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O INSTITUTO DE COIMBRA E A ASTROFISICA SOLAR NO OBSERVATORIO ASTRONOMICO DA UNIVERSIDADE DE COIMBRA Anténio José E Leonardo, Décio R. Martins, Carlos Fiolhais Departamento de Fisica e Centro de Fisica Computacional Faculdade de Ciéncias e Tecnologia da Universidade de Coimbra E-mails: jleonardo@iol.pt; decio@pollux.fis.uc.pt ; tcarlos@teor.fis.uc.pt Palavras Chave: Astrofisica, Sol, Costa Lobo, Instituto de Coimbra, Observatorio Astronémico da Universidade de Coimbra, espectroheliégrafo. INTRODUCAO Em 1925 foi criada no Observatério Astronémico da Universidade de Coimbra (UC) uma seceo dedicada & astrofisica e, em particular, a0 estudo dos fenémenos cromosféricos solares. O grande objec tivo era obter informacio que determinasse os efeitos desses fendmenos no nosso planeta, em particu- lar no campo magnético terrestre e nas condicdes meteorolégicas. Esta 4rea de investigacio tornou-se possivel gracas 3 instala¢io de um espectroheliégrafo, instrumento que permite obter imagens mono- cromiticas da cromosfera solar. © novo aparelho, similar ao que estava instalado no Observatério de ‘Meudon (Paris), permitin a troca de observagGes entre os dois observatérios. As pesquisas em Coimbra ¢ Meudon integraram uma campanha mundial de monitorizagio dos fenémenos solares. A existéncia em Coimbra de uma sociedade académica denominada “Instituto de Coimbra” foi um factor que tera facilitado este projecto, tendo sido publicados varios artigos na revista O Instituto, daquela instituicao, que descreveram os novos aparelhos instalados em Coimbra ¢ apresentaram alguns dos resultados ob- tidos. Todos 0s cientistas envolvidos neste projgcto, inclusivamente alguns estrangeiros, foram, s6cios deste institute. HISTORIA DAS CIENCIAS £ DAS TECNICAS EM PORTUGALENO BRASIL | 461 ‘Tal desenvolvimento da astrofisica em Portugal teve como principal mentor Francisco Miranda da Costa Lobo, professor de Astronomia da Faculdade de Matemitica da UC, Director do Observatorio de Coimbra ¢ Presidente do Instituto de Coimbra (IC). Para 0 bom éxito deste projecto Costa Lobo contou com 0 apoio decisivo de Henri Deslandres, Director do Observatério de Meudon, ¢ de Lucien D’Azambuja, assistente deste. Descrevem-se aqui, em linhas gerais, os esforcos de instalagio do espectroheliégrafo ¢ os principais resultados cientificos obtidos com esse instrumento, tal como pode ser concluido a partir da leitura de varios artigos sobre o assunto na revista O Instituto. DISCUSSAO Em 1907, durante uma viagem cientfica que efectuou aos mais importantes observatérios astronémicos ceuropeus, Francisco Costa Lobo encontrou-se com Henri Deslandres, Director do Observatério de Meudon, perto de Paris. Este contacto convenceu-o da importincia da frea entiio emergente da astrofisica solar, nome- adamente depois do apelo astrfisico do noxte-americano George Hale para que houvesse uma cooperagio mundial na monitorizago das manchas solares. Portugal apresentava grandes vantagens, em relacio a outros paises europeus, devido & sua alargada exposigio solar © espectrohelidgrafo era considerado um instrumento essencial para estudo do Sol ¢ © que se situava em Meudon, em fancionamento desde 1908, era um dos mais avangados a nivel mundial, seu fimcio~ namento baseava-se na captagio de uma imagem fixa do Sol com um celéstato. A imagem era entio pro- Jjectada de uma objectiva para uma primeira fends ¢, apés atravessar um sistema dispersivo composto por uum conjunto de prismas,a selecgio do comprimento de onda desejado era feita por uma segunda fenda. Através do movimento em sincronia de varias partes do sistema, por ac¢io de dois motores que controlavamn a posigdo da objectiva e da segunda fenda, era possivel obter numa chapa fotogrifica, uma imagem mono- cromitica do Sol, designada de espectroheliograma.' A seleccio do comprimento de onda de riscas espec- trais emitidas pela cromosfera solar permitia revelar pormenores da sua estrutura, colocando em evidéncia as manchas solares, as regides faculares, os filamentos e protuberincias, formas caracteristicas visiveis nesta camada solar. A utilizago de uma maior abertura da fenda fornecia uma imagem do Sol dividida em fatias, cada uma delas contendo uma parte do espectzo.A andlise destes espectros permitia, com base no efeito de Doppler, determinar a velocidade do movimento de varias partes da cromosfera. ‘Al Guerra Mundial atrasou 0 projecto, impedindo a chegada a Coimbra dos componentes compra dos no estrangeiro a varios fabricantes especializados. No entanto, o interesse por este novo ramo da fisica solar jé existia em Coimbra, 0 que se pode comprovar por um estudo do clima de Coimbra de 1866 a 1916, publicado em 1922, da autoria de Anselmo Ferraz de Carvalho, que era entio Director do Obser~ vat6tio Meteorol6gico e Magnético da Universidade de Coimbra e que viria a suceder a Costa Lobo em 1945 na presidéncia do IC. Neste trabalho foram compiladas todas as observagGes realizadas no referido observatério meteorolégico ¢ magnético, que inclufam os registos relatives a temperatura, humidade, chuvas ¢ respectivo tratamento estatistico. Um dos capitulos foi reservado & comparagio entre a tempe~ ratura do ar e outros fenémenos meteorolégicos com o niimero de manchas solares € irradiagio solar. Ferraz de Carvalho concluiu, com base nos nimeros de manchas solares recolhidos por Alfred Wolfer, ‘compensados segundo as tabelas publicadas até 1914 na Monthly Weather Review, que nio se confirmava a ideia segundo a qual a um acréscimo das manchas solares correspondia uma diminuigio da temperatura, Neste estudo do clima conimbricense no se reconheceu, claraménte, uma dependéncia imediata entre as variagdes da temperatura ¢ © néimero de manchas. Nao era também evidente uma dependéncia das variagdes das chuvas com as manchas solares, apesar de, geralmente, ocorrer um mfnimo de chuvas com um maximo de manchas? Apenas em 1925 foi inaugurado 0 espectroheliégraf instalado num pavilhéo na “Cumeada”, proximo do Observatorio Meteorolégico ¢ Magnético, e obtidés os primeiros heliogramas solares. As dificuldades 462 | SECAO2 \éenicas que envolveram o proceso de insalacio tinham exigido que Gumersindo Sarmento de Costa Lobo, lho de Francisco Costa Lobo, se tivese deslocaclo a Meudon pot sua prépria conta, em 1923, para realizar tim estigio junto de Deslandes e do seu asstente Lucien D’ Azambuyja (um luso-descendente). D'Azambuja, comisionado pelo governo fancés, deslocou-se a Coimbra, em 1925, para realizar os tltimossjstes do noe equipamento de modo a providenciar a preciso requerida: a informagdo a obter em Coimbra. © aparelho instalado em Coimbra, praticamente igual a0 de Meudon, estava 20 nivel dos melhores do mundo, equiparando-se a0 do Observatorio de Mount Wilson, sendo melhorado em paralelo com as inovagSes estando ainda hoje operacional A importincia do novo pélo de investigagio astofisica solar em Coimbra motivou varias referencias elogiosas por parte de muitos des mais “importantes observatérios europeus ¢ motivou a visita a Coimbra do inglés Sir Frank Dyson, entio disectos do Observatério de Greenwich, em 26 de Novembro de 1931. Dyson participou na comemoracio Promo- vida pela Faculdade de Cincias da Universidade de Coimbra e pelo IC em honra de Isaac Newton ® O sucesso da criaglo da Secgio de Astrofisica do Observatério Astronémico deveu-se i rede de con ‘actos internacionais de Costa Lobo, em particular & sua participagio em numerosos congressos como jiissentants do IC, da UC © do governo portugues. © IC, sociedade académica fandada em 1852 que integrou como sécios virias individvalidades académicas portwguesas,além de individualidades estas sis como os jé referidos Frank Dyson, Henri Delandies ¢ Lucien D*Azambuja, era composto por ués classes, estando a segunda, dedicada 4s Cigncias Fisico-Mateméticas, matemiticas, ciéncias isicas e cigncias médicas. Os sécios do IC partici Gusio de artigos e da organizagio e participacio em conferéncias.’A revista do IC, O lnstinto ~via Cenifica¢ literiia, publicada desde sua fundagio até 1981 e, por isso,a mais antiga publicagao deste género ‘em Portugal, contém muitos artigos que descrevem, em pormenor, a investigagao realizada na Sec¢io de Astrofisica, incluindo tanto a metodologia como os principais resultados obtidos, dividida em trés secgdes: ciéncias ipavam activamente através da pro~ Tlustragio 1: Placa existente na éltima sede do te edificio tem a sua sede a mais antiga revista 1C,na Rua da ha em Coimbra, onde se pode lers“"Nes- literétia do pats, O Instituto, A obtengio dos fundos necessirios para a aquisicfo do espectrohelidgrafo pode ter que ver com 0 facto de virias personalidades da elite politica da 6poca fazerem parte do IC, algumas das guais, como Bermardino Machado (que ocupou o cargo de primeiro.ministro de Presidente da Repiblica em css ocasides) ¢ Afonso Costa (ministre primeiro-ministo de diversos governos), terem desempenhado pa Dis relevantes nesta academia (Bernardino Machado foi piesidente do IC ¢ Afonso Costa foi seeseteio de IC coordenou a comissio de redaceio da revista O Insitute). © proprio Francisco Costa Lobo reve. tim pasado interventivo na politica, embora com menor visibilidade desde a revolugio que implantoa a repiiblica em Portugal em 1910. Os resultados obsidos na Secrio de Astrofsica motivaram varias comunicages da autoria de-Francis- 0 ¢ Gumersindo Costa Lobo em Congressos ch Unio Astronémica Internacional de 1928, 1932, 1935 © 1998. Gumersindo Sarmento de Costa Lobo, filo de Francisco Costa Lobo, para além de ter participa HISTORIA DAS CIENCIAS £ DAS TECNICAS EM PORTUGAL E NO BRASIL 1 463 do activamente na instalagio do espectroheliégrafo, foi também protagonista da investigagZo subsequente ‘em astrofisica solar,* tendo regressado varias vezes a Meudon para aperfeicoar a sua formagio. Tlustragio 2: Primeizo heliograma obtido a 12 de Abril de 1925 (Lobo, Les nouveaux instruments spectrographiques, p. 136) Os resultados na area da astrofisica solar obtidos em Coimbra, entre 1929 e 1944, foram publicados nos Anais do Observatirio Astrondmico da UC — Fendmenos solares. Os espectroheliogramas foram também partilhados com Meudon, cuja edigéo de mapas sinépticos do Sol, que davam uma visio geral da activi- dade solar, estava a cargo de Lucien D’Azambuja. Os dados provenientes de Coimbra permitiam colmatar lacunas nas observagdes deste Observatorio, sendo posteriormente enviados para Zurique, na Suica, a fim de integratem o Bulletin for character figures of solar phenomena, uma publicagio da Uniio Astronémi- ca Internacional que, a partir de 1928, recolhia observagdes solares de varios observatérios mundiais. A publicagio dos Anis, iniciada em 1930, gerou virias apreciacdes favoriveis na comunidade cientifica internacional da Area, tendo sido votada por aclamagao, na Assembleia~Geral da Unido Astronémica Internacional de 1932, uma conclusio proveniente da Comisio de Fisica Solar onde se reconhecia expressamente a importincia do trabalho realizado em Coimbra, apés andlise das publicagSes respeitan- tes & actividade solar. Na sessio de 27 de Junho de 1932 da Academia de Ciéncias de Paris, Deslandres, apresentou o primeiro volume dos Anais, tendo o registo desta comunicasao sido publicado nos Comptes Rencdus desta academia? Os resultados publicados nos Ancis inclufram sempre dados meteorol6gicos e magnéticos fornecidos pelo Instituto Geofisico da Universidade de Coimbra (designacio adoptada pelo Observatério Meteoro- Jégico e Magnético a partir de 1925) e dados atmosféricos provenientes da Direccio de Servigos de TSF do Ministério da Marinha, que poderiam ser comparados com os dados dos fenémenos solares."" Para além do espetrohelidgrafo, a Secgio de Astrofisica do Observatério Astronémico de Coimbra possuia também um foto-helidgrafo, adquirido em 1871, ¢ um espectrégrafo estelar, adquirido em 1923. Diariamente, a partir de 1926 e desde que as condigdes meteorologicas 0 permitissem, eram capta- das duas imagens da cromosfera solar, uma relativa a risca espectral K, e outa com a risca espectral K, (correspondentes 20 calcio II). Assim era possivel comparar o aspecto da cromosfera solar a duas altitudes diferentes.'! Em 1941 foram obtidos os primeiros espectroheliogramas H[ (risca do hidrogénio)..A acco dos cientistas portugueses nio se limitou A observagio e obtencio dos heliogramas e 4 anilise numérica dos caracteres solares. Duas invengdes de Francisco Costa Lobo merecem especial referéncia: uma esfera solar, de madeira, que facilitava a visualizacio da posigZo das estruvuras solares, e uma representagio gri- fica que permitia reproduzir de forma planar a imagem do Sol, reduzindo a distor¢io. © exame das observagdes efectuadas conduaiu 4 tentativa de explicagio do processo de formagio das manchas e protuberincias solares. Na introdugio do primeiro volume dos Anais, Francisco Costa Lobo apontow a interligagio existente entre as manchas solares ¢ as regides faculares,zonas brilhantes da super 464 | SECAO2 ficie solar ¢ com maior extensio que as manchas. Os dois fenémenos estavam associados uma vee que as ‘manchas solares surgiam sempre no interior de zonas faculares, pelo que as ficulas seriam mais importan- tes pois perduravam apés o desaparecimento das manchas. Esta situacdo tinha implicagdes na influéncia do Sol nalguns fenémenos terrestres, pois o efeito das manchas era contrariado pelo efeito produzido elas ficulas, explicando os resultados contradit6rios que vinham sendo obtidos, nomeadamente por Ferraz de Carvalho. Apesar de os Anais conterem também tabelas onde a informagio relativa aos fend- menos solares contabilizados poderia ser comparada com dados terrestres, como temperaturas maximas € minimas, iradiagZo solar e vatiagSes magnéticas, nio foram extraidas conclusées sobre este assunto, Gumersindo Lobo desenvolveu também investigagao sobre astrofisica solar, escrevendo artigos que abo daram a classificagio dos fenémenos solares. Deduziu que os filamentos e as protuberdncias, que se julgava serem dois acontecimentos independentes,se poderiam considerar como diferentes aspectos de uma mesma inregularidade, correspondendo o filamento a uma zona de maior sbsorgio de uma protuberincia.!? Em 1949, ja depois da morte de Francisco Costa Lobo em 1945, o IC organizou uma conferéncia, impulsionada por Gumersindo Lobo, que trouxe uma vez mais a Coimbra Lucien D’Azambuja, desta vez acompanhado pela sua esposa e assistente Marguerite D’Azambuja. As palestras de ambos, no salo nobre do edificio-sede do IC, incidiram nos fendmenos solares ¢ no progresso das pesquisas efectuadas 4 atmosfera solar. Marguerite discorreu sobre as possiveis causas das manchas solares ¢ ficulas, indicando as possiveis explicagdes existentes na altura", e Lucien apresentou o seu conceito de centro de activida- de, que incorporava varios eventos solares, Lucien D’Azambuja também referiu os efeitos das erup;Ses cromosféricas no nosso planeta. Em 1951, no ano anterior zo do seu filecimento, Gumersindo Lobo regressou a0 Observatrio de Meudon, que se encontrava integrado no Observatério de Paris desde 1925, respondendo a uma solici- tagdo para instalar em Coimbra um novo instrumento que viabilizasse a participago do Observatorio de Coimbra num novo esforgo internacional para obtengio de um filme solar continuo. Em 1969 foi publicado um novo artigo n'O Institute, que relata a reinstalagio do espectroheligrafo ‘num novo local, situado na freguesia de Santa Clara, Coimbra (para onde tinha sido transferido 0 Ob- servatério Astronémico da Universidade de Coimbra, devido 4 demoli¢ao do seu edificio no Patio da Universidade em 1951). Alberto Simées da Silva, que supervisionou os trabalhos de reinstalago, descre- veu também, sucintamente, a actividade cientifica subsequente, realgando a publicago de treze volumes dos Anais do Observatirio de Coimbra — fendmenos solares. Com a excepgi0 dos dois primeizos volumes, (8 restantes tinham sido publicados por Manuel dos Reis, o Director do Observatério que sucedeu a Francisco Costa Lobo. No artigo de Simées da Silva foi referido que, a partir da publicagdo do 11.° volume, em 1949, se tornou mais dificil a publicagio dos Anais devido ao aumento dos custos tipogrificos. De facto, o tiltimo volume (16.%) relativo as observagdes de 1944, s6 seria publicado em 1975. Sobre a transferéncia do espectrohelidgrafo, ja Lucien D’Azambuja, durante a sua segunda visita a Coimbra, tinha previsto ser dificil mas possivel. Também Karl Otto Kiepenhener, director do Instituto Fraunhofer, durante a sua visita as novas instalagdes do Observat6rio Astronémico em 1966, deu uma opiniio similar & de D'Azambuja. Os trabalhos foram iniciados nesse mesmo ano, tendo-se colocado em funcionamento a ctipula do celéstato no novo pavilhdo. Em Margo de 1967 iniciou-se a transferéncia da unidade espectroheliografica. A reinstalagio, que esteve a cargo do pessoal do pessoal do Observat6rio, {oi concluida em Abril de 1968, tendo sido reatado o aproveitamento sistemitico do aparelho em 10 de Junho do mesmo ano. CONCLUSOES Na intervengio dos Costa Lobo, pai e filho, o IC teve uma influéncia decisiva, j4 que os dois desem- penbaram papéis muito activos nessa instituigio.*Para além de facilitar o estabelecimento de contactos HISTORIA DAS CIENCIAS E DAS TECNICAS EM PORTUGAL ENO BRASIL | 465 nacionais internacionais, o IC permitiu, através da sua revista, divulgar a investigago realizada, nomea- damente junto das instituigdes estrangeiras que recebiam, num sistema de permuta, esta publicagii A relagio pessoal entre Francisco Costa Lobo ¢ Henri Deslandres foi essencial para a concretizagiio do projecto. Por parte de Costa Lobo havia o interesse de iniciar uma nova érea de investigagao em Portugal que auferisse reconhecimento internacional ao nosso pais. A existéncia em Coimbra de um aparelho em quase tudo idéntico 20 de Meudon permitia integrar de forma quase imediata, isto é, sem necessidade de grandes correcges, os espectoheliogramas obtidos em Coimbra nos mapas sinépticos elaborados em ‘Meudon, colmatando as lacunas dos registos efectuados no observatorio francés. Dado o niimero de dias, de Sol descoberto no nosso pais ser superior a0 que se verifica em Franca, a colecgdo das observagses portuguesas foi sempre mais completa, mas o mérito da compilagio ¢ da edigdo das observagSes recaiu quase integralmente no Observatério de Meudon e, em particular, na pessoa de Lucien D’Azambuja, situagio que terd limitado o reconhecimento internacional das observagdes realizadas em Coimbra, A cooperagio com o Instituto Geofisico da Universidade de Coimbra, na pattilha de dados meteoro- logicos e magnéticos, permitiu alargar as valéncias dos trabalhos de investigagio das areas de meteorolo- gia, geomagnetismo ¢ astrofisica solar realizados em Coimbra. ‘Todavia, os trabalhos foram sempre afectados pela exiguidade de pessoal devido a limitagdes financei- 12s, situago recorrentemente mencionada na introdugio dos diversos volumes dos Anais. O Observat6- rio Astronémico de Coimbra carecia, em especial, de pessoal com habilitages técnicas em astrofisica, 0 que motivou as viagens de Gumersindo Lobo ao Observatério de Meudon. E significative que as custas das viagens, com a excepgio da dltima pouco antes da sua morte, tenham sido suportadas pelo proprio. A dificuldade de obtengio de apoio financeiro intensificou-se ao longo do tempo, atrasando até a publi- cago dos sucessivos volumes dos Anais. Apesar de todos estes contratempos, os trabalhos da Sec¢io de Astrofisica, iniciada em 1925, mantiveram-se até aos dias de hoje. Quem visitar © local do Observatério Astronémico da Universidade de Coimbra, que continua ins talado em Santa Clara, poder visitar o Pavilhio do Espectroheligrafo, que efectua uma média de 240 2 260 observaces por ano, uma das melhores prestagdes europeias."® O equipamento, apesar de manter algumas pegas originais, foi sendo melhorado com modernas lentes, redes de difracgio e fendas, que per mitem obter imagens de melhor qualidade. O processo de aquisicio das observagées € hoje totalmente controlado por computador. Mantém-se também a cooperagio entre o observatério coimbrdo ¢ 0 ob- servatério parisiense, uma cooperagio que jé leva mais de oitenta anos. Contudo, situagio diversa foi a do IC. Em 1981 foi publicado o iltimo volume da revista (na reali- dade, tratou-se da reuniio dos volumes 140.° ¢ 141.°), numa altura em que a associagio se debatia com graves problemas financeiros e de organizagio, apresentando-se 0 edificio onde este fizncionava com gra ves deficiéncias. A sociedade académica ficou inactiva nos anos que se seguiram, tendo todo o seu espélio revertido para a Universidade de Coimbra e sido transferido para a Biblioteca Geral dessa Universidade, onde hoje se encontra. Esté a ser alvo de tratamento técnico gragas a um projecto apoiado pela Fundagio para a Ciéncia e Tecnologia, que contempla a digitalizagio integral da revista O Instituto, § devido um agradecimento 4 Fundagio para a Cincia ¢ Tecnologia, que atribuiu uma bolsa de doutoramento ao primeito autor. REFERENCIAS 1 Lobo, E M. da C., Les nouveaux instruments spectrographiques de ! Observatoire Astronomique de 'Université de Coimbra. O Institute, 73, 1926: 128-141. 2 Carvalho,Anselmo Ferraz. Clima de Coimbra. Resume das Obserowes fies no Obseratrio Meteorolégico da Uni de Coimbra desde 1866. 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