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AVALIAÇÃO FINAL: RESUMO TÉORICO E HISTÓRICO DA PSICANALISE

FREUDIANA

ALUNO: LUCAS GUIMARÃES DOS SANTOS

Em meados do séc. XIX, a Psicanálise inaugura a ciência da alma e do inconsciente,


em um momento em que a Psicologia se empenhava na validação de seus conceitos
através do método científico e da linguagem experimental. Os teóricos da Psicologia
do final do século XIX e início do século XX tiveram como compromisso criar um
método psicológico observável e alinhado com as ciências exatas – em oposição às
psicologias mentalistas, entendidas como abstratas e metafísicas, que não cumpriam,
então, com os critérios do método científico. Em um universo do concreto, o conceito
de doença era o fenômeno antecedido pelo sintoma, observado mecanicamente.

A presença, ou não, de lesão anatômica relativa a determinados sintomas era,


para a Psiquiatria do século XIX, fator importante para a compreensão de distúrbios
em geral. Mas os aspectos não observáveis, para os quais não se tinham lesões
orgânicas, também eram levados em consideração - eram, então, as neuroses. O
fenômeno da histeria foi abordado a partir do ponto de vista da ausência da lesão, já
que não se tinham indícios orgânicos de disfunções. As nuances da Psicanálise
surgem da análise de neuróticos e da terapêutica constantemente em adaptação para
esses pacientes, em virtudes de novas descobertas.

Sigmund Freud é o principal percursor da Psicanálise e dá as cartas para a


teorização de um universo até o momento muito obscuro e sem tamanhas
explicações. Como neurologista, Freud atendia pacientes histéricas e as razões da
histeria ainda eram incertas. Ao atender um curso de Charcot, proeminente professor
e neurologista, Freud adere ao seu modelo fisiológico para a histeria. Um dos
aspectos mais salientados à época, tanto por Freud como por Charcot, eram os que
diziam respeito ao fato de que a histeria não era uma simulação, e sim uma doença
funcional com um conjunto nosológico bem definido.

A principal proposta de Charcot eram os estudos com hipnose para


atendimento de pacientes. Nas suas aulas, eram feitas demonstrações constantes de
sessões de hipnose, assim como inalação de nitrato de amilo, com o intuito da
encenação da crise histérica. O emprego da hipnose tinha por objetivo controlar a
situação. Através da sugestão hipnótica, o médico podia obter um conjunto de
sintomas bem definidos. Como principal conclusão dos estudos, Charcot pontua que
os estados histéricos advêm de uma predisposição hereditária para, em decorrência
de um trauma psíquico, produzir um estado hipnótico permanente. Ao pedir para seus
pacientes narrarem suas histórias e seus possíveis traumas, Charcot se surpreende
com o conteúdo sexual presente em muitos deles.

A concepção de Charcot sobre a histeria influencia Freud em sua atuação com


pacientes histéricos, e recomenda em seus escritos as etapas principais do
tratamento do paciente: o afastamento temporário da família e a internação.
Eventualmente, percebe-se que a dinâmica do tratamento – que incluía a reclusão,
hidroterapia, massagem, ginástica, hipnose por sugestão (em razão do aspecto
inconsciente do trauma), entre outros – apenas eliminava o sintoma, e não a causa.
Com isso Freud se alinha a Breuer em um estudo preliminar sobre o uso da hipnose
a fim de fazer o paciente remontar sua história para chegar ao trauma, e assim
descarrega-lo no processo da ab-reação. Nesse método, o analista guia o paciente
até seu objetivo, estabelecendo proibições a desvios que possibilitam fuga do objetivo
de atingir o trauma.

Com o tempo, Freud se deparou com um fenômeno inédito, e de profunda


importância para o surgimento da Psicanálise em si - as defesas. Para se libertar do
trauma é necessário a superação das defesas, ou resistências, incutidas no
inconsciente, e isso só seria possível em uma análise consciente longe da suspensão
da consciência proposta pela hipnose. Freud abandona a hipnose, e introduz o
conceito de recalcamento, que são exatamente as defesas do inconsciente que
precisam ser desarmadas.

Com essas descobertas, Freud abandona de vez a hipnose e rompe


alinhamentos com Breuer, e passa a estudar mais intimamente a natureza dessas
defesas, ou resistências. Em análise, os pacientes eram solicitados a relembrar do
fato traumático que poderiam ser os causadores dos sintomas observados. E, com
isso, as tentativas dos pacientes e do analista eram confrontadas com uma resistência
muito grande do paciente em trazer essas lembranças à consciência. As memórias
eram de conteúdo muito aflitivo, e eram carregadas de emoções de vergonha,
autocensura e dor psíquica - a defesa aparece como uma forma de proteger o ego de
uma ameaça grande, mantendo a lembrança longe da consciência do indivíduo. O
corpo reagia a essa carga afetiva de grande tamanho com a emergência de sintomas
somáticos, como então observados.

Em momentos primitivos de desenvolvimento egóico, há uma integração ainda


pobre e em contínua construção e fortalecimento, expondo a estrutura do ego a
estímulos de difícil elaboração - se o estímulo é muito complexo e traumático há um
desvio, ocasionando o encaixotamento desse trauma em forma de recalcamento.
Essa estrutura recalcada é alocada às margens do inconsciente, inacessível e é
pautada por forças próprias. A maneira de demarcar seu território a nível consciente
é exatamente através do sintoma.

Com a percepção de um conteúdo sexual latente em muitos dos casos de


traumas em indivíduos neuróticos, Breuer abandona a prática da análise, sobretudo
após o caso de Anna O., paciente que desenvolve uma dependência afetivo-
emocional (introdução do conceito fundamental da transferência) e apresenta uma
gravidez histérica, em que dizia que o filho era de Breuer. O médico dizia que a
relação com a mulher era estritamente profissional, mas ela passa a desenvolver uma
relação de co-depedência de clara conotação sexual. Ao relatar o caso para Freud,
Breuer omite o fato, que é precedente para o entendimento da histeria como
subproduto dos traumas sexuais. Freud reconhece o abandono de Breuer dos
quadros histéricos em decorrência dos conteúdos sexuais dos mesmos como um
grande equívoco, e, então, passa a compreender a base da análise a partir da
formação psicossexual e suas vicissitudes. Com o abandono da hipnose, o
descobrimento do recalcamento, das transferências e do mecanismo da resistência,
Freud estabelece os princípios basilares da ciência psicanalítica.

Freud divide a estrutura psíquica em três grandes estruturas: consciente,


inconsciente e pré-consciente. A psicanálise propõe uma hipótese para a formação
estrutural do inconsciente, uma dessas grandes estruturas psíquicas. Freud divide,
então, o inconsciente, a princípio, em dois blocos principais: Ego e Id. Cada um
desses blocos é regido por um princípio fundamental, que, ao serem comparados,
mostram-se conflitantes – os princípios da realidade e do prazer, regentes do Ego e
do Id, respectivamente. O princípio da realidade atua sobre o Ego como um sensor
das exigências do mundo externo, ao passo que o princípio do prazer atua sobre o
mesmo Ego como um combustível para a descarga de todo e qualquer impulso do Id,
de maneira incontornável e urgente. Ainda há um terceiro bloco, funcionando como
uma força a mais sobre o Ego, o chamado Superego. Esse terceiro bloco é a
representação da moral e dos códigos éticos, que despendiam da mesma força e
urgência do Id, e atuam sobre o Ego como cobrador do cumprimento das regras
sociais de conduta. O Ego, então, pressionado por três forças poderosas age como
um grande negociador e mediador de necessidades, tentando suprir as demandas de
todas as três forças.

A formação do Superego vale uma ressalva importante. As propriedades


morais da estrutura são derivadas de uma fase central da psicanálise freudiana, o
Complexo de Édipo. Reiterando o pujante conteúdo sexual da formação psíquica e
traumática humana, a fase do Édipo é um precedente para o choque moral que pauta
fases posteriores do desenvolvimento. O filho menino passa a disputar o amor e a
atenção da mãe com o pai, no sentido sensual e sexual da situação. Para superar
esse desejo incestuoso, então o pai castra o desejo do filho elaborando uma
conclusão ideal dessa fase do desenvolvimento. Problemas na etapa de castração
por parte do pai podem comprometer a decorrência saudável do psiquismo,
culminado em algumas disfunções ou até perversões. O processo na filha menina
apresenta alguns pontos convergentes, mas o movimento já é de inveja do pênis e
da fantasia de carregar filhos no ventre – a elaboração da formação egóica feminina
não foi muito bem explorada por Sigmund Freud, deixando vários fios soltos.

Dando as bases estruturais do inconsciente e destrinchando as etapas


fundamentais da análise - interpretação da demanda, transferência e superação das
resistências -, Freud, então, propõe a definição da pessoa do analista e de quem esse
papel é de direito. Á época do autor, existia uma reivindicação por parte de teóricos e
de médicos para que a análise fosse de delegação exclusiva da Medicina, e de
profissionais médicos graduados. Porém Freud é muito incisivo e claro que a ciência
psicanalítica é diferente da ciência médica, e que as competências de um médico não
o fazem um analista apenas pela vivência na graduação e especialização.

Freud defende a possibilidade de analistas leigos, já que a análise cumpre com


critérios específicos. Se sabe que o analista é de fato um analista se ele dominar a
arte da análise, e é preciso compromisso e superação das resistências para a prática
da análise responsável e bem sucedida. A teoria freudiana foi o alicerce para o
universo vindouro da análise, influenciando todos os psicanalistas promissores a vir
em seguida, como Lacan, Klein, Jung, Winnicott, Bion, entre outros.

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