Você está na página 1de 5

Capítulo 6

A importância dos gêneros textuais no aprendizado


de L2

Prof.Ms. Viviane Barbosa Caldeira Damacena

Viviane Barbosa Caldeira Damacena é graduada em Letras Português/Inglês pela Universidade


de Uberaba, pós-graduada em Educação Especial pela mesma instituição. Mestre em Letras
pelo programa Profletras pela Universidade Federal do Triângulo Mineiro - UFTM, e
atualmente é doutoranda pelo programa Estudos Linguísticos da Universidade de Uberlândia -
UFU. É professora de língua portuguesa, intérprete de Libras e professora de língua portuguesa
como L2 para surdos, tendo experiência ministrando cursos de capacitação para professores,
sobre língua portuguesa, aquisição de língua materna e língua não materna, além de ter
experiência em produção de materiais didáticos.

Definições:

O ensino de língua portuguesa como segunda língua para surdos ainda passa
por um processo de pesquisa e estudos, demonstrando ainda estar em
desenvolvimento. Pesquisas sobre o ensino de surdos e metodologias de ensino são
propostas, aplicadas e analisadas, porém não são vistas como única estratégia a ser
abordada. Porém, mesmo que não haja uma fórmula pronta, o uso de textos e dos
gêneros textuais demonstram ser imprescindível para que esse aprendizado possa
ser realizado.
Por se tratar de uma segunda língua apenas na modalidade escrita, o contato
com essa língua ocorre apenas através de textos. Principalmente se considerarmos
que o surdo não apresenta resíduos fônicos, esse contato torna-se ainda mais restrito.
O ensino de línguas através de gêneros textuais não está limitado apenas ao
ensino de pessoas surdas, mas também demonstra ser uma prática utilizada no
ensino de línguas de modo geral, tanto língua materna quanto segunda língua.
Ao lidarmos com o texto na sala de aula, em um primeiro momento há a
necessidade de distinção entre tipos textuais e gêneros textuais. A diferenciação entre
esses dois conceitos pode ser feita de forma simples, demonstrando as suas
complexidades.
“Usa-se a expressão tipo textual para designar uma espécie de
construção teórica definida pela natureza linguística de sua
composição (aspectos lexicais, sintáticos, tempos verbais,
relações lógicas). Em geral, os tipos textuais abrangem cerca de
meia dúzia de categorias conhecidas como: narração,
argumentação, descrição, injunção, exposição e dialogal. ”
(MOURÃO, 2022, p.90).

Assim, tipos textuais são o conjunto amplo de características que definem o


texto, enquanto que o gênero textual
“Usa-se a expressão gênero textual como uma noção
propositalmente vaga para referir os textos materializados que
encontramos em nossa vida diária e que apresentam
características sociocomunicativas definidas como: conteúdos,
propriedades funcionais, estilos e composição.” (MOURÃO,
2022, p. 90)

Podemos perceber que, enquanto os tipos textuais apresentam uma


característica mais ampla e demonstram ser limitados, os gêneros textuais podem ser
ilimitados, pois envolvem o cotidiano e todos os momentos da nossa vida, podendo
ser, por exemplo, um telefonema, uma receita, um manual e até mesmo uma conversa
por aplicativos de mensagens.
Assim, pensando no papel social que a língua apresenta, a escolha tanto do
tipo quanto do gênero textual torna-se complexa, pois há a necessidade de escolher
objetivos de aprendizado e, assim, perceber o melhor texto que cumpra com esse
objetivo. Ao lidarmos com o aprendizado de segunda língua pelo aluno surdo, essa
responsabilidade torna-se ainda maior, pois é através destes textos que ele terá
contato com a língua.
Os gêneros textuais trabalham não apenas como suporte para o aprendizado
da língua, mas também possibilitam o contato do aprendiz com a leitura e a escrita. O
papel do professor, nesta situação, deixa de ser apenas um papel mediador, passando
a ser o responsável pela formação de leitores críticos e com opiniões formadas.
Segundo Bakhtin, quando um indivíduo fala/escreve ou ouve/lê
um texto, antecipa ou tem uma visão do texto como um todo
acabado justamente pelo conhecimento prévio do paradigma
dos gêneros a que ele teve acesso nas suas relações de
linguagem. Só que um gênero não é uma forma fixa, cristalizada
de uma vez por todas e que deve ser tratado como um bloco
homogêneo. E é esse o equívoco que comentem algumas das
abordagens pedagógicas. O professor não pode perder de vista
a dimensão intergenérica, dialogal que um gênero estabelece
com outro no espaço do texto. (MOURÃO, 2022, p.91)
Sendo assim, o professor precisa considerar toda a dimensão e abrangência
que o gênero textual pode apresentar, possibilitando, assim, um aprendizado mais
amplo e completo. O texto precisa ser visto e tratado como objeto social, considerando
suas características de interação. Assim, o texto trabalha em parceria com o professor
e o aluno, colaborando para o seu desenvolvimento linguístico, conhecimento de
mundo e conhecimento social desse aprendiz.
A variedade e heterogeneidade de textos e gêneros textuais possibilitam ao
aprendiz uma oportunidade mais ampla de contato com a língua, pensando e
considerando o seu uso social e tendo como objetivo o objeto comunicativo.
A riqueza e a variedade dos gêneros do discurso são infinitas,
pois a variedade virtual da atividade humana é inesgotável e
cada esfera dessa atividade comporta um repertório de gêneros
do discurso que vai diferenciando-se e ampliando-se à medida
que a própria esfera se desenvolve e fica mais complexa.
Cumpre salientar de um modo especial a heterogeneidade dos
gêneros do discurso (orais ou escritos), que incluem
indiferentemente: a curta réplica do diálogo cotidiano (com a
diversidade que este pode apresentar conforme os temas, as
situações e a composição de seus protagonistas), o relato
familiar, a carta (com suas variadas formas), a ordem militar
padronizada, em sua forma lacônica e em sua forma de ordem
circunstanciada, o repertório bastante diversificado dos
documentos oficiais (em sua maioria padronizados), o universo
das declarações públicas (num sentido amplo, as sociais, as
políticas). E é também com os gêneros do discurso que
relacionaremos as várias formas de exposição científica e todos
os modos literários (desde o ditado até o romance volumoso).
[...] Não há razão para minimizar a extrema heterogeneidade dos
gêneros do discurso e a consequente dificuldade quando se trata
de definir o caráter genérico do enunciado (BAKHTIN, 1992,
279-280-281).

Essa heterogeneidade torna-se rica e complexa quando se aborda as


oportunidades de aprendizado. Outro ponto a ser considerado é a existência de novos
gêneros textuais, que estão surgindo e aqueles gêneros que passam por significações
e ressignificações ao longo dos tempos.
E é através dessa diversificação textual e situacional que o professor pode e
deve explorar questões que possibilitam ao aluno a formação de um pensamento
crítico, proporcionando a possibilidade de uma formação de opiniões que trabalham
questões não apenas voltadas para as estruturas rígidas de um gênero textual, mas
problematizando as suas práticas sociais e o seu papel comunicativo no cotidiano do
aprendiz.
Escolher um gênero textual e um texto para se trabalhar em sala de aula vai
muito além de escolher aleatoriamente. Considerar a atualidade do texto é de extrema
importância. Isto não significa que o professor deve levar apenas textos escritos em
um determinado período de tempo mais atual. É necessário a leitura de textos mais
antigos, principalmente quando consideramos o letramento literário, porém há
gêneros textuais que já se tornaram obsoletos e não há a necessidade de existir um
foco específico nele. Alguns desses gêneros textuais obsoletos, que podemos citar
são os telegramas, cartas, bilhetes, que, apesar de ainda existirem, sua utilização não
apresenta uma ocorrência tão frequente quanto há alguns anos.
Alguns desses gêneros textuais mais atuais e que ainda não são tão
trabalhados em sala de aula, são os gêneros textuais tecnológicos. Alguns deles já
são trabalhados, como texto midiático, reportagens divulgadas em meios de
comunicação digital, e-mails, etc. Outros ainda necessitam ser mais explorados, como
fanpages, blogs e, ainda assim, há aqueles novos gêneros textuais tecnológicos que
as vezes nem são considerados, como o whatsapp, o Facebook e até mesmo o tiktok.
Esses gêneros textuais emergentes também precisam ser abordados e trabalhados
como objeto significativo e prática social que envolve o cotidiano daquele aluno.
Esses gêneros que emergiram no último século no contexto das
mais diversas mídias criam formas comunicativas próprias com
um certo hibridismo que desafia as relações entre oralidade e
escrita e inviabiliza de forma definitiva a velha visão dicotômica
ainda presente em muitos manuais de ensino de língua. Esses
gêneros também permitem observar a maior integração entre os
vários tipos de semioses: signos verbais, sons, imagens e
formas em movimento. A linguagem dos novos gêneros torna-se
cada vez mais plástica, assemelhando-se a uma coreografia e,
no caso das publicidades, por exemplo, nota-se uma tendência
a servirem-se de maneira sistemática dos formatos de gêneros
prévios para objetivos novos. Como certos gêneros já têm um
determinado uso e funcionalidade, seu investimento em outro
quadro comunicativo e funcional permite enfatizar com mais
vigor os novos objetivos. (MARCUSCHI, 2002, p.02)

Assim, os gêneros textuais emergentes demonstram ser e ter tanta importância


quanto os gêneros textuais tradicionais. Partindo do pressuposto de prática social e
objeto comunicativo e sem desmerecer a tradição, poderíamos dizer, então, que os
gêneros textuais emergentes apresentam uma maior relevância como prática social
para esse aluno.
Esses gêneros textuais emergentes mostram-se mais flexíveis e maleáveis em
relação aos gêneros mais tradicionais, que demonstram terem características mais
engessadas. Essa flexibilidade colabora para que o aluno consiga perceber os
diversos usos da língua, conhecendo sua real dimensão.

Referência Bibliográfica

BAKHTIN, M. Os gêneros do discurso. In: Estética da criação verbal. São Paulo:


Martins Fontes, 1992

MARCUSCHI, L.A. Gêneros textuais: definição e funcionalidade. Gêneros textuais e ensino.


2002

MOURÃO, M.H.B.A. Gêneros e tipos textuais: uma proposta socio-interacionista.


Redes Revista Educacional da Sucessos. v.02.n.1, 2022.

Você também pode gostar