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1.

A ordem jurídica e a sujeição do homem às duas regras


1.1. Considerações introdutórias
Os instintos que os homens possuem são insuficientes para os orientar na vida, pelo
que estes precisam que padrões de conduta lhes digam como se devem comportar,
regras sem as quais não conseguem viver em sociedade. As regras dizem ao homem o
que está certo ou errado, contudo, não têm todas a mesma importância.
1.2 A aprendizagem das regras de convivência humana: as Instituições e suas regras; a
individualidade dos homens; as relações humanas como relações de poder
Como as regras não são inatas, têm de ser apreendidas. Desde o seu nascimento o
homem encontra-se envolvido num determinado contexto que atua sobre ele, isto é,
sente a convivência humana que o rodeia (a primeira instituição é a família). Esta
convivência com outros homens acompanha-o durante toda a sua vida, uma vez que
apenas em sociedade consegue (sobre)viver. As regras que servem para o orientar
emanam de “instituições”, logo, para viver em sociedade, o homem precisa de
instituições, que podem ser definidas como conjuntos na realidade social que
estabelecem regras de comportamento com carácter normativo (norma = regra) e que,
ao serem observadas, garantem a segurança nas relações entre os homens. É
precisamente nas instituições em que está inserido (familiares, desportivas, políticas,
etc.) que o homem aprende a viver em sociedade com os outros. Muitas vezes, as
regras de convivência nem sequer são sentidas porque as pessoas já as têm
interiorizadas como sendo habituais.
O homem é um ser social que evolui através da convivência com os outros, revelando-
se um indivíduo autónomo e social. O homem está sempre relacionado com alguém
(depende do outro), e como indivíduo depende da sociedade. Existe um ponto
comum: todas as relações sociais são relações de poder. O homem precisa de uma
“ordem” que legitime a sua atuação, regras que o disciplinem.
Existem diferenças consideráveis entre os homens, nomeadamente a nível das
mentalidades e comportamentos. Porém, a diversidade não pode afetar a igualdade
em dignidade e direitos (e obrigações). Na verdade, apesar de como indivíduos serem
todos diferentes, enquanto homens são todos iguais.
Embora dando estabilidade e orientação às condutas dos homens, as instituições estão
sujeitas à evolução (científica, social). Basta olharmos para a evolução da instituição da
família que sofreu alterações profundas, reflexo da modificação das mentalidades das
pessoas. Todavia, apesar da evolução, a família manteve a sua função institucional: a
inserção do homem na sociedade, a aprendizagem de viver em comunidade.
1.3 A Ordem natural e a ordem social
1.3.1 A ordem natural
Montesquieu constatou que há leis que os homens fizeram e leis que eles não fizeram
(mas que têm de observar).
O direito natural é diferente das leis naturais: O direito natural (pré-existente) regula
de um modo universal as relações humanas a partir de uma ideia de justiça. Vigora em
toda a parte e não depende do consentimento dos homens. Já as leis naturais dizem
respeito a fenómenos naturais e ignoram por completo qualquer ideia de justiça.
1.3.2 A Ordem sociocultural como ordem normativa
A condição biológica (física) do homem é completada pela componente cultural. A
cultura – com as suas atitudes, crenças e regras – é o meio ambiente construído pelo
homem. Os padrões culturais dizem ao homem como se comportar, dão-lhe segurança
e ao mesmo tempo liberdade, sendo, para o indivíduo, um indicador do rumo pelo
qual se deve orientar. Todavia, a cultura não determina por completo o pensar e o agir
dos homens.
1.3.3 A Ordem jurídica como necessidade prática para a convivência humana
A função do direito: mediante o estabelecimento das normas de conduta possibilita o
desenvolvimento do homem através da sua convivência com os outros, bem como a
satisfação dos seus interesses individuais. O direito estabelece deste modo regras para
o comportamento dos homens na convivência entre si, define o quadro dentro do qual
se podem (e devem) mover, tendo em vista a liberdade individual e a segurança. As
normas jurídicas que vão ao encontro dos interesses dos homens são mais eficientes
do que proibições ou punições. Por regra, a ordem jurídica – que é aceite – conta com
o cumprimento voluntário das suas normas, em virtude do sentimento jurídico comum
dos homens. Contudo, quando ela não é tida como justa, o referido comportamento
não se verifica. O mesmo sucede em períodos de crise (por exemplo, guerra) em que
se dissolvem os valores comuns da sociedade e, entre eles, o sentimento comum de
justiça. Sempre que as normas jurídicas são desrespeitadas é necessário e lícito que os
órgãos estaduais recorram a meios coercivos para impor a sua observância. É uma
característica do direito as normas serem munidas de coercibilidade, segundo as regras
e formas de um processo judicial, ordenado e formalizado de maneira objetiva e isenta
para garantir a igualdade processual das partes litigantes. Na medida em que é vedado
fazer justiça pelas próprias mãos, o direito protege o mais fraco. Em qualquer caso,
não pertence às funções do direito eliminar as diversidades de interesses entre os
homens, nem eliminar a relação de tensão existente entre o homem autónomo e a
sociedade em que se integra, dando supremacia àquele ou a esta. Todas estas relações
de tensão devem ser ordenadas e reguladas de forma a garantir o desenvolvimento
tanto do indivíduo, como da própria sociedade.
1.3.4 A Ordem moral como regra ética
Nestes termos, a função do direito é ordenadora e criadora de segurança e certeza,
que são valores imprescindíveis para a convivência humana. Mas um valor que pode
ser considerado como mais elevado do que a ordem jurídica é a ordem moral. O
direito diz respeito às relações dos homens entre si ou com a sociedade, visando
regular a convivência exterior ao garantir a liberdade de agir. Dentro desta finalidade,
a observância das regras jurídicas é coercível, pois um comportamento exterior pode
ser fiscalizado e imposto. A ordem moral, por sua vez, dirige-se para dentro e aponta
para as convicções internas. Ela resulta da sua consciência e é com base neste “fio
condutor interno” que o homem deve procurar pautar os seus atos. Todavia,
normalmente as condutas dos homens conforme as leis correspondem também às
suas convicções morais. O direito possibilita a todos viver em conformidade com as
suas convicções interiores de acordo com as suas crenças. Acresce que o direito não se
pode abstrair de princípios morais, que são orientações para ele. Contudo, daí não
resulta que o direito pode transpor princípios morais para o seu domínio, a não ser em
situações específicas, como sucede, por exemplo, quando o Código Civil, nos seus
artigos 280.º e 281.º, invoca os “bons costumes”, ou seja, os valores morais positivos
compartilhados e

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