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Caro aluno

Ao elaborar o seu material inovador, completo e moderno, o Hexag considerou como principal diferencial sua exclu-
siva metodologia em período integral, com aulas e Estudo Orientado (E.O.), e seu plantão de dúvidas personalizado.
O material didático é composto por 6 cadernos de aula e 107 livros, totalizando uma coleção com 113 exemplares.
O conteúdo dos livros é organizado por aulas temáticas. Cada assunto contém uma rica teoria que contempla, de
forma objetiva e transversal, as reais necessidades dos alunos, dispensando qualquer tipo de material alternativo
complementar. Para melhorar a aprendizagem, as aulas possuem seções específicas com determinadas finalidades.
A seguir, apresentamos cada seção:

INCIDÊNCIA DO TEMA VIVENCIANDO


NAS PRINCIPAIS PROVAS
Um dos grandes problemas do conhecimento acadêmico é o seu
De forma simples, resumida e dinâmica, essa seção foi desenvol- distanciamento da realidade cotidiana, o que dificulta a compreen-
vida para sinalizar os assuntos mais abordados no Enem e nos são de determinados conceitos e impede o aprofundamento nos
principais vestibulares voltados para o curso de Medicina em todo temas para além da superficial memorização de fórmulas ou regras.
o território nacional. Para evitar bloqueios na aprendizagem dos conteúdos, foi desenvol-
vida a seção “Vivenciando“. Como o próprio nome já aponta, há
uma preocupação em levar aos nossos alunos a clareza das relações
entre aquilo que eles aprendem e aquilo com que eles têm contato
em seu dia a dia.
TEORIA
Todo o desenvolvimento dos conteúdos teóricos de cada coleção
tem como principal objetivo apoiar o aluno na resolução das ques-
tões propostas. Os textos dos livros são de fácil compreensão, com-
pletos e organizados. Além disso, contam com imagens ilustrativas
que complementam as explicações dadas em sala de aula. Qua- APLICAÇÃO DO CONTEÚDO
dros, mapas e organogramas, em cores nítidas, também são usados
e compõem um conjunto abrangente de informações para o aluno Essa seção foi desenvolvida com foco nas disciplinas que fazem
que vai se dedicar à rotina intensa de estudos. parte das Ciências da Natureza e da Matemática. Nos compila-
dos, deparamos-nos com modelos de exercícios resolvidos e co-
mentados, fazendo com que aquilo que pareça abstrato e de difí-
cil compreensão torne-se mais acessível e de bom entendimento
aos olhos do aluno. Por meio dessas resoluções, é possível rever,
a qualquer momento, as explicações dadas em sala de aula.

MULTiMÍDiA
No decorrer das teorias apresentadas, oferecemos uma cuidado-
sa seleção de conteúdos multimídia para complementar o reper-
tório do aluno, apresentada em boxes para facilitar a compreen-
ÁREAS DE
são, com indicação de vídeos, sites, filmes, músicas, livros, etc.
Tudo isso é encontrado em subcategorias que facilitam o apro- CONHECiMENTO DO ENEM
fundamento nos temas estudados – há obras de arte, poemas, Sabendo que o Enem tem o objetivo de avaliar o desempenho ao
imagens, artigos e até sugestões de aplicativos que facilitam os fim da escolaridade básica, organizamos essa seção para que o
estudos, com conteúdos essenciais para ampliar as habilidades aluno conheça as diversas habilidades e competências abordadas
de análise e reflexão crítica, em uma seleção realizada com finos na prova. Os livros da “Coleção Vestibulares de Medicina” contêm,
critérios para apurar ainda mais o conhecimento do nosso aluno. a cada aula, algumas dessas habilidades. No compilado “Áreas de
Conhecimento do Enem” há modelos de exercícios que não são
apenas resolvidos, mas também analisados de maneira expositiva
e descritos passo a passo à luz das habilidades estudadas no dia.
Esse recurso constrói para o estudante um roteiro para ajudá-lo a
apurar as questões na prática, a identificá-las na prova e a resol-
CONEXÃO ENTRE DiSCiPLiNAS vê-las com tranquilidade.

Atento às constantes mudanças dos grandes vestibulares, é ela-


borada, a cada aula e sempre que possível, uma seção que trata
de interdisciplinaridade. As questões dos vestibulares atuais não
exigem mais dos candidatos apenas o puro conhecimento dos
conteúdos de cada área, de cada disciplina. DiAGRAMA DE iDEiAS
Atualmente há muitas perguntas interdisciplinares que abran-
Cada pessoa tem sua própria forma de aprendizado. Por isso, cria-
gem conteúdos de diferentes áreas em uma mesma questão,
mos para os nossos alunos o máximo de recursos para orientá-los em
como Biologia e Química, História e Geografia, Biologia e Mate-
suas trajetórias. Um deles é o ”Diagrama de Ideias”, para aqueles
mática, entre outras. Nesse espaço, o aluno inicia o contato com
que aprendem visualmente os conteúdos e processos por meio de
essa realidade por meio de explicações que relacionam a aula do
esquemas cognitivos, mapas mentais e fluxogramas.
dia com aulas de outras disciplinas e conteúdos de outros livros,
Além disso, esse compilado é um resumo de todo o conteúdo da
sempre utilizando temas da atualidade. Assim, o aluno consegue
aula. Por meio dele, pode-se fazer uma rápida consulta aos princi-
entender que cada disciplina não existe de forma isolada, mas faz
pais conteúdos ensinados no dia, o que facilita a organização dos
parte de uma grande engrenagem no mundo em que ele vive.
estudos e até a resolução dos exercícios.

HERLAN FELLiNi
© Hexag Sistema de Ensino, 2018
Direitos desta edição: Hexag Sistema de Ensino, São Paulo, 2021
Todos os direitos reservados.

Autores
Eduardo Antônio Dimas
Tiago Rozante

Diretor-geral
Herlan Fellini

Diretor editorial
Pedro Tadeu Vader Batista

Coordenado-geral
Raphael de Souza Motta

Responsabilidade editorial, programação visual, revisão e pesquisa iconográfica


Hexag Sistema de Ensino

Editoração eletrônica
Felipe Lopes Santos
Leticia de Brito Ferreira
Matheus Franco da Silveira

Projeto gráfico e capa


Raphael de Souza Motta

Imagens
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ISBN: 978-65-88825-82-2

Todas as citações de textos contidas neste livro didático estão de acordo com a legis-
lação, tendo por fim único e exclusivo o ensino. Caso exista algum texto a respeito do
qual seja necessária a inclusão de informação adicional, ficamos à disposição para
o contato pertinente. Do mesmo modo, fizemos todos os esforços para identificar e
localizar os titulares dos direitos sobre as imagens publicadas e estamos à disposição
para suprir eventual omissão de crédito em futuras edições.
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SUMÁRIO

HISTÓRIA GERAL
Aulas 35 e 36: Unificações tardias: Itália e Alemanha 6
Aula fundamento: EUA no século XIX 13
Aulas 37 e 38: Imperialismo e neocolonialismo 21
Aulas 39 e 40: Primeira Guerra Mundial 26
Aulas 41 e 42: Revolução Russa (1917) 37
Aulas 43 e 44: Crise de 1929 e fascismo italiano 47

HISTÓRIA DO BRASIL
Aulas 35 e 36: Estado Novo (1937-1945) 62
Aulas 37 e 38: República liberal ou populista: governo Dutra e segundo governo Vargas 72
Aulas 39 e 40: República liberal ou populista: governos Café Filho e JK 84
Aulas 41 e 42: República liberal ou populista: governos Jânio Quadros e João Goulart 94
Aulas 43 e 44: Ditadura militar: governos Castelo Branco e Costa e Silva 106
INCIDÊNCIA DO TEMA NAS PRINCIPAIS PROVAS

Aborda as principais transformações Questões sobre Revolução Francesa, Congresso de


sociológicas e materiais da Segunda Viena, Segunda Revolução Industrial e as ideologias
do século XIX têm sido abordadas com enfoque nas
Revolução Industrial, exigindo capacidade de
estruturas sociais, econômicas e culturais.
interpretação textual aliada a conhecimentos
pouco aprofundados sobre o assunto. É
aconselhável manter atenção aos
temas da atualidade.

Nos dois últimos anos, as interações dos aspec- Não são abordadas diretamente questões de As análises das estruturas sociais, econômicas e cul-
tos culturais, econômicos e sociais associados à História, mas há um grau de interdisciplinaridade turais da Revolução Francesa, Congresso de Viena,
Revolução Francesa, Segunda Revolução Indus- que permite o uso dos conhecimentos históricos Segunda Revolução Industrial e das ideologias do
trial e ideologias do século XIX costumam ser para auxílio da resolução das questões e escrita século XIX costumam ser temas apresentados em
abordadas com a utilização de textos longos. da redação. combinação com textos e principalmente imagens.

Prova desafiadora nos últimos vestibulares, com pre- Os últimos vestibulares apresentaram uma Os últimos vestibulares abordaram as temáticas Percebe-se que o vestibular não tem contemplado
sença dos temas presentes neste livro, a abordagem tendência em abranger temas relacionados à Revolução Francesa, Era Napoleônica e Congresso com frequência os temas abordados neste livro.
prioriza uma integração entre Medicina e História, História do Brasil. Entretanto, o caráter da prova de Viena, Segunda Revolução Industrial e ideolo- Entretanto, o caráter da prova exige um domínio
principalmente voltada para temas como vacinas e exige um domínio amplo de interpretação textual gias do século XIX, por meio de uma correlação amplo de interpretação textual e estabelecimento de
disseminação de doenças. e estabelecimento de conexões entre diferentes entre os aspectos sociais, econômicos e políticos. conexões entre diferentes áreas do conhecimento.
áreas do conhecimento.

UFMG

Aborda as temáticas Revolução Francesa e ideolo- A banca do vestibular privilegia que o candi- Não são contemplados diretamente temas de
gias do século XIX, por meio das correlações entre dato realize análises e interpretações sobre História; entretanto, há um grau de interdiscipli-
os aspectos sociais, políticos, econômicos e culturais. diferentes processos históricos e perceba suas naridade que permite o uso dos conhecimentos
Utiliza textos introdutórios, charges e imagens em continuidades e rupturas. Assim, utiliza textos in- históricos para auxílio da resolução das questões e
suas questões. trodutórios e imagens para elaborar as questões escrita da redação.
sobre as temáticas estudadas.

O vestibular solicita análises de estruturas Não há uma divisão clara entre História e O vestibular elabora questões de múltipla
históricas em suas questões, que propõem Geografia, que são abordadas como Estudos escolha direcionadas aos candidatos que pre-
uma reflexão sobre as temáticas elencadas Sociais; portanto, não existem definições tendem uma vaga nos cursos de Enfermagem,
estabelecendo relações com o mundo específicas de tema, mas sim um grau elevado Biomedicina e Medicina. Há uma tendência em
contemporâneo. Utiliza trechos de textos e de interdisciplinaridade. Há uma tendência em abordar temas contemporâneos.
imagens, de forma mesclada, em abordar temas contemporâneos.
suas questões.
HISTÓRIA GERAL

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AULAS 35 E 36
Limites internacionais
Cidades
Reino do Piemonte-
-Sardenha
Ex-domínio do Império
Austríaco
Territórios cedidos
à França (1860)
Ex-domínio da dinastia
francesa dos Bourbon
Ex-domínio do papa

UNIFICAÇÕES TARDIAS: Territórios pretendidos pela


Itália e só anexados em 1919

ITÁLIA E ALEMANHA Localização no mundo

O L

1 : 16 500 000
165 330 km
1, 2, 3, 4, 5 e 6
0
COMPETÊNCIAS: Escala aproximada
Projeção Ortográfica

1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 10,
HABILIDADES: 11, 13, 14, 15, 16, 19, 20,
21, 22, 27 e 29

1. Introdução multimídia: vídeo


No século XIX, a burguesia lutou contra as forças reacioná-
Fonte: Youtube
rias do Antigo Regime para assumir o poder em revoluções
liberais e nacionalistas, principalmente em 1830 e 1848. A A Unificação da Itália
Áustria buscou disseminar a fragmentação política dessas
duas regiões (Itália e Alemanha), antes que a família real dos
Habsburgos perdesse o seu poder, o que de fato aconteceu 2.2. Fatores da unificação
no final do século XIX.
A ruptura do equilíbrio europeu com a unificação da Itália e
da Alemanha, e com as lutas pela redivisão do mercado mun-
dial, iria desembocar em 1914, na Primeira Guerra Mundial.

2. Unificação da Itália
2.1. Antecedentes
A Itália, sede do antigo Império Romano do Ocidente,
Conde Camilo Cavour
fora atacada pelos germanos ou bárbaros, que instituí-
ram na Europa ocidental os chamados reinos bárbaros. A família real do Piemonte mantinha laços estreitos com a
A Itália propriamente dita fragmentou-se politicamente, burguesia, o que a fez conscientizar-se do seu crescimento,
dividida em cidades-estados e feudos durante o período atrelado à unificação política da Península Itálica, fundamen-
medieval. Em boa parte da Idade Moderna, ela permane- tal para o desenvolvimento do capitalismo. Seriam criadas
ceu sob domínio da Espanha e da Áustria. O Congresso as condições, sob a mesma legislação, de um mesmo poder
de Viena (1815) dividiu a Itália em sete regiões: o reino político e militar, de crescimento da mão de obra, do merca-
do Piemonte-Sardenha, liderado pela dinastia de Savoia; o do consumidor e do crescimento da oferta de matéria-prima.
reino Lombardo-Veneziano, anexado ao império austríaco; O Reino do Piemonte, no norte da Península itálica, pas-
os Estados Pontifícios, sob a direção do papa, mas ligado sou por um processo de modernização que o transformou
os Habsburgos; o reino das duas Sicílias ao sul, governado no mais poderoso dos pequenos estados italianos. Mesmo
pela dinastia dos Bourbon; e três ducados, Parma, Modena após a derrota da Revolução de 1848 na Itália e da res-
e Toscana, submetidos à influência austríaca. tauração de condições próximas à política do absolutismo

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em todos os estados da península, o Piemonte conservou a Em 1848, o rei Carlos Alberto, do Piemonte-Sardenha,
monarquia constitucional como regime político. tentou pela primeira vez a unificação, declarando guerra à
Um surto de industrialização propiciou o fortalecimento da Àustria. O movimento Jovem Itália estimulava o naciona-
burguesia piemontesa, cujos interesses econômicos torna- lismo italiano reforçado pelo Risorgimento, cuja finalidade
vam necessária a unidade política do país. A burguesia de- era reviver o espírito italiano da Renascença e do Império
sejava a unificação, que garantiria a continuidade do desen- Romano. O rei foi vencido e abdicou em favor de seu filho,
volvimento interno e lhe daria possibilidades de concorrência Vitor Emanuel II.
no mercado exterior, liberando a circulação de mercadorias Embora outras rebeliões dos Estados italianos também ti-
dentro da península, favorecendo as exportações e impedin- vessem sido sufocadas, o ideal de unificação e o naciona-
do as importações dos produtos concorrentes. lismo continuaram vivos.
Com esse objetivo, nasceu no norte da atual Itália o Risor- Em 1852, a ascensão de Cavour ao posto de primeiro-mi-
gimento, movimento nacionalista liberal que assumiu um nistro, apoiado pelos partidários da unificação, estimulou
papel preponderante na luta pela unificação do país, cujo a luta pela unidade italiana. Em 1858, Cavour firmou com
líder, Camilo Benso, conde de Cavour, propunha a unifica- Napoleão III da França uma aliança franco-piemontesa, que
ção nos moldes liberais com a monarquia constitucional, o resultou na organização de um pacto militar antiaustríaco,
que agradava a burguesia piemontesa, pois isolava a pene- o que favoreceu o Piemonte para iniciar em 1859 a luta
tração das camadas populares no Estado. pela unificação italiana. Napoleão III apoiaria o Piemonte
O movimento pela unificação da Itália contava também numa luta contra a Áustria e receberia em pagamento os
com o apoio de outros líderes políticos, como Giuseppe condados da Savoia e de Nice, pertencentes ao Piemonte;
Mazzini, fundador do movimento Jovem Itália, que lutava este receberia a Lombardia-Veneza, pertencente à Áustria.
pela criação de uma República Italiana.
Baseado nesse acordo, Cavour provocou a guerra contra a
O nacionalismo desse reino, portanto, estava enraizado nas Áustria no início de 1859. Franceses e sardo-piemonteses
necessidades específicas da expansão do capitalismo, que obtiveram vitórias em Magenta e Solferino (Lombardia), mas
trilhou caminhos semelhantes aos da Prússia. a ameaça de intervenção militar da Prússia levou a França a
No sul da Itália, outra força poderosa era a dos Camisas se retirar da guerra, obrigando os piemonteses a firmar com
Vermelhas, liderada por Giuseppe Garibaldi, que defendia a a Áustria o Tratado de Zurique: a Áustria conservaria a região
criação da República com voto universal, pois acreditava que de Veneza e cederia a Lombardia ao Piemonte, que, por sua
somente a unificação poderia retirar a população humilde da vez, cederia à França as regiões de Nice e Savoia.
miséria. A unificação italiana contou com dois grupos cujos Paralelamente à guerra contra a Áustria, Garibaldi promove-
objetivos eram convergentes; divergiam, porém, no tocante ra várias insurreições de caráter nacionalista na Itália central.
à estrutura ideológica: o Risorgimento era elitista burguês e As tropas garibaldinas conquistaram os ducados de Toscana,
Garibaldi, popular e radical. Já os Estados Pontifícios eram Parma e Modena, assim como a região da Romanha perten-
contra a unificação, porque o papa perderia o poder político cente aos Estados Pontifícios. Em 1860, após a realização de
para o chefe de Estado, caso a unificação constituísse uma plebiscito, esses territórios foram incorporados ao Piemonte,
política republicana ou uma monarquia constitucional. dos quais formou-se o Reino da Alta Itália.

2.3. O processo de unificação

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube
O leopardo
Durante o conturbado processo de unificação italiana na
Sicília, o príncipe Don Fabrizio passa a simpatizar com os
ideais socialistas, mas não gosta da ideia de perder seu
prestígio e privilégios.
Giuseppe Garibaldi

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Em 1860, Garibaldi atacou o Reino das Duas Sicílias, coman- conhecido como a Questão Romana, foi resolvido so-
dando a Expedição dos Mil Camisas Vermelhas, que culminou mente em 1929 com o Tratado de Latrão, com o qual o
com a conquista de Nápoles, capital do Reino. Nessa mesma governo fascista de Benito Mussolini indenizou a Igreja
época, as tropas piemontesas ocuparam a parte oriental dos pelos prejuízos sofridos com a perda de Roma e conce-
Estados Pontifícios e estabeleceram a ligação terrestre entre dia-lhe a soberania sobre a Praça de São Pedro, oportuni-
o norte e o sul da Itália. No ano seguinte, esses territórios dade em que foi criado o atual Estado do Vaticano.
conquistados foram incorporados à Alta Itália, que formaram
A Itália concluíra tardiamente sua unificação política, já na
o Reino da Itália, do qual Vitor Emanuel II foi proclamado rei.
segunda metade do século XIX, em 1870, o que contribuiu
É interessante observar que Garibaldi recuou temporaria- muito para retardar seu desenvolvimento capitalista. O sul
mente nas suas pretensões de implantar a República, por- do país permaneceu agrário e não desenvolvido, dominado
que notou que era mais importante consolidar o nascimen- pelo latifúndio e pela aristocracia rural. O norte conseguiu
to da Itália para depois impulsionar o projeto republicano. um relativo desenvolvimento industrial, mas a falta de mer-
cados e de matérias-primas impediu que a industrialização
alcançasse grandes proporções. A Itália chegou atrasada
à corrida colonial, quando a divisão do mundo já estava
praticamente concluída e os mercados já dominados pela
Inglaterra e pela França. A impossibilidade de formar um
império colonial contribuiu para retardar ainda mais o de-
senvolvimento do capitalismo italiano.
multimídia: vídeo
Fonte: Youtube
O inocente
“O inocente“ (1976) é um filme italiano de Luchino Visconti,
baseado no romance homônimo de Gabriele d’Annunzio.

multimídia: vídeo
2.4. Consequências da Fonte: Youtube
unificação italiana Ludwig
“Ludwig“ é um filme de 1972, do diretor italiano Luchi-
no Visconti, e conta sobre a vida e a morte de Luís II da
Baviera, mais conhecido por sua admiração por Richard
Wagner e sua comissão de vários palácios na Baviera,
como Neuschwanstein e Herrenchiemsee.

3. Unificação da Alemanha
Papa Pio IX Rei Vitor Emanuel II
3.1. Antecedentes
Nascida a Itália, dois problemas preocupavam o novo Es-
No início do século XVI, quando a Europa ocidental firma-
tado: Veneza continuava pertencendo à Áustria e o não re-
va o processo de formação das monarquias nacionais, a
conhecimento do papa Pio IX, protegido por tropas france-
Alemanha ainda estava dividida em principados, feudos e
sas, da Itália como Estado obrigava os italianos a aceitarem
cidades autônomas. Foi nesse período que se levantou pela
Florença como capital.
primeira vez a possibilidade de unidade nacional. No en-
Esses problemas foram resolvidos quando a Áustria, en- tanto, nenhum grupo revolucionário da época – burguesia
fraquecida com a guerra contra a Prússia, foi obrigada em formação, campesinato e pequena nobreza – era sufi-
a ceder Veneza ao Estado italiano. O rei Vitor Emanuel cientemente forte para liderar sozinho tal intento. Como
fez de Roma a capital italiana quando a França perdeu a não se uniram, lançando-se de modo independente na
guerra contra a Prússia, em 1870, e retirou suas tropas da luta contra a nobreza, o fracasso foi inevitável. Os prínci-
“cidade eterna”. O papa manteve o não reconhecimento pes foram os grandes beneficiários dessas “revoluções” e
e enclausurou-se na basílica de São Pedro. Esse dilema, a Alemanha firmou-se como um mosaico de pequenos Es-

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tados soberanos, que tratavam de defender sua soberania De 1860 a 1870, os reflexos dessa política econômica fize-
e impedir a unidade nacional. ram-se sentir: distritos industriais e numerosos centros ur-
banos surgiram em várias regiões; a extensão das estradas
No século XVIII, quando só a Áustria constituía um Estado
de ferro passou de 2 mil km para 11 mil km; as minas de
poderoso, nasceu outro principado forte, a Prússia, que se
carvão e de ferro criaram condições para o crescimento das
fortaleceu à custa de uma série de guerras de conquistas.
indústrias siderúrgicas, metalúrgicas e mecânicas. Perceben-
do a ameaça que esse desenvolvimento representava para
seu poder, a Áustria tentou em vão fazer parte do Zollverein.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube

Confederação Germânica
Napoleão III, Bismarck e a Unificação Alemã:
Videoaula
O território germânico não estava unificado, mas sua po-
pulação mantinha forte elo cultural com as narrativas mi-
tológicas que alimentaram um militarismo nobiliárquico Esse processo de fortalecimento da Prússia culminou em
apropriado pelos junkers – aristocracia prussiana que con- 1862 com a nomeação, pelo rei Guilherme I, de Otto von
trolava a administração e o exército. Outro fato que susten- Bismarck, representante da aristocracia junker, para o
tava o orgulho dos alemães era o I Reich (Império) aliado cargo de chanceler (primeiro-ministro) da Prússia. Em-
do Sacro Império Romano-Germânico. Entretanto, os ale- bora antiliberal (partidário do regime monárquico forte),
mães foram humilhados por Napoleão, que os submeteu Bismarck era devotado à causa da unificação alemã, que
à Confederação do Reno e, mesmo depois do Congresso deveria ser obtida pela força militar contra a Áustria. Ten-
de Viena, em 1815, seu território continuava fragmentado, tou organizar militarmente o Reino da Prússia, transfor-
com 35 Estados independentes e quatro cidades livres, do- mando o exército prussiano no principal instrumento da
minados pela Áustria graças à Confederação Germânica. unificação alemã.
“A posição da Prússia na Alemanha não será determinada
3.2. Fatores da unificação por seu liberalismo, mas por seu poder… A Prússia deve
O principal fator da unificação alemã foi o desenvolvimento concentrar sua força e segurá-la para um momento favorá-
econômico e social dos Estados germânicos, particularmente vel, que está chegando. Desde o Tratado de Viena, vi várias
o da Prússia. A Áustria, que impedira a unificação alemã, ten- vezes nossas fronteiras mal concebidas para um corpo po-
tada pela Prússia em 1850, não conseguiu impedir o desen- lítico saudável, que não devem ser melhoradas através de
volvimento econômico de seus Estados, alcançado graças ao discursos e decisões que a maioria vem a decidir durante o
Zollverein – liga aduaneira adotada em 1834, que aboliu dia – que foi o erro de 1848 e 1849 –, mas com sangue e
as tarifas alfandegárias no comércio entre os Estados ger- ferro” (Otto von Bismarck, 1862).
mânicos, o que propiciou o início da sua unidade econômica.
3.3. Processo de unificação
3.3.1. Guerra dos Ducados (1864)
Os ducados de Schleswig e Holstein, de população predo-
minantemente germânica, estavam sob domínio da Dina-
marca – graças ao Congresso de Viena, em 1815. Com
a morte do rei dinamarquês Cristiano IX, em 1863, os
príncipes germânicos desses ducados quiseram tornar-se
independentes. A Prússia, que chegou a firmar uma aliança
Otto von Bismarck, o “chanceler de ferro”. com a Áustria, apoiou os príncipes e venceu a Dinamarca,

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em 1864. Derrotada, a Dinamarca cedeu o domínio dos nha, em 1871. Na Sala dos Espelhos do Palácio de Versa-
ducados, mas as divergências originadas quando da parti- lhes, Guilherme I, rei da Prússia, foi coroado imperador da
lha dos territórios anexados agravaram ainda mais a antiga Alemanha. Com a fundação do II Reich1 alemão, estava
rivalidade austro-prussiana. concluída a unificação política do país.

3.3.2. Guerra Austro-Prussiana (1866)


A Guerra Austro-Prussiana eclodiu finalmente em 1866
e passou à história como Guerra das Sete Semanas. Com
uma campanha fulminante, os prussianos venceram os
austríacos na Batalha de Sadowa. Pelo Tratado de Praga, a
Áustria aceitou a dissolução da Confederação Germânica e
passou os ducados de Schleswig e Holstein para a Prússia.
O caminho para a centralização da Alemanha do Norte es-
tava aberto. Outros territórios foram anexados pela Prússia,
Napoleão III e Bismark após a Batalha de Sedan.
aos quais se uniram outros Estados germânicos, formando
a Confederação Germânica do Norte (1867). Cada Estado
manteve sua organização tradicional, mas todos passaram 3.4. Consequências da
a ser dirigidos pelo rei da Prússia, presidente da Confede- unificação alemã
ração, bem como o exército e as finanças.
O Império Alemão destruiu o equilíbrio de poder estabele-
cido na Europa desde 1815 pelo Congresso de Viena. No
3.3.3. Guerra Franco-Prussiana (1870) prazo de algumas décadas, a Alemanha se transformaria
No início da Guerra Austro-Prussiana, Napoleão III fora na primeira potência econômica e militar da Europa. O
conivente com Bismarck, certo de que a luta se arrastaria Tratado de Frankfurt, assinado em 1871 com a França,
por muito tempo e lhe traria vantagens. A vitória prussiana permitiu à Alemanha anexar as províncias francesas da
foi inesperada e desagradável para a França: a unificação Alsácia-Lorena, ricas em jazidas de ferro e carvão, além
da Alemanha constituía uma ameaça direta à hegemonia de receber da França uma pesada indenização de guerra.
francesa na Europa. O exército francês não podia ser mo- Tudo isso contribuiu para o desenvolvimento do revan-
bilizado, pois tinha sido desorganizado por uma expedição chismo francês, que se transformou numa das princi-
ao México (1862–1867). Tentando resguardar um pouco pais causas da Primeira Guerra Mundial.
da autoridade francesa, Napoleão III exigiu da Prússia
A unificação política, os minérios da Alsácia-Lorena e a in-
que os Estados do sul da Alemanha – onde a influência
denização francesa contribuíram para impulsionar o desen-
francesa era considerável – não se unissem aos do norte.
volvimento industrial da Alemanha. A revolução industrial,
Bismarck usou dessas exigências para opor os alemães aos
realizada na passagem do século XIX para o XX, posicio-
franceses, os quais considerava inimigos tradicionais.
nou a Alemanha lado a lado com a Inglaterra como grande
Em 1869, a candidatura do príncipe Leopoldo de Hohen- potência econômica da Europa.
zollern, parente do rei da Prússia, ao trono da Espanha foi
Como foi tardia, a unificação fez com que a Alemanha,
vetada por Napoleão III e serviu de estopim para a eclosão
assim como a Itália, chegasse atrasada à corrida colonial,
da Guerra Franco-Prussiana.
quando a partilha do mundo estava praticamente conclu-
Para o imperador francês, a candidatura do príncipe ale- ída e os principais territórios já ocupados por Inglaterra e
mão era uma manobra de cerco à França no caso de uma França. A necessidade de mercados externos e a rivalidade
guerra com a Prússia. Napoleão III exigiu a retirada da can- anglo-alemã – resultante da concorrência industrial, co-
didatura de Hohenzollern e a promessa de Guilherme I, rei mercial e naval entre as duas potências – transformaram-
da Prússia, de que nenhum príncipe germânico ocuparia o -se em pontos de atrito altamente explosivos.
trono espanhol. Guilherme I enviou a Bismarck um telegra-
ma (Despacho de Ems) a ser encaminhado a Napoleão III.
Mas Bismarck modificou-o, o que o fez parecer insultuoso
ao povo francês. Esse texto, publicado pelos jornais ale-
mães, levou a França a declarar guerra à Prussia, em 1870.
A Batalha de Sedan selou a vitória da Prússia sobre a Fran- 1
O II Reich fazia parte do Sacro Império Romano-Germânico fundado na
Idade Média.
ça e consolidou a anexação dos Estados do sul da Alema-

10
CONEXÃO ENTRE DISCIPLINAS

A região de Ausácia-Lorena, rica em minério de ferro, foi disputada com “unhas e dentes“ pelos franceses e
alemães. O território era, originalmente, possessão alemã (Sacro Império Romano-Germânico) até ser tomado
pela França, em 1648, pela Paz de Vestfália. Durante a Guerra Franco-Prussiana (1870-1871), foi reincorporado
pelos alemães, que desejavam ampliar sua produção siderúrgica. Já em 1918, após o final da Primeira Guerra
Mundial, o Tratado de Versalhes assegurou a possessão do território novamente aos franceses, o que gerou
enorme insatisfação da elite alemã.
Não foi de se espantar que, durante o nazismo, em 1940, Hitler tenha reincorporado as importantes jazidas mi-
nerais da região. O fim do conflito viria somente após o término da Segunda Guerra Mundial, quando finalmente
a maior parte de Alsácia-Lorena ficou sob o domínio do Estado francês.
O caso descrito é representativo do quão é importante para a indústria nacional possuir matérias-primas em
abundância. Riquezas naturais, muitas vezes, são fontes de soberania.

11
DIAGRAMA DE IDEIAS

UNIFICAÇÕES TARDIAS

A ANTECENDENTES C ALEMANHA

• FORTALECIMENTO DO PODER BURGUÊS NA


• DIVISÃO ENTRE PEQUENOS ESTADOS SOBERANOS
EUROPA
• UNIDADE CULTURAL
• REVOLUÇÕES LIBERAIS E NACIONALISTAS
• TRADIÇÃO MILITARISTA
DE 1830 E 1848
• ORGULHO DO I REICH
• INTERFERÊNCIA POLÍTICA DO ABSOLUTISMO
• REGIÃO CONTROLADA PELA ÁUSTRIA
AUSTRÍACO
I FATORES DA UNIFICAÇÃO
B ITÁLIA: CONGRESSO DE VIENA (1815) • “ZOLLUEREIN”/ LIGA ADUANEIRA (1834)
DIVISÃO DA ITÁLIA EM SETE REGIÕES • DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO, SOCIAL E
MILITAR
REINO PIEMONTE • FORTALECIMENTO DA PRÚSSIA
• MONARQUIA CONSTITUCIONAL
• ALIANÇA ENTRE REI E BURGUESIA II LIDERANÇA
• OTTO VON BISMARCK - CHANCELER DA PRÚSSIA
1848: TENTATIVA DE UNIFICAÇÃO
• FRACASSO III PROCESSO DE UNIFICAÇÃO
• DESENVOLVIMENTO INDUSTRIAL • 1864
• GUERRA DOS DUCADOS
I LIDERANÇAS • CONQUISTA DE DUCADOS DA DINAMARCA
• CONDE DE CAVOUR/ RESSURGIMENTO PIE- • 1866
MONTE/MONARQUISTA • GUERRA AUSTRO-PRUSSIANA
• GIUSEPPE GARIBALDI (CAMISAS VERMELHAS - • CONQUISTA DE TERRITÓRIOS GERMÂNICOS DA ÁUSTRIA
SUL DA ITÁLIA) REPUBLICANO • FORMAÇÃO DA CONFEDERAÇÃO GERMÂNICA DO
NORTE
II PROCESSO DE UNIFICAÇÃO
• 1870
• 1858-1859
• GUERRA FRANCO-PRUSSIANA
• GUERRA ENTRE PIEMONTE E ÁUSTRIA: CONQUISTA DO
• CONQUISTA DE TERRITÓRIOS AO SUL DA ALEMANHA
NORTE DA ITÁLIA
• QUEDA DO II IMPÉRIO FRANCÊS
• 1860
• 1871
• GARIBALDI UNIFICA CENTRO E SUL DA ITÁLIA
• FORMAÇÃO DO II REICH
• ALIANÇA ENTRE GARIBALDI E CONDE DE CAVOUR
• 1870
IV CONSEQUÊNCIAS
• REI VITOR EMMANUEL II CONQUISTA ROMA
• NOVO EQUILÍBRIO DE PODER NA EUROPA
• PAPA NÃO RECONHECE O ESTADO ITALIANO
• ANEXAÇÃO DA ALSÁCIA E DE LORENA
III CONSEQUÊNCIAS • REVANCHISMO FRANCÊS
• QUESTÃO ROMANA (1870-1929) • ALEMANHA É NOVA POTÊNCIA ECONÔMICA
• ATRASO NO DESENVOLVIMENTO CAPITALISTA DA EUROPA
• ATRASO NA CORRIDA COLONIAL • ATRASO NA CORRIDA COLONIAL
• NORTE DA ITÁLIA - INDUSTRIALIZADO
• SUL DA ITÁLIA - AGRÁRIO

12
– exploração agrícola monocultora e exploração do tra-
AULA FUNDAMENTO balho escravo, com produção de tabaco, algodão, arroz e
índigo (anil), exportados para a Europa.
Durante o século XIX, o território americano assumiu di-
mensões próximas das atuais em virtude de uma série de
fatores, dentre os quais a Doutrina do Destino Manifesto,
EUA NO SÉCULO XIX que ocupou uma posição de suporte da atitude americana
em relação àqueles que não são reconhecidos como seus
iguais: acreditavam ter sido ungidos por Deus para exerce-
rem a liderança mundial.
Os Estados Unidos não se interessavam pelas questões
internacionais; a prioridade era resolver seus problemas
internos mediante uma política isolacionista. Nos poucos
COMPETÊNCIAS: 1, 2, 3, 4, 5 e 6 momentos em que buscaram interferir fora de seu ter-
ritório, ocuparam-se da independência da América Lati-
1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, na quando foi criada a Doutrina Monroe, cujo lema era
HABILIDADES: 10, 11, 13, 14, 15, 16, “América para os americanos”. Tratava-se de uma clara
19, 20, 21, 22, 27 e 29 antecipação para seu futuro imperialista. A sede do ex-
pansionismo estadunidense revelou-se com a Emenda
Platt, que “legalizou” suas interferências em Cuba, já no
1. Estados Unidos início do século XX.

no século XIX
1.1. Introdução
O século XIX marcou o desenvolvimento capitalista dos
Estados Unidos e o início da expansão de seu território em
direção ao oeste. multimídia: vídeo
Desde a colonização inglesa (século XVII), havia uma série Fonte: Youtube
de diferenças entre as colônias do norte e do sul. Aquelas Sangue negro
formavam a Nova Inglaterra e suas atividades econômi- Falido, o minerador de prata Daniel Plainview decide
cas estavam voltadas para a pesca, pecuária, atividades começar vida nova e buscar a fortuna com o filho, em
comerciais e produção manufatureira. Em virtude da forte local rico em petróleo, mas seus interesses entram em
presença dos imigrantes puritanos ingleses, a região carac- conflito com os do pastor Eli Sunday, a figura mais in-
terizou-se pela vida disciplinada e ética do trabalho como fluente da cidade.
forma de obtenção da prosperidade econômica, sinal da
salvação divina. A região foi marcada pela tolerância reli-
giosa e um estilo de vida voltado para o isolamento. 1.2. A conquista do Oeste
As colônias centrais eram socialmente mais abertas e recep- No período subsequente à independência dos Estados Uni-
tivas aos grupos sociais que professassem diferentes crenças dos, teve início a famosa “marcha para o oeste” – expan-
religiosas. Recebiam imigrantes de outras regiões da Europa, são da sociedade norte-americana para as terras do oeste
de diferentes credos, como suecos, holandeses, escoceses, do continente, até então ocupadas pelas nações indígenas.
entre outros. Tornaram-se importante centro econômico e Formaram-se duas grandes correntes migratórias que par-
mantinham fortes laços com as colônias do norte. Ambas tiram da costa leste em direção à região oeste.
conseguiram um desenvolvimento econômico autônomo da
Inglaterra, o que sustentou as revoltas quando a Inglaterra 1.2.1. Fatores da expansão territorial
quis fazer valer as regras do colonialismo mercantilista, de
Se, à época da independência, a população dos Estados
forma tardia, explicando a precoce independência americana.
Unidos era de 3,5 milhões de habitantes, basicamente gra-
As colônias do sul se organizaram nos limites da clássica ças ao grande afluxo de emigrantes europeus, esse número
exploração econômica mercantilista colonial, a plantation saltou para sete milhões no início do século XIX. Os cam-

13
poneses fugiam dos rigores da servidão ainda vigente em A Luisiana foi comprada da França por 15 milhões de dóla-
alguns países europeus. Os artesãos procuravam a Amé- res; a Flórida, da Espanha por cinco milhões de dólares; e o
rica, porque, com o desenvolvimento do capitalismo na Alasca, da Rússia por sete milhões de dólares.
Europa e o consequente avanço da produção mecanizada,
Mediante tratado diplomático negociado com a Inglaterra,
eles foram economicamente marginalizados.
o Oregon, na costa Norte do Pacífico, foi anexado aos EUA.
Esse crescimento demográfico, agravado pela reduzida di-
Em 1848, metade do território mexicano, formada pelas
mensão territorial do jovem país, foi um dos principais fatores
atuais regiões de Nevada, Califórnia, Utah, Arizona, Texas e
do avanço para o oeste americano no século XIX, somado à
Novo México, foi anexada pela guerra. Não foi à toa que um
necessidade de aumentar a produção de alimentos com a
presidente mexicano, Porfírio Diaz, declarou: “Pobre México,
incorporação de novas terras de plantio, de pastagens para o
tão longe de Deus e tão perto dos Estados Unidos”.
gado e da procura de metais, alimentados ideologicamente
Aquisições territoriais - EUA
pela crença na Doutrina do Destino Manifesto.
Outro fator importante de atração para o oeste foi a desco-
berta de ouro na Califórnia, em 1848, que provocou uma
expressiva migração para a região (corrida do ouro), tanto
por americanos quanto por europeus.

1.2.2. Características da expansão territorial


Os pioneiros – criadores de gado, agricultores sem terra,
granjeiros e caçadores – dessa conquista foram europeus e
americanos sem condições de sobrevivência na costa leste.
A cavalo ou em barcos pelos rios, punham-se em marcha
para o oeste. Expulsavam ou dizimavam as tribos indíge-
nas, conquistavam e povoavam as terras do interior e nelas 1.2.3. Consequências da
desenvolviam a agricultura, a pecuária e a mineração. marcha para o oeste
A marcha para o oeste era, em grande parte, justificada pela Além de ter praticamente dobrado de tamanho, uma das
Doutrina do Destino Manifesto, segundo a qual os esta- consequências inequívocas da expansão territorial ameri-
dunidenses tinham sido predestinados por Deus à conquista cana foi o crescimento demográfico. Entre 1820 e 1860, a
dos territórios situados entre os oceanos Atlântico e Pacífico. população estadunidense passou de nove milhões para 30
milhões de habitantes, crescimento alimentado pela cons-
tante e intensa imigração europeia em busca da grande
quantidade de terras disponíveis.
A expansão territorial e o crescimento populacional levaram
ao crescimento do mercado estadunidense e à disponibilida-
de de mão de obra que contribuíram para impulsionar o de-
senvolvimento econômico do país, para expandir a indústria,
o comércio, a agricultura, a pecuária e a mineração. Ainda
assim, havia falta de mão de obra, o que favoreceu o desen-
volvimento da indústria de máquinas agrícolas. A indústria
(Progresso Americano. c. 1872. John Gast). Representação alegórica
do Destino Manifesto. Uma mulher angelical,
têxtil de lã e de algodão concentrou-se na Nova Inglaterra; a
identificada como Colúmbia – personificação dos Estados Unidos do extração de carvão e a indústria siderúrgica, na Pensilvânia.
século XIX –, segura um livro escolar, leva a civilização Já em 1860, o país tinha 50 mil quilômetros de estradas de
para o oeste, com colonos americanos, instalando cabos
telegráficos e afugentando povos nativos e animais selvagens.
ferro; de 1862 a 1869 foram construídas as primeiras ferro-
vias transcontinentais, ligando a costa atlântica ao Pacífico.
Em 1862, o presidente Abraham Lincoln criou o Homestead
No norte e no leste do país, desenvolveram-se uma rica e po-
Act (lei da propriedade rural), que concedia terra aos imigrantes
derosa burguesia industrial e comercial e uma classe operá-
que nela se fixassem e produzissem qualquer gênero, aceleran-
ria numerosa e organizada. No centro e no oeste, surgiu uma
do ainda mais a ocupação territorial em direção ao Pacífico.
sociedade de desbravadores dedicados à lavoura e à criação
Os novos territórios incorporados pelos Estados Unidos de gado. No sul, consolidou-se a supremacia da aristocracia
ao longo da expansão para o oeste foram adquiridos pela rural, cujo poder apoiava-se na grande propriedade agrária,
compra, pela diplomacia ou pela guerra. na monocultura de exportação e no trabalho escravo.

14
Em contrapartida ao desbravamento e à ocupação dos
novos territórios pelo homem branco, houve o massacre
1.3. Guerra de Secessão (1861–1865)
sistemático dos indígenas ou seu confinamento em terras
inóspitas, transformadas em reservas.

Batalha da Guerra de Secessão

No dia 25 de junho de 1876, o general Custer, levado pela 1.3.1. Origens da guerra civil
convicção de que “índio bom era índio morto”, acabou por Após a conquista do oeste, entre os anos 1861 e 1865,
encontrar a morte na famosa Batalha de Little Big Horn. Nes- os Estados Unidos foram envolvidos pela guerra civil, co-
sa operação, ele conduziu o Sétimo Regimento de Cavalaria nhecida como Guerra de Secessão, consequência dos an-
num ataque contra a maior concentração de índios da história tagonismos entre os estados do norte (União) e os do sul
dos Estados Unidos, entre os quais estavam os líderes Touro (Confederados).
Sentado, Cavalo Louco ou Cavalo Doido, Galha e Duas Luas.
As origens do conflito remontam ao processo de formação
das 13 colônias inglesas da América do Norte. A coloni-
zação de povoamento, baseada na pequena propriedade
agrária, na agricultura de subsistência e no trabalho livre
do norte, formou um mercado interno que impulsionou o
desenvolvimento do comércio e da manufatura nas cida-
des costeiras. Ao lado de uma classe média de granjeiros
do interior, formou-se nas cidades litorâneas uma rica e
próspera burguesia.
Ao sul ocorrera, no entanto, uma colonização de exploração,
baseada no sistema de plantation – o latifúndio explorava a
General Custer Touro Sentado
monocultura de exportação graças à mão de obra escrava.
Sem uma classe intermediária entre senhores e escraviza-
dos e um mercado interno, houve dificuldades para que o
comércio e a manufatura prosperassem. A sociedade sulista
caracterizou-se por uma poderosa aristocracia rural, que do-
minava uma imensa massa de escravizados. As diferenças
econômicas e sociais entre o norte e o sul permaneceram
mesmo depois da independência e agravaram-se com a
multimídia: vídeo conquista do oeste.

Fonte: Youtube
1.3.2. Os fatores da guerra
E o vento levou
As contradições entre o norte e o sul se aprofundaram com
O drama épico da guerra civil mostra a vida da be-
a abolição da escravidão. Em franca expansão territorial e
la petulante do sul, Scarlett O’Hara. Começando pela
expansão de uma plantação extensa, o filme traça sua capitalista, os Estados Unidos precisavam de uma identi-
sobrevivência na trágica história do sul durante a guerra dade adequada a essa realidade. A escravidão tornou-se
civil e reconstrução. Mostra, ainda, seus casos de amor central no debate político do país que se pretendia demo-
com Ashley Wilkes e Rhett Butler. crático, bem como a necessidade de liberar os capitais in-
vestidos em escravizados. No Acordo de Mississipi, de

15
1820, decidiu-se que a escravidão seria aceita somente poder de sua aristocracia. Foram fundadas agremiações polí-
abaixo do paralelo 36º40’; posteriormente, a Califórnia de- ticas para representar as grandes facções político-econômicas
cidiu-se contrária à escravidão. Com o Compromisso de da época: o Partido Democrata, pelos aristocratas sulistas, e o
Clay, de 1850, cada estado optaria pela abolição ou não Partido Republicano, pela burguesia industrial nortista.
da escravidão após consulta a seus cidadãos. Em 1854,
A rivalidade política entre as duas regiões foi agravada pe-
foi criado o Partido Republicano, que abraçou a causa do
las divergências quando da colonização das terras do oes-
abolicionismo.
te. Como os novos estados elegeriam representantes para
As posições se radicalizaram: abolicionistas e escra- o Congresso federal, quem os controlasse teria assegurada
vistas se enfrentaram militarmente, enquanto o governo a direção política do país. A aristocracia sulista pretendia
tentava apaziguar a luta com concessões aos sulistas. Em introduzir a escravidão na região oeste e assim neutralizar
1859, John Brown tentou sublevar os escravizados da Vir- politicamente a crescente influência dos estados do norte.
gínia. Foi preso e enforcado, transformando-se em mártir A burguesia nortista, embora não se opusesse à escravidão
do movimento abolicionista. Anteriormente, em 1857, o no sul, pretendia implantar nas novas áreas o trabalho livre
escravizado Dred Scott pediu sua liberdade por ter residido e com isso conquistar a supremacia política do país.
duas vezes em território livre, conforme lhe assegurava a
A causa imediata da guerra, entretanto, foi a vitória de
lei. O tribunal negou-lhe o pedido, porque negros não eram
Abraham Lincoln, candidato do Partido Republicano e re-
considerados cidadãos. A escravidão mudara as bases da
presentante dos industriais nortistas, nas eleições presiden-
vida política da nação: a divisão entre as opiniões tomou
ciais de 1860. A aristocracia sulista reagiu à eleição de Lincoln
um sentido geográfico, separando o norte do sul.
e, em 1861, onze estados escravistas do sul separaram-se do
A questão do protecionismo foi um dos principais moti- governo da União e fundaram os Estados Confederados da
vos da guerra civil americana. As indústrias do norte, me- América. Jefferson Davis foi escolhido presidente, a capital foi
nos produtivas que as inglesas, necessitavam de proteção estabelecida em Richmond, na Virgínia, e o general Robert
alfandegária. Exigiam a adoção de uma política tarifária Lee, nomeado comandante das tropas confederadas.
protecionista que lhes assegurasse o controle do merca-
do interno e eliminasse a concorrência das mercadorias
importadas da Inglaterra. Essa proteção não interessava
aos grandes produtores do sul, uma vez que, além de os
produtos do norte serem mais caros que os dos ingleses,
eles corriam o risco de sofrer represálias por parte dos im-
portadores da Inglaterra, grandes compradores dos seus
produtos, como, por exemplo, do algodão.

multimídia: livro

Huckleberry Finn – Mark Twain


Abraham Lincoln
As aventuras de Huckleberry Finn (Adventures of Huckle-
berry Finn, no original em inglês) é um romance do escri- A situação do sul era menos favorável sob todos os aspec-
tor Mark Twain, publicado em 1884. Nele, o protagonista, tos. Além de não ter indústrias, foi proibido de importar
amigo de Tom Sawyer, vive inúmeras aventuras pelo rio armas pelo bloqueio naval imposto pelo governo central.
Mississippi em uma balsa. A União passou a vencer inúmeras batalhas; graças ao seu
moderno e eficiente parque industrial, armou o exército e
A rivalidade política também figurou como fator da Guerra conseguiu anular as forças confederadas. Além disso, a for-
de Secessão. Desde a independência, a política do país havia ça numérica do exército ianque era bem superior, uma vez
sido dominada pela aristocracia sulista, mas a marcha para que originada do grande contingente de imigrantes, que
o oeste acelerou a industrialização do norte, enquanto o sul contava com 20 milhões de pessoas. O sul tinha apenas 11
permanecera essencialmente agrário, o que enfraqueceu o milhões, 30% dos quais eram negros escravizados.

16
Esse conflito inaugurou uma nova tecnologia militar, um União, permitiu o atendimento aos interesses das diferentes
novo tipo de guerra. O velho fuzil de carga pela boca foi frações e facções de classe e deu feição à moderna nação
substituído pelo fuzil raiado, de precisão, de recarga pela americana. Se, em 1860, os Estados Unidos ocupavam a
culatra, cujos tiros saíam em repetição, ampliando a capaci- posição de quarta potência mundial, em 1890 já haviam
dade ofensiva dos soldados da União. Os trens também fo- ultrapassado a Inglaterra, a Alemanha e a França e se trans-
ram bastante úteis para o transporte das tropas e o telégrafo formado na primeira potência econômica mundial.
facilitou a transmissão de notícias. As tropas se deslocavam
À burguesia nortista foi imposta a reconstrução penosa e
rapidamente na direção de onde eram travados os combates.
trágica. As tarifas protecionistas foram aprovadas e deter-
minaram o avanço do capitalismo estadunidense. Estradas
de ferro foram abertas em todo o país para o escoamento
rápido dos produtos industrializados do norte.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube
Lincoln
Ao mesmo tempo em que ocorria a guerra civil estaduni-
dense, que terminou com a vitória do norte, o presidente
Abraham Lincoln tinha de tratar de uma batalha ainda
mais difícil em Washington. Ao lado de seus colegas de
partido, ele tentava passar uma emenda à Constituição Conclusão da Primeira Ferrovia Transcontinental, em 1869. No centro,
dos Estados Unidos que acabava com a escravidão. Samuel S. Montague,
da Central Pacific Railroad, aperta a mão de Grenville
M. Rodeio, da Union Pacific Railroad.
A derrota dos exércitos confederados, em 1863, na Batalha
A Guerra de Secessão derrubou a escravidão e consolidou a
de Gettysburg, foi decisiva. As tropas da União continua-
ram avançando até a assinatura da capitulação em Appo- configuração territorial dos EUA, mas não levou ao debate
matox. Em 9 de abril de 1865, o general sulista rendeu-se o racismo, não criou política alguma de inserção do negro
e a guerra chegou ao seu fim. Alguns dias depois, no dia na sociedade nem de indenização pela extinta escravidão.
14, Lincoln foi assassinado em um teatro por John Wilkes Houve regiões em que o negro continuou sendo considerado
Booth, ator e simpatizante confederado. não cidadão, fato que mudou somente na década de ses-
senta do século XX! Surgiram grupos racistas que usavam a
violência para perseguir negros, judeus e católicos. Foi o caso
da Ku Klux Klan. O Estado africano da Libéria surgiu nesse
processo de luta pela libertação, quando alguns negros acre-
ditaram que poderiam voltar para a África e criar um país
desenvolvido e harmônico, o que foi uma experiência fra-
cassada. Para alguns brancos estadunidenses, a Libéria seria
o lugar para onde negros seriam deslocados a fim de não
serem incorporados à sociedade anglo-saxônica.

1.4. A política externa dos


1.3.3. Consequências Estados Unidos no século XIX
A Guerra de Secessão deixou 600 mil mortos e consolidou a
supremacia política e econômica do norte burguês e indus- 1.4.1. A Doutrina Monroe
trializado sobre o sul agrário e aristocrático, que foi devastado. A política isolacionista estadunidense tinha por objetivo
Os resultados imediatos da guerra civil foram o fim da escra- evitar o envolvimento e a participação dos Estados Unidos
vidão e o investimento de capitais (antes investidos na com- nas guerras e conflitos travados na Europa. O suporte teóri-
pra de escravizados) no capitalismo industrial. A vitória dos co desse isolacionismo foi a Doutrina Monroe, formula-
republicanos (norte), defensores do federalismo, fortaleceu a da em 1823 pelo presidente James Monroe, cujo princípio

17
básico era a oposição do país a qualquer intervenção po- O intervencionismo dos EUA no Caribe atingiu o seu ponto
lítica ou militar dos países europeus nos assuntos internos máximo na virada do século XIX com a política do pre-
do continente americano, sintetizado no lema “a América sidente Theodore Roosevelt, denominada de Big Stick
para os americanos”. (grande porrete). Roosevelt instigou a separação do Pana-
má da Colômbia com a intenção de construir o canal do
Panamá, em 1903, procurando satisfazer interesses esta-
dunidenses. Durante a administração de Roosevelt, deu-se
também a intervenção armada em Cuba e em São Domin-
gos. A determinação de “falar suavemente e carregar um
porrete” apresentava, assim, resultados convincentes para
os Estados Unidos.

Tio Sam protegendo os americanos contra os europeus (Disponível


em: <portaldoprofessor.mec.gov.br>. Acesso em: 10/05/2015).

multimídia: livro

Moby Dick – Herman Melville


Moby Dick é um romance do autor estadunidense Her-
man Melville. O nome da obra é o do cachalote enfu-
recido, de cor branca, que, havendo sido ferido várias
vezes por baleeiros, conseguiu destruí-los.

1.4.2. O imperialismo estadunidense


Após a Guerra de Secessão, a industrialização estaduni-
dense ganhou ímpeto, sendo responsável por uma mudan-
ça de mentalidade: as ideias isolacionistas perderam força
e os estadunidenses iniciaram um agressivo imperialismo.
Em 1890, o sistema industrial dos EUA se encontrava ple-
namente desenvolvido. Havia uma preocupação com a
expansão dos mercados em virtude das necessidades de
reprodução do capital, o que mostra a inserção do país
no movimento de expansão imperialista do final do século
XIX, sendo o principal objetivo o domínio de mercados e a
reserva da matéria-prima. Conquistado o mercado inter-
no, os grandes trustes passaram a exigir do governo uma
política externa mais agressiva, seguindo-se uma série de
intervenções, principalmente na América Latina.
Após a guerra com a Espanha (Guerra Hispano-Americana
- 1898) em favor da independência de Cuba, os Estados
Unidos tomaram posse de Porto Rico, Guam, Havaí e Filipi-
nas. Cuba passou a ser uma nação independente, mas sob
a influência dos estadunidenses.

18
CONEXÃO ENTRE DISCIPLINAS

Muitas empresas dos Estados Unidos procuram instalar suas plantas fabris em território mexicano. Isso se deve
pela busca de salários mais baixos praticados no México, além deste representar um amplo mercado consumi-
dor. Chrysler, Ford, General Motors e Caterpillar são exemplos proeminentes.
Além disso, em 1994, foi assinado o Nafta (Tratado Norte-Americano de Livre Comércio) por Canadá, Estados
Unidos e México, que propunha:
§ eliminar as barreiras alfandegárias (imposto de importação) e facilitar o movimento de produtos e serviços entre
os territórios dos países-membros;
§ promover condições para uma competição justa dentro da área de livre comércio;
§ aumentar substancialmente oportunidades de investimento dos países participantes;
§ oferecer proteção efetiva e adequada e garantir os direitos de propriedade intelectual no território de cada um
dos participantes;
§ criar procedimentos efetivos para a implementação e aplicação do tratado, para sua administração conjunta e
para a resolução de disputas; e
§ estabelecer uma estrutura para futura cooperação trilateral, regional e multilateral para expandir e realçar os
benefícios do acordo.
Contudo, esse cenário de liberdade econômica alterou-se significativamente após a vitória de Donald Trump, em
2016. O novo presidente propôs, durante toda a sua campanha, romper com o Nafta sob o pretexto de atrair
as empresas estadunidenses aos EUA. Além disso, demonstrando rara ousadia conservadora, desejou impor aos
mexicanos a construção de um gigantesco muro separando as fronteiras entre os dois países.

19
DIAGRAMA DE IDEIAS

EUA NO SÉCULO XIX

EXPANSÃO TERRITORIAL
A B GUERRA DE SECESSÃO (1861-1865)
MARCHA PARA O OESTE
CARACTERÍSTICAS ESTADOS DO NORTE (UNIÃO)
• COMPRA, CONQUISTA OU GUERRA • AGRICULTURA DE SUBSISTÊNCIA
• DOUTRINA DO DESTINO MANIFESTO • TRABALHO LIVRE
• HOMESTEAD ACT/LEI DA PROPRIEDADE RURAL (1862) • DESENVOLVIMENTO DE MANUFATURAS
• IMIGRAÇÃO
CONSEQUÊNCIAS
• DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO
• CRESCIMENTO POPULACIONAL ESTADOS DO SUL (CONFEDERADOS)
• FORTALECIMENTO DO MERCADO INTERNO • PLANTATION
• MASSACRE DE INDÍGENAS • TRABALHO ESCRAVO
• ARISTOCRACIA RURAL
• AUSÊNCIA DE MERCADO INTERNO
FATORES
• ABOLICIONISTAS NO NORTE E ESCRAVISTAS NO SUL CONSEQUÊNCIAS
• PROTECIONISMO NO NORTE • VITÓRIA DOS ESTADOS DA UNIÃO
• FORTALECIMENTO DA BURGUESIA NORTISTA
ESTOPIM • ABOLIÇÃO DA ESCRAVIDÃO
• ELEIÇÃO DE ABRAHAM LINCOLN (NORTE) • MANUTENÇÃO DE IDEOLOGIAS RACISTAS

C POLÍTICA EXTERNA

• DOUTRINA MONROE (1823): “AMÉRICA PARA OS • INTERVENCIONISMO DOS EUA NO CARIBE


AMERICANOS” • GUERRA HISPANO-AMERICANA (1898)
• IMPERIALISMO (FINAL DO SÉCULO XIX) • EMENDA PLATT, EM CUBA
• INVESTIMENTO DE CAPITAIS NA AMÉRICA LATINA • POLÍTICA DO BIG STICK (THEODORE ROOSEVELT)

20
França, Alemanha e Itália deram início a uma verdadeira
AULAS 37 E 38 corrida colonial.
O novo colonialismo – neocolonialismo – pode ser en-
tendido como fruto da política industrial e da expansão do
capital financeiro, sem desprezar, contudo, as rivalidades
políticas europeias, que aguçaram o nacionalismo e trans-
formaram a conquista colonial em prestígio político.
IMPERIALISMO E
NEOCOLONIALISMO 1.1. Fatores do neocolonialismo
Durante o século XIX, diversos países europeus viviam o pro-
cesso da Revolução Industrial, razão pela qual precisavam en-
contrar fontes de matéria-prima industrial (carvão, ferro, pe-
tróleo, etc.) e produtos alimentícios de que não dispunham.
COMPETÊNCIAS: 1, 2, 3, 4, 5 e 6
Precisavam também de mercados consumidores para os ex-
3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, 13, 14, cedentes industriais, além de novas regiões onde pudessem
HABILIDADES: 16, 17, 18, 20, 22, 23, investir com lucros significativos seus capitais disponíveis.
24, 25, 26, 28 e 29 Esse mecanismo era indispensável para aliviar a Europa
dos capitais excedentes, que, se fossem investidos na Euro-
pa, agravariam a Grande Depressão e intensificariam a ten-
1. O neocolonialismo dência de os países industrializados na Europa continental
adotarem medidas protecionistas, fechando seus mercados
e tornando a situação ainda pior.
Outro fator tornava a política colonialista atraente para os
governos europeus: a possibilidade de transferir, como co-
lonos, um número significativo de sua população para as
novas regiões conquistadas, resolvendo, assim, o problema
do excedente populacional, que crescia em ritmo acelerado.
Além disso, o operariado europeu, insatisfeito com suas pre-
cárias condições de vida e de trabalho, agitava a Europa ao
comandar inúmeros movimentos sociais. Os governos euro-
peus perceberam que a exploração colonial poderia possibi-
litar melhoria no padrão de vida da classe operária do velho
continente, enfraquecendo, assim, os levantes populares.
No plano político, os Estados europeus estavam preocu-
pados em aumentar seus contingentes militares a fim de
fortalecerem suas respectivas posições frente às demais
potências. Com as colônias, contariam com maior disponi-
bilidade de recursos e aumento dos contingentes militares.

1.2. Teorias do neocolonialismo


The Rhodes Colossus Striding from Cape Town to A propaganda a favor dos interesses imperialistas, vitais
Cairo, 10 dezembro de 1892, de Punch. para o desenvolvimento do capitalismo, deu origem a
A caricatura revela as intenções do político e empresário britânico
Cecil Rhodes, defensor ferrenho do imperialismo inglês. uma série de teorias pseudocientíficas, muito populares
a partir da segunda metade do século XIX. Essas teorias
A segunda metade do século XIX foi marcada por um novo
buscavam justificar a conquista e a colonização de outros
e vigoroso movimento do capitalismo, caracterizado pelo
povos pelos europeus.
imperialismo, que submeteu a maior parte dos territórios
da África e da Ásia à condição de colônia das potências Em geral, elas tendiam a estabelecer uma hierarquia rígi-
europeias, principalmente as que haviam passado pela da entre os diferentes povos, classificados como “mais”
transformação industrial. Países como Inglaterra, Bélgica, ou “menos” civilizados ou evoluídos. Nessa hierarquia, o

21
primeiro lugar era ocupado pela sociedade europeia, cujo Com exceção de alguns portos comerciais, até o fim do
funcionamento deveria servir de modelo ideal para o resto século XVIII, a Ásia não tinha sofrido influências ocidentais.
do mundo. Essa concepção é denominada eurocentrismo. No transcorrer do século XIX, essa situação modificou-se
radicalmente: os países ocidentais passaram do simples
Em 1899, o poeta Rudyard Kipling, de volta à Inglaterra
comércio nos portos à política de zonas de influência, pro-
depois de uma demorada estada nos Estados Unidos, pu-
movendo uma verdadeira partilha do Oriente.
blicou um poema cujo impacto até hoje repercute. The whi-
te man burden (O fardo do homem branco) entrou para a Em 1763, os ingleses tomaram a Índia aos franceses e
história como um chamamento à conquista imperialista do encarregaram uma companhia de explorá-la. Em 1858,
mundo pelos estadunidenses e europeus. De acordo com os cipaios (nativos que serviam nos exércitos coloniais) se
o poema, o domínio do planeta seria uma missão que de- revoltaram devido ao fato de a Índia ter sido integrada ao
veria ser assumida como um fardo por todos os homens Império Britânico.
brancos, uma obrigação dos civilizados, em contraposição
aos selvagens e bárbaros.

The white man’s burden (Apologies to kipling),


1899, de Victor Gillam. Revista Judge.

Dentre essas teorias, talvez a mais conhecida seja o darwi-


Na China, a Guerra do Ópio (1840-1842), provocada
nismo social, que explica, à luz dos estudos de Charles
pela destruição de carregamentos ingleses de ópio, permi-
Darwin sobre a evolução das espécies, as conquistas dos
tiu a conquista de Hong Kong e de outros portos, principal-
homens de acordo com seus ganhos econômicos e sociais
mente os de Xangai e Namquim. Outras expedições milita-
como resultado da “sobrevivência do mais apto”.
res foram organizadas com o pretexto de punir os chineses
Não raramente, os “desígnios divinos” e a defesa do cristia- pela morte de missionários, e novos portos foram abertos.
nismo confundiam-se com os interesses dos capitalistas, de
Depois de vencida pela Inglaterra, a China foi obrigada por
modo que “salvar as almas” dos nativos das colônias era
muitas outras potências capitalistas a dar um tratamento
sinônimo da necessidade de transformá-los em empregados
privilegiado aos seus negócios. No final do século XIX,
das grandes plantações administradas pelos europeus.
nada menos que sete países dividiam entre si os fabulosos
lucros da dominação imperialista na China: Inglaterra, Ale-
1.3. Características do manha, Japão, Estados Unidos, França e Itália.
neocolonialismo A reação contra a invasão da China partiu de uma asso-
ciação secreta, a Sociedade dos Punhos Harmoniosos e
Justiceiros, que, por meio de atentados, lutava contra os
estrangeiros residentes em terras chinesas. As nações eu-
ropeias organizaram uma expedição conjunta para punir
essa sociedade e o governo chinês, que a apoiava. Nasceu
disso a Guerra dos Boxers (1899- 1900). Depois de mais
uma derrota, a China foi inteiramente dominada pelas po-
tências ocidentais.
Na segunda metade do século XIX, o sudeste asiático (In-
dochina) foi reduzido à condição de colônia francesa. Em
1863, a França estendeu seus domínios na região e conver-
Imperialismo na Ásia teu o Camboja em seu protetorado.

22
1.4. A partilha colonial da África 1.5. Consequências do
Apesar de alguns territórios africanos já pertencerem a euro- neocolonialismo
peus antes de 1870, foi só a partir de então que o imperialis- Depois da Conferência de Berlim ocorreu a ocupação e explo-
mo reinou naquele continente. Em 1876, apenas 10,8% do ração do imenso território africano, que foi palco de uma das
território africano estava dominado por Estados colonialistas. mais sangrentas páginas da história do colonialismo euro-
Em 1900, esse número chegou a incríveis 90,4%. peu. A população local foi escravizada e obrigada a trabalhar
Um dos pioneiros da dominação sobre a África foi o rei nas explorações organizadas pelas companhias europeias.
belga Leopoldo II, que, em 1876, tomou posse de todo o Milhares de pessoas morreram vítimas da fome, do trabalho
território do rio Congo. Essa região, aproximadamente dez forçado, das doenças trazidas pelos brancos e dos massacres
vezes maior do que a Bélgica, foi conservada sob domínio coletivos promovidos contra as aldeias que se rebelavam.
pessoal do rei, que a vendeu, em 1908, ao próprio governo
Na medida em que representou a ocidentalização do mun-
belga por uma enorme quantia.
do, a colonização destruiu estruturas sociais tradicionais –
Diversos países europeus se lançaram à aventura africana. que muitas vezes não puderam ser recompostas. No Sudeste
A França conquistou a Argélia, a Tunísia, a África Ocidental asiático, milhares de alqueires, antes dedicados à plantação
Francesa, a África Equatorial Francesa, a Costa Francesa de arroz para a autossuficiência dos povos locais, foram
dos Somalis e Madagascar. Os ingleses dominaram o Egito, transformados em imensas fazendas produtoras de borracha
o Sudão anglo-egípcio, a África Oriental Inglesa, a Rodésia, para exportação. Na Índia, o artesanato foi destruído.
a União Sul-Africana, a Nigéria, a Costa do Ouro e Ser-
Pela primeira vez na história, o mundo encontrava-se in-
ra Leoa. A Alemanha, que entrou tardiamente na corrida
teiramente partilhado, direta ou indiretamente, e submisso
colonial, tomou Camarões, o Sudoeste Africano e a África
às grandes potências europeias e aos Estados Unidos. Em
Oriental Alemã. A Itália conquistou o litoral da Líbia, a Eri-
treia e a Somália Italiana. Os antigos países colonizadores 1905, estavam conquistados: 90,4% da África, 56,6% da
da Europa, Portugal e Espanha, ficaram com porções redu- Ásia, 100% da Austrália, 27,2% da América e 98,9% da
zidas: a Espanha, com o Marrocos espanhol, o rio de Ouro Polinésia. A partir de então, não haveria novas apropriações,
e a Guiné Espanhola; Portugal, com Moçambique, Angola uma vez que já não existiam territórios sem dono. As grandes
e a Guiné Portuguesa. potências passaram a viver uma situação de choque perma-
nente entre si na tentativa de expandir suas áreas de domi-
A colonização africana
nação econômica e política. Esse choque de imperialismos
terminaria por deflagrar a Primeira Guerra Mundial.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube
Zulu
Zulu é um filme épico de guerra, baseado em fatos reais,
que retrata a batalha de Rorke’s Drift, ocorrida entre o
exército britânico e os Zulus em janeiro de 1879, perí-
odo em que o neocolonialismo estava a todo o vapor.
O filme retrata a epopeia de um pequeno regimento
O ponto de partida para a corrida colonial na África foi dado britânico, formado por cerca de 150 soldados – muitos
pela Conferência de Berlim (1884–1885), da qual parti- dos quais doentes e feridos em um hospital de campo
ciparam todos os países colonialistas, que estipularam entre –, que, com sucesso, consegue deter uma força de cerca
si os princípios reguladores do que se convencionou chamar de 4 mil guerreiros Zulu. O filme é protagonizado por
“partilha da África”. A Conferência impunha às potências co- Stanley Baker e apresenta Michael Caine em seu primei-
lonizadoras a necessidade de ocupação efetiva, demarcação ro papel principal.
e notificação de suas posses aos participantes da partilha.

23
CONEXÃO ENTRE DISCIPLINAS

A divisão política da África não reflete os limites territoriais das etnias africanas, uma vez que é fruto da divisão
realizada pelas potências coloniais europeias na Conferência de Berlim, do ano de 1885.
Atualmente, a África é o continente mais fragmentado do mundo, formado por 54 países. A maioria dos países
africanos alcançou sua independência somente depois do processo de descolonização, iniciado depois da Se-
gunda Guerra Mundial. As lutas anticolonização africanas, as rivalidades étnicas, frequentemente atiçadas pelos
antigos colonizadores, e o jogo político do período da Guerra Fria, fizeram do continente um palco de conflitos
sangrentos durante toda a segunda metade do século XX.
O continente, por ter sido considerado mero território colonial, foi fragmentado sem levar em conta os valores,
religiões e tradições de seus povos. A divisão artificial criada trouxe problemas para administrar os instáveis e
nada coesos novos territórios, gerando graves distúrbios socioeconômicos enraizados na economia exportadora
de matéria-prima, como miséria da população, alto índice de mortalidade, abandono, violência, corrupção, fome,
desorganização, guerras civis tribais, golpes de estado, além de conflitos étnicos e religiosos.

24
DIAGRAMA DE IDEIAS

NEOCOLONIALISMO FATORES

• SEGUNDA REVOLUÇÃO INDUSTRIAL


TEORIAS DO • NECESSIDADE DE NOVOS MERCADOS
COLONIALISMO • NECESSIDADE DE MATÉRIAS-PRIMAS
• BUSCA DE LOCAIS PARA INVES-
• O “FARDO DO HOMEM BRANCO” TIMENTOS DE CAPITAL
• CIVILIZAR POVOS NÃO BRANCOS • CONTER REIVINDICAÇÃO DE TRA-
• DARWINISMO SACIAL BALHADORES NA EUROPA
• RACISMO CIENTÍFICO
• CRISTIANIZAÇÃO DOS POVOS
CARACTERÍSTICAS
CONFERÊNCIA DE BERLIM • DISPUTA TERRITORIAL NA ÁFRICA E NA ÁSIA
(1884 - 1885) • CONTROLE TERRITORIAL
PARTICIPANTES: • OCUPAÇÃO DO TERRITÓRIO
• POTÊNCIAS EUROPEIAS • IMPOSIÇÃO CULTURAL
• IMPÉRIO OTOMANO
• ESTADO UNIDOS
EFEITOS: CONSEQUÊNCIAS
• PARTILHA DA ÁFRICA
CONDIÇÕES: • DISPUTAS TERRITORIAIS
• OCUPAÇÃO DO TERRITÓRIO ENTRE PAÍSES EUROPEUS
• DEMARCAÇÃO DE FRONTEIRAS • ESCRAVIZAÇÃO DA POPULAÇÃO ORIGINAL
• NOTIFICAÇÃO AOS PAÍSES PARTICIPANTES • DESTRUIÇÃO DE CULTURAS ORIGINAIS
• FORMAÇÃO DE FRONTEIRAS ARTIFICIAIS

25
que sinalizavam o exercício de uma política de isolamento
AULA 39 E 40 em relação aos interesses europeus. Por isso, a participação
dos EUA na Primeira Guerra Mundial foi tardia e ocorreu so-
mente em 1917. Já o Japão estava em franco crescimento,
em virtude da industrialização provocada pela Revolução
Meiji, mas ainda não tinha condições para confrontar o im-
perialismo da Inglaterra e da França, o que ocorreu somente
PRIMEIRA GUERRA durante a II Guerra Mundial.
MUNDIAL
2. Antecedentes: a Belle
Époque e a paz armada
O estado de espírito predominante na Europa, no período
COMPETÊNCIAS: 1, 2, 3, 4, 5 e 6 anterior a 1914, era de orgulho pelas realizações da civili-
zação ocidental e de confiança em seu progresso futuro. Os
1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9,
avanços na ciência e na tecnologia, a elevação do padrão
HABILIDADES: 10, 11, 13, 14, 15, 16,
de vida, a difusão das instituições democráticas, o incre-
19, 20, 21, 22, 27 e 29
mento da alfabetização das massas, a posição de poder
da Europa no mundo, tudo contribuía para um sentimento
de otimismo. Esse período de euforia, que vai da segunda
metade do século XIX até a eclosão da Primeira Guerra
Mundial, em 1914, foi denominado de Belle Époque.
Porém, paradoxalmente, o período que abrange o final da
Guerra Franco-Prussiana até o início da Primeira Guerra Mun-
dial (1871–1914) ficou conhecido como “paz armada”. Um
período caracterizado pelas fortes rivalidades políticas (nacio-
nalistas), econômicas (disputa por mercados e por matérias-
-primas industriais) e imperialistas (concorrência colonial). A
Soldados estadunidenses guardam trincheira na França durante a imprensa dos principais países europeus discutia e propagan-
Primeira Guerra Mundial (1914–1918) deava a guerra e todos garantiam que seu país sairia vence-
protegidos por máscaras contra gás.
dor. Esse militarismo criou um clima de tensão. Nos principais
países capitalistas europeus, ocorreu uma corrida armamen-
1. Introdução tista; todos se preparavam para a guerra: os transportes e a
indústria bélica desenvolveram-se, houve recrutamento mili-
Inglaterra, França, Bélgica e Holanda exerceram uma políti- tar e aperfeiçoaram-se os sistemas de comunicação.
ca imperialista eficiente em relação à exploração da África e
da Ásia. No entanto, as unificações da Alemanha e da Itália
promoveram uma gigantesca industrialização nesses Esta-
dos, que, por terem se unificado somente na metade final do
século XIX, iniciaram tardiamente o processo de criação dos
monopólios industriais, não tendo assim acesso a um vasto
mercado consumidor para além de seus territórios.
No final do século XIX, algumas potências europeias as-
sociavam o aperfeiçoamento tecnológico à indústria bélica
por intermédio de alianças internacionais, que, somadas ao
nacionalismo, alimentavam um ódio não somente regional,
mas continental. Desse modo, a Europa preparava-se para Belle Époque. 1889. Paris. Jean Béraud.
uma guerra com potencial de destruição que ainda não A mescla de nacionalismo e de imperialismo levou os
tinha sido visto nem mesmo na Era Napoleônica. governos europeus a perceberem a iminência da guerra,
Os Estados Unidos consolidavam sua expansão para o oeste sendo criada uma política armamentista acelerada (paz ar-
e iniciavam a intervenção nas Antilhas, ao mesmo tempo em mada). Esse belicismo exagerado transformou a fisionomia

26
da Europa, pois a burguesia até esse momento passava por Inglaterra no início do século XX. Em 1914, sua produção de
uma fase de euforia cultural (Belle Époque), representada ferro e aço era maior que a da Inglaterra e da França juntas e
nas intermináveis festas no principado francês de Mônaco. sua indústria química e manufatureira de instrumentos cien-
tíficos liderava a produção mundial. O Produto Interno Bruto
A paz armada, com sua corrida armamentista e o clima de ten-
da Alemanha cresceu cerca de 600% entre 1871 e 1914. Os
são que gerou, tornou inevitável a Primeira Guerra Mundial.
alemães dominaram mercados anteriormente controlados
por ingleses na Europa, no Oriente e até mesmo dentro da
3. Causas do conflito própria Inglaterra. A Alemanha, com notável surto industrial,
precisava de escoadouros para suas mercadorias, bem como
de mercados fornecedores de matérias-primas industriais e
3.1. O choque de imperialismos alimentos para uma população crescente, tornando-se inevi-
Um dos principais fatores da Primeira Guerra Mundial – cha- tável a concorrência com a Inglaterra.
mada à época de Grande Guerra –, em 1914, foi o choque A hegemonia inglesa nos mares também estava amea-
de imperialismos, que possuía raízes econômicas (dispu- çada. Houve grande desenvolvimento da marinha ale-
ta por novos mercados consumidores e matérias-pri- mã, fato comprovado pelo lançamento, em 1912, pela
mas industriais), expressando-se de modo político e militar. Alemanha, do maior navio do mundo, o Imperator.
A II Revolução Industrial, baseada no avanço tecnológico da Além da corrida imperialista, vários fatores nacionalistas
eletricidade, aço e petróleo e no capital industrial-financei- estavam presentes na Europa e promoviam o aumento do
ro, gerou uma superprodução que foi parcialmente escoada ódio entre as nações. Um elemento desse nacionalismo foi
para África, Ásia e América Latina. Como Itália e Alemanha o pangermanismo, que se caracterizou pela defesa da
se encontravam marginalizadas da corrida neocolonial, hou- ideologia segundo a qual era um direito do povo alemão,
ve o surgimento do ressentimento que alimentou os atritos devido ao seu passado mitológico e pureza racial, controlar
entre ingleses e franceses, de um lado, e os representantes a Europa Central, bem como interferir nos Bálcãs. Para obter
do capital ítalo-prussiano de outro. Nesse contexto, a Con- o apoio da Áustria, o pangermanismo também se caracteri-
ferência de Berlim (1885) buscou a inserção do II Reich ger- zava pela criação de uma estrada de ferro que uniria Berlim
mânico e da Itália no neocolonialismo por meio de uma série a Bagdá, o que se chocaria com o imperialismo inglês e fran-
de negociações; no entanto, essa estratégia fracassou, pois a cês no Oriente Médio e selaria a aliança entre o II Reich e o
Inglaterra e a França confirmaram o controle sobre as regiões Império Austro-Húngaro. A construção da estrada de ferro
africanas, alimentando o ressentimento alemão, propiciando Berlim–Bagdá (não concluída) contribuiu para agravar ainda
o aumento da militarização e a busca de mercados consumi- mais a rivalidade anglo-germânica. Uma vez concluída, co-
dores por meio da guerra. locaria à disposição da Alemanha as fontes de petróleo do
Oriente Médio, os mercados orientais e ameaçaria as rotas
de comunicação entre a Inglaterra e seu império.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube
Nada de novo no front
Um grupo de estudantes alemães é convencido por um
professor excessivamente nacionalista a se alistar no
exército durante a Primeira Guerra Mundial. Ao testemu-
nharem mortes e mutilações, o heroísmo dá lugar aos
horrores e às tragédias da guerra.

3.2. A expansão industrial


alemã e o pangermanismo
Após concluir o processo de unificação política em 1871, a A Alemanha tentou marcar sua presença na Ásia com a
Alemanha industrializou-se rapidamente, equiparando-se à Primeira Guerra.
construção de uma ferrovia durante a

27
3.4. O expansionismo russo
e o pan-eslavismo
Depois de derrotada pelo Japão na Guerra Russo-Japonesa,
de 1905, a Rússia buscou penetrar no Mediterrâneo pelos
Bálcãs, entrando em choque com os interesses dos impérios
turco-otomano, alemão e austro-húngaro. Esse projeto ex-
multimídia: vídeo pansionista do czar foi intitulado de pan-eslavismo e apro-
Fonte: Youtube ximou-se do povo sérvio. A Rússia dissimulava seus projetos
Gallipoli expansionistas pregando a unificação de todos os povos
Esse drama documental explora a batalha de Galípoli, na eslavos e apresentando-se como protetora e incentivadora
Primeira Guerra Mundial, por meio de encenações, ani- de sua independência. Grande parte desses grupos estava
submetidos direta ou indiretamente à dominação do Império
mação em 3D e entrevistas com especialistas.
Austro-Húngaro e do Império Turco.
Na passagem do século XIX para o XX, o expansionismo
3.3. A rivalidade franco-germânica russo chocava-se com a Alemanha, na região dos estreitos
e o revanchismo francês de Bósforo e Dardanelos, dominada pelo Império Turco. A
manutenção do domínio sobre os estreitos por parte da
decadente Turquia era de vital importância para a Alema-
nha. Por lá passaria a ferrovia Berlim-Bagdá. A Rússia, por
sua vez, procurava apossar-se dos estreitos para conseguir
saída marítima do Mar Negro para o Mediterrâneo.

Em Versalhes, Guilherme I foi aclamado imperador da Monarquia


Federal Germânica. Começava o II Reich Alemão.

Desde a Guerra Franco-Prussiana (1870-1871), que provocou


a queda do Segundo Império Francês e a unificação política 3.5. O nacionalismo sérvio
da Alemanha, cristalizou-se a rivalidade franco-germânica. A exemplo do que acontecera na Itália e na Alemanha, os
Essa situação agravou-se com os termos do Tratado de Frank- povos eslavos do sudeste da Europa pretendiam se unificar
furt (10 de maio de 1871), assinado no Palácio de Versalhes, em um país. Ao sul, o movimento pela “Grande Sérvia”
que obrigou a França a ceder as províncias da Alsácia-Lorena, chocava-se, entretanto, com os interesses do Império Turco;
ricas em ferro e carvão, e a pagar aos alemães uma altíssima e ao norte, com os do Império Austro-Húngaro.
indenização. Unificada, com ferro e carvão em abundância, e
recebendo capital indenizatório, a Alemanha industrializou-se, Em 1908, as divergências aumentaram, quando da anexação
enquanto a França encontrava dificuldades para continuar seu pelo Império Austro-Húngaro das províncias balcânicas da
desenvolvimento. As instituições culturais francesas equilibra- Bósnia-Herzegovina, habitadas por eslavos, o que contrariava
riam o orgulho ferido difundindo. Formou-se um exacerbado os interesses da Sérvia e da Rússia.2 Consumada a anexação,
nacionalismo voltado principalmente contra a Alemanha. As a formação de um estado nacional eslavo (“Grande Sérvia”),
novas gerações francesas nasciam e educavam-se sob o signo centralizado pela Sérvia, só seria possível com desmembramen-
da revanche: vingar a humilhação militar e política sofrida tos parciais do Império Austro-Húngaro e do Império Turco.
2
Com essa anexação, os sérvios ficaram furiosos e apelaram para a Rússia.
na Guerra Franco-Prussiana e recuperar Alsácia-Lorena. Em
O governo do czar ameaçou com a guerra, até que a Alemanha enviou uma
1906, França e Alemanha ampliariam suas diferenças na luta áspera nota a São Petersburgo anunciando sua firme intenção de apoiar
pela dominação do Marrocos,1 contribuindo para aumentar a o Império Austro-Húngaro. Como a Rússia ainda não havia se recuperado
tensão internacional e acelerar a marcha rumo à guerra. inteiramente da guerra com o Japão e com muitos problemas internos, a
1
Com ricos depósitos minerais e reserva de tropas, o Marrocos passou a ser estratégico. intervenção russa foi adiada.

28
4. A política de alianças
O sistema de alianças que agrupou as potências europeias remonta a 1870, quando a Guerra Franco-Prussiana e a unificação
da Alemanha alteraram radicalmente o equilíbrio de poder na Europa.
O revanchismo francês e a possibilidade de se ver envolvida em uma guerra em duas frentes transformaram-se no pesadelo da Ale-
manha. O isolamento da França e a neutralização da Rússia passaram a ser a maior preocupação da política externa de Bismarck. A
Alemanha reforçou sua aliança com o Império Austro-Húngaro, recebendo, também, a adesão da Itália. Em 1882, os dois impérios
e a Itália formalizaram a Tríplice Aliança.
Dois motivos levaram a Itália a participar da Tríplice Aliança: a rivalidade com a França, que havia se apoderado da Tunísia3, con-
siderada área de influência “natural” da Itália; e a vontade de criar boas relações com a Áustria, país temido pela Itália.
O Império Austro-Húngaro, por sua vez, entrou na aliança para se proteger de um possível ataque russo, devido às rivalidades
pelo domínio dos Bálcãs.
Procurando neutralizar a Tríplice Aliança, França e Rússia firmaram um pacto militar em 1894, a Aliança Dual, um tratado
secreto que os prevenia contra qualquer ataque da Alemanha ou de seus aliados.
A partir de 1898, a Inglaterra mudou sua política externa ao perceber que seu maior inimigo era a concorrência alemã. A classe
dominante inglesa passou a exigir o aniquilamento da Alemanha. O rei Eduardo VII, dotado de grande talento diplomático e com
uma nítida compreensão da conjuntura mundial, concebeu um plano de cerco da Alemanha pelas potências que lhe eram hostis.
Como dirigente da política externa inglesa, o monarca acercou-se primeiro da França. Em 1904, ingleses e franceses assinaram um trata-
do chamado Entente Cordial. Em 1907, a Rússia passou a compor a aliança anglo-francesa, que passou a se chamar Tríplice Entente.

Mapa da política de alianças


3
Com o pretexto de uma incursão para a Argélia, em 1881 os franceses invadiram o país com um exército de cerca de 36 mil homens e forçaram o rei a concordar com
os termos do Tratado de Bardo, de 1881, segundo o qual a Tunísia tornou-se oficialmente um protetorado francês, apesar das objeções da Itália.

29
4.1. O assassinato de Francisco ultimato, os austríacos sinalizaram que desejavam a guerra
e que certamente contariam com o apoio da Alemanha. A
Ferdinando: o estopim da guerra Sérvia, apoiada pela Rússia, recusou o ultimato. No dia 28
Em 1912, Sérvia, Montenegro, Grécia e Bulgária alia- de julho, o Império Austro-Húngaro invadiu a Sérvia, ao lado
ram-se e atacaram o Império Turco, na chamada Primei- de quem a Rússia tomou posição em 1.º de agosto. A partir
ra Guerra Balcânica. Os turcos foram derrotados, mas, de então, a política de alianças funcionou automaticamente
na partilha dos despojos Sérvia e Bulgária desenten- em um verdadeiro efeito dominó: a Alemanha, cumprindo
deram-se, o que as levou à Segunda Guerra Balcânica seus compromissos com a Áustria, declarou guerra à Rússia;
(1913), da qual a, Sérvia foi vitoriosa e aumentou seu a França, em socorro aos russos, declarou guerra à Alema-
território. Entretanto, esse crescimento teria sido maior nha; e, pouco depois, os ingleses aliaram-se aos franceses.
se não fossem as pressões austríacas durante a elabo- Começava, então, a Primeira Guerra Mundial.
ração dos tratados de paz. Ao forçar a criação de um
Estado independente na Albânia, a Áustria evitou que
a Sérvia conquistasse uma saída para o mar Adriático,
atitude essa que ampliou os sentimentos antiaustríacos
dos sérvios.
Para o início da Grande Guerra bastava um estopim, que
foi aceso nos Bálcãs, região conhecida como o “barril de
pólvora da Europa”. Num domingo, o arquiduque herdeiro
do trono austro-húngaro, que estava em Sarajevo, capi-
tal da Bósnia – região anexada pela Áustria –, sofreu um
atentado enquanto passeava de automóvel com a espo-
sa. Francisco Ferdinando e sua esposa foram assassinados
pelo estudante bósnio, Gavrilo Princip, membro da organi-
zação terrorista secreta chamada Mão Negra, que lutava
para livrar a Bósnia do domínio austríaco.

Gavrilo Princip, assassino do duque Francisco Ferdinando

Gavrilo Princip

multimídia: livro

A montanha mágica – Thomas Mann


A montanha mágica é um livro escrito por Thomas Mann,
em 1924. Um dos romances mais influentes da literatura
mundial do século XX, foi importante para a conquista do
Prêmio Nobel de Literatura, em 1929, por Mann.

O assassinato de Francisco Ferdinando ilustrado por Achille Beltrame


do jornal italiano Domenica del Corriere, em 12 de julho de 1914.

Acreditando que o atentado fora preparado pela Sérvia, o


5. As fases da guerra
Império Austro-Húngaro enviou-lhe um ultimato com 11
pontos, um dos quais estabelecia a presença de autorida-
5.1. A guerra de movimento (1914)
des austríacas em solo sérvio para investigar o assassinato A primeira fase do conflito caracterizou-se pela guerra
do arquiduque, algo inaceitável para a Sérvia. Pelo teor do de movimento, rápido deslocamento de tropas, com o

30
objetivo de destruir o inimigo em batalhas sucessivas. O
principal país a deslocar seus contingentes militares foi
a Alemanha, que invadiu regiões da França e da Rússia,
depois de dividir seu exército em duas frentes. Usando
uma tática que foi chamada de Plano Schliefen,4 os ale-
mães pretendiam primeiro vencer a França para depois
atacar a Rússia. Na invasão da França violaram o terri- Soldados ingleses lutando em Tanque britânico MK-1
tório belga para evitar as fortificações da futuramente suas trincheiras (1916).

famosa linha Maginot, o que serviu de pretexto para a A guerra havia se transformado radicalmente. As manobras
Inglaterra declarar guerra à Alemanha. estratégicas do período napoleônico e as fulgurantes ofensi-
A ofensiva alemã foi contida na Batalha do Marne, de 6 vas previstas nos manuais militares tornaram-se antiquadas,
a 13 de setembro de 1914, pelo general Joffre. As tropas graças a uma nova arma, a metralhadora. Foi a partir do ve-
alemãs retiraram-se para uma linha mais recuada. rão de 1916 que surgiram os primeiros tanques inventados
pelos ingleses, blindados, armados de canhões e metralha-
dora, com lagartas para todo tipo de terreno. Foram produ-
zidos em pequeno número e não alteravam as condições
básicas dessa guerra, imóvel e sangrenta.

Impérios Centrais
Apoiantes dos
Ofensivas dos Aliados
Ofensivas dos
Aliados
Estados neutrais
Zonas de combate
Frentes em 1917
multimídia: vídeo
Impérios Centrais Impérios Centrais
Fonte: Youtube

5.2. A guerra de trincheiras Lawrence da Arábia


(1914–1918) Graças ao seu conhecimento dos beduínos, o oficial bri-
tânico T.E. Lawrence é enviado à Arábia para encontrar o
Os movimentos em massa tentados pelos dois exércitos príncipe Faisal e servir de ligação entre árabes e ingleses
tiveram poucos resultados positivos. Cada avanço de al- na luta contra os turcos. Com a ajuda do nativo xerife
guns quilômetros custava uma longa preparação e mi- Ali, Lawrence se rebela contra as ordens de seus supe-
lhares de vidas. Durante três anos, a frente imobilizou-se. riores e enfrenta uma jornada através do deserto para
Numa extensão de 640 km, dos Alpes ao Mar do Norte, atacar um porto turco bem protegido.
os lados em confronto construíram uma vasta rede de trin-
cheiras, que tinham abrigos subterrâneos e eram cercadas
de arame farpado. Atrás da frente de trincheiras havia ou- Na frente oriental, os alemães, mais bem equipados, sob
tras linhas para as quais os soldados podiam se retirar e o comando do general Hindenburg, conseguiram diversas
as quais podiam ser usadas para o envio de auxílio. Entre vitórias sobre o numeroso, mas pouco preparado, exército
os exércitos oponentes ficava a “terra de ninguém”, uma do czar russo. Com as vitórias alemãs sobre a Rússia, a
vasta superfície de lama, árvores despedaçadas e troncos Turquia entrou na guerra ao lado da Tríplice Aliança, inves-
partidos. A guerra de trincheiras era uma batalha de ner- tindo contra o pan-eslavismo russo.
vos, resistência e coragem, travada ao som estrondoso da Em 1915, os italianos, apesar de aliados à Áustria e à
artilharia pesada. Era também uma carnificina. Quando os Alemanha, entraram na guerra ao lado da Entente, o
soldados atacantes escalavam suas trincheiras e avança- que se justifica graças aos tratados secretos, segundo os
vam corajosamente ao longo da “terra de ninguém”, eram quais a França e a Inglaterra prometiam à Itália as regi-
dizimados pelo fogo da artilharia pesada e caçados pelas ões do Trento, Tirol e Ístria, então sob domínio austría-
metralhadoras. Apesar das baixas assustadoras, pequena co. Ainda em 1915, o Japão também entrava na guerra
área mudava de mãos. Grande parte do heroísmo, do sacri- contra a Alemanha, mas após dominarem os territórios
fício e das mortes redundava em nada. alemães na China e mais algumas colônias, os japone-
4
Plano idealizado pelo general alemão Alfred von Schlieffen.
ses retiraram-se da guerra.

31
Em 1916 foi travada a Batalha do Somme, possivelmente a Em novembro de 1917, a revolução socialista saiu vitoriosa
mais ilustrativa do tipo de combate ocorrido na Primeira Guerra na Rússia. Em março de 1918, em Brest-Litovsk, o governo
Mundial. No primeiro dia, os ingleses perderam 60 mil homens; da Rússia soviética assinou a paz com a Alemanha, acei-
após um mês haviam conseguido avançar apenas quatro qui- tando suas condições que incluíam a entrega da Polônia,
lômetros. Durante toda a batalha os alemães perderam 500 da Ucrânia e da Finlândia, e se retirava da guerra.
mil homens; os ingleses e franceses, 600 mil. Ainda em 1916,
os franceses barraram o ataque dos alemães à custa de 300
mil baixas de cada lado, derrotando-os na Batalha de Verdun.

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Glória feita de sangue
Durante a Primeira Guerra Mundial, o general-comandante
Batalha do Somme Broulard ordena que seu subordinado, o general Mireau,
ataque a trincheira alemã, oferecendo-lhe uma promoção
5.3. A entrada dos Estados como incentivo. Embora a missão seja imprudente ao ponto
Unidos e o colapso da Tríplice de suicídio, Mireau manda seu próprio subordinado, o coro-
nel Dax, planejar o ataque. Quando o plano termina em de-
Aliança (1917–1918) sastre, o general Mireau exige a corte marcial de três solda-
Iniciada a guerra, os EUA permaneceram neutros, embora dos, aleatoriamente escolhidos, para manter as aparências.
emprestassem capitais e vendessem armas e manufatura-
dos aos países da Entente. Sabiam que da guerra só have- Na primavera de 1918, a superioridade alemã era incontes-
ria um vencedor – Alemanha ou Inglaterra –, que dividiria te a oeste. A Entente estava ameaçada de perder a guerra e
com os americanos o mercado mundial. Por razões cultu- os EUA, seus capitais. Os EUA enviaram mais soldados para
rais, históricas e econômicas, interessava-lhes a vitória da a França, que chegou a quase dois milhões de homens.
Inglaterra. A vitória do imperialismo alemão significaria o Essa participação foi decisiva para a derrota dos impérios
surgimento de um inimigo muito mais perigoso para o jo- centrais da Tríplice Aliança. Diante das sucessivas derrotas
vem imperialismo americano. Assim, o destino da Entente do exército alemão, revoltas internas derrubaram o II Reich
estava ligado ao de seu maior credor: os EUA. e o novo governo republicano assinou o armistício em 11
de novembro de 1918, pondo fim à guerra.
Em 1917, a Alemanha declarou a guerra submarina, sem
restrições, a todos os países da Entente. Seriam afundados
quaisquer navios de países neutros ou que se dirigissem fa- 5.4. Os acordos de paz
voravelmente à Entente. Os EUA romperam relações com a Em janeiro de 1918, o presidente dos Estados Unidos,
Alemanha. A embaixada alemã no México comunicou ao Woodrow Wilson, propôs um acordo de paz chamado
governo mexicano que a Alemanha tinha interesse que o país 14 Pontos. Em linhas gerais, tratava da criação de uma
declarasse guerra aos EUA. Em março de 1917, alguns navios sociedade internacional que teria por finalidade manter a
americanos em comércio com a Inglaterra foram afundados paz mundial, eliminar a diplomacia secreta e promover a
por submarinos alemães. Em 6 de abril, o Congresso america- liberdade total dos mares. Tratava, ainda, do fim da guer-
no votou favoravelmente à declaração de guerra à Alemanha. ra de anexações e com indenizações por parte dos países
beligerantes. Wilson insistia na ideia de que deveria haver
uma paz “sem vencedores nem vencidos”.

Autoridades reunidas para a assinatura do Tratado de Versalhes:


Da esquerda para a direita, Lloyd George, Vittorio Emanuele
Soldados norte-americanos na Primeira Guerra Mundial Orlando, Georges Clemenceau e Woodrow Wilson.

32
Em 18 de janeiro de 1919, realizou-se a Conferência de
Paris, com o objetivo de tratar da paz com os vencidos. Dela
participaram todos os vencedores, embora só tivessem voz
ativa Georges Clemenceau, primeiro-ministro da França,
Lloyd George, primeiro-ministro inglês, e Woodrow Wilson,
presidente dos Estados Unidos.
França e Inglaterra não aceitaram todos os pontos apresen- multimídia: vídeo
tados pelo presidente estadunidense. A França exigia repa- Fonte: Youtube
rações de guerra em dinheiro, pressionada pelos vultosos The World’s War: Forgotten Soldiers of the Empire
prejuízos que tivera. A Inglaterra era contra a liberdade total
O historiador David Olusoga retrata milhões de indianos, afri-
dos mares, uma vez que neles mantinha sua hegemonia.
canos e asiáticos que lutaram na Primeira Guerra Mundial.
Em junho de 1919, o Tratado de Versalhes fixava as
penas a serem aplicadas aos vencidos. A Alemanha, con- Pelo Tratado de Saint-Germain (dezembro de 1919), a
siderada a “grande culpada” pelo conflito, foi despojada Áustria perdeu três quartos de seu território e de sua popu-
de um sétimo de seu território, um décimo de sua popu- lação. Foi obrigada a reconhecer a independência da Hun-
lação, perdeu suas colônias, viu-se privada do território gria, da Polônia, da Tchecoslováquia e da Iugoslávia (resul-
do Sarre (rico em carvão), foi obrigada a desmilitarizar a tado da incorporação da Bósnia-Herzegovina, da Croácia
região da Renânia (fronteira com a França) e a restituir o e de Montenegro pela Sérvia). As regiões do Trieste, sul do
território da Alsácia-Lorena à França, teve seus exércitos Tirol, Trentino e a Ístria passariam à Itália.
reduzidos para 100 mil homens, seu território foi separa-
do em duas partes por um “corredor” de terras (“corre-
dor polonês”), que dava acesso para o mar à Polônia, a
cidade alemã de Dantzig foi transformada em porto livre
e arcou com o pagamento de uma indenização de 33 bi-
lhões de dólares. Ainda pelo tratado, criou-se oficialmen-
te a Liga das Nações, encarregada de preservar a paz multimídia: livro
mundial, desde que Alemanha e União Soviética fossem
excluídas de sua composição. A soldier’s Pay – William Faulkner
Novos países Romance do escritor estadunidense William Faulkner,
Renânia desmilitarizada
que tematiza a chegada aos EUA de soldados que vol-
Alsácia - Lorena (ganho francês)
Estado do Sarre tam da Primeira Guerra Mundial.
Sul do Tirol e Áustria (ganhos italianos)

Para regular a situação com a Hungria, foi assinado o Tratado


de Trianon (1920), pelo qual ela perdia várias regiões. Parte da
Eslováquia passava para a recém-criada Tchecoslováquia; para
a Iugoslávia passava a Croácia, e para a Romênia, a Transilvânia.

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Os campos voltarão
Com a Bulgária, foi estabelecido o Tratado de Neuilly (no- No final da Primeira Guerra Mundial, um grupo de sol-
vembro de 1919). Por ele, a Bulgária perdeu grande parte dados italianos enfrenta os horrores da guerra. A tensão
dos territórios anexados durante a Primeira Guerra Balcâni- aumenta entre os homens, que aguardam novas ordens,
ca. A região da Dobrudja foi dada à Romênia; a Macedônia sem saber até quando vão sobreviver.
Ocidental, à Iugoslávia e a Trácia Ocidental, à Grécia.

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O Tratado de Sèvres (1920) foi imposto à Turquia e determinou a desagregação do Império Turco-Otomano. Esse tratado
estipulava que a Armênia seria independente e que a maior parte da Turquia europeia passaria à Grécia; a Síria seria contro-
lada pelos franceses; a Mesopotâmia (atual Iraque) e a Palestina, pelos ingleses.

6. Consequências da Primeira Guerra Mundial

Europa antes da Primeira Guerra Mundial (1914)

Finlândia

Europa depois da Primeira Guerra Mundial (1919)


Um balanço da Primeira Guerra Mundial assinala o deslocamento da supremacia econômica, financeira, política e militar
da Europa para os Estados Unidos. No plano econômico, a guerra destruiu 40% do potencial industrial europeu e 30% de
sua agricultura. No plano financeiro, de credora, a Europa transformou-se em devedora dos Estados Unidos. As exportações
americanas, que em 1913 orçaram 2,4 bilhões de dólares, alcançaram em 1919 a quantia de 6,7 bilhões. Sua produção
industrial cresceu 40%. Seu produto nacional bruto, de 33 bilhões de dólares em 1913, elevou-se para 63 bilhões em 1919.
Suas reservas de ouro passaram de um bilhão e 800 milhões para 4,5 bilhões de dólares.
Houve também uma mudança radical no mapa político europeu. Surgiram os Estados independentes da Hungria, Tchecoslo-
váquia, Iugoslávia, Polônia, Letônia, Lituânia, Estônia e Finlândia. Vários países tiveram seu território ampliado ou diminuído.
A Grande Guerra assinalou também o declínio do capitalismo liberal baseado na livre concorrência, cedendo lugar, pouco a
pouco, ao Estado intervencionista, com a economia passando a ser parcialmente regulada pelo poder governamental.
Outro fato de grande importância, fruto em parte da Primeira Guerra Mundial, foi a derrubada do regime czarista na
Rússia, substituído pelo primeiro Estado socialista da história.
Em grande parte e como consequência dos tratados de paz da Primeira Guerra Mundial, surgiram na Europa as condições para
o posterior estabelecimento dos regimes nazifascistas, que impulsionaram o mundo rumo a um segundo conflito mundial.
No plano demográfico, a guerra deixou um saldo de aproximadamente oito milhões de mortos e 20 milhões de mutilados.

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CONEXÃO ENTRE DISCIPLINAS

Desde o século XIX houve um processo profundo e sistemático de consolidação de trustes e holdings na eco-
nomia mundial. Os trustes são a fusão de várias empresas, de modo a formar um monopólio com o intuito de
dominar determinada oferta de produtos e/ou serviços. Também é possível definir truste como uma organização
empresarial de grande poder de pressão no mercado.
A existência desses conglomerados leva à confusão dos consumidores, uma vez que muitas das marcas disponí-
veis nas prateleiras dos supermercados aparentam ser concorrentes, embora sejam de uma mesma empresa. A
imagem a seguir demonstra claramente como funciona a concentração de marcas em torno desses poderosos
grupos empresariais.

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DIAGRAMA DE IDEIAS

PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL

A ANTECEDENTES B CAUSAS

I BELLE ÉPOQUE • CHOQUES DE IMPERIALISMOS


• FINAL DO SÉCULO XIX (1914) • INEFETIVIDADE DA CONFERÊNCIA DE BERLIM (1885)
• DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO NA EUROPA • NACIONALISMOS
• AVANÇOS CIENTÍFICO E TECNOLÓGICO • DISPUTAS COMERCIAIS
• MELHORIA NOS PADRÕES DE VIDA
• EFERVESCÊNCIA CULTURAL
C NACIONALISMO
• OTIMISMO

II PAZ ARMADA • PANGERMANISMO: CONTROLE DA EUROPA CENTRAL


• 1871-1914 • RIVALIDADE FRANCO-GERMÂNICA: REVANCHISMO
• RIVALIDADES POLÍTICAS (NACIONALISTAS) FRANCÊS
• DISPUTAS ECONÔMICAS (MERCADOS E MATÉ- • EXPANSIONISMO RUSSO E PAN-ESLAVISMO
RIAS-PRIMAS) • NACIONALISMO SÉRVIO
• IMPERIALISMO (CONCORRÊNCIA COLONIAL)
• CORRIDA ARMAMENTISTA D POLÍTICA DE ALIANÇAS

E ESTOPIM TRÍPLICE ALIANÇA (1882)


• ALEMANHA
• ASSASSINATO DE FRANCISCO FERDINANDO • IMPÉRIO AUSTRO-HÚNGARO
(ARQUIDUQUE AUSTRO-HÚNGARO) NA SÉRVIA • IMPÉRIO OTOMANO
TRÍPLICE ENTENTE (1907)
• FRANÇA
F A GUERRA • GRÃ-BRETANHA
• IMPÉRIO RUSSO
I GUERRA DE MOVIMENTO (1914)
G ACORDOS DE PAZ
II GUERRA DE TRINCHEIRAS (1914-1918)
1915 I OS 14 PONTOS DE WILSON
• ITÁLIA SE ALIA À ENTENTE • SOCIEDADE INTERNACIONAL VISANDO À PAZ
1917 • PAZ “SEM VENCEDORES NEM VENCIDOS”
• EUA ENTRAM NA GUERRA AO LADO DA ENTENTE • PROPOSTA DERROTADA
• REVOLUÇÃO SOCIALISTA NA RÚSSIA
II TRATADO DE VERSALHES (1919)
1918
• PERDA TERRITORIAL ALEMÃ
• REVOLUÇÃO NA ALEMANHA
• DEVOLUÇÃO DE ALSÁCIA-LORENA
• FIM DO II REICH
• DESMILITARIZAÇÃO ALEMÃ
• GOVERNO REPUBLICANO ASSINA O ARMISTÍCIO
• INDENIZAÇÃO ALEMÃ
• DESAGREGAÇÃO DOS IMPÉRIOS AUSTRO-HÚN-
H CONSEQUÊNCIAS
GARO E TURCO-OTOMANO
• REDEFINIÇÃO DAS FRONTEIRAS EUROPEIAS
• REDEFINIÇÃO DAS FRONTEIRAS EUROPEIAS
• DESTRUIÇÃO DO CAMPO E DA INDÚSTRIA
• HEGEMONIA ECONÔMICA DOS EUA • REVOLUÇÃO RUSSA
• EUROPA DEVEDORA DOS EUA • ACIRRAMENTO DOS NACIONALISMOS

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AULAS 41 E 42 2. Antecedentes
2.1. Economia e sociedade
No fim do século XIX, a Rússia possuía 22 milhões de quilô-

REVOLUÇÃO metros quadrados e mais de 150 milhões de habitantes. Sua


principal característica era o gigante atraso econômico em
RUSSA (1917) relação aos países da Europa ocidental. Enquanto Inglaterra,
França e Alemanha passavam por um processo acelerado
de desenvolvimento urbano e industrial, adotavam regimes
constitucionais e avançavam técnica e cientificamente, a Rús-
sia permanecia atrasada econômica, social e politicamente.

COMPETÊNCIAS: 1, 2, 3, 4, 5 e 6 Como país predominantemente agrário e semifeudal, a


aristocracia rural e o clero ortodoxo detinham o controle
1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9, da terra. Cerca de 40% das terras aráveis pertenciam à
HABILIDADES: 10, 11, 13, 14, 15, 16, nobreza. O processo de industrialização tivera início ape-
19, 20, 21, 22, 27 e 29 nas no final do século XIX, caracterizando-se por sua ex-
trema concentração em algumas grandes cidades, como
Kiev, Moscou e Petrogrado (atual São Petersburgo), então
capital do país. Além disso, mais de 50% dos capitais in-
vestidos na indústria eram estrangeiros, principalmente de
origem francesa, inglesa e alemã. Essa industrialização tar-
dia, dependente e concentrada produziu, por um lado, uma
burguesia fraca e incipiente e, por outro, um proletariado
forte, organizado e combativo, que, dadas as suas origens
rurais, mantinha estreitos vínculos com os camponeses. As
péssimas condições de vida do proletariado expressavam-
-se nos baixos salários, nas jornadas de 11 ou 12 horas de
trabalho e nas habitações miseráveis.

Soldados bolcheviques nas ruas de Moscou


durante a Revolução Russa de 1917.

1. Introdução
A Revolução Russa foi a primeira revolução socialista
com a participação do proletariado cujos desdobramen-
tos mudaram a história do mundo. Era a vitória contra o
capitalismo em um determinado país e a busca da cons-
trução de uma sociedade fundada nos princípios do so- Camponeses russos
cialismo. Outras experiências já haviam ocorrido, como a
Comuna de Paris, no século XIX, porém nenhuma delas O atraso econômico refletia-se também no predomínio da
obteve a intensidade e a repercussão internacional como vida rural, que comportava 80% da população Russa. A ten-
a Revolução Russa de 1917. Nenhuma havia sido vitorio- são social no campo era muito forte. Apesar das tentativas
sa e conseguido chegar ao poder. O capitalismo percebeu de reforma do czar Alexandre II (1855-1881), especialmente
a gravidade da ameaça que representava a Revolução a abolição da servidão, em 1861, o clima tenso persistia. As
Russa e imediatamente contra-atacou com críticas radi- terras distribuídas aos camponeses foram insuficientes; as dí-
cais de caráter ideológico ao socialismo e com práticas vidas dos proprietários eram elevadas e tendiam a aumentar
políticas de caráter ostensivamente destruidor aos mili- devido à baixa produtividade da terra, resultante das técni-
tantes socialistas. cas ultrapassadas e dos equipamentos agrícolas precários.

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Nas cidades, onde era reduzido o índice de urbanização,
concentrava-se a classe operária, formada por cerca de seis
milhões de trabalhadores. A burguesia e a aristocracia, por
sua vez, não chegavam a constituir 10% da sociedade.

2.2. O czarismo e o atraso político


Enquanto no Ocidente europeu os países haviam se trans-
formado em regimes liberais, a Rússia vivia ainda no abso-
lutismo, com um império autocrático, governado pelo czar1
Nicolau II, da dinastia Romanov, que se recusava a conce-
der a seus súditos um governo constitucional e parlamen-
tar. O corpo ministerial era nomeado e demitido pelo czar,
que governava por meio de decretos-lei. Não se falava em
liberdade individual ou direitos constitucionais; a imprensa
vivia censurada, os civis eram julgados por tribunais milita-
res e geralmente condenados a longas penas de prisão, à Lenin em frente do Instituto Smolny. Isaak Brodski.
morte ou ainda aos longínquos exílios na Sibéria.
Existiam outros partidos de oposição, como o Partido So-
cial-Revolucionário, composto por intelectuais oriundos
das camadas médias, que defendiam a realização de uma
revolução agrária com base no apoio aos camponeses, e
o Partido Constitucional Democrata (Kadet), que represen-
tava os interesses da burguesia liberal e cuja meta era a
implantação de uma monarquia constitucional.

2.4. Revolução de 1905:


o “Ensaio Geral”
O fim do século XIX foi marcado pela expansão colonial e
Nicolau II, no centro, com os filhos e cossacos. 1916. imperialista das grandes potências, com vistas à divisão do
mercado mundial em áreas de influência. Também a Rús-
2.3. A oposição ao czarismo sia expandiu-se, mas em direção ao Oriente, procurando
conquistar territórios sob a influência da China e de outros
Desde o final do século XIX, as ideias socialistas originárias
países no Pacífico. Com a construção da ferrovia trans-
da França, da Inglaterra e da Alemanha já haviam penetra-
-siberiana, os russos acabaram por se chocar com o imperia-
do na Rússia, trazidas por intelectuais que viviam no exílio
lismo japonês, na Manchúria e na Coreia. Essa rivalidade em
devido à repressão czarista.
torno dos mercados asiáticos acabou por provocar a eclo-
Inspirados por essas ideias, surgiram no país vários partidos são da Guerra Russo-Japonesa (1904-1905), na qual os
clandestinos de oposição à autocracia czarista. Entre eles russos foram fragorosamente derrotados. Pelo Tratado de
estava o Partido Social-Democrata Russo, baseado no so- Portsmouth, o Japão ficou com o sul da ilha de Sacalina, Port
cialismo marxista. Em 1903, a social-democracia dividiu-se Arthur e o protetorado sobre a Coreia e a Manchúria.
em duas facções: os bolcheviques (de bolchenstvo, maio-
A derrota frente ao Japão deixou clara e pública toda a
ria), liderados por Lenin, eram revolucionários e defendiam
crise que se escondia sob o manto da autocracia do czar
a instauração do socialismo na Rússia com base numa
Nicolau II. Membros da classe média, que até então evi-
aliança entre operários e camponeses; e os mencheviques
tavam ligar-se aos revolucionários, juntaram-se ao clamor
(de menschenstvo, minoria), liderados por Martov, eram re-
de mudanças. Trabalhadores organizaram greves e mani-
volucionários que defendiam a aliança com a burguesia e
festações em todas as cidades importantes. Liderados pelo
a passagem gradual ao socialismo através de uma política
padre Gapon, um grupo de mais de três mil trabalhadores
de reformas progressivas.
e suas famílias reuniram-se para protestar pacificamente
diante do palácio de inverno do czar, em São Petersbur-
1
O termo “czar” é a tradução russa da palavra “césar”, do nome de família
de Júlio César e dos primeiros imperadores de Roma. Os czares governaram
go, a 22 de janeiro de 1905. Os manifestantes queriam
a Rússia de 1547 a 1917. entregar um abaixo-assinado pedindo melhores condições

38
de vida, direito de greve, reforma agrária e convocação de Em 1907, o czar Nicolau II, fortalecido por empréstimos
uma assembleia nacional. Essa manifestação pacífica cul- franceses e pelo retorno das tropas que estavam no Orien-
minou com o massacre dos manifestantes, recebidos a tiros te, desencadeou a contrarrevolução, dissolvendo os sovie-
pelas tropas da guarda (cossacos), fazendo com que a data tes e prendendo ou exilando os membros da oposição. As
ficasse conhecida como Domingo Sangrento. concessões liberais foram suprimidas e a Duma, embora
mantida, passou a ter uma existência meramente simbóli-
ca. O poder da Duma era incipiente, porque, como a Rússia
ainda era semifeudal e as poucas fábricas possuíam liga-
ção com o capital estrangeiro, a burguesia russa não tinha
acumulado capital suficiente para proteger seus interesses,
pois não tinha experiência parlamentar.
O “Ensaio Geral”2 foi importante, porque, apesar de não ter
conseguido destruir o czarismo e de não provocar melhorias
significativas no padrão de vida do povo russo, mostrou a
grande força política dos sovietes, que, no futuro, seriam a
principal arma proletária na luta para a implantação do socia-
Domingo Sangrento lismo. Após a revolução de 1905, as diferenças entre as fac-
O massacre de São Petersburgo criou uma onda de indig- ções socialista bolchevique e menchevique tornaram-se mais
nação pelo país seguida de greves e protestos. Os mari- agudas, pois os bolcheviques, liderados por Lenin, passaram
nheiros do Encouraçado Potemkin, ancorado em Odessa, a defender o partido comunista, que, mesmo pequeno, era
e a guarnição de Kronstadt amotinaram-se. Os diversos formado por revolucionários profissionais que propagariam o
conceito de uma revolução socialista capaz de destruir o cza-
povos de nacionalidade não russa começaram a se movi-
rismo e o capitalismo simultaneamente. Já os mencheviques
mentar, tornando a situação bastante grave. A burguesia
propunham uma revolução por etapas: primeiro, a destruição
apoiava a insurreição popular, procurando capitalizá-la
do czarismo; posteriormente, mediante uma nova revolução,
com o objetivo de instaurar no país um regime constitu-
implantar o socialismo. Os partidos acusavam-se de revisio-
cional e parlamentar. Os sovietes (conselhos de operários,
nismo. Acreditavam que o opositor tinha traído o fundamento
camponeses e soldados) encabeçavam a luta contra o cza-
do marxismo, seja na ligação com a burguesia defendida pelos
rismo. Nesses órgãos, os trabalhadores exerciam um poder
mencheviques, seja numa passagem direta de uma estrutura
ao mesmo tempo executivo e legislativo, elegendo seus re-
semifeudal para o socialismo, defendida pelos bolcheviques.
presentantes a partir dos locais de trabalho e quartéis, des-
tacando-se o soviete de Petrogrado, liderado por Trotsky. 2.5. A Rússia e a Primeira
Guerra Mundial

multimídia: vídeo
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O encouraçado Potemkin
A revolta de marinheiros de um navio de guerra, em Cavalaria russa durante a Primeira Guerra Mundial
1905, que seria o prenúncio da revolução russa de 1917. Em 1914 estourou a Primeira Guerra Mundial, conflito en-
tre os países imperialistas pelo domínio do mercado mun-
Diante da grande onda revolucionária, o czar Nicolau II lan- dial e do mundo colonial. Integrante da Tríplice Aliança (ao
çou um manifesto, em outubro de 1905, fazendo algumas lado de França e Inglaterra), a Rússia entrou no conflito
concessões, entre as quais a promessa de uma Constitui- contra as potências centrais (Alemanha e Império Austro-
ção que estabeleceria a eleição para o parlamento (Duma). -Húngaro), esperando obter, além de vastas compensações
territoriais, o domínio de Constantinopla e dos estreitos
Em 1906, reuniu-se a Duma, parlamento controlado pela pertencentes ao Império Turco.
burguesia e pelos latifundiários, com o objetivo de redigir 2
Um “Ensaio Geral”. Foi dessa forma que Lenin, líder
uma Constituição para o país. da Revolução Russa, classificou o ano de 1905.

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Na frente oriental cabia à Rússia, país atrasado e depen- O movimento grevista crescia continuamente desde
dente, arcar com o peso da guerra contra a Alemanha; 1912. Em 1916, havia 200 mil trabalhadores em greve.
mas, em 1915, o exército czarista foi vencido e as tropas O exército, por sua vez, havia sofrido três milhões de bai-
alemãs invadiram e ocuparam vastas áreas da Rússia eu- xas. Sem quaisquer condições de combate, os soldados
ropeia. Esses desastres militares, aliados à crise econômi- desertavam e passavam a engrossar as fileiras dos que se
ca e financeira que atingiu o país, aceleraram o declínio opunham ao regime.
da autocracia russa. Ao fim de 1916, os soldados, cansa- No início de 1917, a burguesia, apoiada pela esquerda mo-
dos da guerra, exigiam paz; os camponeses, revoltados derada, pressionava o governo, provocando manifestações de
com a miséria, exigiam terras; os operários, pressionados trabalhadores nas ruas; uma greve geral paralisou os trans-
pela fome, exigiam pão. A guerra já custara três milhões portes na cidade de Petrogrado. Os gritos por pão e contra a
de mortos, destruíra 25% da indústria e 9% da agricul- guerra transformaram-se em gritos de “abaixo a autocracia”.
tura do país e não trouxera nenhuma compensação. A A polícia era insuficiente para deter o movimento; o exército
inflação violenta desvalorizava os salários; as empresas foi mobilizado, mas no dia 12 de março, 27 de fevereiro, pelo
nacionais iam à falência, acentuando ainda mais os des- calendário russo, os soldados recusaram-se a marchar contra
contentamentos sociais. o povo amotinado. No dia seguinte, sem o apoio do exército,
o poder imperial desapareceu com a abdicação do czar.
A política de Nicolau II – de dar continuidade à guerra –
acelerou o início da Revolução e provocou a queda do cza- Constituíram-se, imediatamente, dois poderes paralelos:
a Duma, na qual um comitê provisório, composto na sua
rismo na Rússia.
maioria por membros do Partido Constitucional Democra-
ta, Kadet, pretendia consolidar a monarquia constitucional;
e os sovietes, conselhos de operários, soldados e campone-
ses, que caminhavam na direção da implantação de uma
República socialista.
O Comitê da Duma transformou-se em Governo Provi-
sório após a abdicação oficial do imperador, presidido por
multimídia: vídeo Lvov. Esse governo proclamava as liberdades fundamen-
tais, deu anistia aos presos políticos e exilados – permitin-
Fonte: Youtube do a volta de líderes bolcheviques que estavam no exílio,
A greve entre eles Trotsky e Lenin –, mas não retirou a Rússia da
O suicídio de um operário injustamente acusado de roubo Primeira Guerra Mundial e nem levou adiante a partilha
é o estopim para o início de uma greve numa fábrica rus- das terras, duas reivindicações populares.
sa, em 1912. O lento processo de negociação expõe uma
série de ações e contra-ações entre grevistas e polícia.

3. A Revolução de fevereiro de
1917 e o governo provisório
Em 1917, a Rússia estava sofrendo inúmeras derrotas na
I Guerra Mundial, agravando o grau de miséria da popu-
lação humilde; contudo, o czar, a nobreza e o alto clero
ortodoxo ainda viviam num clima de luxo. Essa realidade,
A Revolução de Fevereiro de 1917 e a queda do czarismo.
unida à desastrosa ligação do czar Nicolau II com o fami-
gerado Rasputin,3 provocou o ressurgimento dos sovietes e Lenin ganhou expressão, pregando a paz, a distribuição
a revolução teve início. de terra aos camponeses e o fortalecimento dos sovietes
em artigos no jornal Pravda: “Teses de Abril: paz, ter-
3
Rasputin foi um místico russo, figura politicamente influente no final do
período czarista. Por volta de 1905, a sua já conhecida reputação de místico
ra e pão”. Esse novo programa, entretanto, só poderia
introduziu-o no círculo restrito da Corte imperial russa, na qual, segundo se ser realizado com a derrubada do governo provisório e a
dizia, Rasputin teria salvado a vida de Alexei Romanov, o filho do czar, que transferência do poder para os conselhos de operários,
era hemofílico. Perante esse acontecimento, a czarina Alexandra Feodorovna
dedicou-lhe uma atenção cega e uma confiança desmedida, denominando-o camponeses e soldados, resultando daí a palavra de or-
mesmo de “mensageiro de Deus”. Com essa proteção, Rasputin passou a dem “todo poder aos sovietes”, que serviria de base para
influenciar a Corte e, principalmente, a família imperial russa, colocando
homens como ele no topo da hierarquia da poderosa Igreja Ortodoxa Russa. a Revolução de Outubro.

40
A timidez da política social do novo governo propiciou o
avanço dos bolcheviques. A Rússia ia mal na guerra, e os fra- 5. O governo Lenin (1917–1924)
cassos provocaram reações internas, como as manifestações Uma série de medidas foi tomada pelos dirigentes do novo
de julho em Petrogrado, logo reprimidas. Sob forte pressão, regime. Um decreto relativo à propriedade da terra foi as-
Lvov cedeu lugar a Kerenski, apoiado pelos mencheviques. sinado, visando ganhar o apoio dos camponeses: a grande
Os bolcheviques foram novamente perseguidos e Lenin refu- propriedade foi abolida e os proprietários não tiveram di-
giou-se na Finlândia, enquanto Trotsky, presidente do soviete reito a indenizações. As grandes indústrias passaram para
de Petrogrado, criou uma milícia popular, a Guarda Vermelha. o controle dos operários por meio dos sovietes. Quanto às
nacionalidades, ficou estabelecido que haveria igualdade e

4. A Revolução de
soberania de todos os povos da Rússia.

Outubro de 1917
Kerenski conseguiu equilibrar-se precariamente no poder
com o apoio dos mencheviques, que acreditavam numa
revolução gradual e por meio de medidas reformistas. Em
setembro, tropas fiéis ao czarismo, sob o comando do ge-
neral Kornilov, marcharam sobre Petrogrado. Kerenski foi
obrigado a pedir ajuda aos operários e até mesmo aos
bolcheviques, o que demonstrava sua fragilidade. Lenin,
Lenin
líder dos bolcheviques, que fora obrigado a refugiar-se na
Finlândia durante o primeiro Governo Provisório, pôde re- 5.1. A Rússia sai da Grande Guerra
tornar à Rússia.
O Partido Bolchevique estava dividido quanto à necessida-
O Governo Provisório de Kerenski perdia terreno, pois insis- de de parar ou não a guerra. A esquerda, sob a liderança
tia em continuar na Primeira Guerra Mundial, negava-se a de Trotsky, queria transformá-la numa guerra revolucioná-
distribuir terras aos camponeses e adiava as eleições para a ria mundial. Para ela, as massas europeias, cansadas da
futura Assembleia Constituinte. Lenin preparou o povo para guerra imperialista, estavam preparadas para a revolução.
uma revolução armada. Na noite de 6 de novembro, 24 de A direita, liderada por Kamenev e Zinoviev, queria pará-la a
outubro no calendário russo, os bolcheviques ocuparam os qualquer preço, enquanto Lenin colocava-se numa posição
pontos estratégicos de Petrogrado. O encouraçado Aurora centrista: para ele, era necessário retirar-se da Guerra para
bombardeou o Palácio de Inverno, sede do governo. Aban- consolidar a revolução internamente, mas sem fazer muitas
donado por suas tropas, Kerenski foi obrigado a fugir. No dia concessões aos alemães, com os quais discutiam procuran-
7 reuniu-se o Congresso Panrusso dos Sovietes, que contava do ganhar tempo.
com 390 bolcheviques entre seus 650 membros. O exercício
Tendo de resolver a questão da frente oriental para pode-
de todo o poder foi transferido aos sovietes representantes
rem se defender a oeste, os alemães lançaram uma ofensi-
dos camponeses, trabalhadores e soldados. Foi designado
va geral contra Petrogrado. Sem saída, o governo soviético,
um Conselho dos Comissários do Povo, cuja formação ficou
a 3 de março de 1918, assinou o Tratado de Brest-Lito-
nas mãos dos bolcheviques. Era presidido por Lenin; Trotsky
vsky com a Alemanha: a Rússia perdia a Polônia, Finlân-
ficou no Comissariado das Relações Exteriores.
dia, Estônia, Lituânia e Letônia.

5.2. A Guerra Civil (1918–1921)


e o “comunismo de guerra”

Lenin na Revolução de Outubro Exército Vermelho durante a Guerra Civil.

41
Depois de o governo russo concluir o acordo de paz com A resistência dos camponeses que escondiam suas colhei-
a Alemanha, saindo da Primeira Guerra Mundial, em 1918, tas foi quebrada pela ação da Tcheca, polícia política cria-
eclodiu uma guerra civil no país entre o Exército Branco, for- da para combater os contrarrevolucionários. A produção
mado pelos setores interessados na restauração do antigo industrial em 1920 equivalia a 18% da produção de 1913;
regime, comandado por militares ligados ao czarismo, e o a produção agrícola equivalia, no mesmo ano, a 30% da
Exército Vermelho, que chegou a contar com três milhões de produção de 1913. O resultado foi a fome generalizada
soldados e foi organizado por Trotsky para lutar pela preser- de 1921. Ocorreram motins dos marinheiros de Kronstadt,
vação da nova ordem socialista. A França, a Inglaterra, os que foram massacrados.
Estados Unidos e o Japão, países interessados na derrota dos Percebendo o problema, Lenin iniciou, em março de 1921,
bolcheviques e na restauração do capitalismo na Rússia, in- a Nova Política Econômica, NEP. Como ela continha alguns
tervieram militarmente, aliando-se aos russos brancos. aspectos do capitalismo, o Ocidente pensou que a Rússia
Nessa época, para fazer frente ao cerco das potências capi- voltava à antiga ordem do capital. Na realidade, nas pala-
talistas e à destruição provocada pela guerra civil, o governo vras de Lenin, tratava-se de uma tática de “dar um passo
socialista adotou uma política econômica conhecida como atrás, para poder dar dois passos à frente”.
“comunismo de guerra”. Essa política implicou na completa A NEP consistiu na restauração parcial da economia de
estatização dos bancos, do comércio exterior e da indústria fa- mercado, com a adoção de uma série de medidas típicas
bril, assim como a apropriação compulsória da produção agrí- do capitalismo. Os comerciantes e agricultores foram or-
cola, o estabelecimento da igualdade de salários e o trabalho ganizados em cooperativas; suprimiram-se as requisições
obrigatório. Finalmente, em 1921, a guerra civil chegava ao fim agrícolas forçadas pelo Estado; foram privatizadas as em-
com a vitória do Exército Vermelho e um saldo de nove milhões presas com menos de vinte trabalhadores; hierarquizaram-
de mortos. Dentre os fatores que contribuíram para a vitória -se os salários, permitiu-se a entrada de capitais estrangei-
dos bolcheviques na guerra civil, estava o seu prestígio e o dos ros no país e foram retomadas as relações econômicas com
sovietes, que era grande entre a classe operária, porque ambos a Inglaterra e a Alemanha. Além disso, os investimentos
simbolizavam a nova ordem que havia derrotado o czarismo. foram dirigidos para os setores fundamentais da economia
– produção de energia e de matérias-primas básicas.
5.3. A Nova Política Econômica, Do ponto de vista econômico, a NEP foi um sucesso; fez
NEP (1921–1928) crescer a produção agrícola e industrial e impulsionou o
comércio. Em 1924, a produção industrial atingiu 50% e a
Os resultados econômicos do “comunismo de guerra” fo-
produção agrícola equiparou-se aos índices de 1913.
ram desastrosos: a produção declinou, pois os trabalhadores
não estavam habituados a gerir as empresas; a moeda foi
inflacionada e o comércio, paralisado. O bloqueio realizado 6. Stalinismo (1924–1953)
pelas potências capitalistas aumentava as dificuldades. As
medidas econômicas tornaram-se cada vez mais drásticas. 6.1. A disputa pelo poder
As indústrias pequenas, com cinco a dez operários, foram entre Stalin e Trotsky
estatizadas; os camponeses deveriam entregar a colheita ao
governo, salvo a parte destinada ao autoconsumo.

Trotsky Stalin
Lenin morreu precocemente, em 1924. Josef Stalin, secretá-
rio-geral do Partido Comunista, e Leon Trotsky, comissário do
povo para a guerra, passaram a travar uma luta ferrenha pelo
Cartaz da NEP poder, que resultou anos mais tarde no assassinato de Trotsky

42
e numa ditadura liderada por Stalin. A rivalidade entre os dois Num processo de industrialização acelerado, desenvolveu-
não era somente pelo controle do governo, mas também pelo -se a indústria pesada com a exploração de petróleo e de
tipo de socialismo a ser implantado. Trotsky acreditava que o carvão e minério de ferro, nos Urais, na Ásia Central e na
ideal socialista não deveria ficar centralizado na URSS, mas Sibéria. Em 1940, a eletrificação cresceu cerca de 80%
difundido pelo mundo (“revolução permanente”) sem ne- em relação a 1928 e a produção de aço cresceu cerca de
cessariamente ter a URSS como referência. Já Stalin possuía 450%, no mesmo período.
uma visão nacionalista e defendia a tese da “revolução num
só país” – na Rússia, no caso –, onde deveria primeiro consoli-
dar-se, assegurando sua independência pelo desenvolvimento
6.3. O Estado totalitário de Stalin
da produção pesada, o que em longo prazo tornaria o Exército Stalin implantou um governo centralizado no Partido Co-
Vermelho insuperável e instrumento para a revolução mundial. munista. Os políticos do Comitê Central eram controlados
diretamente por ele, por meio de uma burocracia distante
Stalin venceu a contenda, pois o poder do Partido Bolche-
do cotidiano da população. Esses burocratas formaram
vique, agora chamado de Partido Comunista da União So-
uma elite chamada de “nomenklatura”. Críticos da URSS
viética, PCUS, era maior do que o do Exército Vermelho.
chamavam-na burocracia de Estado.
Trotsky foi expulso do partido, do Exército, do próprio país
e refugiou-se na Turquia, de onde teve de fugir. Entretanto,
encontrado por um agente de Stalin no México, acabou
sendo assassinado em 20 de agosto de 1940.

6.2. Os planos quinquenais


A ascensão de Stalin assinalou o início de uma nova política
econômica. A NEP foi abandonada e foram adotados os planos
quinquenais.A Gosplan – comissão estatal de planejamento eco-
nômico – passou a se encarregar da planificação da economia.
Os dois primeiros planos quinquenais estabeleceram dois
objetivos básicos: criação de uma indústria pesada e coletivi-
zação forçada da agricultura, por meio da qual a propriedade
Cartaz com Stalin em propaganda de Estado.
privada da terra foi substituída por cooperativas agrícolas,
proprietárias da produção, mas não da terra (kolkhozes), e Para esmagar a resistência e moldar um novo tipo de
por fazendas estatais cujas terras, máquinas e produção eram cidadão, devidamente motivado e disciplinado, Stalin
do Estado (sovkhozes). A resistência dos camponeses foi mui- implantou um estado totalitário na Rússia. A revolução
to além das expectativas. Mataram o gado, inutilizaram as do totalitarismo4 englobou toda a atividade cultural:
ferramentas e, em muitas regiões, rebelaram-se abertamente meios de comunicações, literatura, artes, música, teatro
contra o regime. Stalin foi implacável. Mobilizou as forças do passaram a ser forçados a se submeterem à ideologia
Exército e fez cumprir o projeto de coletivização. Milhões de soviética. Na literatura, como em todas as artes, foi pro-
kulaks (proprietários rurais) foram deportados para os cam- mulgado um estilo oficial, chamado realismo socialista,
pos siberianos e condenados a trabalhos forçados. que deveria descrever o mundo tal como o partido o via
ou esperava moldá-lo. Compositores tiveram suas músi-
cas examinadas em busca de resquícios do espírito bur-
guês. Deveriam escrever melodias simples, adequadas
aos tempos heroicos. Em toda parte, cartazes enormes e
muito coloridos mostravam homens e mulheres radian-
tes, empenhados num trabalho árduo, chamando outros
multimídia: vídeo para que se juntassem a eles; muitas vezes Stalin, o pai
e líder sábio, era retratado entre eles. Da pré-escola à
Fonte: Youtube
universidade, a educação foi igualmente utilizada para
Stalin treinar cidadãos leais e obedientes. A propaganda sovi-
Ao longo de três décadas, Stalin assume o poder da Rús- ética encarregou-se do culto à personalidade de Stalin,
sia, trata a esposa terrivelmente e ordena atos de agres- que quase chegou à deificação.
são contra seu próprio povo. Sem confiar em ninguém, o 4
Regime político de força em que um grupo socialmente organizado apossa-
ditador age cruelmente até sua eventual queda e morte. -se violentamente dos poderes do Estado, concentrados em um só, o Execu-
tivo, cuja vontade arbitrária é imposta a todos os indivíduos.

43
O poder de Stalin exerceu os “grandes expurgos”, en-
tre os anos de 1936 e 1938, quando a oposição interna,
bem como membros do próprio Partido Comunista, foram
afastados, expulsos, eliminados ou presos nos gulags –
espécie de campos de concentração na Sibéria.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube
Doutor Jivago
Baseado no romance de Boris Pasternak, dr. Jivago é um
médico e poeta que inicialmente apoia a revolução russa,
mas, aos poucos, se desilude com o socialismo e se divide
entre dois amores: a esposa Tania e a bela plebeia Lara.

A indústria stalinista de reconstrução da história fazia coisas como esta.


Na foto acima, Lenin discursa para as tropas diante do Teatro Bolshoi,
em 1920, com Trotsky e Kamenev ao lado do palanque. Abaixo, um
retoque na foto os faz desaparecer, futuros inimigos e assassinados.

44
CONEXÃO ENTRE DISCIPLINAS

Atualmente, há poucos países no mundo que se reivindicam comunistas – é o caso de Cuba e da Coreia do
Norte. Este último país vem ganhando destaque midiático por sua postura agressiva no cenário internacional.
Corriqueiras manobras militares e testes nucleares foram executados próximos ao território japonês, causando
desconforto entre as grandes potências – EUA, China e Japão.
No âmbito interno, a Coreia do Norte é um país totalitário e economicamente frágil. Tal fato é constatado pela
abissal diferença econômica e social entre ela e sua vizinha Coreia do Sul.

Coreia do Norte Coreia do Sul


Área: 120.538 km² Área: 99.016 km²
PIB: 14.753 milhões de US$ PIB: 956.788 milhões de US$
PIB per capita: US$ 618 PIB per capita: US$ 9.841
População: 23.906.070 habitantes População: 48.332.820 habitantes
População urbana: 63% População urbana: 81,7%
Expectativa de vida: 67 anos Expectativa de vida: 78,2 anos
População subnutrida: 32% População subnutrida: menor que 5%

Kim Jong-Un, líder supremo da Coreia do Norte

45
DIAGRAMA DE IDEIAS

REVOLUÇÃO RUSSA

A CARACTERÍSTICAS B ANTECEDENTES

• REVOLUÇÃO SOCIALISTA
• PROLETARIADO É O AGENTE REVOLUCIONÁRIO ECONOMIA E SOCIEDADE
• FORTALECIMENTO DO MOVIMENTO SOCIALISTA • ATRASO ECONÔMICO
INTERNACIONAL • POUCA INDUSTRIALIZAÇÃO
• DEPENDÊNCIA DO CAPITAL ESTRANGEIRO
• BURGUESIA FRACA
• BAIXA PRODUTIVIDADE NO CAMPO
REVOLUÇÃO DE 1905
• CONSEQUÊNCIA DA GUERRA RUSSO-JAPONESA
CZARISMO
• LEVANTES OPERÁRIOS E MILITARES
• ATRASO POLÍTICO
• FORMAÇÃO DOS SOVIETS
• RESQUÍCIOS DO ABSOLUTISMO
• FORMAÇÃO DA DUMA
• CENSURA
• DIVISÃO DO PARTIDO SOCIAL DEMOCRATA RUSSO
• AUSÊNCIA DE LIBERDADES INDIVIDUAIS
• BOLCHEVIQUES: REVOLUÇÃO SOCIALISTA
• MENCHEVIQUES: REVOLUÇÃO LIBERAL BURGUESA
OPOSIÇÕES
PRIMEIRA GUERRA MUNDIAL • FORÇA DO SOCIALISMO
• RÚSSIA AO LADO DA TRÍPLICE ENTENTE • PARTIDO SOCIAL DEMOCRATA RUSSO
• BOLCHEVIQUES
• DERROTAS MILITARES
• MENCHEVIQUES
• CRISE ECONÔMICA
• FOME • PARTIDO SOCIAL REVOLUCIONÁRIO
• INFLAÇÃO • PARTIDO CONSTITUCIONAL DEMOCRATA (KADET)

C A REVOLUÇÃO DE 1917

REVOLUÇÃO DE FEVEREIRO REVOLUÇÃO DE FEVEREIRO


• GREVES GERAIS • RÚSSIA SE MANTÉM NA GUERRA
• EXÉRCITO SE OPÕE AO CZAR • NÃO HÁ REFORMA AGRÁRIA
• COMITÊ DA DUMA (GOVERNO PROVISÓRIO) • ASSEMBLEIA CONSTITUINTE NÃO SE FORMA
• CONTROLADO PELOS MENCHEVIQUES • BOLCHEVIQUES: “TODO PODER AOS SOVIETS”
• RESSURGIMENTO DOS SOVIETS • VITÓRIA
• BOLCHEVIQUES: “PÃO, PAZ E TERRA” • CONSELHO DOS COMISSÁRIOS DO POVO

D GOVERNO SOCIALISTA

I GOVERNO LÊNIN II GUERRA CIVIL E COMUNISMO DE GUERRA


• ABOLIÇÃO DA GRANDE PROPRIEDADE DE TERRA • EXÉRCITO VERMELHO × EXÉRCITO BRANCO
• INDÚSTRIA CONTROLADA POR TRABALHADORES • APROPRIAÇÃO COMPULSÓRIA DA PRODUÇÃO AGRÍCOLA
• AUTODETERMINAÇÃO DOS POVOS • ESTATIZAÇÃO DO SISTEMA FINANCEIRO
• SAÍDA DA GUERRA • VITÓRIA DO EXÉRCITO VERMELHO
• ACORDO BRIST-LITOVSKY • CRISE ECONÔMICA

46
das mercadorias e do capital financeiro – fez com que a
AULAS 43 E 44 burguesia ditasse as políticas que melhor conviessem à
reprodução do capital: a defesa da burguesia e dos seus
representantes nas instâncias institucionais da não inter-
ferência do Estado nas atividades do capitalismo. Durante
esse período, constituíram-se os trustes, os cartéis e as
CRISE DE 1929 E holdings. No final do século XIX, o capitalismo configu-
rou-se como imperialista: havia necessidade de assegurar
FASCISMO ITALIANO territórios no mundo como mercado consumidor para
a crescente produção de mercadorias, agora atingin-
do a superprodução, geradora de crises e da expansão
imperialista, que impõe os conflitos armados como ne-
cessidade de conquista e preservação dos mercados. A
superprodução, a política econômica liberal e a especu-
COMPETÊNCIAS: 1, 2, 3, 4, 5 e 6 lação financeira provocaram a primeira grande crise do
capitalismo, a Crise de 1929, cujas consequências foram
1, 2, 3, 4, 5, 6, 7, 8, 9,
devastadoras para o mundo capitalista.
HABILIDADES: 10, 11, 13, 14, 15, 16,
19, 20, 21, 22, 27 e 29

1. Crise de 1929
multimídia: livro

A crise de 1929 – Bernard Gazier


A crise de 1929 foi uma depressão generalizada da produ-
ção em quase todo o mundo industrializado. A cada dia,
multiplicavam--se as demissões em massa e os pedidos de
falência. O crash da Bolsa de Nova York causou um racha
jamais visto no mercado financeiro.

1.2. Antecedentes: a prosperidade


dos EUA e o american way of life
Como a Europa estava devastada economicamente pela
I Guerra Mundial, suas produções agrícola e industrial
caíram ao mesmo tempo em que as dívidas externas dos
países europeus cresceram, gerando dificuldades em abas-
tecer os mercados internos, africano, asiático e latino-ame-
Trabalhador varre o chão da Bolsa de Nova York ricano com suas mercadorias manufaturadas. A burguesia
após o crash de Wall Street, em 1929.
industrial estadunidense percebeu essa dificuldade euro-
peia e passou a acelerar sua produção industrial em busca
1.1. Introdução de penetrar esses mercados. Como as indústrias deveriam
O capitalismo nasceu sob a égide de ser mundial, como crescer em curto período, a burguesia fabril foi buscar capi-
capitalismo comercial, por meio da expansão ultramarina, tal na bolsa de valores, principalmente na de Nova Iorque.
no final do século XV. A Revolução Industrial consolidou o Com o aumento de mercado e o capital especulativo fi-
capitalismo como sistema econômico: o capitalismo sem nanciando a aceleração produtiva, os Estados Unidos pas-
necessidade de adjetivação, no final do século XVIII. Seu saram a desfrutar de um período de grande prosperidade.
caráter expansionista – acumulação de capital é cons- Na década de 1920 tornaram-se a nação mais próspera
tante através da produção industrial, da comercialização de todo o mundo, chegando a um índice de produção

47
industrial e agrícola jamais alcançado por qualquer nação
europeia.
O crescimento econômico dos Estados Unidos em alguns
setores estratégicos foi impressionante. A produção in-
dustrial cresceu 50% entre 1922 e 1929. Foram produ-
zidos 600 mil automóveis em 1928, o que correspondeu
a 75% da produção automobilística mundial. Os rádios,
“O melhor padrão de vida do mundo” e “Não há melhor estilo
cuja produção era mínima em 1920, atingiram 13 mi- de vida que o americano”, dizem as frases da propaganda.

lhões de unidades em 1929. Essa intensificação do ritmo


“Era a ‘sociedade do consumo’ – na qual a capacidade de
de crescimento da produção estadunidense deveu-se a
consumir era vista como o principal direito da cidadania. Não
dois fatores: aceleração do progresso técnico decorrente há dúvida de que a promessa de consumo em massa brota-
da racionalização da utilização da mão de obra (taylo- va no período. A nova indústria de propaganda e marketing
rismo e fordismo) e processo de concentração industrial, ajudada pelos jornais, revistas de grande circulação e rádio,
que aumentava a capacidade produtiva das empresas que atraía grande audiência, disseminou a ideia de liberda-
pela melhor utilização dos seus recursos. Por outro lado, de associada ao consumo em oposição à ideia da liberdade
os investimentos maciços ampliavam enormemente a associada a mudanças nas relações de trabalho. A busca por
produção, permitindo a redução dos preços, bem como autonomia econômica e soberania política foi substituída,
os investimentos crescentes dos capitalistas estaduniden- nas mentes de muitas pessoas, pelas possibilidades de con-
ses no exterior. sumo como o elemento essencial de felicidade e cidadania.”
KARNAL, L.; MORAIS, M. V. de; FERNANDES, L. E.;
PURDY, Sean. História dos Estados Unidos: das origens ao
século XXI. São Paulo: Contexto, 2014. p. 198.

A forma de vida típica dos estadunidenses, o american


way of life, passou a ser considerada modelo da moder-
na civilização ocidental: a construção de altíssimos edifí-
cios, a multiplicação das residências, dos carros, dos apare-
lhos domésticos. Esse estilo de vida atenuava as diferenças
sociais: o crédito permitia a todos adquirirem um carro ou
uma casa. O rádio e o cinema, bem como as diversões pú-
blicas, tiveram grande desenvolvimento.

Trabalhadores em linha de montagem nas indústrias de Henry Ford.

Por todas essas razões, os Estados Unidos concentravam,


em 1929, 44% da produção industrial do mundo. As socie-
dades financeiras constituídas para a formação de conglo- multimídia: livro
merados, as holdings, que dominavam um grande conjunto
de empresas, expandiram-se significativamente.
1929: a crise que mudou o mundo – Jayme Brener
O consumo crescia aceleradamente, alimentado por diver-
Entre as décadas de 1920 e 1930, a economia mundial
sas razões: aumento dos salários reais resultante dos ga-
saiu da euforia para a depressão. O desemprego e a fome
nhos de produtividade; destruição do espírito de poupança
chegaram a quase todos os cantos da terra. Depois daque-
por causa da crise monetária; ampliação dos seguros so-
les anos trágicos, o capitalismo nunca mais seria o mesmo.
ciais, que estimulavam o gasto em bens de consumo e ser-
viços; ampliação do crédito voltado para o consumo; baixa
dos preços agrícolas, que permitiu o deslocamento do po- 1.3. Os fatores da crise
der aquisitivo para o consumo de produtos industriais e
serviços; e, finalmente, atuação crescente da publicidade, 1.3.1. Superprodução agrícola
que estimulava o consumismo criando novas necessidades Com o aperfeiçoamento e desenvolvimento das técnicas
para os consumidores. agrícolas (eletrificação rural e mecanização da agricultura),
a produção do campo nos Estados Unidos atingiu altos índi- 1.3.3. Valorização irreal das ações1
ces. A Europa, devastada pela guerra, impulsionava a produ-
ção estadunidense por meio das importações; com a recupe-
e crack da Bolsa de Nova Iorque
ração europeia, elas foram reduzidas. Assim, formou-se um Percebendo o aumento dos lucros das indústrias, a po-
excedente de produção agrícola nos Estados Unidos que não pulação estadunidense passou a comprar cada vez mais
encontrava mercado consumidor, interna ou externamente. suas ações. O capital gerado por esses papéis era in-
A produção agrícola não consumida foi estocada para evitar vestido nas indústrias, que, ao obterem maiores lucros,
que um excesso de oferta baixasse demasiadamente os pre- provocaram o aumento dos preços das ações e, conse-
ços dos produtos. Desse modo, os fazendeiros tiveram que quentemente, o enriquecimento do proprietário das ações
arcar com as despesas de armazenagem que, em geral, foram que poderia vendê-las a um preço elevado. Nesse ambien-
tão altas que os obrigaram a hipotecar suas propriedades para te surgiu uma onda de especulação financeira na Bolsa de
poder pagá-las, baixando ainda mais seu poder de compra. Valores de Nova Iorque, cujo comércio de ações passou a
supervalorizar seus preços, baseado na suposição de que
1.3.2. Desaceleração do consumo seus valores sempre iriam crescer no futuro, dando uma
A indústria norte-americana crescera muitíssimo e os lu- falsa sensação para a classe média de que o lucro futuro
cros industriais também. Entretanto, o poder aquisitivo da seria uma certeza absoluta. Assim, a população estadu-
população não acompanhava esse crescimento industrial. nidense passou a usar suas economias e salários para a
Enquanto o valor dos produtos industriais subiu cerca de compra de ações.
10 bilhões de dólares entre 1923 e 1929, o aumento global
É interessante notar que, como o capitalismo era liberal,
dos salários não foi além de 600 milhões. Nessa situação,
com o crescimento dos salários menor que o aumento da o Estado não intervinha de maneira efetiva na economia.
produção, não era possível consumir boa parte do que se Da mesma maneira que o governo dava liberdade para a
produzia. Embora se comprasse mais que antes, essa de- pessoa lucrar, o Estado não iria proteger quem tivesse pre-
manda não acompanhava, na mesma proporção, o aumen- juízo, numa genuína política de liberdade econômica e de
to da produção. Além disso, os produtores agrícolas, que individualismo.
não encontravam compradores para seus excedentes, tam- De 1920 a 1929, incentivados pela aparente prosperida-
bém diminuíam o consumo de produtos industrializados. de, os norte-americanos compraram desenfreadamente
ações das mais diversas empresas, ações que atingiram
em pouco tempo cotações altíssimas, muito maiores que
o crescimento real das empresas. No momento em que
algumas delas faliram, os proprietários deram-se conta
de terem pagado muito mais por elas do que realmen-
te valiam. Em pânico, todos os investidores passaram a
multimídia: vídeo vender suas ações, provocando uma vertiginosa baixa no
Fonte: Youtube seu valor.
Entendendo a Crise de 29 (Dublado) No dia 24 de outubro de 1929, conhecido como Quin-
ta-feira Negra, a Bolsa de Valores de Nova Iorque sofreu
a maior baixa de sua história. Mais de 16 milhões de ações
não encontraram compradores. Esse episódio foi o estopim
para a grande crise e ficou conhecido como o crack da Bol-
sa de Nova Iorque.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube
A rosa púrpura do Cairo (1985)
Em área pobre de Nova Jersey, durante a depressão, uma
1
As ações são papéis que representam uma pequena parte do capital social
garçonete (Mia Farrow) que sustenta o marido bêbado e
de uma empresa. Ao comprar uma ação, o investidor se torna sócio da em-
desempregado, que só sabe ser violento e grosseiro, foge
presa que emitiu essa ação, passando a correr os riscos dos negócios junto
da sua triste realidade assistindo a filmes. com a empresa, e tendo participação nos lucros e prejuízos da mesma.

49
A retirada brusca dos capitais estadunidenses da Europa
provocou de imediato as falências do banco austríaco
Kreditanstaldt e dos Rothschild franceses, que arrastaram
consigo os bancos alemães Danatbank e Dresdner Bank.
Várias indústrias ligadas a esses bancos também faliram.
A produção industrial alemã caiu 39%, porcentagem que
correspondia aproximadamente à queda da produção em
todo o mundo, ao mesmo tempo em que o comércio inter-
nacional ficou reduzido em 25%.
O número de desempregados em todo o mundo variou
entre 25 e 30 milhões de pessoas, de 1929 a 1933. Na In-
glaterra, onde a exportação diminuiu 70% nesse período, o
número de desempregados atingiu 2,7 milhões em 1931.

Wall Street na Quinta-feira Negra. No plano político, as consequências não foram menos sig-
nificativas. O desemprego tinha profundas repercussões
1.3.4. Dependência mundial em sociais e as manifestações contra os governos sucediam-se
relação à economia dos EUA por toda parte. Os movimentos políticos pregavam solu-
ções radicais e encontravam numerosos adeptos entre os
A economia estadunidense era o carro chefe do capita- descontentes. Os partidos socialistas viram crescer rapida-
lismo mundial. Entre outros fatores, os Estados Unidos mente suas fileiras. Contra eles surgiram os partidos fascistas
detinham 45% do ouro mundial e eram o grande centro eco-
– antiliberais e antidemocráticos –, que defendiam a for-
nômico; deles dependiam para importações e exportações
mação de governos autoritários para reprimir as agitações
quase todas as nações capitalistas. Foi com grande rapidez
das massas desempregadas.
que a crise afetou outros países.
O Brasil foi um dos países que mais sofreu com a crise.
Somente em 1929, os estadunidenses haviam emprestado
Seu produto principal era o café, responsável por 70% das
a vários países 7 bilhões e 400 milhões de dólares, que
reverteram em importações de produtos americanos. Com exportações, das quais os Estados Unidos eram os maio-
a crise, os capitais foram repatriados, reduzindo as impor- res compradores e consumidores. Além da diminuição do
tações dos países estrangeiros a 32% do que tinham sido. consumo, a crise de 1929 trouxe o abandono da política
As importações dos Estados Unidos, que eram de 4 bilhões de estocagem, pois os bancos estrangeiros não estavam
e 300 milhões de dólares em 1929, reduziram-se a 1,3 bi- mais em condições de financiá-la. A impossibilidade de
lhão de dólares em 1933. manter a estocagem fez com que todo o café existente
fosse posto abruptamente à venda no mercado mundial,
Como o frenesi do lucro do comércio de ações chamou a
forçando a baixa vertiginosa dos preços. Esse produto pas-
atenção da elite mundial, a Bolsa de Valores de Nova Iorque
sou a representar apenas 53% das exportações brasileiras.
passou a movimentar o capital de grande parte do plane-
ta quando houve a quebra. As falências espalharam-se por Nos Estados Unidos, o otimismo cedeu lugar ao medo. Em
todo o mundo, inclusive na economia cafeeira da República três anos, quatro mil bancos faliram, 14 milhões de pes-
brasileira. Como a URSS possuía uma economia planificada, soas ficaram desempregadas, os salários caíram 40% e a
sua economia passou à margem da depressão capitalista. renda nacional foi reduzida em 50%. Entre 1929 e 1932, a
renda familiar nas pequenas propriedades caiu 60% e um
1.4. Consequências da crise terço dos proprietários rurais perdeu suas terras. Trabalhadores
rurais, brancos e negros, perambulavam de cidade em cida-
de em busca de comida e trabalho.
Milhões de solteiros desempregados com rostos magros e
roupas velhas caminhavam penosamente pelas ruas de todas
as cidades procurando empregos inexistentes. Favelas prolife-
ravam nas periferias das cidades do Oeste. Chamadas hoo-
vervilles, eram uma ironia ao odiado presidente americano.2

Investidor falido põe seu Cadillac Fleetwood à 2


Herbert Hoover, presidente dos Estados Unidos entre 1929 e 1933.
venda por 100 dólares em Wall Street.

50
1.4.1. O New Deal
A Depressão atingiu profundamente a população estaduni-
dense, que foi obrigada a enfrentar um período de desem-
prego nunca visto. Milhares de desempregados tornaram-se
mendigos. Como o desemprego era estrutural, não havia
perspectiva de melhoria de vida no campo ou nas cidades;
contudo, os camponeses sentiam-se mais isolados e provo-
caram um gigantesco êxodo rural, inchando as cidades. A
criação do Super-homem, herói de revista em quadrinhos, fez
parte desse momento. O povo estadunidense precisava de
qualquer alento para suas dificuldades, mesmo que fosse um
ser com poderes fantásticos saído do universo da imaginação.

Família desempregada e miserável em uma hooverville, em


Elm Grove, Califórnia

A vida econômica e social das famílias durante a Depres-


são mudou. Para economizar, muitas delas alugaram quar-
tos ou dividiram casas com parentes e outras famílias. Sem
emprego ou forçados a pedir assistência, muitos homens
abandonaram suas famílias. Taxas de fecundidade e ca-
samento diminuíram pela primeira vez no país desde os
primeiros anos do século XIX.

Super-homem em edição do final da década de 1930.

O candidato do Partido Democrata à presidência, Franklin


Delano Roosevelt, ganhou as eleições de 1932 com a pro-
messa de restaurar a confiança na economia e na socieda-
de. Como faziam os políticos do mundo inteiro na época,
fossem os sociais-democratas da Europa, os stalinistas da
Rússia ou os populistas da América Latina, Roosevelt reco-
Fila para receber pão durante a Depressão. nheceu que a intervenção estatal massiva era necessária
para salvar o sistema econômico e aliviar o conflito social.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube
Loucura americana (1932)
Durante a era da grande depressão estadunidense, um
homem toma uma posição corajosa diante do imenso
poder das corporações, ao passo que os Estados Unidos
passam por sua maior catástrofe econômica.
Franklin D. Roosevelt

51
Ao tomar posse em 1933, Roosevelt lançou o New Deal, precisamente, quando os estadunidenses envolveram-se
um pacote de reformas baseado nas ideias do economista no conflito (dezembro de 1941), o fantasma da Depres-
inglês John Maynard Keynes (keynesianismo) – para pro- são foi afastado. A guerra constituiu a saída “natural”
mover a recuperação industrial e agrícola, regular o siste- para a maior crise do sistema capitalista, uma vez que
ma financeiro e providenciar mais assistência social e obras possibilitou uma redivisão de mercados e uma retomada
públicas. Para acelerar a solução da crise, Franklin Delano plena do crescimento econômico.
Roosevelt propôs o fim do liberalismo e a tutela do capita-
lismo pelo Estado, que passaria a intervir na economia para
nivelar a oferta e procura, evitando dessa maneira novas
crises de superprodução e ondas especulativas.
Dentre as medidas implementadas com o New Deal, eis
as principais:
§ concessão de créditos aos bancos para frear as falên- multimídia: livro
cias no setor;
§ criação de um fundo para resguardar os depósitos po- As vinhas da ira – John Steinbeck
pulares nos bancos; É o primeiro livro de John Steinbeck, ganhador do Prêmio
§ criação de um banco para financiar as exportações; Nobel de Literatura. O clássico conta a história da família
Joad, que abandona as terras onde vivia há gerações, no
§ concessão de crédito aos fazendeiros endividados; estado de Oklahoma, por causa de uma grande seca.
§ lançamento de um programa de grandes obras públi-
cas (estradas, sistemas de irrigação, barragens hidrelé-
tricas, etc.) para diminuir o desemprego;
2. Fascismo italiano
§ criação do seguro-desemprego;
§ limitação da jornada de trabalho;
§ aumento dos salários dos operários;
§ fixação de um salário mínimo;
§ ampliação do sistema de previdência social;
§ proibição do trabalho infantil.

Benito Mussolini

2.1. Introdução
Após a Primeira Guerra Mundial, a Europa estava pas-
sando por um momento delicado, pois a devastação pelo
conflito tinha arruinado a economia e, consequentemente,
a burguesia passou a perder o controle do Estado. O libe-
Programa de obras públicas implementado com o New Deal. ralismo parlamentar ficou desacreditado devido ao grande
contingente de desempregados e famintos. Para aumentar
Os resultados decorrentes da aplicação do New Deal não o medo no interior da sociedade capitalista, havia o fato
tardaram. O número de desempregados foi reduzido de da Rússia ter tornado-se socialista, o que incentivou a di-
14 para 7,5 milhões entre 1933 e 1937; os preços subi- vulgação do marxismo-leninismo entre os sindicatos. Foi
ram 31%; a produção industrial, 64%; a renda nacional, nesse contexto que a burguesia aproximou-se das ideolo-
70%; e as exportações, 30%. No entanto, apenas com gias totalitárias de extrema direita, como um instrumento
a eclosão da II Guerra Mundial (1939 – 1945), ou, mais para repelir os movimentos operários e manter-se no poder.

52
§ Expansionismo – necessidade básica para os “povos
vigorosos e dotados de vontade”, plenamente justifi-
cado como forma de restabelecer o poderio do Império
Romano, no caso italiano.
§ Militarismo – essencial à expansão e à afirmação do
elemento nacional e racial. A vida militar é sinônimo de
multimídia: vídeo cooperação do grupo, inerente aos “povos vigorosos”
na marcha para subjugar os “fracos e degenerados”;
Fonte: Youtube
reforça os laços entre poder econômico e poder militar
Mussolini, A História Não Contada Ep 1 e desdobra-se necessariamente no expansionismo.
§ Totalitarismo – submissão de todos aos interesses do
2.2. Ideologia fascista Estado forte e inquestionável, catalisador da vontade na-
A palavra "fascismo" tem suas origens no termo latino fasci, cional, elemento de preservação da identidade da nação; o
"feixe". Na Roma Antiga, representava um símbolo e um que conta são os deveres do indivíduo para com o Estado.
princípio de autoridade. O feixe de varas paralelas, entre- § Culto à personalidade do líder – guia infalível,
cortadas por um machado, era um símbolo da autoridade encarnação da vontade nacional, zelador da preserva-
dos magistrados romanos. O movimento fascista, nascido ção da vontade nacional, graças à pureza da raça, à
na Itália no período entreguerras, valeu-se dessa simbolo- integridade do Estado e do partido-Estado; o fanatismo
gia e acrescentou-lhe novos significados. transforma o culto ao líder em uma apoteose mística,
sendo o “Duce é infalível”.
§ Unipartidarismo – uma vez que o pluripartidarismo,
a democracia e o parlamentarismo são causadores de
dissensão e conduzem à divisão da sociedade, o parti-
do único encarna e preserva a vontade da nação, con-
funde-se com o próprio Estado e, por extensão, com a
própria vontade nacional;
§ Corporativismo – à moda sindical, baseiam-se em
corporações, no interior das quais patrões, empregados
e representantes do Estado encarregam-se de planejar
a produção e decidir sobre os conflitos entre capital e
trabalho; típico da Itália, o corporativismo assumiu ou-
tras características na Alemanha.
§ Anticomunismo – a união e a harmonia das classes
devem ser defendidas em prol do desenvolvimento
da nação e não a luta de classes, como defendiam
os comunistas.

Fasci, símbolo do fascismo, na bandeira do Partido Nacional Fascista. 2.3. A Itália no pós-guerra:
Dentre os princípios da ideologia fascista, destacam-se: origens do fascismo
§ Nacionalismo exacerbado – para os fascistas, a Em 1914, quando do início da Primeira Guerra Mundial, a
nação é o bem supremo; em nome dela, qualquer tipo Itália rompia com a Tríplice Aliança e declarava sua neutra-
de sacrifício deve ser exigido dos indivíduos; há de ser lidade no conflito. Em 1915, no entanto, abandou seu não
cultuada, mistificada, preservada suas origens e manti- alinhamento para se aliar à Tríplice Entente.
da a “pureza” do povo.
Em 1918, ao fim das operações militares, o custo da par-
§ Racismo – com vistas a “purificar” o elemento nacional ticipação italiana na guerra atingia o montante de 15 bi-
de qualquer tipo de “contaminação” do sangue, há de lhões de dólares, uma dívida de 4 bilhões de dólares com
se cultuar as origens germânicas (Alemanha e Áustria), os Estados Unidos e Inglaterra, além de 500 mil mortos e
latinas (Itália), hispânicas (Espanha), lusitanas (Portugal) 700 mil feridos. Das vastas compensações territoriais que
etc.; o racismo alimenta-se do nacionalismo e vice-versa. lhe haviam sido prometidas, a Itália recebeu apenas o

53
Trentino, o Tirol do Sul e a Veneza-Giulia, pertencentes à Benito Mussolini (1883-1945) nasceu na Romagna, em
Áustria. A Itália não tinha conseguido obter nos tratados uma família pobre. Seu pai era ferreiro e socialista. Cresceu
do pós-guerra algumas possessões territoriais que ambi- nos ambientes anarquistas e socialistas italianos, tendo
cionava, como a Dalmácia, que permaneceu ligada à Iu- passado a integrar os quadros do Partido Socialista. En-
goslávia. A insatisfação com os poucos territórios recebidos tre 1912 e 1914 tornou-se redator do jornal Avanti, que
serviu para alimentar o nacionalismo italiano, uma vez que defendia a neutralidade e o pacifismo. Em 1914, mudou
a Itália achava-se “vencida no campo dos vencedores”. bruscamente de opinião e fundou o jornal Pópolo d’Itália,
sustentado pelos subsídios da embaixada francesa, que
Os problemas sociais e econômicos agravaram-se depois
defendia a entrada da Itália na guerra ao lado dos alia-
da guerra. A inflação, o desemprego de um milhão de
dos. Por isso foi expulso do Partido Socialista. Alistou-se no
soldados de volta da guerra, a alta do custo de vida, a
Exército italiano e foi gravemente ferido. Voltou a dirigir seu
desvalorização da moeda (lira) e a queda da produção
jornal em 1919, defendendo o direito de trabalho para os
industrial desencadearam uma crise sem precedentes na
antigos combatentes e a necessidade de profundas refor-
história da Itália. O Partido Socialista ampliava sua base
mas sociais por meio de um regime forte e ditatorial.
de apoio, conquistando, em 1919, um terço das cadeiras
da Câmara. Os negócios encontravam-se parcialmente Nesse contexto, em março de 1919, Benito Mussolini fun-
paralisados pelas contínuas greves e falta de mercados dou o Partido Fascista Italiano, cujos membros provinham
externos. Em 1920, para combater as greves, algumas in- das mais variadas tendências: nacionalistas extremados,
dústrias decidiram paralisar suas atividades, mas 600 mil anarcossindicalistas e sobretudo ex-combatentes desocu-
operários ocuparam-nas e passaram a administrá-las por pados, apoiados e financiados por alguns industriais. Nas
meio de conselheiros de fábricas eleitos. eleições daquele ano, os fascistas foram fragorosamente
derrotados, enquanto os socialistas obtinham a maioria
No campo a situação não era diferente. O exército italiano, for-
das cadeiras do Parlamento. O fracasso mostrou a Musso-
mado basicamente de camponeses, ao voltar da guerra passou
lini as deficiências do partido. Pôs-se então a reorganizá-lo
a exigir uma reforma agrária que lhes havia sido prometida.
em moldes militares, criando milícias e grupos civis arma-
Passaram então a ocupar a terra e, por meio de cooperativas,
dos, rigidamente disciplinados. Essas formações parami-
a administrá-las. O exemplo da Revolução Russa estimulava as
litares eram compostas pelos esquadristas, membros do
agitações operárias e camponesas e assustava a burguesia e
partido que usavam camisas negras como símbolo de luto
os latifundiários. Temendo uma revolução, os grandes indus-
pela Itália e que obedeciam cegamente ao chefe, o Duce.
triais italianos queriam um Estado forte que a impedisse.
Essas tropas de choque do partido utilizavam a violência
para atacar seus adversários.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube
multimídia: vídeo
Ditadores - Ascensão do Fascismo (Legandado)
Fonte: Youtube
Vencer (2009)
2.4. Fundação do Partido Fascista Ida Dalser (Giovanna Mezzogiorno) conheceu Benito
Mussolini (Filippo Timi) quando ele era apenas um mili-
tante socialista radical. Fascinada por ele, resolve se des-
fazer de suas posses para ajudá-lo no jornal Il Poppolo
d’Italia e na criação do Partido Fascista.

2.5. Marcha sobre Roma e


ascensão de Mussolini
Em 1919, o número de grevistas chegou a quase um mi-
lhão; em 1920, a dois milhões. Também em 1920, os socia-
Benito Mussolini listas assumiram o controle de 100 fábricas e procuraram

54
administrá-las por conta própria. Pouco depois, organiza-
ram-se na zona rural as chamadas Ligas Vermelhas, pre-
gando a repartição das propriedades rurais.

multimídia: livro

Fascistas – Michael Mann


Quem eram os fascistas, de onde vieram, quais eram su-
as motivações, seus valores e como chegaram ao poder?
Mann analisa o surgimento na Europa de regimes autori-
tários de extrema direita, após a Primeira Guerra Mundial,
e os principais redutos fascistas no velho continente. Ele
Mussolini, no centro, na Marcha Sobre Roma. 1922. aponta sinais do fascismo ainda evidentes em diferentes
partes do mundo.
Diante da agitação social e política e da consequente ame-
aça de uma revolução socialista, o fascismo fortaleceu-se
com o apoio da classe média e o financiamento de gran-
des banqueiros, industriais e latifundiários. Nas eleições de 2.6. Governo fascista
1921, o Partido Fascista conseguiu eleger 35 deputados. Em 1923, paralelo ao Conselho de Ministros, Mussolini criou
Os camisas negras fascistas invadiam e destruíam sindica- o Grande Conselho Fascista, composto pelos principais che-
tos, assassinavam líderes socialistas, dissolviam manifesta- fes do partido. Ao lado do exército regular, transformou a
ções espancando os participantes e arrasavam as instala-
milícia fascista (camisas negras) em órgão de segurança na-
ções dos jornais que os criticassem.
cional, sob o comando do chefe de governo.
A ação terrorista dos camisas negras foi possível de-
Realizaram-se, em 1924, eleições para o Parlamento. Por
vido à conivência do Exército, da polícia e do Poder
meio do terror, os fascistas obtiveram 65% dos votos. Mus-
Judiciário. O rei Vitor Emanuel III, o primeiro-ministro Giolit-
solini foi contemplado por um dócil Parlamento, agora livre
ti e as instituições do aparelho estatal fechavam os olhos à
de opositores reais e com plenos poderes.
agressão contra os socialistas, pois imaginavam mais tarde
poder destruir os camisas negras, retomar o controle so- Em 1925, Mussolini promoveu uma série de medidas re-
bre os fascistas e manter o poder com mais estabilidade. pressivas: dissolveu as organizações que considerava sub-
Enganaram-se. A violência fascista rapidamente atingira versivas, fechou os clubes de oposição, ordenou buscas
também os liberais. e prisões, ampliou a censura à imprensa e aumentou as
Nas eleições de 1921, quatro diferentes partidos conquista- verbas destinadas às milícias fascistas.
ram forte representação na Câmara. Os dois maiores, o Parti- Após um atentado sofrido pelo Duce, em 1926, os jornais
do Socialista e o Partido Popular (católico) não entravam em da oposição foram fechados, os partidos dissolvidos e seus
acordo, inviabilizando a estabilização do governo parlamentar. membros perseguidos. A pena de morte foi restaurada,
criando-se tribunais especiais compostos por membros da
Aproveitando a total desorganização do regime parlamentar,
milícia fascista. As formações paramilitares tornaram-se
Mussolini ordenou aos camisas negras a Marcha sobre Roma,
oficiais e, de 300 mil homens, em 1925, chegaram a 750
em outubro de 1922. Cerca de 30 mil fascistas desfilaram
mil, em 1930. Em 1939, o Parlamento foi suprimido e seus
pela capital e exigiram a entrega do poder. O rei Vitor Ema-
membros substituídos pelo Grande Conselho Fascista. No
nuel III, pressionado por militares, pela alta burguesia e pelos
período de 1927 a 1934, mais de cinco mil pessoas foram
latifundiários, convidou Mussolini para ocupar o cargo de
condenadas por oposição ao regime, algumas à pena ca-
primeiro-ministro. Sob a aparência de uma monarquia parla-
pital, outras à prisão perpétua. Milhares de pessoas foram
mentarista, o líder fascista detinha plenos poderes e convo-
deportadas. Essa tarefa coube à polícia política, a Ovra.
cou um novo ministério. Estava formado um novo governo,
cujos cargos essenciais eram dominados pela maioria fas- Elaborada em 1927, a Carta del Lavoro (Carta de Traba-
cista. Mussolini passou a se servir das instituições do Estado lho) foi um documento que regulou as relações de trabalho
como instrumento de destruição da democracia parlamentar na Itália fascista por meio do corporativismo, de acordo
e de instauração da ditadura fascista. com o qual os trabalhadores foram reunidos em sindica-

55
tos fascistas e os proprietários, em federações industriais.
Ambas as organizações eram agrupadas nas corporações
presididas por um delegado nomeado por Mussolini, se-
gundo profissão ou ramo de atividade. Dessa maneira, a
solução dos conflitos entre patrões e empregados passou a
ser dada pelo Estado, que intervinha e regulava as relações
de trabalho e a economia.
Um acordo com o papa Pio XI resolveu a chamada Questão
Romana, pendente desde a unificação e que fora finalmen-
te resolvida pelo Tratado de Latrão, de 1929. O papa
recebeu a soberania sobre o Vaticano e uma indenização
pela perda dos antigos Estados Pontifícios. O catolicismo
era reconhecido como religião oficial, os casamentos re-
ligiosos tinham o mesmo valor dos casamentos civis e o
ensino religioso seria dado nas escolas. Esse acordo deu o
apoio dos católicos a Mussolini que, entretanto, manteve a
interdição sobre o Partido Popular e sobre a livre publica-
ção de textos pelas editoras católicas.

Mussolini e Hitler

Assinatura do Tratado de Latrão, 1929.


multimídia: vídeo
O esforço de industrialização foi acelerado a partir de 1927 Fonte: Youtube
com a estabilização do valor da lira (moeda italiana). Cres-
Amarcord (1973)
ceram a produção de energia elétrica e a construção naval,
Em uma cidade italiana, o jovem Titta (Bruno Zanin) está
aeronáutica e de automóveis, que, em 1938, era a sexta
sempre aprontando com seus amigos e observa várias
indústria do setor no mundo. Em consequência, cresceram
personalidades excêntricas locais que se comportam de
também a indústria siderúrgica e a indústria mecânica. Es-
forma absurda.
sencialmente concentrado nas grandes cidades do norte
da Itália, o arranque industrial agravou ainda mais a divi-
são econômica e social entre o norte e o sul do país.
Durante a década de 1930, cresceu a intervenção estatal
na economia, que incrementou a indústria bélica. O país
militarizou-se, iniciando a escalada expansionista. Em
1935, a Etiópia foi ocupada pelas forças italianas e, em
1939, foi a vez da Albânia. O país aproximou-se da Ale-
manha nazista, assinando, em 1939, com Hitler, o Pacto
de Aço, caminho traçado para a Segunda Guerra Mundial.

56
CONEXÃO ENTRE DISCIPLINAS

A crise de 2008
O crédito fácil e a disseminação de um investimento “podre” pelo mundo todo estão na raiz da crise financeira
de 2008. Por volta de 1998, os bancos dos Estados Unidos começaram a emprestar dinheiro a muita gente que
não tinha como pagar. Mesmo quem estava desempregado podia absorver facilmente crédito. Caso o indivíduo
tivesse uma casa, poderia deixá-la como garantia para conseguir ainda mais empréstimos. Tais tipos de créditos
são chamados de subprime, ou créditos de segunda linha, e atingiram patamares exorbitantes na véspera da crise.
Como esses tomadores de empréstimos não tinham como honrar seus compromissos, diversos bancos estaduni-
denses entraram em colapso, contaminando todos aqueles que possuíam títulos desses bancos em todo o mundo.
Seguiu-se que a crise financeira alcançou a economia real, gerando desemprego e falências, o que obrigou
diversos governos a injetarem bilhões na economia com o intuito de conter o ciclo de quebras. Até hoje, muitos
países ainda não retomaram o nível de emprego anterior à crise. As cicatrizes de 2008 ainda estão expostas.

Homens carregam placa do banco Lehman Brothers, que entrou em falência durante a crise de 2008.

57
DIAGRAMA DE IDEIAS

CRISE DE 1929

A CARACTERÍSTICAS B ANTECEDENTES

• CRISE EM MÚLTIPLAS ÁREAS: • HEGEMONIA CAPITALISTA DOS EUA


• CAPITALISMO • SISTEMA FINANCEIRO CUSTEIA A PRODUÇÃO
• SUPERPRODUÇÃO • ALTO CRESCIMENTO PRODUTIVO
• CAPITAL ESPECULATIVO • FINANCIAMENTO DOS EUA NA EUROPA
• LIBERALISMO • FORMAÇÃO DE GRANDES CONGLOMERADOS
ECONÔMICOS
• VENDA DE AÇÕES NA BOLSA DE VALORES
C FATORES
• “AMERICAN WAY OF LIFE” (ALTO CONSUMO)

SUPERPRODUÇÃO AGRÍCOLA
• DESENVOLVIMENTO TÉCNICO
• RETRAÇÃO DO CONSUMO MUNDIAL DESACELERAÇÃO DO CONSUMO
• GASTO COM ESTOCAGEM • SUPERPRODUÇÃO
• SALÁRIOS NÃO ACOMPANHAM O
CRESCIMENTO PRODUTIVO
VALORIZAÇÃO IRREAL DAS AÇÕES
• ALTA PROCURA POR AÇÕES INDUSTRIAIS ECONOMIA MUNDIAL
• AUMENTO NO VALOR DAS AÇÕES • DEPENDÊNCIA DO CAPITALISMO MUNDIAL DA
(LEI DA OFERTA E DA PROCURA) ECONOMIA DOS EUA
• FALÊNCIA DE INDÚSTRIAS • BOLSA DE NOVA IORQUE MOVIMENTA CAPITAL
• VENDA DAS AÇÕES POR BAIXO VALOR MUNDIAL
• CRASH DA BOLSA DE NOVA IORQUE • URSS NÃO É AFETADA

D CONSEQUÊNCIAS E NEW DEAL

• FALÊNCIA DOS BANCOS MUNDIAIS • VITÓRIA DE FRANKLIN DELANO


• GRANDE DEPRESSÃO ROOSEVELT NA PRESIDÊNCIA
• DESEMPREGO • IDEIAS KEYNESIANAS
• FOME • INTERVENÇÃO DO ESTADO NA
• PERDA DE TERRAS ECONOMIA
• FORTALECIMENTO DO SOCIALISMO • FIM DO LIBERALISMO
• SURGIMENTO DE IDEIAS ANTILIBERAIS • EXPANSÃO DE CRÉDITO
E ANTIDEMOCRÁTICAS (FASCISMO) • SEGURO SOCIAL
• OBRAS PÚBLICAS
• RETOMADA ECONÔMICA

58
FASCISMO ITALIANO

A CONTEXTO B PARTIDO FASCISTA

• INSATISFAÇÃO ITALIANA APÓS 1ª GUERRA • CRIADO POR BENITO MUSSOLINI (“DUCE”)


• PROBLEMAS ECONÔMICOS E SOCIAIS • ORGANIZAÇÃO COM ESTRUTURA MILITAR
• FORTALECIMENTO DO MARXISMO LENINISTA • MILÍCIA - CAMISAS NEGRAS
• GREVES E OCUPAÇÃO DE TERRAS • ANTICOMUNISTA
• BURGUESIA DESEJA ESTADO FORTE • APOIO DA BURGUESIA E DOS MILITARES

C IDEOLOGIA D ASCENSÃO

• NACIONALISMO EXACERBADO 1919


• RACISMO • FUNDAÇÃO DO PARTIDO
• EXPANSIONISMO • DERROTA ELEITORAL
• MILITARISMO 1921
• TOTALITARISMO • ELEIÇÃO DE 35 DEPUTADOS
• CULTO AO LÍDER 1922
• UNIPARTIDARISMO • MARCHA SOBRE ROMA
• CORPORATIVISMO • MUSSOLINI SE TORNA 1º-MINISTRO DO REI
• ANTICOMUNISMO • GOVERNO REPUBLICANO ASSINA O ARMISTÍCIO

E GOVERNO

• 1923: CONSELHO FASCISTA


• 1924: MAIORIA PARLAMENTAR
• 1925: CENSURA
• 1927: “CARTA DEL LAVORO” / CARTA DE TRABALHO (CORPORATIVISTA)
• RETOMADA ECONÔMICA
• 1929: TRATADO DE LATRÃO: APOIO DA IGREJA CATÓLICA
• ANOS 1930: CONTROLE DO ESTADO NA ECONOMIA
• 1935: OCUPAÇÃO DA ETIÓPIA
• 1939: FECHAMENTO DO PARLAMENTO
• “PACTO DE AÇO” COM ALEMANHA NAZISTA
INCIDÊNCIA DO TEMA NAS PRINCIPAIS PROVAS

Aborda as principais transformações socioeco- As temáticas do Estado Novo (1937-1945), República Liberal
nômicas e culturais que permearam o período ou Populista e ditadura militar são abordadas por meio da
interação dos aspectos econômicos, sociais e culturais. Para
das temáticas estudadas, exigindo capacidade
tanto, utiliza-se de imagens, tabelas e textos para compor
de interpretação textual aliada a conhecimentos questões.
aprofundados sobre o assunto. É aconselhável
manter-se atentos aos temas da
atualidade.

Com forte teor de análise social, econômica Existe um grau de interdisciplinaridade que permite o uso Aborda aspectos sociais, econômicos e culturais que perme-
e cultural, a prova fornece aos candidatos um dos conhecimentos históricos para auxílio da resolução dos aram o período do Estado Novo (1937-1945), República
desafio quando a temática é Estado Novo exercícios e escrita da redação, no qual paralelos podem Liberal ou Populista e a ditadura militar. Elabora questões
(1937-1945), República Liberal ou Populista e ser traçados sobre a importância desses processos na com uso de imagens, charges e textos médios/grandes como
ditadura militar. Vale estudar os processos histó- construção da República Brasileira. auxílio para a pergunta.
ricos relacionados aos períodos.

Nos últimos vestibulares, consta a presença das Nos últimos vestibulares, percebe-se uma Os últimos vestibulares abordaram as temáticas: Nos últimos três anos, as temáticas do Estado
temáticas estudadas neste livro. A abordagem tendência em abranger temas relacionados à His- Estado Novo (1937-1945) e os governos que Novo (1937-1945), República Liberal ou Populista
prioriza uma integração entre Medicina e História, tória do Brasil. Nota-se uma ênfase em questões compreendem e caracterizam o período da e ditadura militar têm tido presença e exigem do
principalmente voltada para temas como as vacinas relacionadas aos aspectos sociais, econômicos e República Liberal ou Populista, por meio de uma candidato análise de documentos escritos, imagens e
e interações com a população durante o período políticos que caracterizam o período do Estado correlação entre os aspectos sociais, econômicos debates historiográficos.
do Estado Novo. Novo (1937-1945). e políticos.

UFMG

Por meio das correlações entre os aspectos sociais, A banca do vestibular privilegia que o candidato No vestibular não são contemplados diretamente
políticos, econômicos e culturais, o vestibular realize análises e interpretações sobre diferentes temas de História, entretanto, há um grau de
aborda as temáticas Estado Novo (1937-1945) e processos históricos. Assim, na elaboração das interdisciplinaridade que permite o uso dos conhe-
ditadura militar. Utiliza textos introdutórios, charges questões sobre Estado Novo (1937-1945) e cimentos históricos para auxílio da resolução dos
e imagens para elaborar suas questões. ditadura militar são utilizados trechos de registros exercícios, interpretação de tabelas e imagens e
documentais e imagens. escrita da redação.

O vestibular realiza análises de estruturas Percebe-se uma tendência em temas relaciona- A banca do vestibular elabora questões de
históricas brasileiras em suas questões, que dos à História do Brasil contemporâneo, mas há múltipla escolha direcionadas aos candidatos
propõem aos candidatos uma reflexão sobre um grau de interdisciplinaridade que permite que pretendem uma vaga nos cursos de
as temáticas estudadas, relacionando-as com o uso dos conhecimentos históricos para Enfermagem, Biomedicina e Medicina. Há uma
pertinências contemporâneas, como precon- auxílio da resolução dos exercícios e escrita tendência em abordar temas contemporâneos.
ceito e desigualdade social. da redação.
HISTÓRIA DO BRASIL

61
A ditadura getulista, denominada Estado Novo, permite com-
AULAS 35 E 36 parar o significado histórico das organizações políticas e socio-
econômicas em escala local, regional e mundial, na medida em
que algumas ações de Vargas e da classe dominante brasileira
assemelham-se aos princípios e mecanismos de controle usa-
dos pelo fascismo italiano e pelo nazismo alemão: exaltação
ESTADO NOVO do ideal nacionalista, repressão exacerbada aos opositores –
(1937-1945) no limite pela eliminação física deles – e controle da educação.
Trata-se, também, de identificar o papel dos meios de comu-
nicação na construção da vida social daquele momento, de
como o ditador Getúlio Vargas fez uso do seu carisma asso-
ciado ao controle dos meios de comunicação pela agência
especializada DIP, Departamento de Imprensa e Propagan-
da, e ao uso do rádio pelo noticioso “Hora do Brasil”. O DIP
COMPETÊNCIAS: 1, 2, 3, 4, 5 e 6 cuidava da imagem do presidente e organizava suas apari-
ções em eventos públicos, divulgava cartas e documentos
1, 7, 10, 11, 13, 14, 15,
HABILIDADES: oficiais e promovia a censura dos meios de comunicação e
18, 19, 21 e 22
das manifestações culturais – música e literatura.
A ditadura de Vargas assumiu um caráter personalista sem
se apoiar em doutrinas ou partidos políticos, aliás, ordenou

1. Introdução
o fechamento de todos –, o que não significou desvincula-
mento dos interesses de grupos representantes da classe
dominante e de setores conservadores da sociedade.
Embora não houvesse espaço para uma política sistemá-
tica de antissemitismo e houvesse no governo quem sim-
patizasse com essas orientações, determinados grupos
étnicos sofreram mais discriminação social e política. Mas
o personalismo de Vargas o indispôs com os integralistas,
que esboçaram uma tentativa de tomada do poder, deno-
minada Intentona Integralista, em 1938.

1.1. Aspectos políticos e econômicos


A ditadura varguista foi marcada pela rígida centralização
política – todos os poderes concentrados nas mãos do di-
tador –, representada por órgãos como o Departamento de
Administração do Serviço Público, DASP, responsável pelo
Desfile de 1.º de maio, de 1942, no estádio São Januário, Rio de Janeiro. controle das repartições do Estado. Governados por inter-
ventores nomeados pelo presidente, os estados perderam
Os estudos feitos são relevantes para entender o projeto
sua autonomia. Em uma cerimônia pública, Vargas chegou
político do qual Getúlio Vargas era representante e pelo
a queimar as bandeiras dos estados diante da bandeira do
qual se desdobrou na implantação do Estado Novo.
Brasil para simbolizar a força do poder central.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube
Conhecendo os Presidentes - Ep. 16: Getúlio Vargas
Parte II
Cerimônia de queima das bandeiras estaduais, 1937.

62
1.2. Constituição de 1937 rígida censura, bem como servia-se de jornais, cartilhas e,
principalmente, rádio para enaltecer a figura de Vargas e
A quarta Constituição brasileira, redigida pelo jurista Francis- suas realizações. Com esse objetivo, em 1934, foi criado
co Campos, ficou conhecida como “Polaca”; baseava-se em o programa radiofônico “Hora do Brasil”.
modelos fascistas europeus, destacadamente a Constituição
A polícia política, principal organismo de repressão do Es-
polonesa, que era inspirada na constituição italiana imposta
tado, e comandada por Filinto Müller, antigo participante
por Mussolini. Outorgada por Getúlio Vargas em novembro
do movimento tenentista, encarregava-se de perseguir,
de 1937, a Constituição trazia como principais dispositivos: prender e torturar opositores.
§ ampliação dos poderes do Presidente da República Charge critica a censura do Estado Novo.
graças a uma rígida centralização governamental;
§ governo do Presidente da República mediante decre-
tos-leis, suspensão de imunidades e estado de sítio;
§ mandato presidencial ampliado para seis anos;
§ perda da autonomia dos estados, que passaram a ser
governados por interventores nomeados pelo Presi-
dente da República;
§ dissolução dos partidos políticos;
§ censura da imprensa e dos meios de comunicação em geral;
§ instituição do estado de emergência e permissão ao Novaes, Carlos Eduardo; Lobo, César. História do Brasil
presidente de suspender imunidades parlamentares, para principiantes. São Paulo: Ática, 2003, p. 230.

prender, exilar e invadir domicílios;


1.4. O Dasp
§ proibição das greves;
O Departamento Administrativo do Serviço Público, Dasp,
§ pena de morte para os crimes contra a segurança foi criado em 1938 com a finalidade de dar ao Estado um
nacional. aparato burocrático racionalizador e modernizador da ad-
Essa constituição deveria ter sido submetida a um plebisci- ministração pública. Com ele, generalizou-se o sistema de
to, como determinava seu próprio texto, mas o ditador fez mérito: o recrutamento de candidatos passou a ser feito
com que essa determinação não fosse cumprida. mediante a avaliação da capacidade em concursos públi-
cos e provas de habilitação.

multimídia: vídeo multimídia: vídeo


Fonte: Youtube
Fonte: Youtube
Banana da terra
Sem palavras / Speechless / Sprachlon - Docu-
Uma ilha do oceano Pacífico, a Bananolândia, produziu mentário
muita banana naquele ano e não teve compradores para
o produto. A rainha da terra (Dircinha Batista), avisada pe-
lo conselheiro-mor, devia vender banana para o Brasil. E 1.5. O trabalhismo
isso ela consegue, por meio de uma intensa propaganda
Outra marca importante do Estado Novo foi a intensificação da
feita pelos jornais e pelo rádio.
legislação trabalhista, que publicou a Consolidação das Leis do
Trabalho, CLT, inspirada na Carta del Lavoro (Carta do Traba-
1.3. O DIP e a polícia política lho), implantada na Itália pelo ditador Benito Mussolini. Foram
Pela ação do Departamento de Imprensa e Propaganda, incorporadas à CLT as leis trabalhistas que vinham sendo pro-
DIP, o governo controlava os meios de comunicação sob mulgadas no Brasil ao longo da década de 1930, como a jor-

63
nada de oito horas diárias, o descanso semanal obrigatório e as Em março de 1938, fizeram uma primeira tentativa de golpe,
férias remuneradas. Foram regulamentados também os contra- duramente reprimida. Logo depois, unidos a outros oposicio-
tos entre patrões e empregados, que deveriam ser registrados nistas, tentaram a queda de Vargas mediante a um ataque
na Carteira de Trabalho. O funcionamento dos sindicatos foi ao Palácio da Guanabara, residência do presidente. Assim
permitido, desde que subordinados ao Estado, que os utilizava fizeram na manhã do dia 10 de maio, obrigando Vargas e
como instrumento de manipulação da classe trabalhadora. seus familiares a defenderem-se de armas na mão. A ajuda
militar ao presidente só chegou depois de quatro horas de
Em julho de 1940, foi criado o imposto sindical, instrumen-
tiroteio. Mas essa tentativa de golpe também falhou, com
to básico de financiamento do sindicato e de sua subor-
dinação ao Estado. Consistia de uma contribuição anual inúmeros golpistas presos e fuzilados no próprio palácio.
obrigatória, correspondente a um dia de trabalho, paga por Plínio Salgado, líder do movimento, foi exilado em Portugal.
todo empregado sindicalizado ou não. O imposto sindical
deu suporte à figura do “pelego”, expressão originada da 1.7. O desenvolvimento da indústria
cobertura de pano ou couro sob a sela de um animal de No Estado Novo, o intervencionismo estatal na economia,
montaria para amortecer o choque produzido pelo movi- que vigorava desde a Revolução de 1930, foi ampliado.
mento do animal no corpo do cavaleiro. Sem deixar de proteger a agricultura, o objetivo da política
A ideia de amortecedor mostrou-se bastante adequada. econômica governamental foi o desenvolvimento indus-
“Pelego” passou a ser o dirigente sindical que atuava mais trial. O governo organizou o Primeiro Plano Quinquenal
por interesse próprio, do patrão ou do Estado do que por (1939), à luz do qual a Comissão Executiva do Plano Side-
interesse dos trabalhadores; agia como amortecedor de rúrgico Nacional assumia dupla responsabilidade:
atritos. O pelego sobreviveu à custa da pequena represen- § realizar estudos técnicos com vistas à construção de uma
tatividade sindical de trabalhadores e do imposto sindical, usina siderúrgica para fabricação de trilhos e chapas;
que garantia a sobrevivência da organização. Portanto, § organizar uma campanha nacional, com a participação
pouco importava o número de sindicalizados. do Estado e das empresas privadas, para construção e
exploração da usina.
1.6. A Intentona Integralista (1938)

Cartaz do DIP na campanha a favor da siderurgia nacional.

O Estado Novo foi marcado ainda pelo nacionalismo eco-


nômico, que visava limitar a atuação do capital estrangeiro
Página de rosto do jornal O Globo, em 11 de na economia nacional, ao mesmo tempo em que incentivava
maio de 1938. Rio de Janeiro, RJ.
a industrialização do Brasil por meio da implantação de uma
Para o golpe de 10 de novembro de 1937, Getúlio con- indústria de base, que o levou à criação da Companhia
tou com o apoio dos integralistas. Plínio Salgado e seus Vale do Rio Doce, em Minas Gerais, e da Companhia Siderúr-
adeptos mostravam-se eufóricos, uma vez que também no gica Nacional, CSN, no Rio de Janeiro. Aquela forneceria ma-
Brasil o fascismo vingou. téria-prima para a indústria de base graças à exploração de
No entanto, consolidado no poder, Vargas tratou de descartar minério de ferro; esta se encarregaria de fabricar ferro e aço.
os integralistas. Em 2 de dezembro de 1937, foram surpreen- Com empréstimos junto ao Eximbank (banco norte-america-
didos pela lei que punha fim aos partidos políticos, sem excluir no), Vargas obteve os recursos necessários para instalação da
a AIB, bem como pela falta de oferta de cargo a eles pelo novo Companhia Siderúrgica Nacional, CSN, e da Usina de Volta
governo. Ignorados, passaram a conspirar contra o governo. Redonda (1941). Viabilizaram-se os meios de transporte para

64
alimentar a usina: incremento do transporte marítimo
para trazer o carvão de Santa Catarina e equipamento da
estrada de ferro Central do Brasil para transportar o mi-
nério de ferro extraído em Minas Gerais pela Companhia
Vale do Rio Doce.
Em 1938, foi criado o Conselho Nacional do Petróleo, CNP,
que se encarregou de prospectar poços petrolíferos e dar iní- multimídia: vídeo
cio ao desenvolvimento desse setor no Brasil. No ano seguin-
Fonte: Youtube
te, foram encontrados indícios de petróleo na Bahia, onde foi
perfurado o primeiro poço do Brasil, na cidade de Lobato. A estrada 47
Na Segunda Guerra Mundial, o Brasil era aliado dos Estados
Unidos, Inglaterra e França. Na época, foram encaminhados
mais de 25 mil soldados da FEB (Força Expedicionária Bra-
sileira) para combater os inimigos, representados pelo Eixo:
Alemanha, Itália e Japão. Quase todos de origem pobre e,
em sua maioria, despreparados para o combate, os pracinhas
tiveram que aprender na prática a lutar pela sobrevivência.
multimídia: livro
A primeira fase da Segunda Grande Guerra foi marcada pelo
avanço das potências do Eixo, só contidas a partir de 1942.
1937 – O golpe que mudou o Brasil: o
A entrada dos EUA e da URSS na guerra ao lado dos Aliados
Estado Novo – Antonio Luiz D’Araujo
contribuiu significativamente para a contenção dos avanços
De 1937 a 1945, o país viveu um dos períodos mais con- nazistas e a posterior vitória dos Aliados contra o Eixo.
troversos de sua história: o Estado Novo. Nessa obra, são
abordados os principais acontecimentos políticos que mar- Durante os primeiros anos do conflito, o Brasil manteve-se neu-
caram os anos 1930 em nosso país: o enfrentamento en- tro, embora Getúlio simpatizasse com o Eixo. Paralelamente,
tre comunistas e integralistas; o levante armado de 1935; no entanto, pressões externas e internas pela entrada do país
a rivalidade entre as correntes que dividiam o poder no na guerra do lado Aliado fizeram-se valer. A aproximação ideo-
governo de Vargas; as práticas racistas no Estado Novo; a lógica entre o Estado Novo e o fascismo europeu era evidente.
posição do governo de Vargas entre as ditaduras fascistas; Ministros de Vargas, como Francisco Campos, da Educação e
Saúde, e Eurico Gaspar Dutra, da Guerra, defendiam a entrada
e as democracias às vésperas da Segunda Guerra Mundial.
do país na guerra ao lado do Eixo. Oswaldo Aranha, das Rela-
ções Exteriores, defendia o apoio brasileiro aos Aliados.

2. O Brasil na Segunda
Guerra Mundial
Iniciada em 1939, a Segunda Guerra Mundial foi o con-
fronto entre as ditaduras nazifascistas do Eixo (Roma-Ber-
lim-Tóquio) e as democracias liberais europeias, França e
Inglaterra, que posteriormente contaram com a adesão de
EUA, da URSS e do próprio Brasil.
Digamos que a Primeira Guerra Mundial foi a principal Getúlio Vargas com Franklin Roosevelt (à
esquerda). Natal, RN. Janeiro de 1943.
causa da Segunda Guerra, na medida em que as razões
Getúlio Vargas manteve-se neutro enquanto procurava ob-
que levaram à eclosão do conflito, notadamente as dispu- ter vantagens econômicas de ambos os lados em troca do
tas por territórios, não foram completamente resolvidas. apoio do Brasil. Em meados de 1940, chegou a anunciar a
Além disso, os tratados impostos aos derrotados, como intenção de o governo alemão investir na siderurgia brasilei-
o Tratado de Versalhes, provocaram revanchismo e fa- ra com a fundação de uma indústria siderúrgica. Em 1941,
voreceram, entre outras causas, a ascensão do nazismo. para evitar esse acordo e exigir o compromisso do governo
Promessas de territórios feitas à Itália pela Inglaterra não brasileiro, o governo estadunidense ofereceu ao Brasil recur-
foram cumpridas e Mussolini continuava a busca imperia- sos para a construção da Companhia Siderúrgica de Volta
lista por territórios. Redonda, futura Cia Siderúrgica Nacional (CSN).

65
Além de ceder bases militares na região Nordeste para
estadunidenses e ingleses, foi enviada aos campos de
batalha europeus a Força Expedicionária Brasileira,
FEB, com 25 mil homens, comandados pelo general
Mascarenhas de Moraes. A FEB foi incorporada ao IV
Exército dos EUA e lutou nos campos italianos contra
multimídia: livro o fascismo.

O imperialismo sedutor – Antonio Pedro Tota


Baseado em ampla pesquisa, Antonio Pedro Tota anali-
sa as ações da verdadeira “fábrica de ideologias” criada
pelo governo estadunidense para conquistar o apoio
brasileiro durante a Segunda Guerra. Uma visão inédita
das origens da influência dos EUA no Brasil. multimídia: música
Fonte: Youtube
Brasil brasileiro – Carlos Galhardo

multimídia: livro

Senta a Pua – A força aérea brasileira na


Segunda Guerra Mundial (1944/1945)
Nesse livro, o major-brigadeiro-do-ar Rui Moreira Lima faz
uma narrativa sobre o combate na Segunda Guerra Mundial.

No início de 1942, foi realizada a Segunda Conferência dos


Chanceleres Americanos, no Rio de Janeiro, oportunidade
em que o Brasil decidiu romper relações diplomáticas com as
nações do Eixo. Em resposta, submarinos alemães atacaram
embarcações e afundaram navios brasileiros em águas terri-
toriais nacionais. Graças a manifestações que se intensifica-
ram, em agosto de 1942, o Brasil declarou guerra ao Eixo.
“A cobra vai fumar” e “senta a púa!”, slogans que
incentivaram os militares brasileiros da FEB.

multimídia: livro
multimídia: vídeo
1942 – O Brasil e sua guerra quase desconhecida Fonte: Youtube
– João Alberto Barone Reis e Silva
Senta a Pua!
João Barone, baterista do grupo Paralamas do Sucesso
“Senta a Pua!“ é o símbolo e grito de guerra do 1.º
e aficcionado por assuntos da Segunda Guerra Mundial,
Grupo de Aviação de Caça da Força Aérea Brasileira,
revela e analisa a participação do Brasil no conflito que
que atuou na Segunda Guerra Mundial.
sangrou o mundo.

66
multimídia: vídeo multimídia: vídeo
Fonte: Youtube Fonte: Youtube
For all - O trampolim da vitória Rádio Auriverde - A FEB na Itália
Fala da convivência de brasileiros com soldados estaduni- Um novo olhar sobre as ações do exército brasileiro na
denses na base de Parnamirim Field, em Natal (RN), duran- Itália, no período da Segunda Guerra Mundial, entre 1944
te a Segunda Guerra Mundial. Cerca de 15 mil soldados e 1945, buscando uma revisão histórica e uma perspecti-
dos EUA passaram pela base e suas presenças alteraram a va mais realista e factual dos acontecimentos, através da
estabilidade das famílias locais, trazendo não somente dó- montagem de imagens de arquivo da época, trechos de
lares e eletrodomésticos, mas também o glamour de uma cinejornais e filmes do período.
cultura hollywoodiana, a música das grandes bandas e a
sensualidade de cantoras e atrizes famosas. Em janeiro de 1945, antes do final da guerra, foi realizado
em São Paulo o Primeiro Congresso Brasileiro de Escritores,
com a participação de Graciliano Ramos, Caio Prado Júnior,
2.1. O fim do Estado Novo Monteiro Lobato e Carlos Drummond de Andrade. Eram
A participação brasileira na Segunda Guerra Mundial ao escritores e intelectuais que defendiam a realização de elei-
lado das democracias liberais e contra os regimes totali- ções diretas para os diversos cargos públicos, a reabertura
tários de extrema direta revelaram a contradição do país democrática e o fim da censura aos meios de comunicação.
governado por uma ditadura. A partir de então, cresceu a
Pela imprensa, segmentos sociais e políticos começaram a se
pressão interna pela redemocratização do Brasil.
manifestar pela redemocratização do Brasil. De olho em sua
sobrevivência política, Vargas aparentemente cedeu às pres-
sões e surpreendeu o país: iniciou um processo de abertura
política anunciando a convocação de eleições presidenciais
para o final de 1945; reduziu a censura à imprensa e conce-
deu anistia política, que beneficiou Luís Carlos Prestes, preso
desde 1936, e permitiu-lhe voltar à cena política nacional.
multimídia: livro Com a concessão da liberdade partidária, foram fundados
vários partidos políticos: União Democrática Nacional, UDN,
composta por conservadores, burgueses e latifundiários, re-
Soldados da borracha: os heróis esquecidos
presentantes dos interesses das elites nacionais em oposição
– Marcos Vinícius Neves e Ariadne Araujo
a Vargas; Partido Social Progressista, PSP, em São Paulo, com
Ao mesmo tempo em que a Segunda Grande Guerra
grande poder local e liderado por Adhemar de Barros; Parti-
convulsionava o mundo, no interior do Brasil um drama
do Comunista Brasileiro, PCB, devidamente legalizado e atu-
silencioso e quase invisível estava em curso. Milhares de ante; Partido Social Democrático, PSD, que congregava uma
homens e mulheres foram enviados do Nordeste para a facção das elites nacionalistas ligadas ao setor industrial que
Amazônia como parte do esforço de guerra conhecido apoiavam Vargas; e Partido Trabalhista Brasileiro, PTB, ligado
como a “Batalha da Borracha”. aos sindicatos, trabalhadores e camadas médias urbanas.
Getúlio atuou diretamente na fundação desses dois partidos
Em 1943, políticos mineiros liderados por Artur Bernardes, políticos, PSD e PTB, que lhe serviam como base de apoio.
Afonso Arinos e Magalhães Pinto enviaram um documento
As eleições foram marcadas para 2 de dezembro de 1945,
a Getúlio – Manifesto dos Mineiros –, exigindo a redemo-
e os partidos indicaram seus candidatos: brigadeiro Edu-
cratização do país e eleições livres. O presidente, por sua
ardo Gomes, pela UDN; Yêdo Fiúza, pelo PCB; e general
vez, usou a guerra como justificativa para ignorar o Mani-
Eurico Gaspar Dutra, pela coligação PSD/PTB.
festo e adotar medidas de retaliação contra os favoráveis
à redemocratização: demissões, aposentadorias compulsó- Enquanto o processo eleitoral se desenvolvia, Vargas apoia-
rias, entre outras. va e estimulava discretamente um movimento em prol de

67
sua continuidade na presidência da República: o Quere-
mismo. Sob os slogans “Queremos Getúlio” e “constituinte
com Getúlio”, os queremistas defendiam a continuidade de
Vargas na presidência até que fossem realizadas eleições
para a formação de uma Assembleia Nacional Constituinte,
que elaboraria uma nova Constituição e convocaria eleições
para a escolha de um novo presidente.
multimídia: música
De maneira surpreendente, o movimento queremista chegou
Fonte: Youtube
a contar com a adesão de Luiz Carlos Prestes e do PCB, que
haviam sido perseguidos e reprimidos por Vargas. A justifica- Grito da nação – Dircinha Batista
tiva para o apoio ao Queremismo foi a orientação do Parti-
do Comunista Soviético aos partidos comunistas de todo o
mundo para que apoiassem governos que lutaram contra o
nazifascismo na Segunda Guerra Mundial e se aproximas-
sem dos sindicatos e organizações de trabalhadores.

multimídia: site

http://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/AEraVargas1/
anos30-37/GolpeEstadoNovo/PlanoCohen
www.gazetadopovo.com.br/vida-e-cidadania/
historia/soldados-da-borracha-os-escravos-do-se-
culo-20-em-plena-2-guerra-mundial-799hvh20tv-
0frus80eda1ftxf
www.acervo.oglobo.globo.com/fatos-historicos/
Manifestação queremista
vargas-assina-polaca-passa-ter-plenos-poderes-pa-
ra-estado-novo-10169358
www.literaturaeafinidades.blogspot.com.br/2010/04/
duas-vezes-favela-por-boris-fausto.html

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube
Dutra (Vargas deposto, Constituição de 1946,
Liberalismo...) multimídia: música
Fonte: Youtube
O apoio ao Queremismo suscitou desconfiança geral de Democracia – Gilberto Alves
que Getúlio preparava um golpe, visando à permanência
no poder. Para evitar que isso ocorresse, os generais Góes
Monteiro, Eurico Gaspar Dutra e Otávio Cordeiro de Farias
lideraram as Forças Armadas na deposição de Getúlio Var-
gas da presidência da República, no dia 29 de outubro de
1945, pondo fim ao Estado Novo e à Era Vargas.
A presidência foi assumida pelo presidente da Suprema
Corte, ministro Antônio José Linhares, cearense. Conforme multimídia: vídeo
previsto, as eleições ocorreram no dia 2 de dezembro de Fonte: Youtube
1945 e foram vencidas pelo general Eurico Gaspar Dutra,
A chama Queremista de 1945 “Queremos Getúlio”
graças à coligação PSD/PTB.

68
CONEXÃO ENTRE DISCIPLINAS

Sociologia
Durante o Estado Novo varguista (1937-1945), o Brasil conheceu uma nova concepção de cidadão, o cidadão
trabalhador. Tal concepção implantada pelo regime getulista defendia a ideia de que o bom cidadão não se
envolvia em greves, tumultos ou manifestações nocivas aos “interesses nacionais”. É necessária a clareza de
que tal ideologia era difundida pelo DIP (Departamento de Imprensa e Propaganda), órgão governamental
responsável por toda a propaganda do governo e, desse modo, o Brasil abandonou, durante o Estado Novo,
o ideário de que trabalhar era coisa de gente tola e que bom mesmo era viver na malandragem. Isso pode ser
visto, em grande parte, nas composições musicais da época, em que as letras das canções começam a ressaltar
a importância do bom trabalhador, e não mais dão valor às figuras dos malandros, os quais levavam a vida sem
grande esforço laborial.
Um exemplo cabal dessa transformação ocorreu com o compositor Wilson Batista, e pode ser observado em
duas canções que mostram a transformação de pensamento do compositor, pois a primeira valoriza a prática da
malandragem, e a segunda, contemporânea do Estado Novo, defende o trabalhador.

69
ÁREAS DO CONHECIMENTO DO ENEM

HABILIDADE 21
Identificar o papel dos meios de comunicação na construção da vida social.

A partir do século XX, com a criação da imprensa de massas no Brasil, os meios de comunicação passaram a ter
papel central na vida política nacional. Pela sua importância na formulação de opiniões e debates, passou a ser vis-
ta como uma ferramenta essencial aos poderosos, que ambicionavam manter-se nos poder. No caso em questão,
vemos uma comparação entre a propaganda do Estado Novo, promovida pelo governo Vargas, com o nazismo,
cujo maior expoente da comunicação era Joseph Goebbels.
O aluno deve ser capaz de compreender a importância dos meios de comunicação na formação da consciência
coletiva, bem como analisar criticamente o uso deles pelos poderosos. Muito comumente, tais questões lançam
mão de textos, charges ou imagens que devem ser utilizadas para a formulação correta da resposta. Ater-se ao
enunciado, portanto, é fundamental nesse tipo de questão.

MODELO 1
(Enem) Durante o Estado Novo, os encarregados da propaganda procuraram aperfeiçoar-se na arte da empol-
gação e envolvimento das “multidões” através das mensagens políticas. Nesse tipo de discurso, o significado
das palavras importa pouco, pois, como declarou Goebbels, “não falamos para dizer alguma coisa, mas para
obter determinado efeito”.
CAPELATO, M.H. Propaganda política e controle dos meios de comunicação. In: PANDOLFI.
D. (Org.). Repensando o Estado Novo. Rio de Janeiro: FGV, 1999.

O controle sobre os meios de comunicação foi uma marca do Estado Novo, sendo fundamental à propaganda
política, na medida em que visava:
a) a conquistar o apoio popular na legitimação do novo governo.
b) ampliar o envolvimento das multidões nas decisões políticas.
c) aumentar a oferta de informações públicas para a sociedade civil.
d) estender a participação democrática dos meios de comunicação no Brasil.
e) alargar o entendimento da população sobre as intenções do novo governo.

ANÁLISE EXPOSITIVA

O DIP, Departamento de Imprensa e Propaganda do Estado Novo, tinha como função o controle da propaganda
do governo, com vistas a legitimar o regime ditatorial junto à população brasileira.

RESPOSTA Alternativa A

70
DIAGRAMA DE IDEIAS

ESTADO NOVO (1937-1945)

A CARACTERÍSTICAS B INSTRUMENTOS
• GOVERNO PERSONALISTA
• NACIONALISMO • DEPARTAMENTO DE IMPRENSA E PROPAGANDA
• CENTRALIZAÇÃO POLÍTICA • DEPARTAMENTO ADMINISTRATIVO DE SERVIÇO PÚBLICO
• INSPIRAÇÃO FASCISTA • POLÍCIA POLÍTICA
• CONSERVADOR • CONSTITUIÇÃO DE 1937
• TRABALHISMO
CONSTITUIÇÃO DE 1937
• INSPIRADA PELA CONSTITUIÇÃO FASCISTA DA POLÔNIA
TRABALHISMO
• FIM DA AUTONOMIA DOS ESTADOS
• CONSOLIDAÇÃO DAS LEIS DO TRABALHO (CLT)
• DISSOLUÇÃO DOS PARTIDOS POLÍTICOS
• SINDICATOS ATRELADOS AO ESTADO
• CENSURA
• IMPOSTO SINDICAL
• INSTITUIÇÃO DO ESTADO DE EMERGÊNCIA
• CRIAÇÃO DO “PELEGO”
• PROIBIÇÃO DE GREVES

DESENVOLVIMENTO
C INTENTONA INTEGRALISTA D
DA INDÚSTRIA

• TENTATIVA DE GOLPE DO PARTIDO INTEGRALISTA • INTERVENÇÃO ESTATAL


• DERROTA • NACIONALISMO ECONÔMICO
• PLÍNIO SALGADO SE EXILA EM PORTUGAL • LIMITAÇÃO DE INVESTIMENTO ESTRANGEIRO
• EMPREGO PARA BRASILEIROS
• CRIAÇÃO DE INDÚSTRIAS DE BASE
E SEGUNDA GUERRA MUNDIAL • VALE DO RIO DOCE
• COMPANHIA SIDERÚRGICA NACIONAL
• ALIADOS × EIXO • USINA DE VOLTA REDONDA
• ESTADO NOVO SE APROXIMA IDEOLOGICAMEN- • CONSELHO NACIONAL DO PETRÓLEO
TE DO EIXO
• EUA INVESTEM NO BRASIL
• BRASIL ENTRA NA GUERRA COM OS ALIADOS F FIM DO ESTADO NOVO
• ENVIO DA FORÇA EXPEDICIONÁRIA BRASILEIRA (FEB) À ITÁLIA
• VITÓRIA DOS ALIADOS • DERROTA DO FASCISMO NA SEGUNDA GUERRA
MUNDIAL
• VITÓRIA DAS DEMOCRACIAS
PARTIDOS • PRESSÃO SOCIAL POR REABERTURA POLÍTICA
• UNIÃO DEMOCRÁTICA NACIONAL (UDN) • LEGALIZAÇÃO DOS PARTIDOS E ELEIÇÕES
• CONSERVADORES, BURGUESES, LATIFUNDIÁRIOS • VITÓRIA ELEITORAL DE DUTRA (1945)
• PARTIDO SOCIAL PROGRESSISTA (PSP) • COLIGAÇÃO PSD/PTB
• PARTIDO PAULISTA
• PARTIDO COMUNISTA BRASILEIRO (PCB) QUEREMISMO
• PARTIDO SOCIAL DEMOCRÁTICO (PSD) • APOIO À CONTINUIDADE DE GETÚLIO VARGAS
• ELITE NACIONALISTA • DEFESA DE UMA NOVA ASSEMBLEIA CONSTITUINTE
• PARTIDO TRABALHISTA BRASILEIRO (PTB) • APOIO DO PCB
• SINDICATOS, TRABALHADORES, CLASSE MÉDIA • ORIENTAÇÃO DA URSS

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AULAS 37 E 38 “Embora se propusesse a defender os interesses
dos assalariados (elevação salarial, melhores condi-
ções de vida, maior participação política, nacionali-
zação da economia, etc.), o trabalhismo não incen-
tivava sua organização livre da influência burguesa
REPÚBLICA LIBERAL OU nem a formação de uma ideologia adequada à
essência de seus interesses e, menos ainda, a reali-
POPULISTA: GOVERNO zação de reformas sociais que levassem à completa
DUTRA E SEGUNDO libertação do trabalhador (...). Os trabalhadores, em
sua grande maioria, eram levados a depositar na
GOVERNO VARGAS ideologia nacionalista e trabalhista suas esperan-
ças de justiça social e de um mundo melhor”.
ALENCAR, Francisco; CARPI, Lúcia, RIBEIRO, Marcus
COMPETÊNCIAS: 1, 2, 3, 4 e 5 Venício. História da Sociedade Brasileira, 13 ed. rev.
atual. Rio de Janeiro. Ao Livro Técnico, 1996.

HABILIDADES:
1, 2, 7, 9, 10, 12, 13, 14,
15, 19, 21 e 22 Carismáticos e populares, os líderes populistas utilizavam os
meios de comunicação de massa, especialmente o rádio, e
os comícios gigantescos para se comunicar com as camadas
populares e trabalhadoras. Os principais representantes do po-
1. O populismo pulismo latino-americano foram Getúlio Vargas, Jânio Quadros
e João Goulart, no Brasil; Juan Domingo Perón, na Argentina;
O período democrático situado entre as ditaduras do Es- Lázaro Cárdenas, no México; e Victor Paz Estenssoro, na Bolívia.
tado Novo (1937-1945) e o Regime Militar (1964-1985)
é chamado, por alguns historiadores, de República Libe-
ral Populista. Nesse período, o país viveu uma relativa
liberdade democrática, com grande atuação de partidos
políticos, imprensa e movimentos sociais. No entanto, a
liberdade democrática era limitada. O Partido Comunista
Brasileiro continuou proibido, e seus representantes par-
lamentares cassados.
Getúlio Vargas Juan Domingo Perón

O populismo referido foi um fenômeno político co-


mum na América Latina em meados do século XX,
mas não pôde ser aplicado a todos os presidentes
brasileiros do período que se estendeu de 1946 a
1964. Ele se caracterizou pela atuação de políticos
carismáticos, que conseguiram mobilizar as classes
populares mediante ações e atitudes de caráter pater-
nalista e demagógico, muitas vezes vinculadas às rei- Lázaro Cárdenas
vindicações dos trabalhadores, mas transfiguradas em
reivindicações do “trabalhismo”, que as apresentava
como “doação” do líder político, tirando-lhe o caráter
de luta da classe trabalhadora.

Os líderes populistas eram nacionalistas, defenderam


a redução da dependência econômica em relação ao
multimídia: vídeo
capital estrangeiro por meio de políticas de estímulo à Fonte: Youtube
industrialização. Conhecendo os Presidentes - Ep. 17: José Linhares

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2. Governo de Eurico Gaspar tou pelo fechamento do Partido Comunista Brasileiro, PCB,
em maio de 1947 e, no ano seguinte, todos os mandatos
Dutra (1946–1951) legislativos – senadores, deputados e vereadores – dos co-
munistas foram cassados.

multimídia: livro

Brasil, de 1945 ao golpe militar – José Ênio Casalecchi


Esse livro focaliza o período que vai da ditadura de Var-
gas à Ditadura Militar, conhecido como República Liberal,
que cobre os governos de Dutra, Vargas (até o suicídio em
1954), Café Filho, Juscelino, Jânio e Jango. Foi um tempo
de renúncias, deposições e morte de presidentes.

Dutra

2.1. Política interna


Eleito pela coligação PSD/PTB, Partido Social Democrático e
Partido Trabalhista Brasileiro, com o apoio de políticos var-
guistas, logo que assumiu a presidência da República em
janeiro de 1946, Dutra iniciou um processo de aproximação
política com as elites nacionais, particularmente, represen-
tadas pela UDN, União Democrática Nacional. No cenário
internacional marcado pela Guerra Fria, o novo presidente
definiu o posicionamento brasileiro pró-EUA, o que provo-
cou uma série de problemas internos. No governo Dutra, foi
promulgada a nova Constituição Brasileira, em 1946.
Principal instrumento de normalização institucional do país, a
Constituição de 1946 pautava-se pelo predomínio dos prin- Notícia da promulgação da Constituição de 1946
cípios liberais, característicos de democracias ocidentais in- No mesmo dia do fechamento do PCB, o Ministério do Tra-
fluenciadas pelos EUA. No entanto, estabeleceu limites para balho ordenou a intervenção em catorze sindicatos e fechou
a participação democrática, como a intervenção nos sindicatos uma central sindical controlada pelos comunistas. Na ilegali-
e a censura a algumas manifestações artísticas e culturais no-
dade, sob violenta repressão, o PCB definhou em termos de
tadamente de caráter comunista. Foi mantido o voto secreto
política de massas, ainda que tenha mantido uma atividade
para maiores de 18 anos, exceto para analfabetos, cabos e sol-
clandestina junto à classe operária.
dados, e eleições diretas em todos os níveis. O mandato presi-
dencial foi fixado em cinco anos sem possibilidade de reeleição
e o cargo de vice-presidente foi recriado, sendo preenchido por 2.2. Política externa
eleição própria. Além disso, os direitos trabalhistas do período Após a Segunda Guerra, o cenário internacional foi marcado
getulista foram incorporados ao texto constitucional. pela polarização ideológica e política entre EUA e URSS, co-
As consequências do alinhamento do governo brasileiro nhecida por Guerra Fria. Nesse contexto, Dutra adotou um po-
com os EUA no contexto da Guerra Fria podem ser cons- sicionamento de alinhamento automático aos EUA e ao bloco
tatadas na política interna. Houve restrição ao direito de capitalista, rompendo relações diplomáticas com a URSS e,
greve pelo decreto-lei 9.070, de março de 1946. Baseada posteriormente, com a China, que se tornara comunista após
em justificativas fúteis, a maioria governista da Câmara vo- a vitória da Revolução de 1949, liderada por Mao Tsé-Tung.

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2.3. Economia
Em virtude do alinhamento do governo brasileiro à política
estadunidense, Eurico Gaspar Dutra adotou uma política eco-
nômica liberal, caracterizada pela abertura ao capital estran-
geiro e pela importação de vários produtos, principalmente os
supérfluos, como aparelhos de televisão – embora não hou-
vesse emissoras no Brasil –, meias de náilon e casacos de pele
– para um país predominantemente tropical –, eletrodomésti-
cos, automóveis, cigarros e chicletes. O resultado foi a redução
significativa das reservas econômicas acumuladas ao longo
da Segunda Guerra Mundial, que tinham deixado a econo-
mia do país em situação relativamente confortável, criando a
Dutra (à direita) cumprimenta o presidente estadunidense
Harry Truman em visita ao Brasil. necessidade de obtenção de novos empréstimos no exterior.
Em 1947, o presidente estadunidense Harry Truman visitou Em 1948, foi lançado o Plano SALTE, que previa investimen-
o Brasil, quando foi realizada na cidade fluminense de Petró- tos nas áreas de Saúde, Alimentação, Transportes e Energia.
polis a Conferência Interamericana de Manutenção da Paz
e Segurança. Encerrando a Conferência, foi assinado o Tra- “Em linhas gerais, o Plano SALTE visava estimu-
tado Interamericano de Assistência Recíproca, Tiar, mediante lar e suprir a iniciativa privada através da ação do
o qual os países das Américas estabeleciam um pacto para Estado na economia. O Estado, sem substituir as
defesa mútua, permitindo a intervenção dos EUA em qual- empresas particulares, deveria investir para sanar
quer área do continente para preservar a paz e a segurança, as deficiências daqueles setores identificados como
’pontos de estrangulamento do desenvolvimento
o que deve ser entendido como combate ao comunismo no
nacional’” (CACERES, Florival. História do Brasil.
continente, ficando conhecido como: Doutrina Truman.
São Paulo: Moderna, 1993, p. 303).

Curiosidades Ainda em 1948 foi criada a “missão Abbink”, nome pelo qual
ficou conhecida a Comissão Brasileiro-Americana de Estudos
Econômicos. Sob a direção de John Abbink e pelo brasileiro
Otávio G. Bulhões, tinha como objetivo analisar os fatores que
promoviam ou retardavam o desenvolvimento econômico
brasileiro. O relatório final dessa comissão foi publicado em
fevereiro de 1949, e ficou conhecido como Relatório Abbink.
O plano não surtiu o efeito desejado. Alguns poucos setores fo-
ram beneficiados, com destaque para a inauguração da Rodo-
via Rio-São Paulo, Via Dutra, em 1950, que ligava as cidades de
São Paulo e Rio de Janeiro, a abertura da Rodovia Rio-Bahia e a
instalação da Companhia Hidrelétrica do São Francisco, Chesf.

Antes da visita do presidente Truman, veio ao Brasil


(em 1946) o general Eisenhower. Para sondá-lo foi en-
carregado o presidente da UDN, Otávio Mangabeira.
Num gesto servil, e simbólico, o representante brasi-
leiro inclinou-se e beijou as mãos do visitante. Era o multimídia: livro
início da Guerra Fria e o Brasil abrigava-se debaixo
das asas da Águia Americana.
A canção no tempo: 85 anos de músicas brasileiras
No célebre registro fotográfico de Ibrahim Sued, o depu- – Jairo Severiano e Zuza Homem de Mello
tado Otávio Mangabeira beija a mão do general estadu-
”A canção no tempo – vol. 1” relaciona, classifica e
nidense Dwight Eisenhower em sessão solene na Câma-
analisa as canções que o povo brasileiro consagrou en-
ra dos Deputados realizada em 1946 (Arquivo Nacional).
tre os anos de 1901 e 1957.

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2.4. Eleições presidenciais senador, não deve ser candidato à presidência. Candidato,
não deve ser eleito. Eleito, não deve tomar posse. Empossado,
A sucessão presidencial ocorreria no final de 1950 e Getú- devemos recorrer à revolução para impedi-lo de governar”.
lio Vargas decidiu disputar a presidência pelo PTB, apoiado
por Adhemar de Barros e seu PSP, que indicaram o candi-
dato a vice-presidente, Café Filho. O acordo previa ainda
que Vargas apoiaria Adhemar nas próximas eleições pre-
sidenciais. O PSD lançou o candidato Cristiano Machado,
mas grande parte dos filiados do partido deu apoio a Var-
gas, especialmente nos estados. A UDN lançou novamente
o brigadeiro Eduardo Gomes.
Getúlio Vargas venceu a eleição com 49% dos votos váli-
dos e pôde voltar ao Palácio do Catete, sede da presidên-
cia, “nos braços do povo”.

Getúlio Vargas mostra a mão suja de petróleo em Mataripe,


BA, em 1952. O presidente tornou-se símbolo da época em
que transformou o petróleo em monopólio estatal e criou
a Petrobras, com o lema “O petróleo é nosso”.

A afirmação de Lacerda é uma síntese da atitude dos ude-


nistas durante a campanha presidencial e o governo Vargas
até o seu trágico fim. Os conservadores udenistas chegaram
a apelar para os militares a fim de evitar a posse de Vargas,
mas não obtiveram êxito, pois os militares preferiram, naque-
le momento, respeitar a decisão das urnas, uma vez que exis-
tia ainda uma parcela de militares nacionalistas que apoia-
vam Vargas. Ficava claro, no entanto, que Vargas enfrentaria
Vargas comemora vitória na eleição de 1950.
problemas com diversas frações de classes em seu governo.

Retrato do Velho
Bota o retrato do velho outra vez
Bota no mesmo lugar
O sorriso do velhinho
Faz a gente trabalhar
Eu já botei o meu multimídia: vídeo
E tu, não vai botar?
Já enfeitei o meu Fonte: Youtube
E tu vais enfeitar? Conhecendo os Presidentes - Ep. 18: Getúlio Var-
O sorriso do velhinho
gas - Parte III
Faz a gente trabalhar
(Haroldo Lobo e Marino Pinto. Marcha de Sem maioria no Congresso, Vargas tentou formar uma
grande sucesso no Carnaval de 1951)
base de apoio através de uma composição ministerial que
conciliava forças conservadoras do PSD e PSP, com políti-
3. Segundo governo cos progressistas do PTB. Até mesmo a UDN foi convidada
para compor a base de apoio do governo, recebendo o Mi-
Vargas (1951–1954) nistério da Agricultura, mas não aceitou, optando por se
manter na oposição ao governo.
A candidatura de Vargas à presidência da República provocou
a oposição sistemática e ruidosa da UDN, determinada a evi- O governo foi marcado pelo antagonismo entre setores
tar sua volta ao Catete a todo custo, como podemos constatar nacionalistas, que contavam com a simpatia do presidente,
na afirmação de Carlos Lacerda: “O senhor Getúlio Vargas, e liberais, acusados pelos nacionalistas de “entreguistas”.

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O grupo dos nacionalistas era composto por intelectuais,
militares, burguesia nacional, estudantes e membros das
3.1. Nacionalismo
camadas urbanas, que defendiam mais autonomia do Bra- Simpático ao nacionalismo econômico, mas sem descartar
sil em relação ao capital estrangeiro, bem como a explo- alianças com o capital estrangeiro, desde que trouxessem
ração das riquezas nacionais por empresas brasileiras e a benefícios ao país, como a incorporação de novas tecnolo-
industrialização baseada em capitais nacionais. gias, Vargas tomou medidas voltadas para o desenvolvimen-
to nacional. No ano seguinte à sua posse, criou o Banco
Já os setores liberais eram compostos por políticos conser-
Nacional de Desenvolvimento Econômico, BNDE, com o
vadores, elites agrárias e membros da burguesia, militares e
objetivo de estimular e financiar projetos de longo prazo.
parte da classe média na sua maioria congregados na UDN.
Eram chamados de “entreguistas”, por defenderem o de- Também entrou em vigor no governo Vargas a instrução nº
senvolvimento econômico nacional baseado na abertura da 70 da SUMOC (Superintendência da Moeda e Crédito), que
economia brasileira ao capital estrangeiro, particularmente visava, entre outras coisas, proteger a indústria nacional.
estadunidense, por meio da montagem de empresas multi-
Contudo, muitos integrantes dos setores agrários e
nacionais no Brasil, para utilizarem sua tecnologia na explo-
mesmo industriais não gostaram da medida, uma vez
ração das riquezas nacionais de nossa mão de obra.
que diziam que o governo estava tentando acabar com
a liberdade econômica.
Por meio da criação do Plano Nacional de Reaparelhamen-
to Econômico, ou Plano Lafer, o governo elaborou metas de
desenvolvimento da siderurgia, metalurgia, petroquímica,
transportes e eletricidade. Diante das dificuldades, o plano
obteve resultados modestos.
multimídia: livro
Vargas também denunciou os grandes lucros das empresas
estrangeiras e a grande remessa de divisas para o exterior
Getúlio (1945-1954): da volta pela consagração e passou a combatê-las. Em 1952, foi aprovada a Lei de
popular ao suicídio – Lira Neto Remessa de Lucros ao Exterior, que obrigava as empresas
Na terceira e última parte da consagrada série biográfica estrangeiras a reinvestir no Brasil pelo menos 10% dos lu-
sobre Getúlio Vargas, Lira Neto reconstitui os acontecimen- cros obtidos em território nacional. Essas medidas fomen-
tos políticos e pessoais mais importantes dos anos finais taram a insatisfação das frações comerciais da burguesia
do ex-presidente. Entre a deposição por um golpe militar, e das classes médias tradicionais, bem como dos investi-
em outubro de 1945, e o suicídio, em agosto de 1954, o dores estrangeiros, que, em represália, cancelaram vários
livro revela como a história do Brasil se entrançou com a empréstimos programados para os anos de mandato de
vida de Getúlio, inclusive enquanto afastado do poder. Vargas, notadamente os provenientes dos EUA.
Apesar das dificuldades, Vargas fundou a Eletrobrás e ini-
ciou a construção da Usina Hidrelétrica de Paulo Afonso.
Todavia, a maior obra do segundo governo de Vargas foi a
criação da Petrobras, em 1953.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube
Getúlio Vargas
Documentário que mostra os fatos que marcaram a vida multimídia: livro
e a carreira de Vargas, o cotidiano da época e o suicídio
que gerou controvérsias e uma gigantesca comoção so-
Getúlio (romance) – Juremir Machado da Silva
cial. Com narração de Paulo César Pereio, o documentá-
rio utiliza cinejornais produzidos pelo DIP e pela Agência Passados mais de 50 anos do suicídio de Getúlio Vargas,
Nacional, fotos da época, discos, discursos de Vargas e o mistério sobre o mito ainda prevalece. Afinal, quem foi
textos de literatura de cordel. um dos maiores oligarcas que o Brasil já teve?

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3.2. “O petróleo é nosso!” Em 1953, o projeto foi aprovado e foi criada a Petrobras,
empresa de capital misto controlada pelo governo brasilei-
Desde a descoberta dos primeiros poços de petróleo no ro, que teria o monopólio de pesquisa, exploração e refino
território brasileiro, empresas estrangeiras, especialmente do petróleo brasileiro, frustrando os interesses internacio-
estadunidenses, pressionavam o governo brasileiro a con- nais. O monopólio não se estendia à distribuição de deriva-
ceder-lhes a permissão e a prioridade para sua prospecção dos do petróleo no Brasil, que poderia ser feita por grupos
e exploração. Os debates tornaram-se mais frequentes e privados e estrangeiros.
intensos quando Getúlio Vargas enviou um projeto de mo-
nopólio estatal de exploração do petróleo no Brasil.

multimídia: música
Fonte: Youtube
Se eu fosse o Getúlio – Nelson Gonçalves

3.3. Trabalhismo e populismo


Com o intuito de reforçar a política trabalhista do governo
e aproximá-lo mais ainda dos sindicatos, Getúlio Vargas
nomeou o deputado federal gaúcho João Goulart, popu-
larmente chamado de Jango, para o Ministério do Trabalho.
Cartaz alusivo à campanha pelo monopólio do petróleo brasileiro. 1952.
O país passava por uma séria crise econômica e a inflação
corroía o poder de compra dos salários da classe trabalha-
O governo dos EUA pressionava os países latino-ameri- dora. Emergiam greves e manifestações em várias cidades,
canos a favorecerem a exploração de minerais estratégi- como São Paulo, Rio de Janeiro, Santos e Belém.
cos no continente às empresas do país, garantindo-lhes o
abastecimento e o controle sobre grandes reservas estra- Jango negociou com os grevistas e fez-lhes algumas conces-
tégicas altamente necessárias no contexto da Guerra Fria. sões, aliviando as tensões, apesar das críticas da UDN. Em
maio de 1954, Jango propôs um aumento de 100% no salário
Vargas e sua assessoria, formada por ministros e secretá- mínimo, tentando garantir o apoio da classe trabalhadora ao
rios de Estado nacionalistas, viam como vital a exploração governo. A medida não agradou setores da elite que apoiavam
de minerais estratégicos, como o petróleo, para o desenvol-
Vargas, notadamente parte da burguesia nacional, militares e
vimento econômico e industrial nacional; posicionaram-se,
empresários que passaram a fazer oposição ao governo, acu-
portanto, contrários ao controle estrangeiro sobre setores
sando-o de tentar montar uma República sindical no Brasil,
considerados estratégicos.
assim como Juan Domingo Perón fizera na Argentina.
Os debates envolveram o Congresso, a imprensa e as ruas.
As críticas ao governo cresciam e a imprensa desmoralizava
A UDN, políticos conservadores, parte da imprensa, setores
Vargas e Jango, especialmente por meio da oposição agressi-
econômicos ligados ao capital estrangeiro e alguns mili-
va do jornalista udenista Carlos Lacerda, proprietário do jor-
tares defendiam a associação econômica com capitais es-
nal carioca Tribuna da Imprensa. Vargas tentava se defender
trangeiros e passaram a combater de modo cada vez mais
através do jornal Última Hora, o qual apoiava o presidente.
violento o projeto de monopólio estatal do petróleo.
Políticos do PTB, parte do PSD e PSP, bem como o Partido Em face da crise e do acirramento dos ânimos políticos, Var-
Socialista Brasileiro, PSB, apoiavam o projeto de monopó- gas decidiu recuar, demitindo João Goulart do Ministério
lio estatal do petróleo. Militares nacionalistas, estudantes do Trabalho e cancelando o aumento de 100% no salário
ligados à União Nacional dos Estudantes, UNE, sindica- mínimo. A medida desagradou as massas trabalhadoras e
listas, comunistas, setores médios urbanos, intelectuais e o movimento sindical, que ameaçaram retirar seu apoio ao
operários apoiavam o projeto nacionalista do governo e governo. Num gesto tipicamente populista, Getúlio decidiu
se engajaram na campanha “O petróleo é nosso!”, que preservar esses apoios e, em meio às comemorações alusivas
ganhou as ruas, visando pressionar o Congresso a aprovar ao dia do trabalho, voltou a conceder o aumento de 100%
o monopólio estatal do petróleo. no valor do salário mínimo, em 1.º de maio de 1954.

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da pelo Brigadeiro Eduardo Gomes. Oficiais do Exército e da
Marinha solidarizaram-se com a Aeronáutica e parte das For-
ças Armadas passou a exigir a renúncia do presidente.
Apoiado pelo Ministro da Guerra, general Zenóbio da Costa,
Vargas anunciou que não renunciaria. As pressões contra o
presidente aumentavam diariamente e setores da imprensa
com políticos da UDN ganharam cada vez mais aliados de-
multimídia: música fensores da renuncia de Vargas, até mesmo o vice-presidente
Fonte: Youtube Café Filho, que rompeu relações políticas com o presidente.
Ai, Gegê – Jorge Goulart

3.4. Atentado na rua Tonelero


O principal veículo de crítica a Getúlio era o jornal Tribuna
da Imprensa, do jornalista Carlos Lacerda, correligionário
da UDN, que diariamente lançava ataques e graves acusa-
ções ao presidente. multimídia: vídeo
No dia 5 de agosto de 1954, Carlos Lacerda sofreu um aten- Fonte: Youtube
tado próximo à sua residência, na rua Tonelero, no bairro de 63 - O suicídio de Vargas e a Carta-Testamento - História
Copacabana, no Rio de Janeiro. O jornalista foi atingido no
pé e o major da Aeronáutica, Rubens Florentino Vaz, que o “Daqui não saio...”
acompanhava, foi morto com um tiro no peito.
No mesmo dia, Lacerda acusou o presidente pelo atentado, afir-
mando: “Perante Deus, acuso um só homem como responsável
por esse crime. É o protetor dos ladrões cuja impunidade lhe dá
a audácia para atos como o desta noite. Este homem chama-se
Getúlio Vargas” (MEIRA, Antônio Carlos. Brasil: recuperando a
nossa história. São Paulo: FTD, 1998, p. 219).
Vargas declarou-se inocente, mas as investigações realiza-
das pela Aeronáutica apontaram como mandante do aten-
tado o chefe da guarda pessoal do presidente, Gregório
Fortunato, o “Anjo Negro”, que foi acusado pelo pistoleiro Hilde Weber. Tribuna da Imprensa. 13 ago. 1954.
que efetuou os disparos, Alcino do Nascimento.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube
Getúlio
A intimidade de Getúlio Vargas (Tony Ramos), então presi-
dente do Brasil, em seus 19 últimos dias de vida. Pressio-
nado por uma crise política sem precedentes, em decorrên-
Após o atentado da rua Tonelero, Lacerda aparece
na foto carregado por militares. cia das acusações de que teria ordenado o atentado contra
o jornalista Carlos Lacerda (Alexandre Borges), ele avalia
3.5. A crise política e o os riscos existentes até tomar a decisão de se suicidar.
suicídio de Getúlio Vargas Os militares enviaram um ultimatum a Vargas exigindo sua re-
Mesmo declarando-se inocente e como a grande vítima do núncia, o que deixava claro que um golpe de Estado estava
atentado, Vargas perdeu o apoio da Aeronáutica, influencia- sendo preparado. Na noite do dia 23 de agosto, realizou-se

78
uma reunião ministerial no Palácio do Catete. Nela, foi cogitada Comovida, a população saiu às ruas de várias cidades, es-
uma licença do presidente, mas as negociações não avança- pecialmente no Rio de Janeiro, onde era realizado o velório
ram. Já de madrugada, Getúlio retirou-se para seus aposentos. do presidente. Emocionadas, pessoas passavam mal, des-
Na manhã do dia 24 de agosto de 1954, o presidente Ge- maiavam, eram pisoteadas no último adeus a Vargas.
túlio Vargas foi encontrado morto sobre sua cama, com um
tiro no coração. Na cabeceira da cama, havia uma carta-
-testamento, cuja divulgação comoveu a população.

“Não querem que o povo seja independente. Assumi


o Governo dentro da espiral inflacionária que des-
truía os valores do trabalho. Os lucros das empresas
estrangeiras alcançaram até 500% ao ano. Nas de-
clarações de valores do que importávamos existiam
fraudes constatadas de mais de 100 milhões de dó-
lares por ano. Veio a crise do café, valorizou-se o nos-
so principal produto. Tentamos defender seu preço
e a resposta foi uma violenta pressão sobre a nossa Comoção popular no velório de Vargas
economia, a ponto de sermos obrigados a ceder. Em diversas cidades, houve grandes manifestações con-
Tenho lutado mês a mês, dia a dia, hora a hora, resis- tra os adversários de Getúlio. A embaixada dos EUA e as
tindo a uma pressão constante, incessante, tudo su- redes dos jornais O Globo e Tribuna da Imprensa foram
portando em silêncio, tudo esquecendo, renunciando atacadas e apedrejadas. Veículos de emissoras e jornais
a mim mesmo, para defender o povo, que agora se oposicionistas foram queimados, Carlos Lacerda retirou-
queda desamparado. Nada mais vos posso dar, a não -se do Rio de Janeiro e vários outros políticos da UDN
ser meu sangue. Se as aves de rapina querem o san- também tiveram que se esconder da fúria popular.
gue de alguém, querem continuar sugando o povo
brasileiro, eu ofereço em holocausto a minha vida. A morte de Getúlio Vargas acabou por evitar um pos-
sível golpe militar articulado pela UDN, em 1954, e
Escolho este meio de estar sempre convosco.
conseguiu “atrasar” o golpe e o governo militar por 10
Quando vos humilharem, sentireis minha alma so-
anos (até 1964).
frendo ao vosso lado. Quando a fome bater à vos-
sa porta, sentireis em vosso peito a energia para
a luta por vós e vossos filhos. Quando vos vilipen-
diarem, sentireis no pensamento a força para a
reação. Meu sacrifício vos manterá unidos e meu
nome será a vossa bandeira de luta. Cada gota de
meu sangue será uma chamada imortal na vossa
consciência e manterá a vibração sagrada para a
resistência. Ao ódio respondo com o perdão.
multimídia: livro
E aos que pensam que me derrotam respondo com a
minha vitória. Era escravo do povo e hoje me liberto 1954: um tiro no coração – Hélio Silva
para a vida eterna. Mas esse povo de quem fui escra- Essa obra faz parte da monumental série ”O ciclo de
vo não mais será escravo de ninguém. Meu sacrifício Vargas”, um conjunto de 16 livros que narra a história
ficará para sempre em sua alma e meu sangue será do Brasil, da Proclamação da República, em 1889, até o
o preço do seu resgate. Lutei contra a espoliação do Golpe Militar de 1964.
Brasil. Lutei contra a espoliação do povo. Tenho luta-
do de peito aberto. O ódio, as infâmias, a calúnia não
abateram meu ânimo. Eu vos dei minha vida. Agora
vos ofereço a minha morte. Nada receio. Serenamen-
te dou o primeiro passo no caminho da eternidade e
saio da vida para entrar na História.”
(Carta-testamento deixada pelo presidente Getúlio
Vargas. 24 ago. 1954.) Manchete do jornal
Última Hora. Rio de Janeiro, 24 ago. 1954.

79
multimídia: livro

Vitória na derrota: a morte de Getúlio


Vargas – Ronaldo Conde Aguiar
Nesse livro, o sociólogo Ronaldo Conde Aguiar compõe
um amplo painel, investigando os eventos, as forças
políticas, as intenções não declaradas. Uma verdadeira
exploração policial, com acariação de depoimentos e
descobertas de pistas até hoje escondidas.

multimídia: site

https://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/AEraVargas2/
biografias/eurico_gaspar_dutra
www.infoescola.com/historia-do-brasil/plano-salte/
www.maniadehistoria.wordpress.com/getulio-var-
gas-explicacoes-para-sua-morte/
www.guiadoestudante.abril.com.br/estudo/por-que-
getulio-se-matou/

multimídia: livro

O homem que matou Getúlio Vargas – Jô Soares


Esse livro focaliza o período que vai da ditadura de Var-
gas à ditadura militar, conhecido como república liberal,
que cobre os governos de Dutra, Vargas (até o suicídio
em 1954), Café Filho, Juscelino, Jânio e Jango. Foi um
tempo de renúncias, deposições e morte de presidentes.

80
CONEXÃO ENTRE DISCIPLINAS

Química
No dia 3 de outubro de 1953, era criada a Petrobras, a companhia estatal destinada a cuidar da exploração do
petróleo brasileiro, sem deixar que empresas estrangeiras tivessem acesso a esse recurso do nosso solo. Contudo,
a campanha propagada pelo então presidente Getúlio Vargas dava a esperança ao povo de que tal companhia
iria gerar autossuficiência nos derivados de petróleo ao Brasil, o que faria com que o país poupasse muito dinhei-
ro sem a necessidade de importar tais produtos.
Contudo, o que não se propagava no ideário dos brasileiros era que uma companhia petrolífera não iniciaria
suas funções com plena capacidade de extração de petróleo e produção de seus derivados, pois para isso o Brasil
necessitaria de um enorme avanço na indústria química para poder refinar o petróleo (que bruto é uma mistura
complexa de hidrocarbonetos) e separar seus componentes. Tal refino passa por dois processos físicos (a destila-
ção fracionada e a destilação a vácuo) e um processo químico (o craqueamento catalítico), pelo qual quebram-se
as moléculas mais longas e as transformam em moléculas menores e de maior rentabilidade comercial. Como
nesse momento histórico o Brasil ainda não possuía refinarias de grande porte que pudessem realizar todas
essas etapas, o sonho de autossuficiência não prosperou.

Esquema de transformação de uma fração de querosene em gasolina pelo craqueamento catalítico

81
ÁREAS DO CONHECIMENTO DO ENEM

HABILIDADE 14
Comparar diferentes pontos de vista, presentes em textos analíticos e interpretativos, sobre situação ou fatos
de natureza histórico-geográfica acerca das instituições sociais, políticas e econômicas.

Para ilustrar diferentes dinâmicas políticas e sociais, a prova do Enem recorre a muitos textos jornalísticos e fragmen-
tos de obras da historiografia brasileira. Significa dizer que, para além da memorização do conteúdo da disciplina, o
aluno deve ser capaz de interpretar tais textos para conseguir formular corretamente a resposta da questão.
Vê-se que muitas dessas questões, como de praxe nessa prova, são de cunho interpretativo. Uma leitura calma e
perspicaz do enunciado é suficiente para resolvê-la. Especificamente na questão abaixo, é possível ver uma crítica à
dinâmica de redemocratização no Brasil no ano de 1945, quando Dutra e Eduardo Gomes disputavam as eleições
presidenciais, após oito anos de ditadura estadonovista. Vargas ainda dispunha de grande popularidade e o autor
do excerto expunha a capacidade desse governante de se identificar com as mais distintas e contraditórias causas.

MODELO 1
(Enem) Estão aí, como se sabe, dois candidatos à presidência, os senhores Eduardo Gomes e Eurico Dutra, e
um terceiro, o senhor Getúlio Vargas, que deve ser candidato de algum grupo político oculto, mas é também
o candidato popular. Porque há dois “queremos”: o “queremos” dos que querem ver se continuam nas
posições e o “queremos” popular... Afinal, o que é que o senhor Getúlio Vargas é? É fascista? É comunista?
É ateu? É cristão? Quer sair? Quer ficar? O povo, entretanto, parece que gosta dele por isso mesmo, porque
ele é “à moda da casa”.
A democracia. 16 set. 1945. Apud GOMES. A.C.; D’ARAÚJO, M.C. Getulismo e trabalhismo. São Paulo: Ática. 1989.

O movimento político mencionado no texto caracterizou-se por:


a) reclamar a participação das agremiações partidárias.
b) apoiar a permanência da ditadura estadonovista.
c) demandar a confirmação dos direitos trabalhistas.
d) reivindicar a transição constitucional sob influência do governante.
e) resgatar a representatividade dos sindicatos sob controle social.

ANÁLISE EXPOSITIVA

O movimento citado no texto é o queremismo. Tal movimento, articulado por Vargas junto às massas popu-
lares, visava defender a sua permanência no poder ou a transição de governo através da batuta varguista.

RESPOSTA Alternativa D

82
DIAGRAMA DE IDEIAS

GOVERNO DUTRA E
SEGUNDO GOVERNO VARGAS

A POPULISMO B GOVERNO DUTRA (1946-1951)

• FENÔMENO POLÍTICO LATINO-AMERICANO POLÍTICA INTERNA


• MEADOS DO SÉCULO XX • APROXIMAÇÃO COM A UDN
• LIDERANÇAS POLÍTICAS CARISMÁTICAS • CONSTITUIÇÃO DE 1946
• PATERNALISMO E DEMAGOGIA • LIBERAL
• POLÍTICA DE MASSAS • ELEIÇÕES DIRETAS
• TRABALHISMO • MANDATO DE 6 ANOS
• NACIONALISMO • PRESIDENTE E VICE ELEITOS SEPARADAMENTE
• CASSAÇÃO DO PCB
• INTERVENÇÃO NOS SINDICATOS
SEGUNDO GOVERNO POLÍTICA EXTERNA
C
VARGAS (1951-1954) • ATRELAÇÃO AOS EUA NA GUERRA FRIA
• DOUTRINA TRUMAN
CARACTERÍSTICAS
• OPOSIÇÃO DA UDN ECONOMIA
• POPULISMO E TRABALHISMO • PLANO SALTE (SAÚDE, ALIMENTAÇÃO, TRANSPORTE
• CRISE ECONÔMICA E ENERGIA)
• NACIONALISMO (AUTONOMIA ECONÔMICA) • IMPORTAÇÃO E GASTO DAS RESERVAS ECONÔMICAS
VS. ENTREGUISMO (ABERTURA ECONÔMICA) • EMPRÉSTIMOS ESTRANGEIROS
ELEIÇÕES DE 1950
NACIONALISMO
• GETÚLIO VARGAS (PTB/PSP)
• CRIAÇÃO DO BANCO NACIONAL DO
• BRIGADEIRO EDUARDO GOMES (UDN)
DESENVOLVIMENTO ECONÔMICO (BNDE)
• VITÓRIA ELEITORAL DE VARGAS
• LEI DE REMESSAS DE LUCROS AO EXTERIOR
• VICE: CAFÉ FILHO (PSP)
• CAMPANHA “O PETRÓLEO É NOSSO”
• APOIO POPULAR (MILITARES NACIONALISTAS,
UNE, SINDICATOS, COMUNISTAS, CLASSE MÉDIA)
• 1953 – CRIAÇÃO DA PETROBRAS
• MONOPÓLIO ESTATAL CRISE POLÍTICA
• OPOSIÇÃO DE CARLOS LACERDA (UDN)
TRABALHISMO E POPULISMO • DIFAMAÇÃO MIDIÁTICA
• INFLAÇÃO GENERALIZADA • ATENTADO DA RUA TONELERO
• MINISTRO DO TRABALHO (JOÃO GOULART) • EXÉRCITO EXIGE RENÚNCIA DE VARGAS
SE APROXIMA DOS SINDICATOS • PERIGO DE GOLPE MILITAR
• APOIO DOS TRABALHADORES • SUICÍDIO DE VARGAS (1954)
• OPOSIÇÃO DA ELITE, EMPRESÁRIOS E MILITARES • MANIFESTAÇÕES PÚBLICAS DE APOIO A VARGAS

83
Democrática Nacional) e de militares contrários a Getúlio,
AULAS 39 E 40 nomeando-os para as principais pastas ministeriais.
No ano de 1955, tiveram início as movimentações de
candidatos a presidente e vice, sendo lançados, respecti-
vamente, Juscelino Kubitschek (JK) e João Goulart (Jango).
Aliada a partidos de menor expressão, a UDN lançou a
REPÚBLICA LIBERAL OU candidatura de Juarez Távora, um dos militares que haviam
POPULISTA: GOVERNOS conspirado contra Vargas. Plínio Salgado candidatou-se
pelo PRP (Partido da Representação Popular) e Adhemar
CAFÉ FILHO E JK de Barros pelo PSP.

COMPETÊNCIAS: 1, 2, 3, 4 e 5

HABILIDADES:
1, 4, 5, 8, 12, 14, 15, 16,
17, 18, 20, 21 e 25
multimídia: vídeo
Fonte: Youtube

1. Governo Café Filho Conhecendo os Presidentes - Ep. 19: Café Filho

(1954–1955) Políticos conservadores e militares antigetulistas tenta-


ram impedir a candidatura de JK e Jango, alegando que
representariam a volta do getulismo ao poder e defen-
diam um governo de coalisão de direita. Os conservado-
res não foram atendidos e o Brasil, novamente, vivia um
clima de tensão.

multimídia: livro

A alma do negócio: como eram as propagandas nos


anos 50, 60 e 70 – Alberto Villas
O livro nos leva de volta a uma época pré-tecnológi-
ca, quando ainda não existiam os computadores e os
celulares. Na impressionante coleção de livros, discos
e revistas que possui, Villas garimpou as raridades que
João Café Filho compõem esse livro.
Em virtude do suicídio do presidente Getúlio Vargas (1954),
a Presidência da República foi assumida pelo vice-presidente
O presidente Café Filho afastou-se do cargo em novem-
João Café Filho, que pertencia ao PSP (Partido Social Progres-
bro de 1955, alegando problemas de saúde e foi substi-
sista) e havia sido indicado à chapa por Adhemar de Barros.
tuído pelo presidente do Congresso Nacional, Carlos Luz,
No exercício da presidência, Café Filho aproximou-se de que era filiado ao PSD, mas mantinha estreitas relações
políticos conservadores, especialmente da UDN (União com a UDN.

84
Realizadas as eleições, Juscelino Kubitschek obteve 36%
dos votos e Juarez Távora, 30%, enquanto João Goulart
foi eleito vice-presidente. Inconformados com a vitória de
JK e Jango, Carlos Lacerda e políticos da UDN tentaram
tumultuar ainda mais o ambiente político nacional, inicial-
mente justificando que os vitoriosos não poderiam assumir
por não terem obtido mais da metade dos votos, mesmo
que isso não estivesse presente na Constituição de 1946.
Lacerda chegou inclusive a pregar a anulação das eleições,
sob o argumento de que JK e Jango teriam vencido graças
aos votos de comunistas e trabalhadores pobres, que não
tinham “discernimento para votar”. Marechal Lott, ministro da Guerra e responsável
pelo contragolpe legalista ou “golpe preventivo”.

1.1. A Instrução 113


Na área econômica, uma importante medida foi a Instru- 2. Governo Juscelino
ção 113 (17 jan. 1955) da Superintendência da Moeda e
do Crédito (Sumoc)1, pela qual empresas estrangeiras po- Kubitschek (1956–1961)
diam importar máquinas e equipamentos do exterior sem
cobertura cambial (impostos alfandegários), contanto que
se associassem a empresas nacionais. Para os empresários
nacionais independentes persistiam as restrições cambiais
nas importações, de modo a forçá-los a uma associação com
os capitais estrangeiros. Iniciava-se um rápido processo de
desnacionalização econômica que tenderia a se intensificar.

1.1.1. O contragolpe legalista


do general Lott
O presidente Carlos Luz também não era favorável à
posse de JK e Jango, e demonstrava simpatia pelo gol-
pe que se processava junto a políticos da UDN. Para
favorecer o golpe, Luz precisava afastar do cargo de mi-
nistro da Guerra o general Henrique Teixeira Lott, que
era legalista e a favor do respeito à Constituição e ao
resultado das eleições.
No enterro do general Canrobert Pereira, o coronel Bizarria
Mamede fez um discurso inflamado atacando JK e Jango
Juscelino Kubitschek
e convocando as Forças Armadas a impedir a posse dos
eleitos. Lott exigiu que o presidente Luz punisse o coronel Logo que assumiu a presidência da República, o mineiro
Mamede. Como não foi atendido, afastou-se do cargo por Juscelino Kubitschek começou a pôr em prática seu plano
incompatibilidade com o presidente. de governo, chamado Plano de Metas. Utilizando o slo-
Porém, incentivado por outros militares legalistas, Lott resis- gan “50 anos em 5”, o presidente pretendia estimular o
tiu e depôs o presidente Carlos Luz, cercando o Rio de Janei- desenvolvimento nacional por meio de uma aliança entre o
ro com aproximadamente 2,5 mil homens, e posteriormente, Estado e a iniciativa privada, promovendo grande abertura
em novembro de 1955, impediu a volta de Café Filho ao ao capital estrangeiro e estimulando a industrialização e o
cargo. A justificativa para o golpe legalista foi o respeito à crescimento econômico nacional.
democracia. A presidência foi assumida pelo presidente do Entretanto, se o novo presidente enfrentou dificuldades
Senado Federal, Nereu Ramos, que decretou estado de sítio antes de tomar posse, enfrentou-as também no decorrer
e concluiu o mandato, garantindo a posse de JK e Jango no do mandato. Ocorreram levantes militares nas bases da
dia 31 de janeiro de 1956. aeronáutica de Jacareacanga (1956) e Aragarças (1959),
1
A Superintendência da Moeda e do Crédito, Sumoc, foi a autoridade
contidos habilmente pelo presidente, que concedeu anistia
monetária anterior à criação do Banco Central do Brasil. aos revoltosos.

85
Foi também graças a sua grande habilidade política que JK tade do previsto para a construção de novas estradas de ferro
conseguiu minar e enfraquecer a oposição ao seu governo, foi concluído. Por outro lado, o transporte rodoviário foi bene-
obtendo apoio da maioria do Congresso Nacional e conse- ficiado com a construção e reforma de estradas em número
guindo aprovar seus projetos. duas vezes maior que o previsto no plano. Uma grande obra
rodoviária ajudou muito o povoamento do Centro-Oeste do
Brasil e da Amazônia, a rodovia Belém-Brasília. Outra obra
rodoviária ligando regiões brasileiras, feita por Juscelino, foi a
Rodovia Régis Bittencourt, que liga o Sudeste ao Sul do Brasil.
O setor energético foi contemplado com a construção das
usinas hidrelétricas de Furnas e Três Marias, vitais para as
multimídia: vídeo indústrias que se instalavam no país. O Ministério das Mi-
nas e Energia foi criado com vistas à melhoria administrati-
Fonte: Youtube va do setor. Já os setores da saúde, educação e agricultura
Conhecendo os Presidentes - Ep. 20: Juscelino Kubitscheck foram marcados por avanços modestos.

multimídia: música
Fonte: Youtube O presidente Juscelino Kubitschek no Clube Militar, RJ, em conferência sobre
Governo de Juscelino Kubitschek “O Desenvolvimento econômico e as metas do governo”. Foto. Arquivo O Globo.

O desenvolvimento da indústria foi memorável, destacando-se


o setor de bens de consumo duráveis, que recebeu volumosos
investimentos externos atraídos por facilidades concedidas
pelo governo ao capital estrangeiro. As diretrizes para uma
efetiva implantação da indústria automobilística partiram do
Grupo Executivo da Indústria Automobilística (Geia), criado
pelo decreto 39.412 e assinado por Juscelino em 16 de junho
multimídia: livro de 1956. O Geia propôs que se incentivasse a produção de
automóveis e caminhões, com capitais privados especialmente
estrangeiros, que foram atraídos para o Brasil graças às facili-
O governo JK e as raízes getulistas da orientação dades concedidas pela instrução 113 e outras, e às potencia-
do capitalismo no Brasil – Daniel Kosinski lidades do mercado brasileiro. As grandes empresas multina-
O governo JK e as raízes getulistas da orientação do cionais – Ford, Willys Overland, General Motors e Volkswagen
capitalismo no Brasil é um livro escrito com o espírito de – concentraram-se no ABC paulista, mudando completamente
transformação do passado como objeto de saber. a fisionomia daquela região. Foram montadas também fábri-
cas de eletrodomésticos, papel, alumínio, cimento e borracha.

2.1. Plano de Metas


O termo “Plano de Metas” foi usado como referência
ao Plano Nacional de Desenvolvimento, composto por 31
metas, das quais a última sintetizava as demais: construir
a nova capital na região do Planalto Central, que deveria
ser inaugurada no dia 21 de abril de 1960. O plano con-
templava ainda os setores de transporte, energia, saúde,
educação, indústria e agricultura.
É importante frisar que algumas metas não foram atendidas
No fusca, Juscelino Kubitschek acena na inauguração
satisfatoriamente, como as de ferrovias, já que menos da me- da Volkswagen do Brasil, em 1959.

86
a transferência da capital federal para o Planalto Central
brasileiro gerou certo distanciamento entre o centro das
decisões do governo e eventuais pressões políticas e sociais
regionais. Além disso, considera-se que esse isolamento pro-
porcionou às autoridades mais segurança institucional.

multimídia: música
Fonte: Youtube
Anos Dourados (Minissérie)

2.1.1. Brasília, a nova capital


Como já dito, a meta síntese do Plano Nacional de Desen-
volvimento era a construção de Brasília, no Planalto Cen-
tral. Com esse pretensioso objetivo, JK criou a Companhia Responsável pelo projeto da construção de Brasília, o arquiteto Oscar
Urbanizadora da Nova Capital, a Novacap, para coordenar Niemeyer apresenta a maquete da
Praça dos Três Poderes para Juscelino e Israel Pinheiro.
a execução do projeto. Por meio de concurso público, foram Foto. Mario Fontenelle. Arquivo Público.
escolhidos o arquiteto Oscar Niemeyer e o urbanista Lúcio
Costa para projetar a cidade.
O governo não mediu esforços para concluir o projeto e A cultura no Brasil do “presidente bossa-nova”
conseguiu a aprovação no Congresso da Lei 2.874, de 19
de setembro de 1956, que criou a Novacap e permitiu ao
presidente obter empréstimos externos. Os operários, ma-
joritariamente nordestinos, trabalhavam diuturnamente e
eram chamados de candangos.

Tom Jobim e Vinicius de Moraes


multimídia: livro “Juscelino Kubitschek – denominado ‘presidente bos-
sa-nova’ pela simpática composição do músico Juca
Chaves – governou o país em um período em que a
O essencial de JK – Ronaldo Costa Couto
efervescência cultural era enorme, com figuras como
Biografia do ex-presidente responsável pela construção Guimarães Rosa, Jorge Amado, Dalton Trevisan, Glau-
de Brasília. Abrange os períodos da vida de Juscelino ber Rocha, Niemeyer, Darcy Ribeiro, Ferreira Gullar, os
Kubitschek – do nascimento à morte num acidente con- suplementos literários dos jornais O Estado de S. Pau-
siderado suspeito, passando pelo período em que traba- lo e Jornal do Brasil. A essa altura, no Nordeste, Paulo
lhou como médico, sua entrada na política, a mudança Freire testava seu método de alfabetização que teria
da capital do Brasil para a região Centro-Oeste, a mo- repercussão nacional e internacional.
dernização do Estado brasileiro e muitos outros pontos.
No Rio, o pessoal da ‘bossa-nova’ despontava em
1957, com a música Chega de saudade, de Vinícius e
Conforme o previsto, a capital foi transferida para Brasí- Tom Jobim. Em 1958, em São Paulo, o ator Gianfran-
lia, inaugurada em 21 de abril de 1960 –, bem como mi- cesco Guarnieri lançava o Teatro de Arena e a peça
nistérios, tribunais, órgãos administradores e repartições Eles não usam black-tie, uma revolução na temática,
públicas. Ainda em 1960, Juscelino indicou Darcy Ribeiro na linguagem e no conceito de teatros engajados.
para planejar a Universidade de Brasília, com auxílio de José Celso Martinez lançava o seu Teatro Oficina,
Niemeyer, Ciro dos Anjos e Anísio Teixeira. dando os primeiros passos com o teatro experimental
A construção de Brasília criou na região Centro-Oeste um com a peça A incubadeira. [...]
polo de desenvolvimento demográfico e econômico. Porém,

87
JK pretendia com isso atrair mais recursos para o Brasil.
Em 1959, finalmente, com Jobim, Vinicius, Carlos Resultado de sua proposta: criação da Operação Pan-Ame-
Lyra, Menescal, Nara Leão, Silvinha Telles, o violo- ricana (OPA) em 1958, que consistia na ajuda econômica
nista e compositor Baden Powell e muitos outros, dos EUA à América Latina por meio do recém-criado Banco
eclodiu o movimento musical da Bossa Nova, que Interamericano de Desenvolvimento (BID).
expressava uma profunda mudança de mentalidade
A necessidade de grandes volumes de capital para a exe-
temática, de harmonia musical e de concepção do
cução do Plano de Metas forçava o governo a recorrer in-
Brasil. Uma revolução no plano da história das men-
tensamente a empréstimos externos. JK tentou obter um
talidades no Brasil.”
empréstimo de 300 milhões de dólares junto ao FMI, que
(Adriana LOPEZ; Carlos Guilherme Motta. História do Brasil:
uma interpretação. São Paulo: Senac SP, 2008. p. 762-763).
impôs condições severas ao Brasil para liberar os recursos,
como corte de gastos públicos, contenção de salários e
redução de subsídios agrícolas. O governo brasileiro não
aceitou as condições impostas, mas também não conse-
guiu o empréstimo, o que levou ao rompimento de rela-
ções do Brasil com o FMI.

multimídia: música
Fonte: Youtube
Presidente bossa-nova – Juca Chaves

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube
Os anos JK - Uma trajetória política

multimídia: música
Fonte: Youtube
Nova capital – Linda Batista

multimídia: livro
2.2. Política externa
A execução do Plano de Metas requeria altos investimen- JK: o artista do impossível – Claudio Bojunga
tos do governo. Mas o Estado não dispunha de recursos e
Esse livro conta a história de um homem, de uma épo-
as exportações enfrentavam dificuldades. JK apelou então
ca e de um país. Um homem que ousou governar com
para o capital estrangeiro; recorreu a vultosos empréstimos
imaginação, uma época em que os brasileiros deram as
que elevaram a dívida externa brasileira.
costas à derrota – e viveram o sonho intenso de serem
Os grandes destaques da política externa do governo JK fo- modernos, cosmopolitas, viáveis.
ram a atuação na criação da Operação Pan-Americana (OPA)
e o rompimento com o Fundo Monetário Internacional (FMI).
A imagem negativa dos EUA na América Latina, demonstra- 2.3. Os resultados do Plano de Metas
da nas manifestações contra a visita do presidente Richard Os resultados do Plano de Metas foram impressionantes,
Nixon a alguns países latino-americanos, proporcionou ao sobretudo no setor industrial. Entre 1955 e 1961, o valor
presidente Juscelino Kubitschek a oportunidade de propor da produção industrial cresceu 80%, com altas porcenta-
ao governo estadunidense um programa de ajuda econô- gens nas indústrias do aço (100%), mecânicas (125%),
mica aos países da região como forma de melhorar sua de eletricidade, de comunicações (380%) e de material de
imagem junto à população do continente. Evidentemente, transporte (600%).

88
De 1957 a 1961, o PIB, Produto Interno Bruto, cresceu a
uma taxa anual de 7%, correspondendo a uma taxa per
capita de quase 4%. Se considerar toda a década de 1950,
o crescimento do PIB brasileiro per capita foi aproximada-
mente três vezes maior que o resto da América Latina.
No entanto, os gastos governamentais para sustentar o pro-
grama de industrialização, a construção de Brasília e um forte multimídia: música
saldo negativo na balança comercial resultaram em crescen-
Fonte: Youtube
tes deficits do orçamento federal. O governo gastava mais do
Me leva, seu presidente – Jorge Veiga
que arrecadava. Esse déficit passou de menos de 1% do PIB
em 1954 e 1955, para 2% em 1956 e 4% em 1957.
Esse quadro foi acompanhado do avanço da inflação. Em
1956, a inflação estava em 19%; ao final do governo JK,
a inflação atingiu 30% ao ano. Dentre os vários fatores do
crescimento da inflação, os principais foram os gastos go-
vernamentais com a construção de Brasília e com o atendi-
mento aos aumentos salariais de setores do funcionalismo,
aprovados pelo Congresso; o déficit na balança comercial; multimídia: livro
a compra de café por meio de emissão de papel-moeda
para sustentar os preços em declínio; e o crédito fácil con- Expresso Brasília: a história contada
cedido ao setor privado. pelos candangos – Edson Beu
Houve também aumento espetacular da dependência em Expresso Brasília é um livro comovente. A ideia de levantar a
relação ao capital externo. Em setores como a indústria voz dos candangos é bela, e nos deixa com um sentimento
automobilística, cigarros, eletricidade, material elétrico, de gratidão pelo autor, por ter feito o que muitos não fize-
produtos químicos e farmacêuticos, o domínio do capital ram, ao falar sobre aqueles anos árduos e extraordinários.
estrangeiro passou a ser de 80% a 90%. O crescimento
econômico acelerado foi acompanhado pelo aumento das
importações, remessas de lucros, pagamentos de royalties,2
o que resultou em déficits da balança de pagamentos.
2.4. A sucessão de JK
Em 1960 foram realizadas eleições para a escolha do novo
Os investimentos privados e públicos eram maiores na região
presidente da República. Coligados, PSD, Partido Social De-
Sudeste, aumentando as disparidades regionais e, em espe-
mocrático, e PTB, Partido Trabalhista Brasileiro, lançaram uma
cial, era notável o declínio econômico do Nordeste. A própria
chapa encabeçada pelo marechal Henrique Teixeira Lott e João
classe dominante nordestina multiplicou a transferência de
Goulart para vice. Os eleitores votavam em separado para pre-
seus capitais para o Sul em busca de mais lucros, enquanto a
sidente e vice-presidente – ao qual era permitida a reeleição.
classe trabalhadora continuava a migrar de forma crescente,
fugindo da miséria da região. Em 1959, numa tentativa de
resolver os problemas da região, o governo federal criou a
Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste, (Sude-
ne) sem, contudo, alcançar o resultado esperado.
Some-se a todos esses problemas, um aumento signi-
ficativo da dívida externa. Quando da posse de JK, a
dívida externa brasileira era de 1,5 bilhão de dólares;
multimídia: música
no final de seu governo, saltara para 3,8 bilhões de dó- Fonte: Youtube
lares. Ainda ocorreu a emissão de títulos públicos mui- A bandeira do meu partido – Jorge Mautner
to abaixo do seu real valor de mercado, o que atraiu
compradores e garantiu dinheiro rápido ao governo, O PSP, Partido Social Progressista, indicou Adhemar de Bar-
mas gerou uma enorme dívida pública a ser paga pelo ros e o minúsculo PTN, Partido Trabalhista Nacional, com
próximo presidente. o apoio da UDN, União Democrática Nacional, lançou a
candidatura de Jânio Quadros, ex-vereador, ex-deputado,
2
Royalties são pagamentos pelo uso de tecnologia estrangeira e remetidos
para o exterior. ex-prefeito e ex-governador, sempre por São Paulo.

89
Dotado de uma oratória envolvente e utilizando discursos
fortes e uma imagem que o aproximava das camadas po-
pulares, Jânio Quadros venceu as eleições com a maior vo-
tação já obtida até então por um candidato à presidência.
Sua campanha tinha como símbolo uma vassoura, com a
qual prometia varrer a corrupção do Brasil. João Goulart foi
novamente eleito vice-presidente.
multimídia: site

https://cpdoc.fgv.br/producao/dossies/JK/artigos/
JkRumoPresidencia/11Novembro
www.espacoacademico.com.br/076/76borges.htm
www.cpdoc.fgv.br/producao/dossies/JK/artigos/So-
ciedade/Musica
www.cpdoc.fgv.br/producao/dossies/JK/artigos/
Economia/PlanodeMetas
www.cpdoc.fgv.br/producao/dossies/JK/artigos/
Jânio ao lado da “vassoura”: uma carreira meteórica, Brasilia/Construcao
marcada pelo discurso de viés populista.

multimídia: livro

Fé em Deus e pé na tábua – Amilton Lovato


A fantástica história de Adhemar de Barros, um político po-
pulista desbocado, amado e odiado, inspirador do infame
lema “rouba, mas faz”, que participou do Golpe Militar de
1964, foi posto de lado pelos generais e morreu exilado
em Paris, depois de marcar sua época e a história do Brasil.

multimídia: livro

Chega de saudade – Ruy Castro


O livro reconstitui a vida boêmia e cultural carioca dos
tempos da bossa nova – boate por boate, tiete por tiete,
história por história. Para compor esse fascinante mo-
saico envolvendo música e comportamento, Ruy Castro
ouviu dezenas de seus participantes: compositores, can-
tores, instrumentistas – além de seus amigos e inimigos.

90
CONEXÃO ENTRE DISCIPLINAS

Arte e geopolítica
Durante o governo do presidente Juscelino Kubitschek (1956-1961), ocorreu uma grande aproximação com a
cultura estadunidense, seja por meio do cinema ou da música. Símbolo dessa aproximação, o estilo musical que
dominava a época era a bossa nova, uma união do samba com o jazz. O estilo musical se tornou tão importante
para a época, que o próprio presidente ganhou a alcunha de “presidente bossa-nova”, apodo este muito ligado
às constantes aparições do chefe de Estado brasileiro em eventos e festas repletos de artistas.
Contudo, ainda devemos lembrar que essa aproximação política com os EUA já vinha sendo desenhada desde o
governo Dutra (1946-1951), e fazia parte de um contexto político internacional muito maior que a simples mi-
xagem de estilos musicais. O contexto político em questão era a Guerra Fria, disputa que opunha o sistema capi-
talista, defendido pelos EUA, ao sistema socialista, defendido pela URSS. Nesse cenário, o Brasil seguia a cartilha
de um bom país americano, o qual deveria seguir alinhado às políticas projetadas pelos EUA, adotando todas
as medidas importantes para combater os ideais socialistas e evitar sua propagação em continente americano.

Presidente JK recebendo os melhores da rádio no ano de 1956.

91
ÁREAS DO CONHECIMENTO DO ENEM

HABILIDADE 25
Identificar estratégias que promovam formas de inclusão social.

Políticas públicas envolvem quase sempre o uso do orçamento público, selecionando aqueles que serão
beneficiados e excluindo todo o restante da população. A habilidade 25 requer a capacidade do estudante
de captar o impacto dessas políticas na dinâmica de inclusão econômica e social. A república de 1946-
1964 foi um período de consecução de diversos planos econômicos, que impactavam profundamente a
vida do povo brasileiro. É preciso que o candidato estude as suas propostas, mas também seus resultados
práticos e desdobramentos.
Abaixo, há uma questão que trata do governo Juscelino Kubitschek, marcado pelo discurso desenvol-
vimentista e por políticas que visavam à industrialização e ao aumento do consumo de bens duráveis
no país, enquanto boa parte da população vivia sem sequer ter acesso à energia elétrica e alimentação.
Trata-se, portanto, de um processo contraditório que o aluno deverá interpretar.

MODELO 1
(Enem)

JK — Você agora tem automóvel brasileiro, para correr em estradas pavimentadas com asfalto brasileiro, com
gasolina brasileira. Quer mais quer?
JECA — Um prato de feijão brasileiro, seu doutô!
THÉO. In: LEMOS, R. (Org.). Uma história do Brasil através da caricatura (1840-2001). Rio de Janeiro: Bom Texto; Letras &
Expressões, 2001.

A charge ironiza a política desenvolvimentista do governo Juscelino Kubitschek, ao:


a) evidenciar que o incremento da malha viária diminuiu as desigualdades regionais do país.
b) destacar que a modernização das indústrias dinamizou a produção de alimentos para o mercado interno.
c) enfatizar que o crescimento econômico implicou aumento das contradições socioespaciais.
d) ressaltar que o investimento no setor de bens duráveis incrementou os salários de trabalhadores.
e) mostrar que a ocupação de regiões interioranas abriu frente de trabalho para a população local.

ANÁLISE EXPOSITIVA

Como a charge mostra, enquanto em alguns setores da economia (como o industrial) o Brasil apresentava
significativo crescimento, em outros (como a inclusão social de todos) o país ainda “patinava”, apresen-
tando grandes disparidades de desenvolvimento.

RESPOSTA Alternativa C

92
DIAGRAMA DE IDEIAS

GOVERNOS CAFÉ FILHO E JK

GOVERNO CAFÉ FILHO GOVERNO JUSCELINO


A B
(1954-1955) KUBITSCHEK (1956-1961)
• VICE DE VARGAS PELO PSP
• APROXIMA-SE DA UDN CARACTERÍSTICAS
• RENÚNCIA • ALIANÇA ENTRE ESTADO E INICIATIVA PRIVADA
• ASSUME CARLOS LUZ (PSD), PRESIDENTE DO CON- • DESENVOLVIMENTO DE INFRAESTRUTURA
GRESSO NACIONAL • FORTALECIMENTO DO SETOR AUTOMOBILÍSTICO
• EIXO ECONÔMICO NO SUL-SUDESTE
ECONOMIA
• CRIAÇÃO DA SUDENE
• INSTRUÇÃO 113 DA SUPERINTENDÊNCIA DA MOE-
• PLANO DE METAS
DA E DO CRÉDITO (SUMOC)
• CRESCIMENTO DO PIB
• FACILITA IMPORTAÇÃO POR EMPRESAS ESTRANGEIRAS
• AUMENTO DA INFLAÇÃO
• DESNACIONALIZAÇÃO ECONÔMICA
• ESTÍMULO AO FUNCIONALISMO PÚBICO
ELEIÇÕES DE 1955
• VITÓRIA DE JUSCELINO KUBITSCHEK (PSD) E JOÃO CULTURA
GOULART (PTB) • BAIXO INVESTIMENTO EM EDUCAÇÃO
• SETORES DO EXÉRCITO TENTAM IMPEDIR A POSSE • FERMENTAÇÃO ARTÍSTICA E CULTURAL
• CONTRAGOLPE LEGALISTA DO GENERAL LOTT • EDUCAÇÃO POPULAR (PAULO FREIRE)
• TEATRO ENGAJADO E EXPERIMENTAL
• CINEMA NOVO
POLÍTICA EXTERNA • MODERNISMO (LITERATURA, ARQUITETURA)
• ESTREITAMENTO DE LAÇOS COM OS EUA • MOVIMENTOS MUSICAIS (BOSSA NOVA)
• ROMPIMENTO COM O FUNDO MONETÁRIO INTERNACIONAL (FMI)
• AJUDA DO BANCO INTRA-AMERICANO DE DESENVOLVIMENTO
PLANO DE METAS
(BID)
• 31 METAS
ELEIÇÕES DE 1960 • CONSTRUÇÃO DE BRASÍLIA NO PLANALTO CENTRAL
• COLIGAÇÃO PSD/PTB: MARECHALL LOTT (PRESIDÊNCIA) E • OBRAS RODOVIÁRIAS
JOÃO GOULART (VICE) • USINAS HIDRELÉTRICAS
• ADHEMAR DE BARROS (PSP) • CRIAÇÃO DO MINISTÉRIO DE MINAS E ENERGIA
• JÂNIO QUADROS (PTN/UDN) • POUCO INVESTIMENTO EM SAÚDE, EDUCAÇÃO E
• VITÓRIA DE JÂNIO QUADROS E JOÃO GOULART AGRICULTURA

93
muito tempo. Sua renúncia (25 de agosto de 1961), vista por
AULAS 41 E 42 muitos como uma estratégia para reforçar sua base política,
colocou o Brasil em alerta e sob uma ameaça de guerra civil,
só contornada pela adoção do parlamentarismo, que possibi-
litou a posse do seu vice João Goulart, com poderes limitados
em virtude das resistências dos setores conservadores.
REPÚBLICA LIBERAL OU Jango, como era conhecido, enfrentou diversas dificuldades,
POPULISTA: GOVERNOS em especial quando tentou aprovar um conjunto de medidas
que foram rejeitadas pelo Congresso, conhecidas como “refor-
JÂNIO QUADROS E mas de base”. Seguiram-se manifestações sociais contrárias e
favoráveis ao presidente. Por essa razão talvez seja esse perí-
JOÃO GOULART odo o momento ideal para analisar a atuação dos movimen-
tos sociais que contribuíram para mudanças ou rupturas em
processos de disputa pelo poder, bem como para reconhecer
COMPETÊNCIAS: 1, 2, 3, 4 e 5 a dinâmica da organização dos movimentos sociais e a im-
portância da participação da coletividade na transformação
1, 2, 3, 7, 8, 9, 10, 13, 14,
HABILIDADES: da realidade histórico-geográfica. Por fim, vale lembrar que
15, 21, 22 e 25
avaliar criticamente conflitos culturais, sociais, políticos, econô-
micos ou ambientais, ao longo da história, é outro objetivo que
temos neste capítulo, o que permitirá compreender melhor os
fatores que resultaram em 21 anos de regime ditatorial.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube
Política desde 1945 até o golpe militar de 1964
filme imperdível
Posse de Jânio Quadros como presidente da República, ladeado pelo vice,
João Goulart, e pelo ex-presidente, Juscelino Kubitschek.

2. Governo Jânio
1. Introdução Quadros (1961)
Ainda que tivesse enfrentado alguns problemas internos para
manter a estabilidade política em seu governo, bem como
uma crise internacional, resultado da sua política econômica,
pode-se classificar o governo de Juscelino Kubitschek como
uma fase em que predominou certa estabilidade. Afinal, em
todo o período da República populista (1945 a 1964), so-
mente dois presidentes chegaram a concluir seus mandatos:
Dutra e o próprio Juscelino. As crises político-institucionais
que se iniciaram efetivamente com o suicídio de Vargas, em
1954, tornaram-se cada vez mais intensas e menos espaça-
das, culminando com o Golpe civil-militar em 1964, processo
classificado como a fase do colapso do populismo.
Nesse contexto, destaca-se a figura de Jânio Quadros, político
que se tornara um fenômeno das urnas, inaugurando uma for-
ma irreverente de fazer campanha, que viria a ser imitado por Jânio Quadros

94
O sul-mato-grossense de Campo Grande, Jânio da Silva Qua-
dros, foi professor de Língua Portuguesa e advogado antes
de entrar para a política. Sua ascensão política foi meteórica
e teve início quando assumiu o cargo de vereador de São
Paulo, em 1947, beneficiado pela cassação de vereadores
eleitos pelo Partido Comunista extinto pelo então presidente
Eurico Gaspar Dutra. Em 1950 foi eleito deputado estadual;
em 1953, prefeito de São Paulo e em 1954 licenciou-se para
disputar e vencer o pleito pelo governo do estado de São
Paulo, que governou até 1959.
Carismático, excêntrico, conservador, grande orador e aci-
ma de tudo populista, Jânio baseava suas campanhas na
sua imagem e na sua personalidade, não se ligando a par-
tidos ou a correntes políticas.
Isso fica claro nas constantes trocas de partido que fazia
a cada eleição e na vitória na campanha presidencial pela
coligação de pequenos partidos, apesar do apoio da UDN,
União Democrática Nacional, encabeçada pelo PTN, Partido
Trabalhista Nacional, partido de pouca expressão política.
Jânio Quadros condecora Che Guevara com a
Ordem Nacional do Cruzeiro do Sul.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube multimídia: livro
Conhecendo os Presidentes - Ep. 21: Jânio Quadros
Jânio Quadros: a vassoura em
2.1. Política externa independente ação! – Nelson Cavalcante
Desde o início de seu curto governo, Jânio Quadros definiu Jânio Quadros foi, sem dúvida, uma das figuras mais im-
que a política externa brasileira seria independente, não portantes da vida política do Brasil no século XX, pelos
alinhada automaticamente pelos interesses estrangeiros, muitos contrastes de sua extraordinária carreira e seu
especialmente os norte-americanos. estilo peculiar e exótico de tratar as coisas do Estado.
Dessa maneira, com o intuito de conquistar novos mer-
cados consumidores, o governo restaurou relações diplo-
máticas com a URSS e a China comunista, que haviam 2.2. Política interna
sido rompidas na presidência de Eurico Gaspar Dutra. Na Jânio Quadros foi o primeiro presidente a tomar posse em
ONU, o Brasil defendeu o ingresso da China no órgão e Brasília, assumindo o cargo num momento em que o país
deu apoio às independências de Angola, Moçambique e atravessava séria crise econômica. A inflação crescia, havia
Guiné-Bissau, colônias portuguesas, alegando que o Brasil
grande déficit nas contas públicas e na balança comercial.
apoiava a tese de autodeterminação dos povos.
A dívida externa havia crescido assustadoramente, prin-
Além disso, Jânio recusou-se a apoiar a invasão estadu- cipalmente em virtude dos empréstimos contraídos por
nidense da Baía dos Porcos, em represália à Revolução Juscelino Kubitschek, cujos juros deveriam começar a ser
Cubana, e condecorou o ex-guerrilheiro e um dos líde- pagos ao longo do ano de 1961.
res da Revolução ao lado de Fidel Castro, Ernesto “Che”
Guevara. Também condecorou Yuri Gagarin, cosmonauta Para enfrentar a crise econômica, a moeda foi desvaloriza-
russo que foi o primeiro homem a sair da órbita da Terra. da (instrução 204 da Sumoc), foram cortados gastos pú-
Essas medidas não satisfizeram os setores conservadores blicos e reduzidos os subsídios para a importação de trigo
ligados ao capital estrangeiro, perdendo sua base parla- e petróleo, medidas que geraram oposição ao presidente
mentar com o afastamento da UDN do governo. da República, pois provocaram recessão e inflação. Além

95
disso, a política externa independente afastou a UDN de Contrariado, o presidente reuniu seus ministros milita-
Jânio, que perdeu sua base parlamentar no Congresso, o res e exigiu que fosse mantida a ordem no país. No dia
que dificultava muito as ações do governo. seguinte, 25 de agosto, Jânio Quadros participou pela
manhã, em Brasília, de uma solenidade em homenagem
Tentando desviar a atenção da imprensa e da população dos
ao dia do soldado. No início da tarde, enviou um bilhe-
reais problemas brasileiros e das medidas impopulares do
te ao Congresso Nacional comunicando sua renúncia à
governo, Jânio Quadros adotou medidas polêmicas que o
presidência da República.
mantinham constantemente na mídia, como proibições do
uso de biquínis em desfiles, brigas de galo, corridas de cavalo Tudo indica que a renúncia era uma jogada de Jânio para
em dias úteis e de lança-perfumes em bailes de carnaval. obter mais poderes, já que não tinha base parlamentar para
governar. Ele acreditava, e com razão, que militares e políti-
Jânio tinha o hábito de dar ordens por meio de bilhetes,
cos conservadores não aceitariam a posse do vice-presidente
geralmente dirigidos a assessores e funcionários públicos.
João Goulart e insistiriam para que desistisse da renúncia,
As repartições públicas foram obrigadas a funcionar em
desistência essa que poderia ocorrer se fossem aceitas al-
dois turnos e instaladas diversas sindicâncias nas mesmas
gumas exigências suas; ele acreditava também que haveria
por ordem do presidente, que proclamava ser defensor da
manifestações populares em prol de sua continuidade.
moral e dos bons costumes.
Mas as coisas não aconteceram dessa forma. A situação era
tensa e o vice-presidente estava fora do país em visita oficial
à China. O Congresso e os militares aceitaram prontamente
a renúncia do presidente e a presidência da República foi
ocupada por Ranieri Mazzilli, presidente do Congresso Na-
cional. O Brasil viveria uma crise política sem precedentes.

multimídia: música
Fonte: Youtube
Varre, varre, vassourinha – jingle
Jânio Quadros (1960)

2.3. A renúncia
Novamente, o ambiente político nacional foi agitado por Car-
los Lacerda da UDN. Revoltado com as condecorações de Che
Guevara, o então governador do estado da Guanabara denun-
ciou em 24 de agosto de 1961, aniversário de morte de Getú-
lio Vargas, que Jânio Quadros preparava um golpe de Estado.

multimídia: música
Fonte: Youtube
Capa da edição extra da Revista Fatos & Fotos O homem da vassoura – João Dias
destacando a renúncia de Jânio à presidência.

96
Texto da carta renúncia de Jânio
3. Governo João Goulart
“Fui vencido pela reação e assim deixo o governo. (1961–1964)
Nestes sete meses cumpri o meu dever. Tenho-o cum-
prido dia e noite, trabalhando infatigavelmente, sem 3.1. A crise política antes da posse
prevenções nem rancores. Mas baldaram-se os meus
esforços para conduzir esta nação, que pelo caminho A renúncia de Jânio Quadros mergulhou o país em uma
de sua verdadeira libertação política e econômica, a séria crise política, pois militares e setores conservadores
única que possibilitaria o progresso efetivo e a justiça opunham-se à posse do vice-presidente João Goulart, con-
social a que tem direito o seu generoso povo. siderado herdeiro político de Getúlio Vargas e comunista.
Desejei um Brasil aos brasileiros, afrontando, nesse sonho,
a corrupção, a mentira e a covardia que subordinam os
interesses gerais aos apetites e às ambições de grupos
ou de indivíduos, inclusive do exterior. Sinto-me, porém,
esmagado. Forças terríveis levantam-se contra mim e
me intrigam ou inflamam, até com a desculpa de cola-
boração. Se permanecesse, não manteria a confiança e a multimídia: vídeo
tranquilidade, ora quebradas, indispensáveis ao exercício
Fonte: Youtube
da minha autoridade. Creio mesmo que não manteria a
própria paz pública. Encerro assim, com o pensamento Conhecendo os Presidentes - Ep. 22: João Goulart
voltado para a nossa gente, para os estudantes, para os
operários, para a grande família do Brasil, esta página da Logo que soube da renúncia, Jango voltou ao Brasil, mas
minha vida e da vida nacional. A mim não falta a coragem foi impedido de entrar no país pelos ministros militares
da renúncia. Saio com um agradecimento e um apelo. O brigadeiro Gabriel Grün Moss (Aeronáutica), almirante Síl-
agradecimento é aos companheiros que comigo lutaram vio Heck (Marinha) e general Odílio Denys (Exército). Eles
e me sustentaram dentro e fora do governo e, de forma contavam com o apoio da UDN e de Carlos Lacerda, que
especial, às Forças Armadas cuja conduta, exemplo, em
defendiam o impedimento de Jango, uma reforma consti-
todos os instantes, proclamo nesta oportunidade. O apelo
tucional e a realização de novas eleições presidenciais.
é no sentido da origem, do congraçamento, do respeito e
da estima de cada um dos meus patrícios, para todos e de João Goulart seguiu para o Uruguai e entrou no Brasil pelo
todos para cada um. Somente assim seremos dignos des- Rio Grande do Sul, de onde o governador Leonel Brizola
te país e do mundo. Somente assim seremos dignos de organizava um movimento em prol do respeito à Consti-
nossa herança e da nossa predestinação cristã. Retorno tuição e da posse de Jango. O movimento foi batizado de
agora ao meu trabalho de advogado e professor. Traba- “Campanha da Legalidade”. Pelo rádio convocava o povo
lharemos todos. Há muitas formas de servir nossa pátria.” a defender a legalidade, contando com o apoio de outros
Brasília, 25 de agosto de 1961 (Acesso em: <historiativa.com>). governadores – Juracy Magalhães (Bahia); Mauro Borges
(Goiás); Carvalho Pinto (São Paulo) e Ney Braga (Paraná).
Além deles, a maioria do Congresso era a favor da posse
de Jango, bem como alguns militares, como o marechal
Henrique Lott e o general Machado Lopes, comandante do
II Exército, sediado no Rio Grande do Sul.

multimídia: livro

Desafio inacabado: a política externa de Jânio


Quadros – Carlos Alberto Leite Barbosa
Esse livro pretende colaborar para a interpretação sob a
óptica das relações internacionais de episódios que mar-
caram os sete meses do governo Jânio Quadros, interrom-
pido pela sua renúncia no dia 25 de agosto de 1961.
Brizola teve importante atuação na rede pela legalidade.

97
O governador gaúcho Leonel Brizola ameaçava distribuir Ciente das dificuldades do país e da oposição dos meios
armas à população e o país estava à beira de uma guerra elitistas, conservadores e militares, João Goulart iniciou a
civil, quando foi selado um acordo para resolver o impasse: primeira fase de seu governo procurando alternativas para
o Congresso Nacional aprovou uma emenda à Constituição restaurar o presidencialismo, o que lhe garantiria poderes
de 1946, que estava em vigor, instituindo o parlamentaris- para tentar realizar as reformas necessárias ao Brasil. Para
mo no Brasil durante um período, quando, por meio de um tanto, deveria conquistar o apoio ou quebrar a resistência
plebiscito a ser realizado em 1965, coincidiria com o término dos militares e acalmar a oposição conservadora sem per-
do mandato de Jango. A população decidiria se mantinha o der o apoio popular e de setores progressistas de esquerda.
sistema ou se o Brasil deveria retornar ao presidencialismo. Nessa fase, o país era governado de fato por um primei-
A adoção do parlamentarismo foi a solução encontrada para ro-ministro, cargo ocupado respectivamente por Tancredo
a grave crise que o país atravessava, agradando aos dois la- Neves (PSD), Brochado da Rocha (PSD) e Hermes Lima
dos, pois João Goulart poderia assumir a presidência, como (PSB). Durante esses governos, não houve melhoria na
queriam os legalistas, mas não teria plenos poderes, como situação do país, o que fazia aumentar a crença de que
exigiam os conservadores e militares contrários à sua posse. somente Jango poderia resolver os problemas nacionais.
Diante disso cresceram as pressões para a antecipação do
plebiscito sobre a manutenção do parlamentarismo ou a
volta do presidencialismo. O país sofreu com greves e ma-
nifestações em todo o território nacional, especialmente
nas capitais. A gravidade da situação e a pressão popular
forçaram o Congresso Nacional a aprovar a antecipação do
multimídia: livro plebiscito de 1965 para 6 de janeiro de 1963.

Brizola – Trajano Ribeiro e Clóvis Brigagão


Revivendo grandes momentos da história de Brizola,
conseguimos entender o quanto foi fundamental a sua
dedicação ao Brasil.

3.2. Fase parlamentarista (1961–1963)


Depois da crise institucional e política que se seguiu à re-
núncia de Jânio Quadros, João Goulart pôde assumir a pre-
sidência no dia 7 de setembro de 1961, graças ao acordo
político que levou o Congresso a aprovar a emenda consti-
tucional que implantaria o parlamentarismo no Brasil.
Jango assumiu a presidência num momento em que o país
atravessava uma séria crise econômica, com altas taxas de
inflação, déficits públicos e uma enorme e crescente dívida
externa. Seu governo foi dividido em duas fases, parlamen-
Cartaz convoca os brasileiros a dizerem não ao parlamentarismo.
tarista e presidencialista, e estendeu-se até 31 de março de
1964, quando foi deposto por um Golpe Militar. 3.3. Fase presidencialista (1963–1964)
O resultado do plebiscito provocou a restauração do presi-
dencialismo no Brasil. No dia 24 de janeiro de 1963 foi em-
possado o novo ministério montado pelo presidente João
Goulart, com destaque para Almino Afonso (Trabalho),
Celso Furtado (Planejamento e Coordenação Econômica)
e San Tiago Dantas (Fazenda).
Diante da crise, o governo elaborou um plano para ser
aplicado entre os anos de 1963 e 1965, chamado Plano
Trienal, que contemplava prioridades como combate à
Posse de João Goulart inflação, retomada do crescimento econômico e renego-

98
ciação da dívida externa, bem como Reformas de Base, A oposição a Jango e às Reformas de Base congregava po-
consideradas fundamentais para solucionar os problemas líticos conservadores, especialmente da UDN, empresários,
sociais do país. militares; imprensa – com destaque para Carlos Lacerda e o
jornal O Globo –, parte da Igreja Católica, Instituto de Pes-
As Reformas de Base compreendiam reformas político-
quisas e Estudos Sociais, Ipes – composto por empresários –,
-eleitorais – direito de voto aos analfabetos – e partidárias;
Campanha da Mulher pela Democracia, Cade – financiada
tributária – limitação da remessa de lucros ao exterior e
pelos Ipes –, Movimento Anticomunista, MAC, Frente da Ju-
regulamentação de impostos de acordo com a renda; uni-
ventude Democrática – formada por estudantes de classe
versitária – de acordo com exigências estudantis; constitu-
média e alta –, e setores de classe média assustados com a
cional e agrária – baseadas na desapropriação de terras às
amplitude das Reformas de Base, que poderiam, segundo a
margens de rodovias e ferrovias federais.
imprensa conservadora, atingir seus bens.

multimídia: vídeo
multimídia: livro
Fonte: Youtube
Jango O golpe de 64 – Oscar Pillagalo
O filme refaz a trajetória política de João Goulart, o 24.º Em 31 de março de 1964, as forças militares brasileiras defla-
presidente brasileiro, que foi deposto por um Golpe Mi- graram um golpe de Estado contra o presidente João Goulart
litar nas primeiras horas de 1.º de abril de 1964. e instalaram no país uma ditadura que durou duas décadas.

É importante frisar que o combate à inflação seria marcado


por medidas recessivas e impopulares e que as Reformas de 3.4. Agravamento da crise
Base não agradavam setores conservadores e das elites. O e deposição de Jango
resultado foi a intensificação dos debates e grandes mani-
festações a favor e contra as reformas propostas por Goulart.
O presidente recebia apoio de segmentos nacionalistas e pro-
gressistas, como sindicatos, trabalhadores em geral, Coman-
do Geral dos Trabalhadores, CGT; União Nacional dos Estu-
dantes, UNE; Ligas Camponesas, Ação Popular – católicos de
esquerda –, Pacto de Unidade e Ação Popular, Frente de Mo-
bilização Popular, FMP, liderada por Leonel Brizola, políticos
do PTB e PSD; comunistas e intelectuais ligados ao Instituto Presidente João Goulart com a esposa Maria Teresa no comício de
Superior de Estudos Brasileiros, ISEB; e segmentos populares. 13 de março de 1964 em que anunciou as Reformas de Base.

multimídia: vídeo multimídia: livro


Fonte: Youtube
1964: o golpe que derrubou um presidente, pôs
Dossiê Jango
fim ao regime democrático e instituiu a ditadura
João Goulart foi eleito presidente do Brasil democratica-
– Jorge Ferreira e Angela de Castro Gomes
mente, mas acabou deposto. O filme traz a questão de
Um panorama de como se instaurou a ditadura civil-mi-
sua morte misteriosa à tona e tenta esclarecer fatos obs-
litar no Brasil e seus desdobramentos.
curos da história do país.

99
A cada dia a situação política brasileira tornava-se mais lica, que ocupou as ruas do centro da cidade, no dia 19 de
tensa e o governo era acusado de estar a serviço do comu- março: a “Marcha da Família com Deus pela Liberdade.”
nismo internacional. Governadores de estados importantes
defendiam abertamente a deposição do presidente, entre
eles Adhemar de Barros, de São Paulo; Carlos Lacerda, da
Guanabara; IIdo Meneghetti, do Rio Grande do Sul; e Ma-
galhães Pinto, de Minas Gerais.
Jornais influentes como O Globo, O Estado de S. Paulo e
O Correio da Manhã atacavam diariamente o presidente
Goulart. O embaixador dos EUA no Brasil, Lincoln Gordon,
circulava constantemente ao lado dos conspiradores, de-
monstrando de que lado estava o governo estadunidense.
Marcha da Família com Deus pela Liberdade
Por outro lado, o deputado Leonel Brizola reunia importan-
tes lideranças civis e políticas, entre elas o governador de
Pernambuco Miguel Arraes, com o intuito de impedir um
golpe de Estado contra o presidente Goulart.
Diante da crise, João Goulart tentou implantar o estado
de sítio, mas o Congresso não aprovou tal medida. Jango
decidiu então aproximar-se das massas e implantar as Re- multimídia: livro
formas de Base.
No dia 13 de março de 1964 aconteceu um comício no Rio
Jango: a vida e a morte no exílio –
de Janeiro, em frente à estação Central do Brasil, organi-
Juremir Machado da Silva
zado por sindicatos e entidades estudantis, com o objetivo
É um livro que busca reconstruir o passado para des-
de pressionar o Congresso Nacional a aprovar as Reformas
construir mitos. Se tivesse de ser resumido a uma ques-
de Base. O comício reuniu entre 100 e 200 mil pessoas
tão, seria: quem foi João Goulart? Um presidente fraco
e contou com a participação do presidente João Goulart,
ou um herói reformista no tempo errado, derrubado do
que assinou dois importantes decretos: a desapropriação
poder para que não melhorasse o Brasil cedo demais?
e a nacionalização das refinarias de petróleo particulares
e estrangeiras; a criação da Superintendência da Reforma
Agrária, Supra, que desapropriaria latifúndios situados às Outros movimentos semelhantes ocorreram em outras ci-
margens de ferrovias e rodovias federais. dades, sinalizando aos militares que havia certa base social
para um golpe contra o presidente.
No Rio de Janeiro, ocorreu um motim de marinheiros lide-
rados pelo Cabo José Anselmo dos Santos, presidente da
Associação dos Marinheiros e Fuzileiros Navais, exigindo
a demissão do ministro da Marinha, Silvio Mota. Fuzileiros
navais designados para reprimir os amotinados aderiram ao
multimídia: livro movimento e o Ministro da Marinha demitiu-se do cargo.

O golpe de 1964: momentos decisivos – Carlos Fico


O golpe de 1964 é o evento-chave da história do tempo
presente do Brasil. Por que setores significativos da so-
ciedade brasileira aprovaram a deposição do presidente
João Goulart?
multimídia: música
As medidas provocaram reações nos meios oposicionistas, Fonte: Youtube
assustados com a amplitude das reformas. As críticas avo- Discurso que declara João Goulart
lumavam-se na imprensa e, em São Paulo, foi organizado deposto da presidência
um protesto por entidades femininas ligadas à Igreja Cató-

100
Tentando contornar a situação, o presidente interveio
anunciando que os revoltosos não seriam punidos, o que
foi visto pelos oficiais como quebra de hierarquia, pois o
presidente posicionava-se ao lado de marinheiros que ha-
viam desrespeitado o comando.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube
Cabra marcado para morrer
Um camponês é assassinado e sua história vira tema de
multimídia: livro um filme. Porém, com o golpe de 1964, a filmagem é sus-
pensa. Dezessete anos depois, o diretor retorna ao local e
desperta questões que até então estavam adormecidas.
Quem foi que inventou o Brasil?: a música popular
conta a história da república (1902-1964) vol. 1
No dia seguinte, o movimento espalhou-se pelo Brasil.
– Carlos Alberto Leite Barbosa e Franklin Martins
Várias guarnições militares aderiram ao golpe. Prédios pú-
Quem tem alguma informação sobre a história da músi- blicos foram cercados e tropas ocuparam as ruas do Rio
ca popular no Brasil sabe, sem dúvida, que os fatos polí- de Janeiro, de Brasília, São Paulo e Belo Horizonte. Em Per-
ticos sempre foram usados para tema de música canta- nambuco, o governador Miguel Arraes foi preso e levado
da por compositores e letristas, desde os primórdios do para Fernando de Noronha; em seguida foi aprovado seu
chamado teatro de revista, no século XIX, até o advento impeachment pelos deputados estaduais. Jango estava no
das gravações em cilindros e discos (primeiro mecânicos Rio de Janeiro e foi buscar asilo político em Brasília e Porto
e, depois, elétricos) depois do início do século XX. Alegre, de onde foi pressionado por Leonel Brizola a resistir.
Preferindo evitar uma guerra civil, Jango retirou-se para o
A alta cúpula militar das três armas (exército, marinha e Uruguai no dia 4 de abril.
aeronáutica) reuniu-se para analisar a situação e definir Já no dia 1.º de abril de 1964, o cargo de Presidente da
seu posicionamento. República foi declarado vago e ocupado por Ranieri Ma-
No dia 30 de março de 1964, Jango foi homenageado zzilli, presidente da Câmara dos Deputados. No dia 2 de
no Automóvel Clube do Rio de Janeiro pela Associação Abril, ocorreu a “Marcha pela Vitória” no centro do Rio de
dos Sargentos e Suboficiais da Policia Militar e reafirmou Janeiro, comemorando a tomada de poder pelos militares
as medidas que vinham sendo postas em prática por seu e a deposição de Jango.
governo, dando ênfase a reforma eleitoral que interessava
diretamente aos militares de baixa patente.
No dia 31 de março de 1964, os generais Olímpio Mourão
Filho e Carlos Guedes iniciaram o movimento militar em Mi-
nas Gerais, sob a chefia do general Castelo Branco, chefe do
Estado-Maior das Forças Armadas, com o apoio dos governa-
dores Adhemar de Barros, Carlos Lacerda e Magalhães Pinto,
respectivamente de São Paulo, Guanabara e Minas Gerais.

Manchetes sobre o golpe civil-militar de 1964, considerado


por alguns como uma revolução que salvaria o Brasil
do caos produzido pelo Governo João Goulart.

No golpe militar de 31 de março de 1964, tanques do


Exército ocuparam as ruas do Rio de Janeiro.

101
multimídia: site multimídia: livro

https://educacao.uol.com.br/disciplinas/historia-bra- O grande irmão: da operação Brother


sil/governo-janio-quadros-1961-mandato-polemi- Sam aos anos de chumbo; o governo
co-de-sete-meses.htm dos Estados Unidos – Carlos Fico
www.cpdoc.fgv.br/producao/dossies/Jango/biogra- Essa obra traz à tona a real participação dos Estados
fias/janio_quadros Unidos durante a ditadura militar no Brasil. Carlos Fico
www.gazetadopovo.com.br/blogs/caixa-zero/ha-50- aponta o general brasileiro que era o contato entre o
anos-janio-condecorava-che-guevara/ então futuro presidente Castelo Branco e o governo de
Washington para a entrega de armas, munições e com-
www.seuhistory.com/hoje-na-historia/janio-quadros-re-
bustível durante o golpe de 64.
nuncia-presidencia-por-causa-de-forcas-terriveis
www.cpdoc.fgv.br/producao/dossies/Jango/artigos/Na-
PresidenciaRepublica/Os_militares_e_o_governo_JG
www.infoescola.com/historia-do-brasil/plano-trienal/
www.cpdoc.fgv.br/producao/dossies/Jango/artigos/
NaPresidenciaRepublica/As_reformas_de_base
www.brothersam.wordpress.com/historico-2/

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube
O dia que durou 21 anos
Documentos secretos e gravações originais da época
mostram a influência do governo dos Estados Unidos
no golpe de Estado no Brasil, em 1964. O filme destaca
a participação da CIA e da própria Casa Branca na ação
militar que deu início à ditadura.

102
CONEXÃO ENTRE DISCIPLINAS

Sociologia e geopolítica
Em 1964, o Brasil atravessava um turbilhão político, pois estava ocorrendo uma ruptura na sociedade brasileira. De
um lado, os ditos comunistas, que desejavam reformas sociais e apoiavam as ideias e propostas do presidente João
Goulart (como pode ser comprovado pelo histórico comício da Central do Brasil); do outro, a oposição conservadora
que acreditava que Jango representava uma ameaça comunista e que deveria ser deposto da presidência o quanto
antes, mesmo que com o uso da força (o que pode ser observado na Marcha da Família com Deus pela Liberdade).
Ademais, essa disputa se relacionava ao contexto político mundial da época: a Guerra Fria, a qual vivia momen-
tos de extrema tensão e risco de um conflito real entre EUA e URSS.
O desfecho desse momento brasileiro foi o golpe militar desferido em 31 de março de 1964, o qual contou com
o apoio do governo estadunidense (operação Brother Sam) e derrubou o presidente João Goulart, implantando
um governo militar que perdurou por 21 anos.

Primeira página do jornal O Globo, do dia 2 de abril de 1964

103
ÁREAS DO CONHECIMENTO DO ENEM

HABILIDADE 13
Analisar a atuação dos movimentos sociais que contribuíram para mudanças ou rupturas em processos de
disputa pelo poder.

Movimentos sociais fazem parte de qualquer sociedade moderna. Eles podem representar diferentes vi-
sões e defendem bandeiras das mais distintas. Alguns, também, podem institucionalizar-se até se tornarem
partidos políticos. A história brasileira, principalmente no século XX, esteve repleta de movimentos como
esses, fazendo com que o estudante de história seja capaz de discerni-los quanto a seus embasamentos
teóricos e suas principais reivindicações.
A questão abaixo trata de alguns desses movimentos, bem como partidos políticos, como a UDN – prin-
cipal partido conservador da década de 1960 – e a UNE (União Nacional dos Estudantes), que, à épo-
ca, tinha um caráter de esquerda e membros simpatizantes do comunismo. O aluno deve ser capaz de
identificar a dinâmica desses movimentos e analisar a sua importância no cenário político da chamada
democracia populista (1946-1964).

MODELO 1
(Enem) Em meio às turbulências vividas na primeira metade dos anos 1960, tinha-se a impressão de que
as tendências de esquerda estavam se fortalecendo na área cultural. O Centro Popular de Cultura (CPC) da
União Nacional dos Estudantes (UNE) encenava peças de teatro que faziam agitação e propaganda em favor
da luta pelas reformas de base e satirizavam o “imperialismo” e seus “aliados internos”.
KONDER, L. História das ideias socialistas no Brasil. São Paulo: Expressão Popular, 2003.

No início da década de 1960, enquanto vários setores da esquerda brasileira consideravam que o CPC da
UNE era uma importante forma de conscientização das classes trabalhadoras, os setores conservadores e de
direita (políticos vinculados à União Democrática Nacional – UDN –, Igreja católica, grandes empresários etc.)
entendiam que essa organização:
a) constituía mais uma ameaça para a democracia brasileira, ao difundir a ideologia comunista.
b) contribuía com a valorização da genuína cultura nacional, ao encenar peças de cunho popular.
c) realizava uma tarefa que deveria ser exclusiva do Estado, ao pretender educar o povo por meio da cultura.
d) prestava um serviço importante à sociedade brasileira, ao incentivar a participação política dos mais pobres.
e) diminuía a força dos operários urbanos, ao substituir os sindicatos como instituição de pressão política
sobre o governo.

ANÁLISE EXPOSITIVA
Para os setores mais conservadores da sociedade, os grupos de esquerda e suas entidades, assim como a
ideia de “conscientizar os trabalhadores”, representavam uma ameaça ao país e suas instituições. A situação
descrita no início dos anos 1960 demonstra a polarização política existente e uma situação de crise, principal-
mente durante o governo de João Goulart, derrubado pelas forças conservadoras em 1964.

RESPOSTA Alternativa A

104
DIAGRAMA DE IDEIAS

GOVERNOS JÂNIO QUADROS


E JOÃO GOULART

GOVERNO JÂNIO QUADROS


A
(1961)
CARACTERÍSTICAS POLÍTICA EXTERNA
• POPULISTA • INDEPENDENTE
• DISTANCIAMENTO DOS PARTIDOS • RETOMA RELAÇÕES COM URSS E CHINA
• CONSERVADOR • APOIA INDEPENDÊNCIA AFRICANA
• MORALISTA • CONDECORA CHE GUEVARA
• CRISE ECONÔMICA • PERDE APOIO DA UDN
POLÍTICA INTERNA RENÚNCIA
• ALTA DÍVIDA EXTERNA • PERDE APOIO PARLAMENTAR E POPULAR
• ALTA INFLAÇÃO • RENUNCIA ESPERANDO APOIO
• DESVALORIZAÇÃO DA MOEDA • VICE-PRESIDENTE GOULART ESTAVA NA CHINA
• MEDIDAS IMPOPULARES • ASSUME PRESIDENTE DO CONGRESSO

GOVERNO JOÃO GOULART


B
(1961-1964)
CARACTERÍSTICAS POSSE
• INSTABILIDADE POLÍTICA • MILITARES E UDN IMPEDEM SUA POSSE
• INSTABILIDADE ECONÔMICA • “CAMPANHA PELA LEGALIDADE”
• OPOSIÇÃO DO EXÉRCITO E CONSERVADORES • MILITARES LEGALISTAS
• APOIO ENTRE OS TRABALHADORES • LEONEL BRIZOLA (GOVERNADOR/RS)
• DEPOSTO POR GOLPE MILITAR • PARLAMENTARISMO

FASE PARLAMENTARISTA (1961-1963) FASE PRESIDENCIALISTA (1963-1964)


• CRISE ECONÔMICA SE MANTÉM • PLANO TRIENAL
• AUMENTO DA DÍVIDA EXTERNA • REFORMA DE BASE
• CAMPANHA POR PLEBISCITO ANTECIPADO • FORTE OPOSIÇÃO DE MILITARES E CONSERVADORES
• APOIO POPULAR A JANGO • RELAÇÃO ENTRE EMBAIXADOR DOS EUA E MILITARES
• PLEBISCITO APROVA RETORNO AO PRESIDENCIALISMO • GOLPE MILITAR EM 1.º DE ABRIL DE 1964

REFORMAS DE BASE CRISE E DEPOSIÇÃO


• REFORMA PARTIDÁRIA • GOVERNO ACUSADO DE COMUNISTA (GUERRA FRIA)
• REFORMA TRIBUTÁRIA • TENSÃO SOBRE REFORMAS DE BASE
• REFORMA UNIVERSITÁRIA • GOVERNO ANISTIA MILITARES GREVISTAS
• REFORMA BANCÁRIA • QUEBRA DA HIERARQUIA MILITAR
• REFORMA AGRÁRIA • “MARCHA COM DEUS PELA FAMÍLIA E LIBERDADE”
• APOIO: SINDICATOS, CAMPONESES, ESTUDANTES, • ARTICULAÇÃO ENTRE MILITARES GOLPISTAS E EUA
MOVIMENTOS SOCIAIS, INTELECTUAIS • DEPOSIÇÃO DE JANGO
• OPOSIÇÃO: CONSERVADORES, SETORES DA IMPRENSA • EXÍLIO DE JANGO
E MILITARES, CLASSES MÉDIA E ALTA

105
AULAS 43 E 44
A análise política do período inicial do Regime Militar (1964)
até atingir seu auge (1973) nos permite concluir que houve
uma progressiva hipertrofia do Poder Executivo, ainda que
houvesse a princípio um esforço de manter a aparência de
um regime que respeitava as regras do jogo democrático, mas
gradativamente ficava claro seu caráter ditatorial e fascista.
DITADURA MILITAR:
GOVERNOS
CASTELO BRANCO
E COSTA E SILVA
multimídia: vídeo
COMPETÊNCIAS: 1, 2, 3, 4 e 5
Fonte: Youtube

1, 2, 3, 4, 7, 8, 9, 10, 11, Disparada, final do Festival da Tv Record de


HABILIDADES: 12, 13, 14, 15, 16, 21, 1966 completo
22, 23, 24 e 25
Para essa aparência contribuíram decisivamente os atos insti-
tucionais, que permitiam aos dirigentes políticos expurgar do
Congresso parlamentares que contrariassem as pretensões
do governo, além de estabelecer um bipartidarismo (Aliança
Renovadora Nacional − ARENA e Movimento Democrático
Brasileiro − MDB) de aparência, com o objetivo de sustentar
a impressão de que o governo tolerava democraticamente
a existência da oposição. A opção pela camuflagem do au-
toritarismo perdurou até 1968, quando, diante do avanço
de movimentos sociais de contestação da ordem econômica
e política, como, por exemplo, a atuação de estudantes e
Repressão política durante a ditadura
operários, o comando da autodenominada “revolução” op-

1. Introdução
tou pela radicalização com a promulgação do AI-5 (Ato Ins-
titucional n.º 5), que rompia qualquer condição dos direitos
O regime militar tem suscitado um acalorado debate por constitucionais, ampliava os poderes do presidente e con-
parte de historiadores, sociólogos, cientistas políticos e estu- cedia-lhe prerrogativas especiais, aumentando as condições
diosos em geral. As polêmicas surgem em meio aos questio- para a repressão violenta aos opositores do regime.
namentos a respeito das práticas que marcaram esse perío-
do nos seus aspectos políticos, econômicos e sociais.
O contexto internacional bipolar da Guerra Fria, especial-
mente as diretrizes anticomunistas e desenvolvimentistas
estabelecidas pelos EUA, à qual o Brasil alinhava-se, in-
fluenciaram as ações promovidas pelos governantes brasi-
leiros naquele período, particularmente as Forças Armadas
e suas convicções políticas.
multimídia: livro
As questões da tortura e dos direitos humanos são importantes
e merecem atenção especial, na medida em que, nos últimos 1964: história do regime militar
anos, emergiram várias discussões como a revisão da Lei da brasileiro – Marcos Napolitano
Anistia e a instituição da Comissão da Verdade. Afinal, como O Brasil mergulhou em uma ditadura que iria perdurar por
atuavam os órgãos de repressão oficial do governo? De que mais de duas décadas. É chegado o momento de fazer um
maneira os opositores atuavam? Governo e oposição respei- balanço histórico do Regime Militar. Marcos Napolitano, co-
tavam os direitos humanos? Portanto, a realização de alguns nhecido historiador da USP, discute nesse livro sólido e bem
questionamentos nos permitirá avaliar criticamente conflitos escrito as principais questões desses “anos de chumbo”.
culturais, sociais, políticos, econômicos ao longo da história.

106
Economicamente experimentava-se, de um lado, a euforia do Após a deposição do presidente João Goulart, a presidência
crescimento, das grandes obras, resultados do chamado “mi- da República foi assumida por Ranieri Mazzili, presidente da
lagre econômico brasileiro”, e, de outro, a decepção de muitos Câmara dos Deputados. Imediatamente foi formado o Co-
diante do acelerado processo de concentração de renda. Regis- mando Supremo da “revolução”, como se denominava o
tra-se, ainda, o crescimento da dívida externa e a presença cada golpe de Estado, formado pelos ministros militares almirante
vez mais acentuada do capital estrangeiro, que resultou numa Augusto Rademaker, da Marinha; general Arthur da Costa e
dependência que colocava em risco a economia nacional. Silva, da Guerra; e brigadeiro Corrêa de Melo, da Aeronáutica.
A questão cultural naquele período não pode ser esqueci- O comando foi responsável pela publicação do Ato Insti-
da ou relegada a segundo plano. Expressões como “Brasil, tucional n.º 1 (Al-1, de 9 de abril de 1964), que suspen-
ame-o ou deixe-o”, “ninguém segura este país”, “este é deu as garantias constitucionais por sessenta dias, durante
um país que vai para frente” ou ainda “o Brasil é o país do os quais poderiam ser cassados mandatos e suspensos os
futuro, o futuro agora chegou”, foram expressões ideológi- direitos políticos de qualquer cidadão. Além disso, o pre-
cas, carregadas de ufanismo, cujo objetivo era ter o apoio sidente, que seria eleito indiretamente, poderia propor
da opinião pública e dessa forma legitimar as ações do emendas à Constituição e decretar estado de sítio.1
governo nos mais variados campos. As determinações do Al-1 permitiriam a cassação dos
mandatos e a suspensão dos direitos políticos de João
Goulart; dos deputados Leonel Brizola, Almino Afonso e
outros políticos ligados ao PTB e a Jango; de Darcy Ribeiro;
do economista e ex-ministro Celso Furtado; do governador
de Pernambuco Miguel Arraes e outros. Os ex-presidentes
Jânio Quadros e Juscelino Kubitschek também tiveram
seus direitos políticos suspensos, assim como Luís Carlos
multimídia: música Prestes. Várias entidades classistas que apoiavam as re-
Fonte: Youtube formas de base foram fechadas, dentre as quais a União
Roda viva – Chico Buarque & MPB4 Nacional dos Estudantes, UNE, o Pacto de Unidade e Ação,
PUA, o Comando Geral dos Trabalhadores, CGT, e as Ligas
Camponesas. Sindicatos e federações operárias sofreram
1.1. Contextualizando intervenção do governo e suas lideranças foram presas e
posteriormente exiladas.

multimídia: livro

A ditadura envergonhada – Elio Gaspari


É o primeiro volume da série “As ilusões armadas“ sobre a
Ditadura Militar no Brasil, escrito pelo jornalista Elio Gaspari.

O AI-1 atingiu, ainda, segundo Meira, “cerca de 122 oficiais


que passaram para a reserva e mais de 1.000 pessoas que
foram afastadas de seus cargos; 50 parlamentares tiveram
seu mandato cassado; e 49 juízes foram atingidos pela
medida de exceção” (MEIRA, Antônio Carlos. Brasil: recu-
perando a nossa História. São Paulo: FTD, 1998, p.241).
“Salvos da comunização que celeremente se preparava, os 1
Estado de sítio é um estado de exceção, instaurado como medida pro-
brasileiros devem agradecer aos militares que os salvaram visória de proteção do Estado, quando e se ameaçado de uma guerra ou de
de seus inimigos”, publicou o jornal O Globo em editorial no calamidade pública. Implica a suspensão do exercício dos direitos, liberdades
dia 2 de abril de 1964, dois dias após o golpe militar. e garantias.

107
mãos dos militares, únicos capazes de manter a ordem e
a tranquilidade interna.
No dia 15 de março de 1964, a junta militar indicou o ma-
rechal Humberto de Alencar Castelo Branco para ocupar
o cargo de presidente da República, devendo concluir o
mandato do presidente deposto, João Goulart, que se es-
multimídia: livro tenderia até janeiro de 1966.

A era dos festivais – Zuza Homem de Mello 2. Governo Castelo


Realizado em 1960, o 1.º Festival da Record assinalou
o início de um dos períodos mais criativos da música Branco (1964–1967)
popular brasileira, e que seria conhecido na crônica mu- Pouco depois de assumir a presidência, Castelo Branco teve
sical como “a era dos festivais“. seu mandato prorrogado por uma emenda à Constituição de
1946, que ainda estava em vigor, até julho de 1966.
A ascensão ao poder dos militares levou à instalação de
um regime político autoritário, marcado por forte censura
aos meios de comunicação e às atividades artísticas e civis,
e a uma abertura da economia ao capital estrangeiro, espe-
cialmente de origem estadunidense. A política econômica
adotada não beneficiou as classes trabalhadoras, oprimi-
das por forte arrocho salarial, e gerou grande dependência
em relação ao capital estrangeiro. De uma maneira geral,
o Regime Militar brasileiro foi caracterizado pelo binômio
segurança e desenvolvimento, que orientou as políticas dos
cinco presidentes do período.

multimídia: livro Castelo Branco


Controlando o Congresso Nacional, composto basicamen-
Prepare seu coração: a história dos te por parlamentares que apoiavam o Regime Militar, já
grandes festivais – Solano Ribeiro que seus principais opositores tiveram os mandatos cas-
sados e os direitos políticos suspensos em virtude do AI-1,
Solano Ribeiro, o criador de festivais da canção dos anos
Castelo Branco conseguiu a aprovação de importantes me-
1960, revela nesse livro os bastidores da música popular
didas para o regime. Entre elas destaquem-se a aprovação
brasileira em um de seus mais ricos e gloriosos períodos.
da Lei de Greve, que tornava ilegais as greves, e da Lei
Suplicy, proposta pelo Ministro da Educação Flávio Suplicy
Há entre os estudiosos desse período uma acirrada dis-
de Lacerda, que extinguia a UNE e todas as entidades estu-
cussão a respeito das posturas desses militares. Haveria
dantis, bem como determinava o fechamento dos centros
duas tendências acerca de como o poder político deveria
acadêmicos das universidades.
ser exercido em nível nacional: Os “castelistas” ou grupo
da Sorborne estavam ligados à Escola Superior de Guer- As medidas provocaram reações e protestos dos estudantes
ra, ESG, e eram considerados intelectuais e tecnocratas. violentamente reprimidos com prisões, espancamentos e tor-
Moderados, defendiam a devolução do poder aos civis turas, usadas amplamente desde o início do Regime Militar.
depois de resolvidos os problemas internos, quando o Professores e funcionários universitários foram demitidos e o
país estivesse livre do comunismo, da subversão e da cor- campus da Universidade de Brasília, UnB, e das faculdades
rupção. A ala mais radical era chamada de “linha dura” e de Filosofia e de Direito da Universidade Federal do Rio de
defendia a tese de que o poder deveria permanecer nas Janeiro, UFRJ, foram invadidos e ocupados pela polícia.

108
O governo assinou ainda um acordo com os EUA, que pre-
via uma reforma universitária, conhecido como acordo Me-
2.2. Política
c-Usaid, sigla do ministério da Educação estadunidense. O A decisão de ampliar o mandato do presidente Castelo
acordo chegava a prever a privatização das universidades Branco demonstrava a intenção dos militares de permanecer
públicas brasileiras, seguindo o modelo educacional dos EUA, mais tempo no poder que o inicialmente previsto, ou seja,
e gerou grandes protestos estudantis em várias cidades, vio- até o final do mandato do presidente deposto João Goulart.
lentamente reprimidos pelas forças repressivas do Estado. As medidas de exceção se tornariam cada vez mais frequen-
tes. Um dos motivos para que isso ocorresse foi a derrota
Também foi criado o Serviço Nacional de Informação, eleitoral dos candidatos dos militares, indicados pela UDN
SNI, principal órgão de informação do governo, que teve ou aliados, nas eleições realizadas em outubro de 1965 para
importante atuação na repressão aos opositores do regi- a escolha dos governadores de onze estados. Em cinco es-
me. Idealizado pelo general Golbery do Couto e Silva, o tados, incluindo os importantes da Guanabara e de Minas
SNI coletava, processava e fornecia informações úteis ao Gerais, os candidatos indicados pelo PSD e PTB, respectiva-
combate à subversão interna, transformando-se em um mente, Negrão de Lima e Israel Pinheiro, obtiveram vitórias
dos principais órgãos do Regime Militar no Brasil. eleitorais. Além desses, Pedro Pedrossian, no Mato Grosso;
Ivo Silveira, em Santa Catarina; e Walfredo Gurgel; no Rio
Grande do Norte, também foram eleitos.
A importante vitória eleitoral de políticos do PSD e PTB
contrariou a cúpula militar e demonstrou que o populis-
mo ainda tinha força no país. A reação estimulada espe-
cialmente pela “linha dura” foi a promulgação do Ato
multimídia: vídeo Institucional n.º 2, de 27 de outubro de 1965, afirman-
do em seu preâmbulo que “não se disse que a Revolução
Fonte: Youtube
foi, mas que é e continuará”.
Conhecendo os Presidentes - Ep. 23: Castelo
O AI-2 determinava que o presidente pudesse intervir nos es-
Branco tados e municípios “para prevenir ou reprimir a subversão”;
permitia ainda a decretação de recesso no Legislativo, poden-
2.1. Economia do o presidente legislar através de decretos-lei; foram estabe-
lecidas eleições indiretas para presidente da Repúbli-
A primeira grande preocupação do novo governo foi ado- ca e vice; e o presidente poderia determinar a suspensão de
tar uma rígida intervenção na economia, com o objetivo de direitos políticos por dez anos. O Al-2 determinava ainda a
controlar a inflação. Foi criado o Plano de Ação Econômi- extinção de todos os partidos políticos no Brasil.
ca do Governo, Paeg, que estabeleceu o corte nos gastos
No entanto, um decreto complementar estabeleceu o bi-
públicos (menos verbas para saúde, educação, salários de
partidarismo e os políticos foram obrigados a se vincular
funcionários) e o aumento de impostos. Daí em diante, cres-
a duas novas legendas criadas: a Aliança Renovadora
ceram as dificuldades para a obtenção de créditos e os juros
Nacional, Arena, e o Movimento Democrático Bra-
aumentaram, o que foi limitando o crescimento econômico
sileiro, MDB. A Arena seria o partido do governo, da si-
do país em virtude de recessão provocada pelo plano. tuação, composto por políticos conservadores, geralmente
No mesmo período foi criado o Banco Central (Lei 4.595, ligados à UDN, e o MDB seria o partido oficial de oposição,
de 31 de dezembro de 1964), tendo como principal fun- composto por políticos do PTB e PSD, que haviam sobrevi-
ção controlar a emissão monetária e o sistema bancário e vido às cassações realizadas pelo governo.
foi introduzida uma nova moeda, o Cruzeiro Novo (NCr$).
As negociações com o FMI seriam realizadas pelo Conselho
Monetário Nacional, CMN, e foi criada a correção monetária
para estimular os depósitos nas cadernetas de poupança.
Castelo Branco limitou os reajustes salariais e facilitou as
demissões e a rotatividade de mão de obra, ao substituir as
garantias de estabilidade no emprego pelo FGTS, Fundo
de garantia por tempo de serviço. Foi criado o Ban- Publicada no dia de finados de 1965, a charge comenta a medida mais espetacular
imposta pelo AI -2, de 27 de outubro: a dissolução dos 13 partidos políticos
co Nacional da Habitação, BNH, que deveria utilizar o
criados a partir de 1946. Na sequência dos fatos, implanta-se um sistema
dinheiro dos depósitos do FGTS para financiar a construção bipartidário, com a criação da Arena, para apoiar a ditadura, e do MDB,
de casas populares. congregando a oposição (FORTUNA. Correio da Manhã, ano 65, n. 22264-BN).

109
2.4. Constituição do Terror
Promulgada em janeiro de 1967 por um Congresso to-
talmente pressionado e manipulado pelas medidas de
exceção da Presidência, a sexta Constituição brasileira foi
responsável pela institucionalização do Regime Militar e,
na prática, confirmava as medidas impostas nos atos insti-
multimídia: música tucionais anteriormente publicados.
Fonte: Youtube A nova Constituição brasileira estabelecia eleições indire-
É proibido proibir – Caetano Veloso tas para os cargos do Executivo, que teria poderes espe-
ciais, como permissão para decretar recessos no Legislativo
2.3. Eleições presidenciais e e estado de sítio e para suspender direitos políticos de ci-
dadãos. Foi incluída na Carta Magna a Lei de Segurança
novos atos institucionais Nacional, que proibia manifestações ofensivas ao gover-
Em outubro de 1966, o candidato imposto pela “linha no na mídia e oficializava censura prévia à imprensa, além
dura”, Arthur da Costa e Silva, foi eleito presidente, tendo de abrir caminhos para a pena de morte em crimes contra
como vice o civil Pedro Aleixo, ex-ministro da Educação do a Segurança Nacional, aprovada em 1969.
governo Castelo Branco.
Antes de concluir seu mandato, Castelo Branco publicou os
Atos Institucionais n.º 3, (de 5 fevereiro de 1966) e n.º 4, (de
7 de dezembro de 1966). O primeiro determinou a realização
de eleições indiretas para a escolha de governantes
estaduais, prefeitos das capitais e de áreas consi-
deradas de Segurança Nacional, como Volta Redonda, multimídia: vídeo
onde estava localizada a Companhia Siderúrgica Nacional,
Fonte: Youtube
CSN, e Santos, onde se localizava o principal porto brasileiro.
Chumbo Quente I- Observatório da Imprensa
O AI-4 estabelecia um conjunto de normas a serem segui-
das pelo Congresso, para a elaboração de uma nova
Constituição, que seria o último ato de Castelo Branco
na Presidência, a Constituição de 1967. Na prática, o
Congresso Nacional, mutilado pelas cassações, foi obriga-
3. Governo Costa e
do a aprovar e promulgar um projeto constitucional envia-
do pelos militares.
Silva (1967–1969)

multimídia: livro

A canção no tempo: 85 anos de


músicas brasileiras (1958-1985) – Jairo
Severiano e Zuza Homem de Mello
Apresenta a história de nossa música popular por meio
de suas composições mais representativas. Esse segun-
do volume começa com o surgimento da bossa nova,
em 1958, e se estende até 1985, passando por movi-
mentos como a jovem guarda e o tropicalismo.
Capa da revista Fatos & Fotos destaca a posse de Costa e Silva.

110
A posse de Costa e Silva representou a ascensão da cha-
mada “linha dura” ao comando político do país. O novo
governo não manteve membros do governo anterior nos
cargos comissionados e nos ministérios, que passaram a
ser ocupados por oficiais e políticos ligados à “linha dura”,
com destaque para o civil Delfim Netto, responsável pelo
comando da economia nacional.
multimídia: livro

Eu não sou cachorro, não – Paulo César de Araújo


Artistas considerados bregas – como Odair José e Waldik
Soriano – sempre apareceram no topo da lista de mais
vendidos. Veiculados nas rádios, frequentavam os progra-
mas de auditório, mas não receberam o devido respeito e
multimídia: vídeo espaço em livros e teses, pois frequentemente eram asso-
Fonte: Youtube ciados à Ditadura Militar.
Dutra (Vargas deposto, Constituição de 1946,
Liberalismo...)
3.1. Críticas ao Regime Militar
Logo no início do mandato, o novo governo elaborou o Os anos de 1967 e 1968 foram marcados pela intensifi-
Programa Estratégico de Desenvolvimento, PED, que tinha cação das críticas ao regime. Apesar do silêncio imposto
como metas prioritárias combater a inflação e estimular o aos sindicatos e do desmantelamento das organizações
crescimento econômico. O governo passou a controlar pre- estudantis, trabalhadores e estudantes ainda consegui-
ços e salários e incentivou os investimentos estrangeiros no ram realizar ações políticas. Políticos civis também se mo-
Brasil. As exportações de produtos primários foram estimu- bilizavam na oposição ao regime e articulavam ações de
ladas e apresentaram crescimento a partir de 1968, bem contestação à ditadura.
como a indústria desenvolveu-se estimulada por subsídios
governamentais e investimentos externos.
Nessa fase inicial do regime, destaque-se a criação da
Fundação Nacional de Assistência ao Índio, Funai, e
do Movimento Brasileiro de Alfabetização, Mobral,
que tinha o ambicioso objetivo de erradicar o analfa-
betismo no Brasil.
multimídia: música
Fonte: Youtube
Ponteio – Edu Lobo

3.2. Frente Ampla


As medidas centralizadoras começaram a desagradar
até mesmo políticos da situação, aliados do governo
que haviam apoiado o Golpe Militar e a deposição de
Goulart. Políticos descontentes com a marginalização a
que estavam submetidos, especialmente Carlos Lacer-
da, que sonhava ser presidente, organizaram uma Fren-
te Ampla de oposição ao Regime Militar.
O principal objetivo dessa Frente era restaurar a democracia
e as eleições diretas para Presidente da República e elaborar
uma nova Constituição. A Frente Ampla contou com o apoio
dos ex-presidentes Juscelino Kubitschek e João Goulart, o que
Cartaz alusivo ao Mobral demonstrava seu caráter eclético ao reunir antigos adversários.

111
entre manifestantes e policiais militares, em frente ao
restaurante Calabouço, da Universidade Federal do Rio
de Janeiro. Revoltados, os estudantes realizaram o veló-
rio de Edson Luís no prédio da Assembleia Legislativa do
Estado, onde vários discursos foram proferidos contra a
ditadura. O enterro foi acompanhado por cerca de 50 mil
pessoas, assim como a missa de sétimo dia, na igreja da
Candelária, que reuniu milhares de pessoas, apesar da
rígida vigilância policial.

Um dos primeiros encontros de JK com Carlos


Lacerda pela formação da Frente Ampla.

multimídia: livro
Missa de 7.º dia de Edson Luís na Igreja da
Candelária, no Rio de Janeiro em 1968.
Vandré: o homem que disse não – O resultado foi a realização de uma grande passeata
Jorge Fernando dos Santos contra o Regime Militar, organizada por estudantes, in-
Quem foi Geraldo Vandré? Por que ele se tornou amado telectuais, artistas e membros da Igreja católica, reali-
pelo público e odiado pelos militares na ditadura? Por zada no dia 26 de junho de 1968. Conhecida como a
que sua canção se tornou um hino – Para não dizer que Passeata dos Cem Mil, a manifestação foi um mar-
não falei das flores – Caminhando – jamais esquecida co e serviu de estímulo à manifestação em todo o país.
durante décadas? Metalúrgicos organizaram greves em Contagem, MG, e em
Osasco, SP, reivindicando melhores salários e criticando o
3.3. Manifestações estudantis autoritarismo do governo.

e a Passeata dos Cem Mil


O ano de 1968 foi marcado por grandes manifestações estu-
dantis de protesto contra a política educacional que o gover-
no desejava implantar através do acordo Mec-Usaid e contra
o próprio governo. Foram realizadas grandes passeatas nas
capitais, especialmente no Rio de Janeiro e em São Paulo.

A Passeata dos Cem Mil contou com a adesão de segmentos


sociais descontentes com os destinos do país.

Empolgados com as manifestações de rua, estudantes


multimídia: vídeo reuniram-se em outubro de 1968 para um Congresso
Fonte: Youtube estudantil que reorganizasse a União Nacional dos Es-
JB - 28 de março de 1968 - Morte no calabouço tudantes, proibida pelo regime. Foi no sítio Muduru, na
cidade de Ibiúna, no interior do estado de São Paulo, que
Em março de 1968, o estudante secundarista Edson eles se reuniram clandestinamente e realizaram o 30.º
Luís de Lima Souto foi morto a tiros em um confronto Congresso da UNE.

112
multimídia: vídeo multimídia: livro
Fonte: Youtube
XXX Congresso da União Nacional dos Estu- 1968 - A paixão de uma utopia – Daniel
dantes Aarao Reis/ Pedro de Mello Moraes
Mais uma década, uma data redonda a mais, sugerindo,
A grande movimentação de jovens na pequena e pacata ci- suscitando, quase impondo novas comemorações – pa-
dade chamou a atenção da população, que avisou a polícia e lavra aqui tomada em seu sentido etimológico de re-
agentes do Departamento de Ordem Política e Social, DOPS.
memorar juntos, recordar em conjunto a saga de 1968.
Identificado o local, foram presos 693 estudantes, dentre
os quais Luís Travassos, presidente da UNE; José Dirceu,
presidente da União Estadual dos Estudantes, (UEE); Vla-
dimir Palmeira, presidente da União Metropolitana dos Es-
tudantes, (UME); e Guilherme Ribas, presidente da União
Paulista de Estudantes Secundaristas, (Upes). As prisões
desmantelaram o movimento estudantil.
As manifestações refletiram no Congresso e o deputado do
MDB, Márcio Moreira Alves, proferiu um violento discurso multimídia: vídeo
contra os militares, denunciando torturas e convocando a Fonte: Youtube
população a boicotar as comemorações pela independência Discurso Marcio Moreira Alves AI-5
do Brasil e os desfiles de 7 de setembro. Sentindo-se desres-
peitado, o governo exigiu que o Congresso punisse o depu-
tado, que gozava de imunidade parlamentar. Os parlamen-
tares negaram a autorização para processá-lo; em represália, 3.4. Ato Institucional n.º 5
o governo fechou o Congresso Nacional e promulgou o Ato
O AI-5 suspendeu direitos e garantias constitucionais
Institucional n.º 5, em 13 de dezembro de 1968.
dos cidadãos e o habeas corpus; ampliou os poderes do
presidente – demitir, remover ou pôr em disponibilidade
funcionários públicos federais, estaduais e municipais,
fechar casas legislativas, decretar estado de sítio e confis-
car bens como forma de punição por corrupção e cassar
mandatos eletivos federais, estaduais e municipais; demi-
tir ou reformar oficiais e membros das Forças Armadas e
das polícias militares.

multimídia: vídeo
Fonte: Youtube
Documentário - AI-5 o dia que não existiu
Capa da revista Veja exibe a prisão das lideranças (Completo)
estudantis no congresso de Ibiúna, SP, em 1968.

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3.5. As guerrilhas e a repressão Merecem destaque estes grupos guerrilheiros:
§ Ação Libertadora Nacional, ALN, fundado por Carlos
Diante do quadro de fechamento total com o AI-5, grupos de
Mariguella;
esquerda passaram a organizar ações de guerrilha urbana e
rural, com a finalidade de derrubar o Regime Militar pela luta § Vanguarda Popular Revolucionária, VPR;
armada. O PCB, de tradicional linha pró-soviética e dirigido § Movimento Revolucionário 8 de Outubro, MR 8;
por Luís Carlos Prestes, era contrário à luta armada. Em geral,
os grupos guerrilheiros eram liderados por ex-militantes co- § Vanguarda Armada Revolucionária Palmares, VAR-Palmares.
munistas rompidos com o “partidão”, estudantes, militares O governo organizou a repressão com militares bem arma-
desertores e operários. Inspiravam-se em guerrilheiros como dos e treinados, particularmente em tortura, e com um vasto
Mao Tsé-tung, da China, em combatentes vietcongues con- aparato repressivo que compreendia as polícias civil, militar
tra os EUA e revolucionários cubanos, como Che Guevara. e federal, também treinados para torturarem. Censura e pro-
Algumas centenas de militantes sem muito preparo teórico e paganda do regime contribuíram para a desinformação da
militar tiveram pouco sucesso em suas ações. A guerrilha do população a respeito da natureza e dos objetivos dos guer-
Araguaia foi organizada pelo PC do B em região de conflitos rilheiros. A população acabou enxergando-os apenas como
rurais entre latifundiários grileiros e camponeses posseiros. “terroristas”, qualificação propositalmente negativa. O gover-
no também lançou mão de expedientes brutais de repressão,
como a tortura sistemática e o assassinato de presos políticos.
Os principais organismos de repressão e informação do
governo foram o Serviço Nacional de Informações, SNI; o
Centro de Informações da Marinha, Cenimar; a Operação
Bandeirantes, OBAN; o Destacamento de Operações de In-
formações do Centro de Operações de Defesa Interna, DOI-
-Codi; e o Departamento de Ordem Política e Social, DOPS.

Primeira página da edição de 14 de dezembro


de 1968 do jornal Última Hora.
multimídia: livro
Grupos guerrilheiros urbanos, premidos por assaltos a ban-
cos para obter fundos para financiar a guerrilha, sequestro A Ditadura Escancarada – Elio Gaspari
de embaixadores em troca da libertação de presos políticos “A Ditadura Escancarada” é o segundo volume da série
em condições de extrema tortura nas prisões, sucumbiram sobre a ditadura militar no Brasil, escrito pelo jornalista
diante da violenta repressão imposta pela Ditadura Militar. Elio Gaspari. Cobre o intervalo de 1969 até o extermínio
da guerrilha do Partido Comunista do Brasil, nas matas
do Araguaia, em 1974.

3.6. A censura e as artes


As manifestações artísticas também sofreram rígida fis-
multimídia: livro calização, censura e perseguição política. Mas foram elas
os principais recursos para criticar o regime e denunciar
a realidade brasileira. A Música Popular Brasileira,
A “geração AI-5“ e maio de 68 – Luciano Martins
MPB, ganhou dimensão política, provocando uma cisão
Esse livro reúne dois exercícios de imaginação socioló- entre artistas que defendiam a separação entre a música e
gica. Os dois fenômenos aqui analisados – a “geração a política e os que defendiam o engajamento de cantores
AI-5“, no Brasil, e os acontecimentos de maio de 1968, e compositores nas causas políticas e sociais, utilizando a
na França – pertencem a uma mesma natureza: a do arte como instrumento de resistência à ditadura. Os maio-
“protesto“, embora de maneiras totalmente distintas. res representantes desse grupo foram Chico Buarque de

114
Holanda, Geraldo Vandré, Milton Nascimento, entre outros. Quase todos perdidos de armas na mão
Escreveram canções dúbias, que procuravam criticar o go- Nos quartéis lhes ensinam uma antiga lição
verno sem despertar a atenção da censura. De morrer pela pátria e viver sem razão
Nas escolas, nas ruas, campos, construções
Somos todos soldados, armados ou não
3.6.1. Cálice Caminhando e cantando e seguindo a canção
“Como beber dessa bebida amarga Somos todos iguais braços dados ou não”
Tragar a dor, engolir a labuta
Mesmo calada a boca, resta o peito
Silêncio na cidade não se escuta
De que me vale ser filho da santa
Melhor seria ser filho da outra
Outra realidade menos morta
Tanta mentira, tanta força bruta
Como é difícil acordar calado
Se na calada da noite eu me dano
Quero lançar um grito desumano
Que é uma maneira de ser escutado
Esse silêncio todo me atordoa
Atordoado eu permaneço atento
Na arquibancada pra qualquer momento Geraldo Vandré
Ver emergir o monstro da lagoa”

multimídia: música
Fonte: Youtube
Canção da despedida – Geraldo Vandré
Chico Buarque
No cinema, Glauber Rocha, Cacá Diegues e Joaquim Pe-
dro de Andrade destacaram-se no Cinema Novo. Seus
filmes buscavam revelar a realidade social, econômica
e política do país. No final da década de 1960 e início
da década de 1970, o teatro brasileiro viveu um de seus
momentos mais importantes de criação e realização, prin-
cipalmente com o Teatro de Arena, dirigido por Augusto
multimídia: música Boal. Foram adaptadas algumas peças estrangeiras e
Fonte: Youtube produzidas várias outras com temáticas genuinamente
Sabiá – Tom Jobim & Chico Buarque nacionais, que denunciavam a realidade brasileira, como
Eles não usam Black-tie, de Gianfrancesco Guarnieri e
3.6.2. Pra não dizer que não falei das flores Roda Viva, de Chico Buarque.

“Nas escolas nas ruas, campos, construções A imprensa alternativa, representada pelos jornais O
Caminhando e cantando e seguindo a canção Pasquim, Opinião e O Movimento, recorria ao bom hu-
Vem, vamos embora, que esperar não é saber mor, a charges e a sátiras para criticar a ditadura. Suas
Quem sabe faz a hora, não espera acontecer marcas registradas eram a ironia inteligente e a metá-
Pelos campos há fome em grandes plantações fora debochada com que tratavam os assuntos da re-
Pelas ruas marchando indecisos cordões
alidade nacional, especialmente a política vigente, seu
Ainda fazem da flor seu mais forte refrão
E acreditam nas flores vencendo o canhão alvo principal.
Há soldados armados, amados ou não

115
Em 1969, o presidente Costa e Silva sofreu um derrame e
foi afastado do cargo, vindo a falecer logo na sequência.
A presidência deveria ser assumida pelo seu vice, o civil
Pedro Aleixo, que se opusera ao AI-5. Os militares não
admitiram a posse do vice e o governo foi assumido por
uma Junta Militar composta dos ministros do Exército,
Marinha e Aeronáutica, respectivamente, general Aurélio
multimídia: site Lyra Tavares, almirante Augusto Rademaker e brigadeiro
Márcio de Sousa Melo.
www.historialivre.com/brasil/paeg.htm
A Junta outorgou uma reforma na Constituição de 1967, a
www.pgfn.fazenda.gov.br/divida-ativa-da-uniao/fgts/
Emenda Constitucional de 1969, que suspendeu as imuni-
breve-historico-do-fgts
dades parlamentares e instituiu a pena de morte e a prisão
www.abin.gov.br/institucional/historico/1964-servi-
perpétua para crimes contra a segurança nacional. Foi de-
co-nacional-de-informacoes-sni/
terminado ainda que somente generais de quatro estrelas
www4.planalto.gov.br/legislacao/portal-legis/legisla-
poderiam ocupar o cargo de presidente da República.
cao-historica/atos-institucionais
www.revistaforum.com.br/2011/10/24/40-anos-de- Em outubro de 1969, o Congresso Nacional foi reaberto
duas-greves-historicas/ para escolher o novo presidente. O Comando Supremo
www.g1.globo.com/Sites/Especiais/Noti- da “Revolução” indicou como candidato o general Emílio
cias/0,,MUL464249-15530,00-ENTENDA+OS+PRO- Garrastazu Médici, que foi confirmado para o cargo.
TESTOS+DE.html

3.7. Junta militar

Junta Militar

116
CONEXÃO ENTRE DISCIPLINAS

Sociologia, filosofia e geopolítica


Em 1968, o mundo viveu um dos anos mais agitados da história, pois inúmeras manifestações ocorriam pelo
mundo e deixavam reflexos também em terras brasileiras.
Num contexto mundial, 1968 reservou: o maio estudantil, ocorrido na França contra medidas de autoritaris-
mo do governo, onde os estudantes inspiravam-se na contracultura e nas bases filosóficas existencialistas de
Jean-Paul Sartre, criando o slogan: “é proibido proibir”, o qual girou muitos países do Ocidente; a Primavera de
Praga, onde o povo da Tchecoeslováquia tentou resistir à ocupação soviética ocupando as ruas e entregando
flores aos tanques de guerra que abriam caminho para a ocupação; o movimento Black Power e os discursos
de Martin Luther King, os quais buscavam o fim das práticas de segregação racial e a afirmação dos negros na
sociedade estadunidense.
Já no Brasil, 1968 reservou muitos eventos que sacodiram o país, como: mortes em manifestações estudantis
(no Calabouço, no Rio de Janeiro, e na Batalha da Maria Antônia, em São Paulo); o histórico Festival da Canção
no Maracanãzinho (onde Geraldo Vandré entoou sua emblemática canção: Caminhando); as greves gerais de
Osasco e Contagem; a morte de Charles Chandler (funcionário da CIA), no bairro do Sumaré, em São Paulo
(executado por Carlos Marighella); o XXX Congresso da UNE, em Ibiúna (que terminou com inúmeras prisões);
o famoso discurso do deputado Márcio Moreira Alves contra o governo militar, o que culminou na implantação
do Ato Institucional n.º 5 (13 de dezembro de 1968).
Todos esses eventos mostram, claramente, o desejo de grande parte das pessoas, espalhadas em diferentes
áreas do planeta, de poder ter suas vozes ouvidas e respeitadas pelos seus respectivos governos e/ou opressores.
Diferiam nas suas causas e pedidos, mas todas se organizavam para mostrar que não aceitariam inertes os
desmandos impostos por grupo algum.

Martin Luther King discursando em frente O deputado Marcio Moreira Alves discursando
ao memorial de Lincoln, em Washington no Congresso contra o governo militar

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ÁREAS DO CONHECIMENTO DO ENEM

HABILIDADE 22
Analisar as lutas sociais e conquistas obtidas no que se refere às mudanças nas legislações ou nas políticas
públicas.

Quase todas as mudanças políticas vêm acompanhadas de mudanças na legislação. Os novos grupos,
quando ascendem ao poder, imprimem sua marca no conjunto de leis que constituem a dinâmica política
de uma nação. Trata-se, portanto, do que ocorreu após o golpe civil-militar de 1964, quando os partidos
antes vigentes foram suprimidos e substituídos por um bipartidarismo formal e pouco efetivo.
O aluno deve ser capaz de analisar imagens e textos que enriquecem os enunciados das questões
para assinalar a resposta correta. A habilidade 22, portanto, é muito requerida em questões que
tratam de rupturas institucionais como essa, fazendo com que o candidato tenha conhecimento das
forças políticas em jogo.

MODELO 1
(Enem)

A imagem foi publicada no jornal Correio da Manhã, no dia de Finados de 1965. Sua relação com os direitos
políticos existentes no período revela a:
a) extinção dos partidos nanicos.
b) retomada dos partidos estaduais.
c) adoção do bipartidarismo regulado.
d) superação do fisiologismo tradicional.
e) valorização da representação parlamentar.

ANÁLISE EXPOSITIVA

A ditadura militar, iniciada em 1964 no Brasil, instituiu o bipartidarismo no país, ou seja, a regulamentação da
existência e atuação de apenas dois partidos políticos no Brasil, um de situação e outro de oposição.

RESPOSTA Alternativa C

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DIAGRAMA DE IDEIAS

GOVERNOS CASTELO
BRANCO E COSTA E SILVA

DITADURA MILITAR GOVERNO CASTELO BRANCO


A B
(1964-1985) (1964-1967) “CASTELLISTA”
MEDIDAS
CARACTERÍSTICAS
• FECHAMENTO DE ENTIDADES CLASSISTAS E CENTROS
• GOVERNO GOLPISTA E AUTORITÁRIO
ACADÊMICOS
• RESTRIÇÃO ÀS LIBERDADES INDIVIDUAIS
• REFORMA UNIVERSITÁRIA – ACORDO MEC-USAID
• APOIO AOS EUA NA GUERRA FRIA
• SERVIÇO NACIONAL DE INFORMAÇÕES (SNI)
• RESISTÊNCIA ARMADA E ARTÍSTICA
• PLANO DE AÇÃO ECONÔMICA DO GOVERNO
• UTILIZAÇÃO DA TORTURA
• CORTE DE GASTOS PÚBLICOS
• “LINHA DURA”
• AUMENTO DE IMPOSTOS
• MILITARES QUE DEFENDEM O FORTALECIMENTO DO REGIME
• FUNDO DE GARANTIA POR TEMPO DE SERVIÇO
• “CASTELLISTAS”
• BANCO NACIONAL DE HABITAÇÃO
• MILITARES QUE DEFENDEM REGIME COMO TRANSIÇÃO
FORMAÇÃO DO GOVERNO ATOS INSTITUCIONAIS (AI)
• AI-2
DEPOSIÇÃO DE JANGO: ASSUME O
• INTERVENÇÃO NOS ESTADOS E MUNICÍPIOS
PRESIDENTE DA CÂMARA
• PRESIDENTE GOVERNA POR DECRETOS
• ELEIÇÕES INDIRETAS (PRESIDÊNCIA)
FORMAÇÃO DO COMANDO • EXTINÇÃO DOS PARTIDOS
SUPREMO DA “REVOLUÇÃO” • BIPARTIDARISMO: ARENA (SITUAÇÃO) E MDB (OPOSIÇÃO)
• AI-3 – ELEIÇÃO INDIRETA PARA GOVERNADOR E
ATO INSTITUCIONAL N.º 1
PREFEITO
• CASSAÇÃO DE POLÍTICOS
• AI-4 – CONSTITUIÇÃO DE 1967
• ELEIÇÃO INDIRETA PARA PRESIDÊNCIA
• CENSURA PRÉVIA À IMPRENSA
• LEI DE SEGURANÇA NACIONAL
ELEIÇÃO DE CASTELO BRANCO

GOVERNO COSTA E SILVA OPOSIÇÃO


C (1967-1969) “LINHA DURA” • FRENTE AMPLA: OPOSIÇÃO CIVIL
• 1968
MEDIDAS • MANIFESTAÇÕES ESTUDANTIS
• CONTROLE DE PREÇOS E SALÁRIOS • PASSEATA DOS CEM MIL (RS)
• SUBSÍDIO DO ESTADO À INDÚSTRIA • GREVES DE OSASCO (SP) E CONTAGEM (MG)
• INVESTIMENTO ESTRANGEIRO • 30.º CONGRESSO DA UNE
• CRIAÇÃO DA FUNAI • MANIFESTAÇÕES NO CONGRESSO
• CRIAÇÃO DO MOBRAL
RESISTÊNCIAS
ATO INSTITUCIONAL N.º 5 (1968)
• GUERRILHAS URBANAS E RURAIS
• FORTALECIMENTO DA REPRESSÃO
• MILITANTES QUE ROMPEM COM O PCB
• CENSURA
• POUCO PREPARO
• FIM DE DIREITOS CONSTITUCIONAIS
• POUCO ÊXITO
• FORTALECIMENTO DO PODER EXECUTIVO
• RESISTÊNCIA ARTÍSTICA
ÓRGÃOS DE REPRESSÃO • DESPISTAM A CENSURA
• DOI-CODI • OBAN • MPB
• DOPS • SNI • CENIMAR • TEATRO DE ARENA

119
Competência 1 – Compreender os elementos culturais que constituem as identidades.
H1 Interpretar historicamente e/ou geograficamente fontes documentais acerca de aspectos da cultura.
H2 Analisar a produção da memória pelas sociedades humanas.
H3 Associar as manifestações culturais do presente aos seus processos históricos
H4 Comparar pontos de vista expressos em diferentes fontes sobre determinado aspecto da cultura.
H5 Identificar as manifestações ou representações da diversidade do patrimônio cultural e artístico em diferentes sociedades.
Competência 2 – Compreender as transformações dos espaços geográficos como produto das relações socioeconômicas e culturais de
poder.
H6 Interpretar diferentes representações gráficas e cartográficas dos espaços geográficos.
H7 Identificar os significados histórico-geográficos das relações de poder entre as nações.
H8 Analisar a ação dos estados nacionais no que se refere à dinâmica dos fluxos populacionais e no enfrentamento de problemas de ordem econômico-social.
H9 Comparar o significado histórico-geográfico das organizações políticas e socioeconômicas em escala local, regional ou mundial
Reconhecer a dinâmica da organização dos movimentos sociais e a importância da participação da coletividade na transformação da realidade
H10
histórico-geográfica.
Competência 3 – Compreender a produção e o papel histórico das instituições sociais, políticas e econômicas, associando-as aos diferentes
grupos, conflitos e movimentos sociais.
H11 Identificar registros de práticas de grupos sociais no tempo e no espaço.
H12 Analisar o papel da justiça como instituição na organização das sociedades.
H13 Analisar a atuação dos movimentos sociais que contribuíram para mudanças ou rupturas em processos de disputa pelo poder.
Comparar diferentes pontos de vista, presentes em textos analíticos e interpretativos, sobre situação ou fatos de natureza histórico-geográfica acerca
H14
das instituições sociais, políticas e econômicas.
H15 Avaliar criticamente conflitos culturais, sociais, políticos, econômicos ou ambientais ao longo da história.
Competência 4 – Entender as transformações técnicas e tecnológicas e seu impacto nos processos de produção, no desenvolvimento do
conhecimento e na vida social.
H16 Identificar registros sobre o papel das técnicas e tecnologias na organização do trabalho e/ou da vida social.
H17 Analisar fatores que explicam o impacto das novas tecnologias no processo de territorialização da produção.
H18 Analisar diferentes processos de produção ou circulação de riquezas e suas implicações sócio-espaciais.
H19 Reconhecer as transformações técnicas e tecnológicas que determinam as várias formas de uso e apropriação dos espaços rural e urbano.
H20 Selecionar argumentos favoráveis ou contrários às modificações impostas pelas novas tecnologias à vida social e ao mundo do trabalho.
Competência 5 – Utilizar os conhecimentos históricos para compreender e valorizar os fundamentos da cidadania e da democracia, fa-
vorecendo uma atuação consciente do indivíduo na sociedade.
H21 Identificar o papel dos meios de comunicação na construção da vida social.
H22 Analisar as lutas sociais e conquistas obtidas no que se refere às mudanças nas legislações ou nas políticas públicas.
H23 Analisar a importância dos valores éticos na estruturação política das sociedades.
H24 Relacionar cidadania e democracia na organização das sociedades.
H25 Identificar estratégias que promovam formas de inclusão social.
Competência 6 – Compreender a sociedade e a natureza, reconhecendo suas interações no espaço em diferentes contextos históricos e
geográficos.
H26 Identificar em fontes diversas o processo de ocupação dos meios físicos e as relações da vida humana com a paisagem.
H27 Analisar de maneira crítica as interações da sociedade com o meio físico, levando em consideração aspectos históricos e (ou) geográficos.
H28 Relacionar o uso das tecnologias com os impactos sócio-ambientais em diferentes contextos histórico-geográficos.
H29 Reconhecer a função dos recursos naturais na produção do espaço geográfico, relacionando-os com as mudanças provocadas pelas ações humanas.
H30 Avaliar as relações entre preservação e degradação da vida no planeta nas diferentes escalas.

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