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28/09/2020 CREMESP - Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo - Versão para impressão - Área de Legislação

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PARECER Órgão: Conselho Regional de Medicina do Estado de São Paulo
Número: 122508 Data Emissão: 2018
Ementa: Gravação de Consultas Médicas. Áudio e Vídeo. Possibilidade. Ressalvas. Comportamento Ético do Médico. Adoção de medidas
preventivas e protetivas da relação médico-paciente. Exceção às situações de urgência e emergência.

Consulta nº 122.508/18

Assunto: Gravação de consultas médicas.

Relator: Dr. Osvaldo Pires G. Simonelli - OAB/SP 165.381 - Advogado do Departamento Jurídico.
Parecer subscrito pela Conselheira Silvana Maria Figueiredo Morandini, Diretora Secretária.

Ementa:  Gravação de Consultas Médicas. Áudio e Vídeo. Possibilidade. Ressalvas.


Comportamento Ético do Médico. Adoção de medidas preventivas e protetivas da relação
médico-paciente. Exceção às situações de urgência e emergência .

Trata-se, em apertada síntese, de solicitação do Ilustre Conselheiro Dr. Eurípedes Balsanufo


Carvalho, quanto a possibilidade de gravação ou registro da consulta médica pelo paciente, em
áudio e vídeo, por intermédio de dispositivos próprios

PARECER

A presente questão representa uma situação bastante frequente nos dias atuais, em
decorrência do fato de que praticamente todos os cidadãos possuem aparelhos celulares -
smartphones - que permitem o fácil registro das situações cotidianas, muitas vezes de modo
imperceptível aos interlocutores.

Na relação entre o médico e seu paciente não é diferente.

Os pacientes têm se utilizado de tal artifício para registro das consultas médicas, seja de boa
fé, no intuito de registrarem a informação detalhada para consulta posterior, como também
para utilização indevida, como expor o médico em redes sociais e congêneres.

O fato é que a gravação, por si só, não é um ato ilícito, inclusive no que se refere à consulta
médica. A Jurisprudência já firmou entendimento quanto a este aspecto:

É certo que esta Corte não admite a utilização de provas obtidas por meios ilícitos. Contudo, no
caso dos autos, segundo o acórdão recorrido, não se trata de gravação clandestina, constando
do voto que:

"O autor gravou conversa própria que manteve com os médicos sobre assunto de seu exclusivo
interesse, ouvindo deles explicações técnicas para atos a que se submeteu para tratamento de
sua saúde" (fls. 81)."

E, mais adiante:

"Na espécie, não se cuida de sigilo algum protegido. E nada há de imoral nessa gravação,
mesmo que da gravação não tivessem ciência os outros interlocutores. O autor apenas
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registrou em gravação magnética a conversa própria mantida com os médicos que lhe
prestaram um serviço de assistência à saúde, e que versou sobre um assunto ligado
exclusivamente à sua saúde" (fls. 82/83).

Não vislumbro, portanto, a excepcionalidade exigida para se determinar o imediato


processamento do recurso especial. STJ. MEDIDA CAUTELAR Nº 7.625 - SP (2003/0235146-2)
Ministro Antônio de Pádua Ribeiro - Relator."

Neste sentido, a gravação oculta de uma conversa privada - mesmo que sem o conhecimento do
outro interlocutor, in casu, o médico - não implica em ilegalidade.

Entretanto, o uso que se faz dessa gravação é que pode implicar em alguma ilegalidade,
passível, inclusive, de medida indenizatória em face do paciente; não se pode, por exemplo,
fazer uso público dessa gravação, como divulgação em redes sociais, imprensa, sem que haja a
autorização prévia do outro interlocutor.

Como já decidiu o STJ, "a voz é parte integrante do direito inerente à pessoa" (REsp n.
1.630.851), não sendo possível a sua utilização ou exploração indevida por parte de terceiros,
sendo que, mais importante ainda, é a proteção da imagem, quando há uma gravação não
autorizada, em vídeo, pelo paciente.

O direito à imagem é protegido pela legislação pátria, como um dos direitos da personalidade,
indenizável por intermédio do respectivo processo judicial, o que significa dizer que, para que
o paciente possa registrar a consulta, deve ser precedido de consentimento expresso do
profissional. 
Na relação médico-paciente o profissional também é sujeito de direitos e que devem ser
respeitados.

Assim, como uma forma de atender à essa nova realidade da relação entre médico e paciente,
podemos indicar algumas recomendações exemplificativas, para que os próprios profissionais
possam se adaptar, invertendo um pouco a atual situação, apresentando aos pacientes as
seguintes propostas, já no início ou durante a consulta:

1. Caso o paciente deseje gravar a consulta médica, solicitar que ele assine um termo de
confidencialidade/preservação da imagem e da voz do médico, destacando que qualquer uso
indevido poderá ser alvo de responsabilização judicial;

2. Anotar no prontuário que a consulta foi gravada pelo paciente e que ele assinou o respectivo
termo;

3. Caso ele se recuse a assinar o termo ,o médico pode lançar mão de duas possibilidades: a.
pedir a alguém que assine como testemunha no termo, informando que o paciente gravou a
consulta e se recusou a assinar (podendo ser a própria secretária ou algum funcionário
administrativo); b. não sendo uma situação de urgência ou emergência, pode se recusar a
prestar o atendimento, utilizando-se da ressalva contida no artigo 36, §1º do atual Código de
Ética Médica (§1º Ocorrendo fatos que, a seu critério, prejudiquem o bom relacionamento com
o paciente ou o pleno desempenho profissional, o médico tem o direito de renunciar ao
atendimento, desde que comunique previamente ao paciente ou a seu representante legal,
assegurando-se da continuidade dos cuidados e fornecendo todas as informações necessárias ao
médico que lhe suceder);

4. Caso o médico se sinta inseguro, poderá, também, gravar o atendimento médico, anotando
tudo no prontuário.

A proteção, nestes casos, não recai sobre o sigilo médico - pois este é um direito do paciente,
que pode abrir mão a qualquer momento - mas sim do direito do profissional em ter a sua

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imagem e sua voz preservadas contra o uso indevido.

Evidentemente que a melhor condição envolve sempre o saudável diálogo a ser estabelecido
entre profissional e seu paciente, inclusive quanto a questão da gravação, que não deve ser
entendida como uma "agressão" à relação, mas a introdução de um elemento tecnológico entre
o médico e seu interlocutor.

O paciente que chega à consulta médica de maneira defensiva deve ser acolhido pelo
profissional que poderá, por intermédio de uma agradável interlocução, entender as razões
pelas quais o paciente pretende gravar a consulta e, se for o caso, demovê-lo de tal ideia, ou
adotar as indicações acima realizadas.

São situações práticas as quais o médico deverá se adequar ao longo do tempo e, na medida do
possível, adotar práticas para fortalecer a relação com seu paciente e, ao mesmo tempo,
proteger-se, em que pese a eventual burocratização da relação, ônus a ser suportado com a
evolução da tecnologia e do amplo e fácil acesso à informação.

Finalmente, quanto aos médicos ocupantes de cargos no serviço público, acaso a discussão
chegue a pontos extremos, o que não é obviamente o indicado e não se espera - há a previsão
quanto ao crime de desacato, tipificado no artigo 331 do Código Penal: "desacatar funcionário
público no exercício da função ou em razão dela."

Entretanto, esta é uma medida última a ser adotada, na hipótese do paciente não conseguir
compreender as razões apontadas pelo profissional quando do diálogo a respeito da gravação da
consulta, como indicado nos parágrafos acima.

Conclusão. Opinio Juris.

Diante do exposto e, evidentemente respeitando posicionamentos e teses contrárias, entendo


que não se deve proibir, de maneira taxativa, a gravação da consulta médica pelo paciente;
contudo, cabe ao médico adotar alguns procedimentos para se respaldar, aproveitando o
momento para fortalecer esta ligação e se adequar às novas características da relação.

Ademais e, por óbvio, estas orientações não são aplicáveis em situações de urgência e
emergência, exceto se for possível adotá-las sem prejudicar o paciente.

Assim, esperando ter atingido os objetivos propostos, apresentamos nosso parecer, colocando-
nos à inteira disposição para eventuais esclarecimentos que se fizerem necessários.

Este é o nosso parecer, s.m.j.

Dr. Osvaldo Pires G. Simonelli - OAB/SP 165.381


Departamento Jurídico - CREMESP

APROVADO NA REUNIÃO DA CÂMARA DE CONSULTAS, REALIZADA EM 15.06.2018.


HOMOLOGADO NA 4.845ª REUNIÃO PLENÁRIA, REALIZADA EM 19.06.2018.
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