
que infundiu um pouco mais de energia41 ao tom de voz, a fim de encorajá-lo a
prosseguir. Nós da sustentação, atentos ao trabalho da doutrinação,
reforçávamos todas as palavras que eram ditas, procurando emoldurá-las
também com firmeza, para que ele as recebesse como ordens que não
poderiam ser descumpridas.
Após a junção das nossas vibrações mentais, impulsionadas pelo
desejo sincero de ajudar, Antenor cedeu à sugestão de prosseguir a viagem...
Depois de breves momentos de expectativa, um grito desesperado, seguido
por um gemido doloroso, rompeu o pesado silêncio. Ele finalmente enxergara o
acidente...
Pedidos de socorro, intercalados por descrições sumárias de graves
ferimentos na cabeça, de onde o sangue jorrava em borbotões, confirmaram-
nos que o bloqueio mental estava desfeito. A partir daquele instante, Antenor
iria receber o auxílio, de acordo com o novo quadro mental apresentado.
Concluído o atendimento, o Espírito de Antenor foi desligado do aparelho
mediúnico que caridosamente fora colocado à sua disposição, para que, em

41
O termo “energia” aqui empregado se refere a uma espécie de ordem, pois a docilidade e as palavras
carregadas de meiguice também são formas de energia, sendo, aliás, poderosíssima na terapêutica a
Espíritos enraizados no mal, no sentimento de desespero, entre outros.
80

contato com as energias do médium, pudesse revivescer as impressões do


acidente fatídico.
Albergado na Espiritualidade, em local adequado ao seu refazimento,
Antenor irá desenvolver em si mesmo a compreensão da lei de ação e reação,
segundo a qual ninguém pode se furtar às consequências dos atos praticados.
Mas, um dia, em algum momento da Eternidade, ele sentirá o júbilo que advém
do dever cumprido! Tal é a Lei.

***

Como já dissemos no decorrer da narrativa, não nos foi difícil


identificar, pelas características manifestadas pelo Espírito, que se tratava de
um caso de bloqueio mental e que, portanto, o nosso trabalho deveria ser o de
fazer com que ele avançasse nas cenas bloqueadas. Entretanto, chamamos
atenção para a forma como a doutrinação atuou, demonstrando estar bem
sintonizada com os mentores responsáveis pelo socorro ao Espírito, pois quase
imediatamente compreendeu que deveria incentivar Antenor a prosseguir a
viagem.
A sustentação, neste caso específico, substituiu a docilidade pela
energia, apoiando Olavo no seu empreendimento. Assim, ficou patente a
relevância de a sustentação e a doutrinação trabalharem em harmonia,
despojando-se ambas de qualquer sentimento de personalismo ou de
individualismo, o que atrapalharia sobremaneira o auxílio.
Desenvolver o sentimento de cooperação, de coletividade e de união
é fundamental a qualquer grupo, em qualquer nível de trabalho. No entanto,
quando se trata de atendimento a Espíritos suicidas, esse sentimento deve se
transformar em dever, haja vista a grandiosidade do sofrimento experimentado
por esses irmãos.

***
81

Capítulo VII

SUICÍDIO ASSOCIADO AO REMORSO

7.1. Mãos que não Acalentaram

Aquela noite era, para todos nós, muito especial... O Grupo de Canto
Maria Madalena (GCMM), antecipando-se ao “Dia das Mães” que oficialmente
seria comemorado no domingo seguinte, havia feito uma apresentação
belíssima, emocionando não apenas o público presente, como também os
próprios integrantes do coro.
Havia um clima de grande ternura no ar... A figura materna, por sua
incomparável capacidade de amar e perdoar, havia sido enaltecida. O nosso
grupo iniciou as atividades mediúnicas envolvido pelas docílimas vibrações que
pairavam no ambiente... Como quase sempre acontecia, tivemos
primeiramente a comunicação do mentor que discorreu sobre o valor da
maternidade, chamando-nos a atenção para a responsabilidade dos
compromissos assumidos diante dela.
Tocada em sua sensibilidade maternal, que requer a todo o momento
dedicação e renúncia, Lucíula ofereceu o seu aparelho físico para o
intercâmbio mediúnico. Apresentou-se, então, um espírito renitente em não
receber qualquer tipo de auxílio, por não acreditar que alguém pudesse
dispensar-lhe carinho, afeto ou atenção, após seu gesto inescrupuloso de ter
recusado o próprio filho. A sua consciência, estigmatizada por culpa e remorso,
intermitentemente registrava que se tornara indigna da maternidade.
Olavo, percebendo o drama íntimo em que a comunicante se debatia,
afirmou que o erro ainda é lugar-comum às criaturas. Sem acusá-la de coisa
alguma e sem pedir contas dos seus atos, sugestionou o grupo a trabalhar na
concepção mental de um quadro que falasse profundamente ao coração
daquele espírito.
82

Como simbologia à outra oportunidade no campo maternal, o grupo


mentalizou um bebê que ansiava pelo aconchego dos seus braços e carecia do
amor do seu coração. Entretanto, Zulmira não conseguiu segurá-lo.
Percebendo a resistência dela em aceitar novamente a maternidade,
intuitivamente, Olavo começou a questioná-la sobre os reais motivos daquela
atitude, uma vez que, de acordo com o seu próprio desabafo, seu grande
sonho era ser mãe. Mas foram indagações que ficaram sem respostas, pois até
o fim do atendimento, ela manteve a postura de não aceitar auxílio, por não se
achar merecedora de qualquer complacência.

***

Após a leitura do texto psicografado durante a reunião (transcrito no fim


deste capítulo), que dissertava sobre o trabalho realizado pelo GCMM, Laura
relatou-nos, entre lágrimas, que, após o término da psicografia, percebeu um
quadro em que alguém a entregava um bebê, pedindo que o amamentasse.
Grande foi a sua surpresa diante daquele acontecimento, pois várias vezes
sonhara exatamente com aquela cena! Como sempre acontecia em seus
sonhos, tomou ternamente o bebê nos braços e começou a amamentá-lo. Pôde
vislumbrar que o leite que jorrava dos seus seios tinha uma simbologia
especial: por meio dele, o amor se materializava, pois, à medida que era
sugado pelo bebê, este ia ficando aureolado por uma luz de tonalidades
safíricas, ao mesmo tempo em que a sua expressão tomava feições de
indescritível apaziguamento e satisfação.
O relato de Laura era tão carregado de emoção que nos envolvemos em
sua narração, como se aquelas cenas tivessem sido plasmadas naquele
momento e nós as observássemos com os olhos da alma.
Dando continuidade à narrativa, Laura nos contou que, enquanto
observava extasiada a transfiguração que se operara com aquele bebê, a sua
atenção foi rapidamente desviada pela aproximação de algumas figuras
femininas. Após observarem-na por breves segundos, explicaram que o
acontecimento que ela protagonizara naquele momento era, de certa forma, um
83

fato normal e corriqueiro. Durante o sono, muitas mulheres encarnadas são


utilizadas pela Espiritualidade para socorrer os abortados que ainda sentem
necessidade de permanecer ligados a um corpo maternal. Aquela revelação
era para Laura a resposta às suas indagações sobre os sonhos que pareciam
tão estranhos, uma vez que seus filhos já estavam na adolescência.
Finalizando sua narração, Laura disse-nos que após amamentar o bebê, em
vão o mostrou a Zulmira, que se recusou terminantemente a olhá-lo,
demonstrando grande repulsa por ele.
Franco, então, confirmando o relato de Laura quanto à recusa de
Zulmira em olhar o filho, falou-nos que, quase no encerramento da
comunicação, pelas vias da audiência, pôde ouvir a voz do espírito que fora
abortado. Ele esclareceu que não era mais um bebê e que há muito tempo
desejava tocar o coração daquela que deveria ter sido a sua mãe, mas que,
mais uma vez, ela recusara a sua aproximação.
O conhecimento de tais fatos doeu-nos profundamente, pois eles nos
revelavam quão dolorosa fora a semeadura de Zulmira e que, desse modo, a
colheita não se daria sem lutas e sacrifícios.

***

Alguns aspectos do caso “Zulmira” merecem ser comentados, dada a


sua especificidade.
Quando Zulmira se recusou a aceitar qualquer forma de auxílio,
demonstrou agir daquela maneira impulsionada pelo remorso de ter rejeitado,
no passado, a maternidade. Por isso, quando Olavo nos sugestionou a
mentalização de um quadro que falasse diretamente ao coração daquele
espírito, concebemos um bebê, frágil e indefeso, necessitando do aconchego
dos seus braços. Pareceu-nos ser esta a melhor forma de sensibilização...
Entretanto, ela não conseguiu segurá-lo.
Olavo percebeu naquela atitude algo mais do que uma dificuldade criada
pelo remorso. Pareceu que Zulmira continuava a rejeitar a maternidade. O que,
a princípio, poderia ser apenas uma inferência de Olavo foi fato confirmado,
84

quando Lucíula relatou que ao oferecer o bebê à Zulmira, essa não quis
recebê-lo. Franco informou-nos que o espírito abortado confessou, pelos
canais da audiência, que havia tentado nova aproximação com Zulmira, porém
sem obter nenhum sucesso.
Muitas interrogações ficaram em nossas mentes em relação a esse
caso. Não nos foi dado a conhecer nem como e nem por que Zulmira se
suicidou; qual o êxito alcançado com o atendimento dado a ela naquela noite –
tendo em vista que ela continuou a recusar a maternidade –; e nem as
providências que seriam ultimadas a seu favor.
Compreendemos, não obstante, que nem sempre teríamos todas as
respostas e que elas viriam no momento certo, se assim fosse necessário; que
o mais importante era a nossa disposição em servir, incondicionalmente.
Muitas lições acerca da maternidade foram suscitadas! Muitas reflexões
a respeito das oportunidades que a vida oferece àqueles que em algum
momento das suas existências colaboraram com a prática do aborto,
acovardando-se na omissão ou comprometendo-se na indução à ação
delituosa!
Por toda parte, a infância desprotegida reclama amparo. Mães
desvalidas suplicam socorro para os filhos que definham na miséria. Mãos
humanitárias esperam por outras mãos no auxílio às creches, aos orfanatos, às
casas transitórias e às escolas de evangelização. Quantas oportunidades de
remissão, no exercício diuturno do amor!

Trechos da Mensagem Psicografada falando sobre o Trabalho do GCMM

Irmãos queridos, Jesus seja com todos!

Nesta noite, o trabalho do Grupo de Canto teve um alcance


bastante significativo no socorro prestado aos irmãos que para aqui
foram conduzidos.
As vibrações melodiosas das músicas entoadas, à semelhança
de luzes, penetravam em seus organismos espirituais, desatando as
amarras do desamor e da tristeza.
Tocados pelo amor que emanava do coração de cada integrante
do Grupo, muitos puderam ser encaminhados para tratamento.
85

A Colônia Maria de Nazaré muito se alegra ao ver o esforço de


cada um em superar as próprias dificuldades e fazer prevalecer, acima
de tudo, a dedicação e o amor ao trabalho.
Muita paz.

O fato de nos empenharmos no auxílio aos desventurados suicidas não


nos eximiu de difíceis provações no campo da saúde, dos sentimentos ou
mesmo no campo material. Porém, sempre sentíamos que corações amorosos
velavam por nossos destinos, confortando-nos e amparando-nos nos
momentos de nossos testemunhos, bem como amenizando as nossas aflições,
conforme fosse possível.
Sem dúvida, as provas pelas quais passamos nos auxiliaram a
compreender melhor a dor alheia, ensinando-nos os rudimentos da fraternidade
que deverá congraçar, no tempo da eternidade, todos os filhos de Deus.

***
86

Capítulo VIII

SUICÍDIO ASSOCIADO A ENFERMIDADES GRAVES

8.1. No Alvorecer de um Novo Dia

Caía a noite sobre a pequena cidade... O silêncio fazia-se pesado


pelas ruas mal iluminadas. Uma melancolia tão intensa como as sombras que
ocultavam os becos cingia o coração de Idalina. Acumulava-se em seu peito
uma avalanche de gritos aflitivos, eclodindo, por fim, em colossal
desesperação.
O vento sussurrava nas folhagens uma cantiga triste que se
prolongava em notas contínuas e bafejava suave frescor ao redor. Era como se
buscasse amenizar o queimor das chagas purulentas que espocavam no corpo
moribundo daquela criatura abandonada pela companhia do mundo, mas
jamais pela Misericórdia de Deus! Faltava pouco, muito pouco para o seu
ressurgimento em grande luz! Muito em breve, todas as ulcerações seriam
cicatrizadas e aquele corpo macerado se transmudaria em vigor e robustez,
quitando injuriosos débitos do passado. Entretanto, enquanto o terrível mal
corroia o seu corpo, a incredulidade carcomia a sua coragem. Via-se
enfraquecida e arrebatada por intenso cansaço.
− Para que continuar lutando? − Se o fim era irrevogável e o
desamparo abria úlceras muito mais vorazes em seu coração, abreviaria o
fatídico momento, decidira-se Idalina, no auge da irresignação.
Desde, então, já não podia compreender o que se passara. Via-se
aprisionada em lugar desconhecido. Ouvia por toda parte gargalhadas
zombeteiras. Vozes sarcásticas gritavam as suas deformidades e a sua
fealdade. Aos seus ouvidos, todo aquele burburinho ecoava ininterruptamente,
constituindo-se em implacável tortura. Ao menor movimento, sentia pedras
87

voarem em sua direção. Sentia exalar do seu corpo um cheiro nauseabundo, e


as dores, bem mais intensificadas, atingiam níveis insuportáveis.
Totalmente envolvida por essa atmosfera sombria, Idalina foi trazida à
nossa reunião. Experimentou, inicialmente, ligeiro bem-estar com o silêncio que
pairava no ambiente. No entanto, ao ouvir a voz de Olavo, colocou-se na
defensiva, pedindo-lhe que se afastasse e que a deixasse sozinha.
Diante da insistência daquele estranho em permanecer próximo,
questionou se ele não temia o contágio e se não sentia repulsa por sua
aparência disforme. Ao ouvirmos aquelas palavras, denunciando a enorme
carência daquela filha de Deus, fomos tomados por imensa ternura e a
envolvemos em um amplexo de luz.
Olavo, então, emoldurando ainda mais de afetuosidade a voz, falou-
lhe ao coração. Exortou a Paternidade Divina que acolhe com imensurável
amor Seus filhos amados; e rememorou Jesus que, em nome do Sempiterno,
enxugava as lágrimas e curava as feridas, albergando junto a Si os mais
necessitados.
Idalina, fragilizada pela dor, pelo abandono e pela solidão, tinha
ímpetos de aceitar o auxílio, mas, à semelhança de vento tempestuoso a
soprar em seus ouvidos, novamente ouvia as vozes e as gargalhadas, que a
faziam recuar atemorizada. Percebemos que era imperioso intensificar a
emissão de vibrações amorosas, para que ela pudesse fortalecer a sua
confiança em nós. Concentramo-nos, então, nas palavras da doutrinação e
mentalizamos uma luz brilhante e intensa, que foi mostrada a ela como símbolo
de um novo momento: o de recomeçar.
Olavo, oferecendo-lhe as suas próprias mãos, que eram nossas
também, ergueu-a lentamente, amparando-a nos primeiros passos em direção
àquela nova estrada que surgia. Ao retê-la amorosamente junto a si e ao falar-
lhe sobre a missão daqueles que salvam vidas sem temer o contágio das
doenças, ele fomentava em Idalina a crença na humanidade e ensinava a ela
que o amor é força divina capaz de vencer todas as intempéries da vida.

***
88

Não obtivemos explicações tanto a respeito do caso “Idalina” quanto


do caso “Dário”42. Não nos foi esclarecido como aconteceu o seu suicídio.
Entretanto, como de outras vezes, tal fato não trouxe qualquer obstáculo ao
desempenho das nossas tarefas, pois fomos preparados pela equipe espiritual
para assim atuarmos.
Quando a nossa reunião foi transformada em mediúnica, o mentor
Paulo ou qualquer outro membro da equipe espiritual sempre se antecipava às
comunicações e nos dava informações sobre os casos que atenderíamos na
noite, oferecendo-nos detalhes a respeito, a fim de que pudéssemos nos
orientar quanto ao socorro a ser prestado. No entanto, à medida que o tempo
foi passando e fomos adquirindo um pouco mais de experiência, tal
procedimento deixou de ser rotina e passou a ser prerrogativa para casos
específicos que necessitassem de condutas ainda desconhecidas do grupo.
Mais uma vez, a Misericórdia de Deus se fazia presente, ensinando-nos que as
mazelas alheias somente a outrem são reveladas quando forem úteis no
empreendimento intercessor.
Ressaltamos que a doçura de Olavo, especialmente neste caso, foi
fator decisivo para o sucesso do atendimento, haja vista o sentimento de
inferioridade cultivado em alto grau por Idalina. Aliás, sentimento bastante
comum nos espíritos que passam por provas terrenas difíceis no campo da
saúde, pois, além da dor física, padecem também da dor moral, podendo esta
última se originar de diversas situações isoladas ou combinadas entre si.
Merece destaque a falta de caridade por parte de alguns dos que
compartilham a vida com o enfermo, quando fazem julgamentos condenatórios,
mesmo que veladamente. Há ainda a própria consciência culpada do espírito,
impossibilitando-o de enxergar na dor física uma oportunidade de reequilíbrio e
resgate; a resistência em sair do ostracismo e agir no bem, apesar das
limitações impostas pela doença; e, por fim, a incredulidade que motiva o
padecente a crer que está à mercê do acaso e que a dor irá latejar
perenemente.

42
Personagem da história Retratos do Passado, Cap. X, 10.1.
89

No encerramento das nossas atividades, apesar de ainda estarmos


tomados de compaixão por Idalina, sentíamos, ao mesmo tempo, grande
euforia por sabermos que mais um Espírito havia despertado para a verdade
suprema de que ninguém está deserdado do amor do Pai e que a vida nunca
perece.

***

Com o caso “Idalina”, concluímos este capítulo, colocando em pauta


a desilusão ocasionada pelo isolamento social, quase sempre resultante do
comportamento preconceituoso que, nos dias atuais, desafia a própria
legislação. Mesmo em tempos de inclusão e de valorização do indivíduo,
aqueles que não se encaixam nos padrões culturais de beleza,
intelectualidade, nível social, opção sexual ou não gozam de saúde física e/ou
mental, ainda são relegados à margem da sociedade e abandonados à própria
sorte.
Essa desilusão amorosa com o mundo, com a vida e, claro, com as
pessoas poderá desencadear casos de depressão grave, que, se não tratados
adequadamente, resultará em finais trágicos, em que as luzes se apagarão
antes que o espetáculo tenha chegado ao fim.

***
90

Capítulo IX

SUICÍDIO COMO VINGANÇA

9.1. No Silêncio do Picadeiro

Era um fim de tarde de domingo... A última sessão da matinê ia


começar... As arquibancadas, as cadeiras e até os camarotes estavam lotados.
A música alegre enchia aquele pequeno mundo, tornando-o ímpar sobre a face
da Terra. A magia daquele ambiente, colorido e extravagante, produzia
contentamento à assembleia que se imantava de vida. Todos eram iguais: a
um só tempo, sorriam e sonhavam e, intensamente, viviam!
No iluminado picadeiro, os números artísticos se sucediam, arrancando
aplausos calorosos e brados de alegria. O tempo passava célere e aproximava-
se o encerramento do show circense. O apresentador, então, orgulhosamente,
anunciou a sensação do espetáculo: os palhaços trapezistas! Para delírio da
plateia, eles fariam o número sem a rede de proteção, numa demonstração de
coragem e desmesurada autoconfiança. Os artistas voadores, aliando graça,
habilidade, agilidade e precisão, magnetizavam os olhares atentos e
fascinados.
Subitamente, o inusitado aconteceu... Em uníssono, um grito coletivo
ecoou abafado e, num átimo, foi substituído por um silêncio sepulcral. Um dos
palhaços trapezistas, tendo aparentemente calculado com imprevisão o
momento de soltar-se do seu trapézio, não pôde ser resgatado pelo outro. Sem
rede de proteção, a arena de alegria se transmudou em arena de horror. Na
assembleia numerosa, todos permaneceram iguais: enterraram o sonho,
engoliram o riso e libertaram o pranto... Agora, não mais aplausos, somente um
corpo de palhaço inerte no picadeiro.
91

Difícil imaginar que aquele mundo mágico, adornado de brilho e cores,


pudesse camuflar semblantes de dor e angústia... Após o apagar das luzes,
quais sombras silenciosas, os mestres da alegria e do entretenimento
protagonizavam, em preto e branco, o espetáculo da própria vida.
Definitivamente, eram tão somente pessoas!
Depois do trágico acidente, a tenda foi recolhida e a caravana partiu,
preparando o próximo espetáculo. Provavelmente, as lágrimas aprisionadas
foram libertadas ao longo do caminho...
Mas, para Pipoca − este era o seu nome –, aquela matinê ainda não
havia acabado. Apresentou-se em nossa reunião, encarcerado nos instantes
que precederam ao ato insano. No intervalo de poucos segundos, imperativa e
seguidamente repetia: “Tirem a rede, tirem a rede. Só farei o número se tirarem
a rede”.
A doutrinação, com o objetivo de fazer o Espírito perceber a
consumação do ato, informou-lhe que a rede já havia sido retirada. Ao se
certificar de que a sua exigência havia sido atendida, o palhaço trapezista
demonstrou enorme contentamento, dando-nos a conhecer o real motivo de
não querer a rede: era uma armadilha. Ele havia planejado o suicídio como
vingança contra o seu parceiro que estaria arruinado ao ser responsabilizado
por sua morte.
Um plano perfeito, se a vida fosse uma chama que pudesse se apagar
com um leve sopro. No entanto, nenhuma atitude, por mais resoluta que seja,
poderá consumi-la. Ela continuará palpitante na criatura imortalizada por Deus.
Pipoca, após a consumação do penoso plano, recusou-se a admitir que
o corpo que jazia no picadeiro era o seu... Entretanto, em profusa confusão
mental e sentindo-se gravemente ferido, lamentava não ter conseguido
extinguir a própria vida e deplorava o fracasso da sua vingança. Martirizado por
dores convulsas, pediu que alguém socorresse o palhaço inerte no chão,
observando que o pescoço dele sangrava, à semelhança do seu próprio.
Olavo, então, cônscio da condução que deveria dar ao caso, convenceu-
o a virar o corpo sem vida...
92

Um grito de pavor, então, ecoou em nossa sala... Pipoca reconhecera


que aquele corpo imerso em uma poça de sangue pertencia-lhe. O bloqueio
mental fora, enfim, desfeito. Naquele momento, começava para ele um novo
espetáculo. Não tão cheio de brilho, de luzes, de cores, de aplausos...

***

Franco nos disse que percebeu o Espírito se aproximando várias


vezes do corpo inerte, sem que se dispusesse a virá-lo, uma vez que aquele
estava de bruços. Sempre que dele se acercava, o seu pensamento retornava
ao número que iria ser feito, sem a colocação da rede.
A sustentação trabalhou sintonizada com a doutrinação, apoiando-lhe
os esforços. Como mãos invisíveis, auxiliamos Pipoca a virar o corpo que jazia
no picadeiro e estendemos os braços para aconchegá-lo no momento em que
compreendeu ser seu o corpo que lá estava.
Enquanto ele gritava desesperado, mentalmente lhe falávamos da luz
da manhã que, suavemente, ia dissipando a escuridão. Do nosso coração,
emanações de carinho eram projetadas em direção à Pipoca com o objetivo de
aliviar a sua dor.
Além de tudo isso, amorosamente, Olavo falou da Bondade do Pai,
que jamais preteriu nenhum dos seus filhos. Diante da realidade que não mais
poderia ser ignorada, revelou-lhe que a vida é fonte inexaurível e que nós, sob
nenhuma condição, conseguiremos extinguir os seus mananciais.
Em verdade, somos todos “tutelados” de Maria. Espíritos
recalcitrantes no erro, quase na mesma proporção em que imploramos uma
nova oportunidade, ficamos indiferentes a ela. Agora, que refazemos lições
passadas, Deus, em sua misericórdia infinita, concede-nos a grande chance de
reabilitação no auxílio ao próximo.
Oraremos por você, Pipoca, a fim de que possa, no tempo em que a
eternidade nos outorga, remontar um espetáculo de luz, no qual o seu antigo
parceiro possa recobrar a paz e a autoconfiança, recuperando-se do trauma
gerado por aquela queda fatídica; e que a alegria de uma tarde festiva possa
93

dissipar os miasmas de horror e de trevas das mentes daqueles que assistiram


àquele espetáculo, naquele findar de tarde de domingo!
As consequências do ato suicida são de enormes proporções e não
ficam restritas ao Espírito imortal, mas afetam direta e indiretamente várias
pessoas. O sentimento de culpa por uma palavra não dita, uma visita não feita
ou uma solicitação não atendida pode desencadear reações diversificadas em
parentes, namorados e, até mesmo, em amigos.
Comumente, a tristeza evolui para estados melancólicos e, em alguns
casos, para distúrbios depressivos graves. Na maioria das vezes, essas
pessoas passam a necessitar de socorro especializado. Quantos dramas são
inimagináveis na dimensão espiritual!

***
94

Capítulo X

O PRECONCEITO OBSTRUINDO O SOCORRO

10.1 Retratos do Passado

Conservamos a individualidade após deixar o corpo de carne 43. Essa


talvez seja uma das grandes surpresas que acomete o Espírito ao despertar no
Mundo Espiritual. Perceber-se tal como sempre foi, com as mesmas
dificuldades e ressentindo-se das necessidades que, aparentemente,
permanecem inalteráveis, representará para ele um novo aprendizado, que irá
exigir de suas estruturas mentais acomodação à nova realidade.
Jesus, ao declarar-se filho de Deus, assentou na Terra as balizas da
fraternidade e da igualdade, ensinando-nos que, apesar das diferenças,
tivemos origem no mesmo foco de vida e amor. Entretanto, na vagarosa
marcha evolutiva que temos empreendido em encarnações sucessivas, temos
refeito tais lições sem, no entanto, conseguir internalizá-las no imo de nossas
consciências. Continuamos intransigentes com as diferenças que nos
individualizam como matéria e espírito, disseminando o preconceito, que se
alastra como erva daninha a sufocar as sementes de tolerância, respeito e
fraternidade.
Ao recebermos o Espírito Dário, comoveu-nos o fato de senti-lo
aprisionado a uma intensa revolta, reagindo violentamente a qualquer
possibilidade de socorro. Logo percebemos que aquela atitude denotava o
acionamento de um mecanismo de defesa, pois rebateu todas as
argumentações de Olavo, afirmando não acreditar que alguém quisesse

43
KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos. 76.ed. Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 1995,
Questão 150.
95

realmente auxiliá-lo, mas, unicamente, fazer chacota da sua estranha


aparência, ridicularizando-o mais ainda.
Aliando o desejo sincero de ajudar à certeza de que a Espiritualidade
presidia a condução daquele caso, a doutrinação, após significativo esforço,
conseguiu convencê-lo de que não estávamos ali para humilhá-lo, que também
tínhamos nossas dificuldades e, por essa razão, nos cabia ser solidários uns
com os outros. Vencido pela própria dor e almejando um pouco de paz e alívio,
Dário deu mostras de que queria realmente acreditar na sinceridade daquelas
palavras. Mas, impelido pelos estigmas da zombaria e da humilhação, chegou
a pedir provas de que o grupo tencionava mesmo auxiliá-lo.
Em dado momento, porém, o diálogo foi por ele interrompido,
demonstrando-nos que alguma coisa havia chamado sua atenção. Quase
imediatamente, ouvimo-lo perguntar sobre “como conseguiram aquele álbum;
como conseguiram levá-lo até lá”.
Olavo, atento ao trabalho dos técnicos espirituais, encorajou-o a abrir
o álbum, a fim de verificar o que havia dentro dele. Quanta emoção demonstrou
Dário, ao reconhecer que aquele era o seu álbum de fotografias e que estava
diante das recordações felizes da sua infância. Enquanto admirava as fotos, foi
sentindo-se criança novamente. Sentiu-se plenamente feliz, saudável e amado!
Extasiado, perguntou curioso: “Quem trouxe o meu álbum?”. A doutrinação
respondeu que tinha sido alguém que ele amava muito. Ao ouvir aquela
resposta, ele murmurou a palavra “mãe”, pedindo que, caso fosse verdade, que
ele pudesse vê-la.
A doutrinação, naquele momento, o motivou a sentir o carinho com
que estava sendo abraçado, a fruir o perfume que exalava no ambiente e que
já fora tão comum ao seu olfato. Incentivou-o, ainda, a reconhecer naqueles
acontecimentos a demonstração do amor grandioso de Deus.
Rendendo-se às vibrações de amor e ao amparo dos Benfeitores Espirituais,
Dário, docilmente, deixou-se por eles conduzir, aceitando o tratamento
regenerador.
Marcos relatou a nós que, durante a comunicação, procurou
aconchegar Dário ao coração, emitindo vibrações de confiança, a fim de que
96

ele pudesse acreditar na sinceridade do grupo. Franco esclareceu que,


intuitivamente, sentia que o Espírito que se comunicaria por intermédio do seu
aparelho mediúnico já havia sido levado a outro grupo, mas que, por ter sido
ridicularizado, não chegou a ser auxiliado, e que, após o acontecimento, se
fechou a qualquer tentativa de socorro. Esse fato foi confirmado no final da
reunião, quando o mentor Paulo nos alertou que todo o cuidado é necessário
ao emitir pensamentos durante o intercâmbio espiritual, a fim de que não seja
passada ao Espírito qualquer vibração de indiferença em relação ao seu
sofrimento.
Quanto a Dário, elucidou-nos que, realmente, tinha sido levado a
outro grupo de auxílio, onde fora ridicularizado, não por parte do médium e nem
por parte da doutrinação, mas pelos demais integrantes do grupo. Quando
encarnado, fora homossexual e a sua peculiaridade ao falar despertou, em
alguns membros do grupo, pensamentos “galhofeiros” que o atingiram
perniciosamente. Assim, ele foi retirado da reunião em situação muito difícil,
sendo conduzido ao Isolamento44, pois refutava qualquer tipo de aproximação.
Dário fora levado à nossa reunião para que pudesse receber o choque anímico
que o auxiliaria a sair do isolamento. Justifica-se, assim, o motivo pelo qual a
Espiritualidade, mesmo sendo detentora de grande amor, precisou da nossa
cooperação para socorrer o irmão.
No trabalho com Jesus, temos exercitado a solidariedade,
compartilhando dores e traumas de irmãos que, impensadamente, se
recusaram a seguir na sua via crúcis; temos aprendido a meditar nos dramas
que envolvem a vida das criaturas, retirando para nós lições preciosíssimas de
vida; temos compreendido que cada filho de Deus carrega um universo dentro
de si e que, por esta razão, tem pontos de vista diferenciados sobre um mesmo
assunto, sentindo-o e vivendo-o de forma particularizada.

***
97

Capítulo XI

SUICIDAS EM ESTADO DE DEMÊNCIA

11.1 Brumas do Passado

O mentor Aloísio, principiando o intercâmbio mediúnico, elucidou sobre as


peculiaridades dos casos que seriam atendidos naquela noite. Os assistidos
não se encaixavam simplesmente na categoria de suicidas, mas também como
homicidas, psicopatas e sadomasoquistas. Dada a gravidade da demência em
que se encontravam, eram isolados em locais apropriados ao desequilíbrio
exteriorizado45, pois o simples contato deles com os encarnados seria o
suficiente para que um processo de indução ao suicídio fosse principiado.
Ante tal revelação, eclodiram interrogações mentais quanto à segurança
dos médiuns que serviriam ao intercâmbio desses espíritos. Mas, quase
imediatamente, o mentor esclareceu que os receios eram improcedentes, pois
a Espiritualidade jamais permitiria que algum mal sucedesse àquele que se
dispusesse a servir ao bem e que os atendimentos eram programados de
acordo com as condições mediúnicas, orgânicas e espirituais dos medianeiros.
No entanto, era natural que após a ligação do Espírito com o médium, este
sentisse a influenciação daquele, mesmo estando sob cuidadosa supervisão da
equipe técnica. Porém, assim como ocorre no desenvolvimento mediúnico, à
medida que o médium estiver mais preparado, o nível de influenciação irá se
reduzindo consideravelmente.
Mas o amor jamais discrimina, julga ou impõe condições. Simplesmente
age na edificação do bem comum. Por isso, o mentor Aloísio afirmou que a
Espiritualidade esperava que destinássemos ao Espírito recursos capazes de

44
Departamento do Hospital Maria de Nazaré onde são internados os Espíritos em grande desequilíbrio.
Cf. PEREIRA, Yvonne A. Memórias de um suicida. 16.ed. Rio de Janeiro: FEB, 1991.
45
Idem, ibidem.
98

auxiliar na sua reconstrução mental. Nesse contexto, as palavras impregnadas


de carinho, o aconchego de um ombro amigo e o fluido terapêutico eram
substratos que, no tempo certo, ajudariam a trazer fertilidade ao solo árido e
infecundo. Aquelas palavras, com a força de poderosa avalanche, foram
levando receios e julgamentos vãos, deixando transparecer em nós, filhos de
Deus, a essência de bondade, compaixão e solidariedade. Sentimo-nos, então,
preparados para o socorro.
Por um instante, assaltou-nos a impressão de que os gemidos que
ecoavam nas regiões de sofrimento haviam encontrado ressonância ali,
naquele ambiente, tal o estado deplorável do Espírito comunicante. Não
conseguindo articular a fala, embora fizesse enorme esforço para isso, emitia
sons guturais, carregados de desespero, cuja cadência ininterrupta nos
provocava comiseração. Seguindo as orientações do mentor Aloísio, Olavo
endereçou a ele palavras de carinho, esperança e reconforto. Palavras que
Marcos e eu reforçávamos, repetindo-as mentalmente, no intuito de dar-lhes
vida, plasticidade.
Todas as doutrinações de Olavo muito nos comoviam, fossem pelo tom
amoroso e doce da sua voz, fossem pela simplicidade com que emoldurava as
lições que ministrava. Por isso, em alguns casos, como o que acabamos de
relatar, pareceu-nos oportuno transcrever algumas partes da doutrinação, a fim
de dar uma ideia mais próxima de como eram feitas, embora não nos fosse
possível transcrever a emoção com que eram ditas:

Compreendemos o seu desespero. A realidade, muitas vezes, vem-nos


de forma inesperada e parece-nos bastante cruel. Mas, por pior que
seja a dor e por mais intenso que seja o desespero, devemos confiar,
pois o Pai nunca vai nos abandonar!
O Mestre Jesus está ao nosso lado incessantemente. Filhos
pequenos que somos, nossos passos são, quase sempre, vacilantes.
Por isso, o Mestre nos estende as mãos para nos mostrar que mesmo
caindo, temos condições de nos levantar e continuar a jornada, pois
cada um de nós tem dentro de si a energia necessária para isso.
Calma, não adianta se entregar ao desespero! Confie! Você não
está sozinho, pois Jesus vela por todos nós. Ele prometeu que estaria
sempre conosco e que nenhuma de Suas ovelhinhas se perderia.
Problemas, nós enfrentamos. Mas não podemos nos deixar abater;
99

achar que tudo está perdido e que não há mais possibilidades. Baixar a
cabeça e cruzar os braços não é a melhor saída.
Confie, companheiro, acredite! Olhe em volta, veja essas mãos
estendidas para você... Estamos aqui para ajudá-lo. A sua dor e o seu
problema fazem parte também de nós.
O Pai não nos criou para estarmos em queda permanente. Com
as quedas, aprendemos a levantar e a refletir sobre os motivos que nos
levaram a cair. É preciso seguir em frente. A sua caminhada será
acompanhada por irmãos abnegados que estarão com você, lado a
lado, e muitas vezes, nos momentos mais difíceis, carregando-o nos
braços.
Portanto, acalme-se e confie! Você vai vencer. Você vai
reencontrar o equilíbrio para seguir de cabeça erguida e com o coração
cheio de esperança. Agora, repouse. Vamos rogar à Mãe Santíssima
que Ela envolva você com toda a ternura; que Ela possa abençoá-lo e
revigorar as suas energias para que você encontre o caminho do
equilíbrio; que as nossas energias sejam misturadas às energias astrais
e que elas possam vibrar dentro de você, impulsionando-o para a
vitória.

No decurso da preleção de Olavo, sentia como se de minhas mãos se


despendessem fagulhas de luz que tomavam a forma de anéis que giravam
velozmente, envolvendo o corpo do Espírito atendido. Aquelas centelhas eram
como condutores de esperança, fazendo vibrar nos arcanos daquela
consciência a irrefutável verdade de que fomos criados para a felicidade, e que,
portanto, uma nova chance seria construída para ele, ao sabor das suas
necessidades evolutivas.

***

Naquela reunião, minhas percepções estavam bastante aguçadas, a


ponto de entrever, com nitidez, a movimentação espiritual em favor dos irmãos
suicidas. No momento em que Laura psicografava, percebi que eu, embora não
atuasse ostensivamente na atividade do passe magnético, aplicava passes 46
em todos eles; e onde minhas mãos tocavam, tinham a propriedade de aliviar...
Entregava-me a esse labor quando a alegria de doar se transmudou em

46
KARDEC, Allan. O Livro dos Médiuns. 23.ed. Araras, SP: IDE, 1992, Segunda Parte, itens 188 e 189.
100

intensa emoção, ao comprovar a misericórdia com que a Espiritualidade trata


todos aqueles que se predispõem ao auxílio.
Em meio àqueles tantos infortunados, ao tocar a cabeça e o ouvido
de um deles, percebi que se tratava de alguém que eu conhecia, que havia
desencarnado há aproximadamente duas décadas, em decorrência de um tiro
no ouvido. Não restava qualquer dúvida: era ele! Inusitadamente, como se
tivesse presenciado a sinistra ocorrência, senti em mim mesma o estrondo
enlouquecedor... Tomada de compaixão, ternamente, afaguei sua cabeça
ensanguentada, limpei sua boca sangrenta, beijei o rosto desfigurado e, por
fim, disse-lhe: “Confie, a sua hora chegou. Agora, tudo vai mudar”. Gratas
lágrimas me turvaram a visão, pois, no decorrer das nossas reuniões, eu
jamais havia pensado naquela pessoa e, de repente, ali estávamos nós, juntos
outra vez: eu, no supremo resgate permitido por Deus; e ele, retomando a
estrada...
Como a atividade socorrista prosseguisse intensamente, formei em
minha tela mental o quadro que comumente idealizava: Jesus sentado em uma
pedra, cercado de lírios brancos, e eu a seus pés. Mostrei, então, a ele a
multidão de sofredores. Ele volveu para mim o olhar piedoso e aquele olhar
falou ao meu coração: “Vai! Eu estou aqui! O auxílio será possível”.
Quase imediatamente, caminhei em direção à multidão e a figura de
Jesus transformou-se em reluzente claridade, impulsionando-me para frente.
Todos os que foram envolvidos por aquela Luz renderam-se ao cansaço dos
padecimentos sofridos e deitaram-se na relva verdejante que cobria a campina.
Aos poucos, as dores foram amenizadas e o sono reparador iniciou o processo
de recomposição espiritual daquelas criaturas. Naqueles instantes, compreendi
o significado da fala de Jesus ao dizer: “Vinde a mim todos vós que sofreis e eu
os aliviarei”47. Especialmente para mim, aquela noite se tornara inesquecível:
tanto amor, solidariedade, misericórdia e benevolência!

***

47
Mateus, capítulo 11, versículos 28-30. Bíblia Sagrada (versão digital). Seafox/Terra Santa/James
King/Vozes, 2005.
101

Ao fazermos a avaliação das atividades realizadas, Franco narrou que,


enquanto ocorria a psicofonia através de Lucíula, pôde entrever cada um dos
membros do nosso grupo no pleno desenvolvimento de atividades em favor do
Espírito comunicante. Da boca de Olavo, saíam fluidos que circundavam o
assistido e que, paulatinamente, se acoplavam ao perispírito desse. Estevão, o
dirigente encarnado, tinha a cabeça iluminada em profusão, e dela partiam fios
espessos de luzes coloridas que iam do vermelho ao amarelo, formando um
cinturão em volta do grupo. Quando o atendimento cessou, a gradação das
cores dos fios de luz passou do verde ao azul, só se apagando no fim da
reunião. Quanto à sustentação, pôde observar o trabalho realizado,
confirmando a veracidade das minhas percepções, bem como as de Marcos,
que com suas preces amparava o Espírito atendido.
A narrativa desse caso oferece-nos uma pálida ideia das ações que se
processam no mundo espiritual em favor de encarnados e desencarnados; e,
principalmente, de como os nossos parcos recursos são manipulados em prol
de fins sagrados, numa demonstração ímpar da complacência e do amor de
Deus para conosco, filhos desertores do bem e do reto caminhar.

***
102

Capítulo XII

SUICÍDIO INFANTO-JUVENIL

12.1. Carrossel Despedaçado

As sociedades terrenas usufruem, no momento atual, de comodidades


jamais antes idealizadas. A revolução tecnológica aproximou povos, reduziu a
distância entre as culturas e universalizou o conhecimento. No entanto, grande
parte da humanidade ainda não conseguiu harmonizar-se consigo mesma,
perdendo-se nos caminhos do desequilíbrio emocional. Desajustadas, as
pessoas vagueiam no trajeto da própria vida, sem encontrar referenciais
concretos e sem conseguir vislumbrar novos horizontes.
Na sociedade do “ter”, a futilidade reina sobre os reais valores da vida,
assolando impiedosamente o “ser”, que, na maioria das vezes, sufocado e
fragilizado, não consegue reerguer-se diante das decepções.
A família, potencialmente, é fonte dos valores éticos e morais.
Entretanto, quase sempre, essa capacidade é obstruída pela mídia, que ainda
não conseguiu contribuir significativamente para o fortalecimento dos laços de
família, pois muitas vezes tem menosprezado seus fundamentos e princípios.
Na insensatez que tem revestido as relações familiares, vemos pais que
não sabem que papel representar na vida dos filhos, e vemos filhos inseguros
que não encontram em seus pais fortes referenciais para a formação do seu
caráter. Assim, as consequências da indefinição de papéis na relação familiar
são as mais funestas possíveis, repercutindo na sociedade de modo geral.
Naquela noite, especialmente nos momentos que antecederam o início
das comunicações, roguei a Maria que ampliasse o amor em meu coração, a
fim de que eu pudesse amar em profundidade os irmãos que seriam
103

socorridos. Quando escutei aquele choro a subjugar o silêncio que se fazia no


ambiente, pude senti-lo repercutir em meu coração, qual lâmina afiada, ferindo-
me profundamente.
Inicialmente, pensei que estava divagando, imaginando coisas. No
entanto, rapidamente compreendi que aquilo era real: recebíamos em nossa
reunião o espírito de uma criança suicida. Assim como você, leitor, também nos
surpreendemos. Apesar de jamais termos cogitado de situação semelhante, o
fato era real.
Serginho chorava e clamava por sua mãe. Queixava-se de muitas dores
e pedia para que ela viesse colocá-lo no colo, pois só assim a sua dor passaria.
Inenarrável o que se passou dentro de mim ao ouvir aquela súplica.
Meus batimentos cardíacos se alteraram e eu desejei ardentemente ser a sua
mãe. Quis tomá-lo em meus braços, aconchegá-lo ao meu coração e assoprar
os seus ferimentos para aliviar as dores do seu débil corpinho. E quando ele,
enfim, experimentasse o alívio do seu sofrimento físico, eu iria acariciar seus
cabelos em desalinho, até que adormecesse. No entanto, ele não conseguiu
perceber qualquer tipo de auxílio. Intercalava o choro e a súplica com a
justificativa de que não queria ter feito “aquilo”, que tinha ficado desesperado,
após o seu pai ter brigado com ele, mas que, no fundo, não queria mesmo
fazer “aquilo”, pois ele era só uma criança...
Era, realmente, um caso atípico. Olavo, então, diante das reiteradas
afirmativas de Serginho quanto ao fato de ser ele um “menino”, perguntou-lhe a
sua idade.
− Eu tenho apenas onze anos. Eu quero a minha mãe – respondeu entre
soluços.
Por mais que Olavo chamasse a atenção de Serginho para o carinho
que nós lhe ofertávamos, era inútil, pois ele nada conseguia perceber.
No momento em que a doutrinação iniciou a prece para a finalização do
intercâmbio mediúnico, senti que eu fazia parte de uma roda, juntamente com
outras crianças. Depois de brincarmos por algum tempo, nós a desfizemos
para brincar de outros folguedos infantis. Vi-me, então, a empinar pipa com
alguns meninos, enquanto outros jogavam bilocas, pulavam “amarelinha” e
104

brincavam de “vivo ou morto”. O fato era que eu estava profundamente ligada a


Serginho. Todas aquelas cenas de brincadeiras infantis eram para atraí-lo, a
fim de tirá-lo daquela fixação mental.
Apesar de intimamente eu estar certa do que estava acontecendo, em
meu coração pairava uma insegurança. “Eu estaria imaginando tudo aquilo,
sugestionada por meu instinto maternal?” – perguntava-me em conflito.
Entretanto, no momento da avaliação das atividades realizadas, Franco foi o
primeiro a fazer comentários e confirmou todas as minhas impressões. Disse
que também vislumbrara a brincadeira de roda, e que um dos coordenadores
espirituais, por intermédio da audiência, falou que a roda era para atrair o
espírito. O objetivo daqueles quadros era mostrar ao pequeno Serginho que a
infância na Terra poderia ser feliz. Diante daquele esclarecimento, concluímos
que aquele espírito, enquanto encarnado, tivera uma infância muito difícil.
Lucíula nos relatou que, momentos antes de ocorrer a comunicação,
sentiu a presença de uma criança. Confusa, relutou diante daquela realidade,
pois julgou não ser possível o suicídio infantil48. Entretanto, ciente de que era
um instrumento de auxílio, entregou-se ao trabalho com amor, deixando de
lado as cogitações íntimas. Informou-nos que, durante a comunicação de
Serginho, em alguns momentos, entrevia um quarto e que nele, na cabeceira
da cama, havia um criado-mudo. Em dado momento, viu uma criança adentrar
o quarto correndo e, num ímpeto, abrir a gaveta do pequeno móvel e retirar
dela uma arma de fogo.
A médium afirmou não poder descrever a emoção que sentiu durante a
comunicação; e que o atendimento a Serginho suscitou em seu coração
algumas reflexões sobre a família e a responsabilidade dos pais com os filhos
que lhes foram confiados.
Olavo esclareceu que somente perguntou a idade da criança por se
tratar de estudo para a realização desse trabalho, pois esse procedimento não
era usual.

48
Estávamos no ano de 1998. Naquela época, ainda nos faltava uma bagagem de estudos maior acerca da
temática do suicídio na infância e na adolescência. Nas sugestões de leitura, há textos que tratam do
assunto.
105

Cônscios das inúmeras indagações que iriam nos inquietar, os


coordenadores espirituais providenciaram para que os esclarecimentos nos
chegassem através da psicografia de Laura, a qual transcrevemos a seguir.
Foi uma noite memorável, repleta de emoções e de aprendizado,
alertando-nos para o fato de que somos irmãos em marcha, refazendo lições,
traçando novos caminhos, mas que ainda somos os mesmos de ontem.
Certamente, um pouco melhores, mas, ainda, ulcerados por nossas próprias
mazelas. Assim, independentemente do estágio físico-cognitivo em que nos
encontremos, nossa consciência culpada pulsa em nós.
Diante de fatos tão irrefutáveis, vem-nos à consciência que Jesus, o
Médico Divino de nossas almas, prescreveu-nos o remédio para que
pudéssemos aliviar as dores uns dos outros: “Amai-vos uns aos outros, como
eu vos amei”49.

Transcrição da psicografia sobre o suicídio de Serginho


Queridos Irmãos,

O espírito comunicante é um jovem de 11 anos que trazia no seu


plano reencarnatório o compromisso de vencer grandes dificuldades
junto ao seu pai. Nesse contexto, a sua mãe seria para ambos – pai e
filho – o amparo amigo que os ajudaria a superar os obstáculos. No
entanto, alma juvenil e muito sensível relutou diante da aproximação.
Como seu pai também tinha limitações no campo afetivo, os conflitos se
intensificaram naquele lar, impossibilitando o convívio fraterno.
Desse modo, em idade ainda tão tenra, o irmão não conseguiu
sobrepujar os empecilhos e deixou-se levar pelo desespero. Buscou,
então, na morte, o alívio para as angústias que oprimiam o seu coração.
Ele necessita muito do nosso amor, a fim de perceber o auxílio
que estamos lhe ofertando.
Ele será socorrido pelo grupo de jovens desencarnados50, que o
recolherá com imenso carinho. Abençoados sejam todos. Muita paz.

***

49
João, capítulo 13, versículo 34. Bíblia Sagrada (versão digital). Seafox/Terra Santa/James King/Vozes,
2005.
50
Jovens desencarnados que apoiam as atividades socorristas no âmbito das reuniões mediúnicas da nossa
Casa Espírita, o Cema.
106

12.2. Acordes para um Despertar

Momentos antes de ocorrer o intercâmbio mediúnico, Franco relatou-


nos que vislumbrou o coral de jovens desencarnados51 que fazia a sustentação
vibratória das nossas reuniões e, em seguida, viu alguns deles adentrarem na
sala, carregando um jovem adormecido nos braços. Pelo carinho e cuidado
com que o transportavam, percebeu que se tratava de alguém muito caro
àquele grupo.
Olavo, secundado pelo relato de Franco, empenhava-se em tirar o
rapaz daquele estado de prostração, conclamando-o a continuar lutando, pois a
juventude era sinônimo de esperança, momento grávido de grandes
realizações.
Após os pesados momentos de silêncio que se sucederam à
elocução inicial da doutrinação, Otávio, enfim, acordou... Ainda um pouco
sonolento, mostrou-se bastante decepcionado ao constatar que as tentativas
de aniquilar a própria vida foram improfícuas, pois se sentia plenamente vivo,
apesar de tudo. Sem a devida compreensão da continuidade da vida além-
túmulo, não atinava que o seu corpo carnal jazia no fundo de escura sepultura,
enquanto o Espírito imortal ali estava preservado em sua individualidade.
Tomado de compaixão, Olavo convidou-o a observar ao redor, pois
muitos jovens ali estavam para ajudá-lo. Com eloquência, discorreu sobre
solidariedade, perseverança e o caráter transitório das dificuldades que
vivenciam as criaturas que habitam os mundos-escolas; que erguesse a
cabeça e se dispusesse a lutar novamente, pois somente nas lutas
regeneradoras que nos são facultadas pela Bondade e Justiça Divinas é que
nos despojamos das inquietações que nos atormentam a consciência milenar.
Ao ouvir tais apelos, o jovem sussurrou: “Estou perdido”. No entanto,
imediatamente, a resposta enfática de Olavo ecoou no coração daquele
Espírito equivocado: “Jamais! Jesus disse que nenhuma de suas ovelhas
ficaria perdida”52.

51
Por meio da vidência de Franco, o coral mencionado foi visto em diversas reuniões fazendo um cordão
de isolamento ao redor da Casa Espírita, bem como ajudando a socorrer os Espíritos atendidos em nossas
reuniões mediúnicas.
52
João, capítulo 18, versículo 9. Bíblia Sagrada, op. cit.
107

Naquele instante, então, o Bom Pastor encontrou a ovelha perdida e,


amorosamente, conduziu-a ao seu aprisco. Otávio pôde ver ao seu lado a “avó”
– aquela figura inesquecível que enchera a sua infância de ternura, afeto e
alegria – e, em soluços, entregou-se aos seus braços como criança indefesa,
reclamando proteção.

***

Quando do atendimento a Otávio, por intermédio da audiência,


Franco foi informado que aquele jovem de dezesseis anos se suicidara por
estar com uma enfermidade incurável. Tomando remédios em excesso,
conseguiu consumar o ato planejado. Os jovens do coral cantavam com o
objetivo de despertá-lo.
Ao ser finalmente despertado, Otávio sentiu-se nas mesmas
condições em que estava quando buscou o suicídio. No entanto, como
terapêutica socorrista, a equipe espiritual providenciara para que ele visse a
avó, dada a importância que ela tivera em sua vida. Ao vê-la, abandonou-se
em seus braços amorosos, sentindo-se transportado à fazenda das férias da
sua infância, saindo de charrete para um passeio prazeroso pelas alamedas
adornadas de flores.
Após o transe mediúnico, Franco foi dominado pela emoção e chorou
copiosamente. No momento da avaliação, enfatizou a Misericórdia Divina que
lhe permitiu entrever um quadro cuja sublimidade jamais seria apagada da sua
memória espiritual. Confessou-nos que, dada a beleza do quadro visualizado,
sabia que as palavras não seriam capazes de retratá-lo fidedignamente.
A seguir, reproduzimos o relato do médium que muito nos comoveu:

O coro de jovens desencarnados que faz a sustentação das


reuniões de atendimento aos suicidas forma um cordão de isolamento
em torno da nossa Casa Espírita. Estavam todos vestidos como
belíssimos bonecos de neve. Quando alguns deles adentraram esta
sala, trazendo nos braços o Espírito do jovem, o cordão de isolamento
ficou restrito a ela.
108

Momentos antes de a reunião ser encerrada, de um ponto do


cordão, uma espiral de luz começou a se formar. Observei que aqueles
jovens se transformavam em pontos de luz, dando forma à espiral
fulgurante que começou a se elevar em direção a uma estrela − que
seria a Colônia Maria de Nazaré – formando uma longa calda, fazendo
uma alegoria à estrela de Belém.
Quando o quadro se completou, o nosso grupo recebia respingos
de luz, transformando-se em base daquela espiral que nos ligava à
Colônia.

Estávamos em dezembro. Em breve, seria Natal53. Marcos


mencionou que, pela primeira vez, trabalhou intensamente com a sensibilidade,
a fim de que Otávio pudesse perceber as vibrações de ânimo e solidariedade a
ele direcionadas.
É necessário esclarecer que todo o grupo sempre trabalhava com
muita emoção e amor. Portanto, quando Marcos se referiu ao trabalho com a
“sensibilidade”, reportava-se ao fato de que, na sustentação,
desempenhávamos papéis diferenciados no atendimento socorrista.
Eu trabalhava mais com as mentalizações ligadas ao coração; ele,
com a razão. Não que isso tivesse sido deliberado por nós ou mesmo pela
equipe espiritual. Com o tempo, após a troca de impressões em relação aos
atendimentos, fomos percebendo a peculiaridade que nos caracterizava
individualmente e que, na verdade, a junção do sentimento com a racionalidade
integralizava o auxílio.
Laura, um tanto melancólica, confidenciou-nos que no início da
reunião sentiu vontade de psicografar uma música. No entanto, não o fez por
achar que o momento não era adequado. Mas, após ouvir o relato de Franco
sobre o coral de jovens que cantava para despertar Otávio, deduziu que,
provavelmente, se tratava da música cantada pelo coro. Antes de fazer a leitura
da psicografia da noite, falou-nos que sentiu uma dor profunda ao psicografar,
pois se tratava do depoimento de um dos jovens que fazia parte do coral, o

53
Muitas impressões descritas nos comentários, datas e dificuldades encontradas ficaram fora de ordem
no texto final, pelo fato de termos optado, na organização didática dessa obra, pelos capítulos de acordo
com a modalidade de atendimento
109

qual contava sobre o seu suicídio e sobre o seu resgate, que se dera em uma
noite de Natal54.
A visão materialista da vida, a inversão de valores e a falta de diálogo
familiar são fatores extremamente relevantes como incentivadores do desvario
que acomete a maioria dos jovens. A vivência plena do fulgor juvenil é
incentivada pela sociedade, que seduz o jovem com efemeridades, falácias e
sordidez. Não sobra espaço para a descoberta de si mesmo, como criatura
singular na epopeia da vida. Nesse contexto e sob essa perspectiva, não há
lugar para jovens como Otávio, que simplesmente aguardam o “nada” ...

***

54
A mensagem psicografada está transcrita na Parte 2 desta obra, Capítulo 1 − Cartas-Desabafo, Suicídio
110

SEGUNDA PARTE

ESPÍRITOS EM VIA DE REENCARNAÇÃO

Capítulo I

O CASO DO ESCRITOR

Estávamos no mês de fevereiro de 1998. Para nossa surpresa, um


dos mentores da atividade socorrista se manifestou, informando-nos que o
trabalho estava entrando em uma nova fase, que começaríamos a receber
irmãos em vias de reencarnação.
Além do estudo que deveríamos empreender, envolvendo a
problemática daqueles que retornam à carne após a deserção pelo suicídio,
caberia também responsabilidade de encorajá-los na nova empreitada.
Embora a emoção fosse presença constante em nossas reuniões,
zelávamos para que se manifestação com moderação, a fim de evitar que
excessos pudessem prejudicar o trabalho de alguma forma. Assim, diante da
comoção de Tadeu ao nos reconhecer, foi-nos necessário buscar o
autocontrole para não colocar em risco o auxílio.
Entre lágrimas, Tadeu mencionou que se recordava do perfume que
exalava no ar, da música que enchia de paz o ambiente, do tom suave da voz
que lhe dava boas-vindas; que não tinha dúvidas de que já estivera ali e de que
fora ajudado pelo nosso grupo. Entretanto, não pudemos nos recordar dele em
particular e, consequentemente, nem do socorro a ele prestado.55

Infantojuvenil.
55
No decorrer dos anos, foram muitos os atendimentos. E, consequentemente, todas as história
foram únicas e especiais para os Espíritos protagonistas. Entretanto, para nós, avolumavam-se
como socorros e mais socorros. E assim, naturalmente, não nos seria possível retê-las todas em
111

Decorridos os momentos iniciais, mesmo envolvido por vibrações


amorosas, Tadeu se mostrou bastante reprimido, sem saber o que dizer.
Olavo, então, falou que éramos seus amigos e que queríamos muito bem a ele.
Após alguns instantes de silêncio, Tadeu nos confessou estar muito
angustiado, por saber que estava próximo o momento de retornar; que tinha
medo de fracassar e repetir os mesmos erros do passado. Relatou-nos que
ainda não conseguira esquecer o revólver e que, constantemente, revivia o
momento fatal e que um estrondoso ruído no conduto auditivo lhe tirava a
lucidez e o equilíbrio.
A simples visão de um livro qualquer ou mesmo a cena cotidiana de
algum leitor, imputavam nele implacável vergonha, pois tinha usado de forma
mórbida as palavras. Utilizando-se do talento inato, combinava-as
sordidamente para que induzissem à perversão, ao sarcasmo e à
desesperança, maculando sonhos e assassinando possíveis grandes
realizações. Temia escrever tudo aquilo de novo...
Vez por outra, as palavras de Tadeu eram entrecortadas por soluços.
Vibrávamos para que reagisse!
Contou-nos que na encarnação renegada, tivera uma mãe que jamais
se eximira de orientá-lo no bom caminho. No entanto, como fora surdo a tudo,
temia que na sua próxima empreitada lhe faltasse a orientação segura. Além
disso, temia esquecer tudo quanto aprendera na erraticidade, pois não passara
ainda por grandes aprendizados.
Ao constatar que fora precipitado, entregando-se ao ato desesperado,
pois muito pouco faltava para vencer a provação, o arrependimento passou a
ser o seu carrasco de todas as horas. Não tivesse se deixado levar pelo
materialismo extremado, teria suportado a falência financeira e, agora, não se
sentiria daquela forma, como se morresse outra vez, outra vez e outra vez...
Tadeu nos revelou que, no decorrer da semana, fora colocado em
contato conosco e tivera a oportunidade de acompanhar algumas das nossas
lutas diárias. Sentiu, então, vontade de ser um de nós, de estar entre nós, de

nossa memória, principalmente as passadas há vários anos atrás. Nesta obra, ousamos selecionar
alguns poucos relatos, a título de estudo.
112

encarar as dificuldades sob um prisma totalmente diferente do seu antigo ponto


de vista.
Solicitou que orássemos por ele, pois um mentor havia lhe dito que,
durante as noites da sua infância terrestre, qual um quadro vivo, ele poderia
nos ver e nos ouvir, para que não se esquecesse de que há luz na Terra,
apesar de tudo...
Ao despedir-se de nós, agradeceu o auxílio recebido, as palavras de
carinho e de encorajamento, bem como as flores que lhe ofertávamos agora,
com votos de sucesso.
Dando continuidade ao atendimento da noite, os Servos da Legião de
Maria trouxeram um Espírito em inenarrável sofrimento, pois, durante o tempo
em que esteve junto a nós, apenas gemeu e chorou.
Chamou-nos a atenção o fato de que ele rejeitava qualquer
aproximação, qualquer tipo de auxílio. Olavo, entretanto, não obstante a
rejeição do comunicante, endereçou a ele palavras de conforto e de carinho,
afirmando Jesus e Maria sempre estariam ao seu lado, amparando-o nos
momentos de provação. Mas nos pareceu que ele estava mergulhado nas
próprias “trevas interiores”, pois sentíamos que a luz que lhe endereçávamos
não penetrava o seu coração. Como isso fugia à nossa capacidade de
compreensão, confiamos à Maria o auxílio que ofertávamos, para que o
utilizasse da forma como fosse possível. Finalizados os atendimentos,
novamente o mentor se manifestou e nos esclareceu sobre alguns aspectos
básicos do plano reencarnatório de Tadeu. Ele viverá muitos anos no plano
físico e, se tiver o equilíbrio necessário e seguir os bons conselhos que irá
receber, sairá recuperado. Terá a Doutrina Consoladora como sustentáculo.
Além do auxílio da Colônia Maria de Nazaré, contará com a ajuda do nosso
grupo que se comprometeu mentalmente a orar por ele.
À luz dessas informações, refletimos sobre a Misericórdia Divina que,
apesar da nossa pequenez, valoriza nossa capacidade de amar, ainda tão
deformada por nossas imperfeições, conclamando-nos, incessantemente, ao
trabalho no bem.
113

Em relação ao segundo caso atendido, o mentor nos esclareceu que


ele era paciente interno do manicômio56 e que não tinha nenhuma percepção
do que estava acontecendo. Tratava-se de uma reencarnação compulsória. Ao
contrário de Tadeu, retornaria por poucos anos, o suficiente para queimar os
fluidos deletérios do seu corpo espiritual. Caso contrário, o auxílio a ele ficaria
estagnado, tendo em vista o seu grande comprometimento com as Leis
Divinas.
***
A sustentação trabalhou intensamente com a emissão de energia,
envolvendo o corpo espiritual dos Espíritos assistidos. Entretanto, no segundo
atendimento, as energias plasmadas pareciam não penetrar as estruturas
moleculares do Espírito.
Marcos nos informou que, durante o atendimento a Tadeu,
mentalizou quadros que retratavam esperança e coragem; e que se
comprometeu a orar por ele. Ao final, vislumbrou nossas mãos unidas,
formando uma vigorosa corrente de luz, ligando-se a Tadeu. Era a simbologia
dos laços que haviam sido criados entre nós e ele. Era, na verdade, um
compromisso de amor!
Para nossa surpresa, Franco nos informou que já tinha visto Tadeu
em reuniões anteriores, sem saber, entretanto, de quem se tratava. Descreveu
que ele era um senhor de mais ou menos sessenta anos de idade, de barba e
cabelos brancos, trajando um terno branco de linho e chapéu, aparentando
profunda tristeza no semblante.
Ao comentar que nascer em lar espírita é uma bênção, Olavo nos
suscitou algumas reflexões, pois aquele que muito receber muito terá que doar,
sob pena de ser duramente torturado pela própria consciência.
Rogamos, na prece final, força para vencermos os maus pendores e
ajuda para enxergarmos com maior nitidez, as oportunidades que se renovam
a cada dia da nossa existência.

***

56
PEREIRA, Yvonne A. Memórias de um Suicida. 16ª ed. Rio de Janeiro: Federação Espírita
114

Capítulo II

CASO ADELAIDE

A fala pausada de Adelaide nos fazia entrever a melancolia que


sombreava aquela alma.
Adelaide tinha consciência da gravidade do ato que praticara e estava
se preparando para retornar às lides terrenas. Relatou-nos que na última
encarnação fora moça belíssima e aquinhoada por uma voz inigualável; que
muitos corações se deixaram enfeitiçar por seus dons memoráveis e foram
impiedosamente destroçados por sua futilidade.
Entretanto, entre todos os que a rodeavam, havia um rapaz, um único
rapaz que não se curvara aos seus encantos. Isso nada significaria, se ele não
tivesse “encantado” o seu coração. Por mais que se esforçasse, não conseguia
chamar a atenção daquele que elegera. Ele continuava sempre impassível e
indiferente à “magia” da sua voz.
Acostumada a ter os caprichos satisfeitos e ver aos seus pés os
rapazes mais cobiçados da sociedade, sentiu-se ferida no seu orgulho de
mulher. Pela primeira vez, era preterida por alguém! Massacrada por vaidade
insana, isolou-se de tudo e todos. Deixou de cantar, sufocando a voz em
imensa tristeza.
No cume de uma crise depressiva, preparou um cálice de bebida letal
para oferecer àquele que a repudiara, pois, se ele não a queria, não seria de
outra também. Ela não permitiria jamais! Preferiria vê-lo morto. Mas, no
momento decisivo, tomou o líquido venenoso no lugar dele. Se a fé, que
sustenta e enobrece, tivesse sido cultivada como valor da alma, teria se
sobreposto à insânia e evitado tanto sofrimento!

Brasileira, 1991, 2ª Parte, Cap. III, p. 259-262, 568 p.


115

Muito tempo se passou desde então... Muitas lágrimas foram vertidas


e muitas dores experimentadas... No entanto, aproximava-se o momento de
retomar o caminho outrora abandonado.
Com a voz embargada pela emoção, denunciando certa temeridade
perante o desenrolar dos fatos, Adelaide nos falou que, na nova empreitada na
Terra, mais uma vez usará a voz, mas de forma diferente.
As luzes dos grandes salões estarão apagadas para ela e, ao seu
redor, só haverá pobreza. Sua figura estará revestida de insignificância e os
olhares ofuscantes de paixão não mais a buscarão, como no passado. A
fealdade física marcará a sua existência reparadora. Nessas condições, poderá
recolher pelo caminho aqueles que um dia lançou ao chão. Ela lhes falará de
outro tipo de amor: do amor que dignifica, que eleva e constrói...
Ao despedir-se de nós, rogou-nos o auxílio da prece e fez-se
inesquecível pelas palavras com que encerrou a narrativa: “Esta é uma história
banal, como tantas outras – disse-nos humildemente –, mas com uma
diferença: é a minha história!”.
Que preciosa lição recebemos por meio daquelas palavras! Tão
candidamente, Adelaide concitou-nos a respeitar em plenitude o sentimento do
outro, pois geralmente só achamos que uma dor é verdadeiramente corrosiva
quando ela está dentro de nós... A indiferença diante do sofrimento alheio tem-
nos retardado os passos, enclausurando-nos dentro de nós mesmos.
Somos filhos imortais de um Deus justo e bom; e, no estágio em que ora nos
encontramos, não podemos mais esquecer as divinas palavras: “Amai-vos uns
aos outros, como eu vos amei”57.

***

Ao comentarmos sobre o trabalho da noite, Lucíula e eu constatamos


que vimos Adelaide em situações diferentes, no momento em que ela se
comunicava. Eu a entrevi trancafiada em um quarto, absorta por pesada
melancolia. Olhava pela janela, como se buscasse um caminho além daquele
116

que se desenhava lá fora. Lucíula vislumbrou-a na iminente reencarnação, sem


qualquer beleza física e numa condição social bem inferior.
Marcos nos informou que se comoveu imensamente com o caso da
irmã que usou a Arte, não como instrumento de elevação, mas de declínio
moral. Docemente, emitiu-lhe pensamentos positivos, incentivando-a na
conquista dos verdadeiros valores da vida.
É necessário refletir sobre o fato de que Adelaide, despojada da
beleza plástica convencionada pela sociedade terrena, poderá iniciar a
modelagem da mais fulgurante beleza: a da alma que se aperfeiçoa para se
mostrar ao Criador.
Certamente, se Adelaide se mantiver resoluta nos objetivos traçados,
poderá mirar a própria alma enobrecida nos olhos daqueles que tiverem as
lágrimas estancadas por ela.

***

57
João, capítulo 15, versículos 9-17. Bíblia Sagrada (versão digital). Seafox/Terra Santa/James
117

Capítulo III

O RETORNO DE PIPOCA

Somos prisioneiros das criações mentais que emitimos, seja no


mundo físico ou no espiritual. Viveremos harmonicamente ou não com as Leis
Divinas, conforme a própria semeadura. O suicida, portanto, nesse contexto,
está imerso em pesadelos dantescos.
Aguardávamos em prece que o atendimento via psicofonia
começasse, quando Franco relatou a Olavo que vislumbrara quadros confusos,
em que imagens de um tocador de bumbo iam sendo confundidas com a de um
trapezista que, em queda livre, mergulhava em um poço; e, em seguida, a do
trapezista se embaralhava com dezenas de palhaços em diferentes
performances: uns virando de costas, outros correndo, outros dando piruetas,
outros andando em triciclos... Explicou que essas silhuetas se delineavam
rapidamente e se turvavam, misturando-se umas às outras.
Quase imediatamente após a descrição, comunicou-se pela psicofonia
do referido médium, um Espirito em alto grau alto de perturbação, dizendo ver,
de forma ininterrupta, uma imagem que o torturava desmensuradamente. De
repente, aquietou-se. Após breves instantes, afirmou que tudo ficara em trevas,
proporcionando uma sensação de alívio e bem-estar, pois não mais enxergava
a visão angustiosa...
Como criança indefesa que encontra abrigo depois de vagar em
sobressaltos na escuridão, comentou que alguém, com carinho, oferecia a ele
o colo para que repousasse a cabeça cansada. Decorrido brando silêncio,
iniciou o relato da sua história. No entanto, não expunha os fatos ao grupo,
mas a quem o aconchegava!

King/Vozes, 2005.
118

Havia sido palhaço trapezista em um circo de sucesso. Um dia,


deixando-se levar por nefasto sentimento de vingança contra o seu parceiro,
suicidou-se em pleno espetáculo. Algum tempo depois, sua filha, que tomara o
autocídio paterno por bravura, suicidou-se também. A todo instante, escutava a
voz clamorosa da jovem, rogando-lhe auxílio. Entretanto, infrator das Leis
Divinas, tornara-se impotente para prestar qualquer tipo de socorro; e este era
o seu maior padecimento. Fracassara como pai, pois tecera a desventura
daquela que desejara fazer a mais feliz das criaturas.
Sem nenhuma dificuldade, identificamo-lo como sendo o palhaço
Pipoca58, atendido anos atrás em nossa reunião.
Após o doloroso relato, tão emocionantes foram as palavras que
Olavo lhe endereçou, que também nós nos sentimos beneficiados por elas; e,
não raras vezes, valemo-nos delas para angariar ânimo perante nossas
próprias lutas íntimas. A seguir, pequeno trecho da preleção:

O viajante que se senta desanimado à margem da estrada por


considerá-la muito longa, reclamando que não irá conseguir vencer a
jornada, realmente não irá conseguir...
Mas, se der os primeiros passos, tudo será diferente; pois um
passo dado será um a menos... E, de passo em passo, chegará ao fim
desejado.
E você, meu irmão, assim precisa fazer! Não se omita mais! O
momento agora é de reconstrução e não de covardia. Erga a cabeça e
mostre o seu valor, pois tem condição para isso!
Mesmo sofrendo, vá em frente! Diante das dificuldades, reúna
todas as suas energias e prossiga!
Tenha certeza de que, se você se dispuser à caminhada, o
“céu” estará ao seu lado. Você não estará sozinho nos momentos de
59

grandes dificuldades. Quando nós nos predispomos à vitória, sempre


haverá amigos dispostos a nos ajudar.
Tudo tem o tempo certo! Se você quer ajudar sua filha, ajude a si
mesmo primeiro. Pense... O oceano é extenso, mas é formado por
gotas d’água. A semente não se tornará árvore de um dia para o outro.
Primeiro, passará pelo processo de germinação e de crescimento.
Portanto, anime-se! Disponha-se a continuar a caminhada. Somente
assim, você irá ao encontro da filha querida.

58
A história de Pipoca está relatada no capítulo. 1.9 “No Silêncio do Picadeiro”.
59
Céu, termo usado pelo doutrinador no sentido de “Providência Divina, Deus”.
119

Confie no auxílio daquela que tutelou no coração de Mãe


Amorosa os infortunados da Terra...

Quando Olavo se calou, o Espírito declarou que estava se sentindo


estranho. Não mais sentia as pernas, e os braços estavam perdendo os
movimentos. Em seguida, não conseguiu mais falar e passou a emitir apenas
sons guturais, assim permanecendo até o seu recolhimento.
Ainda estávamos sob os efeitos da emoção que o atendimento
provocara em nós, quando o mentor da noite nos trouxe a explicação do caso
atendido. Disse-nos o dirigente espiritual que, quando a filha de Pipoca se
suicidou, alguns obsessores que haviam acompanhado a derrocada do
equivocado palhaço trapezista mostraram a ele o acontecimento funesto. Ao
saber-se responsável pela tragédia que maculara a vida daquela que ele tanto
amava, passou a sofrer duplamente: por si mesmo e por ela.
A partir de então, vigorosa insanidade dominou os seus sentidos. Ora
via um palhaço (que era ele mesmo!) e ora uma equilibrista (que era a sua
filha) precipitando-se das alturas e cadaverizando-se no baque fatal. Em
seguida, via repetir-se a mesma cena, sempre e sempre, ininterruptamente.
Quando recebeu o primeiro atendimento no nosso grupamento, o
duplo clichê mental se desfez, permanecendo apenas o que envolvia o suicídio
da filha. Por isso, em face da dor torturante, pedia para permanecer na
escuridão, para nada mais enxergar...
A situação de Pipoca era tão grave que a sua iminente reencarnação,
sob a tutela de Maria de Nazaré, seria apenas para dissipar as vibrações
deletérias produzidas pela mente enfermiça. Somente em outra encarnação
seria capaz de edificar algo.

***

Ao findar-se a reunião, sentia-me fortemente impressionada com o


atendimento realizado. Primeiro, pelo fato de que, quando eu oferecera o colo
para que Pipoca repousasse a cabeça fatigada, simultaneamente ele relatara a
120

minha atitude a Olavo. Segundo, porque ele apresentara os sintomas dos


distúrbios que teria em sua próxima encarnação.
Franco, ao comentar sobre a atividade socorrista, confirmou que
entrevira Pipoca com a cabeça no meu colo e que, quando ele chamou
“mãezinha”, foi porque se imaginou no colo de Maria de Nazaré, relatando a
Ela a sua triste história.
Comoventemente, Franco nos falou, ainda, que Pipoca tivera, no
transcorrer do atendimento, um instante de lucidez; que ele vira Marcos e o
reconhecera como sendo um dos que o socorrera outrora.
Marcos comentou que procurou trabalhar a expansão de energia na
mente de Pipoca, com o propósito de mostrar-lhe a realidade de que, para
ajudar a filha, ele deveria primeiramente ajudar a si mesmo.
A cada reunião, recolhíamos grandes aprendizados para as nossas
vidas. Os erros de Pipoca e o seu padecimento por ter induzido a filha a imitar
o seu gesto alertaram-nos para que nos atentássemos ao modelo que estamos
oferecendo aos nossos filhos e para a responsabilidade que envolve a
paternidade na Terra, pois um dia teremos que prestar contas do “filho que a
nós foi confiado”60.

***
121

Capítulo IV

O RETORNO DE UM HOMOSSEXUAL

O choro convulso de Heitor e as palavras pronunciadas


continuamente indicavam desespero e não nos permitiam entender o que se
passava.
Pacientemente, aguardamos que atendesse ao pedido de Olavo,
acalmando-se, o que se deu algum tempo depois. Então, do desespero
defensivo, passou à petição dolorosa. Explicou-nos que se aproximava a hora
de recomeçar; que em breve seria internado para ultimar o seu retorno à carne;
que estava imerso em profundo desequilíbrio, pois não queria reencarnar nas
mesmas condições anteriores... Não queria retornar em um corpo masculino,
pois ainda estava sob o domínio da psique feminina. Não queria, mais uma
vez, ser diferente!
A todo o momento, questionava que proveito poderia tirar da nova
existência, se teria as mesmas dificuldades e se não se sentia preparado para
superá-las.
Nas estruturas mentais de Heitor, como tambores a rufar
insistentemente, ressoavam vozes dementes que gritavam acusadoras... Era o
passado secular que vencia barreiras e ressurgia vigoroso, gritando os erros,
os enganos e as oportunidades desperdiçadas.
Entre lágrimas, confessou-nos que, em vida anterior à última
encarnação, habitara um corpo feminino e que não valorizara o lar e a família,
preferindo enganar; trair covardemente. Sentia prazer em manipular os
sentimentos alheios, alimentando a própria volúpia e insensatez; e que
tamanha leviandade acabara por levar à loucura aquele com quem se

60
KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. 91ª ed. Rio de Janeiro: FEB, 1985, Cap.XIV,
item 9, 456 p.
122

consorciara. Sentia-se envergonhado por tudo... No entanto, na última


encarnação, a vida cobrara-lhe a reparação de todos os erros.
Heitor, por ter vivenciado emoções desvairadas em vidas passadas,
ao usar de forma abusiva o magnetismo de que se sabia possuidor, na
derradeira encarnação, tivera como expiação a inversão sexual compulsória,
situando-o na contramão da própria anatomia. Experimentou, assim, toda sorte
de angústias, expondo-se às situações mais vexatórias.
Sentindo-se humilhado, desprezado e relegado à própria sorte,
começou ingerindo pequenas doses, que iam sendo aumentadas
consideravelmente, à proporção que crescia a sua depreciação diante do
mundo e diante de si mesmo. Até que, um dia, tudo se consumou...
Não tinha a menor ideia de quanto tempo ficara no além-túmulo,
soterrado por fétida lama... Lembrava-se apenas que, um dia, alguém orou por
ele; e que aquela oração tivera o poder de resgatá-lo daquele lamaçal.
Olavo, ao perceber que a narrativa daquele Espírito chegara ao fim e
que quão grande era o seu temor diante da expiação que iria promover o seu
reajustamento perante as Leis Divinas, falou-lhe de esperança. Lembrou que
as experiências vividas lhe serviriam de sólidos alicerces; que muitos amigos o
auxiliariam a sair vitorioso da nova empreitada. Alertou-o, porém, que a sua
vitória dependeria do equilíbrio que soubesse conquistar, não apenas no
campo da afetividade expressada, muitas vezes, por atos sexuais, mas em
todas as demais áreas em que se batem e se combatem as criaturas
humanas.
Qual criança temerária em face de perigo próximo, confessou-nos
que o mais difícil a ser suportado na nova existência será a dor e a angústia
que irão consumir os seus dias.
Sentíamos um desejo profundo de envolver aquele irmão em ondas
de carinho, amizade, solidariedade e esperança. Para nossa alegria,
verificamos que os Amigos Espirituais manipularam aquelas vibrações, pois
Heitor, um tanto comovido, nos agradeceu as flores que lhe entregávamos,
afirmando serem as mais belas que já tivera a oportunidade de ver. Pediu-nos
que orássemos por ele, para que os seus esforços de reforma íntima o
123

conduzissem à reeducação dos sentimentos, a fim de que aprendesse a amar


verdadeiramente. Somente assim, conseguiria livrar-se de tão tormentoso
débito.
O caso de Heitor suscitou-nos algumas reflexões a respeito das
várias facetas que a homossexualidade poderá assumir e que poderão ser
geradoras de ansiedade e desvario; quase sempre agravadas pelos,
supostamente, “mais equilibrados”. No entanto, essa prova, se bem vivida,
poderá permitir ao Espírito a reeducação dos sentimentos, a valorização da
sinceridade e da fidelidade no campo amoroso, pois desejará ardentemente ter
um companheiro e com ele constituir um lar e uma família. Entretanto,
necessitará resignar-se ante a impossibilidade de concretizar tal anseio.
Algumas Ciências, dissociadas dos princípios reencarnacionistas,
vêm tentando responder à pergunta “Por que existem homossexuais?” No
entanto, no futuro, as Ciências ligadas à Psicologia terão a resposta.
A Doutrina Espírita, entretanto, além de já ter decifrado tal enigma,
esclarece-nos sobre a origem das questões que envolvem a sexualidade
humana; e mostra-nos como solucioná-las. Portanto, “Os homossexuais não
são passíveis de críticas, senão de esclarecedoras luzes espíritas em suas
sensíveis almas, iluminando o seu presente.” 61
Entretanto, nem sempre a homossexualidade terá caráter
compulsório e expiatório, podendo ocorrer também no caso em que: “Espíritos
cultos e sensíveis com a mente acentuadamente feminina ou marcadamente
masculina, reencarnam em corpos diferentes de sua estrutura psicológica, para
execução de tarefas especializadas no campo do desenvolvimento intelectual,
moral e espiritual da Humanidade”62
Indubitavelmente, até mesmo nos grupos mediúnicos, onde o amor
deveria coroar todo tipo de atendimento, persiste a rejeição a Espíritos ligados
a essa temática. Que possamos, então, mirrar os preconceitos, cultivando a

61
KÜHL, Eurípedes – Sexo: Sublime Tesouro. 1ª ed. Belo Horizonte: Editora Espírita Cristã Fonte Viva,
1992, pág. 145.
62
BARCELOS, Walter – Sexo e Evolução. 2ª ed. Belo Horizonte: Editora Espírita Cristã Fonte Viva,
1993, cap. 9, p. 109.
124

árvore frondosa da compreensão, a fim de que ela possa albergar sob seus
galhos os peregrinos a caminho da redenção.

***
125

Capítulo V

O RETORNO DE ESPÍRITOS SUICIDAS OBSESSORES

Os casos que serão relatados a seguir apresentam um estudo


comparativo sobre o planejamento do retorno de Espíritos suicidas e, ao
mesmo tempo, obsessores.
Os grunhidos selvagens quebraram o silêncio, dando-nos a
impressão de que uma fera enjaulada invadira a sala. No entanto, sabíamos
que se tratava de um irmão exteriorizando a colheita dolorosa da própria
semeadura. Encarcerado no ódio, qual larva no casulo, perdera a consciência
espiritual da sua essência divina.
Acompanhávamos atentamente o trabalho da doutrinação para que
Jairo recuperasse a identidade perispiritual, reconhecendo-se como ser
racional que carrega em si mesmo os estímulos para conquistar a felicidade
plena.
Paulatinamente, os grunhidos foram substituídos por gemidos e
depois pelo choro renovador. Jairo retomava as características humanas!
Embora tentasse falar, só conseguia emitir sons roucos e ininteligíveis,
denotando a gravidade das lesões que acometeram o seu perispírito. O
aparelho fonador deveria ser totalmente recuperado e ele teria que aprender a
falar novamente.
Jairo, naquele momento, retomava o caminho do sol após perambular
pelo caminho das trevas!

***

Após o atendimento a Jairo, a equipe espiritual trouxe-nos mais um


irmão para ser socorrido. Tratava-se de um Espírito que, quando encarnado, a
126

fim de torturar os que o amavam, se comprazia em fazer chantagem


emocional, ameaçando suicidar-se. Após cometer alguns delitos, fora
condenado à prisão. Tal fato acentuou seu caráter chantageador.
Este caso chamou muito a nossa atenção pelo fato de que a
obsessão de encarnado para encarnado, embora não seja muito destacada,
merece ser analisada com atenção, visto os danos que pode causar aos
envolvidos nesse tipo de processo obsessivo. Ao dar a comunicação
mediúnica, Cleomar gritava enfurecido, ordenando que o tirassem detrás das
grades, afirmando que fora vítima de grande injustiça.
Impulsionado pela revolta, em meio a impropérios de toda sorte,
reclamava não ter sido visitado por ninguém. Dizia-se abandonado e
cruelmente esquecido. Com o passar do tempo, o inconformismo diante da
solidão do cárcere gerou o desejo voraz de se vingar de todos os que, segundo
seu julgamento, o abandonaram injustamente. Em sintonia com os planos
inferiores, a mente doentia e desequilibrada planejou o suicídio com a intenção
de atribuir a responsabilidade do ato tresloucado a outras pessoas, lançando
em suas almas a semente do remorso destruidor.
Em completa demência, descreveu-nos como se daria o
enforcamento, afirmando, porém, não ser suficientemente corajoso para
consumá-lo. Mas, imediatamente à descrição do plano lúgubre, lágrimas,
gemidos e lamentos permitiram-nos entrever o bloqueio mental em que se
aprisionara: dependurado, afirmava a si mesmo que era preciso manter-se forte
até que alguém chegasse para socorrê-lo, evitando, assim, a sua morte.
Olavo, compreendendo que Cleomar julgava não ter consumado o
autocídio, falou-lhe que, um dia, despojados das imperfeições que nos
aprisionam ao solo árido, pedregoso e espinhoso, alçaremos o voo libertador,
em direção ao Pai. Ao final, rogou a Maria que o auxiliasse a compreender e a
aceitar a realidade, por mais dolorosa que fosse.

***
127

Breves momentos se sucederam até recebermos a saudação


amorosa de um dos coordenadores espirituais, o qual nos elucidou sobre os
casos atendidos, bem como nos colocou a par do plano reencarnatório de
ambos.
A fim de mantermos a fidedignidade da mensagem psicofônica
recebida, segue a transcrição:

Meus bem-amados, filhos da Casa de Madalena,

É com grande alegria que aqui nos fazemos presentes,


acompanhados de uma caravana de irmãos aptos a reencarnar.
Assistiram a mais essa aula de devotamento ao próximo que lhes
mostrou que a Humanidade, passo a passo, se transforma no amor
sublime de Jesus e Maria.
Trouxemos, nesta noite, dois Espíritos em grande sofrimento.
Ambos, além de suicidas, também estão na condição de obsessores.
Entretanto, há grande diferença entre eles.
No primeiro caso, temos uma consciência atormentada pelo
suicídio e também pelo remorso, uma vez que, depois de ter
desencarnado, se envolveu com Espíritos ainda ligados ao desequilíbrio
na Terra e passou a desencadear inúmeros processos obsessivos.
Desde que foi por nós recolhido, é somente o choro convulso de
remorso, aturdido pela vontade de se vingar dos companheiros
desencarnados, que o induziu às empreitadas obsessivas. Não
conseguindo perdoá-los, procura incessantemente por eles, no intuito
de se vingar.
Ele está sendo preparado para a reencarnação... Na Terra, uma
mãe generosa ouvirá articulações vocálicas desconexas de um filho
dementado e tetraplégico por 27 anos...
Durante esse tempo, em sono físico, será recolhido por nós para
auxílio. Mas, somente nos derradeiros sete anos da vida terrena, sua
mãe, jubilosa, notará nele um semblante mais ameno e alguma
possibilidade de entendimento.
Os aprendizes que trouxemos nos indagaram se algo aconteceu
de errado, pois o médium continuou a chorar, mesmo após o Espírito ter
sido desligado. Esclarecemos que o choro não era da comunicação,
mas do próprio médium, que sentiu a dor do Espírito e chorava, rogando
a Maria amparo para aquele irmão.
Também nós, emocionados com o acontecimento, não
impedimos o gesto espontâneo de muitos que aqui se encontravam em
estudo e que correram a abraçar o médium, compartilhando suas
lágrimas... Assim fizeram com todo o grupamento.
128

Já o segundo Espírito que foi atendido ainda não tem a


consciência desperta para o remorso. A demência, na sua próxima
estadia terrestre, será o seu socorro necessário. Na tentativa de auxiliá-
lo, intuiremos aqueles que estiverem trabalhando com ele para que, de
acordo com o possível, o impeçam de repetir o suicídio.
Diante do fato, alguns poderiam perguntar se não seria
contraditório aquele que se arrependeu renascer tetraplégico e o outro
não. No entanto, não é assim que as coisas funcionam. A tetraplegia
permitirá que o Espírito, em um espaço de tempo menor, resgate as
dívidas contraídas com a Justiça Divina. O retorno à carne em um corpo
que o impeça de cometer erros graves, associado à possibilidade de,
durante esses anos, realizar reflexões em estado de vigília ou durante o
sono do corpo físico, muito o auxiliará.
No segundo caso, o Espírito (Cleomar), ainda preso a situações
dolorosas de chantagem, não logrará o abrigo de um lar, pois
vilipendiou os mais caros laços de família. Caminhará errante, até que
almas caridosas o recolham a uma casa de auxílio. Roguemos a Jesus
por esses irmãos.

***
129

Capítulo VI

PABLO, O SEDUTOR

“Não, não quero voltar, não quero voltar! Eu não vou conseguir nada.
Não quero voltar! Vai ser horrível! Eu não vou conseguir. O fardo é pesado. Eu
não quero voltar, não quero!”. Essas palavras denunciam o drama que vive o
suicida ao deparar com o inevitável momento de retornar ao mundo físico. Ao
adentrar as portas do Departamento de Reencarnação63, alguns poderão se
sentir serenos, por estarem conscientes de que após o penoso resgate
poderão reiniciar a caminhada bruscamente interrompida. Entretanto, a maioria
estará relutante, por recear novas quedas e novos fracassos. É certo, porém,
que nenhum se sentirá tomado de felicidade, em decorrência da gravidade do
ato infracional cometido.
Pablo pertencia ao segundo grupo. Apavorava-se diante do premente
retorno às lides terrenas em circunstâncias adversas às que vivenciara na vida
pregressa.
Apesar das argumentações de Olavo, tentando mostrar-lhe as
possibilidades de sucesso que ele teria na nova encarnação, o Espírito estava
resoluto em solicitar mais tempo para que pudesse melhor se preparar para o
regresso. Rogava, ainda, que lhe fosse dada a provação da pobreza, mas que
lhe fosse facultado habitar um corpo físico perfeito. Segundo os técnicos64 do
Departamento Reencarnatório, tal petição era absolutamente sem proveito para
ele, pois não havia sido a riqueza o motivo da sua queda, mas a forma física
perfeita e bela. Vivendo uma vida de prazeres, rendia culto exterior à beleza,
emaranhando-se, cada vez mais, nas teias da tola vaidade e do orgulho.
Conhecer o outro lado da moeda era para ele lição imprescindível.
Renasceria sob o amparo de família carinhosa, com poder aquisitivo suficiente
para lhe oferecer oportunidades de edificação. Em contrapartida, teria uma das

63
PEREIRA, Yvonne A. Memórias de um suicida..., op. cit. p. 327-330.
64
Idem, ibidem, p. 352-356.
130

pernas atrofiada. Tal deficiência, para quem vivera sob os holofotes da


admiração, invejado e disputado, seria mais dolorosa que a maior pobreza.
Olavo empenhava-se na tentativa de despertá-lo para a realidade de
que o corpo físico é apenas matéria a serviço da evolução do Espírito; e que
este é que fulgurará como chama perene, por toda a eternidade. No entanto,
Pablo não conseguia assimilar o significado daquelas palavras, pois a ideia de
ter o futuro corpo marcado pela mutilação, causava-lhe verdadeiro terror.
No auge do desespero, oscilando entre imprecações e rogos, Pablo
denunciava-nos o inevitável: já não sentia uma das pernas! A consciência
culpada já imprimira no seu perispírito as marcas resultantes dos desatinos
cometidos.
Indiferente às palavras de ânimo e de esclarecimento, permanecera
inconformado com o futuro que construíra para si mesmo... Em desequilíbrio,
foi reconduzido à Colônia Maria de Nazaré.
Finalizado o atendimento, aguardávamos o desdobramento das
atividades, sem conseguir, no entanto, deixar de pensar em Pablo... Ecoavam
dentro de nós suas palavras, revelando-nos o medo, o desespero e a
inconformismo perante corrigenda necessária ao seu próprio melhoramento.
Entretanto, a saudação de Olavo a mais um irmão a ser assistido, chamou-nos
à realidade.
Tratava-se de Ranna. Aparentemente, parecia tranquila. O tom de
voz e a maneira como se comportava deixavam transparecer que recebera boa
educação e que desenvolvera a sensibilidade em nível elevado.
Conjecturava consigo mesma que o dia estava convidativo a um
passeio, que a vida era bela e que era imensamente feliz, pois amava e era
amada. Ressaltava que precisava terminar de se arrumar, pois não queria
chegar atrasada ao encontro e que não mais esconderia seus sentimentos,
pois chegara a hora de todos saberem a verdade...
A maneira de agir daquele Espírito talvez pudesse confundir, pelo
menos inicialmente, os médiuns inexperientes no trato com Espíritos suicidas.
Fazemos essa inferência pelo fato de que a sua conduta confrontava com os
paradigmas que conhecemos das comunicações de suicidas. No entanto, a
131

experiência nos assegurava que Ranna havia mascarado a realidade e que


aquela tranquilidade e equilíbrio eram apenas aparentes.
Como ela sinalizara que se preparava para sair, Olavo perguntou-lhe
se iria se encontrar com alguém, ao que Ranna assentiu, afirmando-lhe que
precisava se apressar, visto que seu amado já deveria estar esperando por ela.
Contou-lhe que tinham um recanto onde costumavam se encontrar, sempre às
escondidas; que mesmo contra a vontade dos seus pais, ela o receberia por
esposo; que enfrentaria o mundo se fosse preciso, mas não abdicaria daquele
amor; que tinha certeza de que tudo se resolveria naquele dia, pois ele iria
pedi-la em casamento.
Olavo, então, solicitou permissão para acompanhá-la, no que foi
prontamente atendido. Passados alguns instantes de silêncio, ao fazer
referência ao local onde estavam, Ranna começou a oscilar entre o momento
presente e o momento passado. A todo instante, pedia silêncio para que
pudesse ouvir o soar dos cascos do cavalo. Entrementes, perguntava pelas
horas, afirmando que já estava ficando escuro e que ela não poderia demorar-
se mais, sob pena de o romance proibido ser descoberto.
Abeirava de si a demência, pois lhe custava crer que o seu amado
houvesse faltado ao encontro. Cogitava que tudo não teria passado de uma
brincadeira de esconde-esconde e implorava para que ele aparecesse, pois
não tardaria a anoitecer. De repente, no desequilíbrio em que se debatia, gritou
angustiosamente um nome, o qual nos suscitou inúmeras interrogações!
Diante do desespero de Ranna, Olavo ofereceu-se para ajudá-la a
descobrir o que havia acontecido. Mas, afirmando-se cansada e sem forças,
recusou-se a sair de onde estava. Subitamente, porém, disse que o eleito do
seu coração estava chegando, pois podia ver a imagem dele refletida nas
águas do rio e que ele lhe pedia para pular. Em frenesi, ao mesmo tempo em
que Ranna dizia que iria com ele para qualquer lugar, ela se recusava a imergir
naquelas águas caudalosas para encontrá-lo.
Aquele episódio sombrio na vida de Ranna caminhava para o seu
desfecho, pois a doutrinação compreendera que ela havia se jogado nas águas
132

daquele rio e que, embora o despertar fosse doloroso, era o primeiro passo
para a reabilitação daquele Espírito perante as Leis Divinas.
Olavo, então, disse-lhe que não havia mais possibilidade de deter a
queda, visto que ela já havia pulado. Ao mesmo tempo em que rompia o
bloqueio mental, encorajava-a a seguir adiante, afirmando-lhe que “o amor
cobre a multidão de pecados” e que, um dia, todos iremos amar intensamente,
não apenas a uma pessoa, mas à Humanidade.
Comumente testemunhamos o Espírito manifestar a dor provocada
pelo ato suicida quando o bloqueio mental é rompido. Mas, no caso de Ranna,
seguiu-se profundo silêncio, do qual deduzimos que o seu recolhimento se dera
de imediato.
Em nós, ainda ecoava aquele nome, tão sentidamente evocado:
“Pablo!”. A inevitável dúvida ganhava vulto em nossa mente: O Pablo que
Ranna chamou era o mesmo que fora anteriormente atendido? –
perguntávamos a nós mesmos.
Como já acontecera em outras ocasiões, um dos mentores da
reunião, por meio da psicofonia, elucidou-nos sobre os acontecimentos daquela
noite.
O momento da volta é o drama de todos os suicidas.
O irmão quer a pobreza e o que é dado a ele é um corpo
mutilado. Embora ele diga que irá arrastar-se, terá uma perna atrofiada,
o que não o impedirá de manter-se na posição ereta; enquanto outros,
que verdadeiramente se arrastarão, dirão que têm os movimentos
dificultados. Quanta diferença!
Há muito tempo, ele vem adiando a provação. Não
constrangemos e nem estipulamos prazos muito rigorosos para o
retorno, quando, então, se cumprirá a necessária reparação do ato
praticado contra as Leis Divinas.
Certamente, se o irmão fosse mais sereno e mais humilde, o
prazo de estudos para ele seria maior. Se estivesse disposto a buscar a
transformação pela humildade, poderia retornar pobre, vitimado por
dores pungentes, mas com muitas oportunidades de trabalho. No
entanto, ainda se sente um nobre, ocupando posição de destaque.
Cultuando o corpo físico, vê-se ainda como o mesmo sedutor do
passado, que levou ao desequilíbrio tantas almas. Dessa forma, para
ele, a beleza, mesmo na pobreza, seria fonte de delinquências e
desequilíbrios, pois ele não conseguiria mudar sua conduta.
133

A perna que ele sente não se mover é o reflexo da consciência


culpada, que aceita o fato como justo e correto. Entretanto, a
imobilidade da perna é apenas aparente. Somente quando os trabalhos
do processo de reencarnação estiverem sendo efetivados é que o novo
corpo físico será moldado pelo perispírito – que já começa a aceitar a
nova situação – para uma jornada de aproximadamente cinquenta anos
na Terra.
Era por Pablo que Ranna esperava... A fantasia do encontro
marcado a levou à loucura. Vivia em profundo esgotamento da
realidade, substituindo-a constantemente pela interminável espera junto
das águas, a ponto de ver refletida nelas a imagem de Pablo,
chamando-a.
Uma sedução profunda pode desencadear uma loucura diversa
das que catalogamos comumente como tal. O seduzido pode viver em
dois mundos: o real e o imaginário. Ranna não estava junto das
paisagens como dizia estar. Na verdade, ela é paciente do Manicômio65,
da ala dos iludidos. Em virtude da desilusão amorosa, criara para si
uma realidade imaginária. Alheia ao próprio suicídio, esperava
indefinidamente por “Pablo”.
Essa criação mental será expungida após habitar novo corpo, no
qual lhe será possível resgatar o ato insano, bem como se libertar da
sedução irresponsável de que fora vítima. Há muito ela está sendo
tratada. Ambos retornarão à existência física para o reajustamento
necessário. Pablo renascerá primeiro e, com a deformação do corpo
físico, burilará a personalidade vaidosa, perdendo o ar sedutor de antes.
Ainda como bendita oportunidade de redenção, receberá Ranna – a
quem iludira de forma irresponsável – como filha muito amada.
Estamos felizes e agradecidos por mais essa tarefa cumprida.
Amemos profundamente esses irmãos.
Maria abençoa a todos.

***

Constatar que aquele a quem Ranna tanto havia amado e por quem
se deixara iludir era justamente Pablo, o jovem sedutor, foi surpreendente
demais!
Mas, o que realmente havia acontecido? Por que Pablo, jovem
afortunado e dotado de expressiva beleza física, levando uma vida condizente
com o seu orgulho e vaidade, suicidara-se? Como acontecera o seu suicídio?
134

Tendo em vista a dissertação do mentor sobre a demência que


acometera Ranna, qual seria realmente a situação daquele Espírito frente à
responsabilidade dos próprios atos? Por que o mentor, ao nos esclarecer sobre
outras coisas, nos deixara sem essas respostas? Não sabíamos! Como já
dissemos, nem sempre nossas interrogações eram respondidas.
Para nossa surpresa, no entanto, na posterior reunião de
atendimento, uma mensagem psicografada por Laura respondia nossos
questionamentos sobre os casos “Pablo e Ranna”, conforme transcrição a
seguir:
Pablo, além de ser um rapaz muito rico, era também muito belo.
Crescera cercado de mimos. Educado em meio a futilidades,
desenvolvera em alta escala a vaidade, o orgulho e o egoísmo.
Possuidor de uma autoestima invejável, acreditava-se uno em
inteligência, beleza, poder e glórias.
Com um jogo perigoso de sedução, fizera inumeráveis conquistas
amorosas... Muitas jovens, mal ingressadas na adolescência, foram por
ele atraídas, enganadas e covardemente abandonadas.
O suicídio de Ranna, que o esperara indefinidamente, foi apenas
um dos casos na vida amorosa de Pablo. O tempo passou sem que ele
tomasse consciência do mal que fizera a tantas vidas.
Um dia, porém, casou-se. Por alguns anos, fora feliz. Mas muitos
Espíritos que haviam perecido em decorrência da sua leviandade,
revoltados e ávidos de vingança, começaram a investir contra ele. Aos
poucos, induziram-no à autodestruição. Entretanto, tal destruição jamais
se daria pelo suicídio consciente, pois Pablo votava a si mesmo um
amor narcisista. Seus perseguidores, então, encontraram na bebida a
poderosa aliada que, paulatinamente, iria consumi-lo.
Pouco a pouco, ele foi perdendo o prazer de viver e, com o
passar dos anos, naturalmente a beleza foi se esvaecendo. Perdera o
encanto de antigamente.
Acostumado que fora a viver egoisticamente, os compromissos
de um homem casado lhe magoavam profundamente, pois o limitavam
em todos os sentidos. Extremamente desgostoso, buscara refúgio na
bebida. Quando o vício já se tornara incontrolável, contraiu uma
enfermidade no fígado. Por ver-se deformado pela doença, em vez de
buscar a cura, em meio a toda sorte de imprecações, bebeu até morrer.
Assim se deu o suicídio de Pablo. Dono de uma consciência
culpada, não foi capaz de resistir à sugestão dos que o induziram ao
alcoolismo irreversível.

65
Ala do Hospital Maria de Nazaré, na Colônia Maria de Nazaré, onde eram internados os Espíritos em
alto grau de demência. Cf. PEREIRA, Yvonne A. PEREIRA, Yvonne A. Memórias de um suicida..., op.
cit. p. 217-218.
135

Ao chegar ao mundo espiritual, seus algozes o arrastaram para o


acerto de contas. Por longo período, vagou sem rumo, experimentando
todo tipo de dissabores; até ser resgatado por nós.
Esta é a história de Pablo.

***

Inúmeras reflexões podemos tirar da história dessas vidas para o


nosso fortalecimento na luta do dia a dia. Que a candura possa nos envolver o
coração, a fim de que aceitemos com resignação as provas a que somos
submetidos, certos de que elas são os instrumentos necessários à nossa
evolução.
Quando depararmos com os “Pablos” e as “Rannas” ao longo do
caminho, que sejamos fraternos e solidários, senão os acolhendo em nossa
amizade, pelo menos orando para que se fortaleçam e não se desviem da rota
programada.
Pela Benevolência Divina, os náufragos da última existência serão
reconduzidos a nova viagem...

***
136

TERCEIRA PARTE

A Psicografia nas Reuniões de Atendimento aos Suicidas

A PSICOGRAFIA

A psicografia possibilitava aos Espíritos fazer relatos extremamente


dolorosos, bem como reflexões amarguradas a respeito dos enganos que
culminaram no trágico desfecho.
Os textos eram verdadeiras “cartas-desabafo” que traziam em si a
expansão de sentimentos e pensamentos, que, à semelhança de confissões,
proporcionavam a desopressão da consciência culpada. Nessa perspectiva, as
cartas cumpriam um duplo papel: atenuar as dores daqueles que as escreviam
e oferecer aos encarnados oportunidades de aprendizado, tendo em vista as
lições que traziam. Este último aspecto assumia proporções admiráveis na
terapia aplicada aos espíritos atendidos, pois os habilitava a auxiliar os irmãos
da Terra, mesmo na condição em que se encontravam.
Havia também o “relato-súplica”, que articulava o redimensionamento da
própria dor com a possibilidade de uma mudança que se operaria
gradativamente. Na maioria das vezes, a súplica transmudava-se em
verdadeira oração...
Muitos outros, porque já haviam atingido certo grau de serenidade,
colaboravam com a equipe espiritual, trazendo-nos mensagens de
esclarecimento e encorajamento. Embora ainda estivessem em tratamento
preparatório para o recomeço, colaboravam no auxílio aos náufragos da
primeira hora. Sentiam-se felizes por retribuir, de certa forma, o gesto amigo
das mãos generosas que um dia os resgataram do martírio.
Em muitas ocasiões, a médium sensibilizou-se com a angústia que os
Espíritos exteriorizavam nas páginas escritas. Quando esse as lia para o grupo,
percebíamos que, embora as histórias guardassem algumas semelhanças
entre si, jamais poderiam ser categorizadas como similares. Os sentimentos,
137

valores e pontos de vista com os quais foram construídas eram peculiares aos
que as viveram.
Com o passar dos anos, portanto, fomos percebendo a relevância da
psicografia como possibilidade de socorro aos suicidas, pois, como nos
afirmaram os próprios coordenadores técnicos espirituais, trata-se de um
“desabafo da alma”.
A seguir, a título de ilustração, apresentamos algumas mensagens
psicografadas, conforme as três situações que acabamos de ressaltar.
Almejamos que elas possam servir tanto como elemento de estudo como de
fortalecimento, pois a continuidade da vida independe das nossas crenças
pessoais, e a nossa vida presente é apenas um momento diante da eternidade.

***

1- Cartas - Desabafo

1.1. Depoimento chamando atenção para o perigo da ideia do suicídio

“Minha história não tem vibrações de alegria. Vem crivada pela dor do
suicídio.
Ainda muito jovem, deixei-me levar por vibrações inferiores, pois
julgava ser o centro das atenções. Quanto mais me supunha ligada aos que me
amavam, mais me distanciava deles. Na adolescência, diante de mínimos
sofrimentos e contrariedades, ameaçava me matar. Quanto mais meus pais se
desdobravam em amor, mais preocupação desejava causar a eles.
Até que um dia, não resistindo à volúpia daquela mórbida sugestão,
matei-me com um tiro na cabeça. Meus pais muito sofreram com o destino que
dei à minha vida, e os meus irmãos, ainda tão pequenos, não puderam ter o
exemplo das minhas virtudes.
Como pude ser tão inocente? Ah, como eu gostaria de poder voltar o
tempo! Como eu gostaria de poder arrancar do peito da minha mãe aqueles
momentos dolorosos e que a fizeram adoecer gravemente!
138

Após o suicídio, muito sofri... Uma dor insuportável na cabeça e o


sangue a jorrar ininterruptamente quase me levaram à loucura. As trevas
dominavam o ambiente onde eu estava e a companhia constante de outros
suicidas não me deixava prosseguir...
Em alguns momentos, entrevia uma luz a clarear o caminho. Então,
mais eu sofria, pois sabia se tratar das figuras angelicais dos meus pais, que,
apesar de tudo, não se cansavam de orar por mim. Como pude ser tão tola!
Há muito, pude conhecer o trabalho que este grupo espírita realiza a
favor dos suicidas. Eu os via passar66, sentia muita vergonha e não podia olhá-
los de cabeça erguida. No entanto, um dia − não sei precisar quando − levantei
o olhar e vi mãos que se ofereciam para me erguer, ofertando-me o bálsamo
do amor. Introduziram um chumaço de algodão no orifício que se abrira em
minha cabeça, estancando o sangramento. Assim, recebi de vocês os
primeiros socorros.
Hoje, venho agradecer pelo amparo que tornou possível a narração
desses fatos e a confissão do meu arrependimento.
Peço que prossigam com este trabalho e continuem socorrendo
irmãos em desespero. Obrigada pela oportunidade de abrir o coração que,
apesar de tão envergonhado, busca o perdão daqueles a quem tanto fez
sofrer.”

***

2.1 Desabafo de filho drogado, no Dia das Mães

“Mãe, como eu gostaria de ter acariciado o seu rosto quando franzia a


testa para me falar da vida e de Deus. Como eu gostaria de ter seguido seus
conselhos tão amorosos! Como eu gostaria de ter dado alegrias a você...
Lembra-se, mãe? O sonho da formatura..., de um bom trabalho...
Foram sonhos desfeitos. Como fui fraco. No lugar de risos, fiz nascerem

66
Refere-se à atuação do grupo nas reuniões mediúnicas, nos momentos em que fazia vibrações em favor
dos Espíritos no Vale dos Suicidas e locais congêneres, bem como durante o sono físico.
139

lágrimas em seus olhos e tristeza em seu coração. Ah, mãe, como eu queria
lhe pedir perdão!
Acreditei que os amigos eram mais importantes. Achei careta me
dedicar aos estudos, enquanto a turma saía para a balada. Esqueci-me dos
exemplos de trabalho no bem que constantemente recebia.
Quantas noites você ficou esperando por mim e eu não voltei porque
estava drogado. Lembro-me de que no começo tentava melhorar minha
aparência para disfarçar meus deslizes. Com o tempo, porém, perdi toda a
noção de higiene e de qualquer forma de manifestação de amor. Já não
percebia você, mãe. As drogas haviam superado qualquer princípio que
existisse dentro de mim. Já não podia voltar, pois era tarde demais. Era o fim.
Não sei ao certo quanto tempo permaneci enlouquecido, em lugar
aterrador. Minhas dores se misturavam às dores e às lágrimas de tantos
outros.
Em meio a tanto sofrimento, algumas vezes, por breves momentos,
podia ouvir sua voz... Como eu procurei por você, como a chamei! Mas só
encontrei muita solidão...
Gostaria tanto de reencontrá-la e poder chamá-la novamente de mãe.
Se você pudesse me ouvir, como eu gostaria de pedir perdão.”

***

Aquele Espírito, cheio de remorso, deixara registrado pelas mãos de


Laura, o arrependimento pelas escolhas feitas quando encarnado. Escolhas
essas que o levaram a destruir a própria vida e impuseram grande dor à sua
mãe.
Ao findar da reunião, quando as psicografias foram lidas, pudemos
constatar que, ao contrário do que ele próprio poderia imaginar, sua mãe
estava ao seu lado e, embora não pudesse percebê-la, ela – com extremado
amor – ouvira o seu desabafo e o seu pedido de perdão. Ela também fizera o
seu desabafo!
140

Destacamos, assim, a peculiaridade da dinâmica utilizada pela


Equipe Espiritual, permitindo que mãe e filho, em uma mesma reunião,
extravasassem nas folhas que rapidamente iam sendo preenchidas a angústia
que oprimia suas almas.
Transcrevemos a seguir, o desabafo daquela mãe.

1.3. Desabafo da mãe

“Quando descobri que o meu filho era usuário de drogas, sofri


amargamente. Mobilizei todos os esforços para ajudá-lo, mas foram em vão,
pois já era tarde demais. Ele estava totalmente dependente. Um dia, após fazer
uso de grande quantidade de drogas, o seu organismo, embora jovem, não
resistiu...
Como sofri! Quanto chorei! Ele era o meu único filho, pois fiquei viúva
quando ele tinha apenas cinco anos.
Entretanto, Deus – que não nos desampara – felicitou-me, ainda em
vida, com o trabalho voluntário em uma casa de recuperação. Lá, pude
conhecer filhos que foram abandonados por não terem sido o modelo almejado
pelos pais. Então, eu pude doar todo o amor que havia reservado para o meu
único filho.
Hoje, apesar de ele ainda estar muito comprometido mentalmente,
pude acompanhá-lo para este pequeno desabafo. Isso trouxe ao meu coração
de mãe a certeza de que Maria está reconduzindo nossas vidas e amparando-
nos sempre.
Sinceramente agradecida pelo atendimento prestado ao meu filho,
peço que Maria ampare todas as mães que sofrem; que desperte no coração
de cada uma a certeza de que os seus filhos são irmãos a caminho,
extremamente necessitados do amor maternal.
Muita paz a todos.”

***
141

1.4. Carta-desabafo de um trabalhador da Colônia Maria de Nazaré

“Quando o Criador disse ‘faça-se a luz’67, e esta se fez, ficou


determinado que jamais poderíamos deter a vida. Embora conscientes da
grandeza de Deus, cujas Palavras estão impressas no livro da vida, não se
pode penetrar no íntimo de alguém que sofre.
Aquele que busca o suicídio, o faz por egoísmo? Cultiva dentro de si
a incerteza das próprias forças para o enfrentamento dos embates da vida? Em
verdade, o suicida é alguém fracassado, mesquinho e egoísta. Para muitos,
alguém com quem não se deve nem mesmo perder tempo com orações...
Infelizmente, conheci essa realidade. Equivoquei-me, achando que
poderia fugir aos imperativos da Lei Divina.
Um dia, amorosamente fui socorrido por mãos generosas. Demorei a
adaptar-me ao novo estado. Minha consciência se negava a aceitar os deslizes
cometidos, pois, quando encarnado, eu recebera as luzes da Doutrina Espírita.
Como foi difícil confessar-me a mim mesmo! Sentia-me cansado e não
conseguia prosseguir.
Hoje, sinto-me feliz por fazer parte da Colônia Maria de Nazaré, como
servo humilde. Tal condição tem me proporcionado significativos aprendizados.
Como lamento não ter refletido enquanto ainda era tempo! Mas cada
um tem o seu momento! Terei de retornar para entender os desígnios do
Criador.”

***

1.5. Carta-desabafo – Suicídio por desilusão amorosa

“Irmãos,
Quanto sofrimento... Mas, a cada dia, surpreendo-me com os
horizontes que se descortinam diante dos meus olhos. Nesses momentos,
sinto-me confusa entre o que hoje vivencio e o que antes eu acreditava.
Fui evangélica e servi ao Senhor da forma que eu conhecia como
certa e única.
142

Muito jovem e cheia de ilusões, encantava-me com as pregações do


irmão que coordenava a nossa igreja. Suas palavras me envolviam e, dia a dia,
despertavam em mim um amor muito grande. Entretanto, o pastor era casado.
Eu muito me envergonhava dos meus sentimentos. Tinha medo de que alguém
percebesse.
Muito sofri até compreender que não poderia continuar amando
aquele homem. Afastei-me da igreja e, achando-me indigna, afastei-me de
todos. A Bíblia era a minha fiel companheira e sobre ela chorei minhas lágrimas
mais sofridas. A tristeza me corroia. Um dia, então, pensei em dormir o sono
eterno. Esperei que meus pais fossem para a igreja. Com uma mão segurei o
veneno para ratos e com a outra, a Bíblia.
Não podia entender como as coisas haviam acontecido. Mesmo
depois de tudo, eu permanecia viva. Todos que estavam comigo eram
estranhos e riam da Bíblia que eu carregava.
Certa vez, quando chorava desesperadamente, orei ao meu Senhor:
“O senhor é meu pastor e nada me faltará”68. Quase imediatamente, uma irmã
veio em meu auxílio e revelou-me com meiguice que ela também fora
evangélica e que agora vivia nova realidade, em um mundo novo: o mundo dos
Espíritos.
Tive medo. Porém, fui levada a um hospital, onde refiz meus
pensamentos e conheci novas pessoas. Aos poucos, fui compreendo que eu
estava realmente viva. Se era um Espírito, queria ser um Espírito bom e estar à
direita do Pai.
Atualmente, sou trabalhadora dos jardins da colônia e muito tenho
aprendido com as flores... Espero continuar a trabalhar para Jesus.
Estou feliz por estar aqui, relatando um pouco da minha história por
intermédio de outras mãos. O Espírito é eterno!
Jesus os abençoe.”

***

67
Gênesis, capítulo 1. Bíblia Sagrada (versão digital). Seafox/Terra Santa/James King/Vozes, 2005.
143

1.6. Carta-desabafo – Suicídio por desilusão amorosa

“Cheia de sonhos, intempestivamente, entreguei-me ao amor.


Enfrentei os preconceitos da época, deixei minha família e ignorei as
convenções sociais. Meus pais, profundamente desgostosos com o meu gesto,
adoeceram gravemente. Passivamente, entregaram-se à doença que, aos
poucos, os levou. Muito sofri ao vê-los partir, pois eu tinha plena consciência de
que havia causado tudo aquilo...
Tempos depois, em uma tarde de outono, ele se foi! Apaixonara-se
por uma bela moça que também nutria por ele afeição. Senti como se o mundo
acabasse ali e apenas eu houvesse sobrevivido. O vento soprava forte e, aos
poucos, o sol desaparecia no horizonte, deixando uma melancolia no ar.
Subjugada pela dor, desesperei-me, pois não tinha mais ao meu lado
os meus pobres pais, que seriam, naquela hora, o meu porto seguro!
Irrefletidamente, então, procurei o caminho do riacho. Olhei as pedras e
imaginei que a morte seria a solução e, num átimo, atirei-me de encontro a
elas...
No primeiro momento, quando o salto chegou ao termo, em cruciante
imobilidade, deixei-me ficar. Mas, depois, sobreveio um zumbido ensurdecedor
e, seguidamente, senti uma espécie de explosão por dentro de mim. Percebi
que o sangue do meu corpo se esvaia em borbotões. Foi, então, que uma dor
imensurável me tirou a lucidez... Não conseguia enxergar e perdi totalmente a
noção de tempo. Ouvia, vindo de todas as direções, gritos de revolta,
xingamentos, gemidos, soluços e loucas gargalhadas que me faziam temer
pelo que pudesse estar acontecendo.
Aos poucos, percebi que estava em um lugar estranho e que não
conhecia ninguém. Insistentemente, a mim mesma perguntava onde Paulo
estaria. Comecei a ter consciência de que as dores se intensificavam na
mesma proporção que eu perguntava por ele. Perambulava como louca,
procurando alguém para conversar, no entanto, ninguém me ouvia ou me
entendia.

68
Salmo 23. Bíblia Sagrada, op. cit.
144

Não sei dizer quanto tempo havia passado... Sei, porém, que em um
determinado momento, já bastante exausta, lembrei-me de Jesus e tentei
rezar. Mas, minha mãe não estava lá para rezarmos juntas. Então, chorei,
chorei e chorei, pois nada mais me restava a fazer. Entretanto, em meio
àquelas lágrimas, lembrei-me de singela oração, que fiz de olhos fechados.
Comecei, assim, a me sentir melhor. Implorei auxílio. Meus olhos se
desanuviaram e pude ver muitas pessoas se aproximarem de mim. Entre elas,
uma mulher de olhar sereno, falou-me: “Chega de sofrer. Você quer vir
conosco?”. Sem poder respondê-la, inopinadamente, beijei suas mãos e deixei-
me ser socorrida.
Adormeci profundamente. Quando despertei, estava em um hospital,
onde fui muito bem tratada e onde me aconselharam com amor.
Vagarosamente, recordei todos os acontecimentos. Entrei em desespero. Eu
teria, enfim, morrido? Por que eu estava ali? Paulatinamente, fui sendo
esclarecida sobre a minha nova condição; e, ao mesmo tempo, procurava me
fortificar na fé. A continuidade da vida em outra dimensão foi uma grande
surpresa para mim.
Estudei e conheci toda a Colônia, constatando o quanto era bem
administrada. Assistia palestras, apresentações musicais e teatrais. Quanto
bem a música me proporcionava!
Depois de muito tempo, integrei-me ao grupo de captação de preces
e pude levar o bálsamo da oração aos necessitados de conforto e auxílio.
Um dia, disseram-me que Paulo desencarnara aos setenta e cinco
anos de idade e que eu poderia me encontrar com ele. Informaram-me que ele
muito sofrera ao saber o que havia acontecido comigo e que, verdadeiramente,
arrependera-se de ter me iludido e abandonado. Exultante, esperei ansiosa
pelo reencontro.
Encontramo-nos, então, e agradecemos a Jesus a concessão
daquele encontro. Dali em diante, eu permaneceria na Colônia e Paulo daria
continuidade ao tratamento a que estava sendo submetido. Sempre que era
possível, encontrávamo-nos novamente. A ternura e o carinho que sentíamos
145

um pelo outro cresciam cada vez mais, assim como a disposição para o
trabalho.
Antes, eu tinha muito medo de reencarnar! Agora, sinto-me mais
confiante, pois meus pais já estão reencarnados e irão me receber novamente
como filha.
Eu e Paulo teremos também uma nova oportunidade e receberemos
como filha aquela que foi outrora o motivo da nossa separação.
É tempo de partir.
Com muita alegria agradeço a oportunidade.”

***

1.7. Carta-desabafo de uma enfermeira

“Amigos em Cristo,
A minha história ainda me toca muito, pois é bem difícil conviver com
a realidade de que fui a causadora de tantas mortes.
Sim, meus amigos! Recebi instruções de enfermagem e isso era uma
grande vitória, pois à época em que vivi não era corriqueiro a mulher ter uma
profissão. Portanto, sentia-me feliz, pois tinha certeza de que Deus havia
colocado em minhas mãos o sacerdócio do auxílio.
Consegui trabalho em uma maternidade e afaguei muitas mãezinhas
nos seus momentos de dores, como também pude compartilhar do júbilo que
elas sentiam ao segurar os filhos nos braços.
Os tempos eram difíceis e os recursos financeiros, antes suficientes,
já não atendiam minhas necessidades. Certa feita, uma família em desespero
me procurou, pois a filha caçula aparecera grávida de um serviçal da casa.
Isso, para a sociedade da época, era uma afronta aos bons costumes. Era
preciso resolver o problema... A princípio, a proposta fez-me recuar. Entretanto,
além da recompensa financeira ser tentadora, considerei que a causa era
‘justa’. O ‘trabalho’ não fora difícil, pois eu tinha muita prática; e a recompensa
me fizera aceitar a experiência com naturalidade.
146

Muito tempo depois, a mesma família novamente me procurou...


Desta vez, tratava-se da filha de um compadre que enfrentava dificuldades com
uma gravidez indesejada. Afirmavam que a menina havia sido vítima de uma
sedução. Realizei o aborto, justificando para mim mesma que o caso era sério
e que, além do mais, aquela seria a última vez que faria aquele tipo de serviço.
No entanto, não parei por ali. Tornei-me uma aborteira eficiente.
Desde então, adquiri vultosos recursos. Minha consciência, porém,
não me dava tréguas. Acusava-me ininterruptamente; e eu não tinha paz.
Já bem madura, busquei o casamento como alternativa para mudar
de vida. Entretanto, surpreendi-me com a impossibilidade de engravidar. Meu
marido não aceitou aquela incapacidade e começou a se afastar de mim.
Iniciava-se o meu calvário e o cálice de fel começava a ser sorvido em
abundantes goles.
Eu já não conseguia viver como antes. Abandonei o emprego e
refugiei-me em minha própria casa, onde amarguei a maternidade impossível
na solidão dos dias que me pareciam intermináveis. Comecei a sonhar com os
nascituros que impiedosamente eu assassinara. Nos meus sonhos, eles se
grudavam em mim, gemiam e choravam; e, eu, desesperadamente, chorava
também.
Acordava assustada e não conseguia tirar do pensamento aqueles
lamentos. Com o decorrer do tempo, passei a sentir os fetos agarrados a mim,
sorvendo minhas energias, como parasitas. Eu implorava que me deixassem
em paz; gritava para que procurassem as mães que os haviam rejeitado...
Sentia-me enlouquecer a cada dia... Não vendo solução para aqueles
desvarios, vocês podem imaginar o que ocorreu...
Quanto sofri, irmãos! A imagem daqueles corpinhos indefesos,
fugindo das minhas mãos assassinas, torturava-me incessantemente. Eles
lutavam pela vida e eu os matava por dinheiro.
Um dia, porém, Maria acolheu-me com carinho. Recebi ajuda de
amigos, fiz muitos cursos e tive inúmeras oportunidades de trabalho.
147

Tanto tempo já se passou! Atualmente, auxilio as mães que aqui


chegam em consequência do aborto praticado. É para elas que dedico todo o
meu amor. Recebo-as como se recebesse o filho amado que não pude ter...
Que esta Casa Espírita possa sempre encabeçar campanhas em
favor da vida, contando com o auxílio dos amigos espirituais.
A vida vale mais!”

***

1.8. Carta-desabafo – Suicídio por orgulho

“Como tenho sofrido! Quanta decepção! Quanta tristeza!


Matei-me, pois jamais imaginara que a vida tivesse prosseguimento
além do corpo físico. Quando o vexame me assolou de cheio, não hesitei um
só instante.
Tantas vezes ouvi o chamamento do Cristo, por meio das palavras da
minha mãe. Mas a vontade de vencer e de ganhar dinheiro me tirou a razão.
Não medi meus atos e não pude conter minha loucura.
No auge do poder e da riqueza, perdi o controle de tudo e meus bens
foram usurpados. Minha família se envergonhou de mim e me deu as costas.
Com o orgulho ferido, com cuidado, premeditei tudo: uma corda, um pulo e o
fim. Entretanto, as coisas não aconteceram como eu esperava...
Ainda hoje sofro as consequências do ato vergonhoso. Embora
constantemente ouça vozes me oferecendo ajuda, até o momento presente
não consegui me libertar do incrível torpor...
Gostaria de melhorar, mas não consigo. Sou um fracassado. Embora queira
reagir, sinto-me arrastado ao desespero.
Perdoe-me, Pai! Se é que assim posso chamá-lo.
As lágrimas que agora derramo têm algo diferente. Não sei bem o
que está acontecendo, mas tenho a impressão de que uma luz está vindo ao
meu encontro...
148

Sim, é uma luz! Ah, meu Deus, há tanto tempo estou envolvido em
pesadas trevas... Estou tão cansado. Gostaria que me levassem... Não suporto
mais...
Auxiliem-me, se for possível.”

***

1.9. Carta-desabafo – Suicídio Infantojuvenil

“Era noite de Natal... A cidade estava toda iluminada e as pessoas,


apressadas, andavam de um lado para o outro. Fazia um frio cadavérico e
tremores agitavam o meu corpo.
Em meio àquela movimentação, à semelhança de um filme, eu revia o
meu passado, ainda tão presente dentro de mim...
Eu e meus irmãos éramos ainda muito pequenos quando nosso pai
nos abandonou. Mesmo com pouca idade, tivemos que começar a trabalhar.
As dificuldades me tornaram um menino amargo e apático, que via a vida
passar inalteravelmente em preto em branco. Não conseguia sorrir, conversar e
nem fazer amigos.
Certa vez, quando retornava para o barraco onde morávamos, parei
aterrorizado diante da terrível cena: bombeiros tentavam apagar o fogo que já
havia destruído tudo... Minha mãe e meus dois irmãos menores foram
consumidos pelas chamas. Nada fiz, nenhuma reação esbocei. Apenas fiquei
imóvel, a observar o trágico acontecimento.
Desde então, as pessoas me tomaram como louco, pois emudeci de
vez. Pouco comia do que a caridade pública me doava. Sem ter para onde ir,
andava, andava, até desfalecer de cansaço.
Especialmente naquela noite, não consegui suportar a tristeza e a
solidão. Como uma fera ferida e enjaulada, desferi o grito há tanto sufocado...
Nada poderia ser pior do que continuar vivendo...
Mas eu estava enganado... Por muito tempo, perambulei sem rumo,
tornei-me joguete nas mãos de Espíritos inferiores e fui aprisionado,
juntamente com outros infelizes, em uma caverna escura e sombria. Lá,
149

experimentei os maiores horrores, sob a tortura de sinistro coro que gritava e


gemia, incessantemente.
Não sei dizer por quanto tempo fiquei prisioneiro naquele lugar. No
entanto, consegui fugir. Mas fugir para onde? Corria sem rumo, impulsionado
pelo temor de ser capturado. Já havia sofrido demais... Sem forças para
continuar a fuga, parei e deixei-me ficar... Então, chorei. Não mais de revolta,
mas de saudade da minha mãe.
Prostrado no chão, implorei por sua presença, pois desejava repousar
a cabeça em seu colo e ter os cabelos afagados por suas mãos.
− Mãe, eu suplicava, perdoe-me por ter desistido de viver. Socorre-
me, pois já não suporto mais...
Naquele momento, uma sensação de bem-estar tomou conta de mim.
Senti que alguém, cuidadosamente, pegava a minha cabeça e colocava-a no
colo e, em seguida, afagava os meus cabelos. Tamanha foi a emoção que não
consegui reagir. Não havia dúvidas! Era ela, a minha mãe! Sentindo-me
amparado e protegido, simplesmente me entreguei àquele gesto de carinho...
− Filho querido, disse-me com ternura, muito tempo já se passou. Já
é Natal outra vez... Quando estávamos na Terra, você se sentia triste pela
mesa farta que nunca tivemos e pelos presentes que nunca ganhava. Mas,
daqui para frente, você descobrirá o verdadeiro significado do Natal. O seu erro
foi grande, mas Deus é Misericordioso e lhe dará outra chance! Esses irmãos
irão tirá-lo daqui e ajudá-lo. Aqui encontramos amigos. Confie!
Tudo mudou desde então. Agora percebo o quanto fui imaturo, fraco
e acomodado. Compreendo com clareza que, naquela ocasião, a maior
carência era a de ter Jesus na minha vida.
Mais um Natal se aproxima. Onde havia trevas, já se fez luz, pois
Jesus está em nós.
Feliz Natal! Um abraço a todos.”

***
150

2 – Relato–súplica

2.1. Apelo para Renascer

“Como eu gostaria que me ouvissem!


Tanto tempo já se passou desde aquela tarde sombria em que eu,
não mais acreditando na vida, me enveredei por abismos profundos, certa de
que encontraria o refrigério para os meus sofrimentos... Mas, ao contrário do
que havia imaginado, dores ainda maiores impregnaram o meu ser imortal.
Apesar de saber que poderia permanecer mais tempo aqui, a fim de
recompor o meu corpo espiritual, sinto um desejo imenso de progredir. Mesmo
ciente de que terei a vida marcada pela deficiência dos órgãos que mutilei, em
função dos meus próprios desatinos, quero voltar. Mas dependo de corações
generosos para me receber como filha. Sei que isso não será fácil, pois terão
de abdicar do sonho de filhos perfeitos e inteligentes para encher suas vidas de
alegria.
Por isso, peço por mim e por tantos outros que necessitam passar por
uma nova experiência: deixem-nos renascer! Só o renascimento poderá nos
dar a paz de consciência.
O registro que aqui deixo é um pedido de socorro”.

***

2.2. Relato-súplica de uma Jovem Viciada

“Ainda hoje, sinto-me envolvida por uma sensação de torpor. O mesmo


que acompanhava as minhas fugas e que rapidamente se transformavam em
delírios. Naqueles atalhos me perdi, sem encontrar o caminho de volta.
A primeira vez é sempre legal, pois vem acompanhada da certeza de que
nada se tem a perder. A coragem aumenta e você acredita ser o maior. Quanto
engano! Passado o êxtase, a angústia e o arrependimento torturam o que
ainda resta de você.
151

Nesse processo, rapidamente o desejo se torna insaciável e tem início a


procura por ‘coisas’ mais pesadas. Então, o vazio toma conta de tudo e, como
não dá para fugir de si mesmo, a gente se retraí, isolando-se do mundo.
Às vezes, quando a ‘onda’ passava, queria que alguém viesse em meu
auxílio. Esse alguém poderia até ser um daqueles caras caretas que, vez por
outra, falavam do Evangelho como solução para os problemas. No entanto,
aqueles momentos eram muito breves. Eu queria dizer não às drogas, mas não
tinha força suficiente para isso.
Não sei onde os amigos foram parar, pois quando o seu corpo não
aguenta mais, todo mundo cai fora. Você passa a ser uma carta fora do
baralho, pois o seu valor está diretamente ligado à grana que você pode
conseguir.
No decorrer do tempo que passei ligada à minha veste carnal (é assim
que falam aqui), sofri demais vendo tudo acontecer. Desejei poder fugir... Fugir
mais uma vez. Porém, era inútil. Era tarde demais...
Agora vejo com clareza que eu poderia ter vivido os dias dos jovens
legais... Assim como eles, poderia ter brincado, trabalhado, amado e
gargalhado, sem precisar das drogas para ter momentos de alegria.
Não valeu a pena. Não se iludam, não caiam nessa armadilha. O poço é
fundo demais. No final, só há dores e escuridão. É melhor dizer não!
Desejo que estas palavras possam chegar como o grito de alerta de
alguém que despertou e compreendeu que Jesus é o caminho.”

***

2.3 Relato-súplica de Alguém que cedeu à Sugestão de Espíritos


Obsessores

“Amigos,
Quanto sofrimento encontrei por ter desistido de viver! A dor era tão
intensa que me sentia morrer a cada instante, sem que isso efetivamente
acontecesse.
152

Eu não tinha noção do tempo que havia passado. Apenas chorava


com a dor lancinante dos punhos cortados, de onde o sangue jorrava sem
parar.
Não conseguia alcançar a luz que por vezes via reluzir na escuridão.
O tempo todo, só ouvia gemidos, lamúrias e pragas. Eram loucos que me
espreitavam e que riam sarcasticamente do meu destino. À semelhança de
lobos famintos, rodeavam-me ferozmente, querendo me capturar.
Desesperado, tentava fugir, mas não saía do lugar. Até que um dia, mãos
anônimas me tiraram daquele abismo infernal...
Hoje, muito tempo depois de ter sido socorrido, entre a dor e a
vergonha, posso aqui me comunicar. Anseio, simplesmente, dar o meu
testemunho de que a vida não pertence ao corpo que apodrece, mas ao
Espírito que é imortal.
Não procurem o suicídio como resolução dos problemas, pois
somente a luta diária, com o enfrentamento das dificuldades pode trazer paz e
luz àquele que caminha na Terra.
Orem a Deus para que possam estar protegidos de Espíritos que,
como matilha feroz e faminta, rodam a humanidade. Só a oração e o trabalho
no bem poderão detê-los.”

***

3 – MENSAGENS DE COLABORADORES DA EQUIPE ESPIRITUAL

3.1. Orientação ao Grupo69

“Queridos irmãos,
Somente a compreensão, a perseverança e a dedicação farão dos
trabalhadores deste grupo seareiros diferenciados pela responsabilidade que
julgamos ser de todos nós. É natural que alguns ainda permaneçam ansiosos e
que tenham muitos questionamentos.

69
Mensagem psicografada em agosto/1998, período em que começamos a fazer os registros para a
confecção desta obra.
153

Compreendemos a apreensão da nossa querida Clarisse70 quanto à


catalogação dos dados. Gostaríamos de solicitar a ela que leve todas as
dúvidas para serem discutidas e analisadas pelo grupo. Dessa forma, teremos
maior possibilidade de auxiliá-la, pois muitas vezes, com receio, tem ignorado
as intuições recebidas, restringindo o seu trabalho aos comentários gravados
nas fitas cassetes.
Assim sendo, após o grupo ter dirimido todas as dúvidas, se ainda
houver necessidade, poderemos dar mais esclarecimentos na própria reunião
de atendimento.
Solicitamos que, na semana que antecede o trabalho, preparem-se melhor
para a atividade, a fim de não se tornarem alvo de influenciações pesadas.
O amor que parte do coração de cada um em direção à Colônia
sempre tem chegado ao seu destino, levando aos nossos internos eflúvios de
paz que os fortalece e os reanima, facilitando-nos o socorro.
Rogamos aos irmãos da doutrinação que continuem vibrando amor
por meio da palavra que consola e esclarece; e aos sustentadores que
permaneçam sempre em auxílio, pois as emanações piedosas aliviam e
adormecem os pupilos de Maria. Chamamos a atenção para o quanto os
médiuns psicofônicos e psicógrafos necessitam do trabalho da sustentação
para apoiá-los no equilíbrio vibratório das comunicações.
Os irmãos por vocês auxiliados enviam-lhes vibrações de alegria,
gratidão e cânticos de amizade.
Nós não seremos o relógio que desperta, mas a bússola que convida
a seguir.
Muita paz e que Jesus os abençoe”.

***

70
Pseudônimo explicado na Introdução, no item “O Grupo Mediúnico”.
154

3.2. Mensagem de Fortalecimento nos Momentos de Crítica por ter sido


Criada uma Reunião Específica para Atendimento a Espíritos Suicidas

“Queridos irmãos,
A Bondade Suprema de Deus nos concedeu, no dia de hoje, a
oportunidade de estarmos juntos neste trabalho de amor, pelo qual tanto
esperamos.
Até estarmos hoje na condição de trabalhadores fiéis da Colônia
Maria de Nazaré, muitas lágrimas foram derramadas, pois o aprimoramento
daquele que infringe as Leis Divinas se faz com lutas e sacrifícios. Muitos
caminhos foram percorridos para que nos preparassem para esta atividade
que, embora pareça tão simples, tanto significa para nós.
Muitos julgam não ser necessário um dispêndio tão intenso de amor.
Outros até questionam a necessidade de um trabalho específico para atender
aqueles que se negaram a viver. Por isso, por várias vezes, este grupo foi
criticado. Mas aqueles que já se sensibilizaram com o sofrimento alheio, após
um esclarecimento maior, compreenderão melhor essa necessidade.
Não fiquem impacientes diante das críticas, pois essas quase sempre
são frutos da inexperiência que dificulta a percepção do amor que hoje vocês já
sabem valorizar.
Maria não nos desampara e a luz que um dia fez brilhar no abismo
onde vocês estavam, resgatando-os de sofrimentos atrozes, ainda hoje se
reflete neste grupo, apoiando a realização deste trabalho.
Em certas ocasiões, o silêncio será melhor, a fim de que o
desabrochar se processe de forma natural. Somos como frutos... Por isso,
esperemos e confiemos.
Sabemos das dificuldades que por vezes os ameaçam. Percebemos
as lágrimas diante dos sofrimentos. Entretanto, Jesus nos ampara sempre,
aceitando-nos como trabalhadores da sua seara.
Para nós, o trabalho continua sempre, estendendo-se noite adentro,
pois quando os corpos repousam, os Espíritos continuam o aprendizado.
Então, cada um ressurge, carregando no peito o símbolo do colaborador que,
mesmo entre dificuldades, se faz luz.
155

Lembrem-se de que nenhuma ovelha ficará desgarrada do rebanho.


Sejamos os pastores leais a favor do trabalho e trabalhemos em conjunto.
O Pai Maior será sempre conosco, hoje e sempre.
Paz a todos!
Um irmão em Cristo Jesus.”

***

3.4 Mensagem de Alerta sobre a Necessidade da Realização do Culto no


Lar
“Neste ano que se finda, deixamos a cada um o nosso abraço
afetuoso e o nosso agradecimento.
Na oportunidade, lembramos a necessidade de os trabalhadores se
voltarem para a família, dedicando-se semanalmente ao culto do Evangelho no
lar71 − berço de bênçãos e de reajustes.
O orgulho precisa ser banido do coração e o amor deve ser pregado
dentro de todos os lares.
A caridade começa no santuário do lar. Atenção, muita atenção!”

***

3.5. Mensagem de Alerta

“Caros irmãos,
Grande é o despertar da humanidade nos tempos que surgem. O
trabalho com o Cristo requer de nós a compreensão e o desprendimento que
tantas vezes nos desviam do caminho.
Uma sintonia maior é necessária para que o trabalho possa fluir com
êxito e para que as influências advindas dele não interfiram72 em suas vidas. A

71
Mensagem psicografada em dezembro de 2002, época em que estava sendo implantado, por meio de
campanhas, o Culto do Evangelho no Lar. Atualmente, essa prática, bem como a consciência da sua
importância têm encontrado cada vez mais receptividade nos lares dos trabalhadores da Casa Espírita.
72
A vigilância é imprescindível em qualquer trabalho que se realize. Nas atividades mediúnicas, a sua
importância assume proporções ainda maiores.
156

atividade de auxílio é ampla e tem continuidade nos dias que se seguem à sua
realização.
Não se deixem envolver por pensamentos negativos, que são a porta
de entrada para as influências menos sãs. Recorram sempre ao Evangelho,
fortificando-se nas lições que o Cristo nos deixou.
Sabemos que as dificuldades os desmotivam. Entretanto, acreditem
no Amparo Vigilante que envia amigos para auxiliá-los.
Agradecidos pela oportunidade, pedimos ao grupo que se mantenha
unido e confiante para que as dificuldades possam ser superadas com êxito.
Confiemos e aguardemos, pois o trabalho continua.”

***

3.6. Mensagem de Encorajamento

“A Colônia Maria de Nazaré agradece a colaboração que cada um


pode oferecer no momento.
Assim como o diamante passa por processos bem dolorosos de
burilamento para atingir aquele brilho e tornar-se precioso, necessitamos do
trabalho íntimo para evoluirmos.
Hoje sabemos que não há nada que o tempo não possa resolver. Se
às vezes nos alegramos, em outras nos entristecemos, principalmente quando
nos desequilibramos. Mas Maria nos adverte que sempre é tempo de fazer a
reforma íntima; e, se há forças que nos sugam para baixo, há outras que nos
impulsionam para o Alto.
Nós da Colônia Maria de Nazaré, por estarmos sempre ao lado de
vocês, temos tido a grata surpresa de presenciar o melhoramento espontâneo
e verdadeiro que aos poucos vocês têm evidenciado.
Nos momentos mais corriqueiros do dia, alguns já são capazes de
sentir a proximidade da espiritualidade a intuí-los e a envolvê-los em vibrações
de paz, harmonia e fé.
157

Maria nos sorri com benevolência e nos alerta que é preciso orar e
vigiar os pensamentos mais secretos e os pequenos gestos, a fim de sermos
mais receptivos às influências do Alto.
Desejamos que as vibrações e os pensamentos emitidos por vocês
possam ser percebidos por meio da luz e da paz que sejam capazes de
irradiar. Isso é um treino constante, em que Jesus nos auxilia com o Seu amor.
Tenhamos fé e não nos deixemos levar. Busquemos o equilíbrio e a
harmonia para o nosso próprio melhoramento.
Jesus os abençoe e que a Sua luz possa envolvê-los em eflúvios de
paz.
Um irmão em Cristo.”

***

UMA OBSERVAÇÃO IMPORTANTE

Os exemplos de “carta-desabafo” e “relato-súplica” aqui expostos


demonstram um grau de conhecimento da vida espiritual e relativo equilíbrio na
organização das ideias no papel.
Não obstante, várias cartas e relatos vieram até nós sem a clareza de
ideias, possibilitando-nos diagnosticar o estado deplorável em que se
encontrava o Espírito comunicante, fosse pela dificuldade de organizar os
pensamentos, pela falta de consciência do seu real estado, ou pela dolorosa
impressão causada ao médium, entre outras.
Dessa forma, julgamos por bem guardar aquelas páginas, evitando
expô-las, pois acreditamos que tenham sido retratos de um momento já
passado. Além disso, a caridade nos aponta que a exposição da dor alheia
somente deve ser feita no limite do necessário para o estudo em questão.

***
158

QUARTA PARTE

A ARTE COMO TERAPIA PARA ESPÍRITOS SUICIDAS

A PSICOPICTOGRAFIA

No ano de 1992, a reunião de vibrações não havia sido ainda


transformada em mediúnica. Os Mentores Espirituais iniciaram, então, nas
reuniões de psicografia/psicopictografia73 da nossa Casa Espírita, o tratamento
de alguns espíritos suicidas por intermédio de Franco.
Pelo processo da psicopictografia, eles começaram a representar o
estado enfermiço de suas almas, liberando, pelos desenhos, as emoções
carregadas de pessimismo. Mas, após o desenrolar de várias sessões, foram
se reorganizando intimamente e, aos poucos, as sombras foram cedendo lugar
à luz inspiradora... Começaram a desenhar e a pintar a esperança, o apelo à fé
e à caridade. Paisagens repousantes, capazes de infundir sentimentos de paz
e desejo de renovação foram surgindo. As fácies humanas passaram a ser
retratadas como templos do Escultor Divino, suscitando veneração e
respeitabilidade em uma próxima encarnação.
De acordo com os técnicos espirituais responsáveis pela reunião,
outras tantas possibilidades de auxílio por meio da psicopictografia poderiam
ser listadas e relatadas. Entretanto, optaram por enfatizar que a pintura
mediúnica para os suicidas é usada como recurso terapêutico bastante eficaz,
mesmo para aqueles que ainda não tenham desenvolvido esse dom.
Alertaram-nos que, enquanto encarnados, se viermos a conhecer
melhor o recurso do desenho e da pintura, dele poderemos também nos
beneficiar, utilizando-o para a liberação de energias depressoras nos

73
Pintura dos Espíritos por meio do médium (pintura mediúnica).
159

momentos de dor e angústia e para a fixação de energias criadoras nos


momentos de lazer e de elevação.
Os exemplos que oferecemos a seguir são de dois espíritos que se
identificaram com os pseudônimos de “Alma Suicida” e “Marcos”, sendo que
ambos foram pintores na Terra e se encontravam em tratamento na Colônia
Maria de Nazaré à época em que se comunicaram.
O procedimento usado era sempre o mesmo: faziam suas telas e, em
seguida, escreviam algo sobre elas. Para elucidações mais detalhadas sobre a
forma como se deram esses atendimentos, transcrevemos a seguir algumas
observações feitas pelo médium:

As comunicações dos espíritos “Alma Suicida” e “Marcos” sempre


se iniciavam com a pintura do quadro. Digo pintura porque, durante a
composição do quadro, ambos tratavam o papel como se fosse uma
tela.
As cores que eles utilizavam eram vislumbradas espiritualmente.
Ora eles usavam o lápis como pincel, ora como lápis mesmo.
Curiosamente, ambos começavam o traçado por um ponto que
não me permitia identificar o que iria ser pintado.
Após a conclusão dos quadros, “Alma Suicida” assinava-os com o
título da obra e datava-os cuidadosamente. Em seguida, escrevia
pequeno texto sobre eles.
O espírito “Marcos”, no entanto, ao terminar o quadro, partia
imediatamente para o texto, dando a ambos o mesmo título. O título da
tela ficava em segundo plano, apenas como uma singela ilustração do
que iria ser contado.
Juntamente com esses Espíritos, muitos outros vinham em
caravana presenciar o intercâmbio entre os planos material e espiritual
e aprender as lições que os mentores julgassem importantes para cada
um deles.
160

Quadros do Espírito Alma Suicida

Quadro 1- Alma Suicida


Data: 30/06/92

Suicidei-me há muitos anos, mas ainda hoje sofro. Fui pintor.


‘Alma Suicida’ é um quadro ‘sufocante’.
Assim eu retrato a mente antes do suicídio. A luz não penetra e a
mente, presa ao problema, não vê diante de si qualquer esperança e qualquer
possibilidade de luz.
Pintando, esforço-me para colocar a luz penetrando todos os cantos e
pontos. Se pudesse ver74 a minha tela com cores, veria o amarelo e o vermelho
combinados, refletindo sobre as árvores, e não riscos, como ficou neste papel.
É assim que eu e muitos outros temos trabalhado para arrancar
nossas impressões amarguradas: colocamos luz nos quadros e em nosso ser
para que amanhã, no plano terrestre, possamos ter muita vontade de colocar
luz em nossos passos, a fim de não cairmos novamente.

74
Durante a formação do quadro, o médium vislumbrava as cores, porém no relato para o grupo o que se
via era a folha de papel com o desenho a lápis.
161

Que nossa Mãe Maior esteja em nosso coração.


Um irmão em reeducação”

Quadro 2- Aquece-nos
Data: 07/07/92

“Aquece-nos, Senhor!
Aquece-nos para servirmos sempre, para aprendermos a amar os
nossos inimigos, tentando alcançar o coração deles.
Aquece-nos para esquecermos o gelo de outrora e perdoe-nos as
falhas do passado para vencermos o que ainda nos faz prisioneiros de
vibrações tão infelizes.
Ajude-me com o seu calor de irmão e deixe-me voltar aqui mais
algumas vezes, pois ainda preciso me melhorar.
Estou com os companheiros em tratamento que foram trazidos pela
equipe da Colônia.
Maria nos abençoe!
Alma Suicida”
162

Quadro 3- Fortalece-te
Data: 14/07/92

“Fortalece-te diante da provação que te visita.


Lembra-te sempre de tua fé em Deus e ela te guardará em paz,
mesmo na ventania ameaçadora que tomba os menos seguros, os quais
alcançam no pensamento apenas o hoje.
Sempre reflito quando desenho árvores... Quando pinto a ventania
desfolhando umas e tombando umas, penso que já fui uma delas e, então,
construo na mente as raízes fortes da fé e planto as flores do trabalho que irão
alegrar e dar sentido à vida.
Sinto-me forte e não mais uma árvore frágil que a qualquer momento
poderá ser atingida pela ventania.
Que Jesus nos ajude a sermos assim e que possamos ajudar uns aos
outros a encontrar a fé.
Fortalece-te!
Alma Suicida”

***
163

Quadro 4- Eleva-te
Data: 21/07/92

“Diante das pedras do caminho que nos dificultam a vida terrena,


aprendi que devemos ser como as plantas resistentes cravadas nas pedras,
como os cactos que resistem às tempestades sem perder a beleza, que
mesmo na noite escura mantêm a postura elevada e elegante, ostentando a
flor singela acima da folhagem. É como se a oferecesse a Deus nas alturas, na
certeza de que, mesmo longe, uma estrela brilha, espargindo a luz que o faz
majestoso...
Sejamos belos como os cactos, cujas folhas resistentes estão
direcionadas para o Alto. Ostentemos as flores singelas, mas perfumadas, com
a humildade de coração.
Deixemos que as pedras do caminho, em vez de serem tormentos
para nós, sustentem as raízes da nossa evolução na Terra.
Uma estrela brilha nas trevas para aqueles que se elevam.
Jesus seja sempre em nosso coração aprendiz.
Alma Suicida”
164

Quadro 5- Previna-te
Data: 28/07/92

““Previna-te!
Os caminhos são muitos.
As pedras da maldade nos fazem tropeçar e os espinhos das provas
difíceis nos ferem os pés. Qualquer descuido e poderemos ser levados pela
correnteza das paixões e aprisionados pelas futilidades que devoram o nosso
desejo de crescer.
Somente as ações pautadas nos preceitos ensinados por Jesus
poderão iluminar a estrada, permitindo-nos avançar com segurança, pois
certamente andaremos entre espinhos, pedras e serpentes.
Só vencerá aquele que não se esquecer do recado: previna-te.
Alma Suicida”
165

Quadro 6- Uma Luz


Data: 04/08/92

“Maria, nossa luz, nossa mãe!


A ti rendemos graças por seres a luz que do Alto nos aquece e nos
aconchega nos momentos de dor e de decepção.
A ti e à assembleia de irmãos que formam a legião do amor
verdadeiro ao próximo, agradecemos por nos socorrer e nos conduzir
ao caminho de esperança.
Obrigado também aos irmãos deste grupo.
Despeço-me profundamente grato e renovado, pois, apesar de saber
que ainda tenho que melhorar muito, estou mais equilibrado.
Parto feliz, na expectativa de um dia poder me integrar a um grupo
espírita na Terra e retribuir os benefícios que recebi.
Espero ainda rever o irmão que me permitiu a comunicação com este
plano.
Jesus e Maria abençoem vocês, hoje e sempre!
Eternamente grato,
Alma Suicida”
166

QUADROS DO ESPÍRITO MARCOS

Quadro 1- Confusão Mental


Data: 27/10/92

“Meu quadro retrata a minha mente ao ingressar na colônia de


recuperação de drogados e mostra como fiquei após conhecer a dolorosa
passagem daqueles que não souberam aproveitar a vida na Terra.
Escrevo e pinto também pela paz e esperança de um novo dia.
Estou aqui para falar da minha vida. Os momentos que irei relatar
serão de dor e alegrias.
Rogarei, em nome de Jesus, por uma juventude mais cristianizada e
por um mundo de amor para os jovens.
Retornarei na próxima semana.
Obrigado a todos.
Com Jesus em nossos corações.
Marcos”
167

Quadro 2- Uma Chuva de Bênçãos


Data: 03/11/92

“Certa noite, ainda preso à loucura do passado que para mim ainda era
presente, eu ainda pensava estar vivo. Desesperei-me. Uma falange de irmãos
se aproximou de mim e maldosamente fizeram com que eu percebesse o que
eu era na realidade: mais um que passava da vida para a morte, por meio do
abuso da liberdade que Deus havia me confiado. Por uma dose a mais de
cocaína, eu estava preso a uma situação que não sabia qual era.
O local era escuro, frio e tinha gente que gritava e gemia. Era, na
verdade, um cemitério e eu não conseguia enxergar e nem entender direito
tudo aquilo. Ao mesmo tempo em que me sentia anestesiado, sofria dores
absurdas. Não tinha a mente sob controle e não conseguia pensar.
De vez em quando, percebia que riam de mim. Não tinha qualquer
noção de tempo, nem me lembrava da família e dos amigos. Apenas sofria.
Acovardado, não podia resistir à falange que um dia me arrastou e jogou-me
em um poço de lama, onde eu não conseguia respirar. Sufocado, eu chorava.
Às vezes, a respiração voltava ao normal, mas logo me sentia sufocado
novamente. Assim fiquei não sei por quanto tempo.
168

Quando eu sentia não ser possível sair daquele poço, lembrei-me


que, certa vez, eu tinha ido à missa e olhado para a figura de Jesus crucificado.
Recordei-me, então, que, mesmo por farra, eu não tinha pintado somente as
impressões nefastas e acovardadas da filosofia materialista, pois, um dia, eu
havia retratado Jesus em uma tela que nunca fora exposta. Tentando lembrar-
me da tela, murmurei ‘Jesus’ e, então, foi como se uma chuva de bênçãos se
derramasse sobre a minha mente, ainda em confusão.
Marcos.”

Quadro 3- Era a Primeira Vez


Data: 10/11/92

“Inusitadamente, lembrava-me de situação que não era peculiar ao


meu mundo mais direto, mais tangível. A figura angelical de um homem, a qual
eu não compreendia, misteriosamente me transmitia uma sensação calmante.
Então, comecei a levantar a hipótese de ter sido ele mesmo quem me ajudara
nos momentos de escuridão.
Quanto mais eu aceitava essa possibilidade, mais e mais ia
mergulhando na ilusão gostosa de que uma luz intensa banhava minha face, e
169

que mãos me afagavam como se eu fosse uma criança. Percebi, por fim, que
não estava só; e um canto suave de mulher me fez adormecer...
Muitos dias se passaram. Eu acordava e novamente voltava a dormir,
sem nada de novo perceber à minha volta. Estava totalmente alheio a tudo o
que se passava.
Hoje sei que fui socorrido pela Legião dos Servos de Maria e que
aqueles dias de sono faziam parte do tratamento inicial de desintoxicação do
meu organismo fluídico. Desintoxicação dentro dos limites do possível, já que
alguns resíduos só poderei mesmo eliminar em novo corpo, trabalhando e
reeducando a mente.
As sessões de tratamento foram muitas até que a minha mente
finalmente despertasse e pudesse ser submetida à terapêutica dolorosa, porém
necessária: a revivescência do passado.
Relembrar era muito penoso e eu, quase sempre, caía em depressão
profunda, tendo que partir do zero novamente, até que a melhora se
consolidasse.
Aos poucos, fui me habituando aos trabalhos da Colônia Maria de
Nazaré e encontrando paz nas preces que, a princípio, eu articulava meio sem
sentido, tentando vencer o bloqueio que eu impusera a mim mesmo por ter
vivido na Terra longe de qualquer manifestação de louvor ou mesmo de súplica
ao Criador.
Marcos”
170

Quadro 4- Reconhecer-se Suicida


Data: 17/11/92

“Reconhecer-se suicida e avaliar a gravidade da situação que


criamos para nós no além-túmulo é um passo difícil de ser dado. Procuramos
fugir dessa realidade amarga, mas chega o momento em que a consciência, já
menos entorpecida, acaba anulando as próprias tentativas de fantasiar a real
situação. Encontramo-nos, enfim, com a verdade. É um instante solitário, em
que somos massacrados pelo nosso tribunal interior que nos condena pelo
grande crime.
Fragilizados pela própria condenação, somos sustentados por irmãos
bondosos que nos ajudam a seguir em frente. Entre lágrimas abundantes,
buscamos nas preces o socorro da coragem para pedirmos nova
oportunidade... É quando, então, sonhamos em ser mais dignos do corpo de
carne que outrora desprezamos.
Deparar-se com a imperiosa necessidade de reiniciar é um momento
cruel, pois, ao mesmo tempo em que o medo de falir novamente nos impele a
recuar, a consciência culpada reclama reparação. Vivemos torturados pela
angústia e somente com as aulas que recebemos é que conseguimos frear
esse duelo mental.
171

É interessante observar que nem todos os Espíritos endividados com


as Leis Divinas percebem claramente esse processo interior. Nesses casos,
por acréscimo de misericórdia, reencarnam compulsoriamente, a fim de se
reequilibrarem o suficiente para posteriormente terem condições de passar
pelos estudos que aqui realizamos.
Assim, apesar de tudo, julgo-me feliz.
Marcos”

Quadro 5- O Jesus que eu Pintei


Data: 24/11/92

“O Jesus que eu pintei tinha enormes espinhos a sulcar-lhe a fronte e


de forma equivocada conferiram à sua expressão a dor suplantando o amor.
Hoje, sinto que realmente só conheço este Jesus que aparece nas
telas que pintei por farra quando encarnado. Sou alguém que ainda hoje coloca
espinhos na fronte augusta do Senhor.
172

Em meus dias de solidão percebi que nada fiz para merecer pensar
nele como alguém de fronte serena e de olhar manso, a exemplificar-nos o
amor.
Anseio voltar à Terra e poder pintar novamente... Retratar o amor no
brilho intenso daquele olhar. Anseio desenhar os lábios que sussurravam
canções de amor que foram compreendidas apenas pelos puros de coração.
Gostaria de mostrar a face bela do Cristo sem espinhos..., mas como
fazer se ainda sou o espinho a sulcar-lhe a fronte, por não conseguir
compreender a sua sublime lição?
Rogo a Deus e a Maria que eu possa encontrar dentro de mim, neste
período de renovação a que me entrego nesta Colônia, a convicção de que,
mesmo em face das minhas arbitrariedades contra a vida, Ele somente deseja
o meu progresso e a minha felicidade.
Espero estar mais sereno a cada dia e voltar com o coração
preenchido de emoções verdadeiras, a fim de fazer da minha vida um pouco de
luz.
Quero mentalizar em cada ação e em cada gesto, a retirada dos
espinhos que plantei em minha vida anterior. Só assim verei o Cristo como
muitos de vocês: como amor e somente amor.
Marcos”

***
173

Quadro 6- O Espelho D’Alma


Data: 01/12/92

“Conseguir olhar para dentro de si é algo difícil quando se quer


realmente acreditar em uma vida melhor, sem as dores e as calamidades do
suicídio.
Surge a visão de um ser que mais parece trincadas e envelhecidas
peças de porcelana, cheias de pó e sem contornos definidos. Somos assim. A
decepção ao nos sentirmos como tal, enlouquece-nos. Precisamos suportar,
cheios de precariedades morais e corporais, uma angústia que somente se
findará com o regresso vitorioso de nova experiência vivida na carne.
O espelho reflete a verdade e nem mesmo os Espíritos bondosos que
nos socorrem conseguem desfazer a nossa triste constatação. Olhamos e
sentimos, não dá pra remediar. São os ouvidos que não ouvem bem, o cérebro
confuso que não conjectura, as mãos que não correspondem ao nosso querer
e o sentimento descontrolado que exterioriza a forma de vida anômala que
somos.
174

Quando me olho, sinto falta do brilho no olhar e da vivacidade de que


sempre fui possuidor. Vejo, então, o quanto preciso de uma nova vida. Sinto
que a razão parece surgir e que o equilíbrio domina a minha alma. Começo a
acreditar que serei capaz de enfrentar as provas e as dificuldades do
recomeço.
São tantos dias estudando e vivenciando lições que nos fortificam,
que rogamos a Jesus a oportunidade de reencarnar o mais breve possível.
Somos avisados, então, de que tudo se encontra em fase de planejamento
preliminar e interrogamo-nos se já é chegada a hora.
Passam-se os meses e percebo, a cada dia, que eles sabem muito
mais do que nós. As crises se repetem, mas não mais as que vivenciáramos na
enfermaria. Agora, são crises de determinação interior. E voltamos a cogitar a
hipótese do fracasso que poderá se suceder na nova encarnação. Nesses
momentos, a necessidade da prece se faz imperiosa, pois precisamos nos
amparar em Maria e na esperança de não mais fracassar.
Assim prosseguimos, encorajando-nos nas lições evangélicas, nas
dramatizações, nas visitas a instituições e, também, no tratamento cada vez
mais profundo para melhorar a nossa capacidade de resistências às provas.
A oportunidade do recomeço vai surgindo, cada vez mais próxima...
Marcos”
175

Quadro 7- Caminhos
Data: 08/12/92

“Chega, enfim, o grande momento! Finalmente, a bagagem mínima


está completa. É hora de partir. Seremos aceitos no departamento que
coordena o retorno à carne.
Estamos eufóricos, desejando começar o doloroso testemunho que
irá modificar a nossa indesejável condição de suicidas. Queremos estar em
condições de avançar mais em nossas conquistas eternas, mas, sem a
recapitulação necessária, ficaremos presos ao nosso desequilíbrio e devedores
perante a Lei Maior.
Após estudos, no meu caso em particular, ficou acertado que
retornarei com a arte em forma de dom natural, e que esta será despertada no
consciente tão logo seja possível que fluam minhas emoções através da
pintura. Estou muito feliz, pois nem todos da minha turma tiveram esta
permissão.
Retorno com o resgate amarrado em torno das dores físicas, muito
agravadas no estômago e no fígado; embora todo o organismo venha a ser
debilitado.
176

Terei a oportunidade de conhecer a Doutrina Espírita e sentir de perto


o Cristo que antes pintara por farra. Ele será por mim exaltado e reverenciado
em telas que aqui ficaram verdadeiramente belas do ponto de vista evangélico.
Assim me expresso, porque agora sei diferenciar o belo artístico do belo
realmente belo, ou seja, a beleza que constrói e anima o coração macerado
pela dor e que é capaz de expressar os bons sentimentos.
Dói profundamente o fato de que não terei almas caras ao meu redor.
Mas, pelo menos, contarei com o auxílio de nobres irmãos que me aceitarão
como filho e que me darão a ajuda de que tanto preciso.
Ainda jovem, serei tentado pelas viciações da carne, comuns aos
adolescentes do século em curso, e verei desaparecer aqueles que me darão a
vida. Terei que mover montanhas entre a minha consciência arraigada ao
desmando e a nova vontade, ainda débil, que precisa ser fortalecida. Poderei
encontrar apoio na Doutrina Consoladora, que se expande atualmente e que
promete ser a luz do século XXI.
Estou ao mesmo tempo emocionado e preocupado. Rogo a Jesus
que nos auxilie a cumprir os nossos resgates e me despeço deste grupo
pedindo a Maria, minha adorável benfeitora, que nos guie nesta jornada para
que possamos chegar ao termo dela sem os débitos angustiosos que
contraímos por não conhecer o Cristo que vocês já conhecem.
Muito obrigado e um grande abraço a todos!
Marcos”

***
177

O RETORNO DE ALMA SUICIDA E DE MARCOS

Para nossa surpresa, no dia 1º de março de 1998, na reunião,


recebemos uma mensagem psicografada dando-nos notícias sobre “Alma
Suicida” e de “Marcos”, que reproduzimos a seguir:
“Hoje, ‘Alma Suicida’ se encontra com quatro anos e meio na Terra e
‘Marcos’ é um belo menino de dois anos.
Reencarnaram em grupamento espírita que os educarão nas bases
da Doutrina Espírita.
Embora haja o resgate do corpo em reequilíbrio, ambos poderão ser
novamente pintores, pois muito trabalharam na Espiritualidade para estar em
condições de realizar a grande empreitada.
‘Alma Suicida’ pintará o mundo renovado em telas e consagrará
melodias ao Deus que se vê na natureza e no amor ao próximo.
‘Marcos’ buscará inspiração nas paisagens do Evangelho redivivo
para auxiliar nos estudos e conversações em torno do Cristo.
Muitos outros artistas também estão reencarnados com o objetivo de
renovar as artes; e eles, jubilosos, desejaram tomar parte deste plano de
trabalho. Outros irmãos, porém, não tiveram essa permissão, reencarnando em
grande desequilíbrio, revelando o arrependimento mal sentido, como nos cita
Joanna de Angelis75.
Assim, as obras realizadas aqui, no Plano Espiritual, começarão a
mostrar o valor da terapia artística com Jesus e o valor do amor que se
expande nas palavras, no canto, na pintura e no teatro. Por isso, ajudem
sempre na cristianização de toda forma de expressão e o mundo terá uma
atmosfera psíquica mais saudável para a renovação mental que todos
anseiam.
Nossos pupilos, durante o desprendimento físico, estão em
tratamento contínuo e lembram-se com felicidade de que foram uma espécie

75
FRANCO, Divaldo P. Autodescobrimento (uma busca interior). Pelo Espírito Joanna de Angelis. 3.ed.
Salvador: Editora Leal, 1996.
178

de ‘mola propulsora’ para a sintonia deste grupo com o trabalho de socorro a


Espíritos suicidas que hoje se realiza nesta Casa Espírita.
Confiem no grupamento de Espíritos que velam por vocês e pelo
cumprimento dos seus objetivos.
Que Maria esteja com todos.
Muita Paz,
Marthan”

***

EXIBIÇÃO E COMERCIALIZAÇÃO DE QUADROS

A psicopictografia, além da terapia a Espíritos suicidas, pode também


servir de auxílio aos encarnados. A contemplação dos quadros pode
impulsioná-los a vencer obstáculos e a vivenciar melhor o amor do Cristo.
Recomenda-se, no entanto, que nenhuma obra dessa natureza seja
comercializada. A terapia alcança seu objetivo com a simples execução da
obra. Muito do que se vê nos quadros é uma arte ainda carente de equilíbrio
em virtude das condições inerentes ao suicida. Além disso, há maior ou menor
interferência do médium. Mesmo quando se trata de Espíritos já equilibrados, a
exibição com fins comerciais, ainda assim, poderia suscitar situações
embaraçosas para o autor espiritual ou mesmo para o grupamento. Outro
aspecto a destacar é que o médium pode se desequilibrar e as suas faculdades
mediúnicas, antes destinadas ao socorro, podem acabar sucumbindo no
“estrelismo”.
Mesmo que julguemos que conosco será diferente, o desfecho
poderá ser adverso do idealizado. Por isso, a prudência deve nortear os passos
dos medianeiros do amor. “Dai de graça o que de graça recebestes”76.

76
Mateus, capítulo 10, versículo 8. Bíblia Sagrada (versão digital). Seafox/Terra Santa/James
King/Vozes, 2005.
179

QUINTA PARTE

A Atuação da Equipe Espiritual nas Reuniões de Atendimento a


Espíritos Suicidas

Destacamos este assunto em separado por considerá-lo de extrema


relevância àqueles que se disponham ao trabalho com os desventurados
suicidas. Isso porque, além de elucidar sobre como se processa o auxílio no
plano imaterial, ressalta o zelo que a Equipe Espiritual dispensa ao grupo de
medianeiros.
Com o objetivo de manter a fidedignidade dos esclarecimentos
prestados pela Equipe Técnica Espiritual, estes foram transcritos na íntegra e,
por questões meramente didáticas, os organizamos em itens.

SELEÇÃO DOS ESPÍRITOS QUE SERÃO ATENDIDOS

“Inicialmente, é feita a seleção dos Espíritos que serão atendidos, os


quais podem estar entre os internos nos hospitais da Espiritualidade ou entre
aqueles que ainda não foram resgatados.
Muitos clamam nos vales sombrios de regiões inferiores, e parentes
intercedem por eles, solicitando auxílio... No entanto, depende imensamente do
próprio Espírito ser auxiliado. Mas não é só isso. É também necessário que
haja grupamentos dispostos a socorrê-los.
Na Colônia, inúmeros procedimentos socorristas são levados a efeito,
com resultados bastante satisfatórios. Mas, em razão do grau de materialidade
em que se encontram esses espíritos, o auxílio de grupos encarnados é
fundamental, pois possibilitará a eles o contato com as energias anímicas
necessárias ao seu despertamento...”
180

PREPARAÇÃO PARA O ATENDIMENTO

“Após a seleção dos Espíritos que serão socorridos, a Equipe


responsável anota tudo o que deve ser realizado para o sucesso do
atendimento.
Depois que os médiuns psicofônicos aceitam socorrer os Espíritos,
inicia-se a preparação do atendimento. A equipe espiritual inicia os
preparativos necessários para o intercâmbio mediúnico.
Dias antes da reunião, é feita a limpeza orgânica dos componentes
do grupo, sendo que os médiuns psicofônicos recebem uma atenção especial,
pelo fato de que terão uma ligação mais direta com os Espíritos suicidas. No
dia da reunião, porém, tal limpeza é renovada.”

A LIGAÇÃO DO ESPÍRITO COM O MÉDIUM

“No dia da reunião de socorro, quando a ligação do Espírito com o


médium é efetivada, a Equipe Espiritual permanece atenta, a fim de evitar que
qualquer influenciação do Espírito possa causar algum dano ao médium.
Geralmente, a ligação do Espírito é feita com certa antecedência,
embora, algumas vezes, aconteça nas últimas horas, de acordo com o
planejamento espiritual.
Sentinelas e enfermeiros são colocados a postos nos lares dos
médiuns, a fim de garantir o desenvolvimento dos planos traçados para a
reunião vindoura.”

PREPARAÇÃO DO AMBIENTE

“No momento da realização da reunião, uma grande guarda fica a


postos e, no caso deste grupamento, um coral Infantojuvenil da espiritualidade
faz a sustentação do ambiente espiritual. Por que os jovens? Porque amam
com a pureza da alma e, geralmente, são os que mais se sentem felizes em
ajudar esses irmãos.
181

Com o objetivo de estudar as mais variadas vertentes da reunião de


socorro, uma numerosa plateia de irmãos desencarnados comparece sob a
supervisão da Equipe Espiritual.
A equipe de trabalhadores da Colônia é imensa e divide-se em muitas
frentes de trabalho para atender desde os mínimos cuidados necessários à
segurança dos médiuns até os recursos mais sofisticados para o socorro dos
Espíritos e a reposição de fluidos para os integrantes da reunião.
Um grande telão é preparado para a projeção de imagens
necessárias ao trabalho de esclarecimento. A equipagem usada no decorrer de
toda a reunião é impossível de ser descrita, tendo em vista os inúmeros
detalhes.”

PROVIDÊNCIAS QUANDO OS COMPONENTES DO GRUPO ENCARNADO ADENTRAM A


SALA MEDIÚNICA

“Quando o grupo adentra a sala, primeiramente a equipe trabalha os


médiuns de sustentação77, por serem eles o sustentáculo da reunião, cujas
luzes78 não poderão se apagar, sob pena de prejudicar a realização do
trabalho.
No entanto, inicialmente, com exceção dos médiuns psicofônicos, os
demais também atuam como sustentadores, doando fluidos.
Após a acomodação do grupo, antes que a reunião propriamente dita
tenha início, a equipe espiritual efetua uma série de procedimentos:
1. O supervisor espiritual do trabalho posiciona-se junto do
coordenador da reunião no plano material. Sua mente liga-se à do coordenador
encarnado por tênues fios que fazem parte de uma equipagem que irá garantir
o funcionamento perfeito de tudo.
2. Fios canalizadores de energia fazem a ligação dos integrantes do
grupamento. O poder de canalização de energia desses fios é imenso.

77
Nomenclatura explicada na Introdução, no item “O Grupo Mediúnico”.
78
Luzes, termo usado no sentido de vibrações.
182

3. Durante a leitura de um texto edificante, são acionadas câmaras que


funcionam como uma espécie de exaustores do ambiente, para a retirada de
energias deletérias ali desprendidas pelos Espíritos enfermos.
4. Inicia-se também a modulação de uma cor especial para a noite, que
varia do vermelho ao amarelo-sol, de acordo com a necessidade dos Espíritos
atendidos.
5. O grupo torna-se único depois que todos os membros estão ligados.”

DINÂMICA DA REUNIÃO DE ATENDIMENTO

“Os sustentadores iniciam a doação de energias, mentalizando


quadros de auxílio e doação. Um coletor de vibrações é acionado, antes que a
primeira comunicação tenha início. Trata-se de um suprimento que será usado,
ao final do trabalho, para a reposição de energias.
Em seguida, o atendimento é iniciado ligando-se um dos Espíritos a
ser socorrido a um dos médiuns. O dispêndio de energia é violento, mas com a
sustentação funcionando, tudo acontece como em uma simbiose: energia
gasta, energia reposta. E isso, não apenas para o médium, mas também para o
Espírito comunicante. Todos os fluidos direcionados aos atendimentos
socorristas passam por tênue filtro, onde são armazenadas apenas as boas
vibrações. Para a alegria da Equipe Espiritual, quase tudo que vem do grupo
de auxílio é recolhido.
No momento da atuação da psicografia, um círculo energético
protege o médium psicógrafo de vibrações enfermiças provenientes da clientela
espiritual em desequilíbrio.
A mente do coordenador encarnado, por estar ligada à do supervisor
espiritual, emite energias vigorosas, mantendo a corrente vibratória da reunião
em níveis elevados.
Assim, ao sentir qualquer oscilação, ondulações energéticas
estabilizadoras são disparadas, e essas vibrações, à semelhança de ordens,
são acatadas docemente pelos médiuns.
Quanto à doutrinação, as palavras impregnadas de intenso
magnetismo concitam a sustentação à formação de quadros. (...) Quando a
183

comunicação é finalizada, o Espírito que foi atendido adormece, recebendo os


fluidos que foram armazenados no coletor, no início da reunião. Assim ocorre
com as demais comunicações.”

TÉRMINO DA REUNIÃO DE ATENDIMENTO

“Quando se aproxima o término da reunião, a equipe espiritual


começa a harmonizar o grupo para a finalização das atividades.
A luz quase incandescente do início começa a mudar, pois é chegada
a hora de repousar e receber o agradecimento da Colônia Maria de Nazaré.
Luzes safíricas começam, então, a descer do Alto, desfazendo as impressões
deletérias e trazendo paz a todos.
Hosanas são cantadas! As emanações melodiosas do coro
infantojuvenil envolvem o grupo, despertando em todos o júbilo pelo trabalho
realizado.
Aos poucos, os fios vão se dispersando e, como uma luz que se
apaga, a atividade vai sendo finalizada. A Equipe Espiritual verifica se tudo está
em ordem. Os fios que se ligam ao coordenador encarnado são os últimos a
ser desligados.
Ao findar-se tudo, os Servos da Legião de Maria acompanham os
membros do grupo aos seus lares, ministrando neles, durante o sono físico, a
fluidoterapia adequada às necessidades de cada médium.”

***

Depois de tudo o que nos foi revelado acerca da metodologia usada


pela Equipe Espiritual para a realização da reunião, ficou patente a
minuciosidade com que a atividade é preparada e que sua grandiosidade
dispensaria quaisquer outros comentários de nossa parte.
Entretanto, não poderíamos deixar de registrar o fato de que os
médiuns psicofônicos e psicógrafos só eram utilizados para o intercâmbio
mediúnico se realmente estivessem em condições físicas e psicológicas para
tal. Inúmeras vezes, por estarem debilitados em função de problemas
184

orgânicos ou vivendo momentos de grande abalo emocional em suas vidas


pessoais, eles foram poupados.
Dada a condição de suicidas dos irmãos socorridos, os atendimentos
eram sempre difíceis e os médiuns sentiam em si mesmos toda a angústia, o
tormento e o desespero dos Espíritos comunicantes. Mas, depois que as
atividades eram concluídas, nenhuma daquelas impressões ficava em sua
constituição físico-espiritual.
Se, por algum tempo, os médiuns permaneciam com qualquer
sentimento de tristeza, tal circunstância não era resquício de vibrações
deletérias deixadas pelos desventurados Espíritos. Era simplesmente fruto do
amor fraternal que os medianeiros passavam a nutrir por aqueles, o que os
faziam se sentir copartícipes dos seus infortúnios.
Piedosamente, catalogavam os desditosos suicidas entre os
beneficiários de suas preces, estabelecendo-se, dessa forma, uma ligação que
transcendia os planos do “dever cumprido”.

***
185

SEXTA PARTE

CONSIDERAÇÕES FINAIS

URGÊNCIA DA FORMAÇÃO DE NOVOS GRUPOS DE


ATENDIMENTO A ESPÍRITOS SUICIDAS

Grande multidão sucumbe hoje e o avançar das provações surtirá


em muitos Espíritos o efeito de golpe cruel; e aqueles mais
fracos, que ainda não compreenderam o verdadeiro sentido da
vida voltarão pelas portas do suicídio.
Quem socorrerá essa multidão? É a pergunta que
deixaremos no ar. Precisamos de mãos amigas, de corações
sinceros para serem instrumentos de auxílio. Por isso,
simplesmente não implementamos um trabalho, mas criamos
condições para propagá-lo − Espírito Paulo79.

Pontos a Serem Considerados para a Formação de Grupos de


Atendimento a Espíritos Suicidas

Além das diretrizes contidas em outros livros espíritas para formação


de grupos mediúnicos, embasadas nas obras da codificação da Doutrina
Espírita, entre elas O Livro dos Médiuns, de Allan Kardec, e complementadas
com mais detalhes nos livros Desobsessão, do Espírito André Luiz, Diálogo
com as Sombras, de Hermínio C. de Miranda e outros citados nas sugestões
de leitura, recomendamos iniciar a formação do grupo com reuniões de estudo
sobre a temática do suicídio. Em especial, que se faça uma exploração
detalhada do livro Memórias de um suicida, de Yvonne A. Pereira.
Após estudo da temática básica − período necessário para que se
tenha certeza da afinidade com o trabalho −, começar a dividir o tempo da
reunião entre estudo e preces/vibrações pelos Espíritos suicidas.

79
Coordenador Espiritual da Reunião de Atendimento aos Suicidas do Centro Espírita Maria Madalena
(Cema), Planaltina-DF.
186

Dar início às comunicações com os Espíritos suicidas somente após


um estudo satisfatório da temática e quando o grupo estiver consciente das
responsabilidades assumidas, bem como ter passado pela fase de
sensibilização que as preces/vibrações proporcionam.
Evitar grupamentos formados por número excessivo de médiuns, o
que, além de dificultar a harmonização, poderá comprometer o atendimento
dos Espíritos comunicantes.
Cultivar o hábito da prece pelos suicidas em outros dias da semana
para favorecer o auxílio possível, em uma demonstração de fraternidade e
solidariedade perante a dor dos que sofrem, sejam encarnados ou
desencarnados.
O suicida é, geralmente, aquele que desacreditou na solidariedade
humana e no respeito que se deve ter à dor alheia. Portanto, esforçar-se para
vencer obstáculos e dificuldades/provações, ajudando os demais componentes
do grupo a fazer o mesmo. Trata-se de conquistar autoridade moral para
suscitar nos Espíritos suicidas a coragem para recomeçar e a esperança para
vencer as provações, numa demonstração inequívoca de que na Terra não há
somente desamor e egoísmo.
Avaliar os próprios conceitos, preconceitos e julgamentos
precipitados, ampliando, assim, a visão de certo e errado, na certeza de que
Deus conhece nossas limitações. Por isso, não nos cabe julgar, apenas
amparar e amar, conscientes de que, no caminho onde se enfileiram as
reencarnações, cada um, a seu turno, será capaz de transformar as trevas em
luz.
Admitir no grupamento somente pessoas que se sintam voluntárias,
sem qualquer constrangimento para participação. No entanto, aos voluntários
do serviço, são requeridos disciplina e compromisso.
Estar ciente de que para integrar um grupamento de auxílio, mesmo
sendo delicada a ligação de Espíritos suicidas aos medianeiros, não é
necessário que estes tenham uma saúde perfeita ou que estejam livres de
problemas ou dramas de ordem psicológica ou espiritual, desde que estas
últimas não sejam de caráter grave.
187

Ter fé em Deus e confiar nos Espíritos que coordenam as atividades


mediúnicas de reuniões sérias e compromissadas com a caridade espiritual.
Finalmente, não temer a influenciação de Espíritos ou atribuir à
prática mediúnica problemas de saúde ou da vida cotidiana, pois os Espíritos
coordenadores nos afirmam que, conforme os ensinamentos de Jesus, quanto
mais se doa, mais se recebe. Alertam-nos, ainda, que o exercício constante do
amor ao próximo poderá amenizar as nossas provações, ou mesmo modificá-
las, em função do aprendizado conquistado.

DETALHAMENTO DAS HISTÓRIAS

Qual é a relevância de se conhecer a fundo a história de cada irmão


que é socorrido na reunião mediúnica de atendimento a espíritos suicidas?
Um irmão com crise respiratória comparece à reunião mediúnica
gesticulando desesperadamente e tentando retirar algo que lhe estrangula o
pescoço. O médium reflete a aflição repetidamente e o quadro parece
interminável.
Diante de tamanho desespero, identificamos se tratar de mais um
Espírito preso ao clichê mental do suicídio, sem, no entanto, conhecermos a
sua identidade − e isso se aplica ao sexo, idade, nacionalidade, etc. −, a
motivação para o ato equivocado e a época em que foi praticado. Mas temos
plena consciência de que nos cabe envolvê-lo com carinho, auxiliando-o a
despertar para a realidade sinistra e a ensaiar os primeiros passos a caminho
da reabilitação.
E mais:
Os motivos para o suicídio estariam calcados em uma desventura
amorosa?
Teria sucumbido diante de um revés financeiro?
Sofreria de uma enfermidade grave, talvez incurável, padecendo de
dores atrozes?
Em que condições espirituais estaria no momento do suicídio?
Estaria sobre o efeito de drogas?
Premeditou o ato ou não?
188

Teria recebido orientação religiosa na infância?


Teria tido uma família acolhedora na adolescência?
Seria membro de alguma seita que prega o suicídio como meio de se
chegar ao paraíso?

Diversas são as indagações que poderiam nos causar inquietação,


impulsionando-nos a fazê-las aos Coordenadores Espirituais! Mas o
atendimento se encerra com um grito de dor e com a voz entrecortada por
soluços: “Eu morri, meu Deus, que loucura. E agora...” A seguir, um choro
convulso e nenhuma palavra a mais.
O Espírito comunicante é induzido ao sono reparador pela doutrinação,
auxiliada pela sustentação. O trabalho inicial estava feito. A barreira criada pelo
Espírito para admitir o suicídio fora vencida...
No plano imaterial, socorristas benevolentes recolhiam a um hospital da
espiritualidade mais um náufrago para receber os primeiros cuidados
terapêuticos.
Para nós, da equipe encarnada, apenas uma certeza: a de que o
Espírito suicida saíra da agonia de reviver “eternamente” os momentos
anteriores ao suicídio, sem nunca concretizá-lo.
Logo após lágrimas de agradecimento a Maria de Nazaré por nos
permitir integrar a equipe de socorro.
Em seguida ao passe de dispersão dos fluidos do comunicante sobre o
médium, nossas atenções se voltavam para outro medianeiro, por intermédio
do qual se daria mais um atendimento.
O Espírito começa a sua comunicação e o grupo se une em prece para
mais um socorro.
O comunicante ainda estaria preso a um clichê mental?
Seria um homicida e suicida?
Estaria consciente da condição de suicida?
Estaria relutante diante do socorro ofertado?
189

As respostas a estas questões não eram importantes, pois nos cabia tão
somente agir em consonância com os preceitos de Jesus. Sempre que
necessário, a Espiritualidade responsável pelos atendimentos nos orientava,
fosse via intuição ou por meio da psicofonia e/ou da psicografia.
Ainda hoje, assim tem sido a rotina das reuniões mediúnicas do nosso
grupo. Em alguns momentos, temos a clareza dos quadros espirituais,
chegando a conhecer pormenores da história do Espírito. Em outros, temos
notícias da adaptação desses irmãos na Pátria Maior e, em algumas ocasiões,
posteriormente, eles são novamente levados às nossas reuniões. Entretanto,
na maioria dos casos atendidos, apenas alguns fragmentos da realidade
daqueles irmãos nos são permitidos entrever, dando-nos a certeza de que
fomos instrumentos de auxílio.
Tendo em vista a pequena quantidade de médiuns que se permite abrir
o coração para a comunicação de um suicida80, as reuniões com este fim serão
marcadas pelo aproveitamento máximo do tempo, com exclusão de
detalhamentos desnecessários ao socorro.
Durante os anos em que fomos chamados a coletar dados e histórias
para compor esta obra, grande parte do tempo das nossas reuniões era
preenchida pela palavra dos coordenadores espirituais, que traziam
detalhamentos dos casos atendidos e as formas de intervenção, bem como
abriam espaço para perguntas e solicitação de orientações diversas.
Findo aquele período, o maior tempo da reunião passou a ser utilizado
para as intervenções socorristas, e as comunicações de orientação se
restringiram aos casos que fugiam ao nosso entendimento.
Julgamos relevante esse comentário, a fim de que aqueles que
abraçarem essa tarefa compreendam o quanto é limitado o nosso
conhecimento acerca da história de cada Espírito; e que, longe de ser um
entrave à realização da tarefa, tal fato é mais um motivo para reconhecermos o
respeito da Espiritualidade diante da dor alheia, auxiliando com sigilo e
discrição e preservando a identidade dos Espíritos socorridos; e, ao mesmo
tempo, ensinando-nos que é preciso perguntar menos e servir mais.
190

Enfatizamos, porém, que, quando o socorro exige o prévio


esclarecimento do caso, os coordenadores espirituais nos fornecem as
informações imprescindíveis; que os casos relatados nesse trabalho foram
apresentados ao nosso grupamento com a ampliação gradativa do grau de
complexidade relativo a cada um. Portanto, somente quando estávamos em
condições espirituais, orgânicas e de esclarecimento sobre as formas de
intervenção favoráveis é que tais atendimentos foram autorizados pelo Plano
Maior.

***

80
PEREIRA, Yvonne A. Memórias de um suicida. 16.ed. Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira,
191

SÉTIMA PARTE

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

1. CASTRO, Almerindo Martins. O Martírio dos Suicidas. 12ª ed. Rio de


Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 1991, 209 p.

2. XAVIER, Francisco Cândido. Libertação. Pelo Espírito André Luiz. 13ª ed.
Rio de Janeiro: Federação Espírita do Brasil, 1987, 264 p.

3. XAVIER, Francisco Cândido; VIEIRA, Waldo. Desobsessão. 14ª ed. Rio de


Janeiro: Federação Espírita do Brasil, 1993, 248 p.

4. XAVIER, Francisco Cândido; VIEIRA, Waldo. Mecanismos da Mediunidade.


1ª ed. Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 1987, 188 p.

5. XAVIER, Francisco Cândido. Os Mensageiros. 17ª ed. Rio de Janeiro:


Federação Espírita Brasileira, 1984, 268 p.

6. MIRANDA, Hermínio C. Diálogo com as Sombras: teoria e prática da


Doutrinação. 7ª ed. Rio de Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 1993, 289
p.

7. PERALVA, Martins. Estudando a Mediunidade. 17ª ed. Rio de Janeiro:


Federação Espírita Brasileira, 1994, 232 p.

8. PERALVA, Martins. O Pensamento de Emmanuel. 5ª ed. Rio de Janeiro:


Federação Espírita Brasileira, 1994, 240 p.

1991, p. 138-141.
192

9. PEREIRA, Yvonne A. Memórias de um Suicida. 16ª ed. Rio de Janeiro:


Federação Espírita Brasileira, 1991, 568 p.

10. KARDEC, Allan. O Céu e o Inferno. 30ª ed. Rio de Janeiro: Federação
Espírita Brasileira, 1993, 425 p.
11. KARDEC, Allan. O Evangelho Segundo o Espiritismo. 91ª ed., Rio de
Janeiro: Federação Espírita Brasileira, 1985, 456 p.

12. KARDEC, Allan. O Livro dos Médiuns. 23ª ed. São Paulo: IDE, 1992, 464 p.

13. KARDEC, Allan. O Livro dos Espíritos, 76ª ed., 1995, 494 p.

14. KÜHL, Eurípedes. Sexo: Sublime Tesouro. 1ª ed. Belo Horizonte: Editora
Espírita Cristã Fonte Viva, 1992,185 p.

15. BARCELOS, Walter. Sexo e Evolução. 2ª ed. Belo Horizonte: Editora


Espírita Cristã Fone Viva, 1993, 287 p.

16. Bíblia Sagrada (versão digital). Seafox/Terra Santa/James King/Vozes,


2005.

16. SAINT EXUPÉRY, Antonie. O Pequeno Príncipe. São Paulo: Círculo do


Livro, 1944, 96 p.

17. FRANCO, Divaldo P. Autodescobrimento: uma busca interior. Pelo Espírito


Joanna de Angelis. 3ª ed. Salvador: Editora Leal, 1996, 171 p.

18. FERREIRA, Aurélio B. de Holanda. Novo Dicionário Aurélio da Língua


Portuguesa:. 2ª ed. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1986, 1828 p.

19. DENIS, Leon. O Espiritismo na Arte. 2ª ed. Rio de Janeiro: Publicações


Lachâtre, 1994, 111 p.
193

20. JACINTHO, Roque. Doutrinação. 11ª ed. São Paulo: Editora Luz no Lar,
128 p.

21. RUFINO, Maria Helena de O. Arte-Cura na Pintura Mediúnica. 1ª ed.


Brasília: Petry Gráfica e Editora Ltda., 1999, 253 p.
194

SUGESTÕES BIBLIOGRÁFICAS PARA LEITURA

1. DIAS, Maria Luiza. Suicídio, Testemunhos do Adeus. São Paulo:


Brasiliense, 1991.
2. DURKHEIM, Émile. O Suicídio: um Estudo Sociológico. .... ed. Rio de
Janeiro: Zahar, 1982.
3. JAMISON, Kay Redfield. Quando a Noite Cai – Entendendo o Suicídio. ed.
Rio de Janeiro: Gryphus, 2002.
4. ROOSEVELT M. S. Cassorla. O que é o Suicídio. 4ª ed. São Paulo:
Brasiliense, 1985, 1985, 101 p.
5. ____. Do Suicídio – Estudos Brasileiros. Campinas: Papirus, 1998, 234 p.
6. OMS. Relatório sobre a Saúde no Mundo, 2001. Disponível em
“http://www.psiqueweb.med.br/acad/oms1.html”
195

(contracapa)

Os Tutelados de Maria – Reuniões de Atendimento a Suicidas - traz o


relato de algumas possibilidades de auxílio a suicidas no âmbito das reuniões
mediúnicas, oferecendo àqueles que se dispuserem ao labor com esses
desventurados irmãos, subsídios que servirão de apoio à execução de tão
nobre tarefa.

“Grande multidão sucumbe hoje e, então, com o avançar das


provações, (...) aqueles mais fracos voltarão pelas portas do suicídio. Quem
socorrerá essa multidão? Precisamos de mãos amigas, de corações sinceros
para serem instrumentos.” (Espírito Paulo)

A charrua está pronta. Vasto é o campo a ser arado...

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