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Latine Português

[Prologus Sancti Thomae] [Prólogo De Santo Tomás]

Praecurre prior in “Sê o primeiro a correr


domum tuam, et illuc para tua casa e ali ocupa-
advocare et illic lude, et te de tuas concepções. Lá
age conceptiones tuas. invoca-as e diverte-te”
Eccl. XXXII, 15 - 16. (Eclesiástico 32, 15-16).

Habet hoc privilegium sapientiae studium, O estudo da sabedoria tem este privilégio, que
quod operi suo prosequendo magis ipsa sibi ela mesma lhe é mais que suficiente para expor a
sufficiat. In exterioribus enim operibus indiget sua atividade. De fato, nas obras exteriores o
homo plurimorum auxilio; sed in contemplatione homem necessita do auxílio de muitíssimas coisas.
sapientiae tanto aliquis efficacius operatur, Porém na contemplação da sabedoria, quanto
quanto magis solitarius secum commoratur. Et mais solitário consigo permaneça, mais
ideo Sapiens in verbis propositis hominem ad eficazmente alguém se ocupa dela. E por isso, nas
seipsum revocat, dicens: “Praecurre prior in palavras expostas, o sábio volta a chamar o
domum tuam”, idest ad mentem tuam ab homem para si mesmo, dizendo: “Sê o primeiro a
exterioribus sollicite redeas, antequam ab alio correr para tua casa”, isto é, regresse com
occupetur, per cuius sollicitudinem distrahatur: solicitude das coisas exteriores à tua mente, antes
unde dicitur Sapient., VIII, 16: “Intrans in domum que te ocupes de outras por cuja atenção seja
meam, conquiescam cum illa”, idest cum distraído, conforme se afirma em Sabedoria 8,16:
sapientia. Sicut autem requiritur ad “entrando em minha casa, repousarei com ela”,
contemplationem sapientiae quod mentem suam ou seja, com a sabedoria. Assim como a
aliquis praeoccupet, ut totam domum suam contemplação da sabedoria requer que alguém se
contemplatione sapientiae impleat; ita etiam apodere de sua mente para que preencha toda
requiritur quod ipse totus per intentionem sua casa com sua contemplação, assim também se
interius adsit, ne scilicet eius intentio ad diversa exige que todo ele esteja interiormente presente
trahatur: et ideo subdit: “Et illuc advocare”, idest pela atenção de maneira que sua atenção não seja
totam intentionem tuam ibi congrega. Sic igitur de fato atraída para outras coisas. Por isso
interiore domo totaliter evacuata, et homine adiciona: “Lá invoca-as”, isto é, concentra lá toda
totaliter per intentionem in ea existente, quid tua atenção. Assim, tendo esvaziado totalmente a
agendum sit exponit subdens, “Et illic lude”. Ubi casa interior e o homem nela existindo numa total
considerandum est, quod sapientiae contemplatio dedicação, expõe o que se deve fazer agregando
convenienter ludo comparatur, propter duo quae “e diverte-te”. Agora é necessário considerar que
est in ludo invenire. Primo quidem, quia ludus a comtemplação da sabedoria se relaciona
delectabilis est, et contemplatio sapientiae convenientemente com o jogo por duas coisas que
maximam delectationem habet: unde Eccl., XXIV, nele se encontram: em primeiro lugar porque o
27 dicitur ex ore sapientiae: “Spiritus meus super jogo é agradável e a contemplação da sabedoria
mel dulcis”. Secundo, quia operationes ludi non comporta o maior deleite, conforme se afirma em
ordinantur ad aliud, sed propter se quaeruntur. Et Eclesiástico 24, 27 por boca da sabedoria: “meu
hoc idem competit in delectationibus sapientiae. espírito é mais doce que o mel”. Em segundo lugar
Contingit enim quandoque quod aliquis apud porque as operações do jogo não estão ordenadas
seipsum delectatur in consideratione eorum quae a outras coisas, mas se buscam por si mesmas. E
concupiscit, vel quae agere proponit. Sed haec isto mesmo corresponde aos deleites da
delectatio ordinatur ad aliquid exterius, ad quod sabedoria. Porém, ocasionalmente sucede que
nititur pervenire: quod si deficiat vel tardetur, alguém se deleita consigo mesmo na consideração
delectationi huiusmodi adiungitur non minor de outras coisas que deseja ou que se propõe
afflictio, secundum illud Prov., XIV, 13: “Risus fazer. Mas este deleite se ordena a algo externo
dolore miscebitur”. Sed delectatio que se esforça por alcançar. Porém se acabar ou
contemplationis sapientiae in seipsa habet tardar, se adiciona a este tipo de deleite uma não
delectationis causam: unde nullam anxietatem menor aflição como se afirma em Provérbios 14,
patitur, quasi, expectans aliquid quod desit. 13: “o riso de misturará com a dor”. Mas o deleite
Propter quod dicitur Sap., VIII, 16: “Non habet da contemplação da sabedoria tem em si mesma
amaritudinem conversatio illius, nec taedium a causa da satisfação motivo pelo qual não se sofre
convictus illius”, scilicet sapientiae. Et ideo divina nenhuma ansiedade como quando se espera algo
sapientia suam delectationem ludo comparat, que falta. Por isso se diz em Sabedoria 8, 16: “a sua
Proverb., VIII, 30: “Delectabar per singulos dies, convivência não tem sabor amargo, nem o tédio a
ludens coram eo”: ut per diversos dies, diversarum sua intimidade”, a saber, a da sabedoria. E assim o
veritatum considerationes intelligantur. Unde et deleite da divina sabedoria está relacionado com
hic subditur: “Et illic age conceptiones tuas”, per o jogo, por isso em Provérbios 8, 30 afirma: “por
quas scilicet homo cognitionem accipit veritatis. dias e dias me deleitava jogando com ele”. De
modo que por diversos dias se apreciam as
considerações de diversas verdades. Por isso
agrega também isto: “e ali ocupa-te de tuas
concepções” pelas quais o homem evidentemente
adquire o conhecimento da verdade.

CAPITULUM I

[Textus Boetii] [Texto de Boécio]

QUOMODO SUBSTANTIAE IN EO QUOD SINT COMO AS SUBSTÂNCIAS SÃO BOAS NAQUILO QUE
BONAE SINT CUM NON SINT SUBSTANTIALIA SÃO, AINDA QUE NÃO SEJAM BENS
BONA, LIBER. Ad Ioannem Diaconum Ecclesiae SUBSTANCIAIS. Ao diácono João da Igreja de Roma
Romanae

Postulas ut ex Hebdomadibus nostris, eius Tu me pedes que, por meio de nossas


quaestionis obscuritatem quae continet modum Hebodômadas, mostre mais claramente e
quo substantiae in eo quod sint, bonae sint, cum disperse a obscuridade daquela questão que
non sint substantialia bona, digeram, et paulo concerne o modo como as substâncias são boas
evidentius monstrem. naquilo que são, ainda que não sejam bens
substanciais.
Idque eo dicis esse faciendum cum non sit E dizes que isso deve ser feito assim porque o
omnibus notum iter huiusmodi scriptionum. Tuus estilo destes escritos não é conhecido por todos.
vero testis ipse sum, quam haec vivaciter fueris Inclusive eu mesmo sou testemunha do modo tão
ante complexus. vivaz que tens abraçado estes [temas]
anteriormente.
Hebdomadas vero ego mihi ipse commentor, De fato, eu mesmo pondero as Hebdômadas e
potiusque ad memoriam meam speculata conservo estas considerações na minha memória
conservo quam cuiquam participo: quorum em vez de compartilhá-las com qualquer um
lascivia ac petulantia, nihil a ioco risuque patitur daqueles que o desenfreio e a insolência não
esse coniunctum. permitem que nada seja enlaçado sem jogo e
risadas.
Prohinc tu ne sis obscuritatibus brevitatis Portanto não sejas desfavorável às
adversus: quae cum sint arcani fida custodia, obscuridades da brevidade. Pois sendo
tamen id habent commodi quod cum his solis qui misteriosas, têm a vantagem de serem fiéis
digni sunt loquuntur. guardiãs [de um segredo], já que elas dialogam
somente com aqueles que são dignos.
Ut igitur in mathematica fieri solet, caeterisque Assim, como se costuma fazer na matemática
disciplinis, proposui terminos regulasque quibus e demais disciplinas, propus termos e regras dos
cuncta quae sequuntur efficiam. quais demonstrarei todas as coisas que se
derivam.
Communis animi conceptio est enuntiatio Uma concepção comum da mente é uma
quam quisque probat auditam. enunciação que, tendo ouvido, qualquer um
aprova.
Harum duplex modus est: Nam ita una Destas existem dois tipos: de fato, uma delas é
communis est, ut omnium sit hominum: veluti si tão comum que é própria de todos os homens
hanc proponas: “Si duobus aequalibus aequalia como, por exemplo, quando propões isto: “se de
auferas, quae relinquuntur, aequalia esse”; nullus duas coisas iguais diminuis porções iguais, o que
id intellegens neget. Alia vero est doctorum sobrará serão coisas iguais”. Ninguém que
tantum, quae tamen ex talibus communibus animi entenda o negará. Porém há outras que
conceptionibus venit, ut est “quae incorporalia pertencem somente aos instruídos, ainda que
sunt, in loco non esse”; et caetera, quae non procedam de tais concepções comuns da mente
vulgus, sed docti comprobant. como é [esta]: “aquelas coisas que são
incorpóreas, não estão em um lugar” e outras que
os instruídos comprovam, mas não a plebe.

[Thomae Aquinatis expositio] [Comentário de Tomás de Aquino]

Igitur, exercitationis, sectator Boetius in suis Sendo, pois, partidário desta prática, Boécio
contemplationibus librum nobis edidit, qui De nos produziu um libro sobre suas concepções que
Hebdomadibus dicitur, idest de editionibus: quia se chama “De Hebdomadibus”, isto é, “Sobre as
in Graeco “hebdomada” idem est quod edere. In Declarações”, pois em grego “hebdómada” é o
quo quidem libro Boetius duo facit. Primo enim mesmo que declarar. Assim, neste livro Boécio faz
praemittit prooemium; secundo procedit ad duas coisas: primeiro, preanuncia um proêmio.
operis tractatum, ibi, “Diversum est esse, et id Em segundo lugar, procede à discução da obra, ali
quod est”. onde afirma “Diverso é o ser e aquilo que é”.
Circa primum tria facit. Primo ostendit de quo Sobre primeiro faz três coisas: primeiro,
sit intentio; secundo quomodo sit tractandum, ibi, mostra qual é sua intenção. Segundo, como deve
“Idque eo dicis esse faciendum cum non sit tratá-la, alí [onde afirma] “E dizes que isso deve
omnibus notum iter huiuscemodi descriptionum”; ser feito assim porque o estilo destes escritos não
tertio tradit ordinem quo procedendum est, ibi, é conhecido por todos” Terceiro, apresenta a
“ut igitur in mathematica fieri solet”. ordem em que se deve proceder, ali [onde diz]
“Assim, como se costuma fazer na matemática”.
Scribit autem hunc librum ad Ioannem De fato, escreveu este livro ao diácono João da
diaconum Romanae Ecclesiae, qui ab eo petierat Igreja de Roma, que lhe havia pedido que
ut ex suis hebdomadibus, idest editionibus, discorresse e expusesse uma difícil questão sobre
dissereret, et exponeret quandam difficilem suas “hebdômadas”, isto é, declarações por meio
quaestionem, per quam solvitur quaedam da qual se resolve uma aparente contradição. Pois
apparens contrarietas. Dicitur enim, quod se afirma que as substâncias criadas, enquanto
substantiae creatae, inquantum sunt, bonae sunt; são, são boas, não obstante se diga que as
cum tamen dicatur, quod substantiae creatae non substâncias criadas não são bens substanciais,
sunt substantialia bona, sed hoc dicitur solius Dei mas isto se diz unicamente do próprio ser de Deus.
proprium esse. Quod enim convenit alicui Pois aquilo que convem a algo enquanto é, parece
inquantum est, videtur ei substantialiter que lhe convem substancialmente. E assim se as
convenire; et ideo si substantiae creatae, substâncias criadas, enquanto são, são boas,
inquantum sunt, bonae sunt, consequenter parece consequentemente que elas são bens
videtur quod sint substantialia bona. substanciais.
Deinde cum dicit, “Idque eo dicis esse Depois quando diz “E dizes que isso deve ser
faciendum, quod non sit omnibus notum iter feito assim porque o estilo destes escritos não é
huiuscemodi descriptionum”, ostendit per quem conhecido por todos”, mostra como quer tartar o
modum hic tradere velit, idest non plane, sed assunto, isto é, não de modo claro, mas obscuro.
obscure: et circa hoc tria facit. Primo ostendit E referente a isto faz três coisas: Primeiro mostra
quod intendit obscure dicere; secundo ostendit porque pretende falar de modo obscuro. Segundo
hunc modum esse sibi assuetum, ibi, mostra que este modo [de falar] lhe é familiar, ali
“Hebdomadas vero ego mihi ipse commentor”; [onde diz] “De fato, eu mesmo pondero as
tertio ostendit quod hic modus debeat ei esse Hebdômadas”. Em Terceiro lugar, mostra porque
acceptus, ibi, “Prohinc tu ne sis obscuritatibus este modo lhe deve ser aceito, ali onde diz:
brevitatis adversus”. “Portanto não sejas desfavorável às obscuridades
da brevidade”.
Dicit ergo primo, quod ille ad quem scribit Assim sendo, diz em primeiro lugar que aquele
haec, ita petebat praedicta esse scribenda, quod para o qual escreve estas coisas pedia que elas
via eorum quae hic scribenda sunt, non esset devessem ser escritas assim, pois o método delas
omnibus nota, qui non eodem desiderio ad haec não era conhecido por todos que não eram
afficiebantur quo ipse, cui Boetius testimonium influenciados pelo mesmo desejo que ele tinha
perhibet quod praedicta fuerit vivaciter ante para com elas. O próprio Boecio dá testemunho
complexus, idest vel perspicaciter intelligendo, vel dele, já que tais coisas foram de antemão
ferventer desiderando. vigorosamente abraçadas, ou seja, ao
compreendê-las com perspicácia ou deseja-las
com fervor.
Deinde cum dicit, “Hebdomadas vero ego mihi Depois quando diz “De fato, eu mesmo
ipse commentor”, ostendit hunc modum etiam pondero as Hebdômadas” mostra que este modo
sibi esse consuetum; et dicit, quod ipse solitus erat [de falar] também lhe é familiar. E diz que ele
sibi commentari, idest componere vel excogitare mesmo estava acostumado a meditar consigo, isto
quasdam hebdomadas, idest editiones, seu é, compor e inventar certas "hebdômadas", em
conceptiones, quas potius conservabat eas outras palavras, declarações ou concepções, as
considerans ad sui memoriam, quam participem quais preferia conservavá-las considerando em
eorum faceret aliquem illorum qui propter sui sua memória que comunicá-las a alguns daqueles
lasciviam, et petulantiam, idest luxuriam, et que por seu desenfreio e insolência, isto é, luxúria
levitatem, “nihil” aliud “a ioco et risu patiuntur e superficialidade, não suportam que se juntem
esse coniunctum”, id est ordinatum vel “nada” além “do jogo e das risadas”, ou seja, nada
constructum. Detestantur enim si quis aliquem ordenado e disposto corretamente. De fato,
sermonem coniunxerit aut ordinaverit non ad detestam se alguém junta e ordena um discurso
ludum, sed ad seria pertinentem. não para o jogo, mas àquilo que concerne aos
assuntos sérios.
Deinde cum dicit, “Prohinc tu ne sis Depois quando diz “Portanto não sejas
obscuritatibus brevitatis adversus”, concludit ex desfavorável às obscuridades da brevidade”,
praemissis, quod obscurum sermonem debeat conclui que a obscuridade do discurso deva ser
gratanter suscipere, utpote qui talem sermonem recebida de bom grado a partir do que foi exposto,
ipse petierat; et hoc est quod dicit: “prohinc”, quia tal como o próprio [João] havia solicitado. E é por
scilicet hoc fecisti, ne iter nostrarum esta razão que ele diz “por isso”. Pois de fato
descriptionum esset omnibus pervium, “ne sis fizeste isto de tal modo que o caminho das nossas
adversus”, idest contrarius, “obscuritatibus descrições não fosse acessível a todos. “Não sejas
brevitatis”, idest obscuritati praesentis libri, qui avesso” ou, em outras palavras, contrário às
est brevitati coniuncta. Ex hoc enim quod aliqua “obscuridades da brevidade”, isto é, à
breviter dicuntur, magis solent esse obscura. obscuridade do presente livro que está unida à
Obscuritas autem cum secretum fideliter brevidade. Pois, quanto mais brevemente
custodiat, hoc affert utilitatis quod loquitur algumas coisas são ditas, mais costumam ser
“solum cum illis qui digni sunt”, idest cum obscuras. Ademais, a obscuridade, ao guardar
intelligentibus et studiosis, qui digni sunt ad fielmente um segredo, traz isto de utilidade: “que
secreta sapientiae admitti. fala somente com aqueles que são dignos”, a
saber, com os inteligentes e dedicados, que são
dignos de serem admitidos aos segredos da
sabedoria.
Deinde cum dicit, “Ut igitur in mathematica Depois quando diz “Assim, como se costuma
fieri solet, caeterisque disciplinis, proposui fazer na matemática e demais disciplinas, propus
terminos regulasque quibus cuncta quae termos e regras dos quais demonstrarei todas as
sequuntur efficiam”, ostendit quo ordine sit coisas que se derivam”, mostra em qual ordem é
procedendum, utpote per ea quae sunt per se necessário proceder: evidentemente por meio da
nota: et circa hoc duo facit. Primo ponit ordinem aquelas coisas que são conhecidas por si mesmas
procedendi; secundo notificat illa ex quibus e sobre isto faz duas coisas. Em primeiro lugar,
procedere intendit, ibi, “Communis animi estabelece a ordem do procedimento. Em
conceptio est enuntiatio quam quisque probat segundo, da a conhecer aquelas coisas a partir das
auditam”. quais tem intensão de proceder alí [onde diz]
“Uma concepção comum da mente é uma
enunciação que, tendo ouvido, qualquer um
aprova”.
Dicit ergo primo, quod ipse intendit primo Portanto, diz em primeiro lugar que ele
proponere quaedam principia per se nota, quae pretende propor primeiramente certos princípios
vocat “terminos et regulas”. “Terminos” quidem, autoevidentes que chama de “termos e regras”.
quia in huiusmodi principiis stat omnium “Termos” porque, efetivamente, em tais
demonstrationum resolutio; “regulas” autem, princípios encontra-se a resolução de todas as
quia per eas dirigitur aliquis in cognitionem demonstrações. “Regras” porque por elas alguém
sequentium conclusionum. Ex huiusmodi autem é dirigido ao conhecimento das conclusões
principiis intendit concludere et facere nota omnia subsequentes. De tais princípios, pois, pretende
quae consequenter tractanda sunt, sicut fit in concluir e tornar conhecidas todas as coisas que,
geometria, et in aliis demonstrativis scientiis; quae consequentemente, devam ser tratadas, assim
ideo dicuntur disciplinae, quia per eas discipulis como se faz na geometria e em outras ciências
aggregatur scientia ex demonstratione quam demonstrativas que, por isto mesmo, se chamam
magister proponit. disciplinas, pois por elas se agrega aos discípulos o
conhecimento que o mestre propõe por meio da
demonstração.
Deinde cum dicit, “Communis animi conceptio Depois quando diz “Uma concepção comum da
est enuntiatio quam quisque probat auditam”, mente é uma enunciação que, tendo ouvido,
notificat principia per se nota: et primo per qualquer um aprova”, da a conhecer os princípios
definitionem; secundo per divisionem, ibi, “harum autoevidentes: primeiro por definição e, em
autem duplex est modus”. seguida, por divisão alí [onde diz] “Destas existem
dois tipos”.
Circa primum considerandum est, quod Sobre o primeiro, deve considerar-se que
huiusmodi principia, quae sunt termini, quia princípios deste gênero, que são termos, se
regulae demonstrationum sunt, vocantur chamam concepções comuns da mente por serem
communes animi conceptiones. Definit ergo animi as regras das demonstrações. Define, portanto,
conceptionem communem, dicens: “communis concepção comum da mente dizendo: “Uma
animi conceptio est enuntiatio quam quisque concepção comum da mente é uma enunciação
probat auditam”, idest quam quilibet approbat que, tendo ouvido, qualquer um aprova”, isto é,
statim ut eam audit. Aliae enim propositiones que qualquer um está de acordo quando a ouve.
quae his demonstrantur, non statim ex ipso auditu De fato, outras proposições que são
approbantur, sed oportet ut per alia aliqua fiant demonstradas por estas não se reconhecem de
nota. Hoc autem non est procedere in infinitum: imediato pelo mesmo fato serem ouvidas, mas
unde oportet pervenire ad aliqua quae statim per convém que algumas [proposições] se tornem
se sunt nota. Unde dicuntur communes animi conhecidas por outras. Contudo, isto não pode
conceptiones, et communiter cadunt in proceder ao infinito, daí que é necessário chegar a
conceptione cuiuslibet intellectus: cuius ratio est,
algumas [proposições] que sejam conhecidas por
quia praedicatum est de ratione subiecti; et ideo si mesmas de modo imediato. Por este motivo, são
statim nominato subiecto et intellecto quid sit, chamadas de concepções comuns da mente e
statim manifestum est praedicatum ei inesse. geralmente caem no entendimento de qualquer
intelecto. A explicação disto é que o predicado
está contido na razão do sujeito. E assim, logo que
o sujeito tenha sido nominado e entendido o que
ele seja, no mesmo momento fica claro o
predicado que lhe pertence.
Deinde cum dicit, “Harum autem duplex est Depois quando diz “Destas existem dois tipos”,
modus”, dividit praedicta principia, dicens, quod divide os princípios mencionados dizendo que o
praedictarum communium animi conceptionum modo dos predicados das concepções comuns da
duplex est modus. Quaedam enim animi mente é duplo. Pois certas concepções da mente
conceptiones sunt communes hominibus são comuns a todos os homens assim como esta:
omnibus; sicut ista: “Si ab aequalibus aequalia “se de coisas iguais, retiram-se coisas iguais o que
auferas, quae relinquuntur sunt aequalia”. Alia sobram são coisas iguais”. Porém, a outra
vero animi conceptio est communis solum doctis, concepção da mente é comum só para os doutos,
quae derivatur a primis animi conceptionibus, pois se deriva das primeiras concepções da mente
quae sunt omnibus hominibus communes: et comuns a todos como, por exemplo: “coisas
huiusmodi est: “incorporalia non esse in loco”, incorpóreas não podem estar em um lugar” que
quae non approbatur a vulgo, sed solum a não é aceita pelo vulgo, mas somente pelos
sapientibus. Huius autem distinctionis ratio est, sábios. A razão desta distinção é porque uma
quia cum communis animi conceptio, vel concepção comum da mente, ou princípio
principium per se notum, sit aliqua propositio ex evidente, é uma proposição em que o predicado
hoc quod praedicatum est de ratione subiecti; si pertence à noção do sujeito. Assim, se aquilo que
illud idem quod significatur per subiectum et é significado pelo sujeito e pelo predicado
praedicatum, cadat in cognitionem omnium; igualmente cai no entendimento de todos, se
consequens est quod huiusmodi propositio sit per segue que tal proposição é autoevidente para
se nota omnibus; sicut quid sit aequale, notum est todos. Dado que todos sabem o que é ser igual e,
omnibus, et similiter quid sit subtrahi; et ideo de modo semelhante, o que é subtrair, assim
praedicta propositio est omnibus per se nota. Et também dita proposição é conhecida por todos. E
similiter: “omne totum est maius sua parte”, et modo semelhante quando se diz que “o todo é
aliae huiusmodi. Sed ad apprehendendam rem maior que sua parte” e outras afirmações do
incorpoream solus intellectus sapientum mesmo gênero. Mas somete o intelecto dos sábios
consurgit; nam vulgarium hominum intellectus se eleva a compreensão de uma coisa incorpóra,
non transcendunt imaginationem, quae est solum pois os intelectos dos homens ordinários não
corporalium rerum; et ideo ea quae sunt propria transcendem a imaginação que é própria somente
corporum, puta, esse in loco circumscriptive, das coisas corporais. Por tal motivo, aquelas coisas
intellectus sapientum statim removet a rebus que são próprias dos corpos, como, a saber, estar
incorporeis; quod vulgus facere non potest. em um lugar circunscrito, o intelecto dos sábios de
imediato remove das realidades incorpóreas o
qual o vulgo não pode fazer.

CAPITULUM II

[Textus Boetii] [Texto de Boécio]

Diversum est esse, et id quod est. Diverso é o ser e aquilo que é.


Ipsum enim esse nondum est; at vero quod est, Pois o mesmo ser ainda não é, porém aquilo
accepta essendi forma, est, atque consistit. que é, tendo recebido a forma de ser, é e consiste.
Quod est, participare aliquo potest; sed ipsum O que é pode participar de algo, mas o mesmo
esse nullo modo aliquo participat. Fit enim ser de nenhum modo participa de algo. A
participatio, cum aliquid iam est. Est autem aliquid participação se da quando algo já é. Por outro
cum esse susceperit. lado, é algo quando tenha recebido o ser.
Id quod est, habere aliquid, praeterquam quod Aquilo que é pode ter algo além do que ele
ipsum esse, potest; ipsum vero esse nihil aliud mesmo é. Mas o mesmo ser não tem nada mais
praeter se habet admixtum. misturado além de si.
Diversum est tamen esse aliquid et esse aliquid Diverso é, no entanto, ser algo e ser algo
in eo quod est. naquilo que é.
Illic enim accidens, hic substantia significatur. Pois aquele significa o acidente, este, a
substância.
Omne quod est, participat eo quod est esse, ut Tudo o que é participa daquilo que é o ser para
sit. Alio vero participat ut aliquid sit. que seja. Entretanto participa de outra coisa para
que seja algo.
Ac per hoc id quod est, participat eo quod est E por isto aquilo que é participa daquilo que é
esse, ut sit. Est uero ut participet alio quolibet. o ser para que seja. Por outro lado, é para que
participe de qualquer outra coisa.
Omni composito aliud est esse, aliud ipsum est. Em todo composto, uma coisa é o ser e outra
coisa é ele mesmo.
Omne simplex, esse suum, et id quod est, Todo aquele que é simples tem o seu ser e
unum habet. aquilo que é como uma só coisa.
Omnis diversitas discors; similitudo vero Toda diversidade é contrastante; a
appetenda est. semelhança, em vez, deve ser desejada.
Et quod appetit aliud, tale ipsum naturaliter E aquele que deseja outro mostra que ele
esse ostenditur quale est illud hoc ipsum quod mesmo é por natureza tal como é aquilo mesmo
appetit. que apetece.
Sufficiunt igitur quae praemisimus: a prudente Em conclusão, são suficientes [os princípios]
vero rationis interprete suis unumquodque que preestabelecemos, pois cada uma destas
aptabitur argumentis. noções será aplicada aos argumentos pelo
intérprete prudente.

[Thomae Aquinatis expositio] [Comentário de Tomás de Aquino]

Supra boetius dixerat, hoc ordine se Boécio tinha dito acima que ele procederia
processurum ut prius praemitteret quosdam nesta ordem: antes colocaria certos termos e
terminos et regulas, ex quibus ad ulteriora regras a partir das quais procederia àquilo que
procederet; et ideo secundum ordinem vem depois. Assim, de acordo com a ordem
praetaxatum, primo incipit praemittere quasdam preestabelecida, primeiro começa por exprimir
regulas, sive conceptiones quasdam sapientum; certas regras ou concepções dos sábios. Segundo,
secundo ex illis incipit argumentari, ibi, “Quaestio a partir delas, começa a argumentar ali [onde diz]
vero huiusmodi est”. “Assim sendo, a controvérsia se apresenta da
seguinte maneira”.
Sicut ante dictum est, illae propositiones sunt Como se disse anteriormente, aquelas
maxime notae quae utuntur terminis quos omnes proposições são sumamente conhecidas porque
intelligunt. Ea autem quae in omni intellectu se usam termos que todos entendem. Aquelas
cadunt, sunt maxime communia; quae sunt ens, coisas que caem em qualquer intelecto são as
unum et bonum. Et ideo ponit hic boetius primo mais comuns, a saber: ente, uno e bem. E assim
quasdam conceptiones pertinentes ad ens; Boécio põe aqui certas concepções que se referem
secundo quasdam pertinentes ad unum, ex quo ao ente. Em segundo lugar, certas que pertencem
sumitur ratio simplicis et compositi, ibi, “Omni a uno, das quais se extraem as noções de simples
composito aliud est esse, aliud ipsum est”; tertio e composto ali [onde diz] “Em todo composto,
ponit quasdam conceptiones pertinentes ad uma coisa é o ser e outra coisa é ele mesmo”. Em
bonum, ibi, “Omnis diversitas discors”. terceiro lugar, certas concepções que se referem
ao bem ali [onde diz] “Toda diversidade é
contrastante”.
Circa ens autem consideratur ipsum esse quasi No referente ao ente, se considera o mesmo
quiddam commune et indeterminatum: quod ser como algo comum e indeterminado,
quidem dupliciter determinatur: uno modo ex determinando-se de duas maneiras: uma por
parte subiecti, quod esse habet; alio modo ex parte do sujeito que tem o ser e outro modo por
parte praedicati, utpote cum dicimus de homine, parte do predicado, tal como afirmamos sobre o
vel de quacumque alia re, non quidem quod sit homem, ou qualquer outra coisa, que ele não
simpliciter, sed quod sit aliquid, puta album vel somente é de modo simples, mas que é algo como
nigrum. Primo ergo ponit conceptiones quae branco ou negro. Portanto, primeiramente coloca
accipiuntur secundum comparationem esse ad id as concepções que se tomam segundo a relação
quod est; secundo ponit conceptiones quae do ser com aquilo que é. Em segundo lugar, coloca
accipiuntur secundum comparationem eius quod as concepções que se tomam conforme a relação
est esse simpliciter, ad id quod est esse aliquid, ibi, daquilo que é simplesmente ser com aquilo que é
“Diversum est tamen esse aliquid in eo quod est, algo ali onde diz “Diverso é, no entanto, ser algo e
et esse aliquid”. ser algo naquilo que é.”
Circa primum duo facit. Primo ponit No que diz respeito ao primeiro, faz duas coias:
differentiam eius quod est esse, ad id quod est; primeiramente estabelece a diferença daquilo que
secundo manifestat huiusmodi differentiam, ibi, é ser em relação com aquilo que é. Em segundo
“Ipsum enim esse nondum est”. lugar, manifesta esta diferença alí [onde diz] “pois
o mesmo ser ainda não é”.
Dicit ergo primo, quod diversum est esse, et id Portanto, diz primeiramente que é diverso o
quod est. Quae quidem diversitas non est hic ser e aquilo que é. Esta diversidade aqui não se
referenda ad res, de quibus adhuc non loquitur, refere às coisas, das quais ainda não está falando,
sed ad ipsas rationes seu intentiones. Aliud autem mas às próprias razões ou intenções. Uma coisa
significamus per hoc quod dicimus esse, et aliud denotamos por isto que dizemos ser e outra por
per id quod dicimus id quod est; sicut et aliud isto que dizemos aquilo que é. Assim como
significamus cum dicimus currere, et aliud per hoc denotamos uma coisa quando dizemos correr e
quod dicitur currens. Nam currere et esse outra por isto que se diz aquilo que corre. Pois
significantur in abstracto, sicut et albedo; sed correr e ser significam [algo] em abstrato assim
quod est, idest ens et currens, significantur sicut in como a brancura. Mas aquilo que é, ou seja, ente
concreto, velut album. e aquilo que corre significam [algo] em concreto
como branco.
Deinde cum dicit, “Ipsum enim esse nondum Depois quando diz “pois o mesmo ser ainda
est”, manifestat praedictam diversitatem tribus não é”, mostra a diversidade anunciada de três
modis. maneiras.
Quorum primus est, quia ipsum esse non Dasquais a primeira é que o mesmo ser não
significatur sicut ipsum subiectum essendi, sicut significa o mesmo sujeito do ser do mesmo modo
nec currere significatur sicut subiectum cursus: que tampouco o correr significa o sujeito da
unde, sicut non possumus dicere quod ipsum corrida. Daí que não podemos dizer que o mesmo
currere currat, ita non possumus dicere quod correr corra, como também não podemos dizer
ipsum esse sit: sed sicut id ipsum quod est que o mesmo ser seja. Mas aquilo que é, significa
significatur sicut subiectum essendi, sic id quod
[algo] como sujeito do ser, do mesmo modo aquilo
currit significatur sicut subiectum currendi: et ideo
que corre significa [algo] como sujeito do correr.
sicut possumus dicere de eo quod currit, sive de
Por esta razão, da mesma forma que podemos
currente, quod currat, inquantum subiicitur cursui
afirmar em realação àquele que corre, ou ao
et participat ipsum; ita possumus dicere quod ens,
corredor, que corre na medida em que se submete
sive id quod est, sit, inquantum participat actum
à corrida e participa dela, assim podemos dizer
essendi: et hoc est quod dicit: “ipsum esse que o ente, ou aquilo que é, é na medida em que
nondum est”, quia non attribuitur sibi esse sicut
participa do ato de ser. Por isso afirma que “o
subiecto essendi; sed “id quod est, accepta mesmo ser ainda não é”, porque não se atribui a
essendi forma”, scilicet suscipiendo ipsum actum
ele o ser como sujeito do ser. Porém “aquilo que
essendi, “est, atque consistit”, idest in seipso
é, tendo recebido a forma de ser”, a saber,
subsistit. Non enim ens dicitur proprie et per se,
recebendo o mesmo ato de ser “é e tem
nisi de substantia, cuius est subsistere. Accidentia
consistência”, em outras palavras, subsiste em si
enim non dicuntur entia quasi ipsa sint, sed mesmo. De fato, o ser não se diz propriamente e
inquantum eis subest aliquid, ut postea dicetur.
por si, senão da substância cuja característica
distintiva é subsistir. Pois os acidentes não se
dizem entes como se eles mesmos fossem, mas na
medida em que a substância é algo para eles eles
tal como se dirá mais adiante.
Secundam differentiam ponit ibi, “Quod est, A segunda diferença coloca ali [onde diz] “O
participare aliquo potest” quae quidem differentia que é pode participar de algo”. Tal diferença se
sumitur secundum rationem participationis. Est toma segundo a noção de participação, pois
autem participare quasi partem capere; et ideo participar é como tomar parte [de algo]. Portanto,
quando aliquid particulariter recipit id quod ad quando algo recebe de modo particular aquilo que
alterum pertinet, universaliter dicitur participare pertence a outro de modo universal, se diz
illud; sicut homo dicitur participare animal, quia participar dele. Da mesma maneira que o homem
non habet rationem animalis secundum totam se diz participar de animal, porque não possui a
communitatem; et eadem ratione socrates noção de animal em toda a sua generalidade. E
participat hominem; similiter etiam subiectum Pela mesma razão Sócrates participa de homem.
participat accidens, et materia formam: quia Da mesma forma o sujeito também participa dos
forma substantialis vel accidentalis, quae de sui acidentes e a matéria da forma, porque a forma
ratione communis est, determinatur ad hoc vel ad substancial ou acidental, que por sua razão é
illud subiectum; et similiter effectus dicitur comum, se determina para este ou aquele sujeito.
participare suam causam, et praecipue quando Igualmente o efeito se diz participar da sua causa,
non adaequat virtutem suae causae; puta, si principalmente quando não se equipara a força da
dicamus quod aer participat lucem solis, quia non sua causa como, por exemplo, quando dizemos
recipit eam in ea claritate qua est in sole. que o ar participa da luz do sol, porque não a
Praetermisso autem hoc tertio modo participandi, recebe com aquela claridade que está no sol. Com
impossibile est quod secundum duos primos exeção deste terceiro modo, é impossível que o
modos ipsum esse participet aliquid. Non enim mesmo ser participe de algo segundo os dois
potest participare aliquid per modum quo materia primeiros. Certamente não pode participar de
vel subiectum participat formam vel accidens: algo à maneira que a matéria ou o sujeito participa
quia, ut dictum est, ipsum esse significatur ut da forma ou do acidente, porque, como foi dito, o
quiddam abstractum. Similiter autem nec potest mesmo ser significa como algo abstrato.
aliquid participare per modum quo particulare Igualmente tampouco pode participar à maneira
participat universale: sic enim etiam ea quae in que o particular participa do universal. Assim,
abstracto dicuntur, participare aliquid possunt, pois, também aquelas coisas que se dizem em
sicut albedo colorem; sed ipsum esse est abstrato podem participar de algo como a
communissimum: unde ipsum quidem brancura da cor. Mas o mesmo ser é comuníssimo,
participatur in aliis, non autem participat aliquid por isto é participado em outras coisas, mas não
aliud. Sed id quod est, sive ens, quamvis sit participa de coisa alguma. Por outro lado, aquilo
communissimum, tamen concretive dicitur; et que é, ou o ente, ainda que seja comuníssimo, não
ideo participat ipsum esse, non per modum quo obstante se diz de modo concreto e por isso
magis commune participatur a minus communi; participa do mesmo ser, não pelo modo que o
sed participat ipsum esse per modum quo mais comum é participado pelo menos comum,
concretum participat abstractum. Hoc est ergo mas participa do mesmo ser pelo modo que o
quod dicit, quod “id quod est”, scilicet ens, concreto participa do abstrato. É isto, portando, o
participare aliquo potest; sed ipsum esse nullo que diz: que “aquilo que é”, ou seja, o ente pode
modo participat aliquo: et hoc modo probat ex eo participar de algo, mas o mesmo ser de nenhuma
quod supra dictum est, scilicet quod ipsum esse maneira participa em algo. Ele prova isto a partir
nondum est. Manifestum est enim quod id quod daquilo que foi dito acima, a saber, que o mesmo
non est, non potest aliquo participare: unde ser ainda não é. Fica claro, pois, que aquilo que
consequens est quod participatio conveniat alicui não é não pode participar em algo. Por isso a
cum iam est. Sed ex hoc aliquid est quod suscipit consequência é que a participação convém a algo
ipsum esse, sicut dictum est. Unde relinquitur que já é. Porém algo é porque recebe o mesmo ser
quod id quod est, aliquid possit participare; ipsum tal como já foi dito. Disto se conclui que aquilo que
autem esse non possit aliquid participare. é pode participar de algo, porém o mesmo ser não
pode participar de algo.
Tertiam differentiam ponit ibi, “id quod est, A terceira diferença coloca ali onde diz “Aquilo
potest aliquid habere, praeterquam quod ipsum que é pode ter algo além do que ele mesmo é”,
est”. Sumitur ista differentia per admixtionem tomando esta diferença pela mistura de algo
alicuius extranei. Circa quod considerandum est, extranho. Sobre isto se deve considerar que a
quod circa quodcumque abstracte consideratum, verdade sobre qualquer coisa considerada
hoc habet veritatem quod non habet in se aliquid abstratamente está no fato de que não há em si
extraneum, quod scilicet sit praeter essentiam algo extranho, isto é, que seja além da sua
suam, sicut humanitas, et albedo, et quaecumque essência, como a humanidade, a brancura e
hoc modo dicuntur. Cuius ratio est, quia quaisquer coisas que se digam deste modo. A
humanitas significatur ut quo aliquid est homo, et razão disto é que a humanidade se denota como
albedo quo aliquid est album. Non est autem aquilo pelo qual é homem e a brancura aquilo pelo
aliquid homo, formaliter loquendo, nisi per id qual é branco. Pois algo não é homem,
quod ad rationem hominis pertinet; et similiter formalmente falando, senão por aquilo que
non est aliquid album formaliter, nisi per id quod pertence à razão de homem. De modo
pertinet ad rationem albi; et ideo huiusmodi semelhante, algo não é formalmente branco,
abstracta nihil alienum in se habere possunt. Aliter senão por aquilo que pertence à razão de branco.
autem se habet in his quae significantur in E por este motivo tais coisas abstratas não podem
concreto. Nam homo significatur ut qui habet ter nada de extranho em si. De outro maneia
humanitatem, et album ut quod habet albedinem. ocorre com aquelas coisas que se denotam em
Ex hoc autem quod homo habet humanitatem vel concreto. Pois homem se denota como aquele que
albedinem, non prohibetur habere aliquid aliud, tem a humanidade e branco como aquilo que tem
quod non pertinet ad rationem horum, nisi solum brancura. Disto que o homem tem humanidade ou
quod est oppositum his: et ideo homo et album brancura não se proíbe ter algo a mais que não
possunt aliquid aliud habere quam humanitatem pertença a razão destas coisas, senão só o que é
vel albedinem. Et haec est ratio quare albedo vel oposto a estas. Por este motivo, homem e branco
humanitas significantur per modum partis, et non podem ter algo a mais que a humanidade e a
praedicantur de concretis, sicut nec aliqua pars de brancura. E esta é a razão porque a brancura ou a
suo toto. Quia igitur, sicut dictum est, ipsum esse humanidade se denotam à maneira de parte e não
significatur ut abstractum, id quod est ut se predicam do concreto, como tampouco alguma
concretum; consequens est verum esse quod hic parte do todo. Portanto, como foi dito, porque o
dicitur, quod “id quod est, potest aliquid habere, mesmo ser se denota como abstrato e o que é
praeterquam quod ipsum est”, scilicet praeter como concreto, se conclui que é verdade o que
suam essentiam; sed “ipsum esse nihil habet aqui se diz: que “Aquilo que é pode ter algo além
admixtum praeter suam essentiam”. do que ele mesmo é”, a saber, além da sua própria
essência. Por outro lado, “o mesmo ser não pode
ter misturado nada além de sua essência”.
Deinde cum dicit, “Diversum tamen est esse Depois quando diz “Diverso é, no entanto, ser
aliquid in eo quod est, et esse aliquid”, ponit algo e ser algo naquilo que é” coloca as
conceptiones quae accipiuntur secundum concepções que se tomam segundo a comparação
comparationem eius quod est esse simpliciter, ad daquilo que é simplesmente ser com aquilo que é
id quod est esse aliquid: et primo ponit utriusque ser algo. Primeiro estabelece a disversidade de
diversitatem; secundo assignat differentias, ibi, cada uma das duas. Segundo assinala as
“illic enim accidens, hic substantia significatur”. diferenças ali [onde diz] “Pois aquele significa o
acidente, este, a substância”.
Circa primum considerandum est, quod ex quo No que se refere ao primeiro ponto e tendo
id quod est, potest aliquid habere praeter suam afirmado que aquilo que é pode ter algo além de
essentiam, necesse est quod in eo consideretur sua essência, se deve considerar que é necessário
duplex esse. Quia enim forma est principium que nele se tenha em conta um duplo ser. De fato,
essendi, necesse est quod secundum quamlibet sendo a forma princípio do ser, é necessário que
formam habitam, habens aliqualiter esse dicatur. segundo qualquer forma possuída se diga que
Si ergo forma illa non sit praeter essentiam tenha em certa media o ser. Assim, pois, se aquela
habentis, sed constituat eius essentiam, ex eo forma não for além da essência daquele que a
quod habet talem formam, dicetur habens esse possui, mas constitua a sua essência, se dirá,
simpliciter, sicut homo ex hoc quod habet animam daquele que tiver tal forma, que simplesmente
rationalem. Si vero sit talis forma quae sit extranea tem o ser, assim como homem se diz tal porque
ab essentia habentis eam, secundum illam tem a alma racional. Porém, se tal forma for alheia
formam non dicetur esse simpliciter, sed esse à essência daquele que a possui, segundo aquela
aliquid: sicut secundum albedinem homo dicitur forma não se dirá que simplesmente é, mas que é
esse albus: et hoc est quod dicit, quod “diversum algo, assim como segundo a brancura o homem se
est esse aliquid”, quod non est esse simpliciter, et diz branco. E é isso que diz [ao afirmar] que “é
quod aliquid sit “in eo quod est”, quod est diverso ser algo”, porque não é simplesmente ser,
proprium esse subiecti. e que algo seja “naquilo que é”, porque é o próprio
ser do sujeito.
Deinde cum dicit, “illic enim accidens, hic Depois quando diz “Pois aquele significa o
substantia significatur”, ponit tres differentias acidente, este, a substância”, afirma três
inter praemissa. diferenças entre as coisas já preestabelecidas.
Quarum prima est quod “illic”, idest ubi dicitur Das quais a primeira é o “aquele” que denota
de re quod sit aliquid, et non sit simpliciter, “o acidente”, ou seja, onde se refere à coisa que é
significatur “accidens”, quia forma quae facit algo, mas não é de modo absoluto, pois a forma
huiusmodi esse, est praeter essentiam rei; “hic” que faz tal ser está além da essência da coisa. Por
autem cum dicitur esse aliquid in eo quod est outro ladro, o “este”, quando se afirma que é algo
“significatur substantia”, quia scilicet forma naquilo que é, “se refere à substância”, porque
faciens esse constituit essentiam rei. sem dúvida a forma, produzindo o ser, constitui a
essência da coisa.
Secundam differentiam ponit ibi, “Omne quod A segunda diferença coloca ali onde diz “Tudo
est, participat eo quod est esse ut sit”, ubi dicit, o que é participa daquilo que é o ser para que
quod, ad hoc quod aliquid sit simpliciter seja”. Afirma que participa do mesmo ser quando
subiectum, participat ipsum esse; sed ad hoc quod algo for simplesmente um sujeito. Contudo
sit aliquid, oportet quod participet alio aliquo; quando for algo, convém que participe em outra
sicut homo ad hoc quod sit albus, participat non coisa. Assim como o homem, quando for branco,
solum esse substantiale, sed etiam albedinem. participa não somente do ser substancial, mas
também da brancura.
Tertiam differentiam ponit ibi “ac per hoc id A terceira diferença coloca ali [onde diz] “E por
quod est, participat eo quod est esse, ut sit; est isto aquilo que é participa daquilo que é o ser para
vero, ut participet alio quolibet possit”: quae que seja. Por outro lado, é para poder participar
quidem accipitur secundum ordinem utriusque, et de qualquer outra coisa” a qual, de fato, se toma
concluditur ex praemissis. Est autem haec segundo a ordem de ambas as duas e se conclui
differentia quod primo oportet ut intelligatur das premissas. E a diferença é esta:
aliquid esse simpliciter, et postea quod sit aliquid; primeiramente convém que se entenda que algo
et hoc patet ex praemissis. Nam aliquid est simplesmente é; depois que é algo. E isto fica claro
simpliciter per hoc quod participat ipsum esse; sed do que foi já pré-estabelecido. De fato, algo
quando iam est, scilicet per participationem ipsius simplesmente é por isto que participa do mesmo
esse, restat ut participet quocumque alio, ad hoc ser. Mas quando já é, subentende-se, por
scilicet quod sit aliquid. participação do mesmo ser, resta que participe em
qualquer outra coisa para que efetivamente isto
seja algo.
Deinde cum dicit “Omni composito aliud est Depois quando diz “Em todo composto, uma
esse, aliud ipsum est”, ponit conceptiones de coisa é o ser e outra coisa é ele mesmo”,
composito et simplici, quae pertinent ad rationem estabelece as concepções referentes ao composto
unius. Est autem considerandum, quod ea quae e ao simples que concernem à noção de unidade.
supra dicta sunt de diversitate ipsius esse et eius Deve-se, pois, considerar que aquelas coisas que
quod est, est secundum ipsas intentiones; hic foram ditas acima sobre a diversidade do mesmo
autem ostendit quomodo applicetur ad res: et ser e daquilo que é estão de acordo com as
primo ostendit hoc in compositis. Secundo in próprias intenções. Contudo aqui mostra como se
simplicibus, ibi “Omne simplex, esse suum, et id aplicam às coisas. E primeiramente mostra isto
quod est unum habet”. nas coisas compostas. Segundo, nas simples ali
[onde diz] “Todo aquele que é simples tem o seu
ser e aquilo que é como uma só coisa.”
Est ergo primo considerandum, quod sicut esse Portanto, deve-se considerar primeiramente
et quod est differunt in simplicibus secundum que assim como o ser e aquilo que é diferem nas
intentiones, ita in compositis differunt realiter: coisas simples sengundo as intenções, assim nas
quod quidem manifestum est ex praemissis: compostas diferem realmente. Isto, de fato, fica
dictum est enim supra, quod ipsum esse neque evidente a partir das premissas. Com efeito, foi
participat aliquid, ut eius ratio constituatur ex dito acima que o mesmo ser nem participa de algo,
multis; neque habet aliquid extraneum admixtum, como se a sua razão se constitua de muitas coisas,
ut sit in eo compositio accidentis; et ideo ipsum nem tem algo extranho misturado, como se
esse non est compositum. Res ergo composita non existisse nele composição de acidente. Por isto
est suum esse: et ideo dicit, quod in “Omni que o mesmo ser não é composto. Logo a coisa
composito aliud est esse, aliud ipsum” composta não é o seu ser e por este motivo diz
compositum, quod est participatum ipsum esse. que “uma coisa é o ser e outra coisa o mesmo”
composto que é ao participar do mesmo ser.
Deinde cum dicit “Omne simplex, esse suum, et Depois quando diz “Todo aquele que é simples
id quod est unum habet”, ostendit qualiter se tem o seu ser e aquilo que é como uma só coisa”,
habet in simplicibus; in quibus est necesse quod mostra de que maneira acontece nas coisas
ipsum esse et id quod est, sit unum et idem simples nas quais é necessário que o mesmo ser e
realiter. Si enim esset aliud realiter id quod est et aquilo que é sejam uma e a mesma coisa
ipsum esse, iam non esset simplex, sed realmente. Se, de fato, fosse realmente outra
compositum. Est tamen considerandum, quod coisa aquilo que é e o mesmo ser, já não seriam
cum simplex dicatur aliquid ex eo quod caret simples, mas compostos. Contudo, deve-se
compositione, nihil prohibet aliquid esse considerar que quando algo se diz simples por
secundum quid simplex, inquantum caret aliqua carecer de composição, nada proíbe que algo seja
compositione, quod tamen non est omnino simples segundo algum aspecto particular na
simplex: unde ignis et aqua dicuntur simplicia medida em que carece de alguma composição,
corpora, inquantum carent compositione quae est ainda que não seja totalmente simples. Daí que o
ex contrariis, quae invenitur in mixtis; quorum fogo e a água se dizem corpos simples na medida
tamen unumquodque est compositum tum ex em que carecem da composição que é própria dos
partibus quantitatis, tum etiam ex forma et contrários que se encontra nas coisas misturadas.
materia. Si ergo inveniantur aliquae formae non in Porém, cada uma se compõe tanto das partes da
matéria; unaquaeque earum est quidem simplex quantidade quanto de forma e matéria. Por tanto,
quantum ad hoc quod caret materia, et per se algumas formas não se econtram na matéria,
consequens quantitate, quae est dispositio cada uma delas é simples na medida em que
materiae; quia tamen quaelibet forma est carece de matéria e, por consequência, de
determinativa ipsius esse, nulla earum est ipsum quantidade que é uma disposição da matéria.
esse, sed est habens esse. Puta, secundum Entretanto, porque toda forma é determinativa do
opinionem Platonis, ponamus formam mesmo ser, nenhuma delas é o mesmo ser, mas
immaterialem subsistere, quae sit idea et ratio tem o ser. Considere-se que, segundo a opinião de
hominum materialium, et aliam formam quae sit Platão, afirmemos subsistir uma forma imaterial
idea et ratio equorum: manifestum erit quod ipsa que é a ideia e a razão dos homens materiais e
forma immaterialis subsistens, cum sit quiddam outra forma que é a ideia e a razão dos cavalos.
determinatum ad speciem, non est ipsum esse Ficará claro que a mesma forma imaterial
commune, sed participat illud: et nihil differtsubsistente, sendo algo determinado em uma
quantum ad hoc, si ponamus illas formas espécie, não é o mesmo ser comum, mas participa
immateriales altioris gradus quam sint rationesdele. E quanto a isto, nada difere se
horum sensibilium, ut Aristoteles voluit: considerarmos que aquelas formas imateriais
unaquaeque illarum, inquantum distinguitur ab sejam de um grau mais elevado que as noções
alia, quaedam specialis forma est participans destas coisas sensíveis como Aristóteles queria:
ipsum esse; et sic nulla earum erit vere simplex. Id
cada uma delas, enquanto se distinguem da outra,
autem erit solum vere simplex, quod non é certa forma especial que participa do mesmo ser
participat esse, non quidem inhaerens, sed e assim nenhuma delas será verdadeiramente
subsistens. Hoc autem non potest esse nisi unum;
simples. Por outro lado, só isto será
quia si ipsum esse nihil aliud habet admixtum verdadeiramente simples: aquilo que não
praeter id quod est esse, ut dictum est; participa do ser, não inerindo, mas subsistindo.
impossibile est id quod est ipsum esse, multiplicari
Porém isto não pode ser senão um, pois se o
per aliquid diversificans: et quia nihil aliud praeter
mesmo ser nenhuma outra coisa tem misturado
se habet admixtum, consequens est quod nullius além daquilo que é o ser, como foi dito, é
accidentis sit susceptivum. Hoc autem simplex impossível que aquilo que é o mesmo ser se
unum et sublime est ipse Deus. multiplique por algo diversificante. E porque [não]
tem associado nenhuma outra coisa além de si
mesmo, se segue que não é susceptível de
nenhum acidente. Além disto, este sublime e
simples Um é o mesmo Deus.
Deinde cum dicit “Omnis diversitas discors, Depois quando diz “Toda diversidade é
similitudo vero appetenda est”, ponit duas contrastante; a semelhança, em vez, deve ser
conceptiones pertinentes ad appetitum, ex quo desejada” coloca duas concepções pertinentes ao
definitur bonum. Nam bonum dicitur quod omnia apetite do qual se define o bem, pois se diz que o
appetunt. bem [é] aquilo que todas as coisas desejam.
Est ergo prima conceptio, quod “omnis Portanto, a primeira concepção é que “toda
diversitas est discors, et similitudo est diversidade é contrastante e a semelhança deve
appetenda”. Circa quod considerandum est, quod ser desejada”. Sobre isso se deve considerar que a
discordia importat contrarietatem appetitus: discórdia diz respeito à contrariedade do apetite.
unde illud dicitur esse discors quod repugnat Por isto se diz que algo é discorde porque repugna
appetitui. Omne autem diversum, inquantum ao apetite. A razão disto é que o semelhante se
huiusmodi, repugnat appetitui: cuius ratio est, aumenta e se aperfeiçoa com o seu semelhante.
quia simile augetur et perficitur suo simili. Porém, cada um apetece o seu aumento e
Unumquodque autem appetit suum augmentum perfeição e, assim, o semelhante enquanto tal é
et perfectionem; et ideo simile, inquantum apetecível a cada um. Por uma equivalente razão,
huiusmodi, est unicuique appetibile; et pari o diverso repugna ao apetite enquanto diminui e
ratione diversum repugnat appetitui, inquantum impede a perfeição. E por isso disse que “toda
diminuit, et perfectionem impedit: et ideo dicit, diversidade é constrastante”, ou seja, que difere
quod “omnis diversitas” est “discors”, idest ab do apetite. “A semelhança, em vez, deve ser
appetitu discordans; “similitudo vero est desejada”. Sucede, porém, que por acidente
appetenda”. Contingit tamen per accidens quod algum apetite prove aversão ao semelhante e
aliquis appetitus abhorret simile et appetit apeteça o diverso ou vice-versa. Pois como foi
diversum sive contrarium. Nam sicut dictum est, dito, cada um, primeiramente e por si, apetece a
unumquodque primo et per se appetit suam sua perfeição que é o bem de cada um sendo
perfectionem, quae est bonum uniuscuiusque, et sempre proporcionado ao seu perfectível. E
est semper proportionatum suo perfectibili, et segundo isto tem uma semelhança com ele.
secundum hoc habet similitudinem ad ipsum. Alia Porém, outas coisas, que são externas, se
vero quae sunt exterius, appetuntur vel refutantur apetecem ou se rejeitam enquanto contribuem
inquantum conferunt ad propriam perfectionem: para a própria perfeição em relação a qual,
a qua quidem deficit quandoque aliquid per certamente, às vezes falta algo por defeito, às
defectum, quandoque autem per excessum. Nam vezes por excesso. Pois a própria perfeição de
propria perfectio uniuscuiusque rei in quadam cada coisa consiste em certa proporção assim
commensuratione consistit: sicut perfectio como a perfeição do corpo humano consiste em
corporis humani consistit in commensurato um calor proporcionado do qual, si se afasta,
calore; a quo si deficiat, appetit aliquod calidum apetece algo cálido pelo qual se aumente o calor.
per quod calor augetur: si autem superexcedat, Se, pois, excede, apetece o contrário, a saber, o
appetit contrarium, scilicet frigidum per quod ad frio pelo qual se reduz à justa medida na qual
temperamentum reducatur, in quo consistit consiste a perfeição conforme à natureza. E assim
perfectio conformis naturae. Et sic etiam unus também um oleiro detesta o outro enquanto lhe
figulus abhorret alium, inquantum scilicet aufert ei tira a perfeição desejada, a saber, o lucro.
perfectionem desideratam, scilicet lucrum.
Secundam autem conceptionem ponit ibi, “Et Depois coloca a segunda concepção ali [onde
quod appetit aliud, tale ipsum esse naturaliter diz] “E aquele que deseja outro mostra que ele
ostenditur, quale est illud hoc ipsum quod mesmo é por natureza tal como é aquilo mesmo
appetit”, quae concluditur ex praemissis. Si enim que apetece” e que se conclui das premissas. Se,
similitudo per se est appetenda, consequenter id de fato, a semelhança deve desejar-se por si
quod appetit aliud, ostenditur tale naturaliter esse mesma, consequentemente aquilo que apetece
quale est hoc quod appetit, quia scilicet naturalem outra coisa se mostra que é naturalmente tal
inclinationem habet ad id quod appetit: quae como é isto que apetece, porque, certamente,
quidem naturalis inclinatio quandoque sequitur tem uma natural inclinação para aquilo que
ipsam essentiam rei, sicut grave appetit esse apetece. E sem dúvida esta inclinação natural às
deorsum secundum rationem suae essentialis vezes procede da própria essência da coisa assim
naturae; quandoque vero consequitur naturam como o grave apetece estar embaixo segundo a
alicuius formae supervenientis, sicut cum aliquis razão de sua natureza essencial. Às vezes, porém,
habet habitum acquisitum, desiderat id quod procede de alguma forma superveniente assim
convenit ei secundum habitum illum. como quando alguém tem um hábito adquirido
deseja o que lhe convém segundo aquele hábito.
Ultimo autem epilogat, et dicit, quod sufficiunt Por último recapitula e diz que aquelas coisas
ad propositum ea quae praemissa sunt; et quod que foram pré-estabelecidas bastam para o
ille qui prudenter interpretatur rationes dictorum, propósito. E por isto, aquele que prudentemente
poterit unumquodque eorum adaptare congruis interpretar as noções das coisas ditas poderá
argumentis: applicando scilicet ea ad debitas aplicar cada uma delas aos argumentos
conclusiones, ut patebit in sequentibus. convenientes: ou seja, aplicando-as às devidas
conclusões como ficará claro a seguir.

CAPITULUM III
[Textus Boetii] [Texto de Boécio]

Quaestio vero huiusmodi est. Ea quae sunt, Assim sendo, a controvérsia se apresenta da
bona sunt: tenet enim omnis sententia doctorum, seguinte maneira: Aquelas coisas que são, são
omne quod est, ad bonum tendere. Omne autem boas. Em verdade, a opinião de todos os instruídos
tendit ad simile. Quae igitur ad bonum tendunt, sostém que tudo que é tende ao bem. Por outro
bona ipsa sunt. lado, tudo tende a algo semelhante. Logo os que
tendem ao bem são, eles mesmos, bons.
Sed quemadmodum bona sint, inquirendum Mas deve-se perguntar de que modo as coisas
est, utrumne participatione, an substantia. são boas: se por participação ou por substância.
Si participatione, per se ipsa nullo modo sunt Se por participação, de nenhum modo elas são
bona: nam quod participatione album est, per se, boas por si mesmas, pois o que é branco por
idest eo quod ipsum est, album non est; et de participação, não o é por si, ou seja, naquilo que
caeteris qualitatibus eodem modo. Si igitur ele mesmo é e o mesmo diga-se das demais
participatione sunt bona, ipsa per se nullo modo qualidades deste tipo. Assim, se são boas por
bona sunt. Non igitur ad bonum tendunt. Sed participação, de nenhuma maneira são boas por si
concessum est. Non igitur participatione bona mesmas. Consequentemente, não tendem ao
sunt, sed substantia. bem. Mas foi concedido que tendem ao bem.
Logo, não são boas por participação, mas
substancialmente.
Quorum vero substantia bona est, id quod Assim de fato, sendo a substância delas boa,
sunt, bona sunt. Id autem quod sunt habent ex eo aquilo que elas são, é bom. No entanto, aquilo que
quod est esse. Esse igitur ipsorum bonum est. elas são, elas o têm daquilo que é o ser. Por
Omnium igitur rerum ipsum esse bonum est. Sed conseguinte, o seu mesmo ser é bom e o mesmo
si esse bonum est, ea quae sunt, in eo quod sunt,ser de todas as coisas também é bom. Mas se o ser
bona sunt; idemque est illis esse quod bona esse:é bom, aquelas coisas que são, são boas naquilo
substantialia igitur bona sunt, quoniam non que são e assim para elas, ser é a mesma coisa que
participant bonitatem. Quod si ipsum esse in eis ser bom. Portanto são bens substanciais, porque
bonum est, non est dubium quin substantialia, não participam da bondade. E por isto, se nelas o
cum bona sint, primo sint bono similia, ac per hoc
mesmo ser é bom, não há dúvida que sendo bens
ipsum bonum erunt: nihil enim illi praeter se substanciais, são semelhantes ao primeiro bem.
ipsum simile est. Ex quo fit ut omnia quae sunt, Consequentemente são este mesmo bem, pois
Deus sint: quod dictu nefas est. Non sunt igitur nada lhe é semelhante além de seu mesmo ser. Do
substantialia bona, ac per hoc, non in his est esse
qual se conclui que todas as coisas que são, são
bonum. Non igitur in eo quod sunt, bona sunt. Deus, o que é um sacrilégio dizê-lo. Logo não são
bens substanciais e por isto, nestas coisas, o bem
não é o ser. Assim, não são boas naquilo que são.
Sed nec participant bonitate: nullo enim modo Mas se tampouco participam da bondade, de
ad bonum tenderent. Nullo igitur modo bona sunt. nenhum modo tenderiam ao bem e, portanto, de
modo algum são boas.

[Thomae Aquinatis expositio] [Comentário de Tomás de Aquino]

Praemissis quibusdam principiis quae sunt Tendo pré-estabelecido certos princípios que
necessaria ad propositae quaestionis são necessários para a discussão da questão
discussionem, hic accedit ad quaestionem proposta, aqui aborda tal questão e sobre isto faz
propositam; et circa hoc tria facit. Primo proponit três coisas: Primeiro, propõe a questão. Segundo
quaestionem; secundo adhibet solutionem, ibi, fornece a solução ali [onde diz] “Pode-se oferecer
“Huic quaestioni talis poterit adhiberi solutio”. a seguinte solução para esta questão”. Terceiro,
Tertio excludit quasdam obiectiones contra exclui certas objeções contra a solução onde [diz]
solutionem, ibi, “At non alba, in quod sunt alba, “E não seria também conveniente que aquelas
esse oportebit ea qua alba sunt”. coisas que são brancas sejam brancas naquilo que
são brancas”.
Circa primum duo facit. Primo praemittit quod No que se refere ao primeiro faz duas coisas:
quaestio praesupponit; secundo quod in Primeiro pré-estabelece o que a questão
quaestione versetur dubium, ibi, “sed pressupõe. Segundo se ocupa de uma dúvida que
quemadmodum bona sint inquirendum est”. está na questão ali [onde diz] “Mas deve-se
perguntar de que modo as coisas são boas”.
Dicit ergo sic esse ad propositam quaestionem Diz, por tanto, que se deve abordar a questão
accedendum, ut praesupponamus quod omnia ea proposta do seguinte modo: como si supôssemos
quae sunt, bona sint: Et ad hoc probandum inducit que todas as coisas que são, são boas. E para
rationem secundum praemissa, quae talis est. provar isto apresenta uma razão conforme as
Unumquodque tendit ad suum simile. Unde supra coisas que foram pré-estabelecidas, a saber: cada
praemissum est: quod appetit aliud, tale ipsum um tende ao seu semelhante. Por isso tinha se
esse naturaliter ostendit, quale est hoc ipsum expressado acima: aquele que deseja outro
quod appetit. Sed omne quod est, ad bonum mostra que ele mesmo é por natureza tal como é
tendit. Et hoc quidem inducit secundum aquilo mesmo que apetece. Mas tudo aquilo que
communem doctorum sententiam. Unde et in é, tende ao bem. E evidentemente, apresenta isto
principio Ethic., philosophus dicit, quod bonum conforme a opinião comum dos doutos. Por isso o
enuntiant sapientes esse quod omnia appetunt. Filósofo também diz no primeiro livro da Ética que
Est enim proprium obiectum appetitus bonum, os sábios manifestam que o bem é aquilo que
sicut sonus proprium obiectum est auditus. Unde todas as coisas apetecem. O bem é, pois, o próprio
sicut sonus est qui percipitur ab omni auditu; ita objeto do apetite assim como o som é o objeto
oportet bonum esse in quod tendit omnis próprio do ouvido. Por isto, do mesmo modo que
appetitus: et ita, cum cuiuslibet rei sit aliquis o som é o que se percebe por todo ouvido, assim
appetitus, vel intellectivus, vel sensitivus, vel também convém que o bem se encotre naquilo
naturalis; consequens est quod quaelibet res que todo apetite tende. E assim, posto que a
appetat bonum: et ita concluditur quod omnis res qualquer coisa lhe compete ter algum apetite seja
sit bona: quod quaestio intenta supponit. intelectual, seja sensitivo ou natural, a
consequência é que qualquer coisa apetece o
bem. E assim se conclui que todas as coisas são
boas, o que supõe a questão traçada.
Deinde cum dicit, “sed quemadmodum bona Depois quando diz “Mas deve-se perguntar de
sint inquirendum est”, ostendit quid dubium in que modo as coisas são boas”, mostra qual é a
quaestione versetur; et circa hoc tria facit. Primo dúvida referente à questão e sobre isto faz três
proponit quaestionem; secundo obiicit contra coisas: em primeiro lugar propõe a questão;
utrumque membrorum quaestionis, ibi, “Si segundo se opõe contra cada um dos membros da
participatione per se ipsa nullo modo sunt bona”; questão ali [onde diz] “Se por participação, de
tertio ex hoc ulterius procedit ad excludendum nenhum modo elas são boas por si mesmas”; a
primam suppositionem, ibi, “non igitur, in eo quod partir disto, procede adiante a fim de excluir a
sunt, bona sunt”. primeira suposição ali [onde diz] “Assim, não são
boas naquilo que são”.
Dicit ergo, primo, quod, supposito omnia esse Portanto, diz em primeiro lugar que, tendo
bona, inquirendum est de modo, quomodo scilicet suposto que todas as coisas são boas, se deve
bona sint. Dicitur autem aliquid de aliquo investigar sobre o modo, a saber, como são boas.
dupliciter. Uno modo substantialiter, alio modo Mas algo se predica de algo de duas maneiras: Em
per participationem. Est ergo quaestio utrum um modo substancialmente e noutro por
entia sint bona per essentiam, vel per participação. A questão é, portanto, se os entes
participationem. Ad intellectum huius quaestionis são bons por essência ou por participação. Para o
considerandum est, quod in ista quaestione entendimento desta questão se deve considerar
praesupponitur quod aliquid esse per essentiam que nela se pressupõe que ser algo por essência e
et per participationem sint opposita. Et in uno por participação são coisas opostas. De fato, em
quidem supradictorum participationis modorum um dos modos de participação anteriormente
manifeste verum est: scilicet secundum illum citados isto é claramente verdadeiro, a saber,
modum quo subiectum dicitur participare segundo aquele modo em que o sujeito se diz
accidens, vel materia formam (est enim accidens participar do acidente ou a matéria da forma. De
praeter naturam subiecti, et forma praeter ipsam fato, o acidente está além da natureza do sujeito
substantiam materiae): sed in alio participationis e a forma está além da própria substância da
modo, quo scilicet species participat genus. Hoc matéria. Mas no outro modo de participação, ou
etiam verum est secundum sententiam Platonis, seja, naquele em que a espécie participa do
qui posuit aliam esse ideam animalis, et bipedis gênero, isto também é verdadeiro segundo a
hominis. Sed secundum sententiam Aristotelis, opinião de Platão que estabeleceu ser outra a
qui posuit quod homo vere est id quod est animal, ideia do animal e do homem bípede. Mas segundo
quasi essentia animalis non existente praeter a opinião de Aristóteles que estabeleceu que o
differentiam hominis; nihil prohibet, id quod per homem verdadeiro é aquilo que é o animal, como
participationem dicitur, substantialiter praedicari. se a essência do animal não existisse além da
Boetius autem hic loquitur secundum illum diferença do homem, nada proíbe que aquilo que
participationis modum quo subiectum participat se diz por participação seja predicado
accidens; et ideo ex opposito dividitur id quod substancialmente. Pois Boécio está falando aqui
substantialiter et participative praedicatur, ut segundo aquele modo de participação em que o
patet per exempla quae subsequenter inducit. sujeito participa do acidente. E por isto o que se
predica substancialmente e por participação se
dividem por oposição, como fica evidente pelos
exemplos que subsequentemente apresenta.
Deinde cum dicit “Si participatione, per se ipsa Depois quando diz “Se por participação, de
nullo modo bona sunt”, obiicit contra utrumque nenhum modo elas são boas por si mesmas” se
membrum quaestionis: et primo contra hoc quod opõe contra cada um dos membros da questão: e
res sint bonae per participationem; secundo em primeiro lugar contra isto de serem boas
contra hoc quod sint bonae secundum suam segundo sua substância ali [onde diz] “Assim de
substantiam, ibi, “quorum vero substantia bona fato, sendo a substância delas boa, aquilo que elas
est, id quod sunt, bona sunt”. são, é bom”.
Dicit ergo primo, quod si omnia sunt bona per Diz, pois, em primeiro lugar, que se todas as
participationem, sequitur quod nullo modo sint coisas são boas por participação, a consequência
bona per se. Et hoc quidem verum est, si per se é que de nenhum modo são boas por si mesmas.
accipiatur inesse quod ponitur in definitione eius E isto, de fato, é verdadeiro se se admite que o
de quo dicitur, sicut homo per se est animal: quod “por si mesma” pertence ao que se põe na
enim ponitur in definitione alicuius, pertinet ad definição daquilo do qual se está dizendo, assim
essentiam eius; et ita non dicitur de eo per como o homem por si mesmo é animal. Pois, com
participationem de qua nunc loquimur. Si vero efeito, o que se põe na definição de algo, pertence
accipiatur per se secundum alium modum, prout à sua essência. E assim não se diz dele pela
scilicet subiectum ponitur in definitione participação daqual agora estamos falando. Por
praedicati, sic esset falsum quod hic dicitur: nam outro lado, se se admite o “por si mesma”
proprium accidens secundum hunc modum per se segundo o outro modo, ou seja, o sujeito posto na
inest subiecto, et tamen participative de eo definição do predicado, assim seria falso o que
praedicatur. Sicut igitur Boetius hic accipit aqui se está dizendo, pois o próprio acidente,
participationem, prout subiectum participat segundo este modo, pertence ao sujeito por si
accidens; per se autem quod ponitur in definitione mesmo e, mesmo assim, se predica dele por
subiecti; et sic ex necessitate sequitur quod si res participação. Então, como Boécio aqui toma
sint bonae per participationem, non sint bonae participação como o sujeito [que] participa do
per se: et hoc manifestat per exemplum: “nam id acidente, o “por si mesma” é aquilo que se põe na
quod est album per participationem, non est definição do sujeito. E assim necessariamente
album per se, idest in eo quod est ipsum”, quod segue que se as coisas são boas por participação,
pertinet ad primum modum dicendi per se: et não são boas por si mesmas. E clarifica isto por
simile est de aliis qualitatibus. Sic igitur si omnia meio de um exemplo, “pois o que é branco por
entia sunt bona per participationem, sequitur participação, não é branco por si mesmo, ou seja,
quod non omnia sunt bona per se, idest per suam naquilo que ele mesmo é”, que pertence ao
substantiam. Ex hoc ergo sequitur quod primeiro modo de se dizer “por si mesmo”. E [isto
substantiae entium non tendant ad bonum; cuius se aplica] de modo semelhante às outras
contrarium superius est concessum, scilicet quod qualidades. Então se os entes são bons por
omnia in bonum tendant. Videtur ergo quod entia partipação, segue que nem todos são bons por si
non sint bona per participationem, sed per suam mesmos, ou seja, substancialmente. Portanto,
substantiam. disto se infere que as substancias dos entes não
tendem ao bem o que é contrário ao que foi
concedido mais acima, a saber, que todas as coisas
tendem ao bem. Logo, parece que os entes não
são bons por participação, mas por sua substância.
Deinde cum dicit “quorum vero substantia Depois quando diz “Assim de fato, sendo a
bona est, id quod sunt, bona sunt”, obiicit in substância delas boa, aquilo que elas são, é bom”,
contrarium in hunc modum. Illa quorum objeta contra isto em sentido contrário. Aquelas
substantia bona est, necesse est quod bona sint coisas cuja substância é boa devem ser boas
secundum id ipsum quod sunt: hoc enim ad segundo aquilo que elas mesmas são, pois isto
substantiam cuiuscumque rei pertinet quod pertence à substância de qualquer coisa no que
concurrit ad suum esse. Sed quod aliqua sint, hoc toca ao seu ser. Contudo o fato de serem algo elas
habent ex eo quod est esse: dictum est enim supra o têm daquilo que é o ser. Com efeito, se disse
quod est aliquid cum esse susceperit. Sequitur acima que é algo quando recebe o ser. Segue,
igitur ut eorum quae sunt bona secundum então, que o mesmo ser das coisas que são boas
subiectum, ipsum esse sit bonum. Si igitur omnia segundo o sujeito é bom. Se, portanto, todas as
sunt bona secundum suam substantiam, sequitur coisas são boas segundo a sua substância, se
quod omnium rerum ipsum esse sit bonum. Et concluirá que o mesmo ser de todas elas é bom. E
quia praemissa ex quibus argumentando processit porque as premissas das quais procedeu para
sunt convertibilia, procedit e converso: sequitur argumentar são convertíveis, procede de modo
enim e converso si esse omnium rerum sit bonum, reverso. Pois reversamente resulta que, se o ser
quod ea quae sunt, inquantum sunt, bona sint; ita de todas as coisas é bom, na medida em que são,
scilicet quod idem sit unicuique rei esse, et bonum elas são boas naquilo que são. Assim é evidente
esse: sequitur igitur quod sint substantialia bona que é idéntico o ser de qualquer coisa e o ser bom.
ex hoc quod sunt bona, et tamen non per A conseguência, então, é que são bens
participationem bonitatis. Ex hoc autem quod substanciais pelo fato de que são boas e, no
inconveniens sequatur, ostendit subdens, et dicit entanto, não o são por participação da bondade.
quod si ipsum esse rerum omnium sit bonum; cum No entanto, mostra fazendo uma aplicação que
ex hoc sequatur quod sint substantialia bona, desta conclusão resultaria algo inapropriado. E diz
consequens est etiam quod sint primo bono que, se o mesmo ser de todas as coisas é bom,
similia, quod est substantiale bonum, et cui idem inferindo-se disto que são bens substanciais, a
est esse et bonum esse: et ex hoc ulterius sequitur consequência é que também são semelhantes ao
quod omnia sint ipsum primum bonum, quia nihil primeiro bem que é um bem substancial e para o
praeter seipsum est simile illi, scilicet quantum ad qual é o mesmo ser e ser bom. Disto ulteriormente
modum bonitatis. Nihil autem aliud praeter segue que todas as coisas são o mesmo primeiro
primum bonum eodem modo est bonum sicut bem, porque nada, além de si mesmo, lhe é
ipsum, quia ipsum solum est primum bonum. semelhante, ou seja, quanto ao modo de
Dicuntur tamen aliqua ei similia, inquantum sunt bondade. Porém, nada mais além do primeiro
secundario bona derivata ab ipso Primo et bem é bom do mesmo modo que ele, porque só
principali bono. Si ergo omnia sunt ipsum Primum ele é o primeiro bem. Porém, algumas coisas se
Bonum; cum ipsum Primum Bonum nihil sit aliud dizen semelhantes a ele na medida em que são
quam Deus, sequitur quod omnia entia sunt Deus: bens secundários derivados do próprio Primeiro e
quod dicere nefas est. Sequitur igitur et ea quae principal bem. Caso contrário, se todas as coisas
praemissa sunt, esse falsa. Non igitur entia omnia fossem o primeiro pem, sendo que o próprio
sunt substantialia bona, neque in eis ipsum esse primeiro bem nada mais é que Deus, resultaria
est bonum, quia ex his conclusum est quod omnia que todos os entes são Deus o qual também não é
sunt Deus: et ulterius sequitur quod non omnia justo dizer. Logo, também se conclui que são falsas
sint bona inquantum sunt. aquelas coisas que foram pressupostas. Portanto,
nem todos os entes são bens substanciais, nem
neles o mesmo ser é bom, porque a partir delas se
concluiu que todas as coisas seriam Deus. E,
ulteriormente, se infere que nem todas as coisas
são boas enquanto são.
Deinde cum dicit, “sed nec participant Depois quando diz “Mas se tampouco
bonitate”, procedit ulterius ad removendam participam da bondade” procede ulteriormente
primam suppositionem; et dicit, quod si huic quod no sentido de remover a primeira suposição. E diz
est entia non esse substantialiter bona, que a isto, a saber, que os entes não são bens
adiungatur alia conclusio quae supra inducta est, substanciais, se adicionará outra conclusão além
scilicet quod entia non sunt participative bona, daquela que foi apresentada acima, ou seja, que
quia per hoc sequeretur quod nullo modo ipsa ad os entes não são bons por participação, dado que
bonum tenderent, ut supra habitum est; videtur por este motivo se concluiria que de nenhum
ulterius posse concludi, quod nullo modo entia modo tenderiam ao bem tal como foi considerado
sunt bona: quod est contra id quod supra antes. Finalmente parece que se pode concluir
praemissum est. que de nenhum modo os entes são bons, o qual
está contra aquilo que foi pressuposto
anteriormente.

CAPITULUM IV

[Textus Boetii] [Texto de Boécio]

Huic quaestioni talis poterit adhiberi solutio.


Pode-se oferecer a seguinte solução para esta
Multa sunt quae, cum separari actu non possint,
questão: há muitas coisas que, apesar de não
animo tamen et cogitatione separantur; ut poderem separar-se em ato, contudo, separam-se
triangulum vel caetera a subiecta materia nullus
na alma e no pensamento. Pois ninguém separa
actu separat, mente tamen segregans ipsum em ato um triângulo ou outras coisas do gênero
triangulum proprietatemque eius, praeter sujeitas à matéria. Não obstante, segregando o
materiam speculatur. mesmo triângulo e sua propriedade, observa com
a mente além da matéria.
Amoveamus igitur Primi Boni praesentiam Agora, removamos por um breve tempo de
paulisper ex animo, quod quidem esse constat: nosso pensamento a presença do Primeiro Bem o
idque ex omnium doctorum indoctorumque qual, sem dúvida, consta que existe e ainda mais
sententia, barbararum quoque gentium pode conhecer-se pela opinião de todos os
religionibus cognosci potest. instruídos e não instruídos, assim como das
religiões dos povos bárbaros.
Hoc igitur paulisper amoto, ponamus omnia Tendo, assim, removido Este por um breve
esse quae sunt bona; atque ea consideremus, tempo, sustenhamos que todas as coisas que são
quemadmodum bona esse possent, si a Primo sejam boas e as consideremos de que modo
Bono minime defluxissent. Hic intueor in eis aliud possam ser boas, se não derivassem de nenhuma
esse quod bona sunt, aliud quod sunt. Ponatur maneira do Primeiro Bem. Desta perspectiva,
enim una eademque substantia bona esse, gravis, observo que, nelas, uma coisa é que são boas e
alba, rotunda: tunc aliud esset ipsa illa substantia, outra coisa diferente o que são. Suponha-se,
aliud eius rotunditas, aliud color, aliud bonitas. então, que uma e a mesma substância boa seja
Nam si haec singula idem essent quod ipsa branca, pesada e redonda. Então uma coisa seria
substantia, idem esset gravitas quod color, bonum aquela mesma substância e outra sua redondez,
quod album, et quod rotundum, quod fieri natura outra a cor, outra a bondade. Pois se cada uma
non sinit. Aliud igitur tunc in eis esset esse, aliud destas coisas fosse o mesmo que a própria
aliquid esse; ac tunc quidem bona essent, esse substância, o peso seria a mesma coisa que a cor,
tamen ipsum minime haberent bonum. Igitur si que o bem, e o bem seria o mesmo que o peso, o
ullo modo essent non a bono, bona quidem qual a natureza não permite que [isso] se faça.
essent, ac non idem essent quod bona; sed eis Então uma coisa, nelas, seria ser e outra ser algo.
aliud esset esse, aliud bona esse. E agora certamente seriam boas, mas de nenhuma
maneira teriam o mesmo ser como algo bom. Logo
se de algum modo fossem sem [proceder] do Bem,
certamente seriam boas, mas não seriam idênticas
com as coisas boas, mas para elas uma coisa seria
ser e outra ser boas.
Quod si nihil omnino aliud essent nisi bona, E por isso, se não fossem absolutamente nada
neque gravia, neque colorata, neque spatii mais que boas, não haveria nelas nem peso, nem
dimensione distincta, nec ulla in eis qualitas esset, cor, nem extensão pela dimensão do espaço, nem
nisi tantum bona essent; tunc non res, sed rerum qualidade alguma, senão que somente seriam
viderentur esse principium; nec potius viderentur, boas. Agora elas não pareceriam que são coisas,
sed videretur: unum enim solumque est mas o princípio das coisas. E não só pareceriam,
huiusmodi, quod tantum est bonum, aliudque mas pareceria, pois uma coisa, e somente uma, é
nihil sit. assim: a que é simplesmente boa e nada mais.
Quae quoniam non sunt simplicia, nec esse Como aquelas coisas não são simples, não
omnino poterant nisi ea Id quod solum bonum est, poderiam de nenhum modo existir, a não ser que
esse voluisset. Idcirco quoniam esse eorum a Boni Aquele que é simplesmente é bom quisesse que
voluntate defluxit, bona esse dicuntur. Primum elas existissem. Por este motivo elas se dizem
enim Bonum in eo quod est, bonum; secundum boas, já que o ser delas procede da vontade do
vero bonum, quod ex eo fluxit, cuius ipsum esse Bem. De fato, o Primeiro Bem é bom naquilo que
est bonum, ipsum quoque bonum est; sed ipsum é. Todavia o segundo bem, pelo fato de fluir
esse omnium rerum ex eo fluxit quod est Primum daquele cujo mesmo ser é bom, ele próprio
Bonum, et quod bonum tale est ut recte dicatur: também é bom. Além disso, o mesmo ser de todas
in eo quod est, bonum est: ipsum igitur eorum as coisas fluiu daquele que é o Primeiro Bem e que
esse bonum est. Tunc enim in eo quod essent, non é tão bom que propriamente se diz que é bom
essent bona, si a primo bono minime defluxissent. naquilo que é. Logo o mesmo ser delas é bom.
Então, neste caso, não seriam boas naquilo que
são, se de nenhum modo tivessem procedido do
primeiro bem.

[Thomae Aquinatis expositio] [Comentário de Tomás de Aquino]

Praemissa quaestione, et rationibus hinc inde Tendo exposta a questão e depois de


inductis, hic Boetius adhibet solutionem: et circa apresentar os argumentos, aqui, portanto, Boecio
hoc tria facit. Primo determinat veritatem da a solução. E sobre isto faz três coisas.
quaestionis; secundo solvit obiectionem, ibi, “Qua Em primeiro lugar determina a verdade da
in re soluta est quaestio”; tertio inducit quasdam questão. Segundo resolve a objeção ali [onde diz]
obiectiones contra solutionem, et solvit eas, ibi, “Nisto resolve-se a questão”. Terceiro, traz certas
“At non alba, in eo quod sunt alba, esse oportebit objeções contra a solução e as resolve ali [onde
ea quae alba sunt”. diz] “E não seria também conveniente que aquelas
coisas que são brancas sejam brancas naquilo que
são brancas”.
Circa primum tria facit. Primo praemittit Sobre o primeiro faz três coisas: Primeiro
quandam suppositionem; secundo ostendit quid apresenta certa suposição. Segundo, feita aquela
illa suppositione facta sequatur circa bonitatem suposição, mostra o que seguiria sobre a bondade
rerum, ibi, “Hoc igitur paulisper amoto, ponamus das coisas ali [onde diz] “Tendo, assim, removido
omnia esse quae sunt bona”; tertio ostendit Este por um breve tempo, sustenhamos que todas
qualiter se habeat bonitas rerum secundum rei as coisas que são sejam boas”. Terceiro, sem fazer
veritatem, nulla suppositione facta, ibi, “Quae nenhuma suposição, mostra de que modo se
quoniam non sunt simplicia, nec esse omnino relaciona a bondade das coisas segundo a verdade
poterant, nisi ea id quod solum bonum est, esse da realidade ali [onde diz] “Como aquelas coisas
voluisset”. não são simples, não poderiam de nenhum modo
existir, a não ser que Aquele que é simplesmente
é bom quisesse que elas existissem”.
Circa primum duo facit. Primo praemittit Sobre o primeiro faz duas coisas: primeiro
quiddam quod est necessarium ad ostendendum estabelece algo que é necessário para mostrar que
quod possit fieri talis suppositio; secundo se pode dar tal suposição. Segunto apresenta a
suppositionem inducit, ibi, “Amoveamus igitur suposição ali [onde diz] “Agora, removamos por
Primi Boni praesentiam paulisper ex animo”. um breve tempo de nosso pensamento a presença
do Primeiro Bem”.

Dicit ergo primo, quod multa sunt quae non Portanto, diz primeiramente que há muitas
possunt actu separari, quae tamen animo et coisas que não podem separar-se em ato, mas que
cogitatione separantur: cuius ratio est, quia alio no espírito e no pensamento se separam. A razão
modo sunt res in anima, et alio modo sunt in disto é que de um modo estão as coisas na alma e
materia. Potest ergo esse quod aliquid ex eo ipso de outro modo na matéria. Pode, por conseguinte,
modo quo est in materia, habet inseparabilem dar-se que algo, por seu próprio modo no qual
coniunctionem ad aliud; et tamen secundum quod está na matéria, tenha uma conjunção inseparável
est in anima, non habet inseparabilem a outra coisa e, mesmo assim, enquanto que está
coniunctionem ad ipsum, quia scilicet ratio unius na alma não tem uma união inseparável com
est distincta a ratione alterius: Et ponit exemplum aquilo, porque, a saber, a razão de um é distinta
de triangulo, et aliis mathematicis quae a materia da razão do outro. E coloca o exemplo do triángulo
sensibili actu separari non possunt, cum tamen e de outras coisas matemáticas que não ponde
mathematicus abstrahendo mente consideret separar-se da matéria sensível, ainda que o
triangulum et proprietatem eius praeter materiam matemático abstraindo com a mente considere o
sensibilem, quia scilicet ratio trianguli non triángulo e suas propriedades além da matéria
dependet a materia sensibili. sensível, pois, de fato, a noção de triângulo não
depende da matéria sensível.
Deinde cum dicit, “Amoveamus igitur Primi Depois quando diz “Agora, removamos por um
Boni praesentiam paulisper ex animo”, ponit breve tempo de nosso pensamento a presença do
suppositionem quam intendit, ut scilicet quod Primeiro Bem”, põe a suposição que tinha visado,
consideratione mentis removeamus ad tempus ou seja, que com a consideração da mente
praesentiam Primi Boni a ceteris rebus: quod removamos por um tempo a presença do Primeiro
quidem possibile est secundum ordinem Bem das demais coisas, o qual é possível segundo
cognoscibilium quoad nos. Quamvis enim a ordem do que é cognoscível para nós. Pois, ainda
secundum naturalem ordinem cognoscendi, Deus que Deus seja o primeiro cognoscível segundo a
sit primum cognitum, tamen quoad nos prius sunt ordem natural de conhecer, no entanto, no que se
cogniti effectus sensibiles eius; et ideo nihil refere a nós, primeiro se conhecem seus efeitos
prohibet in consideratione nostra cadere effectus sensíveis. E assim, nada proíbe que o efeito do
Summi Boni, absque hoc quod ipsum Primum Sumo Bem caia em nossa consideração sem levar
Bonum consideremus. Ita tamen primum em conta o próprio Primeiro Bem. Mesmo que não
removeamus a consideratione mentis, quod removamos assim o Primeiro Bem da
omnino constet nobis illud esse. Hoc enim consideração da mente, o qual, sem dúvida, nos
“cognosci potest ex communi omnium sententia consta que existe. Pois o fato de que nada existiria
tam doctorum quam indoctorum”, et ulterius se Deus não existisse “se pode conhecer pela
etiam “ex ipsis religionibus gentium barbararum”, comum opinião de todos os doutos como também
quae nullae essent, si Deus non est. dos indoutos” e, ulteriormente, também “pelas
próprias religiões dos povos bábaros”.
Deinde cum dicit, “Hoc igitur paulisper amoto, Depois quando diz “Tendo, assim, removido
ponamus omnia esse quae sunt bona”, ostendit Este por um breve tempo, sustenhamos que todas
quid hac suppositione facta sequatur circa as coisas que são sejam boas”, mostra o que segue
bonitatem rerum: et circa hoc duo facit. Primo tendo feito esta suposição sobre a bondade das
manifestat quod intendit; secundo probat coisas e sobre isto faz duas coisas. Primeiro
quiddam quod supposuerat, ibi, “quod si nihil manifesta o que pretende. Segundo prova algo
omnino aliud essent nisi bona […] tunc non res, que tinha suposto ali [onde diz] “E por isso, se não
sed rerum viderentur esse principium”. fossem absolutamente nada mais que boas [...].
Agora elas não pareceriam que são coisas, mas o
princípio das coisas.”
Dicit ergo primo, quod remoto per intellectum Portanto, em primeiro lugar diz que, removido
primo bono, ponamus quod cetera sint bona: quia o Primeiro Bem por meio do intelecto,
ex bonitate effectuum devenimus in cognitionem suponhamos que as demais coisas sejam boas. Já
Boni Primi. Consideremus ergo qualiter possent que da bondade dos efeitos chegamos ao
esse bona, si non processissent a Primo Bono. Hac conhecimento do primeiro bem, consideremos
autem suppositione facta, videtur in eis aliud esse então como poderiam ser boas se não
ipsa bonitas, et ipsum eorum esse. Si enim procedessem do Primeiro Bem. Feita esta
“ponatur una et eadem substantia esse bona, suposição, se ve nelas que uma coisas é a mesma
alba, gravis, rotunda”, sequetur quod “aliud” in illa bondade e outra seu mesmo ser. Pois se “supomos
re esset eius “substantia, aliud rotunditas, aliud que uma e a mesma substância é boa, branca,
color, aliud bonitas”. Intelligitur enim bonitas pesada e redonda”, se conclui que “uma coisa”
uniuscuiusque rei virtus ipsius, per quam perficit nela seria sua “substância e outra a redondez,
operationem bonam. Nam virtus est quae bonum outra a cor, outra a bondade”. De fato, se entende
facit habentem, et opus eius bonum reddit, ut per que a bondade de algo é como uma virtude da
Philosophum patet in lib. Ethic. Quod autem ista própria coisa pela qual realiza uma boa operação.
sit aliud quam substantia rei, probat per hoc quod Pois a virtude é o que faz bom a quem a possui e
singula praemissorum si essent idem quod rei torna sua obra boa como fica evidente pela
substantia, sequeretur etiam quod omnia illa exposição do Filósofo no livro da Ética. Por outro
essent eadem ad invicem; scilicet quod idem esset lado, o fato de que esta seja diversa da substância
gravitas quod color, et quod bonum, et quod da coisa, se prova pelo fato de que se cada uma
album, et quod rotunditas: quia quae uni et eidem das premissas fossem o mesmo que a substância
sunt, sibi invicem sunt eadem. Hoc autem natura da coisa, seguiria também que todas aquelas
rerum non patitur quod omnia ista sint idem. coisas seriam as mesmas entre si. A saber, que a
Relinquitur igitur quod, praemissa suppositione gravidade seria o mesmo que o calor, que o bem,
facta, aliud esset in rebus ipsum esse, et aliud que o branco e que a redondez, pois aquelas
aliquid esse, puta vel bonum, vel album, vel coisas que são para uma única e mesma coisa
quidquid taliter dicitur: et sic, praedicta positione seriam as mesmas mutuamente. Mas isto a
facta, res essent quidem bonae, non tamen ipsum natureza das coisas não admite, a saber, que todas
eorum esse esset bonum. Sic ergo si aliquo modo sejam idênticas. Resta então que, tendo feito a
essent non a Primo Bono, et tamen in se essent suposição acima exposta, nelas uma coisa seria o
bona, sequeretur quod non idem esset in eis quod próprio ser e outra ser algo, por exemplo, ou bom,
sint bonae; sed aliud esset in eis esse, et aliud ou branco, ou qualquer coisa que se diga assim. E
bonum esse. assim, dada esta prévia condição, as coisas seriam
certamente boas, contudo o mesmo ser delas não
seria bom. Assim, pois, se de algum modo não
procedessem do primeiro bem e mesmo assim
fossem boas em si mesmas, se concluiria que não
é idêntico nelas o fato de serem tais e o fato de
serem boas. Mas uma coisa seria nelas o ser e
outra coisa o ser bom.
Deinde cum dicit, “quod si nihil omnino aliud Depois quando diz “E por isso, se não fossem
essent nisi bona […] tunc non res, sed rerum absolutamente nada mais que boas [...]. Agora
viderentur esse principium”, probat quod elas não pareceriam que são coisas, mas o
supposuerat, scilicet quod praedicta suppositione princípio das coisas”, prova o que havia suposto, a
facta, aliud esset in eis bonum esse, et aliud saber, que, tendo feito a conjetura anteriormente
simpliciter esse, vel quidquid aliud esse. Quia si mencionada, uma coisa seria nelas o ser bom,
nihil aliud esset in eis nisi quod sunt bona, ita
outra simplemente ser ou ser qualquer outra
scilicet quod “neque essent gravia, neque coisa. Porque se nada mais existisse nelas, exceto
colorata, neque distincta aliqua spatii o fato de serem boas, assim é evidente que “não
dimensione”, sicut sunt omnia corpora, nec essetseriam nem pesadas, nem coloridas, nem distintas
in eis ulla qualitas, nisi hoc solum quod bona por alguma dimensão de espaço”, como são todos
essent; tunc non videretur quod essent res os corpos, e não haveria nelas qualquer qualidade,
creatae, sed quod essent ipsum primum rerum senão somente esta que são boas. Então não
principium: quia id quod est ipsa essentia pareceriam ser coisas criadas, mas o próprio
bonitatis, est primum rerum principium: et per princípio das coisas. E consequentemente se
consequens sequeretur quod non oporteret seguiria que não seria necessário falar de todas
dicere pluraliter de omnibus eis quod viderenturelas no plural pelo fato de que pareceriam ser o
esse principium rerum, sed singulariter quod princípio das coisas, mas no singular, pois
videretur esse primum rerum principium, pareceriam ser o primeiro princípio das coisas
tanquam res bonae omnes essent simpliciter como se todas as coisas boas fossem
unum: quia solum unum est quod est huiusmodi semplismente uma só, porque há somente uma
ut sit tantummodo bonum, et nihil aliud. Hoc coisa que é assim de tal modo que é somente bom
autem patet esse falsum. Ergo et primum; quod e nada mais. Mas isto é evidentemente falso.
scilicet res creatae, amoto Primo Bono, nihil aliud
Portanto também o primeiro, a saber, que as
essent quam hoc quod est esse bonum. coisas criadas, removido o Primeiro Bem, nada
mais seriam que isto que é ser bom.
Deinde cum dicit, “quae quoniam non sunt Depois quando diz “Como aquelas coisas não
simplicia, nec esse omnino poterant, nisi ea id são simples, não poderiam de nenhum modo
quod solum bonum est, esse voluisset”, ostendit existir, a não ser que Aquele que é simplesmente
quid sit iudicandum de bonitate rerum secundum é bom quisesse que elas existissem”, mostra
veritatem; et dicit: quia res creatae non habent aquilo que se deve julgar sobre a bondade das
omnimodam simplicitatem, ut scilicet nisi aliud sit coisas segundo a verdade. E afirma: porque as
in eis quam essentia bonitatis; nec etiam omnino coisas criadas não têm uma simplicidade absoluta,
esse possent in rerum natura, nisi voluisset ea esse ou seja, que não há nada mais nelas que a essência
Deus, qui est id quod solum est, inquantum scilicet da bondade, e nem podem de modo algum existir
est ipsa essentia bonitatis; sequitur quod quia esse na natureza se Deus, o qual somente é o que é
rerum creatarum effluxit a voluntate illius qui est enquanto é a mesma essência da bondade, não
essentialiter bonum, ideo res creatae bonae esse quisesse que elas fossem, se conclui assim que as
dicuntur. Primum enim Bonum, scilicet Deus, in eo coisas criadas se dizem serem boas porque o ser
quod est, bonum est, quia est essentialiter ipsa delas flui da vontade daquele que é
bonitas; sed secundum bonum, quod est creatum, essencialmente bom. Pois o Primeiro Bem, ou
est bonum secundum quod fluxit a Primo Bono, seja, Deus, é bom naquilo que é porque é
quod est per essentiam bonum. Cum igitur esse essencialmente a mesma bondade. Mas o
omnium rerum fluxerit a Primo Bono, consequens segundo bem que é criado é bom na medida que
est quod ipsum esse rerum creatarum sit bonum, este flui do Primeiro Bem que é por essência bom.
et quod unaquaeque res creata, inquantum est, sit Sendo, pois, que o ser de todas as coisas flui do
bona. Sed sic solum res creatae non essent bonae Primeiro Bem, se segue que o mesmo ser das
in eo quod sunt, si esse earum non procederet a coisas criadas é bom e que qualquer coisa criada
Summo Bono. enquanto é, é boa. E só neste caso as coisas
criadas não seriam boas naquilo que elas são: se o
ser delas não procedesse do Sumo Bem.
Redit ergo eius solutio ad hoc quod esse Primi Fornece, por tanto, sua solução para isto: que
Boni est secundum propriam rationem bonum, o ser do Primeiro é segundo sua própria razão
quia natura et essentia Primi Boni nihil aliud est bom, porque a natureza e a essência do Primeiro
quam bonitas; esse autem secundi boni est Bem não são outra coisa que a bondade. Por outro
quidem bonum, non secundum rationem propriae lado, o ser do segundo bem é, de fato, bom não
essentiae, quia essentia eius non est ipsa bonitas, por força da própria essência, porque sua essência
vel aliquid aliud huiusmodi; sed esse eius habet não é a mesma bondade, mas a humanidade ou
quod sit bonum ex habitudine ad primum bonum, qualquer outra coisa deste gênero. Mas tem o seu
quod est eius causa: ad quod quidem comparatur ser, que é bom, em relação ao Primeiro Bem que
sicut ad primum principium et ad ultimum finem; é sua causa à qual se constitui como o primeiro
per modum quo aliquid dicitur sanum, quo aliquid princípio e o último fim. Igualmente, alguma coisa
ordinatur ad finem sanitatis; ut dicitur medicinale se diz sã pelo fato estar ordenada ao fim da saúde
secundum quod est a principio effectivo artis assim como algo se diz medicinal na medida em
medicinae. Est enim considerandum secundum que procede de um princípio efetivo da arte da
praemissa, quod in bonis creatis est duplex medicina. Assim, do que foi pré-estabelecido, se
bonitas. Una quidem secundum quod dicuntur deve considerar que nos bens criados há dois tipos
bona per relationem ad Primum Bonum; et de bondade. Uma segundo a qual se dizem boas
secundum hoc esse eorum, et quidquid est in eis a por relação ao Primeiro Bem. E de acordo com isto
Primo Bono, est bonum. Alia vero bonitas o ser delas e qualquer coisa que nelas procede do
consideratur in eis absolute, prout scilicet Primeiro Bem é bom. Porém, a outra bondade se
unumquodque dicitur bonum, inquantum est considera nelas de modo absoluto, a saber, cada
perfectum in esse et in operari: et haec quidem uma se diz boa enquanto é completa no ser e no
perfectio non competit creatis bonis secundum operar. E esta completude não correponde aos
ipsum esse essentiae eorum, sed secundum bens criados segundo o mesmo ser essencial
aliquid superadditum, quod dicitur virtus eorum, delas, mas segundo algo sobreposto que é sua
ut supra dictum est; et secundum hoc, ipsum esse virtude tal como foi comentado acima. E de
non est bonum, sed Primum Bonum habet acordo com isto o mesmo ser não é bom, mas o
omnimodam perfectionem in ipso suo esse, et Primeiro Bem tem todo tipo de perfeição no seu
ideo esse eius est secundum se et absolute mesmo ser e por isso o seu ser é bom de modo
bonum. absoluto e por si mesmo.

CAPITULUM V

[Textus Boetii] [Textus Boetii]

Qua in re soluta est quaestio. Idcirco enim licet Nisto resolve-se a questão: pois ainda que
in eo quod sunt, bona sint, non sunt tamen similia sejam boas naquilo que são, no entanto não são
Primo Bono, quoniam non quoquo modo sint res, semelhantes ao Primeiro Bem, uma vez que as
ipsum esse earum bonum est. Sed quoniam non coisas não são de qualquer modo. O mesmo ser
potest esse ipsum esse rerum, nisi a Primo Esse delas é bom, porém pelo motivo que o mesmo ser
defluxerit, id est Bono, idcirco ipsum esse bonum das coisas não pode existir, a não ser que tenha
est, nec est simile Ei a quo est. Illud enim quoquo procedido do Primeiro Ser, ou seja, do Bem. Assim
modo sit, bonum est, in eo quod est: non enim o mesmo ser é bom e não é semelhante Àquele do
aliud est praeterquam bonum: hoc autem nisi ab qual é. Porém Aquele é absolutamente bom
Illo esse bonum, fortasse esse posset; sed bonum naquilo que é, pois não é nada mais que bom.
in eo quod est esse non posset: tunc enim Enquanto este talvez pudesse ser bom, mas não
participaret forsitan Bono; ipsum vero esse quod poderia ser bom naquilo que é, a não ser que fosse
non haberet a Bono, bonum habere non possent. por Aquele. Pois então, talvez, participariam do
bem. Mas, em verdade, não poderiam ter o
mesmo ser - que elas não teriam pelo bem - como
bom.
Si igitur sublato ab his Primo Bono, mente et Portanto, tendo suprimido o Primeiro Bem
cogitatione, ista, licet essent bona, tamen in eo destes com a mente e com o pensamento, ainda
quod essent bona, esse non possent: et quoniam assim seriam bons, porém não poderiam ser bons
actu non potuerunt exsistere, nisi ea quod vere naquilo que são. E porque não poderiam existir
bonum est produxisset: idcirco et esse eorum em ato a não ser que Aquele que é
bonum est, et non est simile substantiali bono id verdadeiramente bom as produzisse, assim o ser
quod ab eo fluxit : et nisi ab Eo fluxissent, licet delas – o qual procede do bem substancial - é bom
essent bona, tamen in eo quod sunt, bona esse e não lhe é semelhante. Se não procedessem dele
non possent: quoniam et praeter bonum, et non e ainda fossem boas, todavia não poderiam ser
ex bono essent, cum illud ipsum Primum Bonum boas naquilo que são, pois por um lado estariam
et ipsum esse sit et ipsum bonum, et ipsum esse fora do bem e ao mesmo tempo não seriam a
bonum. partir dele. Sendo aquele mesmo Primeiro Bem
tanto o mesmo ser como o mesmo bem e o
mesmo ser bom.
At non alba, in eo quod sunt alba, esse E não seria também conveniente que aquelas
oportebit ea quae alba sunt, quoniam ex voluntate coisas que são brancas sejam brancas naquilo que
Dei fluxerunt, ut essent alba? Minime: aliud enim são brancas, já que, para serem brancas,
est esse, aliud album esse: hoc ideo, quoniam qui procederam da vontade de Deus? De modo
ea ut essent effecit, bonus quidem est, minime algum. Uma coisa é ser e outra ser branco. Isto é
vero albus. Voluntate igitur Boni communicatum assim porque quem fez com que elas existissem, é
est ut essent bona in eo quod sunt; voluntate vero certamente bom, mas de maneira alguma é
albi non communicatum ut talis eius esset branco. Logo, foi determinado pela vontade do
proprietas, ut esset album in eo quod est: neque Bem que fossem boas naquilo que são. Mas
enim ex albi voluntate defluxerunt. Itaque quia certamente não lhe foi determinado pela vontade
voluit ea esse alba qui erat non albus, sunt alba de [algo] não branco esta propriedade de maneira
tantum; quia vero voluit ea esse bona, qui erat que fosse branco naquilo que é, pois tampouco
bonus, sunt bona etiam in eo quod sunt. procederam da vontade do branco. Assim, porque
quis que elas fossem brancas quem não era
branco, são somente brancas. No entanto, porque
quis que elas fossem boas quem era bom, são
boas também naquilo que são.
Secundum igitur hanc rationem cuncta oportet Logo, segundo esta razão convém que todas as
iusta esse, quoniam iustus est Ipse qui ea esse coisas sejam justas, porque o mesmo Justo é quem
voluit? Ne hoc quidem: nam bonum esse ad quis que elas existissem? Nem sequer isto. Pois ser
essentiam, iustum vero esse ad actum respicit. In bom concerne à essência, enquanto ser justo
Deo autem idem est esse quod agere: igitur idem concerne à ação. Porém n’Ele é a mesma coisa ser
est bonum esse quod iustum. Nobis vero non est e agir. Por consequência, [é] a mesma coisa ser
idem esse quod agere: non enim simplices sumus. bom e justo. No entanto para nós não é a mesma
Non igitur nobis idem est bonos esse, quod iustos; coisa ser e agir, pois não somos simples. Portanto,
sed idem nobis est esse omnibus, in eo quod para nós não é o mesmo ser bons e ser justos, mas
sumus. Bona igitur omnia sunt, non autem iusta. para todos nós é o mesmo ser naquilo que somos.
Assim, todas as coisas são boas; porém nem todas
são justas.
Amplius: bonum quidem generale est, iustum Mais ainda, o bem é algo geral. A justiça,
vero speciale, nec species descendit in omnia: porém, especial e a espécie não descende a todas
Idcirco alia quidem iusta, alia aliud. Omnia igitur as coisas. Por isso, sem dúvida, algumas coisas
bona. [são] justas, outras algo mais. Porém todas são
boas.

[Thomae Aquinatis expositio] [Comentário de Tomás de Aquino]

Postquam determinavit veritatem praemissae Depois de determinar a verdade da questão


quaestionis, hic solvit obiectionem, ex qua que havia sido colocada, resolve aqui a objeção da
concludebatur quod bona creata sunt bona in eo qual se concluía que os bens criados são bons
quod sunt quod similia Primo Bono; et circa hoc naquilo que são pelo fato de serem semelhantes
duo facit. Primo solvit obiectionem; secundo ao Primeiro Bem e sobre isto faz duas coisas.
colligit quae dicta sunt, ibi, “Si igitur sublato ab his Primeiro resolve a objeção. Em segundo lugar
Primo Bono, mente et cogitatione”. junta as coisas que foram ditas ali [onde diz]
“Portanto, tendo suprimido o Primeiro Bem
destes se com a mente e com o pensamento”.
Dicit ergo primo, quod ex praemissis patet Portanto, diz em primeiro lugar que do pré-
hanc quaestionem esse solutam; ideo enim non estabelecido fica evidente que esta questão está
sunt similia Primo Bono, per hoc quod sunt bona resolvida. Pois não são semelhantes ao Primeiro
in eo quod sunt, quia ipsum esse rerum creatarum Bem, por serem boas naquilo que são, pois o
non est bonum absolute, quocumque modo se mesmo ser das coisas criadas não é bom de modo
habeat; sed solum secundum habitudinem ad absoluto, qualquer que seja o modo que o
Primum Bonum. Sed quia ipsum esse rerum consideremos, mas somente segundo uma
creatarum non potest esse, nisi deriventur a Primo relação com o Primeiro Bem. Mas como o mesmo
Bono, idcirco ipsum eorum esse bonum est; nec ser das coisas criadas não pode ser, ao menos que
est tamen simile in bonitate Primo Bono: quia illud elas sejam derivadas do Primeiro Bem, por isso o
absolute est bonum, quomodocumque se habeat, mesmo ser delas é bom e, contudo, não é
quia nihil est in eo aliud nisi ipsa essentia bonitatis: semelhante ao Primeiro Bem na bondade. Porque
et hoc ideo est, quia non est in eo perfectio per este é bom de modo absoluto, qualquer que seja
additionem, sed in suo simplici esse habet o modo que se considere, pois nada há nele senão
omnimodam perfectionem, ut dictum est. Sed a própria essência da bondade. E isto é assim pelo
bonum creatum forsitan posset esse bonum etiam fato de que não há nele perfeição sobreposta, mas
in se consideratum, etiam si detur per impossibile contém qualquer perfeição no seu ser simples
quod non procederet a Primo Bono, scilicet como já foi dito. Mas um bem criado quiçá poderia
bonitate quae sibi competeret absolute; sed sic ser bom também considerado em si, inclusive se
non esset bonum in eo quod est, quia tunc esset se concedesse, em defesa do impossível, que não
bonum per participationem bonitatis procedesse do Primeiro Bem, ou seja, da bondade
superadditae; sed ipsum esse eius non esset que lhe competiria de modo absoluto. Mas assim
bonum, si a Bono non derivaretur, ex cuius não seria bom naquilo que é, porque então seria
habitudine ipsum esse rerum creatarum est um bem por participação de uma bondade
bonum. sobreposta e seu mesmo ser não seria bom se não
se derivasse do Bem em relação ao qual o mesmo
ser das coisas criadas é bom.
Deinde cum dicit “Si igitur sublato ab his Primo Depois quando diz “Portanto, tendo suprimido
Bono, mente et cogitatione”, colligit in unum quae o Primeiro Bem destes se com a mente e com o
dicta sunt: et dicit, quod si a rebus per intellectum pensamento”, recolhe as coisas que foram
removeatur Primum Bonum, omnia alia, licet mencionadas e diz que se se removesse com o
detur quod essent bona, non tamen possunt esse intelecto o Primeiro Bem das coisas, todas elas,
bona in eo quod sunt. Sed quia non potuerunt esse ainda concedendo que são boas, não poderiam,
in actu, nisi inquantum sunt producta a Primo apesar disto, serem boas naquilo que são. Mas
Bono, quod est vere bonum; ideo etiam esse porque não foram capazes de existir em ato,
eorum est bonum; et tamen esse fluens a Primo senão na medida em que foram produzidas pelo
Bono non est simile primo quod est substantialiter Primeiro Bem, que é verdadeiramente bem, por
bonum; a quo nisi omnia fluxissent, licet essent isso o ser delas é também bom. E mesmo assim, o
bona, non tamen essent bona in eo quod sunt, ser que flui do Primeiro Bem não é semelhante ao
inquantum scilicet non essent ex Primo Bono; cum Primeiro que é bem substancial, do qual, se não
tamen ipsum Bonum Primum sit Ei ipsum esse, fluíssem todas as coisas, mesmo concedendo que
quia eius esse est substantia sua; et ipsum bonum, fossem boas, não seriam, entretanto, boas naquilo
quia est ipsa essentia bonitatis: et ipsum esse que são, ou seja, na medida em que não
bonum, quia in Eo non differt esse et quod est. procedessem do Primeiro Bem. Todavia como o
próprio Primeiro Bem é também seu mesmo ser,
porque seu ser é sua substância, do mesmo modo
é o mesmo bem, pois é a própria essência da
bondade, e o mesmo ser bom, já que nele não
difere o ser e aquilo que é.
Deinde cum dicit “At non alba, in eo quod sunt Depois quando diz “E não seria também
alba, esse oportebit ea quae alba sunt”, movet conveniente que aquelas coisas que são brancas
duas obiectiones contra praedicta: quarum sejam brancas naquilo que são brancas”, levanta
secundam ponit ibi, “Secundum igitur hanc duas objeções contra o que foi dito, das quais a
rationem, cuncta oportet iusta esse, quoniam segunda está posta ali [onde diz] “Logo, segundo
iustus est Ipse, qui ea esse voluit?” esta razão convém que todas as coisas sejam
justas, porque o mesmo Justo é quem quis que
elas existissem?”
Circa primum ponit talem obiectionem. Dictum Sobre a primeira põe esta objeção: foi dito que
est, quod omnia in eo quod sunt, bona sunt, quia todas as coisas são boas naquilo que são porque
ex voluntate Primi Boni processit ut essent bona. procederam da vontade do Primeiro Bem para
Nunquid ergo omnia alba, in eo quod sunt, alba serem boas. Acaso, então, todas as coisas brancas,
sunt, quia ex voluntate Dei processit ut alba são brancas naquilo que são porque procederam
essent? Sed ipse respondet quod minime hoc da vontade de Deus para que fossem brancas?
oportet: quia his quae sunt alba, aliud est esse Mas ele mesmo responde que isto não convém de
simpliciter, quod competit eis secundum principia modo algum, pois para estas coisas que são
essentialia, et aliud est ex quo sunt alba: et brancas uma coisa é simplesmente ser, o qual lhes
huiusmodi differentiae inter album et bonum ratio compete segundo os princípios essenciais e outra
est, quia Deus qui fecit creata bona, et alba, est coisa é aquilo pelo qual são brancas. E a razão para
quidem bonus, non est autem albus. Sic igitur ad tal diferença entre branco e bom é que Deus que
voluntatem Primi Boni consecutum est ut creata fez as coisas criadas boas e brancas é em efeito
essent bona, inquantum voluit ea esse bona, et bom, mas não é branco. Assim resultou então da
quod essent bona in eo quod sunt, inquantum vontade de Deus que as coisas criadas fossem
sunt a Bono producta, quia esse rerum creatarum boas enquanto quis que elas fossem boas e que
ex hoc ipso quod est a Bono, habet rationem boni fossem boas naquilo que são enquanto foram
ut dictum est; sed voluntatem Dei non est produzidas pelo Bem. Pois, com foi dito, o ser das
consecuta talis proprietas, ut id quod est creatum, coisas criadas tem razão de bem pelo próprio fato
in eo quod est, sit album, propter hoc quod non de procederem do Bem. Mas não resulta da
defluxit ex voluntate albi, sicut bona fluxerunt ex vontade de Deus esta [outra] propriedade de tal
voluntate Boni; ut posset dici quod esse eorum est modo que aquilo que é criado, seja branco naquilo
album, inquantum sunt a primo albo. Sic igitur que é pelo fato de não fluir da vontade do branco
manifestum est quod quia Deus, qui non est albus, assim como as coisas boas fluíram da vontade do
voluit aliqua esse alba; potest quidem hoc solum Bem de tal modo que se pudesse dizer que o ser
dici de eis quod sunt alba, non autem quod sunt delas é branco enquanto são a partir de primeiro
alba in eo quod sunt; sed quia Deus qui est bonus, branco. Assim, fica claro que pelo fato de Deus,
voluit omnia esse bona, ideo sunt bona in eo quod que não é branco, querer que algumas coisas
sunt, inquantum scilicet esse eorum habet fossem brancas, somente se pode dizer isto delas:
rationem boni propter hoc quod est a Bono. que são brancas, mas não que são brancas naquilo
que são. Mas porque Deus que é bom, quis que
todas as coisas fossem boas, assim são boas
naquilo que são, enquanto, a saber, o ser delas
tem razão de bem pelo fato de procederem do
Bem.
Deinde cum dicit “Secundum igitur hanc Depois quando diz “Logo, segundo esta razão
rationem, cuncta oportet iusta esse, quoniam convém que todas as coisas sejam justas, porque
iustus est Ipse, qui ea esse voluit?”, ponit o mesmo Justo é quem quis que elas existissem?”,
secundam obiectionem. Posset enim aliquis coloca a segunda objeção. Em efeito, alguém
dicere: omnia sunt bona in eo quod sunt, quia Ille poderia dizer: todas as coisas são boas naquilo que
qui est bonus, voluit ea esse bona: pari ratione são, porque Aquele que é Bom, quis que elas
omnia oportet esse iusta, quia Ille qui est iustus, fossem boas. Com igual razão convém que todas
voluit ea esse iusta. Sed ipse respondet, quod hoc as coisas sejam justas, porque Aquele que é justo
non sequitur duplici ratione. Primo quidem, quia quis que elas existissem. Mas ele mesmo responde
hoc quod est bonum, significat naturam quandam que isto não procede por duas razões. Primeiro,
sive essentiam. Dictum est enim quod Deus est sem dúvida, porque isto que é bom significa certa
ipsa essentia bonitatis, et unaquaeque res natureza ou essência. Mas foi dito que Deus é a
secundum perfectionem propriae naturae dicitur própria essência da bondade e que qualquer coisa
bona: sed iustus dicitur per respectum ad actum, se diz boa segundo a perfeição da própria
sicut et quaelibet virtus. In Deo autem idem est natureza. Mas justo se diz por referência ao ato,
esse quod agere; unde in ipso idem est bonum assim como também qualquer outra virtude.
esse quod iustum esse: sed nobis non est idem Porém em Deus é a mesma coisa ser e agir. De
esse quod agere, quia deficimus a simplicitate Dei: onde se conclui que nEle é a mesma coisa ser bom
unde nobis non est idem esse bonos et iustos; sed e ser justo. Mas para nós não é o mesmo ser e agir,
esse convenit nobis omnibus inquantum sumus, et pois carecemos da simplicidade de Deus. De onde
ideo etiam bonitas omnibus nobis convenit; sed se conclui que para nós não é o mesmo ser bons e
actus quem recipit iustitia non convenit omnibus, justos, mas o ser convém a todos nós enquanto
nec in his quibus convenit, est idem quod esse somos, e por isto também a bondade convém a
ipsorum: unde relinquitur quod non omnia sunt todos nós. Mas a justiça que recebe o ato não
iusta in eo quod sunt. convém a todos, nem para estes aos quais ela
Secundam rationem ponit ibi “amplius, bonum convém é o mesmo que seu ser. Assim resta que
quidem generale est, iustum vero speciale”. nem todas as coisas são justas naquilo que são.
Bonum enim est quoddam generale, cuius A segunda razão coloca ali [onde diz] “Mais
quaedam species est iustitia sicut et ceterae ainda, o bem é algo geral. A justiça, porém,
virtutes. In Deo autem invenitur omnis ratio especial”. De fato, o bem é algo geral do qual a
bonitatis; et ideo non solum est bonus, sed iustus. justiça é certa espécie assim como as demais
Non autem omnes species bonitatis inveniuntur in virtudes. Porém em Deus se encontra toda a razão
omnibus, sed diversae in diversis; et ideo non da bondade e assim não somente é bom como
oportet quod species quae est iustitia, derivetur também justo. No entanto, não todas as espécies
ad omnia entia, sicut derivatur bonitas. Unde de bondade são encontradas em todas as coisas,
entium quaedam sunt iusta, quaedam vero mas diversas em diferentes coisas. E, portanto,
habent aliam speciem bonitatis; et tamen omnia não convém que uma espécie que é a justiça se
sunt bona, inquantum derivantur a Primo Bono. derive para todas as coisas como se deriva a
bondade. Por isto, certos entes são justos
enquanto outros têm outra espécie de bondade.
Todavia todas as coisas são boas enquanto são
derivadas do Primeiro Bem.
Et in hoc terminatur expositio huius libri. E com isto se termina o comentário deste livro.
Benedictus Deus per omnia. Amen. Bendito seja Deus por todas as coisas. Amém.

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