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Arte do Guerreiro

Este é o seu mundo. Não pode renunciar a ele. Não adianta ficar zangado e desapontado consigo mesmo.
Isso só prova que nosso tonal está empenhado numa luta interna. Uma luta dentro do tonal da gente é uma
das contendas mais inúteis que posso imaginar. A vida apertada de um guerreiro destina-se a terminar essa
luta. Desde o principio ou lhe ensinei evitar o desgaste. Agora, não há mais uma guerra dentro de você, não
como antes, porque o caminho do guerreiro é a harmonia entre os atos e as decisões, primeiro, e depois a
harmonia entre o tonal e o nagual.

Durante todo tempo venho falando tanto a seu tonal como a seu nagual. É assim que a instrução deve ser
conduzida. No principio a gente tem de falar com o tonal. É o tonal que tem de largar o controle. Mas isso
deve ser feito de boa vontade. Em outras palavras, o tonal é obrigado a ceder coisas desnecessárias, como
a auto-importância e o entregar-se, que só levam ao tédio. O problema todo é que o tonal se agarra a tais
coisas, quando devia ficar feliz por se ver livre de besteiras. O trabalho então é convencer o tonal a tornar-
se fluido e livre. É disso que o feiticeiro precisa, acima de tudo, um tonal forte e livre. Quanto mais forte ele
fica, menos se agarra a seus feitos, e mais fácil se torna reduzi-lo.

O meio mais eficaz de se viver é como um guerreiro. Preocupe-se e pense antes de tomar qualquer
decisão, porém, uma vez tomada, siga seu caminho, livre de preocupações e pensamentos; haverá mil
outras decisões ainda á sua espera. É assim a maneira do guerreiro.

Disposição

Precisamos da disposição de guerreiros para todos os atos, senão ficamos fracos e feios. Não existe poder numa vida onde
não tenha essa disposição. Olhe para si. Tudo o ofende e perturba. Geme e reclama e acha que todo mundo esta abusando
de você. É uma folha à mercê do vento. Não existe poder em sua vida. Um guerreiro, ao contrário, é um caçador. Calcula
tudo. Isso é controle. Mas, uma vez terminados seus cálculos, ele age. Entrega-se. Um guerreiro não é uma folha a mercê
do vento. Ninguém pode empurrá-lo, ninguém pode obrigá-lo a fazer coisas contra si ou contra o que ele acha certo. Um
guerreiro é preparado para sobreviver e ele sobrevive da melhor maneira possível. Um guerreiro pode ser ferido, mas não
ofendido. Para um guerreiro, não há nada ofensivo nos atos de seus semelhantes, enquanto ele estiver agindo dentro da
disposição correta.

A disposição de guerreiro exige controle sobre si, e ao mesmo tempo exige que ele se entregue.

Quando um guerreiro acha que seu espírito esta desviado, ele deve simplesmente endireita-lo, pois não ha trabalho no
mundo que valha mais a pena. Não endireitar o espírito é procurar a morte, e isso é o mesmo que não procurar nada, pois a
morte ira nos alcançar não importa o que acontecer.

X
Um guerreiro age como se soubesse o que esta fazendo, quando, na verdade, não sabe nada.

Um guerreiro não tem remorsos por nada que tenha feito, porque isolar os atos de alguém como sendo mesquinhos, feios ou
maus é dar importância indevida ao eu, o truque esta naquilo a que se da importância. Ou nos fazemos fortes ou fracos, a
quantidade de esforço é a mesma.

O poder pessoal é algo que se sente, algo como ter sorte. Pode-se chamá-lo de uma disposição. O poder pessoal é algo
que se adquire por meio de uma vida inteira de luta.

A disciplina torna insípida nossa capa de consciência para os voadores.


Caminho

Lenta e metodicamente, ele guiou minha percepção para focalizar com mais e mais intensidade a
elaboração abstrata do conceito do guerreiro, que ele chamava o caminho do guerreiro e a senda do
guerreiro. Ele explicou que o caminho do guerreiro era uma estrutura de idéias estabelecida pelos xamãs
do México antigo. Esses xamãs tinham derivado essa estrutura por meio de sua capacidade em ver a
energia que flui livremente no universo. Portanto, o caminho do guerreiro era um conglomerado muito
harmonioso de fatos energéticos, verdades irredutíveis determinadas exclusivamente pela direção do
fluxo de energia no universo. Dom Juan declarou categoricamente que não havia nada no caminho do
guerreiro que pudesse ser discutido, nada que pudesse ser mudado. Esse caminho era em si mesmo e
por si mesmo uma estrutura perfeita, e quem fosse que o seguisse era encurralado por fatos energéticos
que não admitiam discussão, nenhuma especulação sobre sua função e seu valor.

Dom Juan disse que aqueles xamãs o chamavam de o caminho do guerreiro porque sua estrutura
abrangia todas as possibilidades vivas que um guerreiro poderia encontrar na senda do conhecimento.
Esses xamãs eram absolutamente exaustivos e metódicos na sua procura de tais possibilidades. Segundo
Dom Juan, eles foram realmente capazes de incluir em sua estrutura abstrata tudo que é humanamente
possível.

Dom Juan comparou o caminho do guerreiro a um edifício, no qual cada um de seus elementos é um
dispositivo de suporte, cuja única função era sustentar a psique do guerreiro no seu papel de iniciante de
xamã, com o objetivo de tornar seus movimentos fáceis e significativos. Ele declarou inequivocamente
que o caminho do guerreiro era a estrutura essencial, sem a qual os iniciantes de xamã naufragariam na
imensidão do universo.

Dom Juan chamava o caminho do guerreiro a glória suprema dos xamãs do México antigo. Ele o
considerava a sua mais importante contribuição, a essência de sua sobriedade.

— O caminho do guerreiro é tão absolutamente importante, Dom Juan? — eu lhe perguntei uma vez.

— "Absolutamente importante" é um eufemismo. O caminho do guerreiro é tudo. É o resumo da saúde


mental e física. Não posso explicar de outro modo. O fato de os xamãs do México antigo terem criado tal
estrutura significa, para mim, que eles estavam no auge de seu poder, no cume de sua felicidade, no
ápice de sua alegria.

(...)

— O intento desses xamãs — disse Dom Juan — era tão agudo, tão poderoso, que podia solidificar a
estrutura do guerreiro em qualquer um que tocasse, mesmo que eles não tivessem consciência disso.

Em suma, o guerreiro era, para os xamãs do México antigo, uma unidade de combate tão sintonizada
com a luta em volta dele, tão extraordinariamente alerta na sua forma mais pura, que ele não precisava
de nada supérfluo para sobreviver. Não havia necessidade de dar presentes para um guerreiro, ou apoiá-
lo com palavras ou ações, ou tentar dar-lhe consolo ou incentivo. Todas essas coisas já estavam incluídas
na estrutura do próprio guerreiro. Desde que essa estrutura fosse determinada pelo intento dos xamãs
do México antigo, eles se asseguravam de que qualquer coisa previsível estaria incluída. O resultado
final era um lutador que lutava só e que tirava de suas próprias convicções silenciosas todo o impulso
que necessitava para avançar, sem queixas, sem a necessidade de ser elogiado.

Pessoalmente, achei fascinante o conceito do guerreiro e, ao mesmo tempo, era uma das coisas mais
amedrontadoras que jamais tinha encontrado. Pensava que era um conceito que, uma vez que eu o
adotasse, me manteria preso numa servidão e não me daria nem tempo nem disposição para protestar,
criticar ou me queixar. A queixa foi um hábito de toda a minha vida; para ser sincero, eu teria lutado
com unhas e dentes para não deixá-la. Achava que a queixa era um sinal do homem sensível, corajoso e
direto que não tem escrúpulos em admitir do que gosta e do que não gosta. Se tudo isso ia se
transformar num organismo de luta, eu achava que ia perder mais do que podia me permitir.

Eram esses meus pensamentos profundos. E, contudo, eu cobiçava a direção, a paz, a eficiência do
guerreiro. Um dos grandes auxílios que os xamãs do México antigo usaram ao estabelecer o conceito de
guerreiro era a idéia de tomar a morte como uma companheira, uma testemunha de nossos atos. Dom
Juan disse que, uma vez aceita essa premissa, mesmo numa forma mitigada, se forma uma ponte que se
estende sobre o vazio entre o mundo de nossos afazeres mundanos e alguma coisa que está diante de
nós, embora não tenha nome; alguma coisa que está perdida na neblina e não parece existir; alguma
coisa tão terrivelmente obscura que não pode ser usada como ponto de referência e, no entanto, está aí,
inegavelmente presente.

Dom Juan argumentava que o único ser na terra capaz de cruzar essa ponte era o guerreiro: silencioso
em sua luta, ele é um homem que não pode ser detido porque não tem nada a perder; e um homem
funcional e eficiente porque tem tudo a ganhar.

Pense

Mate o desejo de viver, este desejo se concentra apenas no corpo, o veiculo do eu materializado, e
não do eu que é eterno e indestrutível, que não mata e nem pode ser morto.
 
Mate a sensação, olhe do mesmo modo para o prazer e a dor, o ganho e a perda, a vitoria e a derrota.
 
Busque refugio apenas no eterno, destrua o sentido de separatividade, a mente que segue os sentidos
oscilantes torna a alma tão indefesa quanto o barco que o vento leva a deriva pelas águas

Antes que a Alma possa ver, a Harmonia interior deve ser alcançada e os olhos físicos devem ficar
cegos para toda ilusão.

O Intento, espírito, o abstrato tudo isso é o conhecimento silencioso, e é algo que todos seres humanos
possuem, mas não se pode racionalizá-lo, tentar racionalizar esse conhecimento é o mesmo que
desligá-lo, não existe meio de racionalizá-lo.

O movimento do ponto de aglutinação é caracterizado por uma ansiedade mortal, pois tudo em nos fica
desconectado e depois é reconectado a uma fonte de poder muito maior. Essa amplificação de energia
é sentida como uma ansiedade mortífera.

Luta contra teus pensamentos impuros Lanu antes que eles te dominem. Usa-os como eles te usarão
porque se os pouparem e deixar que criem raízes e cresçam, deves saber que estes pensamentos te
dominarão e te matarão. Tem cuidado Discípulo, não deixe sequer que a sombra de tais pensamentos
se aproxime. Porque a sombra crescerá, aumentará em tamanho e poder, e então essa coisa de
escuridão absorverá o teu ser antes que você tenha percebido bem a presença do monstro preto
e repugnante.
 

Nunca chegarei a Ixtlan 


No entanto em meus sentimentos, as vezes acho que estou apenas a um passo de alcançá-la, no
entanto, nunca alcançarei, em minha viagem nem encontro os marcos conhecidos que costumava
achar. Nada é igual. Mas os sentimentos de um homem nunca morrem ou mudam e o feiticeiro começa
sua viagem de volta sabendo que nenhum poder na terra nem mesmo sua morte o levara ao lugar as
coisas e pessoas que ele amou. 

PA – Como podemos recuperar a consciência para enxergar além do próprio reflexo?


CC – É necessário restaurar nossa energia. Aumentá-la para gerar mais calma, eficiência e
propósito. Dom Juan dizia que um dos maiores males da nossa civilização é a falta de
propósito, de meta e a incapacidade de tomar decisões. Gastamos energia nos
defendendo. Nossa auto-importância é tamanha que direcionamos toda a nossa energia
para defender o conceito que temos de nós mesmos! E nem percebemos que funcionamos
assim!

Tudo o que os feiticeiros fazem é conseqüência dos movimentos de seus pontos de


aglutinação, esses movimentos são governados pela quantidade de energia que eles tem
disponivel.

PA – O que é o amor para um bruxo?


CC – É o ato de sentir afeto por outra pessoa, ou por uma abstração, com a liberdade,
sem limitações. Porém sentir tal afeto sem transformá-lo em investimento, senti-lo sem
esperar recompensa. Dom Juan dizia que os bruxos de sua linhagem presenteavam seu
amor a quem desejassem e que jamais esperavam algo em troca. Essa condição de afeto
total, dado sem nenhum interesse, pode ser aplicada não somente a seres viventes, mas
também a situações abstratas. A isso Dom Juan chamava de “Caminho com Coração”:
enfocar o afeto total a algo que não é pessoal.

"O critério que indica que um feiticeiro está morto," continuou ele, "é o fato de não fazer nenhuma diferença
para ele estar sozinho ou ter companhia. O dia em que você não cobiçar a companhia de seus amigos, que
você usa com anteparos, esse será o dia em que sua pessoa morreu. O que você me diz? Você topa?" 

Ele nos diz : " Em essência, o caminho dos feiticeiros é uma cadeia de escolhas de comportamento ao lidar
com o mundo, escolhas muito mais inteligentes do que aquelas que nossos pais nos ensinaram . Essas
escolhas dos feiticeiros destinam-se a recompor nossas vidas 
alterando nossas reações básicas com relação a estarmos vivos ." 

A auto-reflexão, auto-estima, auto-imagem é o que mantém o ponto de aglutinação fixo. A guerra travada no
caminho do guerreiro é para destronar a auto-estima. A auto-estima é auto-piedade disfarçada de alguma coisa.

Para um guerreiro a implacabilidade não é crueldade, e sim o oposto da auto-piedade ou auto-estima.


Implacabilidade é sobriedade.

Espreita

É regida por 7 princípios (vide abaixo) 


- Tem 4 passos de aprendizado: implacabilidade, esperteza, paciência e doçura 
- Sua estratégia mais eficaz tem 6 pontos: controle, disciplina, paciência, oportunidade, vontade e o
pequeno tirano 
- Espreita-se tudo, até as próprias fraquezas, mas o “estado da arte” é espreitar a sí mesmo 
- Seus resultados são: rir de si mesmo, não se levar a sério, capacidade infinita de improvisação 
- A espreita é o enigma do coração; a consciência é o da mente; o intento é o do espírito 
- É um comportamento secreto, furtivo e enganoso para produzir um choque (em si mesmo) 
- Para espreitar é preciso ter um propósito, ser impecável, sair da auto-importância, banir hábitos e praticar
a loucura controlada (fingir-se imerso na ação, mas sem se identificar, nem ser notado)
- A recapitulação é o ponto forte dos espreitadores. É uma forma especializada de espreitar as rotinas
internas. 
- A espreita é melhor aprendida em consciência intensificada, sem o inconveniente do inventário 
- Liga-se á energia sexual de forma individual. O sonhador usa a energia sexual para sonhar. O espreitador é
o oposto 

1. “O primeiro princípio da arte da espreita é que os guerreiros escolhem o campo de batalha. Um guerreiro nunca
vai para a batalha sem saber o que o cerca. 
2. Descartar tudo que não é necessário é o segundo princípio da arte da espreita. Um guerreiro não complica as
coisas. Seu objetivo é ser simples. 
3. Ele aplica toda a concentração que tem para decidir se entra ou não na batalha, pois qualquer batalha é uma
batalha por sua vida. Este é o terceiro princípio da arte da espreita. Um guerreiro deve estar disposto e pronto
para travar sua última batalha aqui e agora. Mas não de uma maneira descuidada. 
4. Um guerreiro relaxa e se abandona; ele nada teme. Só então os poderes que guiam os seres humanos abrem
o caminho para o guerreiro e o ajudam. Só então. Este é o quarto princípio da arte da espreita. 
5. Quando diante de dificuldades com as quais não podem lidar, os guerreiros recuam por um momento. Eles
deixam a mente vagar. Ocupam seu tempo com alguma outra coisa. Qualquer coisa serve. Este é o quinto
princípio da arte da espreita. 
6. Os guerreiros comprimem o tempo este é o sexto princípio da arte da espreita. Mesmo um instante conta.
Numa batalha por sua vida, um segundo é uma eternidade, uma eternidade que pode decidir o resultado final.
Os guerreiros visam ao sucesso, portanto comprimem o tempo. Os guerreiros não desperdiçam um só instante. 
7. Para aplicara sétimo princípio da arte da espreita, é preciso aplicar os outros seis; um espreitador nunca se
lança para a frente. Ele sempre olha para frente por detrás das cenas.” 

1.Controle. Enquanto o pequeno tirano atormenta o guerreiro, esse aprende a desmontar os seus
esquemas de justificação da preguiça, vê destruída a sua ingenuidade infantil, e desperta para níveis
superiores de alerta e atenção. Ele aprende a controlar os impulsos inferiores. Se não fizer isso, será
derrotado. 

2.Disciplina.  Como qualquer ser humano, o guerreiro sofre, mas ele sofre  sem sentimento de auto-
piedade. Ele levanta informações objetivas sobre a situação em que está, identifica os perigos reais e
define possíveis alternativas, sem perder tempo ou energia com emoções desnecessárias. 

3.Paciência. O guerreiro não combate prematuramente. Ele aguarda com serenidade e antecipa com
prazer a sua futura libertação. “O guerreiro sabe que espera, e sabe o que espera”, explica Victor
Sánchez.

4.Sentido de Oportunidade.  No momento certo, o guerreiro aplica toda a energia acumulada em


relação aos três pontos anteriores. Sánchez afirma : “É como abrir as comportas de uma represa”.

5. Vontade. Não é a vontade comum, mas um elemento imponderável, reservado para uma situação
extrema. Esse é o único ponto da estratégia que pertence ao desconhecido. Não é apenas um resultado
da acumulação dos itens anteriores.

6.O Tirano Insignificante. É o elemento externo que, ameaçando o guerreiro, dinamiza e acelera o
seu processo de crescimento interior. [ 3 ] 

Os três primeiros pontos – controle, disciplina e paciência – são estimulados pelo sexto elemento, o
tirano, ou a “situação limitadora”. 

O quarto ponto – a escolha do momento de ação – serve para preparar o salto transformador e o
instante criativo que fará toda a diferença. O quinto ponto, a vontade, significa que, tendo aumentado
sua eficiência e sendo impecável nessa situação concreta, o guerreiro reúne uma energia ilimitada, a
ser usada no momento certo. 
Desse modo, cada pessoa de má vontade ou que boicota nossos esforços tem algo a nos ensinar.
Se formos aprendizes conscientes da arte de viver, estaremos sendo beneficiados pelas suas ações
agressivas, ainda que isso possa ser frustrante para o agressor. Normalmente, o pequeno tirano é um
pobre desorientado. Ele não só ignora que sua má-vontade contra nós na verdade nos beneficia, mas
sequer  suspeita o quanto é gravemente prejudicial para ele próprio querer prejudicar alguém.

Para o aprendiz da sabedoria, há três coisas de suprema importância.

A primeira é não aceitar o papel de pequeno tirano nem perder tempo ou energia com pensamentos
e ações destrutivos em relação a outrem. A segunda é não cair na posição de vítima paralisada ou
inconsciente, e não alimentar auto-piedade. A terceira é saber atuar como um colaborador da
sabedoria universal em todas as situações da vida.   

Antes de ousar ou tentar qualquer coisa no Caminho do Guerreiro é preciso aprender a Arte de Espreitar. A Arte da Espreita
é o enigma do coração, segundo os feiticeiros de tempos antigos, o desconcerto que os feiticeiros sentem ao se tornarem
conscientes de duas coisas: primeiro, que o mundo parece para nós inalteravelmente objetivo e factual, por causa das
peculiaridades de nossa consciência e percepção; segundo, que se diferentes peculiaridades de percepção entram em jogo,
as próprias coisas do mundo que parecem objetivas e factuais mudam.

A Espreita teve origens muito humildes e acidentais. Partiu da observação feitas pelos novos videntes que, quando os
guerreiros se comportam por algum tempo de modo fora do habitual, seus pontos de aglutinação se deslocam de maneira
suave.

A feitiçaria é o ato de atingir o lugar do Conhecimento Silencioso . Não pode ser raciocinado; pode apenas ser
experimentado.

Num esforço para se protegerem do avassalador efeito do Conhecimento Silencioso os feiticeiros desenvolveram a Arte de
Espreitar. Na Arte de Espreitar, há uma técnica que os feiticeiros usam muito: Loucura Controlada. Segundo eles a Loucura
Controlada é a única maneira que têm de lidar consigo mesmos, em seu estado de consciência e percepção expandidas, e
com tudo e todos no mundo dos afazeres diários. A Loucura Controlada é uma arte e é preciso muita energia para exercê-la.

ESPREITANDO A SI MESMO

Ensinar a espreitar era uma das coisas mais difíceis que os feiticeiros faziam. E o mais importante é que os atos são ditados
pela impecabilidade.

A Arte de Espreitar é aprender todos os truques do próprio disfarce. Devem ser aprendidos com tanta eficiência que
ninguém perceba o seu disfarce. Espreitar é uma arte aplicável a tudo e há quatro passos para aprendê-la:

IMPLACABILIDADE, ESPERTEZA, PACIÊNCIA e DOÇURA.


IMPLACABILIDADE não deve ser RUDEZA. Seja IMPLACÁVEL mas ENCANTADOR.
ESPERTEZA não deve ser crueldade. Seja ESPERTO mas SIMPÁTICO.
PACIÊNCIA não deve ser NEGLIGÊNCIA. Seja PACIENTE mas ATIVO.
DOÇURA não deve ser TOLICE. Seja DOCE mas LETAL.

Espreitar é a arte de praticar o "controle sistemático do comportamento" de maneiras novas para propósitos específicos. É
um comportamento secreto, furtivo, enganoso designado a provocar um choque. E Quando você espreita a si mesmo, você
choca a si mesmo, usando seu próprio comportamento de um modo implacável e astucioso.
O comportamento humano normal no mundo da vida cotidiana é rotina. Qualquer comportamento que escape a rotina pode
causar um efeito incomum em nosso ser total, e esse efeito é cumulativo.

A espreita envolve um tipo específico de comportamento diante das pessoas, um comportamento que poderia ser
categorizado como sub-reptício, fraudulento, dissimulado.

A IDÉIA DA MORTE E A ESPREITA

A idéia da morte é a única coisa que pode dar coragem aos feiticeiros. Coragem de serem ATENCIOSOS sem serem
VAIDOSOS, e de serem IMPLACÁVEIS sem serem CONVENCIDOS. Quando a consciência fica enredada pelo peso de suas
aquisições perceptivas, o melhor remédio é usar a idéia da morte para causar um choque de espreita.

A vida é o processo pelo qual a morte nos desafia. Se nos movemos, é apenas quando sentimos a pressão da morte. A
morte estabelece o ritmo de nossas ações e sentimentos e empurra-nos incansavelmente até que nos quebra e ganha
o prêmio, OU então nos elevamos acima de todas as possibilidades derrotamos a morte.

Um guerreiro está em guarda permanente contra a aspereza do comportamento humano. Um guerreiro é mágico e
implacável, um dissidente com o gosto e as maneiras mais refinados, cuja tarefa mundana, é afiar mas com disfarce, suas
bordas cortantes de modo que ninguém perceba sua implacabilidade.

APARÊNCIA, DISFARCES E MANOBRAS DOS ESPREITADORES

A arte dos espreitadores destinava-se a criar uma impressão ao apresentar as feições que escolhiam, feições que sabiam
que os olhos do observador seriam obrigados a notar. Reforçando com arte certas expressões, os espreitadores foram
capazes de criar, por parte do observador, uma convicção imutável quanto ao o que os seus olhos haviam percebido.

A aparência é a essência da Loucura Controlada, e os espreitadores criam uma aparência intentando-a, antes que, a
produzindo com a ajuda de disfarces. Os disfarces criavam aparências artificiais e pareciam falsos aos olhos. Intentar
aparências era exclusivamente um exercício para espreitadores.

Os guerreiros podem aprender a espreitar em sua consciência normal, embora seja aconselhável que o façam em
consciência intensificada...não tanto por causa do valor da consciência intensificada, mas porque isto imbui a espreita de um
mistério que ela na verdade não possui; espreitar é um mero comportamento diante das pessoas.

Os pequenos tiranos forçavam os videntes a usar os princípios da Espreita e, ao fazê-lo, ajudavam-nos a deslocar seus
pontos de aglutinação.

"Uma das grandes manobras dos espreitadores é contrapor o mistério à estupidez que há em cada um de nós." As praticas
da Espreita não são coisas para alguém se rejubilar; na verdade são completamente censuráveis.

Um dos propósitos de se espreitar é imprimir seus princípios a um nível tão profundo que o inventário humano seja
ultrapassado, assim como a reação natural de recusar e julgar algo que possa ser ofensivo a razão.

OS SETE PRINCÍPIOS DA ESPREITA

1°- Os guerreiros escolhem seu campo de batalha, ele nunca entra na batalha sem saber o que o cerca.

2°- Descartar tudo o que for desnecessário. Ter somente o essencial.

3°- Um guerreiro tem de estar disposto e pronto a tomar sua última posição e decidir se entra ou não na batalha, pois toda
batalha é uma batalha pela vida.

4°- Relaxar e não ter medo de nada.

5°- Quando confrontados com coisas que não conseguem lidar, os guerreiros se retraem por um instante e desenvolvem um
espírito diferente de auto-confiança para reorganizar seus recursos.

6°- Os guerreiros condensam o tempo. Esperam Ter êxito, portanto não desperdiçam nem um minuto.

7°- Um espreitador nunca se põe a frente das coisas.

A RECAPITULAÇÃO E A ESPREITA

Sem fazer os exercícios de recapitulação para recuperar os filamentos deixados no mundo, não há possibilidade de
manipular a Loucura Controlada, pois esses filamentos estranhos são a base da capacidade ilimitada de auto-importância de
uma pessoa. Para exercitar a Loucura Controlada já que ela não visa enganar ou punir as pessoas ou se sentir
superior a elas, tem-se de ser capaz de rir de si próprio. Florinda disse que um dos resultados de um recapitulação
detalhada é a graça de se ver face a face com a repetição monótona da auto-estima de alguém, que está no cerne de toda
interação humana.

A aplicação dos sete princípios redunda em três resultados:

1. Os espreitadores aprendem a nunca se levarem a sério. Aprendem a rir de si próprios. Se não se


importam de parecer bobos podem enganar a qualquer um.
2. Aprendem a Ter uma paciência sem fim. Nunca estão com pressa. Nunca se desesperam.
3. Aprendem a desenvolver uma capacidade infinita de improvisação.

AFORISMOS DA LOUCURA CONTROLADA

 Um guerreiro pode escolher permanecer totalmente impassível e nunca agir, e comportar-se como se ser impassível
realmente lhe importasse; ele também estará certo assim porque isso também seria a sua Loucura Controlada.

 Como nada é mais importante do qualquer outra coisa, um guerreiro escolhe qualquer ato e age como se lhe
importasse. Sua Loucura Controlada o faz dizer que o que ele faz importa e o faz agir como se importasse, e
contudo ele sabe que não é assim; de modo que, quando completa seus atos, ele se retira em paz e quer seus atos
tenham sido bons ou maus, dado certo ou não, isso absolutamente não o preocupa mais.
 Um guerreiro não tem honra, nem dignidade, nem família, nem nome, nem país; ele tem apenas a vida a ser vivida
e, nessas circunstâncias, sua única ligação com seus semelhantes é sua Loucura Controlada.

 Um guerreiro tem de saber antes de mais nada, que seus atos são inúteis e que, no entanto, ele tem de proceder
como se não o soubesse. Esta é a Loucura Controlada de um xamã-guerreiro.

 As coisas que as pessoas fazem não podem ser de jeito algum mais importantes do que o mundo. E assim um
guerreiro trata o mundo como um mistério sem fim e o que as pessoas fazem como uma loucura sem fim.

Recapitulação
Fazer lista completa de todas as pessoas que conheceu
Pensar na primeira pessoa e lembra tudo o que viveu com ela, desde a ultima vez que a viu até a primeira ou vice-versa

12 Verdades
Tudo que tem um começo tem um fim

Tudo que tem frente tem um dorso

Quanto maior a face maior o dorso

Não existem dois entes iguais


X

X
Apagando-se
Como posso saber o que sou quando sou tudo isso?
Pouco a pouco você deve criar uma nevoa em torno de si. deve apagar tudo em volta de si até que nada possa ser considerado
coisa sabida, até não haver nada de certo nem real. Seu problema agora é que você é real demais. Seus esforços são por
demais reais; seus estados de espírito também. Não se fie tanto nas coisas, você precisa começar a se apagar.
Como? Primeiro é preciso ter o desejo de largá-la. E depois é preciso harmoniosamente passar a cortá-la, pouco a pouco.
Comece com coisas simples, como não revelar o que você realmente faz. Depois, deve abandonar todas as pessoas que o
conheçam realmente bem. Assim, você criara uma nevoa em torno de si.
Pq as pessoas não podem me conhecer?
Uma vez que o conheçam, você é coisa em que eles se fiam, e desse momento em diante não poderá romper o fio do
pensamento deles. Pessoalmente gosto da liberdade total de ser desconhecido. Ninguém me conhece com certeza absoluta,
como as pessoas o conhecem por exemplo.
Mas isso seria mentir, não é?
Não estou preocupado com mentiras ou verdades, as mentiras só são mentiras quando se tem historia pessoal.
Mas não quero iludir as pessoas. Você as iludi querendo ou não, quando a gente não tem historia pessoal, nada do que se diga
pode ser considerado uma mentira. O problema com você é que você tem que explicar tudo a todo mundo,
obrigatoriamente, e ao mesmo tempo você quer conservar a frescura, a novidade daquilo que faz, como não pode
entusiasmar-se depois de explicar tudo o que faz, você mente pra poder continuar.
De agora em diante você deve simplesmente mostrar as pessoas o que quiser mostrar-lhes, porém sem nunca dizer
exatamente como o fez.
Como vê nos só temos duas alternativas, ou consideramos tudo certo e real, ou não. Se adotarmos a primeira acabamos
caceteados mortalmente conosco e com o mundo. Se adotarmos a segunda e apagarmos a historia pessoal, criamos uma
nevoa em volta de nos, um estado muito emocionante e misterioso, em que ninguém sabe de onde sairá o coelhinho, nem
mesmo nós. Quando nada é certo permanecemos alertas e atentos
X
Viajante
"É importante, muito importante," continuou don Juan, "que você mesmo atinja deliberadamente o ponto crítico, ou que você
o crie artificial e inteligentemente." 

Seu ponto crítico," disse ele, "é interromper sua vida como você a conhece. Você fez tudo o que eu disse para você fazer,
zelosa e acuradamente. Se você é talentoso, nunca o demonstrou. Esse parece ser o seu estilo. Você não é vagaroso, mas age como se
fosse. Você é muito seguro de si mesmo, mas age como se fosse inseguro. Você não é tímido e mesmo assim age com se temesse as
pessoas. Tudo o que você faz aponta para uma mesma direção: você necessita acabar com tudo isso, impiedosamente." 
"Penso que tudo se resume numa coisa," disse ele. "Você deve deixar seus amigos. Deve despedir-se deles, para sempre. Não é possível
você continuar no caminho do guerreiro carregando sua história pessoal com você, e a menos que você interrompa seu modo de vida,
não terei condições de continuar com a minha instrução." 

"Exatamente, exatamente," afirmou ele. "Eles são o seu ponto de referência. Por isso, eles têm que sair de sua vida. Os
feiticeiros têm apenas um ponto de referência: o infinito." 

“Tudo o que você fizer deve ser um ato de feitiçaria, um ato livre de expectativas intrometidas, medo de fracasso,
esperanças de sucesso. Livre do culto do eu, do culto do ego, tudo o que fizer tem que ser de improviso, um trabalho de magia onde
deve-se abrir mão de si próprio e se entregar aos impulsos do infinito.”

Escolher para um guerreiro viajante não é realmente um ato de escolha, em vez disso, um ato de aquiescer elegantemente as
solicitações do infinito. O infinito escolhe, a arte do guerreiro viajante é ter habilidade de mover-se a menor insinuação, a arte de
aquiescer a cada comando do infinito. Para isso um guerreiro viajante necessita de coragem, força e sobre tudo o mais, sobriedade.
Essas três características somadas dão, como resultado, elegância.

Os guerreiros viajantes nunca reclamam, eles aceitam qualquer coisa que o infinito lhe apresente como um desafio. Desafio é
desafio. É impessoal não pode ser considerado como uma benção ou uma desgraça. Ou ele vence o desafio ou o desafio esmaga-o. É
mais excitante vencer, então vença!

Feiticeiros entendem disciplina como a capacidade para enfrentar com serenidade, imprevistos que não estão inclusos em
nossas expectativas. Para eles, disciplina é uma arte: a arte de enfrentar o infinito sem vacilar, não porque eles são fortes, mas porque
eles estão cheios de respeito e temor!

Um guerreiro aceita seu destino, seja qual for, e o aceita na mais total humildade. Aceita com humildade aquilo que ele é, não
como fonte de pesar, mas como um desafio vivo. É preciso tempo para cada um de nos compreender esse ponto e vivê-lo plenamente.

A humildade do guerreiro é diferente da humildade do homem comum, o homem comum é humilde como um mendigo, ele
abaixa a cabeça para os outros e assim exige que abaixem a cabeça pra ele. O guerreiro pelo contrario, ele não baixa a cabeça pra
ninguém e também não deixa que ninguém abaixe a cabeça pra ele.

Nada há nesse mundo que um guerreiro não possa enfrentar, Entenda: um guerreiro já se considera morto, de modo que nada
tem a perder, O pior já lhe aconteceu, e, portanto ele esta lúcido e calmo; a julgá-lo por seus atos ou suas palavras, nunca se suspeitaria
de que ele tenha presenciado tudo.

X
Ser inacessível

A arte do caçador é ser inacessível, terei de tornar-me um caçador e vê-la raramente. Ficar totalmente disponível dia após dia até que o
único sentimento que sobre seja o tédio é um erro. Devo não ter rotinas pesadas e intransmutáveis.

Ser inacessível significa que você toca o mundo que o cerca moderadamente, não come cinco codornas come uma. Não danifica as
plantas só pra fazer uma churrasqueira. Não se expõe ao vento a não ser que seja imprescindível. Não espreme e usa as pessoas até
elas mirrarem e sumirem, especialmente aquelas que você ama.

Estar inacessível significa que você evita esgotar-se a si e aos outros propositadamente. Significa que você não esta faminto, nem
desesperado, como o pobre filho da mãe que acha que nunca mais vai comer na vida, e então devora toda comida que pode, todas as
cinco codornas
Um caçador sabe que atrairá varias vezes a caça para sua armadilha, de modo que não se preocupa, preocupar-se é torna-se acessível,
acessível sem saber. E depois que você se preocupa agarra-se a qualquer coisa em desespero, e uma vez que você se agarra, é provável
que se esgote ou que esgote a quem ou a o que você se estiver agarrando.

Já lhe disse que ser inacessível não significa se esconder ou ser misterioso, não significa tampouco que você não possa lhe dar com as
pessoas. Um caçador usa seu mundo com parcimônia e ternura, sem considerar se o mundo é de coisas, pessoas, plantas, ou poder. Um
caçador trata intimamente com seu mundo e no entanto, é inacessível a este mesmo mundo.

Ele esta inacessível porque não esta espremendo o mundo até que este perca a forma. Ele o toca de leve fica o tempo que precisa
depois vai adiante rapidamente, quase sem deixar marcas.

X
Loucura controlada

É possível insistir, insistir realmente, mesmo sabendo que o que se está fazendo é inútil - disse ele, sorrindo.
- Mas primeiro temos de saber que nossos atos são inúteis e, no entanto, temos de proceder como se não
soubéssemos. É esta a loucura controlada de um feiticeiro.

 Com quem você pratica a sua loucura controlada, Dom Juan? - perguntei, depois de um longo silêncio. Ele riu. 
- Com todo mundo! 
- Então, quando é que você resolve praticá-la? 
- Cada vez que eu ajo. 
Achei necessário recapitular, nesse ponto, e perguntei-lhe se a loucura controlada significava que os atos dele nunca
eram sinceros, e apenas os atos de um ator. 
- Meus atos são sinceros - disse ele - mas são apenas os atos de um ator. 
- Então, tudo o que você faz deve ser loucura controlada! - falei, realmente surpreendido. 
- Sim, tudo. 
- Mas isso não pode ser verdade - protestei - não acredito que todos seus atos sejam só loucura controlada. 
- Por que não? - respondeu ele, com um ar misterioso. 
- Isso significaria que nada lhe importa e você não liga realmente para nada ou ninguém. Veja o meu caso, por exemplo.
Quer dizer que não se importa se eu me tornar um homem de conhecimento, se eu viver ou morrer, ou fizer qualquer
coisa? 
- É verdade! Não me importo. Você é como Lúcio, ou qualquer outra pessoa em minha vida, minha loucura controlada.” 
X
“- Será que você me conta mais a respeito de sua loucura controlada? 
- O que é que você quer saber a respeito? 
- Diga-me, por favor, Dom Juan, o que é exatamente a loucura controlada? 
Dom Juan riu à grande e provocou um estalo, dando uma palmada em sua coxa. 
- Isto é loucura controlada! - falou, e tornou a dar uma palmada na coxa. 
- O que quer dizer? 
- Estou contente que você afinal me pergunte acerca de minha loucura controlada, depois de tantos anos, e no entanto não teria a
mínima importância para mim, se você nunca perguntasse. E no entanto resolvi ficar feliz, como se me importasse, porque você
perguntou, como se importasse que eu ligasse. Isso é loucura controlada! 
Nós dois rimos muito. Abracei-o. Achei a explicação dele uma delícia, embora não a entendesse muito bem.” 
X
“- Estou com a impressão de que não estamos falando sobre a mesma coisa. Eu não devia ter usado o meu caso como exemplo. O que
eu queria dizer era que devia haver alguma coisa no mundo com a qual você se importe e que não seja loucura controlada. Não creio
que seja possível a gente continuar a viver se nada realmente nos importa. 
- Isso se aplica a você - respondeu. - As coisas importam a você. Perguntou-me acerca de minha loucura controlada e eu lhe disse que
tudo o que faço com relação a mim e meus semelhante é loucura, pois nada importa. 
- O que eu digo, Dom Juan, é que, se nada lhe importa, como é que você pode continuar a viver? 
Riu depois de um momento, em que parecia estar resolvendo se devia ou não responder-me; levantou-se e foi para os fundos da casa.
Acompanhei-o. 
- Espere, espere, Dom Juan - falei. - Quero mesmo saber; você tem de me explicar o que quer dizer. 
- Talvez não seja possível explicar - disse ele. - Certas coisas em sua vida lhe importam porque são importantes; seus atos certamente
são importantes para você, mas, para mim, não há mais nenhuma coisa importante, nem os meus atos nem os de meus semelhantes.
Mas continuo a viver porque tenho minha vontade. Porque temperei minha vontade em toda minha vida, até ela se tornar limpa e sadia,
e agora não mais me importa o fato de nada importar. Minha vontade controla a loucura de minha vida. 
Agachou-se e passou os dedos por umas ervas que tinha posto a secar ao Sol num pedaço de pano. 
Eu estava confuso. Jamais poderia ter antecipado o rumo que minha pergunta tomaria. Depois de algum tempo, pensei num bom
argumento. Disse-lhe que, em minha opinião, alguns dos atos de meus semelhantes tinham a maior importância. Observei que a guerra
nuclear era positivamente o exemplo mais dramático de um desses atos. Disse que, para mim, a destruição da vida na face da terra era
um ato de uma enormidade arrasante. 
- Você crê nisso porque está pensando. Está pensando na vida - disse Dom Juan, com um brilho nos olhos. - Não está vendo. 
- Eu sentiria outra coisa se estivesse vendo? - perguntei. 
- Quando o homem aprender a ver, ele se encontra sozinho no mundo, apenas com a loucura - disse Dom Juan, misteriosamente. Parou
um momento e olhou para mim como se quisesse avaliar o efeito de suas palavras. - Seus atos, bem como os atos de seus semelhantes
em geral, parecem-lhe importantes porque você aprendeu a pensar que são importantes. 
Ele usou a palavra "aprendeu" com uma entonação tão especial que me levou a perguntar o que ele queria dizer com aquilo. Parou de
mexer nas plantas e olhou para mim. 
- Aprendemos a pensar sobre tudo - disse ele - e depois exercitamos nossos olhos para olharem como pensamos a respeito das coisas
que olhamos. Olhamos para nós mesmos já pensando que somos importantes. E, por isso, temos de sentir-nos importantes! 
Mas quando o homem aprende a ver, entende que não pode mais pensar a respeito das coisas que ele olha, e se não pode mais pensar
sobre as coisas que olha, tudo fica sem importância.” 
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- Aquilo que você me disse hoje à tarde sobre a loucura controlada me perturbou muito. Não consigo compreender o que você queria
dizer. 
- Claro que não consegue compreender - falou. - Você está tentando pensar a respeito, e o que eu disse não se coaduna com seus
pensamentos. 
- Estou tentando pensar a respeito, porque esse é o único meio pelo qual eu, pessoalmente, consigo entender alguma coisa. Por
exemplo, Dom Juan, quer dizer que uma vez que o homem aprenda a ver, tudo no mundo passa a ser sem valor? 
- Eu não disse sem valor. Falei sem importância. Tudo é igual, e dessa forma sem importância. Por exemplo, não há meio de eu dizer
que meus atos sejam mais importantes do que os seus, ou que uma coisa seja mais essencial do que outra; e, portanto, todas as coisas
são iguais, e sendo iguais são sem importância. 
Perguntei-lhe se suas declarações eram uma afirmação de que o que ele chamara de "ver" era realmente um "meio melhor" do que
apenas "olhar para as coisas". Ele disse que os olhos do homem podiam desempenhar ambas as funções, mas que nenhuma das duas
era melhor do que a outra; no entanto, treinar os olhos apenas para olhar, para ele, era um desperdício desnecessário. 
- Por exemplo, precisamos olhar com nossos olhos para rir - disse ele - porque só quando olhamos para as coisas é que pegamos o lado
engraçado do mundo. Por outro lado, quando os nossos olhos vêem, tudo é tão igual que nada é engraçado. 
- Quer dizer, Dom Juan, que o homem que vê nunca pode rir? 
Ficou calado por algum tempo. 
- Talvez haja homens de conhecimento que nunca riem falou. - Mas não conheço nenhum. Aqueles que eu conheço vêem e olham, de
modo que riem. 
- Um homem de conhecimento também pode chorar? 
- Suponho que sim. Nossos olhos olham, de modo que podemos rir, ou chorar ou regozijar-nos, ou ficar tristes, ou felizes. Pessoalmente
não gosto de ficar triste, de modo que sempre que presencio alguma coisa que normalmente me entristeceria, limito-me a mudar meus
olhos e vejo a coisa, em vez de simplesmente olhar para ela. Mas quando encontro alguma coisa engraçada, eu olho e rio.” 
X
Há muitos homens de conhecimento que fazem isso - falou. - Um dia eles podem simplesmente desaparecer. As pessoas podem pensar
que eles caíram numa emboscada e foram mortos por causa de seus atos. Preferem morrer porque não se importam. Por outro lado,
prefiro viver e rir, não porque importe, mas porque essa escolha é de minha natureza. O motivo por que digo que prefiro, é que eu
vejo, mas não é que prefira viver; minha vontade me faz continuar a viver a despeito de tudo o que eu possa ver. Você não me está
entendendo agora por causa de seu hábito de pensar enquanto pensa. 
Essa declaração me intrigou muito. Pedi que ele explicasse o que queria dizer. Repetiu a mesma frase várias vezes, como que se dando
tempo para arrumá-la em termos diferentes, e depois expôs seu argumento, afirmando que, por "pensar", ele queria dizer a idéia
constante que temos de tudo no mundo. Disse que "ver" eliminava esse hábito e até eu aprender a "ver" eu não podia realmente
compreender o que ele queria dizer. 
- Mas se nada tem importância, Dom Juan, por que importa que eu aprenda a ver? 
- Já lhe disse uma vez que nosso destino como homem é aprender, para melhor ou pior - afirmou. - Aprendi a ver e lhe digo que nada
realmente importa. Agora é sua vez. Talvez algum dia você aprenda a ver e então saberá se as coisas importam ou não. Para mim nada
importa, mas talvez para você tudo importará. Você já devia saber que um homem de conhecimento vive pelos atos, não por pensar
nos atos, e não por pensar no que vai pensar depois que acabar de agir. Um homem de conhecimento escolhe um caminho de coração
e o segue; e depois olha e se regozija e ri; e então ele vê e sabe. Sabe que sua vida terminará muito depressa; sabe que ele, como
todos os outros, não vai a parte alguma; sabe, por que vê, que nada é mais importante do que qualquer outra coisa. Em outras
palavras, um homem de conhecimento não tem honra, nem dignidade, nem família, nem nome, nem prática, mas apenas a vida a ser
vivida, e, nessas circunstâncias, sua única ligação com seus semelhantes é sua loucura controlada. Assim, o homem de conhecimento
se esforça, transpira e bufa; e, se se olhar para ele, parece um homem comum, só que tem que a loucura de sua vida está controlada.
Como nada é mais importante do que outra coisa qualquer, um homem de conhecimento escolhe qualquer ato e age como se lhe
importasse. Sua loucura controlada o leva a dizer que o que ele faz importa e o faz agir como se importasse, e no entanto ele sabe que
não é assim; de modo que, quando pratica seus atos, ele se retira em paz, e quer seus atos sejam bons ou maus, dêem certo ou não,
isso não o afeta de todo. 
"Um homem de conhecimento pode preferir, por outro lado, permanecer totalmente impassível e nunca agir, e comportar-se como se
ser impassível realmente lhe importasse; ele também será sincero agindo assim, pois isso também seria sua loucura controlada”
X
Você pensa em seus atos - falou. - E, portanto, tem de acreditar que seus atos são tão importantes quanto você pensa que são,
quando, na realidade, nada do que se faz é importante. Nada! Mas então, se nada importa realmente, conforme você me perguntou,
como posso continuar a viver? Seria mais simples morrer; é isso que você diz e acredita, pois está pensando na vida, assim como agora
está pensando em como seria ver. Queria que eu o descrevesse para você para poder começar a pensar a respeito, assim como faz com
tudo o mais. No caso de ver, contudo, pensar não é a questão, em absoluto, de modo que não lhe posso dizer como é ver. Agora, quer
que eu descreva os motivos de minha loucura controlada, e só lhe posso dizer que a loucura controlada é muito parecida com ver: é
uma coisa sobre a qual não se pode pensar. 
Ele bocejou. Deitou-se de costas e esticou os braços e as pernas. Os ossos de1e estalaram. 
- Esteve fora muito tempo - disse ele. - Você pensa demais. 
Levantou-se e foi para o chaparral espesso ao lado da casa. Alimentei o fogo, para conservar a panela fervendo. Já ia acender um
lampião de querosene, mas a penumbra era muito calmante. O fogo do fogão, que dava luz suficiente para eu escrever, também criava
uma luminosidade vermelha em volta de mim. Larguei minhas notas no chão e deitei-me. Estava cansado. De toda essa conversa com
Dom Juan, a única coisa pungente em meu espírito era que ele não ligava para mim; aquilo me perturbou muito. Durante vários anos,
eu depositara confiança completa nele. Se não tivesse essa confiança, eu teria ficado paralisado de medo com a idéia de aprender o
conhecimento dele; a premissa em que eu baseara minha confiança era a idéia de que ele me apreciava pessoalmente; na verdade, eu
sempre o temera, mas controlava meu medo porque confiava nele. Quando tirou aquela base, fiquei sem nada para me apoiar e senti-
me desamparado.” 
X
Falei a Dom Juan que meu conflito era oriundo das dúvidas suscitadas pelas palavras dele a respeito da loucura controlada. 
- Se nada importa realmente - disse eu - ao se tornar um homem de conhecimento, a pessoa se encontrará forçosamente tão vazia
quanto meu amigo, e numa situação nada melhor. 
- Isso não é verdade - replicou Dom Juan, num tom cortante. - Seu amigo está solitário porque há de morrer sem ver. Em sua vida,
apenas envelheceu e agora tem de ter mais pena de si ainda do que antes. Sente que jogou fora 40 anos porque andou atrás de
vitórias e só encontrou derrotas. Nunca há de saber que ser vitorioso e ser derrotado são a mesma coisa. 
"Então, agora tem medo de mim porque eu lhe disse que você é igual a tudo o mais. Está sendo infantil. Nosso destino como homens é
aprender e a gente procura o conhecimento como vai para a guerra; já lhe disse uma centena de vezes. Vai-se ao conhecimento ou à
guerra com medo, com respeito, sabendo que se vai à guerra, e com uma confiança absoluta em si mesmo. Deposite sua confiança em
si, não em mim”. 
"E então você teme o vazio da vida de seu amigo. Mas não existe vazio na vida de um homem de conhecimento, posso garantir--lhe.
Tudo está cheio até à borda”. 
Dom Juan levantou-se e esticou os braços, como se estivesse tocando em coisas no ar. 
"Tudo está cheio até à borda - repetiu ele - e tudo é igual. 
Não sou como seu amigo que apenas envelheceu. Quando lhe digo que nada importa, não o digo do jeito que ele o faz. Para ele, sua
luta não valeu a pena porque ele foi vencido; para mim não há vitória, nem derrota, nem vazio. Tudo está cheio até à borda; tudo é
igual, e minha luta valeu a pena”. 
"A fim de se tornar um homem de conhecimento, a pessoa tem de ser um guerreiro, não uma criança choramingas. E preciso lutar sem
desistir, sem reclamar, sem hesitar, até ver, só para compreender então que nada importa.” 
X
Você se preocupa demais em gostar das pessoas ou em pensar se gostam de você - falou. - Um homem de conhecimento gosta e
pronto. Gosta daquilo ou da pessoa que quer, mas utiliza sua loucura controlada para não se preocupar com isso. O oposto do que você
está fazendo agora. Gostar das pessoas ou ser apreciado por elas não é tudo o que se pode fazer, como homem. 
. Ficou olhando fixamente para mim, com a cabeça inclinada para um lado. 
- Pense nisso - disse ele. 
- Há mais uma coisa que desejo perguntar, Dom Juan. Você falou que temos de olhar com nossos olhos para rir, mas acredito que
rimos porque pensamos. Veja um cego, ele também ri. 
- Não - respondeu. - Os cegos não riem. Seus corpos estremecem um pouco com o riso. Nunca viram a parte engraçada do mundo, e
têm de imaginá-la. O riso deles não é uma gargalhada. 
Não conversamos mais. Eu tinha uma sensação de bem-estar, de felicidade. Comemos em silêncio; depois, Dom Juan começou a rir. Eu
estava usando um galho seco para pôr os legumes na boca.” 
X
Como é que um homem de conhecimento pratica a loucura controlada, quando se trata da morte de uma pessoa que ele ama? 
Dom Juan foi colhido de surpresa por minha pergunta e olhou para mim de modo estranho. 
- Veja seu neto, Lucio, por exemplo - disse eu. – Seus atos seriam loucura controlada, no momento da morte dele? 
- Veja meu filho Eulálio, é um exemplo melhor - respondeu Dom Juan, calmamente. - Foi esmagado pelas pedras quando trabalhava na
construção da Estrada de Rodagem Pan-Americana. Meus atos para com ele no momento de sua morte foram loucura controlada.
Quando cheguei à área das explosões, ele estava quase morto, mas o corpo dele era tão forte que continuava a se mexer e dar
pontapés. Fiquei diante dele e disse aos rapazes da turma da estrada para não mexerem mais nele; obedeceram-me e ficaram ali em
volta de meu filho, olhando para o corpo estraçalhado. Também fiquei ali, mas não olhei. Desviei os olhos para poder ver sua vida
pessoal se desintegrando, expandindo-se incontrolavelmente além de seus limites, como uma neblina de cristais, pois é assim que a
vida e a morte se misturam e expandem. Foi o que fiz no momento da morte de meu filho. E só isso que se poderia fazer, e isso é
loucura controlada. Se eu tivesse olhado para ele, teria visto que ele ficava imóvel e teria sentido um grito dentro de mim, pois nunca
mais havia eu de ver sua bela figura andando pela terra. Em vez disso, eu vi a morte dele, e não houve tristeza, nem sentimento
algum. Sua morte foi igual a tudo o mais. 
Dom Juan foi calado por algum tempo. Parecia triste, mas depois sorriu e bateu na minha cabeça.
- Por isso você pode dizer que, quando se trata da morte de uma pessoa que eu amo, minha loucura controlada consiste em desviar o
olhar. 
Pensei nas pessoas que eu mesmo amo e uma onda de autocomiseração terrivelmente opressiva me envolveu. 
- Sorte a sua Dom Juan - falei. - Pode desviar o olhar, mas eu só posso olhar. 
Ele achou graça naquilo e riu. 
- Sorte, uma bosta! É trabalho duro.” 
X
Se entendi corretamente, Dom Juan, os únicos atos na vida de um homem de conhecimento que não são loucura controlada são
aqueles que ele pratica com seu aliado ou com Mescalito. Certo? 
- Certo - respondeu, rindo. - Meu aliado e Mescalito não estão num plano de igualdade conosco, os seres humanos. Minha loucura
controlada só se aplica a mim e aos atos que pratico quando em companhia de meus semelhantes. 
- No entanto, é uma possibilidade lógica - falei - pensar que um homem de conhecimento também considera seus atos com seu aliado
ou com Mescalito como loucura controlada, não é verdade? 
Olhou-me por um momento. 
- Você está pensando outra vez - disse ele. - Um homem de conhecimento não pensa e, portanto, não pode encontrar essa
possibilidade. Veja meu caso, por exemplo. Digo que minha loucura controlada aplica-se aos atos que pratiquei em companhia de meus
semelhantes; digo isso porque eu posso ver meus semelhantes. No entanto, não posso ver através de meu aliado e isso torna a coisa
incompreensível para mim; dessa forma, como poderia eu controlar minha loucura se não vejo através dele? Com meu aliado ou com
Mescalito sou apenas um homem que sabe ver e que fica confuso com o que vê; um homem que sabe que nunca há de compreender
tudo o que o cerca. 
"Veja seu caso, por exemplo. A mim não importa que você se torne um homem de conhecimento ou não; no entanto, isso importa a
Mescalito. Obviamente, importa a ele, senão não faria tanta coisa para mostrar seu interesse por você. Observo o interesse dele e ajo
nesse sentido, no entanto seus motivos me são incompreensíveis." 
X
Seja bem-vindo à minha humilde cabana - disse ele, em tom de desculpas, em espanhol. 
As palavras dele eram uma expressão cortês que eu já ouvira em várias regiões rurais do México. No entanto, ao pronunciá-las, ele
sorriu alegremente, por nenhum motivo aparente, e eu sabia que ele estava pondo em prática a sua loucura controlada. Não se
importava a mínima que sua casa fosse uma cabana. Gostei muito de Dom Genaro.” 
X
Na arte de espreitar - continuou Don Juan - há uma técnica que os feiticeiros usam muito: loucura controlada. Segundo eles, a loucura
controlada é a única maneira que têm de lidar consigo mesmos, em seu estado de consciência e percepção expandidas, e com todos e
tudo no mundo dos afazeres diários. 
Don Juan explicou a loucura controlada como a arte do engano controlado ou a arte de fingir estar profundamente imerso na ação -
fingindo tão bem que ninguém pudesse distingui-lo da coisa real. A loucura controlada não é um engano direto, mas um modo
sofisticado, artístico, de estar separado de tudo permanecendo ao mesmo tempo uma parte de tudo. 
- A loucura controlada é uma arte - continuou Don Juan. - Uma arte que causa muitas preocupações, e muito difícil para se aprender.
Muitos feiticeiros não suportam isso, não porque haja alguma coisa inerentemente errada com a arte, mas porque é preciso muita
energia para exercê-la. 
Don Juan admitiu que a praticava conscienciosamente, embora não gostasse particularmente de fazê-lo, talvez porque seu benfeitor
fosse tão adepto a ela. Ou talvez fosse porque sua personalidade - que ele disse ser basicamente tortuosa e mesquinha - simplesmente
não tinha agilidade necessária para praticar a loucura controlada. 
Olhei para ele com surpresa. Parou de falar e fixou-me com seus olhos maliciosos. 
- Na época em que chegamos à feitiçaria, nossa personalidade já está formada - disse, e encolheu os ombros em sinal de resignação -,
e tudo que podemos fazer é praticar a loucura controlada e rir de nós mesmos. 
Senti uma onda de empatia e assegurei-lhe que para mim ele não era de modo algum mesquinho ou tortuoso. 
- Mas esta é minha personalidade básica - insistiu. E eu retruquei que não era. 
- Os espreitadores que praticam a loucura controlada acreditam que, em questão de personalidade, a raça humana inteira entra em três
categorias - disse ele, e sorriu da maneira que sempre fazia quando estava me preparando algo.” 

Lei dos SETE

Um dos documentos mais antigos e obscurosque a Humanidade conhece, a Tábua de Esmeralda, é atribuída pela tradição
ocultista ocidental a Hermes Trismegistos, um outro mito que poderia ser o deus Hermes, Thot,  um grande mago, ou um
sacerdote egípcio.

Ela começa dizendo que “O que está embaixo é como o que está em cima, e o que está em cima é igual o que está
embaixo, para realizar os milagres da Coisa Única”. É a solene afirmação, que o ser humano esqueceu, de que “tudo está
ligado”, e pertence á Unidade. No Cristianismo primitivo, a "queda do Paraíso" é o símbolo desse esquecimento, ao "comer o
fruto da Árvore do Bem e do Mal", da dualidade.

A aplicação prática disso para a busca interior da nossa evolução é que o estudo do homem deve se desenvolver
paralelamente ao estudo do mundo, do Universo que nos rodeia. As leis são as mesmas, atuam igualmente no homem e no
mundo, e são poucas. Às vezes é mais fácil observar no homem, às vezes no mundo, dependendo do caso, e extrapolar de um
para o outro. Como já dissemos na publicação da primeira lei do Universo, a Lei de Três, diferentes combinações numéricas
de poucas forças criam uma variedade aparentemente grande e confusa de fenômenos, e é preciso decompô-los nessas forças
elementares: Positiva, Negativa e Harmonizante, ou o nome que se queira dar a elas.

A segunda lei fundamental do Universo é a Lei de Sete, ou Lei de Oitava, conhecida em todas as tradições autênticas. Para
entender o significado dessa lei é preciso compreender que “Tudo no Universo consiste de vibrações” que se processam em
todo o tipo de matéria e energia a partir de várias fontes, se desenvolvendo e indo em várias direções, influenciando umas às
outras. Esse "tudo" significa: objetos, fatos, eventos, seres, processos, períodos, fenômenos...esquecemos algo?

A lei ancestral, passada de mestre a aluno entre as escolas genuínas, foi reapresentada no século passado por Ouspensky-
Gurdjieff de uma forma nova, associada às vibrações das 7 notas musicais, porque por serem vibrações, se
prestam didaticamente muito bem  à compreensão dessa lei cósmica, que se aplica a tudo. A lei antiga também afirma o
“princípio da descontinuidade da vibrações”. Elas são “não uniformes”, com aceleração e retardamento tanto na escala
ascendente como descendente de qualquer fenômeno, ao contrário do conceito ocidental, que ignora o fenômeno. 
Vamos imaginar uma linha de vibrações cuja   freqüência (nº de vibrações) aumenta  de 1000 para o dobro. Há dois lugares
onde ocorre um retardamento. Um perto do início e outro perto do fim. Assim:

   1000 vezes                                                                        2000

    |__________ * _______________________________* ______|

Essa linha é dividida em 7 partes desiguais e é chamada de oitava. Em tempos muito antigos essa fórmula foi aplicada à
música, obtendo-se a escala de 7 tons, depois esquecida e redescoberta. A mesma lei aplica-se às vibrações de todas as
espécies alem da música: ao espectro da luz, calor, vibrações magnéticas, químicas, etc. A tabela periódica dos elementos
químicos, do russo Mendeleiev, está ligada à oitava embora essa relação ainda não foi completamente aclarada pela ciência
ocidental.

Vamos chamar agora, para simplificar, os extremos dessa linha (1 e 2), de duas notas “dó”. Entre elas temos a oitava. A
freqüência de elevação das vibrações entre as notas desses dois extremos quando se dobra a frequência das vibrações,
comporta-se de forma desigual até atingir o dobro. Assim:

   dó      ré       mi       fá      sol          lá        si     dó                                                                                   

   |_____|_____|_____|_____|_____|_____|_____|

   1       9/8      5/4     4/3     3/2      5/3     15/8      2

Para ficar mais claro ainda o que acontece, vamos dividir a freqüência de uma nota pela da nota anterior para ver o quanto
"acelera" a progressão das frequências entre uma nota e outra:
Intervalos Frequência Aceleração Aceleração
(frac. ord.) (frac. dec.)

Do a Ré 9/8 : 1  = 9/8 1,125

Ré a Mi 5/4 :9/8 10/9 1,111

Mi a Fá 4/3 :5/4 16/15 1,067 retardamento

Fá a Sol 3/2 :4/3 9/8 1,125

Sol a Lá 5/3 : 3/2 10/9 1,111

Lá a Sí 15/8 :5/3 9/8 1,125

Si a Dó 2 : 15/8 16/15 1,067 retardamento

Na escala da música, a diferença de altura das notas é chamado “intervalo” e existem três tipos de intervalos na oitava: 9/8.
10/9, e 16/15, este último que é o menor, encontra-se entre Mi-Fá e Si-Dó. É aqui que a oitava se retarda. 

Se você olhar o teclado do piano, vai ver que são os dois lugares onde falta um semitom, não tem a tecla preta entre as
brancas. Em vez de 14 notas, a oitava só tem 12. Alguém deveria ter percebido isto (rsrs) e dito: “Há algo errado no
Universo”. Ou “Há algo errado com as vibrações”, sei lá... Mas os antigos no Oriente já sabiam de tudo,  nós no Ocidente é
que não aprendemos.

Já na escala cósmica, só esses dois casos (Mi-Fá e Si-Dó) são chamados “intervalos”.

No retardamento das vibrações, a oitava que começou numa linha retado-ré-mi, em direção ao seu objetivo, desviou-se no
intervalo mi-fá e mudou de direção, e depois em si-dó mudou de novo. E vai indo, vai indo e mudando de direção em cada
intervalo... Se o fenômeno era uma idéia, um projeto, um namoro, um empreendimento, depois de um tempo a direção já é
contrária à do começo. No final, frequentemente o fenômeno em vez de atingir o objetivo desejado, voltou ao ponto inicial.
Mas o ser humano, em sono profundo, não se aperta: " - São apenas circunstâncias e está tudo sob controle". Brincadeira...
A Lei de Sete dá uma nova visão da vida, da manifestação dos fenômenos, do progresso, desenvolvimento: o porquê não há
linhas retas na Natureza e na vida da gente; porque tudo “sucede”; porque o entusiasmo inicial por algo ou alguém é sempre
mecânicamente substituído por cansaço, aborrecimento, preguiça, dogmatismo, mudanças imprevistas, e o resultado é
geralmente diferente do que esperávamos. Em todas as atividades humanas, literatura, filosofia, artes, ciência, religião,
depois de um tempo as coisas se degeneram e se transformam até no seu contrário, e às vezes mantendo o mesmo nome
inicial. Como se explica que o amor descrito nos Evangelhos no início do Cristianismo, transformou-se, na fase da Igreja, na
terrível Inquisição na Europa? Como povos europeus “cristãos” dizimaram culturas indígenas americanas? Como a
mensagem inicial amorosa de Maomé se transformou no radicalismo islâmico?
A Lei de Sete explica basicamente três coisas: o desvio de forças, o fato de que nada fica sempre no mesmo lugar, e o fato de
que tudo flutua, sobe ou desce, no desenvolvimento das oitavas. Nada pode permanecer no mesmo nível: ou evolui ou
degenera, é só esperar. Então é preciso um esforço para se compreender o papel dos "intervalos" na manifestação das oitavas.

A Ciência Antiga conhecia tudo isso: o mito da criação em seis períodos com um sétimo para descanso; e a divisão do tempo
em semanas de seis dias de trabalho intercalados com um domingo, relacionando e harmonizando a atividade corriqueira da
vida com a lei geral do Universo.

Só nas oitavas de ordem cósmica ascendentes ou descendentes, as vibrações ocorrem de maneira ordenada e conseqüente,
mantendo a direção tomada na partida, pois uma inteligência de nível superior conhece as forma de aplicar nos intervalos um
“choque adicional” que mantém a direção original. Mas há diferenças entre as oitavas ascendentes e descendentes quanto aos
intervalos. Talvez falemos disso.

No jogo da roleta a gente sabe quando perdeu ou ganhou, mas na vida, os choques adicionais acidentais frequentemente dão
a falsa ilusão de que as coisas correm em linha reta, e de que o homem está no comando, mas esse “homem-máquina” está de
fato controlado pelo acaso, fora e dentro dele mesmo. "O verdadeiro controle das coisas exteriores começa de fato pela
compreensão interior de cada um de nós mesmos. Um ser humano que não compreende o que se passa dentro de si, não
pode controlar nada".

 Um guerreiro procede estrategicamente, conhece a arte de lutar sem lutar, de se defender
apenas se protegendo. Mas se resolver atacar, seu toque será tão pesado como de uma
montanha.

- Adaptabilidade. O guerreiro muda sua maneira de ser tantas vezes quantas forem
necessárias. Ele conhece a arte da adaptação e se molda facilmente ao meio.

- Um guerreiro respeita as forças que dirigem nossas vidas e nossas mortes. Ele nunca pensa
que sua vida vai durar para sempre, sabe que a morte está somente a um braço de distância,
assim como tem sempre presente a morte como conselheira.

- Agirá não só como o caçador que deve conhecer os hábitos de sua presa, mas também
saberá que há forças neste mundo que regem a vida dos homens, dos animais e tudo o que é
vivo. O que você chama de sonho, para um guerreiro é real. O que você chama de vida, para
um guerreiro é somente um sonho e como sabe que um sonho é só uma ilusão passageira,
não será um tolo. Caçará a sabedoria pois ela é a fonte de poder. Pois assim não terá tempo
nem vontade de fingir, de mentir a si mesmo ou dar um passo equivocado. Sabe que o tempo
é muito precioso para isso.

- Serenidade e uma quietude controlada são as marcas de um guerreiro. Assim ele será
guiado por um propósito inflexível podendo facilmente vencer quaisquer desafios.

- Procurar perfeição e harmonia do espírito, do corpo e da mente é o único empreendimento


que o guerreiro considera digno. Esta disposição exigirá controle sobre si e, ao mesmo
tempo, sentimento de entrega total a vida e as coisas da vida. Seu cálculo será preciso e isso é
controle. Mas, uma vez terminados seus cálculos, ele age, entrega-se. Isso é desapego. Um
guerreiro não é uma folha ao vento. Ninguém pode empurrá-lo; ninguém pode obrigá-lo a
fazer coisas contra si ou contra o que considera errado.

- Um guerreiro pode ser ferido, mas não ofendido. Para um guerreiro não há nada ofensivo
nos atos de seus semelhantes, enquanto ele estiver agindo dentro da disposição correta.

- O homem é apenas a soma de seu poder e modo de ser pessoal e a soma de ambos
determina como ele vive e como ele morre. O segredo disto reside não no que você faz
consigo, mas no que você não faz. O procedimento do guerreiro é impecável.

- O guerreiro age em conformidade com as Leis Universais e está em harmonia com o mundo
e com o Universo, ele sabe porque pratica e vivencia de corpo e alma tudo que aprende. Já o
fraco procura justificar tudo no mundo com explicações vazias de que não tem certeza e que
jamais vivenciou. Assim aprendemos a agir como um guerreiro agindo, não falando.

- Uma regra simples: o guerreiro sabe que está esperando e o que está esperando. Enquanto
espera, não precisa de nada e assim qualquer coisa que ele receba é mais do que pode
esperar.

- Um guerreiro tem de usar a vontade e a paciência para esquecer. Na verdade, um guerreiro


só tem a sua vontade e a sua paciência e com elas constrói o que quiser. A vontade é o que
pode fazê-lo vencer quando seus pensamentos lhe dizem que está vencido. A paciência é o
que o torna invulnerável, afinal quem teme perder já está vencido.

- Com a consciência em sua morte, com seu desprendimento e com o poder de suas decisões,
um guerreiro organiza a sua vida de maneira estratégica. O conhecimento de sua morte o
orienta e o torna desprendido e secretamente sensual. O poder de suas decisões finais o
torna capaz de escolher sem remorsos e o que ele escolhe é sempre estrategicamente o
melhor. Assim ele executa tudo o que precisa com sua vontade e com uma eficiência sensual.

- A vida para um guerreiro é um exercício de estratégia. Um guerreiro não se importa com o


significado de sua vida, porquanto que seja um aprendiz da adaptabilidade e da
impecabilidade do ato. Suas ações jamais são fúteis, nem tem pressa para aquilo que precisa
ser bem trabalhado. Mantém o foco de sua mente em todas as suas atividades, sem carregar
fardos que não irá suportar, mas somente aqueles que compreende que irá superar. Ele só
deve estar preparado para combater, sem caprichos nem reclamações, nem espera vencer,
nem espera perder, pois na perda ou na vitória sempre haverá uma lição. O espírito do
guerreiro só é dado à luta e cada embate será como a última batalha na Terra. Assim, o
resultado lhe importa muito pouco. Em sua última batalha na Terra, o guerreiro deixa seu
espírito morrer, livre e claro. E enquanto trava sua batalha, sabendo que sua vontade é
impecável, o guerreiro vê-se envolto sempre numa grande batalha. Suavidade se interpõe as
durezas de seu aprendizado, afinal são as brisas que perfumam seu mundo. A flexibilidade
do galho da árvore permite que a neve caia ao chão. Suavidade e flexibilidade, eis a chave!

- Preocupe-se e pense antes de tomar qualquer decisão, porém, uma vez tomada, siga seu
caminho livre de preocupações e pensamentos; haverá mil outras decisões ainda à sua
espera. É assim a maneira do guerreiro. Esvaziar sua mente quando as coisas se turvam.

- O guerreiro se faz feliz e assim, se faz forte. O homem comum se importa em saber se as
coisas são verdadeiras ou falsas, mas um guerreiro não, pois sabe que não existe nenhuma
verdade e nenhuma falsidade desde que exista a pureza do ato.

- Um guerreiro vive sua vida estrategicamente, não perde uma ínfima oportunidade que
aparece diante de seus olhos.

- Os guerreiros escolhem seu campo de batalha. Um guerreiro nunca entra na batalha sem
saber o que o cerca. Isto o capacita para uma faculdade infinita de improvisação.

- Um guerreiro aceita seu destino, seja qual for e o aceita na mais total humildade. Aceita
com humildade aquilo que ele é, não como fonte de pesar, mas como um desafio vivo. Não
curva a cabeça para ninguém, mas ao mesmo tempo não permite que pessoa alguma curve a
cabeça para ele.

-Um guerreiro tende a ser fluido e mudar em harmonia com o mundo que o rodeia, seja o
mundo da razão ou o mundo da vontade. Ser um guerreiro significa ser humilde e alerta. Sua
intenção é o portão do meio. Assim não se sentirá desamparado, nem confuso, nem
assustado em nenhuma circunstância. Muitos poucos estariam dispostos a escutar e dentre
esses poucos que escutam, um número ainda menor estaria disposto a agir, menos ainda têm
suficiente poder pessoal para aproveitar seus atos. Perca a importância própria, assuma a
responsabilidade e vise a morte como conselheira.

- A liberdade que tem um guerreiro é ou agir de modo impecável ou agir como idiota. A
impecabilidade é realmente o único ato que é livre e assim a verdadeira medida do espírito
do guerreiro.

- Um guerreiro reconhece sua dor, mas não se entrega a ela.

- A alegria de um guerreiro vem de ter aceitado o seu destino e ter avaliado lealmente o que o
espera. A tristeza pertence apenas àqueles que detestam aquilo mesmo que abriga seus seres.
Um guerreiro não procura nada para consolar-se. Um guerreiro nunca pode deixar nada ao
acaso; o guerreiro altera o resultado dos acontecimentos pela força de sua percepção e seu
propósito inquebrantável. Porém, não se decepciona quando não consegue mudar.

- Um guerreiro espreita qualquer coisa, inclusive a si mesmo, do mesmo modo que o caçador
espreita a caça, estuda seus hábitos até conhecer todas suas fraquezas e depois salta sobre
elas e as encarcera como coelhos dentro de uma gaiola. Seu poder não é focado naquilo que é
material , mas sim no seu espírito, que consiste no verdadeiro vôo ao desconhecido e não em
campos triviais. A capacidade da visão só ocorre quando o guerreiro consegue parar com o
diálogo interior. Aí, vivendo um controle e consciência completos, sem pressa nem
compulsão, ele faz o máximo para conseguir o equilíbrio. Nada há nesse mundo que não se
possa enfrentar, afinal um guerreiro já se considera morto, pois sabe que começou a morrer
a partir do dia que nasceu, de modo que nada tem a perder.
- Os guerreiros não conquistaram suas vitórias batendo com a cabeça de encontro aos muros
e sim, conquistando os muros, saltando sobre eles, sem destruí-los. Um guerreiro age como
se nada tivesse acontecido, porque não acredita em nada e no entanto aceita tudo pelas
aparências. Aceita sem aceitar e despreza sem desprezar. Nunca acha que sabe, nem sente
que nada aconteceu. Age como se estivesse...

- Um guerreiro deve abandonar a forma humana a fim de se modificar de verdade. Nada se


pode mudar se não se abandona a forma anterior. Um guerreiro sabe que não pode mudar
nada e então trata de mudar a si mesmo, assim a vantagem do guerreiro sobre o homem
comum, é que o guerreiro nunca se decepciona quando não consegue mudar. O importante
para um guerreiro é alcançar a totalidade de seu ser.

- A autoconfiança do guerreiro não é a mesma que a do homem comum. Este busca a certeza
aos olhos do espectador e chama a isso autoconfiança. O guerreiro busca a impecabilidade a
seus próprios olhos e chama a isso humildade. O homem comum está agarrado a seus
semelhantes, enquanto o guerreiro só se agarra a si mesmo.

- A diferença entre a autoconfiança do homem comum e a humildade do guerreiro é a


seguinte: "A confiança em si significa saber algo com certeza, a humildade significa ser
impecável em suas ações e sentimentos."

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