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CONSTITUIÇÃO DE 1988:

A CONSTITUIÇÃO CIDADÃ

Pesquisadora Cindy Lobo Alves


Objetivos

Ao final desta aula você deverá ser capaz de:

→ Reconhecer o panorama histórico nacional


durante o período da redemocratização
e a influência do papel social do povo na
promulgação da Constituição.

→ Compreender e listar os objetivos


constitucionais.

→ Identificar os direitos fundamentais e seus


objetivos.
Justificativa

O tema é de suma importância para o


agente civil, tendo em vista que apresenta
e desenvolve o conhecimento acerca dos
direitos fundamentais, que são garantidos
aos cidadãos de forma geral a todos os
cidadãos e igualmente ao extensionista, seja
exercendo suas funções enquanto agente,
seja como cidadão comum.
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CONSTITUIÇÃO DE 1988: A CONSTITUIÇÃO CIDADÃ

A Constituição da República Federativa do Brasil de 1988 foi o


resultado da Assembléia Constituinte, convocada no ano de 1985, pe-
ríodo em que os debates acerca da redemocratização e direitos funda-
mentais eram a principal pauta social. A Constituição vigente naquele
momento era a Constituição de 1967 e foi fruto do Ato Institucional nº
4 (AI4), e como tal, tinha um forte caráter autoritário e retirava do ci-
dadão direitos básicos políticos, de liberdade e outros, assim como os
Atos Institucionais anteriores e posteriores. Com o enfraquecimento
da ditadura, após os anos de chumbo, a sociedade lutava cada vez
mais em prol de uma nova Constituição que fosse mais democrática
e garantidora dos direitos do cidadão. Na década de 80, surgiram as
manifestações “Diretas já!”, que tiveram forte aderência social e mobi-
lizou a população para a votação de uma Emenda Constitucional que
devolveria aos brasileiros o direito ao voto que havia sido suspenso ao
longo da ditadura. Apesar da derrota, o povo seguiu apoiando a eleição
de Tancredo Neves, através de eleições ainda indiretas. Logo após,
Tancredo falece e assim assume o seu, então, vice-presidente José
Sarney. A Constituição hoje vigente foi promulgada em 5 de outubro
de 1988 e concretizou o processo de redemocratização, ao fim dos 21
anos do regime autoritário conhecido como ditadura militar. A Carta -
conhecida como a Constituição Cidadã - passa a assegurar, expressa-
mente, direitos fundamentais, colocando o povo no centro dos direitos.
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1. Desenvolvimento
A Assembléia Nacional Constituinte, ou seja, o órgão responsá-
vel por elaborar a Constituição, foi convocada no ano de 1985 - ano
da redemocratização - pelo então Presidente da República, José Sar-
ney. O panorama histórico pós-ditadura era de intensos movimentos
de participação popular e a maior demanda do povo era no sentido de
criar mecanismos de limitação do poder do Estado e de garantia dos
direitos fundamentais.

Em 1986, um ano após intensos debates da Comissão Provisória


de Estudos Constitucionais (também conhecida como Comissão Afon-
so Arinos), o anteprojeto constitucional presidido por Ulysses Guima-
rães foi encaminhado ao Congresso e, a partir daí, os constituintes es-
tabeleceram 8 comissões temáticas, responsáveis por se aprofundar
em seus respectivos temas, a fim de iniciar os debates formais sobre o
conteúdo do documento que definiria as bases de todo o ordenamento
jurídico nacional.

No dia 5 de outubro de 1988 é promulgada a Constituição (o


“projeto D” que continha a redação final do novo texto constitucional),
revolucionando a história constitucional do país, ao ampliar o rol de
direitos fundamentais - reconhecidos formalmente. A ideia é a de de-
senvolver um governo de leis e não de/ para algumas pessoas.

Uma Constituição tem a finalidade de estruturar o Estado, or-


ganizar seus órgãos, modo de atuação e de aquisição do poder, sua
forma e limites de atuação, fixar o regime político, o regime socioeco-
nômico, estabelecer os fundamentos do Estado e assegurar os direitos
dos cidadãos. O conteúdo das constituições varia de acordo com as
mudanças sociais que se estabeleçam ao longo dos anos.
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A Constituição, portanto, tem como objetivos primordiais:

• Organizar o Estado;

• Limitar o exercício do Poder Político;

• Garantir os direitos fundamentais.

Para garantir essa limitação, ou seja, para proibir que o uso do


poder conferido a entidades políticas se sobreponha aos interesses da
população, a Constituição deve estar no ápice do ordenamento jurídi-
co, o que significa que todas as outras normas jurídicas, devem estar
de acordo com as normas constitucionais e, também, que a Constitui-
ção não possa ser alterada, de acordo com interesses próprios do go-
verno. Para que haja alterações em seu texto, faz-se necessário pas-
sar por um rito previamente estabelecido.

Isso se deve ao fato de que a Constituição é o documento jurídi-


co político que define os rumos de um país, a forma como o governo
será definido e quais direitos serão assegurados aos cidadãos daquele
Estado soberano. Portanto, afirmar que vivemos em um Estado Demo-
crático de Direito significa, primordialmente, que aquele Estado cum-
pre com as normas estabelecidas pela vontade do povo, através desse
documento e o coloca como prioridade, tratando desse tema primeiro
e, somente depois tratando da Organização do Estado e demais temas
afins.

Já em seu preâmbulo, o Documento afirma que:

“Nós, representantes do povo brasileiro, reunidos em As-


sembléia Nacional Constituinte para instituir um Estado
Democrático, destinado a assegurar o exercício dos direi-
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tos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem-


-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça como
valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e
sem preconceitos, fundada na harmonia social e compro-
metida, na ordem interna e internacional, com a solução
pacífica das controvérsias, promulgamos, sob a proteção
de Deus, a seguinte CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA FEDE-
RATIVA DO BRASIL.”

Cabe ressaltar, que o preâmbulo é a parte preliminar do texto


constitucional e é nele que o Constituinte originário exprime os ob-
jetivos, valores e ideias que servirão de diretriz interpretativa para a
interpretação sistemática da Constituição. Ou seja, serve como base
interpretativa, em caso de dúvidas de aplicação da lei diante de con-
flitos constitucionais.

Na Constituição de 1988, os direitos fundamentais ocupam o iní-


cio do texto normativo, o que demonstra sua maior relevância, uma vez
que os direitos fundamentais estabelecidos no artigo 5º, §1º, passam
a ter aplicabilidade imediata. Outra limitação trazida por essa Consti-
tuição é a inclusão dos direitos fundamentais como cláusulas pétreas
(art. 60, §4º, CF 88), ou seja, impede que esses direitos sejam reduzi-
dos ou revogados por meio de emenda constitucional.

Art. 60. A Constituição poderá ser emendada mediante proposta:

§ 4º Não será objeto de deliberação a proposta de emenda


tendente a abolir:
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I - a forma federativa de Estado;

II - o voto direto, secreto, universal e periódico;

III - a separação dos Poderes;

IV - os direitos e garantias individuais.

É importante compreender, que as Constituições brasileiras se


deram em razão de marcos históricos, como, por exemplo, a Indepen-
dência do Brasil (1824). No mesmo sentido, a Constituição de 1988 foi
promulgada após 21 anos de ditadura militar, onde os direitos indivi-
duais e coletivos eram violados, principalmente, por parte do Estado e
suas entidades estatais.

Desta forma, bem como em diversos outros Estados, após um


período de violações contumazes dos direitos humanos, a demanda
popular faz-se no sentido de ampliar os direitos do povo e diminuir os
direitos dos entes estatais. Assim, a Constituição de 1988 estabeleceu
nos seus arts. 2º, 5º e por todo o texto constitucional, direitos funda-
mentais.

Esses direitos têm como principal objeto a existência digna do


indivíduo, dentro da sociedade em que está inserido e derivam do prin-
cípio da dignidade da pessoa humana, e devem ser garantidos a todos
os seres humanos, independentemente da vontade estatal. O Estado
é obrigado, em sua razão de ser, a proteger o cidadão e a dá-lo os re-
quisitos mínimos para uma vida digna.

Os direitos fundamentais encontram-se em todo o texto consti-


tucional e estão divididos em temas, são eles:
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• Direitos individuais e coletivos - art. 5º, CF;

• Direitos sociais (art. 6º a 11, CF);

• Direitos de nacionalidade (arts. 12 e 13, CF);

• Direitos políticos (arts. 14 a 17, CF).

O título II da Constituição é aquele que trata (e denomina-se)


“Dos Direitos e das Garantias Fundamentais” e, logo abaixo, encon-
tram-se expressos os cinco direitos fundamentais fundantes deste Es-
tado, são eles:

1. O direito à vida;

2. O direito à liberdade;

3. O direito à igualdade;

4. O direito à segurança;

5. O direito à propriedade.

O direito à vida, assegura que o indivíduo não somente tenha


o direito de viver mas também, que o Estado deve garantir que essa
existência seja digna, do ponto de vista de sua integridade física e mo-
ral. Desse modo, a coação e a tortura, por exemplo, são atos que vio-
lam a Constituição em seu âmago, e por isso, são vedadas pelo texto
constitucional.

O direito à igualdade, assegura que todos os cidadãos - inde-


pendente de gênero, raça, etnia, crença religiosa, etc - sejam tratados
de forma diversa, seja na vida cotidiana ou no acesso aos entes esta-
tais. Além disso, esse direito também toca a questão da desigualdade
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social, que deve ser combatida pelos entes, ainda que estes tenham
que garantir o acesso básico dos cidadãos a esses bens e condições.

O direito à segurança é aquele que temos maior contato apa-


rente no dia a dia. Isso porque, cabe exclusivamente ao Estado, preve-
nir e coibir que os cidadãos estejam agindo de acordo com a lei e, caso
isso não ocorra, o Estado possui o monopólio da força e, assim, pode
e deve coibir as ações que não estejam de acordo com as normas
constitucionais (e infraconstitucionais). Além disso, esse artigo tam-
bém estabelece que nenhum sujeito pode ser imputado por um crime
não previsto pela lei e, também, tem direito a um julgamento justo, nos
termos da legalidade.

O direito a propriedade é um dos direitos mais relevantes e um


dos que mais originou dispositivos infraconstitucionais para regular o
tema, e, também, assegura que alguns bens e propriedades devem se
destinar a uma função social, ou seja, que não devem servir somente
para a exploração e acumulação de riquezas por parte daqueles que
possuem mais bens que os demais cidadãos. Isso porque, segundo a
Constituição, todos devem ter garantido seu direito à moradia.

• Ainda, esses direitos são:

• Universais: alcançam à todos, sem distinção;

• Imprescritíveis: não possuem prazo para o seu exercício;

• Inalienáveis: nem o cidadão, nem o Estado, tem capacidade


de alterá-los, suprimi-los ou negociá-los;

• Relativos: devem ser ponderados em relação a outros direitos


constitucionais;
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• Complementares: os direitos fundamentais devem ser inter-


pretados de forma que um complemente o outro e sua aplica-
ção se dê em conjunto, considerando as normas como conjun-
to e não isoladamente.

• Irrenunciáveis: Nenhuma pessoa pode, ainda que por vonta-


de própria, abrir mão desses direitos.

• Históricos: esses direitos são fruto de um processo histórico


e acompanham esse processo, assim, devem ser adaptados
às evoluções da sociedade.

Conforme supracitado, os direitos fundamentais devem sempre


ser ponderados entre si, de acordo com o caso concreto. A compe-
tência para analisar e julgar quaisquer conflitos constitucionais é do
Supremo Tribunal Federal, responsável por ser o “Guardião” da Cons-
tituição, cujo seus magistrados devem sempre preservar seu conteú-
do formal e material - a vontade do povo expressa na Constituição -.
Com relação aos direitos fundamentais em sentido formal, a doutrina
entende, de modo geral, que são aqueles direitos positivados em âm-
bito constitucional. Ou seja, são posições jurídicas subjetivas a serem
protegidas constitucionalmente, pelo simples fato de estarem inscritas
no texto constitucional. Assim, constituem direitos formais por terem
recebido tratamento diferenciado pelo Poder Constituinte que lhes
conferiu o status constitucional, de modo que seja garantido a esses
direitos a imutabilidade ou, ao menos, uma mudança dificultada. Neste
sentido, leciona Sarlet:

De modo geral, os direitos fundamentais em sentido formal


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podem, na esteira de Konrad Hesse, ser definidos como


aquelas posições jurídicas da pessoa – na sua dimensão
individual, coletiva ou social – que, por decisão expressa
do Legislador-Constituinte foram consagradas no catálogo
dos direitos fundamentais.

À exemplo, a Constituição Brasileira de 1988 elenca, em seu Tí-


tulo II, um rol de direitos fundamentais que são identificados como tal
pelo simples fato de integrarem o texto constitucional, que divide-os
em 5 capítulos, quais sejam: I - Dos Direitos e Deveres Individuais e
Coletivos; II - Dos Direitos Sociais; III - Da Nacionalidade; IV - Dos Di-
reitos Políticos e V - Dos Partidos Políticos. Ademais, a maior parte da
doutrina entende que tal conceito seja unânime.

Por outro lado, quanto à questão material, existem algumas di-


vergências conceituais que não serão objeto de análise nesta aula.
Isso porque, a Constituição ao tratar dos direitos fundamentais es-
clarece expressamente que determinados direitos são considerados
fundamentais tendo em vista sua importância para a consagração da
dignidade humana. Desse modo, para parte da doutrina abre-se uma
brecha para que outros direitos, para além dos que já encontram-se
positivados no texto constitucional, possam ser igualmente considera-
dos, em razão de sua igual relevância.

A garantia desses direitos, portanto, visa diminuir as mazelas so-


ciais e constituir um rumo de desenvolvimento do Estado. Isso porque,
esses direitos protegem não somente o cidadão como indivíduo como,
também, a sociedade como um todo. Logo, o Estado deve garantir es-
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ses direitos, não somente em relação a, mas, também, frente ao Poder


Público.

É importante ressaltar que esses direitos são fruto de uma forte


e contínua influência do cidadão ao longo do processo histórico. As-
sim, foram as reivindicações sociais e noções gerais do que era essen-
cial para uma vida digna que originaram esses direitos. Desta forma,
é possível afirmar que esses direitos não se limitam às garantias já
previstas pela nossa Constituição, mas sim, constituem um processo
ainda em andamento cujo atende a Justiça Social e assim, pode gerar
no reconhecimento de novos direitos fundamentais.

Para garantir que todos os dispositivos da Constituição sejam


cumpridos e, ainda, para que o próprio ordenamento jurídico obtenha
segurança, o legislador criou mecanismos de controle de constitu-
cionalidade, que serão aplicados caso alguma norma inconstitucional
(formal ou materialmente) venha a ser violada ou haja pretensão para
tanto, conforme veremos na aula a seguir.

2. Considerações finais
A Constituição de 1988 foi emblemática ao ampliar o rol de direi-
tos fundamentais e compreender (e assegurar) que os direitos funda-
mentais do homem são os mais importantes para o desenvolvimento e
manutenção do Estado Democrático de Direito, aquele que assegura
que um país seja justo para todos, sua preocupação com a cidadania
e as garantias de participação popular plena para todos os cidadãos e
indivíduos desde solo.
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3. Referências
ALVES, Ítalo Miqueias da Silva. “A História das Constituições Bra-
sileiras: As evoluções Constitucionais do Brasil”; Jus Navigandi. Dispo-
nível em: https://jus.com.br/artigos/61157/a-historia-das-constituico-
es-brasileiras. Acesso em 10 de agosto de 2022

BONAVIDES, Paulo. Curso de Direito Constitucional. 15ª edição.


Salvador: Juspodivm, 2004.

CANOTILHO, J. J. Gomes. Direito Constitucional e Teoria da Cons-


tituição. 6ª Edição. Coimbra: Almedina, 2003.

SARLET, Ingo Wolfgang. A Eficácia dos Direitos Fundamentais.


11ª edição. Porto Alegre: Editora Livraria do Advogado, 2012.

SILVA, Daniel Neves. "Constituição de 1988"; Brasil Escola. Dispo-


nível em: https://brasilescola.uol.com.br/historiab/constituicao-1988.
htm. Acesso em 10 de agosto de 2022.

SILVA, José Afonso da. Curso de direito constitucional positivo.


42 ed. São Paulo: Malheiros, 2019.

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