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VALLE, Ione Ribeiro.

Capítulo 3 - Sociologia da educação e didática: a


versão francesa dos saberes escolares. In: Sociologia da educação: currículo e
saberes escolares / Ione Ribeiro Valle. 2. ed. – Florianópolis: Ed. da UFSC, 2014.
P. 57 – 76.

Valle, Ione Ribeiro – É Professora Titular do Centro de Ciências da


Educação da Universidade Federal de Santa Catarina. Possui pós-doutorado pela
École des Hautes Études en Sciences Sociales - Paris (2014), doutorado em
Ciências da Educação pela Université René Descartes - Paris V Sorbonne (2001),
mestrado em Ciências Sociais pela Universidade Federal de Santa Catarina (1991) e
graduação em Pedagogia pela Universidade do Planalto Catarinense (1976).
Desenvolve estudos e pesquisas na área de Educação e nas subáreas Sociologia e
História da Educação, com foco principalmente nos temas: desigualdades escolares,
democratização da educação, meritocracia, justiça escolar, profissionalização do
magistério, memória docente e socialização profissional. Possui vários trabalhos
publicados em periódicos científicos e em livros nacionais e estrangeiros. Tem
realizado traduções de artigos e de livros do francês para o português na área da
sociologia da educação.
Refletir sobre o atual dinamismo das áreas de conhecimento da escola a
sociologia francesa reflete importante mudança nas expectativas de diferentes
atores sociais que estão diretamente envolvidos na organização escolar. Longe de
constituir um campo relativamente estruturado, com fronteiras uma teoria de
epistemologia mais ou menos definida, como o curso de Sociologia na Grã-Bretanha
ou métodos críticos, sobre as lições ocultas e as noções de resistência da América
afirma, o debate em torno do saber escolar siga caminhos diferentes, mas
interdependentes. Interesse a sociologia da educação no contexto da pedagogia na
década de 1970 limitada a poucos trabalhos, embora os sociólogos franceses não
ainda em desacordo com as visões teóricas anglo-saxônicas.
Para analisar o problema do conhecimento escolar, partimos
hipoteticamente, para pesquisa sócio-histórica, que mostra não apenas coerência,
mas também revela inconsistências políticas, nos esforçamos para construção de
campanhas de educação escolar e Resultados de pesquisas nos campos da
sociologia e da pedagogia da educação. Colocamos, portanto, uma perspectiva
sobre o ângulo teórico mais óbvio nos últimos três anos, a fim de ver como eles
foram construídos origem social semelhante questionada e perspectivas diferentes.

3.1 Um Contexto Marcado Por Rupturas Epistemológicas


As rupturas no campo científico, ideológico, cultural, educacional foram
consideráveis na França dos anos 1960. Em termos de escolarização, esse período
caracterizou-se por um movimento de massificação do ensino secundário,
provocando uma primeira “explosão escolar”, sem fortes impactos sobre os
conteúdos de ensino, os métodos e programas de estudos (LANGOUËT, 1994). Os
conteúdos de ensino, explica Chervel (1998), são concebidos como entidades sui
generis próprias à sala de aula, independentes em certa medida de toda realidade
cultural e exteriores à escola, são produtos de uma organização, de uma economia
íntima e de uma eficácia, que não parecem fruto do percurso histórico percorrido. Os
conteúdos constituem-se, assim, numa criação da escola para a escola, estando
distantes de uma ciência de referência (VALLE, 2014, p. 60).
Por um lado, o objetivo da exploração - em todas a sua plenitude - potencial
utilizável, talento nacional, integridade que é o “Capital humano” 1 (considerado
riqueza econômica e estratégia de inclusão social); isso requer a remoção de todos
as barreiras institucionais ou financeiras para expandir a educação. Segundo a visão
dos economistas educacionais, de acordo com suas conclusões são mais em crença
do que em argumentos reais, afirmando que as pessoas não podem deixar de
acreditar que a educação é indispensável, para o crescer e se desenvolver porque
transformando a estrutura em produção, fonte do progresso tecnológico e a
educação tornar os trabalhadores mais eficientes, o que por si só pode melhorar
nível escolar.
De um outro lado, as críticas à função reprodutiva da educação das escolas,
dando origem a uma "sociologia da dúvida", inspirado principalmente em Pierre
Bourdieu e Jean-Claude Passeron (1964, 1970) sob questionamentos de origens
1
O conceito de “capital humano” foi desenvolvido pela primeira vez em 1961 pelo economista
americano Theodore William Schultz (1902- 1998), mas outros economistas (de Adam Smith a Alfred
Marshall e Irving Fisher) já haviam se interessado pelo tema. Ele considerava que embora pareça
evidente que os indivíduos adquirem o saber-fazer e os saberes úteis, não parece evidente que esses
aprendizados se constituam numa forma de capital, e que esse capital seja produto de um
investimento deliberado. [...]. Segundo essa teoria, o capital humano é indissociável de seu detentor,
o que supõe um investimento contínuo por parte do indivíduo a fim de adquirir novos saberes e novas
experiências. Além disso, o capital humano, diferentemente do capital financeiro, não pode se tornar
propriedade de um terceiro, estando limitado ao indivíduo que o incorpora, pois depende de suas
capacidades físicas e mentais e de seu ciclo de vida (VALLE, 2014, p. 61).
inatas do fracasso escolar, lembrando que, nesse sentido, "é melhor duvidar muito,
não pouco". Também por Christian Baudelot e Roger Establet (1971), que, a partir
da análise do conteúdo do manual escolar da educação primária, comprovando a
função ideológica da escola, para aqueles autores, essa função se realiza na
duplicidade da rede de ensino, reflexo de pessoas que enfrentam forte resistência
(em linguagem vulgar, rejeitar a cultura geral transmitida pela escola).
A rede destinada às classes populares procura inscrever no espírito dos
alunos um sentimento de inferioridade social, simplificando as noções de base,
ensinando lições banais, utilizando textos truncados e resumos esquemáticos
(“verdadeiros subprodutos culturais”), transmitindo uma visão moralista, laboriosa e
virtuosa do trabalho, inspirada em modelos antiquados da vida rural e artesanal
(VALLE, 2014, p. 63).

3.2 Pierre Bourdieu E Jean-Claude Passeron E As Ambiguidades Da Cultura


Transmitida Pela Escola
Para exercer as funções legalizadoras conferidas pelo grupo dominante, as
escolas receberam “poderes para impor”, que incluem a divulgação conteúdo
selecionado com base em seus interesses; conteúdo de assinatura numa verdadeira
“tradição seletiva”. Mesmo conhecimento não expressa necessariamente a mesma
atitude, nem se espalha mesmos valores: para alguns alunos, eles representam uma
força ou única regra, obedecem às ordens da escola; para outros, expressam
características da cultura jurídica, ambiente familiar.
Nesse sentido, “uma cultura puramente escolar não é somente uma cultura
parcial ou uma parte da cultura, mas uma cultura inferior porque os
elementos que a compõem não têm o mesmo sentido que teriam num
conjunto mais amplo” (BOURDIEU; PASSERON, 1964, p. 33). A cultura
transmitida pela escola se apresenta, então, como objetiva e inquestionável,
embora seja arbitrária e de natureza social (resultante portanto de relações
de força). Nota-se assim que a perspectiva neoweberiana aparece
claramente em seus estudos, que conservam os fundamentos do marxismo
concernentes à divisão da sociedade entre dominados e dominantes. De
Max Weber, eles retêm a tese de que a dominação não é engendrada
apenas pela esfera econômica, mas se produz e se reproduz numa relação
de “violência simbólica” (BOURDIEU; PASSERON, 1970), que coloca em
evidência os aspectos cognitivos da atividade simbólica (ideias, valores,
costumes, gostos) (VALLE, 2014, p. 63-64).
Podemos dizer que para, Bourdieu e Passeron (1970) usam abstrações para
mostrar que a visão marxista da separação de classes é incorreta. Eles argumentam
que as classes sociais não existem como entidades distintas com limites claramente
definidos. Em vez disso, eles dizem que essas abstrações são conceitos analíticos
que não representam com precisão a realidade. De fato, Bourdieu e Passeron
afirmam que as fronteiras entre as classes se fundem umas nas outras.
Em outras palavras, para Max, frequentemente se concentra no poder e nas
formas como ele é implementado por causa de sua importância central para seu
trabalho. As relações de poder existentes precisam durar muito tempo para serem
duráveis. Isso foi observado pelo sociólogo Max Weber no século XIX. A sociedade
requer uma razão de existência que só pode ser alcançada por meios simbólicos. Ao
afirmar isso, ele menospreza os esforços daqueles que tentam encontrar soluções
concretas, esforçando-se para justificar sua desvantagem e retificar suas
consequências com inteligência.
Os conteúdos curriculares transmitem regras morais e maneiras de
perceber o mundo, dotando os alunos de uma lógica intelectual comum, que
constitui o “habitus culto” de sua época. O conceito de “habitus” está no
centro da teoria de Bourdieu e de seus colaboradores, tendo sido
empregado, desde os primeiros trabalhos, para designar um “sistema de
disposições duráveis e transmissíveis, estruturas estruturadas predispostas
a funcionar como estruturas estruturantes”; isto é, como princípios
geradores e organizadores de práticas e de representações. O conjunto
dessas disposições funda a constância e a relativa coerência dos
comportamentos e determina o modo pelo qual cada grupo social lê, avalia
a realidade e se move na sociedade. O habitus se manifesta no dia a dia,
correspondendo ao “senso prático”, e permite aos indivíduos adaptar sua
vida cotidiana às exigências sociais de maneira automática, sem precisar
recorrer a uma reflexão consciente. Além disso, o habitus é considerado
como vetor da “causalidade do provável”, pois conduz o indivíduo a
“antecipar seu futuro” e a assumir sua “sina”37 a partir da experiência
vivenciada no presente e, consequentemente, a não desejar o que parece
eminentemente pouco provável (VALLE, 2014, p. 64 - 65).
O poder de determinar quem pertence a um grupo, definindo padrões de
valor ou classificação. A legitimidade concede autoridade às posições que detêm
mais poder.

3.3 A Emergência Da Didática Como Campo De Pesquisa Sobre Os Saberes


Escolares
Apesar de não estar no centro da pesquisa sociológica e das políticas
educacionais implementadas na França, a questão dos saberes escolares
relança sem cessar o debate educacional e encoraja a busca de soluções
para as desigualdades escolares, que não se reduzem apenas às
dificuldades de acesso à escola. Viviane Isambert-Jamati publicou (durante
a década de 1960) diversos trabalhos de cunho sócio-histórico abordando
as transformações dos conteúdos escolares e, numa perspectiva sincrônica,
analisou sua diversificação em função do público escolarizado e/ou dos
professores e nos diferentes projetos educacionais (VALLE, 2014, p. 66).
A projeção de Viviane, seus pensamentos voltaram-se para o assunto do
conhecimento escolar e a transmissão em muitas formas. É por isso que é
considerado um retorno único à perspectiva de Durkheim, novas estruturas
escolares, mudanças nas políticas públicas de educação francesas e mudança no
conteúdo curricular, tudo isso anda de mãos dadas.
A reflexão de Isambert-Jamati se funde com o texto nesse sentido das
teorias da reprodução são problemáticas, professores empregam programas de
ensino como um exemplo para alunos cujas origens sociais impactam o programa.
Além disso, ela critica uma das ideias principais do projeto entre as ideias de
Durkheim e as de seus contemporâneos, uma ampla gama de interações sociais,
incluindo trocas monetárias, são listadas como parte dessa definição, dividindo as
sociedades em vários grupos políticos, sociais e culturais.
Entretanto os saberes escolares não são tidos como uma questão
sociológica (em perspectiva anglo-saxônica), quanto a sua atualização dos
curricular, se direciona-se para uma reaproximação dos conhecimentos procedentes
da pesquisa científica. Visando aprendizagem dos alunos aos conhecimentos
científicos, claro que, é necessário ao professor não somente conheça sua
disciplina, mas demonstre domínio linguístico. Compreendendo que a linguagem é o
meio de poder e sua privação aparece como alienação, com crescentes os estudos
voltados aos problemas linguísticos das crianças de classe popular, tidos como
obstáculo ao dificultando o rendimento escolar. Seguindo a tipologia da pedagogia
francês e a diferenciação social de resultados, Isambert-Jamati, distingue que a
língua é compreendida como um código dentre muitos outros: “apropriar-se do
código linguístico permite tirar mais proveito das comunicações da vida moderna”
(VALLE, 2014, p. 67 - 68).

3.4 Objetivos Comuns, Caminhos Paralelos


Desde a década de 1980, nota-se uma grande produtividade nas
abordagens sociológicas e didáticas da educação escolar, das quais se
desenvolvem sem aproximação, mas em paralelo. As questões que motivam didatas
diferem pela sua natureza das questões colocadas pelos sociólogos: a primeira visa
explicar os mecanismos cognitivos que intervêm numa situação específica de
transferência/absorção de conhecimento; a segunda pretende compreender a
posição social dos vários saberes ensinados, o que leva à incerteza na construção e
disseminação do conhecimento escolar. Portanto, diz-se que cada disciplina produz
seus próprios, trabalhos de forma independente, geralmente sem referência a
trabalhos produzidos em outros campos. No entanto, é unânime a necessidade de
diálogo entre didáticas e sociólogos, pois assim seria possível compreender as
formas de socialização criadas pelos saberes escolares e as relações sociais
construídas por diferentes mecanismos ambientais (VALLE, 2014, p. 68).
Segundo Bourdieu (1985, p. 5), o sistema de ensino e a pesquisa são
vítimas, em todos os níveis, dos efeitos da divisão hierárquica entre o “puro”
e o “aplicado”, que se estabelece entre as disciplinas e no interior de cada
uma delas, o que se constitui numa forma transformada de hierarquia social
entre o “intelectual” e o “manual”(VALLE, 2014, p. 68).
A perspectiva sociológica francesa, no entanto, permanece distante dos
estudos anglo-saxões e continua fortemente associada a abordagens reprodutivas,
que aparentemente não se limitam mais aos estudos da década anterior. Em outra
obra, que tem grande influência no meio acadêmico e rapidamente se tornou uma
espécie de "clássico" da sociolinguística (THOMPSON, 2001), Bourdieu publica
pesquisas de grande impacto sobre a questão da linguagem. Referindo-se ao livro
The Economics of Language Exchange (1982), ele tenta mostrar que a comunicação
em uma situação de "autoridade pedagógica" requer remetentes legítimos,
receptores legítimos, situações legítimas, línguas legítimas. A comunicação
pedagógica, o autor, não se dirige a indivíduos tão dispostos a compreendê-la e a
explorá-la, como o hermetismo, a indiferença ou a imprudência ofendem os menos
afortunados.

3.5 O Olhar Sociológico Se Volta Para A Sala De Aula


Compreendida como um mecanismo idealizado afim de transmitir uma
herança cultural, uma tradição, valores de determinados grupos sociais,
instrumentos conceituais e métodos, a educação escolar provoca entre os
sociólogos algumas expectativas otimistas, apesar do estilo dominante das
explicações reprodutivistas. Determinados por compreensão de efeitos cruéis da
escolarização – pois a “oferta escolar não é homogênea e nem produz sempre o
mesmo desempenho; não tem sempre a mesma eficácia”, levados pela
impossibilidade de não revelar a prática docente sob a ideia de enfrentar o poder
das estruturas organizacionais, os estudos de Isambert-Jamati (1990) e de Forquin
(1990) introduzem novos subsídios ao debate educacional, reorientando o cenário
intelectual de anos consecutivo. Um estudo pioneiro desenvolvido nessa perspectiva
é o de Régine Sirota: A escola primária no cotidiano (1988), publicado no Brasil em
1994, nas palavras da autora, “surgem no campo da sociologia da educação de
língua francesa tentativas de análise e de teorização das práticas pedagógicas ou,
em outras palavras, das maneiras de dar aula” o que leva demais autores o
crescente interesse pela “opacidade da caixa preta” que seria a sala de aula
(VALLE, 2014, p. 70).
Para Isambert-Jamati (1990, p. 41), “afirmar globalmente que a escola é ao
mesmo tempo o reflexo da sociedade e o meio de consolidar sua ordem é
fácil. Mas é bem mais árduo ir além das correspondências aproximativas e
colocar em dia as mediações”. [...], Isambert-Jamati reafirma sua atuação no
progresso das nações (segundo a concepção funcionalista), sem deixar de
reconhecer o lugar inequívoco que a educação ocupa nos projetos de
emancipação política. Por essa razão, a questão do fracasso escolar se
torna central nos meios pedagógicos, especialmente em contextos de
massificação do acesso, tal qual o debate sobre os saberes escolares e as
práticas de ensino. A autora sublinha que uma vez que um nível de
escolaridade bem além do primário se torna a norma, percebe-se que
prever novas vagas não é suficiente. Torna-se necessário modificar a
maneira de proceder, as referências culturais, as condutas esperadas, pois
se estas continuarem exatamente como antes, uma parte importante do
novo público enfrentará muitas dificuldades na instituição escolar e será
rapidamente eliminada, sob a justificativa de sua inaptidão (VALLE, 2014, p.
70 – 71).
Examinando as primeiras tentativas de abertura do ensino médio francês , Isambert-
Jamati (1990) observa que a democratização quantitativa foi acompanhada por um
aumento significativo da segregação interna 2: a desigualdade educacional foi
gradualmente substituída pela desigualdade. Através do complexo “trabalho
pedagógico" descrito por Bourdieu e Passeron (1970), as instituições de ensino
cumprem a tarefa de seleção e classificação, que correlaciona a origem social do
público e o valor que lhe atribuem socialmente. curso específico (ou qualificação).
Além disso, os alunos não podem adquirir os conhecimentos e habilidades
necessários para uma escola na mesma velocidade por causa da diversidade de seu
capital cultural (isto é, o conjunto de atitudes e habilidades, especialmente
habilidades linguísticas). o que torna as diferenças de desempenho escolar ainda
mais significativas - e muito mais perceptíveis.

3.6 JEAN-CLAUDE FORQUIN E A “SOCIOLOGIA DA CULTURA ESCOLAR”


O argumento desenvolvido por Jean-Claude Forquini contribuiu para a
ampliação do debate acadêmico sobre questões educacionais em geral, e
2
A expressão “segregação escolar” despertou o interesse de sociólogos e cientistas da educação
desde os anos 1980, tendo sido utilizada para caracterizar as políticas de democratização da
educação, que, segundo diversas abordagens, limitam-se à promoção de uma “democracia
segregativa”. Para focalizar a exclusão em todas as suas dimensões e formas de manifestação,
Paugan (1996) reúne numa obra notável uma gama de pesquisadores que retomam o debate e
relacionam exclusão e as diversas modalidades de segregação, abrangendo as mais diversas áreas
sociais: saúde, educação, moradia, emprego, etc. No que concerne à noção de “democratização
segregativa”, vale destacar a obra de Duru-Bellat (2002), que examina a gênese e os mitos das
desigualdades sociais na escola francesa (VALLE, 2014, p. 72).
informações escolares em particular, formando uma “teoria sem justificação visível”,
baseada mais no pensamento filosófico, do que nos sociológicos. Além de trazer a
sociologia anglo-saxônica para o campo intelectual francês, mediante uma
perspectiva crítica, suas obras contribuem para o surgimento de novas abordagens
e para a multiplicação da pesquisa educacional. Embora Forquin levante com muita
propriedade a questão das formas como o conhecimento escolar é selecionado,
organizado e legitimado, a sociologia do currículo é contingente, o que a torna pouco
convincente e um obstáculo à educação para implementar o projeto de derrubada do
absolutismo cognitivo e cultural subjacente à educação.
Forquin edifica uma “sociologia da cultura escolar” (ROPÉ, 2001, p. 43), que
se torna referência incontestável tanto nas ciências sociais quanto nas
ciências da educação. Sua abordagem agrada os sociólogos pelo rigor e por
sua inscrição numa perspectiva que aporta novos conhecimentos sobre o
mundo social. Ao reafirmar a transmissão de saberes e da cultura (não no
sentido atribuído por Bourdieu: “a cultura dos cultos”, mas em termos de
valores, normas de comportamento, práticas, competências) às novas
gerações como a principal função da escola, o autor introduz os
fundamentos que permitem correlacionar seus determinantes e suas
consequências sociais. Segundo Bourdieu (2000, p. 134), a sociologia da
educação tem por fim desvelar o caráter arbitrário e as perspectivas
conflituosas, pois “além dos saberes escolares e da organização curricular,
é a ideia de uma ‘verdade’ e de uma ‘validade’ (‘transcontextual’) dos
enunciados que é contestada; as epistemologias são apenas fatos
institucionais, tradições cognitivas cuja plausibilidade repousa sobre a
adesão de comunidades intelectuais particulares” (VALLE, 2014, p. 73).
Segundo Forquin (2000a, p. 63), [..] A ideia de respeitar as culturas pressupõe a
existência de uma perspetiva exterior às próprias culturas e a aceitação de critérios,
que têm um caráter universal. Assim, a educação intercultural pode incluir a atenção
e o respeito que os indivíduos de diferentes culturas merecem, apenas se puder
reconhecê-los acima de tudo como pessoas comuns, com vocação transcultural
para a racionalidade. A variedade do outro só é considerada se for reconhecida
como outra modalidade humana possível. O autor também enfatiza que em um
contexto multicultural [...] os materiais de aprendizagem devem ser escolhidos mais
especificamente com base em critérios educacionais, e não com base nos alunos
pertencentes a uma determinada cultura. Se o professor pode escolher seus
exemplos pedagógicos neste ou naquele universo cultural, também pode enfatizar o
que há de verdadeiramente humano em cada manifestação cultural e avaliar o que
há de especial segundo parâmetros universais. (VALLE, 2014, p. 74).

3.7 UMA BUSCA PERMANENTE DE RESPOSTAS OU A PROPOSIÇÃO DE


NOVOS MODELOS?
Levando em consideração das transformações na atualidade, implicar à
escola grandes desafios, em especial no contexto multiculturais, segundo Forquin
(2001, p. 139-143), frisa a importância de repensar a questão curricular a partir de
respostas centradas em diferentes concepções. Consequentemente, essas
respostas não são equivalentes: por preferência incidirá mais sobre uma que outra,
isso é, no plano ético e político mais que no plano epistemológico ou pedagógico.
1) Uma resposta centrada no neutralismo cultural, que supõe reduzir o
currículo a um conjunto de saberes instrumentais e de ferramentas
cognitivas formais, considerados válidos para todos na medida em que
excluem toda preferência axiológica, toda referência intelectual, toda
singularidade cultural ou histórica.
2) Uma resposta científica, que privilegia os conhecimentos científicos e
tecnológicos vistos como os únicos a portar racionalidade e universalidade,
em detrimento dos ensinamentos literários e dos saberes “hermenêuticos”.
3) Uma resposta pautada no etnocentrismo assimilacionista que, em nome
de justificações universalistas, conduz a impor a todos os alunos referências
e postulações, características da tradição cultural dominante no interior de
um dado país.
4) Uma resposta multiculturalista separatista ou segregacionista, que,
preocupada com a preservação da identidade, apregoa uma diferenciação
precoce dos programas de estudos ou, mais precisamente, a instalação de
redes escolares distintas para recrutar seu público, a partir de critérios de
vinculação comunitária, sociocultural ou étnico-cultural.
5) Uma resposta multiculturalista integradora, que introduziria um pluralismo
de referências culturais no interior das estruturas e dos programas
“unitários” de ensino, visando favorecer o respeito, os intercâmbios, o
diálogo, a interação, a intercomunicação e um enriquecimento cultural
mútuo.
6) Uma resposta neouniversalista aberta de caráter mais crítico e dialético,
que assentaria a tolerância e o intercâmbio sobre um núcleo de saberes e
de valores verdadeiramente “transculturais”, colocando-os no centro de um
currículo unitário que evitaria os riscos do etnocentrismo e os perigos do
relativismo (VALLE, 2014, p. 75 - 76).
Mediante a imensa perspectivas teóricas direcionar para a ideia de uma
“cultura escolar” específica, na medida em que todo saber, para ser ensinado, deve
se submeter a certas “modificações”, decorrentes da necessidade de geri-los ou de
facilita-los, visando que torne-se adequado aos processos de aprendizagem. Por
essa espécie de “abreviatura” do conhecimento científico provoca forte suspeita
sobre a legitimidade dos saberes escolares. Por dizer organização escolar expressa-
se um tipo de “racionalidade escolar” assemelhando-se à “racionalidade econômica”
e por sua vez à “racionalidade política” de sociedades modernas (VALLE, 2014, 76).

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