Você está na página 1de 16

1.

A ordem jurídica e a sujeição do homem às duas regras

1.1. Considerações introdutórias

Para se orientar na vida os seres precisam de indicações. A este respeito os animais seguem o
que os seus instintos lhes indicam. Mas quanto ao homem, os instintos que possui não são
suficientes para ele se orientar na vida. Sob este aspeto podemos dizer que o homem é um ser
ontogeneticamente inacabado, deste modo, precisa de padrões de conduta na vida e que lhe
digam como se deve comportar. É nas regras que os homens encontram os modelos de
orientação para as suas condutas, regras essas sem as quais não conseguem viver em
sociedade. Até o simples modo de vestir obedece a regras (variáveis é certo) conforme as
situações e as convivências sociais. Já as crianças brincam de acordo com regras de jogo que
estabeleceram e que, ao criarem igualdade de oportunidades para ganhar o jogo, permitem-
lhes competir entre si. As regras dizem ao homem o que está certo ou errado, justo ou injusto.
Contudo, as regras não têm todas a mesma natureza ou importância; conforme a sua origem
varia a força vinculativa com que se impõem.

1.2 A aprendizagem das regras de convivência humana: as Instituições e suas regras; a


individualidade dos homens; as relações humanas como relações de poder

Como as regras não são inatas, o homem tem de as apreender. Desde o seu nascimento o
homem encontra-se envolvido num determinado contexto a que foi exposto e que atua sobre
ele. Isto é, o homem, desde o seu nascimento sente a conivência humana que o rodeia. E esta
convivência com outros homens acompanha-o durante toda a sua vida, uma vez que apenas
em sociedade humana consegue (sobre)viver. As regras que servem para o orientar emanam
de “instituições”, logo, para viver em sociedade, o homem precisa de instituições. As
instituições poderão ser definidas como conjuntos na realidade social que, como organizações
sociais, estabelecem para quem a elas pertence regras de conduta ou de comportamento que
têm carácter normativo e normador (norma = regra) e que, ao serem observadas, garantem a
segurança nas relações entre os homens abrangidos por elas. É precisamente nas instituições
em que está inserido (familiares, educativas, culturais, desportivas, políticas, etc.) com as suas
normas próprias e padrões de conduta, que o homem aprende a viver regradamente em
sociedade com os outros. Muitas vezes, as regras de convivência nem sequer são sentidas
porque na consciência das pessoas já estão completamente interiorizadas como habituais. A
primeira instituição em que o homem está inserido e começa a ser socializado é a família.

O homem é um ser social que evolui e se realiza na convivência com os outros, apresentando-
nos uma natureza ambivalente como indivíduo autónomo e ser social, a “sociabilidade não
social”. O homem está sempre relacionado com alguém (depende do outro), e como indivíduo
depende da sociedade. A sua sociabilidade existe em todos os estados da sua evolução e em
todas as culturas, sendo certo que os concretos modos de convivência são naturalmente
diferentes, excetuado um ponto: todas as relações sociais, inclusive as relações jurídicas, são
relações de poder. Por mais individualista que um homem queira ser, ele continua
inevitavelmente um ser social. A sua humanidade específica está intrínseca e
inseparavelmente ligada à sua sociabilidade, e a sociedade é uma forma de vida necessária por
natureza ao homem, essencial à constituição da humanidade do homem. Por outro lado, a
conduta do homem enquanto ser social precisa de uma “ordem” que legitima a sua atuação,
de uma organização que implica a existência de regras ou normas que o disciplinam. A
necessidade de organização implica a existência de regras ou normas que disciplinem a
conduta do homem que, enquanto ser social, precisa de uma “ordem” que legitime a sua
atuação. Os homens distinguem-se e caracterizam-se por uma extrema complexidade, por
uma individualidade que é um mosaico das mais diversas vivências que a identificam, havendo
assim diferenças consideráveis entre uns e outros, dotes naturais muito desiguais,
mentalidades e comportamentos diferenciados. Sendo assim, vemos que são as diferenças
entre eles que mais caracterizam os homens; diferenças essas que, com toda a sua diversidade
e multiplicidade, em caso algum afetam os homens na sua igualdade em dignidade e direitos
(e obrigações) decorrente da natureza humana e comum a todos os seres humanos, mas estão
perfeitamente de acordo com elas. Na verdade, os homens são todos iguais como homens,
têm a mesma natureza humana, mas como indivíduos são todos diferentes. Contudo, embora
dando estabilidade e orientação às condutas dos homens, as próprias instituições estão
naturalmente sujeitas à evolução (cultural, científica, económica, política, social). Todo o
mundo é composto de mudança. Para entendermos isso, basta olharmos para o curto período
da evolução da instituição da família que no decurso de pouco mais de uma única geração
sofreu alterações profundas que refletem a evolução e a alteração das conceções
predominantes na sociedade e a modificação das mentalidades das pessoas. Todavia, não
obstante todas estas evoluções, a família – ou os vários modelos familiares que foram surgindo
– manteve a sua função institucional de sempre: a inserção do homem na sociedade (sua
socialização primária), a aprendizagem de viver em comunidade.

1.3 A Ordem natural e a ordem social

1.3.1 A ordem natural

Já Aristóteles abordava e distinguia entre direito natural e direito legal. O direito natural tem
em todos os lugares a mesma força e não depende do consentimento dos homens (é pré-
existente). São regras comuns à humanidade que vigoram em toda a parte. E em sentido
semelhante Montesquieu constatou que há leis que os homens fizeram e leis que eles não
fizeram (mas que têm de observar).

O direito natural é diferente das leis naturais. O direito natural – pré-existente ou


sobrepositivo– regula de um modo universal as relações humanas a partir de uma ideia de
justiça; as leis naturais respeitam a fenómenos naturais e ignoram por completo qualquer ideia
de justiça.

1.3.2 A Ordem sociocultural como ordem normativa

A condição biológica (física) do homem, insuficiente para se afirmar por si só, acaba por ser
completada, pela sua condição ou componente cultural, sendo as condições biológicas e
culturais complementares, e não opostas. A cultura – com as suas manifestações e produções,
padrões de conduta e interação, atitudes, crenças e regras – é o meio ambiente construído
pelo homem. Os padrões culturais dizem ao homem como se comportar, dão-lhe segurança e
ao mesmo tempo liberdade. Tais padrões culturais de conduta ou instituições são para o
indivíduo um indicador do rumo pelo qual se deve orientar, sendo certo que as culturas que os
homens desenvolveram são muito diferentes entre si. Na medida em que o homem se
mantém dentro dos respetivos padrões culturais, anda seguro. Todavia, a cultura não
determina por completo o pensar e agir dos homens.

1.3.3 A Ordem jurídica como necessidade prática para a convivência humana

A função do direito aparece-nos desta maneira como uma necessidade prática: mediante o
estabelecimento das normas de conduta possibilita e assegura o desenvolvimento do homem
na sua convivência com os outros, bem como a satisfação dos seus interesses próprios ou
individuais. O direito estabelece deste modo regras para o comportamento exterior dos
homens na sua convivência entre si, define o quadro dentro do qual se podem (e devem)
mover. Esta função tem em vista sobretudo os aspetos da ordenação da liberdade individual e
da criação de segurança na convivência social. As normas jurídicas que vão ao encontro dos
interesses dos homens revelaram-se, desde sempre, mais eficientes do que proibições ou
punições. Apenas uma ordem jurídica que realize, de uma maneira equilibrada, liberdade e
segurança continua a ser aceite e consegue conciliar e ordenar os interesses divergentes entre
os homens ou entre estes e a sociedade, bem como extinguir os conflitos que daí possam
resultar. Por regra, a ordem jurídica – que é aceite – conta com a observância espontânea e o
cumprimento voluntário das suas normas, em virtude do sentimento jurídico comum dos
homens. Contudo, quando ela não é experimentada como justa, mas antes como um regime
de força, o referido comportamento não se verifica. O mesmo sucede em períodos de crise
(por exemplo, guerra) em que se dissolvem os valores comuns da sociedade e, entre eles,
também o sentimento comum de justiça. E nestas situações todas as autoridades públicas são
poucas para manter a paz social. Sempre que as normas jurídicas são desrespeitadas é
necessário e lícito que os órgãos estaduais recorram a meios coercivos para impor a sua
observância. É uma característica do direito serem as suas normas munidas de coercibilidade,
segundo as regras e formas de um processo judicial, ordenado e formalizado de maneira
objetiva e isenta para garantir a igualdade processual das partes litigantes. Na medida em que
é vedado fazer justiça pelas próprias mãos, o direito serve e protege desde já o mais fraco,
incapaz de se defender pela força, por ser mais fraco, mas capaz de fazer valer os seus direitos
num processo judicial. Em qualquer caso, e isto convém ser sublinhado, não pertence às
funções do direito eliminar as diversidades de interesses entre os homens. De igual modo,
também não é função do direito eliminar a relação de tensão existente entre o homem
autónomo e a sociedade em que se integra, dando supremacia àquele ou a esta. Todas estas
relações de tensão devem ser ordenadas e reguladas de forma a garantir o desenvolvimento
tanto do homem autónomo, do indivíduo, como da própria sociedade.

1.3.4 A Ordem moral como regra ética

Nestes termos, a função do direito é ordenadora e criadora de segurança e certeza, que são
valores imprescindíveis para a convivência humana. Mas um valor que pode ser considerado
como mais elevado do que a ordem jurídica é a ordem moral. O direito diz respeito às relações
dos homens entre si ou com a sociedade ao ordenar, delimitar e compatibilizar as suas esferas
de interesses e de atuação. Assim, o direito visa regular a convivência exterior ao garantir a
liberdade de agir. Dentro desta finalidade, a observância das regras jurídicas é coercível, pois
um comportamento exterior pode ser fiscalizado e imposto. A ordem moral, por sua vez,
dirige-se para dentro e aponta para as convicções internas e o aperfeiçoamento ético do
homem. Ela resulta da sua consciência e é com base neste “fio condutor interno” que o
homem procura (ou deve procurar) pautar os seus atos. Todavia, normalmente as condutas
dos homens conforme as leis correspondem também às suas convicções morais. Dada a sua
função de ordenação exterior da convivência humana, o direito possibilita a todos viver em
conformidade com as suas convicções interiores de acordo com as suas conceções morais,
crenças ou confissões religiosas. Acresce que o direito não pode ignorar a moral, não pode
abstrair de princípios morais. Estes últimos são, de facto, orientações para ele. Contudo, daí
não resulta que o direito pode transpor princípios morais para o seu domínio, a não ser em
situações específicas, como sucede, por exemplo, quando o Código Civil, nos seus artigos 280.º
e 281.º, invoca os “bons costumes”, ou seja, os valores morais positivos compartilhados e
vigentes na sociedade, que um negócio jurídico deve respeitar (sob pena de nulidade). O
direito não pode juridificar a moral, pois isto significaria que os homens tivessem de
subordinar não apenas o seu pensamento, isto é, as suas convicções morais, mas também o
seu comportamento exterior à moralidade o que favorecia a hipocrisia e, pior, a intolerância e
seria destruidor da liberdade e da democracia e, em última análise, totalitário no sentido de
quem impõe os seus critérios morais. Na medida em que o direito não pode abstrair de todo
de princípios morais pode dizer-se que ele se deve orientar na moral, na medida em que
consagra o “mínimo ético”, uma ordem de valores, que é aceite por todos. Caso isto não
suceda, ao verificar-se uma dissonância aguda entre convicções morais generalizadas e a
ordem jurídica, estamos perante uma crise social em que a ordem jurídica é sentida como um
mero sistema de força e não de justiça.

1.3.5 As Normas de conduta ou trato social

Diferentes das normas jurídicas e das exigências morais são os usos e costumes, ou seja, meras
normas de conduta social que, sendo observadas de facto pelos homens, em princípio não têm
valor jurídico, embora este, segundo o artigo 3.º do Código Civil, pontualmente lhes possa ser
atribuído por lei. À semelhança das normas jurídicas, as normas de conduta social são
exteriores ao homem, mas, precisamente por não terem natureza jurídica, não são como
aquelas judicialmente coercíveis, sendo a sua observância sancionada apenas por uma
“coerção social” que consiste no desprezo, na marginalização ou mesmo na exclusão da vida
social. Esta sanção, por seu lado, tanto pode quase não ser sentida, como pode ir mais longe e
até ter consequências mais graves do que a inobservância de uma norma jurídica, devido ao
isolamento ou social do infrator em reação à sua conduta desconforme com as normas sociais
vigentes. Juridicamente relevantes são, por isso, apenas as normas do direito e, ainda,
excecionalmente, as normas morais e as normas de conduta social quando elas são
juridificadas, quer dizer, dotadas de valor jurídico que lhes é atribuído pelas próprias normas
jurídicas, tal como exemplificámos com as disposições dos artigos 280.º, 281.º, 218.º do
Código Civil. Acrescente-se que, quanto à realização ou à observância das normas jurídicas, o
homem está submetido a duas exigências: a exigência da justiça e a exigência da equidade
(suum cuique tribuere et neminem laedere). Mas, em contrapartida, nenhum homem está em
relação ao seu próximo numa posição de superioridade de tal ordem que apenas possa olhar
para o (seu) direito. A solidariedade é o comportamento mais humano. Igualmente não
podemos dizer que a crescente juridificação das relações inter-humanas as torna, por causa
disso, mais humanas; pelo contrário, frequentemente são tristes as situações em que os
homens, para se entenderem, nada mais sabem do invocar direitos e leis.

1.4 A problemática do Direito Justo

1.4.1 Jus-naturalismo e jus-Positivismo

Ao ordenar a vida em sociedade o direito baseia-se fundamentalmente na ideia da justiça que


o legitima: o direito é uma ordem de convivência humana com um sentido – o sentido da
justiça. Mas as leis que consagram o direito podem não ser sentidas como justas por
contrariarem o sentimento de justiça dos homens a que se destinam. Como ponto de partida
vamos admitir que o direito vigente plasmado em leis, passa a entrar em contradições
insanáveis com as conceções de justiça e as convicções morais dominantes na sociedade que
deve ordenar. Já vimos que o direito não pode desconhecer a moral, não pode abstrair de
princípios morais. Caso contrário, pode surgir um conflito entre as convicções morais reinantes
e as imposições da lei em vigor que as despreza. É principalmente neste contexto (mas não só)
que se põe a problemática do Direito Justo. A este respeito existem historicamente duas
grandes linhas doutrinais, de um lado as conceções do jus-positivismo e do outro as do
pensamento do jusnaturalismo. Para o jus-positivismo o direito é feito pelo homem. A norma
legal é encarada como um ato de vontade do legislador, ato esse que, sendo a única fonte de
direito, traz o seu pleno sentido dentro de si. Assim, fatores extralegais, como por exemplo, a
realidade social, mesmo quando modificada em relação ao tempo da feitura da lei, não são
negados, mas nega-se-lhes importância na aplicação da lei. Deste modo, o jus-positivismo
aparece, na sua modalidade mais rigorosa, como método interpretativo de uma fidelidade
incondicional à lei, como método que sujeita o jurista à lei sem lhe consentir a pergunta acerca
da sua justiça ou da sua moralidade. Neste contexto podemos ver o n.º 2 do artigo 8.º do
Código Civil que determina “o dever de obediência à lei (ao qual o juiz está subordinado) não
pode ser afastado sob pretexto de ser injusto ou imoral o conteúdo do preceito legislativo”
que assente na premissa de a lei estar em conformidade com a justiça e a moral, dá, todavia, a
subentender que uma contradição poderá existir. Desde a antiguidade houve sempre quem se
interrogasse se acima do direito positivo, que vigora e consta das leis, haverá um outro direito,
o direito natural, que prevalece sobre o primeiro e em que este encontra a sua última fonte de
validade e justificação, podendo este direito natural emergir da natureza, da vontade de Deus,
da condição humana ou da lógica da razão. Neste sentido entende-se por direito natural um
direito que existe independentemente de uma estatuição humana e que vale de modo
imutável para todos os tempos e todos os povos. Por conseguinte, os representantes do jus-
naturalismo – uma vez que o direito se legitima pela ideia de justiça – defendem a existência
de um direito supralegal, precisamente o direito natural, com as suas regras comuns para toda
a humanidade que valem em toda a parte. O direito natural gira em volta da natureza
essencial do homem que é comum a todos. Segundo a conceção do jus-naturalismo, o direito é
ao longo dos tempos imutável no que diz respeito a determinados valores fundamentais,
inerentes à natureza humana (ou apenas mutável em consequência de convicções jurídicas
generalizadas em relação aos valores fundamentais resultantes da natureza do homem, que
evoluem em conformidade com as conceções éticas), valores esses, que o direito positivo
legislado tem que respeitar. Podem distinguir-se, na história, três grandes épocas do
pensamento jusnaturalista: o pensamento da antiguidade parte da existência de uma ordem
natural; o pensamento medieval cristão é pensamento teológico: “natural” significa ser
equivalente a não ter sido criado ou concebido pelo homem, existe por si; o direito natural é
universal, imutável e indelével; o pensamento do iluminismo coloca a razão e/ou a natureza do
homem no centro das suas reflexões. Sendo assim, também o direito deve ser deduzido da
razão. Este entendimento teve uma relevância significativa no período do jusnaturalismo
racionalista dos séculos XVII e XVIII com efeitos de grande alcance nas legislações posteriores.
A função do direito natural, atua como princípio universal em dois sentidos: por um lado serve,
afirmativamente, para legitimar o direito positivo vigente expresso nas leis e em sintonia com
ele; por outro, põe, dubitativamente, como fator de correção, o direito vigente em causa à
procura de um direito ainda mais justo e mais em conformidade com os valores humanos
comuns a todos os homens, limitando assim a margem de decisão do legislador. Na medida em
que o pensamento jusnaturalista invoca a moral como alicerce do direito, constitui a crítica da
moralidade ao direito positivo. É patente que uma contradição generalizada entre o direito
positivo e as normas da moral provoca uma crise social. O pensamento jusnaturalista
racionalista teve um êxito enorme nas legislações dos séculos XVIII e XIX, nas quais ganhou a
sua expressão ao esgotar-se nelas (de maneira que a antinomia entre direito positivo e direito
natural deixou de ser sentida por muito tempo porque as leis estavam em sintonia com o
direito natural de modo que se desvaneceu a consciência de que as leis podiam ser não justas
em virtude de não respeitarem valores de justiça superiores). O pensamento jusnaturalista
acabou por ser afastado. Seja como for, devido aos atos legislativos dos regimes totalitários do
século XX (fascismo, nazismo, estalinismo, maoismo) que “permitiram” com as suas leis
atentatórias aos valores da humanidade violações gravíssimas do direito (e da justiça e da
moral), voltou a haver uma consciencialização da antinomia entre o direito positivo e os
princípios superiores de um direito natural que levou a um renascimento do jus-naturalismo.
Talvez se possa concluir que sempre se chama pelo direito natural e pelos seus princípios
quando o direito positivo estiver em crise por se ter afastado daquele. Realmente, a
experiência histórica da humanidade – sobretudo quando esta julgou que fossem “factíveis”
todas as coisas – mostra que é justificado o pensamento jusnaturalista e que não está nas
mãos do homem criar um direito ideal e inteiramente justo.

1.4.2 Interdependência entre a ordem jurídica e a ordem moral

As normas ou regras de conduta que mencionámos (normas jurídicas, morais ou de conduta


social) situam-se a níveis diferentes e por isso a sua não observância tem também
consequências diferentes. Como esclarecemos, a não observância das normas jurídicas, faz
com que o seu cumprimento seja imposto coercivamente pelos órgãos estaduais competentes.
A não observância das normas de conduta social, por seu lado, é sancionada pela exclusão da
convivência ou marginalização de quem as infringe e esta sanção até pode vir a ser muito mais
sentida pelo infractor do que uma sanção pelos órgãos estaduais. A não obediência às normas
morais não leva a sanções externas, mas é sentida no foro íntimo, na consciência, de quem as
não respeita. Por outro lado, pode suceder que a obediência que uma pessoa deve a normas
morais pelas quais se pretende guiar leve a conflitos com normas jurídicas. Mas existe, neste
contexto, uma diferença fundamental se uma norma moral é invocada contra uma lei
ditatorial ou de um tirano ou se uma norma moral (ou religiosa) é invocada para justificar a
inobservância das leis num Estado democrático de Direito. Enquanto a invocação das
convicções morais em sistemas ditatoriais ou opressivas pode ter toda a sua justificação, a
invocação de ordens absolutas de natureza moral, religiosa ou de cariz cultural ou ideológico
num Estado democrático de Direito não pode proceder pois estas ordens hão-de ser
relativizados pela lei aplicável a todos. O Estado de Direito toma conhecimento da posição
individual, moral ou religiosamente absoluta, e pondera-a; mas a lei, democraticamente
consagrada, a que todos estão igualmente sujeitos, não pode ceder. A exigência da proteção
da comunidade é superior a uma lesão das convicções individuais. Na verdade, a aceitação das
leis pelos seus destinatários é um pilar fundamental da sua legitimação democrática.

1.4.3 De qualquer maneira, quanto à obediência a normas devemos distinguir entre estar
obrigado juridicamente e estar obrigado moralmente.

Estar obrigado juridicamente significa que alguém, apoiado numa determinada norma jurídica,
pode exigir de outrem um comportamento, uma conduta (o artigo 2009.º do Código Civil diz
quais são as pessoas que são obrigadas a prestar alimentos e estabelece, no seu n.º 1, alínea
d), também a obrigação de prestar alimentos entre irmãos).

Estar obrigado moralmente significa que é a nossa consciência que nos impõe um dever (dar
uma esmola ou socorrer a quem está a afogar-se).

Obrigações morais e jurídicas podem coincidir: socorrer a quem está a afogar-se não é apenas
uma obrigação moral, mas também jurídica. Neste caso, a omissão de prestar auxílio é um
crime e como tal punido. Ainda pode suceder que alguém cumpre uma obrigação jurídica e ao
mesmo tempo sente-se também moralmente compelido a cumprir (por exemplo, prestar
alimentos legalmente devidos a seus irmãos). Como já sabemos, apenas a observância das
normas jurídicas é garantida pelo poder do Estado (através dos seus meios coercivos).
Compete ao Estado decidir se uma dada norma de conduta é uma norma jurídica, sendo assim
juridificada, ou se não o é. As normas morais em princípio não devem ser juridificadas.

1.4.4 Neste contexto podemos distinguir para já – entre as várias modalidades de normas (que
ainda vamos estudar) – as seguintes:

1) Normas preceptivas (= normas que prescrevem, que impõem um certo comportamento (por
exemplo, as disposições do artigo 879.º CC que prevêem as obrigações de vendedor e
comprador; normas que exigem que se contraia um seguro automóvel, etc.);

2) Normas proibitivas ou sancionatórias (exemplos: as normas penais; mas há também normas


civis que proíbem comportamentos ou sancionam factos ilícitos [por exemplo os artigos 334.º
ou 483.º CC]). Analisemos a hipótese legal do artigo 483.º: “aquele que … violar ilicitamente o
direito de outrem …” sofre a consequência, a sanção, de “fica obrigado a indemnizar …”.
Temos aqui uma previsão abstrata e geral (“violação do direito de outrem”) [uma previsão é
geral e abstrata quando não se refere a um caso concreto e individual, mas sim a um caso
qualquer possível em geral; a esta previsão geral e abstrata devemos subsumir um
determinado comportamento concreto que ocorreu (por exemplo, o atirar uma pedra contra
uma janela ou o envenenar o cão do vizinho, que são atos que violam o direito da
propriedade)];

3) Normas permissivas que atribuem poderes, faculdades e garantem liberdades (por exemplo,
no CC os artigos 405.º [que estabelece o princípio da liberdade contratual que permite às
partes fixar livremente o conteúdo dos contratos … com as cláusulas que lhes aprouver”], ou
2179.º, n.º 1, e 2188.º [que consagram a liberdade de fazer um testamento]. Mas devemos ter
a consciência que todas estas liberdades existem sempre e apenas “dentro dos limites da lei”.

1.4.5 Resumindo:

podemos dizer que estas normas referidas exprimem três ideias: “tu deves, tu não deves e tu
podes”. Mas é fundamental a ideia de que antes de tudo as normas jurídicas aceitam e
protegem a liberdade. Mantendo-se dentro destes espaços de liberdade, portanto aceitando
as regras legais, o homem atua com a segurança que a lei lhe oferece. Neste sentido, o direito
estabelece regras para o livre querer, dirige-se a homens dotados de razão e capazes de se
autodeterminarem. No fundo, a liberdade não é concedida ao homem, ela pertence-lhe, é
inata – o homem nasce livre. Ele pode fazer uso da liberdade como lhe agradar e sem prestar
contas desde que não diminua ou prejudique ninguém. Contudo, a sua liberdade encontra,
naturalmente, limites, ou seja, os “limites da lei”. Os alicerces da liberdade são a propriedade
privada e o Estado de Direito, ou seja, um Estado submetido à lei e sujeito ao controlo judicial.
Sem um sistema de justiça independente, isento e eficiente a liberdade não está garantida.
Podemos dizer que nada protege mais os elementos mais fracos de uma sociedade e evita o
abuso do direito pelo mais forte do que a existência do Estado de Direito e de uma justiça
independente. Resta acrescentar que o espaço de liberdade reservado aos indivíduos dentro
de uma sociedade mede-se pelo grau de autonomia que a ordem jurídica lhes concede na
organização e conformação das suas vidas.
2. A ordem jurídica como ordem normativa

2.1 Subjacente à ordem jurídica estão as características que a definem e a individualizam face
às outras ordens normativas e que, de resto, implicitamente, já foram referidas. Pertencem
aqui as seguintes:

2.1.1 Necessidade

Já explicámos que a ordem jurídica surge como necessidade prática para regular a convivência
humana, em consequência da vida em sociedade. Já Aristóteles referia que o homem é um
animal social, pois é um ser carente que necessita de se relacionar com o outro para atingir a
sua plenitude. Assim, a necessidade de se relacionar com o outro pressupõe também que haja
regras que definam e delimitem os direitos de uns a que correspondem os deveres dos outros.

2.1.2 Exterioridade

O Direito não regula os comportamentos e pensamentos não exteriorizados. O direito regula


comportamentos ou relacionamentos exteriores. As intenções de cada um, mantendo-se no
foro interno de cada um e que não sejam exteriormente concretizadas por qualquer forma ou
ato, não são percetíveis para o Direito. Mas isto não significa dizer que o pensamento de cada
um não possa ser valorado pelo Direito, caso o comportamento e conduta o venha a
exteriorizar e revelar.

2.1.3 Estatalidade

Esta característica significa que o Direito provém do Estado, sendo emanado dos seus órgãos
pelo que também a estes compete a aplicação do Direito- doutrina do monismo jurídico.
Todavia, há quem defenda o oposto: não se nega que o Estado crie e aplique Direito, através
dos seus órgãos competentes, somente não se aceita que o Estado seja o único a emanar
normas jurídicas nem que seja o único com o poder de as aplicar, ou seja, nega-se o monopólio
da criação e aplicação do Direito pelo Estado- doutrina do pluralismo jurídico.

2.1.4 Imperatividade e obrigatoriedade

Na sua função elementar ou fundamental a ordem jurídica contém um comando e esta é a


característica da imperatividade. Se a ordem jurídica não fosse dotada desta característica a
sua função de ordenação social ficaria esvaziada. Esta imperatividade traduz-se também na
existência de sanções jurídicas que são aplicadas em caso de violação das normas jurídicas;
aliás, é a sua existência que muitas vezes fundamenta e prova a imperatividade das mesmas e
compele ao seu cumprimento. Contudo, também há normas jurídicas que não contêm uma
sanção jurídica – por exemplo as definições legais ou noções (ver artigos 67.º ou 202.º, n. 1, e
397.º do Código Civil) – e mesmo assim são imperativas por serem obrigatórias. Na verdade, a
ordem jurídica é composta por normas jurídicas imperativas no sentido de a sua observância
ser obrigatória não apenas no significado de elas imporem ou proibirem uma conduta, mas
também na aceção de a permitirem ao atribuir um poder, uma faculdade ou liberdade, como
sucede por exemplo com a liberdade contratual. Assim, para estabelecer relações jurídicas,
por exemplo para concluir um contrato, é obrigatório utilizar normas jurídicas que regulam os
regimes do contrato. Por isso, liberdade contratual significa atuar livremente dentro da ordem
jurídica e assim é obrigatório recorrer ao modelo, o tipo legal “contrato”, consagrado no
Código Civil, que é escolhido livremente pelas partes, para assumir uma obrigação ou adquirir
um direito.
2.1.5 Coercibilidade

Entende-se por coercibilidade a possibilidade de recorrer ao uso da força para aplicar as


sanções prescritas pelo Direito em caso de violação deste, seja por atos ou por omissões, ou
para obrigar ao seu cumprimento, sempre que seja necessário e possível. Quando se menciona
a possibilidade de uso da força, quer-se dizer a possibilidade de recorrer a órgãos estaduais e
os mecanismos legais de que dispõem para garantir o cumprimento das normas e evitar
violações de direitos, mas não uso de força rude. Como acabamos de ver, por regra, compete
ao Estado a aplicação do Direito coercivamente. Muito excecionalmente, em situações em que
o recurso à força coerciva dos órgãos estaduais não é possível, a ordem jurídica permite que as
pessoas podem, para tutelar os seus direitos, em termos muito limitados recorrer à força
própria.

2.2 O Direito objetivo e o direito subjetivo

2.2.1 O Direito Objetivo

As normas jurídicas no seu conjunto constituem o chamado “direito objetivo”. Este é


legitimado pela função de manter, a partir das suas regras, a paz social, sendo baseado em
critérios de justiça que o legitimam. A ideia da justiça é o critério decisivo pelo qual se mede a
correção do conteúdo das normas jurídicas. Assim, podemos definir o direito objetivo como o
conjunto das normas jurídicas, regras de conduta entre os homens, legitimado pela função de
manter a paz social, baseado em critérios de justiça e munido de coercibilidade pelo poder do
Estado em que o direito tem a sua origem. Neste sentido a tarefa do direito consiste em
garantir uma ordenação justa das relações (situações) de vida, sendo certo que o critério de
justiça, uma questão muito difícil como ainda veremos, é fluído e varia conforme os tempos e
os lugares. Deste modo, o direito objetivo reconhece ou atribui aos homens, em abstrato, os
seus direitos e as suas obrigações; é ele quem diz o que pertence a uns e o que compete a
outros. Escreve João Baptista Machado: “o Direito é uma ordem de convivência humana com
um sentido – o sentido da justiça. (…) Informado pelo princípio da Justiça, limita-se a definir,
segundo um critério objetivo, o teu e o meu, isto é, limita-se a definir a esfera de liberdade de
cada um em face dos demais e em face da coletividade. Daí que as obrigações impostas a cada
um pelo Direito, correlativas de direitos atribuídos a outros ou à coletividade (…) sejam
dotadas da qualidade particular de juridicamente exigíveis”. Deste modo, o respeito pela
liberdade do homem ou, por exemplo, o cumprimento das obrigações de um contrato é
juridicamente exigível, sendo certo que neste caso o devedor da obrigação, como homem
correto e honesto, se pode sentir, além de jurídica, ainda moralmente compelido para efetuar
a sua prestação. Ao direito objetivo – assim entendido como o conjunto das normas jurídicas
ou a ordem jurídica – corresponde o conceito “direito”.

2.2.2 O Direito Subjetivo

Contudo, o conceito “direito” tem ainda um sentido subjetivo. A distinção entre os dois
sentidos fica bem clara nos conceitos do direito anglo-saxónico. Este distingue-se entre law (=
o direito objetivo) e right (= o direito subjetivo). Seguindo esta distinção vemos que o direito
objetivo é na verdade um conjunto abstrato de normas jurídicas e que estamos perante um
direito subjetivo quando alguém, invocando uma norma precisa instituída pelo direito
objetivo, exige de outrem, ao apoiar-se no conteúdo desta norma que lhe atribui este direito,
um determinado comportamento. Portanto, é o direito objetivo que reconhece ou atribui um
direito subjetivo. Por isso, para quem quer fazer valer um direito subjetivo face a outrem, é
sempre indispensável que encontre no direito objetivo uma norma em que o seu pedido se
apoia, isto é, uma norma determinada que lhe atribui o seu direito subjetivo e em que se
baseia a sua pretensão. Por exemplo, o artigo 1311.º atribui ao proprietário esbulhado o
direito de exigir (= reivindicar) a restituição da coisa enquanto o artigo 483.º confere ao lesado
o direito de ser indemnizado pelos danos sofridos ou o artigo 2101.º dá ao herdeiro o direito
de exigir a partilha dos bens da herança. Os direitos subjetivos apresentam-se-nos em
modalidades diferentes. Em termos gerais podemos fazer a seguinte abordagem: existem duas
modalidades distintas do direito subjetivo que são os direitos subjetivos absolutos e os direitos
subjetivos relativos que, no seu conjunto, se designam também por direitos subjetivos
propriamente ditos, havendo, para além deles, ainda os direitos potestativos.

2.2.2.1 Os direitos subjetivos absolutos

Os direitos subjetivos absolutos ou são direitos de domínio ou são direitos de personalidade


(e, de certo modo, ainda direitos familiares pessoais) aos quais corresponde uma obrigação
passiva universal de todos os outros que os devem respeitar, uma vez que se dirigem contra
todos indeterminados. Absoluto não é o mesmo que ilimitado ou isento de vinculações, mas
significa precisamente que pertencem apenas ao seu titular e excluem deste modo todos os
outros e são oponíveis a todos os outros. Isto indica que os direitos absolutos têm efeitos erga
omnes. Deste modo, todos os direitos absolutos são sempre direitos de exclusão; eles impõem
a toda a comunidade um comportamento negativo, de nada fazer que viole ou interfira com o
seu exercício, ou seja, há uma obrigação passiva universal de os respeitar.

Os direitos de domínio incidem sobre uma coisa determinada, que constitui o seu objeto.
Serve como exemplo a definição do conteúdo do direito da propriedade feita pelo artigo
1305.º CC: “O proprietário goza de modo pleno e exclusivo dos direitos de uso, fruição e
disposição das coisas (as coisas são o objeto sobre que incide o direito da propriedade) que lhe
pertencem …”. Estas coisas, sendo inanimados, podem ser corpóreas (um bem material) ou
incorpóreas (um bem imaterial) como nos indicam os artigos 1302.º, n.º 1, e 1303.º. O artigo
1303.º determina que a propriedade intelectual, que é um bem imaterial, está sujeita à
legislação especial. Para ter relevância jurídica é necessário que a respetiva criação intelectual
tenha ganho expressão, ou seja, tenha sido exteriorizada. Ainda são objeto do direito da
propriedade os animais (artigo 1302.º, n.º 2) em relação aos quais o seu proprietário deve
observar deveres especiais (artigo 1305.º-A). Aos animais, seres vivos dotados de sensibilidade
(artigo 201.º-B), são aplicáveis na ausência de uma lei especial as disposições do Código Civil
relativas às coisas, desde que não sejam incompatíveis com a sua natureza (artigo 201.º-D).
Como dissemos, aos direitos subjetivos absolutos pertencem também os direitos de
personalidade que não são direitos de domínio (porque não incidem sobre um objeto [uma
coisa]) e que são definidos pelo seu conteúdo. Os direitos de personalidade são regulados nos
artigos 70.º e seguintes do Código Civil e pertencem aqui, além dos referidos nos artigos 72.º a
80.º, por exemplo, o direito à vida ou à integridade física ou moral. Aparte algumas exceções
(como sucede com o direito ao nome) estes direitos não são atribuídos pelo direito objetivo,
mas resultam da natureza humana, sendo à semelhança da liberdade do homem direitos
inatos e irrenunciáveis. Aqui o direito objetivo limita-se a reconhecer e, por conseguinte,
proteger estes direitos. Vemos, portanto, que todos os direitos de domínio sobre uma coisa
são direitos absolutos, ao excluírem todos os outros, mas nem todos os direitos absolutos são
ao mesmo tempo direitos de domínio como vimos a respeito dos direitos de personalidade,
também exclusivos a quem pertencem. Temos ainda os direitos familiares pessoais que têm
características de direitos absolutos, excluindo todos os outros, mas simultaneamente
estabelecem deveres ou obrigações só oponíveis entre as partes de uma relação jurídica
familiar.

Pertencem aqui os direitos que envolvem as responsabilidades parentais. Estes pertencem


exclusivamente aos progenitores (artigo 1878.º, n.º 1), sendo deste modo direitos absolutos.
Mas entre pais e filhos já temos direitos que os vinculam apenas entre si como flui nitidamente
do artigo 1874.º, n.º 1, que diz que pais e filhos se devem mutuamente respeito, auxílio e
assistência, e sobretudo do artigo 1878.º, n.º 1, que define as responsabilidades parentais. Em
sentido idêntico, surge o artigo 1878.º, n.º 2, que determina que os filhos devem obediência
aos seus pais. Contudo, em caso algum, os filhos são objetos de domínio dos seus pais. Este
entendimento é de todo incompatível com a sua dignidade humana. Uma situação semelhante
encontramos a respeito dos deveres conjugais (artigo 1672.º). O casamento, ou o estado de
casado, tem para cada cônjuge natureza exclusiva face a terceiros (artigo 1601.º, alínea c)).
Mas entre os cônjuges, nas relações internas, os direitos e deveres resultantes do casamento
definidos pelo artigo 1672.º são apenas vinculativos e oponíveis entre eles e nem todos são
sequer coercíveis como sucede com o dever de coabitação.

2.2.2.2 Os direitos subjetivos relativos

Enquanto os direitos de domínio como direitos absolutos incidem sobre uma coisa os direitos
relativos são direitos dirigidos à realização de uma prestação, ou seja, são dirigidos contra uma
pessoa determinada que a deve efetuar. Corresponde-lhes apenas uma obrigação desta
pessoa. Deste modo, os direitos de domínio e os direitos a uma prestação têm objetos
diferentes – coisa ou prestação – mas têm também obrigados diferentes – todos os outros,
indeterminados, ou uma pessoa determinada. Os direitos subjetivos relativos são direitos de
crédito, isto é, são direitos que permitem exigir uma prestação ao estabelecerem uma
obrigação entre determinadas pessoas. O artigo 397.º diz: “Obrigação é o vínculo por virtude
do qual uma pessoa fica adstrita para com outra à realização de uma prestação”. Agora, os
direitos relativos resultam de consensos entre as partes e são apenas estas que ficam
vinculadas e os direitos de cada uma delas são oponíveis apenas entre estas. Por isso são
relativos, quer dizer, têm efeitos inter partes, ou seja, entre as pessoas que celebraram
livremente um contrato com base no artigo 405.º e que ficam vinculados a ele. Em relação a
terceiros, um contrato só produz efeitos nos casos e termos especialmente previstos na lei
(artigo 406.º, n.º 2). Mas a regra é a de que os efeitos jurídicos na sequência da celebração de
um contrato, que vincula as partes que o outorgaram, se limitam apenas a estas, dele
resultando só para elas os direitos de exigir e as obrigações a cumprir.

Podemos acrescentar que, sob este último aspeto, os direitos familiares pessoais – além da sua
característica de direitos absolutos nas relações externas – têm nas relações internas que,
como vimos, vinculam os familiares (pais e filhos ou cônjuges) ainda características de direitos
relativos, tendo deste modo natureza híbrida. Na sua grande maioria, os direitos de crédito
são direitos de curta duração (visam, como vemos no exemplo do contrato de compra e venda,
o rápido cumprimento das obrigações e extinguem-se com o seu cumprimento) enquanto os
direitos de domínio são geralmente direitos de longa duração (como vemos no exemplo no
direito de propriedade que não prescreve e não se extingue com o seu não uso ou o mero
decurso do tempo). Por outro lado, há direitos de crédito muito relevantes de longa duração
que conferem a utilização (o gozo) de uma coisa como, por exemplo, os direitos dos locatários
que resultam de contratos de arrendamento ou de aluguer. A lei designa este tipo de direitos
de crédito como direitos pessoais de gozo. Mas também há direitos de domínio de curta
duração como sucede com o direito da propriedade quando incide sobre coisas destinadas ao
consumo. Como vimos, em princípio a cada direito de crédito corresponde uma obrigação,
como vem expresso no artigo 397.º, e as obrigações uma vez contraídas devem ser cumpridas.
São estes os casos normais e aqui falamos de obrigações civis cujo cumprimento pode ser
exigido. Todavia, pode não ser assim o que sucede no caso das obrigações naturais cujo
cumprimento pode apenas ser pretendido. Temos assim direitos relativos (de crédito) aos
quais corresponde apenas uma “obrigação natural”. Estes são direitos subjetivos relativos mais
fracos porque o seu cumprimento não pode ser exigido, faltando-lhes a tutela judicial e com
isso a proteção coerciva dos órgãos estaduais. Quer dizer, o credor apenas pode pretender o
cumprimento por parte do devedor, mas não lho pode exigir, sendo certo, todavia que o seu
direito existe e que lhe corresponde uma obrigação (artigos 402.º a 404.º). Por conseguinte, o
devedor pode sempre cumprir voluntariamente a sua obrigação por se sentir moralmente
obrigado.

2.2.2.3 Da violação dos direitos subjetivos (propriamente ditos)

Atendendo aos seus efeitos erga omnes, os direitos absolutos podem ser violados por todos os
que os deviam respeitar, mas não cumpriram a obrigação passiva universal de não os lesar,
enquanto os direitos relativos (salvo raras exceções), com os seus efeitos apenas inter partes,
só podem ser violados pelas partes de um contrato, vinculadas pela obrigação de o cumprir. A
violação culposa de um direito subjetivo faz com que o lesante incorra em responsabilidade o
que implica a sua obrigação de reparar o dano causado e de indemnizar o lesado. Em princípio,
e sempre que possível, deve ser reconstituída a situação que existiria se não se tivesse
verificado o evento que causou o dano (artigo 562.º). Caso contrário, a indemnização é feita
em dinheiro (artigos 566.º [que se refere a danos patrimoniais] e 496.º [que se refere a danos
morais ou não patrimoniais onde a indemnização corresponde a uma compensação, sendo
certo que nestes casos frequentemente fica o efeito do semper aliquid haeret]). A violação de
um direito relativo tem como consequência a responsabilidade civil contratual, uma vez que as
obrigações contratuais assumidas pelas partes não foram devidamente cumpridas; já a
violação de um direito absoluto, pelo contrário, onde não há um contrato, tem como efeito a
responsabilidade civil extracontratual. Todavia, a violação de um direito subjetivo, por si só,
não é suficiente para que surja a obrigação de indemnizar. Segundo a lei, a justificação
primordial da responsabilidade é a culpa, um comportamento censurável que justifica uma
sanção. Isto vale tanto para a responsabilidade contratual (artigo 798.º) como para a
responsabilidade extracontratual (artigo 483.º). O critério da culpa para justificar a
responsabilidade pode hoje considerar-se questionável e nem sempre é seguido. Sobretudo no
campo da responsabilidade extracontratual há cada vez mais factos danosos em que a lei
impõe uma responsabilidade independentemente da culpa do causador do dano ou lesante.
Aqui temos a chamada responsabilidade pelo risco: quem tira proveitos de uma atividade lícita
que implica riscos responde, independentemente de culpa sua, pelos danos nos casos em que
o risco se concretiza. Nesta responsabilidade civil pelo risco subjaz o princípio ubi commoda,
ibi incommoda. Mas pertence a este campo também a responsabilidade do produtor ou de
quem fabrica e põe ao uso objetos guiados por inteligência artificial.

Aos direitos subjetivos propriamente ditos devemos acrescentar os direitos potestativos cujo
exercício depende da vontade (potestas) do seu titular e que lhe conferem o poder de
produzir, através do seu exercício, unilateralmente – e não por consenso como sucede
comummente no caso dos direitos relativos – efeitos jurídicos na esfera de outrem, ou seja, na
esfera de uma outra pessoa. Esta outra pessoa encontra-se num estado de sujeição, isto é, há-
de suportar, sem lhes poder subtrair ou sem os poder afastar, na sua esfera jurídica os efeitos
jurídicos que se lhes impõem por virtude do exercício unilateral daquele direito.

Quer dizer, não estamos perante uma obrigação que, eventualmente, pode vir a não ser
cumprida, como acontece com os direitos subjetivos propriamente ditos, pois quem está
sujeito ao exercício de um direito potestativo não se pode subtrair aos efeitos jurídicos
produzidos que se lhe impõem sem mais. Por via de regra, os direitos potestativos pressupõem
a pré-existência de um direito subjetivo propriamente dito ou de uma relação jurídica ou de
uma situação a partir do qual podem vir a nascer e que confere o direito para eles poderem
ser exercidos. Conforme os efeitos que resultam do seu exercício distinguimos entre três
modalidades de direitos potestativos, os extintivos (que extinguem um direito subjetivo ou
uma relação jurídica), os modificativos (que, embora mantendo o direito ou a relação jurídica,
o alteram) e os constitutivos (que fazem nascer um novo direito subjetivo que anteriormente
não existiu).

a) Quanto a um direito potestativo extintivo temos, como exemplo, um contrato de


arrendamento com os seus direitos e obrigações de parte à parte; caso o arrendatário não
pague a renda incorre em incumprimento e o equilíbrio contratual (= a disponibilização da casa
contra o pagamento da renda) fica perturbado; com base nesta situação criada nasce para o
senhorio um direito potestativo extintivo no sentido de poder resolver unilateralmente
(embora por via judicial) o contrato de arrendamento; em consequência do exercício deste
direito fica como efeito a extinção do contrato de arrendamento.

b) A respeito de um direito potestativo modificativo podemos ver a seguinte situação: Duas


pessoas estão casadas e daí resultam para elas como efeitos legais os cinco deveres (e
correspondentes direitos) conjugais enumerados no artigo 1672.º; agora, o casamento corre
mal, mas os cônjuges (podendo ter a esperança de uma reconciliação) para já ainda não
querem pôr um fim ao seu casamento, divorciando-se, tendo no entanto cada um deles o
direito potestativo de pedir unilateralmente a separação judicial de pessoas e bens. Exercido
este direito (por via judicial), o vínculo conjugal ainda se mantém, o estado de casado
continua, mas de forma modificada, afrouxada, pois por efeito da separação dos cinco deveres
conjugais dois cessam; são eles os deveres de coabitação e de assistência (mas não o dever de
fidelidade [por causa do carácter exclusivo do casamento ou estado de casado que se
preserva]).

Pertencem aos direitos potestativos modificativos os poderes de direção (com grande


relevância no direito do trabalho e aos quais alude o artigo 1152.º “sob a direção”) que são
direitos ligados ao exercício de uma função.

c) No que concerne aos pressupostos para o exercício de um direito potestativo constitutivo


vamos mencionar o seguinte caso: Alguém é proprietário de um prédio encravado. Sendo
assim, existe uma relação de vizinhança entre os donos dos vários prédios, sendo certo que a
lei prevê que um prédio deve ter acesso à via pública. Aqui, o proprietário do prédio encravado
tem a faculdade de exercer o direito potestativo de constituir uma servidão de passagem
sobre um terreno vizinho. A servidão de passagem que veio a ser constituída é um direito
subjetivo novo (um direito real limitado), anteriormente não existente, que nasceu – que se
constituiu – por efeito do exercício de um direito potestativo constitutivo.

d) Com o seu exercício, e com os seus efeitos produzidos em virtude deste, ou seja, com a
extinção ou modificação de um direito subjetivo existente ou com a constituição de um direito
subjectivo novo, o fim do direito potestativo ficou esgotado e, em virtude disso, o direito
potestativo extingue-se; a sua razão de ser acabou. Todavia, nos casos em que a lei sujeita o
exercício de um direito potestativo a um prazo, o direito extingue-se por caducidade se não
tiver sido exercido dentro do prazo.

2.2.2.5 Conclusões – o abuso do direito – os prazos para o exercício dos direitos: prescrição,
caducidade, não uso

a) Dito tudo isto podemos concluir: definido “tecnicamente”, o direito subjetivo é o poder ou a
faculdade, reconhecido ou atribuído pela ordem jurídica (= o direito objetivo) ao seu titular, de
exigir (judicialmente [no caso direito absolutos e das obrigações civis]) ou de pretender
(extrajudicialmente [como sucede com as obrigações naturais]) de outrem um comportamento
ativo/positivo (por exemplo: realizar uma prestação) ou passivo/negativo (não violar um
direito absoluto) ou então o poder de produzir unilateralmente efeitos jurídicos na esfera de
outrem (na sequência do exercício de um direito potestativo).

b) Deste modo todos os direitos subjetivos conferem ao seu titular sempre um poder, que lhe
pertence, e que o exerce de acordo com a sua vontade. De facto, a vontade é o elemento
decisivo para a produção dos efeitos jurídicos. Contudo, o exercício volitivo de quaisquer
poderes é sempre (parece quase por natureza) suscetível de ser abusado ou de ser feito de
forma arbitrária. Esta constatação é importante pois, como sublinhámos logo na primeira aula,
todas as relações sociais ou jurídicas apresentam estruturas de poder em que, não raras vezes,
existe um desequilíbrio do poder. Por outro lado, há também muitas relações em que se
verifica um equilíbrio dos poderes em causa.

A ordem jurídica, porém, não pode confiar que o poder é geralmente exercido de um modo
moderado. Como a experiência mostra não se pode confiar numa moderação geral aquando
do exercício de um poder. Daí que a ordem jurídica contenha regras contra o exercício abusivo
dos poderes que são inerentes aos direitos subjetivos (ver, nomeadamente, a norma proibitiva
do artigo 334.º CCiv que determina que “é ilegítimo o exercício de um direito, quando o titular
exceda manifestamente os limites impostos pela boa-fé, pelos bons costumes6 ou pelo fim
social ou económico desse direito”).

c) Finalmente, o direito subjetivo também tem limites que resultam do simples decurso do
tempo ou dos prazos em que podem ou devem ser exercidos. Não o sendo, temos como
consequência que os direitos podem prescrever ou caducar. Distinguimos, portanto,
prescrição, caducidade e não uso.

Não tendo sido exercido dentro do prazo previsto um direito pode prescrever, quer dizer,
deixa de ser exigível judicialmente, embora continue a existir. E, como existe, o titular do
direito prescrito ainda pode pretender o cumprimento tal como o devedor pode,
voluntariamente, cumprir a sua obrigação. Neste último aspeto o direito prescrito aproxima-
se, quanto aos seus efeitos para o devedor – deixa de ser exigível para apenas ser pretendível
– a uma obrigação natural. Contudo, a prescrição não funciona ipso iure, mas tem que ser
invocada por quem dela pretende beneficiar (artigo 304.º). São os direitos de crédito que
podem prescrever e os prazos variam conforme a natureza da obrigação do devedor (artigos
309.º a 317.º).

Mas um direito pode também caducar se não tiver sido exercido dentro do prazo. Enquanto,
apesar de ter prescrito, o direito ainda continua, com a sua caducidade o direito extingue-se,
deixa de existir. Ao contrário da prescrição a caducidade é apreciada oficiosamente pelo
tribunal (artigo 333.º) perante o qual o direito é invocado e de cuja não existência ou não
depende a sua decisão. São os direitos potestativos que podem caducar.

Os direitos absolutos, nomeadamente a propriedade, não prescrevem nem caducam (artigo


298.º, n.º 3, 1.ª parte). Alguns podem extinguir-se pelo seu não uso (artigo 298.º, n.º 3, 2.ª
parte) como está previsto, por exemplo, no artigo 1476.º, n.º 1, al. c) (extinção do direito de
usufruto pelo não exercício).

Ler: Ángel Latorre, pp. 19-22; J. Baptista Machado, Introdução, pp. 64, 88-90

A PARTIR DAQUI JÁ TENHO

3. Os fins do Direito

3.1 A Justiça

Como resulta da definição do conceito “direito objetivo”, os fins da ordem jurídica são a
realização da justiça.

O direito cumpre as suas funções a partir de uma ideia de justiça, que o legitima, sendo esta
ideia aceite (ou, pelo menos, tolerada) pela sociedade. A aceitação do direito pelos homens é
fundamental. Está em causa a aceitação social daquilo que se entende por justo porque uma
definição objetiva de justiça, perene e comummente aceite, não existe. Há-de assumir-se,
resignadamente, que não se pode encontrar uma resposta definitiva à questão de saber o que
é a justiça. O sentir em relação ao entendimento do que é justo modifica-se no decurso da
evolução social e das convicções religiosas e morais e da realidade económica e varia nas
diferentes sociedades. Por isso, a justiça (inclusive os direitos subjetivos e seu exercício) deve
ser sempre aferida à realidade, deve respeitar a realidade que resulta da evolução contínua
dos conhecimentos, da técnica, da ordem social, do sentir dos homens e das suas expectativas
e deve ser consentânea com elas sob pena de se criar um fosso, um desfasamento, fatal para a
aceitação da ordem jurídica, entre a realidade social e as leis. Deve haver uma ligação, uma
“comunicação” (uma interacção), entre quem faz as leis e os que as devem seguir. O que
significa também que a aceitação das leis pelos seus destinatários é um pilar fundamental da
legitimação democrática.

Com os olhos de hoje podemos considerar muitas soluções legais, vigentes no passado, como
injustas embora, na altura, não eram entendidas desta maneira. Ao direito cabe realizar a
justiça na vida real e social que, em dada altura, é acessível ao legislador. E a justiça de que
falamos é a justiça humana, moldada, em termos mais ou menos perfeitos, de acordo com os
conhecimentos existentes, por leis humanas.

A ausência de uma resposta comummente aceite no que respeita à definição da justiça não
impede, todavia, que possam ser definidos elementos da justiça ou determinadas modalidades
da justiça.
3.1.1 Os elementos da justiça

a) Os elementos da justiça em geral são a impessoalidade ao estabelecer limites e critérios


gerais objetivos (sem sentimentos pessoais como amor, caridade ou amizade), e a alteridade
no sentido de que a justiça se orienta para os outros, para os seus comportamentos
exteriorizados, a convivência social, a sua sujeição à evolução contínua e sua orientação para a
vida social bem como a preservação da liberdade. Podemos referir o exemplo da justiça penal
em relação à sociedade e liberdade: o direito penal de uma sociedade secularizada e plural só
pode intervir e impor comportamentos para proteger bens jurídicos fundamentais das pessoas
ou de toda a comunidade; só merecem proteção os bens jurídicos de dignidade eminente e
superior, sendo esta avaliação dependente das condições da evolução social.

b) Como elementos lógico-formais da justiça apontamos a proporcionalidade (temos aqui a


ideia de equilíbrio, da reciprocidade e da adequação), a igualdade na sua aplicação das suas
regras (como contraposto à arbitrariedade, de todo em todo inaceitável) e o respeito pela
dignidade da pessoa humana, isto é, o valor superior de qualquer pessoa humana!

c) Em termos materiais compete ao direito resolver conflitos concretos, garantir a


comparticipação de todos nos bens da comunidade e a integração na sociedade em
consequência do facto de o homem apenas se poder realizar na convivência com os outros.
Mas daí não resulta que, em termos gerais, “nós sermos responsáveis pelo ser dos outros e os
outros são responsáveis pelo nosso ser”. Esta afirmação não corresponde aos pressupostos da
responsabilidade que, em toda a regra, pressupõe atos próprios livremente (autonomamente)
assumidos com os seus riscos inerentes e com a consciência de responder em pessoa. E neste
contexto devemos reconhecer que a autorresponsabilidade abrange até a possibilidade de um
agir que outros podem considerar irresponsável (por exemplo, não se deixar vacinar).

Ser responsável por outrem pressupõe o poder de determinar a conduta deste (é o artigo
491.º que prevê uma situação deste tipo) o que por regra não é o caso. Coisa perfeitamente
diferente e imprescindível é respeitar o outro como ser igual e neste sentido ser responsável
pela sua condição de homem.

P3 4ªsemana

Você também pode gostar