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HISTÓRIA DA ARTE E DO

DESIGN
AULA 3

Profª Débora Jordão Cezimbra


CONVERSA INICIAL

Tivemos durante as duas primeiras aulas da História da Arte amplos


saltos temporais e que retrataram a arte rupestre e da antiguidade e os
modelos da arte denominada de cristã, e estamos agora nos aproximando dos
modos e nos estilos artísticos mais conhecidos e difundidos em nossa
sociedade. Nestes cinco novos temas teremos o transcorrer de pouco mais de
cinco séculos, mas que nos permitem identificar obras e autores que nos são
comuns e muitos aclamados. Lembremos que historicamente os anos que
sucedem a Idade Média incorporaram a busca pelo conhecimento e o valor da
vida humana de uma forma ainda não vista – mesmo no auge da democracia
ateniense e da filosofia socrática – e com o enriquecimento das cidades e de
uma nova sociedade mercantilista, com as novas rotas de navegação que
conduzem ao “Novo Mundo” expandindo a arte para além das fronteiras da
Europa e do Oriente.
A narrativa de nossos estudos passa agora a objetivar o estilo e o
artista, e seguindo uma forte tradição entre os historiadores da arte, contudo é
possível hoje encontrarmos excelentes títulos que rompem certos paradigmas
do “contar a arte”, como o de Julian Bell, “Uma Nova História da Arte”, e de
Giulio Carlo Argan e Charles Harrison especificamente sobre a Arte Moderna, e
que será o assunto de nosso próximo estudo.
Iniciamos esta aula com o Renascimento e o primeiro retorno aos
princípios clássicos da antiguidade greco-romana, sendo que isso volta a
ocorrer aproximadamente dois séculos depois, no Academicismo ou
Neoclassicismo. Mas antes disso veremos sobre a arte Barroca e o Rococó.
Pensemos também neste estudo como o objeto artístico se difunde
numa conjuntura de consumo, ampliando a relevância social de quem pode
comprar/consumir a arte e que não pertence a uma aristocracia ou clero.
Reflitamos, além disso, que a época é repleta de rupturas e crises, tanto
artísticas, como religiosoas (Reforma Protestante e Contrarreforma), sociais e
políticas, com o avançar dos “estados absolutos” e com um mundo cada vez
mais próximo ao modelo em que hoje que vivemos.
Por fim, fecharemos a aula com o período denominado de Romântico,
em que você vai descobrir que não devemos levar os termos e estilo tão “ao pé
da letra” quanto julgamos.

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CONTEXTUALIZANDO

A questão do estilo na arte, pode, num primeiro momento, parecer muito


confortável, fazendo com que “etiquetemos” uma obra ou artista como Gótica,
Surrealista ou Grego Arcaico. Enquadrar a arte em estilos nos permite lidar
com garantias, formais, recorrentes e constantes, e que nos conduz a uma
classificação.
Realmente, sequer conseguimos imaginar a arte sem seus estilos, no
entanto, precisamos pensar na força daquilo que denominamos como discurso
– na arte e em toda nossa sociedade – e a forma como O validamos a partir de
uma compreensão parcial dos temas e dos contextos que O cercam. Dessa
forma indicamos aqui a leitura completa do livro O que é arte, de Jorge Coli
(1995), em que o autor argumenta – didática e cautelosamente, no capítulo Os
Estilos – que a classificação de um artista ou período em um determinado estilo
deve ser sempre parcial e não universal, pois a arte não possui a exatidão e o
rigor da ciência, mesmo nos períodos em que o conhecimento prevalecia.
Para tanto, evitemos então na arte classificar os estilos, os termos e os
períodos como sendo absolutos e estanques e sem o natural movimento da
expressão humana e que faz com que o Barroco não seja igual na Itália, no
Norte europeu ou nas Américas, ou que séculos antes do Renascimento os
artistas gostassem de representar a vida social além dos temas religiosos,
situação essa que só aconteceria mesmo após o Rococó, assim como pensar
que, na Idade Média – nos seus quase mil anos – pouco foi o desenvolvimento
cultural e artístico, mas não desmerecendo sua arquitetura, Iluminuras,
miniaturas e riquíssima produção monástica e de manuscritos. E pensemos
que mesmo com o desinteressado aprimoramento das formas humanas pelos
artistas do norte, poderíamos nos surpreender com a naturalidade do
movimento da escultura do gótico a “Nobre Uta” (Proença, 2005).
Buscando fechar nossas indagações, mas sem encerrarmos nossas
reflexões, tomemos que a Renascença foi o reviver dos ideais artísticos da
antiguidade Greco-Romana, ideais esses que nunca foram totalmente deixados
de lado, e que na arte as transformações vão se sobrepondo, ressurgindo e
renovando e que os estilos, assim como os termos, nos balizam o caminho
histórico, mas não estão ali para nos repelir à formação de nossos próprios
conceitos – e sensações – e, por fim, tenhamos em mente que o que

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prevaleceu na arte no período que trataremos aqui é muito bem fundamentado
por Merlo (2000) quando diz:

Evidentemente que, no seu estrito conteúdo, denominações não


valem mais do que a maior parte das designações históricas.
Renascimento não é melhor e gótico é absurdo. Se quisermos
aprender o alcance geral da arte que deu à Europa a sua fisionomia
definitiva, podemos dizer que, sucedendo ao instinto de livre
descoberta do séc. XV, essa arte é essencialmente um formalismo.
Pouco importa se ela seja clássica ou barroca. Existem na arte do
século XVII duas liturgias: uma de tendência clássica e outra de
tendência barroca. Mas, quer a linha seja direita, quer seja curva, os
dogmas são semelhantes: tendem a transformar a existência, sob o
olhar da inteligência, numa representação. Para o homem deste
tempo, tudo é espetáculo, antes de mais, sua própria vida. (Merlo,
2000)

TEMA 1 – A RENASCENÇA

Para Proença (2005), o Renascimento é um período caracterizado pelo


humanismo (renascentista) e que na arte incorporou a busca pelo
conhecimento com o estudo aprofundado da anatomia e da matemática e de
esquemas para compor a pintura que somente séculos depois seria estudado
na psicologia gestáltica.
Ousamos aqui dizer que a Renascença foi o momento da pintura ante ao
desenvolvimento das perfeitas esculturas gregas. A arte pictórica até então
nunca havia objetivado a beleza sublime como ocorreu no Renascimento.
Outra modificação importante diz respeito ao papel do artista, lembrando que
no decorrer da história sua autoridade oscilou entre o anônimo e o reconhecido
(a arte como ofício) e chegando num distinto status na sociedade helenística,
mas voltando à impessoalidade na produção monástica. Agora na lógica
renascentista do humanismo e do conhecimento o artista é um indivíduo livre,
autor de sua forma de representar e que deixava precocemente sua vida
familiar rumo às escolas de arte da época (ateliês de grandes mestres), onde
aprendia a produzir os pigmentos, a observar e copiar a técnica aprimorando
seu estilo. As rodas de conversa sobre a maneira de um artista pintar, esculpir
e construir era algo bem comum, fazendo parte da vida das pessoas, e sua
autoridade e reconhecimento fazia com que fosse chamado a produzir a quem
o pudesse pagar, normalmente mecenas da arte, como a igreja, a nobreza e a
nova rica classe burguesa (Gombrich, 1981).
Pensemos que no Renascimento o homem e a natureza voltam a ser o
centro do discurso (antropocentrismo) em oposição à superioridade do

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sobrenatural (teocentrismo), que vigorou nos séculos anteriores. O artista,
portanto, passa a ser o personagem que protagoniza a história e que é agora
contada além do panorama civilizatório, incluindo a pessoalidade e o caráter de
quem faz a arte.
Quanto à localidade é a cidade de Florença o berço da Renascença no
Quatrocento e tem-se na figura do arquiteto e escultor Filippo Brunelleschi
(1377-1446) a originalidade de uma nova concepção arquitetônica a partir dos
fundamentos da arte clássica, tal é verificado na fachada frontal da Capela
Pazzi, em que o novo está na combinação das antigas colunas e capitéis
sustentando os arquitraves com as parede com adorno geométricos. O
conjunto é muito simples, ainda mais se comparado às anteriores basílicas
românicas e catedrais góticas, mas essa nova arquitetura exibe outra inovação,
o vão, o espaço livre que aconchega o observador até a porta principal ao
fundo.

Figura 1 – Capela Pazzi de Filippo Brunelleschi, 1429

Créditos: EUG PNG/Shutterstock.

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Esse espaço livre até a entrada cerrada nos dá a sensação de
profundidade por meio de regras matemáticas denominadas de perspectiva.
Recordemos que até então o uso exato da perspectiva geométrica não aparece
na arte, e tem-se o uso de volumes e diferenças tonais e a sobreposição de
planos, mas essa técnica que distancia e aproxima os elementos com o
aumento e a redução de suas escalas – e com auxílio de pontos de fuga – será
um grande trunfo da arte renascentista. Para Gombrich (1981) a arquitetura
renascentista ambicionava produzir além da funcionalidade e da utilidade dos
edifícios, e buscava apenas a “beleza das proporções perfeitas”.
Mesmo sendo Brunelleschi quem primeiro se dedica ao emprego da
perspectiva, foi o arquiteto Leon Battista Alberti (1404-1472) que “solucionou as
questões formais e de medidas a partir da distância dada de um observador”
no tratado intitulado Della Pictura (Santos, 2007). O pintor Tommaso di Ser
Giovanni di Simone, o “Masaccio” (1401-1428), aplica na pintura essa nova
“regra”, de modo que um espaço se abre ao fundo, tal como se a parede fosse
quebrada e novos planos por detrás dela construídos. Para nossos habituados
olhos esse mural pode parecer comum, mas para a época Masaccio mostrou-
se muito além das convenções pictóricas (Gombrich, 1981).

Figuras 2 e 3 – A Santíssima Trindade, de Masaccio

Créditos: Bill Perry/ Marcovarro/Shutterstock.

Além da percepção de amplitude visual possibilitada pela perspectiva,


tem-se o um novo artifício do desenho, afinal, a distância contrapõe a
aproximação, já que quando se distancia certo elemento aproximam-se outros.
Tal questão aliada ao contraste luminoso faz com que haja uma renovação nos

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modos de pintura e esse esquema vai aparecer em inúmeros artistas e obras
durante e após o período.
Quanto aos temas, na Renascença a arte busca refletir a realidade tal
qual ela é – ou parece ao artista –, como no quadro de Jan Van Eyck (1390-
1441/Flandres), O Casal Arnolfini, em que o pintor – e também observador –
“brinca” ao se pintar no reflexo do espelho ao fundo do aposento. Van Eyck traz
referências góticas em suas figuras lânguidas e posição das mãos, mas junto a
Giotto (1267-1337/Itália) formam dois dos artistas anteriores ao período e que
já indicavam o que estava por vir, sendo que na obra de Giotto já ocorre um
perfeito equilíbrio da distribuição das iluminadas figuras e entre os planos da
imagem as fazendo saltar da tela. Lembremos que as figuras anteriores, no
Bizantino, mesmo voltadas e a mirar seriamente o observador, estavam
sempre achatadas e pertencentes ao plano do quadro. Tal preposição volta a
ocorrer nas telas de alguns artistas do romântico e que vermos mais ao fim
desta aula.

Figura 4 – A Lamentação, de Giotto di Bondone

Créditos: Mirages.NL/Shutterstock.

A perspectiva permite então ao artista renascentista compor paisagens


em uma dimensão ficcional infinita até a linha do horizonte e sendo esses
novos espaços ricamente detalhados em desenhos e situações, como se novos

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mundos se abrissem no quadro; podemos ver isso na obra de Mantegna (1431-
1506) abaixo:

Figura 5 – Adoração dos Pastores, de Andrea Mantegna

Créditos: Everett – Art/Shutterstock.

Com essa nova forma de pensar dos humanistas, as figuras surgem na


tela, absortas em seus próprios universos. Mesmo em cenas de grupos é
possível perceber a experiência individual do retratado. Recordemos que, como
no exemplo das Colunas de Trajano, as figuras dividem os mesmos objetivos,
nesse caso as conquistas do Império, e suas feições e contornos nos remetem
a isso.
No Renascimento o artista tem a liberdade para contar a história e para
imaginar. Os temas pintados se expandem, mitos gregos, episódios do
cotidiano misturados a eventos religiosos, festividades e cenas camponesas,
como nas pinturas do holandês Pieter Brueghel (1525-1569), O Velho.

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Figura 6 – The Harvester (Os Ceifeiros), de Pieter Brueghel

Créditos: Everett – Art/Shutterstock.

Outro artifício da arte pictórica renascentista é o contraste acentuado


entre as áreas iluminadas e as escuras, o que destaca as figuras sustentando o
direcionamento do olhar na varredura visual, permitindo ainda sentir a
atmosfera que as envolvem, como na obra Adão e Eva, de Palma Vecchio
(1480-1528).

Figura 7 – Adão e Eva, de Palma Vecchio (reprodução de enciclopédia


ilustrada)

Créditos: Oleg Golovnev/Shutterstock.

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Piero Della Francesca (1415-1492) explora tal artifício na obra O Sonho
de Constantino, que quase podemos sentir o cansaço dos guardas que zelam o
sono do monarca (Gombrich, 1981). Della Francesca é também reconhecido
por esquemas geométricos em composições e que comparam a relação entre a
forma quadrada e esférica para a face do homem e da mulher respectivamente,
como no duplo retrato de Battista Sforza e Federico de Montefeltro na obra
Duque e Duquesa de Urbino, e que séculos mais tarde seriam questionados no
cubismo (Proença, 2005).
Quanto às composições pictóricas, o artista da Renascença preocupa-se
desde o início com o seu equilíbrio e com a disposição das figuras e dos
elementos na cena (nem sempre com sucesso), como visto nos esquemas em
triângulo nos quadros de Masaccio e Mantegna e na linearidade de Botticelli
(1445-1510) no Nascimento da Vênus, e na Última Ceia, de Leonardo da Vinci
(1452-1519 – Cinquecento). Na obra é nítida a preocupação em harmonizar as
partes ao todo, o dilema moral de cada indivíduo e sua argumentação no grupo
em que dialoga e que se arranja em novas unidades ao redor da mesa com a
figura central do Cristo isolado.

Figura 8 – Última Ceia, de Leonardo da Vinci

Créditos: Prakichtreetasayuth/Shutterstock.

Da Vinci, contudo, não foi um artista de produção numerosa, mas que


conseguia transitar por diferentes campos, como engenharia, anatomia e
biônica. Outro artifício marcante do pintor foi o emprego da técnica do sfumato
e que suaviza as gradações tonais, não existindo, portanto, uma linha que

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separa um tom de outro. Isso foi uma contribuição estimável na representação
dos volumes e no maior realismo das figuras, como na A Gioconda (Gombrich,
1981). Contudo, foi o jovem arquiteto e pintor Raffaello Sanzio (1483-1520)
quem explorou a técnica de forma viva e graciosa. As figuras de Rafael são
puras, “rechonchudas” e com contornos quase imperceptíveis e seu colorido
único. A simplicidade de sua obra é considerada como o alcance máximo do
ideal de beleza da Renascença (Neoplatonismo), sendo também a que mais se
aproximou da antiguidade clássica (Proença, 2005).

Figura 9 – A Escola de Atenas, de Raffaello Sanzio

Créditos: Serato/Shutterstock.

O enfoque com que estamos lidando neste primeiro Tema permeia a


Renascença italiana, mas muito foi produzido fora da Itália (norte e países
baixos) por artistas como Albrecht Dürer (1471-1528) e Hieronymus Bosch
(1450-1516), ambos também gravadores. Pensemos que a Alemanha foi
importante no aprimoramento das técnicas de artes gráficas no século XV e
que levou a produção impressa de livros, e não mais pelos copistas medievais
(Janson, 1996).
Na escultura enfatiza-se, além jovialidade e movimento nas estátuas de
Donatello (1386-1466), o David do pintor, arquiteto e escultor Michelangelo
(1475-1564). Michelangelo foi também responsável pelas famosas pinturas no

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teto da Capela Sistina e teve importância ativa na Contrarreforma e que
novamente vem a interferir na arte durante os séculos XV, XVI e XVII.

Figura 10 – Escultura em mármore David, de Michelangelo

Créditos: Muratart/Shutterstock.

É possível hoje encontrar número considerável de produções para TV e


cinema sobre a vida e produção desses grandes mestres renascentistas, o que
pode ajudá-lo(a) a conhecer melhor sua vida e obras.

TEMA 2 – A ARTE BARROCA

Antes de introduzirmos esta “arte do espetáculo” atribuída ao estilo


barroco, retomemos uma das tendências ocorridas no período que a intercala –
em quase 75 anos – com o renascimento a fim de compreender as transições e
a “crise” que começa a ocorrer nas artes.
O Maneirismo talvez seja a principal dessas tendências e foi
inicialmente interpretado como uma tentativa artificial e “forçada” de imitação
do estilo dos importantes artistas renascentistas, ou o “pintar à maneira de”
(Gombrich, 1981; Janson, 1996). Para Rédies e Castela (2010), o Maneirismo

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foi uma tentativa consciente ao antinaturalismo e que se contrapunha a
mímesis da natureza, optando o artista por buscar referências no próprio
conteúdo da arte (nesse caso na obra de outro) do que na realidade “genuína
que o cerca”, promulgando que arte não deva ser a imitação do real e sim tudo
aquilo que ele não é.
Tal tendência questiona os princípios renascentistas na busca da beleza
somente no que foi produzido pelos antigos e para as autoras, se diferenciava
ao aspecto sensorial do Barroco, sendo intelectualizado e frio. Um dos artistas
icônicos desta tendência é o escultor e ourives Benvenuto Cellini (1500-1571) e
seu saleiro de mesa feito para o rei da França Francisco I. Para Gombrich
(1981), as criações de Cellini refletem a busca irrequieta dos artistas do
período para criar algo diferente e mais inusitado do que o alcançado pelos
mestres do período anterior. Outros nomes do Maneirismo e que valem a
busca aprofundada de suas obras são Parmigianino (1503-1540) e o escultor
Giovanni da Bologna (1529-1608).

Figura 11 – Reprodução em gravura do original saleiro em ouro de Cellini

Créditos: Igorgolovniov/Shutterstock.

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Etimologicamente, o termo Barroco, ou barrueco (do espanhol), refere-
se a certo tipo de lapidação de pérola irregular (Merlo, 2000) e era empregado
por críticos contrários ao costume de certos arquitetos do século XVI de
combinar, ao purismo clássico greco-romano, novas formas e adornos e que
tornavam as construções “absurdas e grotescas”, como obras de mau gosto.

Figura 12 – Igreja de Jesus, em Roma, de arquitetura Barroca

Créditos: Stefano_Valeri/Shutterstock.

Pensemos neste ponto que existiam, e ainda existem, inúmeras formas


de arte além das denominadas Artes Plásticas (ou Belas Artes) e que aqui
temos estudado. Essas artes nem sempre se desenvolveram de maneira
equilibrada entre elas e até mesmo com outras categorias de arte, e para isto é
só pensar na pintura ante a escultura grega e lembrar da autoridade grega na
literatura, teatro e na poesia, mesmo antes do arcaico. A mesma situação
ocorre no Barroco, que teve na música profana e em muitas óperas grandes
inovações nas composições. Nesse período a música e suas apresentações se
tornaram o frenesi que conhecemos hoje, tendo nomes como Bach e
Monteverdi (Montanari, 1993). A música barroca utiliza de menos argumentos
religiosos do que visto em sua pintura, mas o estilo foi sim muito bem
direcionado para a manutenção dos dogmas da Igreja nas cerimônias
religiosas e arquitetura na Contrarreforma.

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Ainda assim, nas artes plásticas, seria demasiado ingênuo dizer que a
pintura barroca absorvia somente temas religiosos, considerando que o estilo
se desenvolveu muito bem no norte protestante e entre a realeza que estava a
se opor ao poder do clero católico (Janson, 1996). Para Almeida (2008, p. 46),
o Barroco “reconcilia o antropocentrismo renascentista com o teocentrismo
medieval [...]. Com linhas diagonais, a assimetria, o predomínio da imaginação
sobre a lógica e o clima de imprevisibilidade e tensão” e como o estilo refletia o
homem do século XVII suas “angústias e incertezas” o estilo estava envolto em
dicotomias como “céu e terra, pecado e salvação, mística e sensualidade”
(Almeida, 2008, p. 47).
Avante do tema presente na pintura barroca, a propriedade luminosa é
uma de suas principais características e que amplia a dramaticidade inquieta, e
que nos remete a algo que está fora da cena, não estando representado nem
mesmo nos espelhos, salvo na “estupenda”, obra As Meninas, de Diego
Velázquez (1599-1660) no Museu do Prado em Madrid. Dentre outros artistas
do Barroco exaltam-se nomes como Caravaggio (1571-1617), Tintoretto (1518-
1594), Rubens (1577-1640), El Greco (1541-1614), Rembrandt (1606-1669),
Hans Holbein (1498-1543) e Vermeer Van Delft (1632-1675).

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Figura 13 – O Chamado de São Mateus, de Caravaggio

Créditos: Anna Pakutina/Shutterstock.

É nítida a mágica obtida pelo direcionamento da luz no quadro de


Caravaggio evidenciando a mão do Cristo (o chamado) e a distinção entre um
grupo rico e que conta moedas (Mateus coletor de impostos) doutro simples
nos traje que adentra à taverna. Além da luz direcionada, e do contraste
acentuado das áreas claras e escuras, tem-se no realismo a não idealização de
um tipo único de beleza. Vemos também evidentes pinceladas, fortes e
visíveis, mesmo em meio ao natural ‘esfumaçado’ da pintura renascentista
como no Autorretrato como o Apóstolo Paulo, de Rembrandt.

Figura 14 – Autorretrato do pintor holandês Rembrandt

Créditos: Everett – Art/Shutterstock.


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Na escultura, escolhemos aqui tratar das obras de Gian Lorenzo Bernini
(1598-1680), responsável pela Colunata da Praça de São Pedro e A Fonte dos
Quatro Rios na Piazza Navona, ambas em Roma. Bernini quase que domina a
escultura barroca na Itália e é conhecido por recomendar aos jovens artistas
estudar preferencialmente à natureza – tal postura do escultor é criticada por
Winckelmann no Academicismo – e sua escultura busca sempre a expressão e
o movimento, brincando com a luza tal faz a pintura e repletas de “violentas
paixões e êxtase” (Merlo, 2000). Para Janson (1996), o David, de Bernini (e
muito diferente do de Michelangelo) não é uma concepção autônoma e sim a
metade de duas, pois vemos, de forma implícita, o Golias, a quem David
destina o arremesso cheio de energia e fúria e que está prestes a fazer;
portanto, temos também o aspecto temporal na escultura.

Figura 15 – Escultura em mármore, o David, de Bernini

Créditos: Wjarek/Shutterstock.

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TEMA 3 – A ARTE COLONIAL BRASILEIRA

O Barroco não se difundiu de forma igual ou regular pela Europa, sendo


introduzido nas Américas (central e sul) pelos colonizadores espanhóis e
portugueses (Península Ibérica contrarreformista) e tendo forte influência às
características próprias dessas culturas, por exemplo, os azulejos azuis
portugueses. No Brasil, o Barroco, também conhecido como Barroco Colonial,
desenvolveu-se entre os séculos XVIII e XIX e é considerado como a primeira
expressão artística do país, principalmente na arquitetura.
Por se tratar de uma colônia rica devido ao plantio e à venda do açúcar e
ao descobrimento das minas de ouro, boa parcela da população elevou-se
economicamente, fortalecendo uma consciência nacional e que fez com que o
estilo, em nosso território, se apresentasse por imponentes igrejas que
recebiam camadas do metal em seu ornamento e talhas, nas regiões mais
ricas do país, ficando as menos desenvolvidas, como São Paulo, com
construções mais modestas e características do estilo colonial (Almeida, 2008).

Figuras 16 e 17 – Exterior e Interior da Igreja de São Francisco de Assis em


Salvador

Créditos: Bonandbon / Cassiohabib/Shutterstock.

O Barroco no Brasil desenvolveu-se enquanto a Europa já tendia a uma


nova retomada aos clássicos, e na mistura de culturas e na autonomia própria
da colônia acabou por influenciar em variados tipos de construção além das
igrejas, como os edifícios públicos, civis e praças principalmente no Nordeste
(Bahia, Paraíba e Pernambuco) e Minas Gerais (sudeste). Com o ciclo do ouro
o Barroco chegou ao Rio de Janeiro, cidade que escoava pelo porto os
minérios. Essa dinâmica levou ao crescimento da cidade, do urbanismo e das
construções civis, como o Aqueduto da Carioca (Proença, 2005).

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Figura 18 – Aqueduto da Carioca, no Rio de Janeiro

Créditos: Lazyllama/Shutterstock.

Na escultura, nomes como Mestre Valentim (1744-1813) e Aleijadinho


(1730-1814) – e suas peças em pedra-sabão – apresentam característicos do
estilo e da época, com especial ressalva ao belo conjunto barroco composto de
arquitetura, escultura e textos com os 12 profetas esculpidos em tamanho
natural. Historiadores dizem que Aleijadinho não as fez sozinho, pelo avançar
da idade e pelas condições precárias de saúde. Aleijadinho é considerado um
artista brasileiro e com uma expressão que conjuga as características originais
e mestiça (indígena e negra) à europeia, resultando numa escultura robusta
mais delicada e com feições e traços típicos não vistos antes na arte (Merlo,
2000; Mussi, 2007). Esse nacionalismo “de origem” é algo que surgirá
realmente no Romantismo, principalmente na literatura, mas essa fusão entre
as diversas categorias de arte (arquitetura, pintura, texto, entre outras) e com o
emprego da narrativa nas plásticas é um dos pontos fundamentais e
determinantes durante os séculos XVII e XVIII (Janson, 1996).

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Figuras 19, 20 e 21 – Três estátuas do conjunto os Doze Profetas, de
Aleijadinho, no Santuário de Bom Jesus do Matosinho, em Congonhas do
Campo. Ao fundo, uma igreja barroca

Créditos: Lydianne Moreira/ Breno Saturnino/Shutterstock.

TEMA 4 – O ROCOCÓ

Rococó (do original em francês, Rocaille) refere-se a um ornamento em


forma de concha, típico do período, e aplicado em entalhes dos móveis de Luiz
XV (Merlo, 2000). O Rococó abrange a fase do Barroco entre 1710 e 1780 na
França e quando os ornamentos são exaltados na arte e bem aceitos por quem
a consumia, os ricos e aristocratas de uma França “centralizadora e
autoritária”. O Rococó vem a se fundir bem no sul da Alemanha e na Áustria
(Janson, 1996), e na arquitetura temos no Palácio de Versalhes o exemplo
característico do período com edifícios e fachadas em estilo barroco – ou
seguindo a renascença Italiana – e interiores luminosos e ricamente decorados
em cores claras e suaves, frisos emoldurando pinturas e espelhos e
ornamentos curvilíneos com guirlandas de folhas e padrões florais (Proença,
2005).

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Figura 22 – Interior do Palácio de Versalhes – Subúrbio de Paris

Créditos: Joon_T/Shutterstock.

O Rococó pode-se dizer, por sua concepção de Interiores, se tratar de


uma arte com tendência decorativa e com escultura caracterizada por
pequenas peças (estatuetas) em porcelana – o material foi inventado na época
pelos alemães Tischirnhaus e Boettger (Proença, 2005).

Figura 23 – Coleção de Porcelanas no Palácio de Zwinger, em Dresden

Créditos: Buffy1982/Shutterstock.

Na pintura é perceptível a mudança frente ao Barroco quanto à escolha


da palheta de cores, sem os característicos contrastes com tons escuros e
sóbrios, tem-se nas telas as cores rosa, amarelo e verde, suavizadas na
técnica do pastel e com temas que retratam, para alguns historiadores, uma
vida fútil. O pintor e gravador inglês William Hogarth (1697-1764) alega, por
exemplo, que seus quadros abordam “temas morais modernos” representados
por “atores mudos” como “Na Orgia” (da série denominada The rake’s progress

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ou A vida de um libertino) e a crítica social de uma sociedade rica e seus
costumes (Janson, 1996). Outros nomes na pintura do estilo foram Antoine
Watteau (1684-1721), Jean-Honoré Fragonart (1732-1803) e Nicolas Lancret
(1690-1743) e que marcam a pintura do período como muito mais sensível e
voltada às emoções (Merlo, 2000).

Figura 24 – La Camargo Dancing, de Nicolas Lancret

Créditos: Everett – Art/Shutterstock.

Saiba mais
Outra forma acessível a nós de contemplar o estilo de vida e
características do Rococó é na película Maria Antonieta (2006), de Sofia
Coppola (1971-) e o Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) de Alessandra
Urmann Garbrecht (2017). Disponível em:
<http://repositorio.upf.br/bitstream/riupf/1301/1/PF2017Alessandra%20Umann
%20Garbrecht.pdf>. Acesso em: 26 mar. 2020.

TEMA 5 – NEOCLASSICISMO E ROMANTISMO

Para o historiador da arte Ernst Gombrich (1981), do Renascimento até


o fim do século XVIII, a arte apresentou modas e técnicas diversas, mas não
deixando de ser dispensável e a serviço do entretenimento, pela beleza, dos
seletos (pessoas ricas e “cultas”) interessados. Essa mudança de paradigma
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quanto à arte vem acompanhar as modificações na maneira de o homem
pensar o Estado, a religião e a vida, preconizadas pelo Iluminismo e a Era da
Razão. Com isso, o artista, em crise, passa a buscar novos estilos e assuntos e
em um período quando as tradicionais escolas renascentistas ampliam o status
da arte – agora como uma filosofia – tornando-se verdadeiras Academias
(Paris e Londres) para a aprendizagem das técnicas da antiguidade. Por sua
vez, essa produção que copiava – ou imitava – a arte clássica ficava em partes
sem destino, pois era mais interessante possuir o original ou uma cópia do que
“apostar” em um novo artista, o que levou as escolas a realizarem exposições
anuais, eventos sociais que reuniam críticos, novos compradores e um “público
de arte”.
Com a produção destinada às exposições, o artista sente-se livre a
questionar as tradições e a se libertar das dependências das antigas
convenções buscando despertar novos interesses e atenção a sua obra. Os
temas do período são sobre feitos heroicos, máquinas, embarcações
paisagens e artistas como Jacque Louis David (1748-1825), Francisco de Goya
(1746-1828), Jean-Auguste Dominique Ingres (1780-1867), Eugène Delacroix
(1798-1863), Camille Corot (1796-1875), Benjamin West (1738-1820) e Willian
Turner (1775-1851).

Figura 25 – Veneza: O Dogana e o San Giorgio Maggiore, de Willian Turner

Créditos: Everett – Art/Shutterstock.

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Na arquitetura as linhas voltam à retidão e com o emprego de regras
simples, muito próximas aos já vistos nos templos gregos e na arquitetura
renascentista, o Panteão Nacional de Paris, construído em 1758, é um exemplo
da arquitetura neoclássica.
Para Janson (1996), o Iluminismo traz, em contraponto à razão e ordem
do classicismo, o sentimentalismo – principalmente na literatura inglesa – e o
Romantismo. Ambos, Classicismo e Romantismo se voltam à natureza, o
primeiro como princípio original e o segundo como algo mutante e selvagem. O
autor argumenta que o homem Romântico, imbuído de “um modo natural” no
ser, pode dar liberdade aos seus impulsos. Porém, a verdade estaria somente
na atitude, no gesto romântico e a sua representação em arte necessitaria de
consciência e disciplina (características do classicismo) e que afasta o artista
do impulso primordial.

Figura 26 – Reprodução ilustrada de A Liberdade guiando o povo, de Eugène


Lacroix

Créditos: Oleg Golovnev/Shutterstock.

Para que nesse distanciamento o artista não perca o gesto, ele precisa
de um estilo, mas como escolher um estilo em épocas em que valia opor-se ao
vigente? Teremos então, no período romântico, uma profusão de estilos e
temas muito característicos como o apreço pelo exótico e o indianismo, a
busca da pureza e inocência, a espontaneidade e a nostalgia e “o culto ao
gênio original” (Jason, 1996; Rosenfeld; Guinsburg, 1985).

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Figura 27 – Reprodução ilustrada de Três de Maio de 1808 em Madrid, de
Francisco de Goya

Créditos: Neveshkin Nikolay/Shutterstock.

No Brasil o período é marcado pela transferência da família real


portuguesa no Brasil, com importantes avanços na vida cultural a partir de
1808, com as bibliotecas e impressões de livros os primeiros jornais e escolas
superiores. A Missão Artística Francesa de 1816, com os artistas Jean-Baptiste
Debret (1768-1848) e Nicolas-Antoine Taunay (1755-1830), funda a Academia
Brasileira de Belas Artes, na cidade do Rio de Janeiro (Candido, 2002;
Proença, 2005).

TROCANDO IDEIAS

Neste Trocando Ideias vamos questionar um pouco nosso conhecimento


quanto aos “termos” na arte. Propomos então um fórum online, onde vamos
conversar e esclarecer as dúvidas, caso ainda existam, quanto ao real sentido
e relação na arte. Você deverá então escolher três diferentes terminologias
artísticas, complementando o que elas significam para você e como se dão na
prática, lembrando que somente nesta aula vimos: “objeto artístico”, “estilo” e
“classicismo”; e nas aulas anteriores vimos: “fruição artística”, “mímesis”, entre
outras. Você também pode buscar termos em outros materiais e trazer para os
nossos estudos.

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NA PRÁTICA

Vamos neste exercício testar o nosso olhar e quantas são as


características que identificamos numa obra e, ainda mais, quanto
conseguimos associá-la a um pintor ou período. Mas só valem as estudadas
nesta aula. Para isso você deverá:

1. Escolher três diferentes objetos artísticos (pintura, escultura e


arquitetura, como sugestão).
2. Identificar, pelo olhar, quais são as características empregadas. Tipos de
linha, simetria, perspectiva, cores e adornos, por exemplo.
3. Buscar definir (ou pesquisar se necessário), o estilo e a região onde foi
produzida, trazendo ao fim o nome do artista.

Boa sorte!

FINALIZANDO

Nesta aula nós falamos:

• A respeito de evitarmos a generalização dos estilos artísticos, como uma


prévia do que nos traz a Arte Moderna.
• Sobre os períodos Clássico e Barroco, ou razão versus emoção.
• Que os artistas na Renascença alcançaram na pintura o que os gregos
já haviam alcançado na escultura.
• Que a liberdade do homem a partir do Renascimento e da Era da Razão
influencia diretamente nos temas da arte.
• Que as categorias artistas passam a se fundir, gerando novas narrativas
e aberturas à arte.

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REFERÊNCIAS

ALMEIDA, R. G. de. As Artes Plásticas no Período Barroco e no Modernismo e


a Ética da Psicanálise. Psicanálise & Barroco em Revista. Ano 4, n. 8, 2008.

CANDIDO, A. O Romantismo no Brasil. Humanitas FFLCH, São Paulo, 2002.

COLI, J. O que é arte. São Paulo: Brasiliense, 1995.

GOMBRICH, E. H. A História da Arte. 2. ed. Rio de Janeiro: Zahar Editores,


1981.

JANSON, H. W. Introdução à História da Arte. 2. ed. São Paulo: Martins


Fontes, 1996.

MERLO, C. A história da arte: da antiguidade ao século XX. Porto, Portugal:


Porto Editora, 2000.

MONTANARI, V. História da música: da idade da pedra à idade do rock. 2.


ed. São Paulo: Ática, 1993.

MUSSI, L. I. O teatro barroco de O Aleijadinho. Linguagens – Revista de


Letras, Artes e Comunicação, v. 1, n. 1 p. 34-42, Blumenau, jan./abr., 2007.

PROENÇA, G. História da Arte. São Paulo: Ática, 2005.

RÉDIES, A. B; CASTELA, G. da S. Delimitação estética e histórica do barroco.


In: Anais do Seminário de Estudos da Linguagem, IV, Cascavel, Unioste,
2010.

ROSENFELD, A.; GUINSBURG, J. Romantismo e Classicismo In:


GUINSBURG, J. (Org.). O Romantismo. São Paulo: Perspectiva, 1985.

SANTOS, M. M. A teoria da perspectiva fundamentada pela geometria


projetiva. In: VII International Conference on Graphics Engineering for Arts
and Design e XVIII Simpósio Nacional de Geometria Descritiva e Desenho
Técnico, Curitiba, UFPR, 2007.

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