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UNIVERSIDADE FEDERAL FLUMINENSE

ESCOLA DE ENFERMAGEM AURORA DE AFONSO COSTA


CURSO DE GRADUAÇÃO EM ENFERMAGEM E LICENCIATURA

MARCELE GORITO DE MELLO DE OLIVEIRA

CUIDADOS DE ENFERMAGEM ÀS PESSOAS COM ÚLCERAS FALCÊMICAS:


REVISÃO INTEGRATIVA DE LITERATURA

NITERÓI – RJ
2019
MARCELE GORITO DE MELLO DE OLIVEIRA

CUIDADOS DE ENFERMAGEM ÀS PESSOAS COM ÚLCERAS FALCÊMICAS:


REVISÃO INTEGRATIVA DE LITERATURA

Monografia apresentada ao curso de graduação


de Enfermagem, da Escola de Enfermagem
Aurora de Afonso Costa (EEAAC), da
Universidade Federal Fluminense (UFF) como
parte dos requisitos necessários à obtenção de
título de Enfermeira e Licenciada em
Enfermagem.

Orientadora
Profª Drª Euzeli da Silva Brandão

NITERÓI – RJ
2019
Ficha catalográfica automática - SDC/BENF
Gerada com informações fornecidas pelo autor

O48c Oliveira, Marcele Gorito de Mello de


CUIDADOS DE ENFERMAGEM ÀS PESSOAS COM ÚLCERAS FALCÊMICAS: :
REVISÃO INTEGRATIVA DE LITERATURA / Marcele Gorito de Mello de
Oliveira ; Euzeli Brandão, orientadora. Niterói, 2019.
35 p. : il.

Trabalho de Conclusão de Curso (Graduação em Enfermagem)-


Universidade Federal Fluminense, Escola de Enfermagem Aurora
de Afonso Costa, Niterói, 2019.

1. Anemia falciforme. 2. Cuidados de enfermagem. 3.


Produção intelectual. I. Brandão, Euzeli, orientadora. II.
Universidade Federal Fluminense. Escola de Enfermagem Aurora
de Afonso Costa. III. Título.

CDD -

Bibliotecária responsável: Suelen de Mendonça Soares Cóquero - CRB7/6163


MARCELE GORITO DE MELLO DE OLIVEIRA

CUIDADOS DE ENFERMAGEM ÀS PESSOAS COM ÚLCERAS FALCÊMICAS:


REVISÃO INTEGRATIVA DE LITERATURA

Monografia apresentada ao curso de graduação


de Enfermagem, da Escola de Enfermagem
Aurora de Afonso Costa (EEAAC), da
Universidade Federal Fluminense (UFF) como
parte dos requisitos necessários à obtenção de
título de Enfermeira e Licenciada em
Enfermagem.

Aprovada em 10 de Dezembro de 2019

BANCA EXAMINADORA

___________________________________________________________________________
Prof.a Dra. Euzeli da Silva Brandão (Orientadora) – EEAAC/UFF

___________________________________________________________________________
Prof.a Dra.Beatriz Fernandes Dias - EEAAC/UFF

___________________________________________________________________________
Enfª Ms. Claudia Labriola de Medeiros Martins - HUAP/UFF

___________________________________________________________________________
Enfª Ms. Fernanda Machado Pinheiro

NITERÓI - RJ
2019
Dedico este a vó Raimunda Benta de Oliveira que sempre foi e sempre será minha inspiração de
pessoa bondosa e fiel a Deus.
AGRADECIMENTOS

Entrar na universidade não foi fácil, passar por ela muito menos. Houve dias em
quedesejei desistir, houve diz em que me julguei incapaz de seguir adiante, houve dias em que
precisei fazer escolhas atrás de escolhas, escolhas bem difíceis até. Entrar no curso de
enfermagem foi desafiador, foi ver a vida além do que se vê de fato, foi enxergar a dor do
outro, aprender a lidar com o próximo, adquirir uma responsabilidade para com o outro e
respeitá-lo. Esses anos foram difíceis, mas é com gratidão que estou aqui, finalizando esse
ciclo.

Primeiramente gostaria de agradecer à Deus por não ter me desamparado nunca, por
ter me iluminado e me dado forças pra seguir em frente. Aos meus pais, Vânia e Robert, por
todo apoio que foi fundamental, sonharam este sonho e se sacrificaram junto comigo. Aos
meus irmãos, Gabriel Willians e Monique, que são meus alicerces e sempre acreditaram em
mim. Aos meus avós, Wanderley e Dalva, que fazem de tudo por mim. Aos meus avós,
Raimunda e Ângelo, que hoje são dois anjinhos no céu, não estão mais aqui presentes, mas
dedico esta realização a vocês.

À minha família que comemora comigo a cada conquista, a cada passo dado em
direção aos meus sonhos. Aos meus amigos que entenderam minhas ausências e sempre
estiveram ali torcendo por mim. Ao meu cunhado Ricardo que imprimia meus trabalhos e
documentos referentes a faculdade, e também sempre acreditou em mim. Ao meu amigo
Justino que me ajudou totalmente na escrita desse trabalho. Ao Lucas, uma pessoa muito
importante nessa minha trajetória, que aturava meus surtos de querer trancar a faculdade,
obrigada por não me deixar desistir, por todo apoio nesses anos, por ser meu porto seguro e
ter aturado minhas mudanças de humor por conta da faculdade, por ter me feito companhia
em casa quando precisava estudar pra prova ou fazer trabalhos. Ao meu padrinho Ilson por
confiar tanto no meu potencial. À minha amiga Daiane, pela cumplicidade nesses anos. À
minha princesa Manuela, que veio como um presente para alegrar meus dias, não vejo a hora
de ver seu rostinho, você me deu o gás necessário para finalizar esse ciclo.

Às amizades que fiz nessa caminhada: Gabrielle Castro, Monique Santos, Mariana
Moreira, Manuella Holovaty, Thais Thomaz, Tayana Marques, Layla Linhares, Bruna
Carvalho, Carol Moscon, Rebeca Melo, Amanda Casal, Fabiane Sorrentino e entre outros.
Vocês foram essenciais nessa trajetória, vocês foram as mãos que me erguiam quando tudo
estava de cabeça pra baixo, vocês dividiram momentos muito importantes comigo, risadas,
tristezas, desespero das provas, trabalhos, ETPs, estágio curricular, sorriso de um paciente etc.
Sem vocês eu não teria chegado até aqui.

Thais Thomaz foi meu alicerce, um presente de Deus, virou minha amiga do nada e
sou tão grata por essa amizade, por essa conexão, sem você eu não teria sobrevivido a
fundamentos nem a ESAI. E sem você foi tão difícil seguir essa trajetória, está marcada na
minha história. Tayana foi outro presentinho de Deus e da UFF, nem lembro quando viramos
amiga de fato, mas lembro que eu estava mais sozinha do que nunca e sentia que não me
encaixava em lugar nenhum, mas aí você, com seu jeito incrível me cativou, te desejo um
mundo de coisas maravilhosas, sou eternamente grata pela sua amizade, sem nossas
reclamações diárias, sem nossos desabafos, sem seu apoio, eu não conseguiria.

Aos pacientes que passaram por mim, cada um de vocês foi único e cada um de
vocês me ensinou um pouquinho, se sou uma enfermeira hoje foi graças a vocês. Vocês me
ensinaram tanto sobre amor, sobre dor, perda, felicidade, gratidão. Eu poderia escrever um
livro sobre todas as coisas que sinto quando penso em cada um de vocês. Cada paciente que
pude proporcionar conforto, alívio, cada paciente que ajudei a se alimentar, cada criança que
vi nascer, cada paciente que vi ter alta, ou até mesmo os que se foram, meu muito obrigada.

À todos os professores e profissionais que me ensinaram algo, que tiveram paciência


e me incentivaram a ser o melhor de mim mesma, principalmente as enfermeiras Rosemary
Bacellar e Cláudia Labriola por todo ensinamento, confiança e carinho. Às enfermeiras Ana
Lúcia Abreu e Fernanda Pinheiro por todo apoio, incentivo e ensinamento em cada dia de
estágio. À equipe da maternidade do HUAP em especial por toda recepção, carinho e
paciência. Ao professor Paulo Flores que me fez enxergar o que é ser enfermeiro em sala de
aula, que me acolheu e me ensinou tanto em tão pouco tempo, sou muito grataa toda equipe
Mova por acreditarem tanto em mim e no meu potencial.

Por último, mas não menos importante, à minha orientadora Euzeli que sempre
esteve ali por mim, não desistiu de mim mesmo quando eu chegava pra ela dizendo que não
iria conseguir, que não aguentava mais e ia trancar a faculdade. Ela que sempre acreditou que
eu era capaz mesmo quando eu não acreditava. Obrigada por todo suporte até aqui, pelas
oportunidades que me foram dadas no decorrer dessa caminhada, pelas correções e incentivos.

À todos que diretamente ou indiretamente torceram por mim, muito obrigada! Amo
cada um de vocês de um jeito especial.
Independentemente das circunstâncias,
devemos ser sempre humildes, recatados e
despidos de orgulho.

Dalai Lama
RESUMO

Objetivo: identificar os cuidados de enfermagem, recomendados na literatura, para as pessoas


com úlceras falcêmicas. Método: Trata-se de uma Revisão Integrativa de Literatura (RIL). A
coleta do material para a pesquisa foi realizada com os seguintes descritores: “cuidados de
enfermagem”, “anemia falciforme”, “nursing care” e “sickle cell anemia”. Foi utilizado entre
os descritores, o operador boleano “and”. A busca dos artigosfoi realizada em ambiente
virtual na Biblioteca Virtual de Saúde (BVS), fazendo um apanhado da Base de Dados de
Enfermagem (BDENF), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde
(LILACS), Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDLINE) e Campus
Virtual de Saúde Pública – Brasil (CVSP-Brasil). Foi realizada também busca na biblioteca de
dados da SCIELO, SCOPUS e CINAHL. Resultados: Apenas um artigo apresentou resultados
de pesquisa de um estudo longitudinal com abordagem quantitativa. Aponta-se a precariedade
de estudos quantitativos e com níveis de evidência mais significativos. Discussão: Os artigos
selecionados abordam principalmente produtos e coberturas utilizados no tratamento das
úlceras falcêmicas, medidas preventivas, bem como cuidados gerais. Conclusão: Diante da
escassez de estudos encontrados e selecionados durante a busca nas fontes de dados
estabelecidas, considera-se que o objetivo deste estudo foi atingido parcialmente, tendo em
vista a ausência de uma abordagem mais ampla, pois os artigos privilegiam medidas
preventivas e o uso de produtos/coberturas sem contemplar a avaliação da pessoa e da lesão
propriamente dita. Além disso, importa mencionar a ausência de artigos com níveis de
evidência significativos.

Descritores:Cuidados de enfermagem. Anemia falciforme.


ABSTRACT
Objective: To identify the nursing care, recommended in the literature, for people with sickle
cell ulcers. Method: This is an Integrative Literature Review (RIL). The research material was
collected with the following descriptors: “cuidados de enfermagem”, “anemia falciforme”,
“nursing care” and “sickle cell anemia”. Among the descriptors, the boolean operator “and”
was used. The search for articles was performed in a virtual environment at the Biblioteca
Virtual de Saúde(BVS), taking a look at the Base de Dados de Enfermagem (BDENF),
Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde (LILACS), Medical
Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDLINE) and Campus Virtual de Saúde
Pública- Brazil (CVSP-Brazil). A search was also performed in the data library of SCIELO,
SCOPUS and CINAHL. Results: Only one article presented research results from a
longitudinal study with quantitative approach. The precariousness of quantitative studies with
more significant levels of evidence is pointed out. Discussion: The selected articles mainly
address products and covers used in the treatment of sickle cell ulcers, preventive measures,
as well as, general care. Conclusion: Given the scarcity of studies found and selected during
the search in established data sources, it is considered that the objective of this study was
partially achieved, considering the absence of a broader approach, since the articles favor
preventive measures and the use of products / covers without considering the assessment of
the person and the injury itself. In addition, it is important to mention the absence of articles
with significant levels of evidence.

Keywords:Nursing care. Sickle cell anemia.


SUMÁRIO

LISTA DE ILUSTRAÇÕES, p. 12

LISTA DE TABELAS, p. 12

1 INTRODUÇÃO, p. 13

2 REFERENCIAL TEMÁTICO, p. 15
2.1 ANEMIA FALCIFORME, p. 15
2.2 ÚLCERAS FALCÊMICAS, p. 16

3 MÉTODO, p. 17

4 RESULTADOS, p. 21

5 DISCUSSÃO, p. 22
5.1 PREVENINDO AS ÚLCERAS FALCÊMICAS, p. 22

5.2 PRODUTOS E COBERTURAS RECOMENDADOS PARA TRATAMENTO DAS ÚLCERAS


FALCÊMICAS, p. 23

5.3 AVALIAÇÃO DA PESSOA COM ANEMIA FALCIFORME PARA PREVENÇÃO E CUIDADOS COM
A FERIDA, p. 25

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS, p. 25

7 OBRAS CITADAS, p. 27

8 OBRAS CONSULTADAS, p. 29
LISTA DE ILUSTRAÇÕES

Fig. 1 Identificação, análise e seleção dos artigos, f. 20

Quadro 1 Características e evidências dos artigos selecionados. Niterói, RJ. Abril, 2019,
f. 21
13

1 INTRODUÇÃO

Enquanto bolsista de um Programa de Extensão intitulado “Prevenção e Tratamento


de Feridas no HUAP/UFF”, durante atendimento às pessoas com feridas que buscam o
ambulatório da instituição, foi observadaa presença de pessoas com diagnóstico médico de
úlceras falcêmicas, tipo de ferida que se desenvolve em pessoas com anemia falciforme.

A anemia falciforme é uma doença de grande relevância clínica e epidemiológica. É


considerada um problema de saúde pública, sendo a doença genética de maior ocorrência no
mundo, tendo altaprevalência em populações afrodescendentes. Devido ao alto grau de
miscigenação no Brasil, a doença tende a atingir uma parcela cada vez maior da população
(AMORIM et al apud BARROS et al, 2009)1. A anemia falciforme é um tipo de classificação
da doença falciforme, conhecida como forma homozigótica SS (HbSS), caracterizada por
alteração na hemoglobina, originando uma hemoglobina anormal denominada HbS, ao invés
da normal denominada HbA (BRASIL, 2002). A polimerização da hemoglobina S é o evento
fundamental na patogenia, resultando na alteração da forma da hemácia, que também pode ser
chamada de glóbulos vermelhos, ou até mesmo eritrócito(ZAGO et al 2013).

A doença ocorre quando os pais são heterozigotos, ou seja, cada um deles


apresentam um único gene afetado transmitindo-o para a criança que consequentemente
receberá dois genes anormais caracterizando assim a homozigose (HbSS), sendo importante
salientar que esses pais, geralmente, são portadores assintomáticos (BRASIL, 2002).As
maiores prevalências são encontradas nos estados da Bahia, Rio de Janeiro, Pernambuco,
Minas Gerais e Maranhão, sendo a Bahia o estado com maioresnúmeros. A partir de um
estudo realizado na Bahia, foi feita uma análise acerca das internações por anemia falciforme
registradas no período de 2008 a 2014, revelando prevalência do sexo masculino, sem
motivos ainda descritos (MARTINS e TEIXEIRA, 2017).A estimativa é de que 7% da
população mundial apresenta transtorno de hemoglobina, sendo a anemia falciforme o mais
frequente. No Brasil, cerca de 7.200.000 pessoas possuem traço falcêmico, sendo a
prevalência de 2% a 8% da população total (GOMES et al, 2014 apud MARTINS e
TEIXEIRA, 2017)2.

1
AMORIM, T.; PRATES, S.; PURIFICAÇÃO, A.C. et al. Incidência de hemoglobinopatias na cidade de Salvador Bahia: um estudo de
base populacional. Serviço de Referência em Triagem Neonatal, APAE Salvador, 2004.

2
GOMES L.M.X et al. Acesso e assistência à pessoa com anemia falciforme na Atenção Primária. Acta Paul Enferm. 2014.
14

Sobre as complicações, é importante mencionar que as “cutâneas são uma causa


frequente de morbidade nas pessoas com anemia falciforme, sendo as úlceras de membros
inferiores as mais prevalentes” (ONYEMACHI apud ARAGÃO, 2015, p.7)3.Paladino (2007)
diz que a estimativa é de que 8% a 10% das pessoas com essa homozigose apresentam esse
tipo de úlcera. As úlceras falcêmicas são lesões crônicas causadas pela obstrução dos vasos
pelas hemácias falcizadas (BRASIL, 2012). De acordo com Meneses et al (2010), foi
realizada uma pesquisa clínica no Brasil onde a prevalência de úlceras falcêmicas
correspondeu a 22%. A pesquisa anterior a essa, realizada no Rio de Janeiro, apresentou um
percentual de 35%, enquanto em outros países, como por exemplo, a Jamaica, a prevalência
foi de 75%.

Diante desses dados e da especificidade da doença, ressalta-se a importância dos


cuidados de enfermagem para oferecer um atendimento digno a este público, visando a sua
recuperação. Nesse sentido, o enfermeiro e a equipe devem buscar conhecimentos para
promoção, prevenção, recuperação e reabilitação da pessoa de forma individualizada.

Assim, torna-se necessário ao enfermeiro conhecer as especificidades deste cuidar,


no sentido de manejar o tratamento da lesão e estabelecer estratégias para o autocuidado,
realizando orientações que estimulem a adesão ao tratamento e estabelecendo ações para
promover a saúde da pessoa visando à melhoria da qualidade de vida. Além disso, poderá
reduzir a incidência de complicações agudas e crônicas, favorecendo assim a reinserção do
mesmo em seu meio físico e social (GALDINO, BARCELLOS e SILVA, 2017).

Nesse sentido, considera-se necessário estudar esse tema para obtenção e


disseminação de informações acerca dos cuidados de enfermagem à pessoa com úlceras
falcêmicas, tendo em vista que sua recuperação é lenta, dolorosa e a taxa de recorrência é alta
(PALADINO, 2007). Diante dessas considerações, levantou-se o seguinte objetivo:
Descrever os cuidados de enfermagem recomendados na literatura para as pessoas com
úlceras falcêmicas nos diferentes cenários de atenção à saúde.

3
ONYEMACHI, N.O; ENWEANI U.N; MADUKA C.O. Musculoskeletal complications of sickle cell disease in Enugu, Nigeria. Nigerian
Journal of Medicine. 2011.
15

2 REFERENCIAL TEMÁTICO

2.1 ANEMIA FALCIFORME

“A anemia falciforme é a doença hereditária monogênica mais comum do Brasil”


(BRASIL, 2002, p.10) e é considerada um problema de saúde pública, devido ao seu alto
índice de prevalência. É diagnosticada por meio da triagem neonatal, através do teste do
pezinho, estabelecida pelo Programa Nacional de Triagem Neonatal e a Política Nacional de
Atenção Integral às Pessoas com Doença Falciforme (BRASIL, 2018). Foi originada na
África e chegou as Américas através da escravidão.Madruga, Santander e Cheavegatti, (2014)
citados por Galdino, Barcellos e Silva (2017) afirmam que a anemia falciforme pode ter
surgido no povo africano como forma de resistência a malária, pois o protozoário Plasmodium
falciparumatinge a hemoglobina A. Assim, acredita-se que as pessoas que sobreviviam a
doença eram as que apresentavam alterações da hemoglobina.

Segundo Brunner & Suddarth (2005), trata-se de uma anemia grave que ocorre a
partir da ruptura das hemácias. É caracterizada pela predominância da hemoglobina (Hb) SS,
que é decorrente a uma mutação no gene β-globínicoque codifica as cadeias ß da Hb,
ocasionando alterações físico-químicas em sua molécula quando desoxigenada e polimerizada
(BRASIL, 2012). Essa polimerização é o principal evento da patogenia e depende de variáveis
tais como: concentração de oxigênio, pH, concentração de hemoglobina S, temperatura,
pressão, força iônica e presença de hemoglobinas normais. Essas alterações fazem com que a
hemácia assuma a forma de uma foice (ZAGO et al 2013).

Conforme Nuzzo e Fonseca (2004), os glóbulos vermelhos falcizados, ou seja, em


forma de foice, não conseguem circular de forma adequada na microcirculação, podendo levar
a obstrução do fluxo sanguíneo capilar ou a sua destruição precoce. Essa obstrução pode levar
a fenômenos como: vaso oclusão, crises dolorosas, alterações imunológicas e
comprometimento sistêmico, sendo as crises dolorosas a manifestação clínica mais frequente,
principalmente em extremidades, coluna vertebral e abdômen. O fenômeno de vaso-oclusão é
autolimitado e geralmente dura cerca de uma semana, é secundário a falcização das hemácias
e pode ser desencadeado por infecções, desidratação e fatores emocionais, causando isquemia
dos tecidos provocando uma resposta inflamatória, gerando dor (ZAGO et al, 2013).
16

Essa patogenia ocorre em forma de homozigose, ou seja, é necessário que ambos os


pais sejam portadores de um único gene afetado (heterozigotos), cada um deles transmitindo
esse gene para a criança, apresentando geneticamente a forma Hb SS (homozigoto). A anemia
falciforme tem uma grande variabilidade clínica, tendo em vista que algumas pessoas podem
apresentar um quadro de gravidade, levando-as a diversas complicações e recorrentes
internações, enquanto outras apresentam uma evolução mais tranquila, às vezes assintomática.
Essa variabilidade pode ter a ver com a hereditariedade e até mesmo com fatores adquiridos,
tais como a alimentação e assistência médica, que são consequências do nível socioeconômico
(BRASIL, 2002).

2.2 ÚLCERAS FALCÊMICAS

Em 90% dos casos, as úlceras falcêmicas ocorrem de forma traumática, por prurido,
picadas de insetos ou sem fatores extrínsecos, como a hipóxia causada pelas crises vaso-
oclusivas recorrentes (MENESES et al, 2010), sendo este um dos mecanismos
fisiopatológicos determinantes para seu surgimento, somado aos processos infecciosos
bacterianos e a diminuição do transporte de oxigênio. Paladino (2007) afirma que a inibição
do óxido nítrico (ON) também tem papel importante no aparecimento dessas úlceras, tendo
em vista que é um gás regulador do tônus muscular produzido pelo endotélio, fazendo a
vasodilatação e realizando o controle da pressão sanguínea, assim como a inibição da adesão
plaquetária. Nessa patologia, há a inativação do ON pela hemoglobina livre no plasma, que é
consequente a hemólise intravascular, devido a produção da meta-hemoglobina, nitrato e
radicais livres, que vão impedir que o oxigênio se ligue e seja transportado, com isso ocorre a
vasoconstrição favorecendo assim o processo de vaso-oclusão, devido ao estreitamento dos
vasos somado ao processo de afoiçamento.

As úlceras falcêmicas são úlceras de membros inferiores que na maior parte dos
casos acometem pessoas do sexo masculino, acima dos 10 anos de idade. Ocorrem geralmente
nas regiões maleolares, tibial anterior, área do tendão calcâneo e ocasionalmente no dorso do
pé (PALADINO, 2007). Ela pode se apresentar de forma superficial, podendo ser únicas ou
múltiplas lesões, com bordas definidas e elevadas, tecido de granulação, exsudato e necrose
em seu leito, sendo de recuperação lenta com grande possibilidade de recidivas, e não
apresenta tanta resposta positiva ao tratamento como os demais tipos de úlceras (MENESES
et al, 2010).
17

3 MÉTODO

Trata-se de uma Revisão Integrativa de Literatura (RIL), método considerado um


instrumento da prática baseada em evidências e tem como objetivo identificar, analisar e
sintetizar os resultados de estudos independentes sobre um mesmo assunto de forma
sistemática e ordenada, é considerado fundamental para apontar lacunas do conhecimento a
serem preenchidas através de novos estudos, como também para uma possível repercussão
positiva de dados (SOUZA, SILVA e CARVALHO, 2010).

A RIL é considerada de suma importância para a enfermagem, pois permite uma


análise ampla da literatura em um período curto de tempo, tendo em vista que esses
profissionais não possuem muito tempo disponível para tal. Para que ela seja relevante é
necessário que as seis etapas sejam seguidas e claramente descritas. A primeira etapa trata-se
da definição da questão de pesquisa (MENDES, SILVEIRA e GALVÃO, 2008).

Para definir a questão de pesquisa, foram consideradas as recomendações do Joanna


Briggs Institute (2019), sendo utilizada a estratégia PICo, resultando na questão: Quais os
cuidados de enfermagem recomendados na literatura para as pessoas com úlceras falcêmicas
nos diferentes cenários de atenção à saúde? Cada dimensão do PICo contribui para a definição
dos estudos a incluir, e equivale aos seguintes elementos: Population (P), pessoas com úlceras
falcêmicas; Interest Area/Intervention (I), cuidados de enfermagem; Context (Co), nos
diferentes cenários de atenção à saúde.

Na segunda etapa devem-se estabelecer os critérios de inclusão e exclusão dos


artigos (MENDES, SILVEIRA e GALVÃO, 2008). Para este trabalho foram estabelecidos os
seguintes critérios: artigos publicados por enfermeiros e disponíveis na íntegra online, nos
idiomas português, inglês e espanhol. Diante da escassez de artigos publicados nos últimos
cinco e dez anos respectivamente, ampliou-se a busca para um recorte temporal dos últimos
quinze anos. Os critérios de exclusão se referem aos estudos duplicados e que não respondem
à questão de pesquisa. A coleta do material para a pesquisa foi realizada em setembro de
2019, com os seguintes descritores: “cuidados de enfermagem” e “anemia falciforme”, que
foram definidos após consulta aos Descritores em Ciência da Saúde (DeCS). Também foram
utilizados os descritores em inglês: “nursing care” e “sickle cell anemia” e em espanhol
“atención de enfermería” e “anemia de células falciformes”. Foi utilizado entre os
descritores, o operador boleano “and”. A busca dos artigos foi realizada em ambiente virtual
18

na Biblioteca Virtual de Saúde (BVS), fazendo um apanhado da Base de Dados de


Enfermagem (BDENF), Literatura Latino-Americana e do Caribe em Ciências da Saúde
(LILACS), Medical Literature Analysis and Retrieval System Online (MEDLINE) e Campus
Virtual de Saúde Pública – Brasil (CVSP-Brasil). Foi realizada também busca na biblioteca de
dados da SCIELO e a partir do portal capes, pelo acesso cafe, foi realizado a busca na
SCOPUS e CINAHL.

A terceira fase é a coleta de dados, que consiste na utilização de um instrumento para


organização dos dados, formando um banco de dados contendo: periódico, título do artigo,
ano de publicação, autores, objetivos do estudo, metodologia utilizada, resultados e principais
conclusões referentes a cada estudo selecionado (MENDES, SILVEIRA e GALVÃO, 2008).

Conforme Souza, Silva e Carvalho (2010), a quarta fase trata-se da análise dos
dados, dos estudos selecionados, através dos critérios de inclusão. Essa análise deve ser feita
de modo criterioso, de forma a garantir a validação da revisão. As autoras ainda afirmam que
para auxílio na classificação de evidência é utilizado um sistema de classificação alicerçado
na Prática Baseada em Evidências, contendo seis níveis de hierarquização, onde o nível 1, o
de maior evidência, sendo caracterizado por estudos clínicos e randomizados, o nível 2 por
estudos individuais e experimentais, o nível 3 por estudos quase experimentais, o nível 4 por
estudos descritivos ou com abordagem qualitativa, nível 5 por estudos através de relatos de
caso ou experiência e nível 6 por estudos através de opiniões de especialistas, sendo no
entanto, o de menor evidência.

A quinta fase corresponde a fase de discussão dos resultados, onde o revisor


estabelece comparações dos resultados com o conhecimento teórico, identificando lacunas do
conhecimento a serem preenchidas através de pesquisas futuras, deixando explícito suas
conclusões e fazendo sugestões para melhoria da assistência de enfermagem. Logo em
seguida, encontra-se a sexta e última fase, sendo esta a apresentação da RIL, ou seja, a síntese
de todo o conhecimento. É uma fase de extrema importância, devendo ser clara, permitindo a
visualização dos dados, de modo a serem expressos por tabelas, gráficos ou até mesmo
quadros, que permitam a comparação entre eles para que ocorra a discussão geral (SOUZA,
SILVA e CARVALHO, 2010).

Combinando os descritores “anemia falciforme” and “cuidados de enfermagem” na


BVS, foram encontrados 317 artigos, sendo 268 da MEDLINE, 34 da LILACS, 21 da
19

BDENF e 1 da CVSP - Brasil. Após aplicar o filtro de idiomas “português”, “inglês”,


“espanhol” e de textos completos disponíveis, foram encontrados 100 artigos. Destes, 57 da
MEDLINE, 30 da LILACS, 19 da BDENF e 1 da CVSP – Brasil. Após leitura dos títulos e
resumos, verificou-se que 11 eram duplicados e 85 não se adequavam aos critérios de
inclusão, sendo selecionados apenas 4 artigos que respondiam a questão de pesquisa e se
enquadravam aos critérios de inclusão descritos, sendo os 4 artigos da LILACS. Na SCIELO
ao usar os mesmos descritores citados acima, foram encontrados 8 artigos. Após leitura dos
títulos e resumos, verificou-se que 1 era duplicado, 6 não se adequavam aos critérios de
inclusão e 1 já havia sido encontrado e selecionado na busca realizada na BVS.

Combinando os descritores “sickle cell anemia” and “nursing care” na SCOPUS,


foram encontrados 215 artigos, depois foi utilizado o filtro de acessos disponíveis e foram
encontrados 21 artigos. Após leitura dos títulos e resumos, verificou-se que nenhum artigo se
adequava aos critérios de inclusão descritos. Combinando estes mesmos descritores na
CINAHL, foram encontrados 67 artigos, depois foi utilizado o filtro de textos completos e
foram encontrados 21 artigos. Após leitura dos títulos e resumos, verificou-se que nenhum
artigo se adequava aos critérios de inclusão descritos.
20

Figura 1: Identificação, análise e seleção dos artigos.


Identificação

Relatos identificados no banco de Relatos identificados em outras


dados de buscas = 607 fontes = 0

Relatos após eliminar os duplicados = 595


Triagem

Relatos rastreados = 148 Relatos excluídos = 144

Artigos em texto complete Artigos em texto complete


Elegibilidade

avaliados para excluídos, com


elegibilidade = 138 justificativa = 134

Estudos incluídos em
síntese qualitativa = 3
Inclusão

Estudos incluídos em
síntese quantitativa (meta-
análise) = 1

Fonte: Produção do próprio autor, 2019.


21

4 RESULTADOS

Diante do exposto acima, apresenta-se o seguinte quadro para organização dos


artigos selecionados:

Quadro 1: Características e evidências dos artigos selecionados. Niterói, RJ. Abril, 2019
Resposta para
Título do Tipo de Nível de
Nro Periódico Autores questão de
artigo/ano pesquisa evidência
pesquisa
Recomenda-se
repouso,
Intervenções de
elevação discreta
enfermagem
dos membros
Rev Bras Enferm, durante crises
SILVA, DG; Revisão de inferiores, uso de
1 Brasília 2007 maio- álgicas em 4
MARQUES, IR. literatura compressas de
jun; 60(3):327-30 portadores de
água morna e
Anemia
curativos diários
Falciforme/ 2007
de forma
asséptica.
Importância da
prevenção das
úlceras,
mantendo a pele
hidratada, ingesta
Assistência de
hídrica adequada,
enfermagem na
Rev. bras. hematol. uso de calçados
doença
hemoter. Revisão de adequados, como
2 falciforme nos KIKUCHI, BA. 4
2007;29(3):331- literatura também a
serviços de
338 realização de
atenção básica/
curativos diários
2007
em lesões já
instaladas,
observando se há
sinais de
infecção.
Recomenda-se o
O autocuidado uso de solução
para o tratamento Estudo tópica à base de
Esc Anna Nery MARTINS, A;
de úlcera de longitudinal poli-hexanida
(impr.)2013 out - MOREIRA, DG;
3 perna falciforme: com 3 como forma de
dez ; 17 (4): 755- NASCIMENTO, EM;
orientações de abordagem barreira biológica
763 SOARES, E.
enfermagem/ quantitativa contra agentes
2013 patogênicos em
úlceras crônicas.
Uso de cobertura
Uso de cobertura
à base de
não convencional
colágeno e aloe
no tratamento de
vera como forma
Online Brazilian ferida isquêmica
de tratamento,
Journal of Nursing, em paciente
4 SILVA, MSM L et al Relato de caso 5 além do uso de
[S.l.], v. 8, n. 3, set. portador de
meias grossas e
2009 anemia
macias e sapatos
falciforme:
para evitar o
estudo de caso/
aparecimento de
2009
novas úlceras.
Fonte: Produção do próprio autor, 2019

Os quatro artigos selecionados são de autores brasileiros, três publicados nos últimos
12 anos e o mais recente, publicado em 2013, ou seja, há 6 anos. Apenas um artigo apresentou
resultados de pesquisa de um estudo longitudinal com abordagem quantitativa. Dois estudos
22

publicados em 2007 caracterizam revisões de literatura, descrevendo a doença e aspectos


relacionados aos cuidados de enfermagem e um estudo de caso. Aponta-se a precariedade de
estudos quantitativos e com níveis de evidência mais significativos.

5 DISCUSSÃO

Após leitura dos artigos selecionados, foi possível perceber que dois deles (números
1 e 2, apresentados no quadro 1) tratam das medidas preventivas relacionadas ao
desenvolvimento da úlcera, bem como cuidados gerais. Os outros dois artigos (números 3 e 4)
abordam principalmente produtos e coberturas utilizados no tratamento das úlceras
falcêmicas, sendo eles: hidrogel de poli-hexanida e cobertura à base de colágeno e aloe vera.
Assim, os cuidados recomendados foram organizados conforme a seguir:

5.1 PREVENINDO AS ÚLCERAS FALCÊMICAS

Em relação as medidas preventivas, um dos artigos incluídos no estudo refere a


importância da inspeção da pele para observação de presença de novas lesões (KIKUCHI,
2007), recomendação também citada por Silva et al (2014). Além de destacar o uso de meias
grossas, evitar tênis de cano alto e sapatos que possam provocar algum tipo de lesão, como
medidas que podem ser tomadas para evitar a formação das úlceras falcêmicas (KIKUCHI,
2007). Silva e Marques (2007) abordam medidas profiláticas ao tecido cicatrizado, que se fere
com facilidade, como: cuidado com a região maleolar, sem compressão da área e atenção para
evitar traumas na região. Além disso, Kikuchi (2007) afirma como um cuidado de
enfermagem a orientação à pessoa sobre a importância da ingesta hídrica adequada.

Diante da precariedade de cuidados preventivos encontrados nos artigos, importa


mencionar que no Manual de Doenças Falciformes do Ministério da Saúde (BRASIL, 2012),
encontram-se outras medidas preventivas, que têm por objetivo evitar possíveis lesões, que
predispõem a formação de úlceras, entre elas, orientar a pessoa com anemia falciforme a
examinar com frequência o aspecto da pele, principalmente nos membros inferiores e regiões
maleolares; usar repelentes e inseticidas, que diminuam a possibilidade de lesões decorrentes
de picadas de insetos, evitando pruridos, considerados pontos de partida para o aparecimento
de úlceras; além do uso sistemático de meias de algodão macias. Silva et al (2014)
acrescentam a importância de coletar o histórico de doenças virais ou bacterianas recentes que
podem gerar situações de hipóxia, favorecendo o surgimento ou agravo das lesões.
23

5.2 PRODUTOS E COBERTURAS RECOMENDADOS PARA TRATAMENTO DAS ÚLCERAS


FALCÊMICAS

No que tange ao atendimento da pessoa com úlcera já instalada, ressalta-se que as


coberturas utilizadas devem ser de escolha do enfermeiro, de acordo com a avaliação holística
da pessoa e das características da lesão, visando estimular a vascularização, granulação e a
epitelização (BRASIL, 2012). Os cuidados devem ser rigorosos e diários, atentando-se para os
sinais de infecção. Sobre isso, importa mencionar que as lesões falcêmicas podem ser
colonizadas por Staphylococcus aureus e Pseudomonas aeruginosa (MENESES et al, 2010), o
agravo pode ser evidenciado através do aumento do biofilme, necrose, aumento da dor e do
tamanho da lesão.

Para minimizar tal agravo, um estudo publicado por Martins et al (2013) destaca a
utilização tópica de hidrogel de poli-hexanida em pessoas com úlceras falcêmicas, visando
inibir o crescimento bacteriano. Neste, vinte e três pessoas (57,5%) alcançaram cicatrização
completa, enquanto dezessete (42,5%) apresentaram cicatrização parcial com redução de 47%
do tamanho das úlceras. Salientando que no primeiro ano de estudo, dez pessoas obtiveram
cicatrização completa realizando a troca diária do curativo com soluções à base de poli-
hexanida.

Sobre o hidrogel de poli-hexanida, destaca-se que o produto funciona como barreira


biológica contra os agentes patogênicos, inibindo o crescimento bacteriano, criando um
ambiente propício para evolução do processo cicatricial, além de promover efeito relaxador
nos vasos sanguíneos, conferindo vitalidade ao endotélio vascular (MARTINS et al, 2013).
Conforme o atlas de curativos baseado nas coberturas padronizadas no Hospital Anchieta
(2017) a composição e o mecanismo de ação do hidrogel com poli-hexanida é:

“0,1% de undecilaminopropil betaína, que auxilia no efeito de limpeza; 0,1% de poli-


hexanida (biguanida), um conservante com alta tolerância tissular; glicerol, que
propicia a hidratação hidroxietilcelulose, um agente de gelificação; e água purificada,
assim, proporcionando limpeza e hidratação de lesões cutâneas.”

Ainda segundo este atlas (2017), a aplicação da solução a base de poli-hexanida deve
ser realizada após a higienização do leito da ferida com solução fisiológica.
24

Ressalta-se que neste estudo, os efeitos satisfatórios foram obtidos não


exclusivamente pelo uso do produto nas úlceras, mas também pela utilização de um programa
de autocuidado, durante o qual as pessoas recebiam folders explicativos sobre a doença e
eram orientadas através da consulta de enfermagem quanto às ações de autocuidado
necessárias para o tratamento, bem como treinamento para a realização correta do curativo
que os mesmos passariam a executar em domicílio.

Sobre isso, o Ministério da Saúde (BRASIL, 2012) adverte, também, que o estímulo
ao autocuidado é de fundamental importância para o tratamento local. Sobre as ações de
autocuidado, Silva e Marques (2007) recomendam ainda repouso, elevação discreta dos
membros inferiores, uso de compressas mornas e curativos diários, com a utilização de
técnicas assépticas.

No que diz respeito a dor, Paladino (2007) afirma que as úlceras falcêmicas são
dolorosas, diferentemente das úlceras neuropáticas, descritas por Horta (2015), que são
consideradas indolores, tornando difícil a percepção das mesmas pelas pessoas acometidas.
Paladino (2007) ainda diz que as úlceras falcêmicas são de recuperação lenta e apresentam
altas taxas de recorrência. Concordando com esta afirmação, Meneses et al (2010), relatam
que esse tipo de úlcera responde mais lentamente ao tratamento do que de outras etiologias.

Um estudo de caso realizado por Silva et al (2009) revela que cerca de um mês após
a utilização de cobertura à base de colágeno e aloe vera, houve cicatrização das lesões
falcêmicas, o que se contrapõe ao que Paladino (2007) e Meneses et al (2010) dizem sobre o
tempo de cicatrização da úlcera falcêmica. Outro estudo de caso, realizado por Oliveira,
Soares e Rocha (2010), destacou o uso do mesmo tipo de cobertura em um paciente diabético
e hipertenso, com ferida isquêmica, que cicatrizou cerca de dois meses após a utilização da
mesma, também se contrapondo a Meneses et al (2010) e Paladino (2007), sobre o fato das
úlceras falcêmicas responderem mais lentamente ao tratamento do que úlceras de outras
etiologias.

Sabe-se que o colágeno é a proteína mais abundante no corpo humano e de


fundamental importância. Nesse contexto, salienta-se seu auxilio na reparação das feridas
(SILVA et al, 2009). Girardi (2005) ainda diz que o colágeno proporciona suporte mecânico
ao tecido, sendo considerado importante no processo regenerativo, devido a sua capacidade de
orientar a formação de tecidos em desenvolvimento. Já a aloe vera apresenta ação
25

cicatrizante, pois contém vitaminas, aminoácidos essenciais e polissacarídeos que estimulam


o crescimento dos tecidos e regeneração celular (SILVA et al, 2009). Parente et al (2013)
ainda afirmam que a aloe vera atua favorecendo a cicatrização das feridas devido ao fato de
manter o leito da ferida úmido, estimular a migração celular e a proliferação de fibroblastos,
como também, favorecer a maturação mais rápida de colágeno e redução do processo
inflamatório.

5.3 AVALIAÇÃO DA PESSOA COM ANEMIA FALCIFORME PARA PREVENÇÃO E CUIDADOS COM
A FERIDA

Apesar dos artigos incluídos no estudo ressaltarem cuidados preventivos e produtos


para tratamento da úlcera, não abordaram a avaliação integral da pessoa, cuidado considerado
essencial, antes de qualquer intervenção, visando identificar fatores que podem contribuir para
o desenvolvimento da úlcera e/ou dificultar a cicatrização. Sobre isso, Silva et al (2014)
referem sobre a importância da abordagem integral a pessoa, conhecendo seus hábitos de
vida, para que estes possam auxiliar no processo de cuidar.

Diante da complexidade que envolve o desenvolvimento e cicatrização das úlceras


falcêmicas, ressalta-se a importância desta avaliação integral, pois somente o tratamento local
não é suficiente para cicatrização. Nesse contexto, a enfermagem tem papel fundamental,
visando a identificação de fatores que interferem diretamente tanto na prevenção como no
tratamento das úlceras na anemia falciforme.

Assim, destaca-se a necessidade da avaliação de aspectos clínicos, emocionais e


sociais, incluindo os exames hematológicos que devem ser controlados, a fim de tratar
qualquer possível deficiência de eletrólitos, vitaminas, desidratação ou desnutrição proteico-
calórica, como também a anemia, considerados fatores que podem dificultar ainda mais o
processo de cicatrização (MENESES et al, 2010).

6 CONSIDERAÇÕES FINAIS

Diante da escassez de estudos encontrados e selecionados durante a busca nas fontes


de dados estabelecidas, considera-se que o objetivo deste estudo foi atingido parcialmente,
tendo em vista a ausência de uma abordagem mais ampla, pois os artigos privilegiam medidas
preventivas e o uso de produtos/coberturas sem contemplar a avaliação da pessoa e da lesão
26

propriamente dita. Além disso, importa mencionar a ausência de artigos com níveis de
evidência significativos.

Nesse sentido, destaca-se que este estudo contribui para o ensino e a prática de
enfermagem, pois identificou lacunas, que servirão de base para realização de outros estudos.
Como proposta sugere-se a ampliação da busca em outras fontes de dados, e estudos clínicos,
visando a elaboração de protocolos para nortear o enfermeiro no atendimento a esta clientela.
27

7 OBRAS CITADAS

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36 f. Dissertação (Mestrado) - Curso de Ciências da Saúde, Universidade Federal de Sergipe,
Aracaju, 2015. Disponível em:
<https://ri.ufs.br/bitstream/riufs/3698/1/MATHEUS_TODT_ARAGAO.pdf>. Acesso em: 11
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BARROS, A. S. S. et al. O impacto da anemia falciforme nas trajetórias escolares de


estudantes brasileiros afetados pela doença: diálogos com os temas da educação especial. In:
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