1. Analise a importância da Cúria de Coimbra de 1211 para as relações
entre o direito régio e o direito canónico em Portugal. No período pluralista as fontes de direito de maior relevo, eram, indubitavelmente, o direito romano e o direito canónico. Desta forma, o direito positivo “supra regna”, incidia, maioritariamente, nestas duas fontes distintas. Tendo a perceção que o período que estudamos é um período de forte influência da igreja, o direito canónico aparece com um grau de relevo superior ao direito romano. Foi devido a Dionísio, que todas as fontes de direito canónico (fontes essendi e fontes cognocendi) integraram um único documento: o Corpus Iuris Canonici. Desta forma, a partir da Cúria de Coimbra de 1211, as leis canónicas passaram a prevalecer sobre as leis do monarca, ou seja, sobre o direito régio, devido a forte penetração do direito canónico na Península Ibérica. Assim, os tribunais eclesiásticos passaram a julgar segundo dois critérios: em função da matéria - se essa dissesse respeito à questões do foro espiritual, como é o caso do casamento e das sucessões - e em função da pessoa - teria privilégio de foro caso de tratasse de viúvas, órfãos, docentes universitários, estudantes e clérigos. Este privilégio só deixava de ter efeito caso se tratasse de ofensas ao rei, usucapião e usura. Neste seguimento, o direito romano e o direito canónico iriam disputar a sua aplicabilidade no reino, distinguindo-se em função dos critérios acima descritos. De tal forma foi a influência do Direito Canónico em Portugal, que reinados mais tarde foi aplicado certas restrições a aplicação do direito canónico em Portugal, como é exemplo o Beneplácito Régio, entre outros exemplos.
2. Podemos considerar as cartas de povoação e os forais um contrato, por
comparação com os foros? Fundamente. Estamos, portanto, no âmbito de duas fontes de direito distintas: o direito outorgado e o direito pactuado. Desta forma, o direito pactuado surge como um contrato entre partes, do qual resulta direitos e deveres recíprocos, enquanto o direito outorgado consistia na mera concessão de um direito através de um ato oficial. As cartas de povoação, as cartas de forais e os foros enquadram-se no âmbito das cartas de privilégio, sendo estes um documento que atribuía um certo privilégio e regalias à pessoas determinadas. Ora, enquanto as cartas de povoação e as cartas de foral consistiam na outorga ou na concessão de certos privilégios de tipo territorial, económico, entre outros, pelo monarca ou pelos senhores eclesiásticos, embora haja uma distinção entre as cartas de povoação e as cartas de foral no que toca a sua natureza, visto que as segundas são cartas de privilégio mais extensas e que versavam sobre assuntos de direito privado: direito penal, direito administrativo, militar e fiscal; enquanto as cartas de povoação surgiram no contexto da reconquista cristã e da necessidade de repovoar terras, desta forma possui um cariz meramente económico. Os foros, por sua vez, também conhecidos por Estatutos ou Costumes Municipais, tutelavam sobre assuntos de direito público e privado. Na sua essência, eram cartas de privilégio da iniciativa dos próprios habitantes ou das autoridades locais, que criavam ou alteravam as normas já existentes numa dada região. Partindo desta análise, podemos relacionar as cartas de povoação e as cartas de foral com o direito outorgado, não sendo propriamente um contrato entre partes que prevê uma deliberação, mas antes um contrato de adesão, como os que estamos habituados a subscrever atualmente. No caso dos foros, estes consistem num verdadeiro contrato, estando no âmbito do direito pactuado. Em última análise, o relevante é compreender a distinção e natureza das cartas de privilégio supracitadas.
3. Analise de que forma a ars inveniendi permitiu o processo de criação de
direito e reinvenção do direito romano justinianeu. Antes de mais, importa fazer uma breve contextualização do processo de renascimento do direito romano justinianeu. Ora, sabe-se que após a queda do império romano no ocidente, em 476 d.C, o direito romano sofreu uma grande perda de prestígio, entrando, assim, num período de decadência. Todavia, o processo de renascimento do direito romano justianeu deu-se na Idade Média, por Irnério, monge fundador da primeira escola medieval - escola dos glosadores - o qual descobriu a obra de Justiniano. Prosseguiu-se, então a sua divisão (Digesto Velho, Novo e Esforçado) e foi a partir de então que as escolas medievais voltaram a estudar o direito romano e a aplicá-lo nos casos concretos. Assim, surgiu um novo tipo de direito: o direito prudencial. Sabemos, desta forma, e com base no processo de ressurgimento, que o direito prudencial é um direito académico, visto ter sido criado maioritariamente pelas universidades e procura, por sua vez, solucionar os casos que o direito canónico não abrangia. Neste mesmo sentido, podemos fazer uma breve abordagem das escolas que se debruçaram sobre o código de justiniano e procuraram compreender o direito romano: Escola dos Glosadores, Escola dos Pós-Acúrsianos e Escola dos Comentadores. Desta forma, a metodologia das escolas supracitadas medievais era a Ars Inveniendi, ou seja, arte de criar argumentos, e neste sentido utilizavam a metodologia analítica-problemática. Analítica, visto que os juristas buscavam, para cada caso concreto uma norma legal que os permitessem encontrar a solução ideal; e problemática, pois o jurista obtinha a resolução para o caso concreto, depois de formular a questão, buscar os efeitos positivos e negativos, discutir o problema, e só no fim é que se chegava à resolução do caso concreto. No que concerne à Ars Inveniende, esta consiste em três processos distintos: a Leges, Rationes e Auctoritates. A primeira, leges, consistia na análise dos textos de direito romano. Era uma ciência interpretativa e tinha como base uma gramática especulativa. No caso da segunda, Rationes, esta consistia na fundamentação de argumentos de equidade, de justiça, de lógica, entre outros, de modo a analisar o caso concreto e a procurar soluções viáveis para o mesmo. Importa compreender que este segundo processo da Ars Inveniendi era um processo de saber probabilístico, e neste sentido, os juristas de outrora utilizavam elementos como a retórica, a dialética e a tópica jurídica. Por fim, o último elemento seria a Auctoritates, lembrando-nos da auctoritas, que é um saber socialmente reconhecido, ou seja, a opinião do jurista e a aceitação da solução concreta seria tão e mais acatada, dependendo do jurista que a defendia. Em suma, foi através do ressurgimento do direito romano justinianeu e do contributo das escolas medievais, que podemos falar na reivenção do direito romano através da Ars Inveniendi. 4. As instituições matrimoniais em Portugal, na Idade Média, revelam um casamento puramente civil, ao lado do casamento realizado com as formalidades prescritas pela Igreja, tendo o primeiro efeitos semelhante ao segundo. Comente. Importa compreender, antes da abordagem do tema em questão, o que consiste um instituto familiar. Bem, os professores Albuquerque definem institutos como uma forma de organização social que se projetava através de normas. Ora, partindo deste pressuposto, no Direito Português antigo, existiam já três diferentes formas de casamento, sendo que há uma semelhança entre os atuais processos de casamento: casamento por bênção, casamento de juras e casamento de pública fama, e até um quarto não tão relevante, o casamento por rapto. Primeiramente, há que ressaltar a relevância do processo do noivado, conhecido por esponsais. Este consistia numa promessa de casamento entre os futuros cônjuges e que pode desencadear efeitos jurídicos pessoais e patrimoniais. Os esponsais, como celebração, consistia na entrega do anel esponsalício do noivo para a noiva e de um acordo entre o noivo e o pai da noiva de entraga do dote ou arras, que caracterizava-se como um montante pecuniário destinado à noiva, no caso do futuro cônjuge falecer antes do casamento, ou a repudiar injustificadamente, sendo assim uma forma de compensação. No final da cerimónia dava-se o beijo entre os noivos e a promessa de fidelidade - lei do ósculo. Esta era a primeira fase do casamento. Quanto ao casamento, este podia ser por bênção, que era realizado à luz do direito canónico, num templo sagrado e presidido por um sacerdote ou ministro de culto. Esta forma de casamento pressupunha o real consentimento entre os futuros cônjuges para a sua realização. É equivalente ao casamento religioso atual. No segundo plano, o casamento podia ser também por juras, correspondendo ao atual casamento puramente civil. Consistia, entre outros aspectos, no ato dos noivos professarem juras recíprocas. Esta forma de casamento não poderia ser ministrada por um sacerdote, nem tão pouco ser presidida em um templo sagrado.
Eyshila Neves 26833 Subturma 22 1C Prof. Susana Videira 30/04/2020