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ISSN 1806-9312
Autor(es):
Rita C. C. G. Mendes*,
Marcos Mocellin**,
A Acuidade Auditiva na Insuficiência. Renal
Fabiano B. Gavazoni***,
Crônica.
Guilherme L. Trevizan****,
Frida Block*****,
Gislaine R. M. Wiemes*****.
Resumo: Introdução: O conceito de que as células do ouvido interno são suscetíveis a diversos distúrbios
metabólicos e hormonais é assunto bastante estudado. Entretanto, a associação entre perda auditiva
neurossensorial e insuficiência renal crônica permanece controversa na literatura mundial. Objetivos: Os
objetivos deste trabalho foram verificar a presença de perda auditiva neurossensorial em indivíduos com
insuficiência renal crônica com e sem tratamento hemodialítico, comparando com um grupo controle, e
pesquisar a associação de tais condições na gênese do comprometimento auditivo. Material e métodos:
Foram estudados dezesseis indivíduos com insuficiência renal crônica (IRC) sem tratamento
hemodialítico, dezessete com IRC em hemodiálise e dezesseis controles. Excluíram-se outras causas de
perdas auditivas neurossensoriais. Os pacientes foram estudados através de exame clínico minucioso,
audiometria tonal limiar e imitância acústica. Resultados: A acuidade auditiva de pacientes com
insuficiência renal crônica mostrou-se estatisticamente diferente dos controles, notadamente nas
freqüências de 4, 6 e 8 KHz. Em todas freqüências estudadas, a hemodiálise não foi estatisticamente
significativa na determinação do aumento dos limiares auditivos. Conclusão: Concluiu-se existir
associação direta entre insuficiência renal crônica e perdas auditivas neurossensoriais, principalmente nas
freqüências agudas. A hemodiálise não foi um fator gerador de perda auditiva neurossensorial em
pacientes com insuficiência renal crônica.
Abstract: Introduction: The concept that inner ear cells are sensitive to several metabolic and hormonal
disorders is a well studied issue. But, the relationship between chronic renal failure and sensorineural
hearing loss is still a debatable issue by the scientific community. Purpose: The goals of this paper were
to verify the presence of sensorineural hearing loss in either in haemodialysis chronic renal failure people
or still out of haemodialysis ones and compare their results to normal controls. Material and methods:
Therefore we studied the genesis of chronic renal failure in hearing impairment. Sixteen chronic renal
failure, seventeen in haemodialysis chronic renal failure individuals and sixteen controls were studied by
judicious clinical exam, pure tone and impedance audiometry. Results: The hearing acuity in the chronic
renal failure groups showed impaired results when compared to normal individuals, mainly in 4,6 and 8
KHz. The haemodialysis was not statistic significant in the genesis of hearing impairment. Conclusion: We
concluded that there was a direct relationship between chronic renal failure and sensorineural hearing
loss, mainly in high frequencies. We also concluded that haemodialysis was not a causative agent of
hearing loss in chronic renal failure individuals.
INTRODUÇÃO
A insuficiência renal crônica (IRC) é uma síndrome decorrente de diversas etiologias, como doenças renais
intersticiais, glomerulares, hereditárias, obstrutivas e vasculares2. As principais doenças associadas à IRC
são a hipertensão arterial sistêmica, o diabetes melito e as glomerulonefrites3.
A IRC tem evolução progressiva e insidiosa, dividida em quatro estágios2, reserva renal diminuída (taxa de
filtração glomerular em cerca de 50% do normal), insuficiência renal (filtração de 20 a 50% do normal),
falência renal (filtração menor que 25% do normal) e doença renal terminal (filtração menor que 5% do
normal).
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É bastante conhecido o fato de a cóclea ser extremamente suscetível1 aos mais variados desequilíbrios
metabólicos, hidroeletrolíticos e hormonais, os quais são alterações sistêmicas sem dúvida encontradas em
indivíduos com a função renal comprometida. Assim, é plausível que indivíduos com IRC desenvolvam
disfunção coclear, que poderia se manifestar clinicamente por perda auditiva neurossensorial.
Hutchinson10 observou, em seu estudo, a existência de relação direta entre a IRC e a perda auditiva
neurossensorial.
Oda15 descreveu alterações histológicas em ossos temporais de pacientes renais em hemodiálise e/ou
pós-transplante7, sugerindo lesão das células cocleares do órgão de Corti.
Hutchinson10 encontrou alta prevalência de perda auditiva neurossensorial nas freqüências agudas a
audiometria tonal limiar de pacientes com IRC. Entretanto, não observou alterações no índice de
reconhecimento da fala10. Já, Isselbacher11, Kligerman12 e Mancini13 relataram perdas auditivas com
repercussão clínica importante.
Nikopoulos14, Oda15 e Shvili16 observaram alterações nos potenciais evocados do tronco cerebral em
pacientes renais crônicos, como aumento das latências das ondas III e V, sugerindo a existência de lesões
neurais, além das sensoriais (neuropatia urêmica).
Todavia, a relação direta entre IRC e perda auditiva neurossensorial não é considerada verdadeira de
forma unânime na literatura mundial. Alguns autores como Mancini13 e Gafter6 discordam de que a IRC
seja realmente um fator etiológico de perda auditiva neurossensorial.
MATERIAL E MÉTODO
Foram excluídos os indivíduos que apresentaram: história de perda auditiva prévia à IRC, risco para
doença otológica ocupacional (exposição a ruídos e solventes), diabetes melito ou outras doenças
metabólicas, síndrome de Alport ou história familiar de baixa acuidade auditiva primária, doença do ouvido
externo ou médio ao exame físico, intervalo aeroósseo entre as curvas audiométricas, timpanograma B ou
C7, 7, 10, 13. Excluíram-se, ainda, os pacientes que haviam usado antibiótico aminoglicosídeo por mais de
sete dias ou que estivessem- usando furosemida em dose superior a 1mg/kg/dia13.
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e pesquisa dos reflexos acústicos, tendo sido realizada em todos pacientes. Este exame foi realizado com o
propósito de afastar doenças do ouvido médio em estágio subclínico e observar a presença ou não de
recrutamento, que é sabidamente indicativo de cortipatia.
A análise estatística compreendeu o estudo das diferenças das médias dos limiares de audibilidade mínima
dos diversos grupos, através do teste t de Student. O estudo foi desenvolvido com um intervalo de
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confiança de 95%.
Este estudo foi avaliado e aprovado pelo Comitê de Ética em Pesquisa em Seres Humanos do Hospital de
Clínicas da Universidade Federal do Paraná.
RESULTADOS
A média das idades dos pacientes do grupo A foi de 33,69 ± 10,45 anos; do grupo B foi de 36,65 ± 10,63
anos; e do grupo controle, C, foi de 44,94 ± 11,72 anos. Estes resultados não foram estatisticamente
diferentes. As médias dos clearance de creatinina foram: 32,64 ± 13,64; 14,59 ±11,58; e 117,94 ± 13,23
- respectivamente.
As médias dos limiares de audibilidade mínima em 0,5, 1 e 2 KHz foram 15,9; 15 e 9,9 (no ouvido direito)
e 12,09; 14,71; e 8,43 (no ouvido esquerdo) - respectivamente. Estes resultados não apresentaram
diferença estatística.
As médias dos limiares auditivos em 4 KHz foram de 19,37; 23,23 e 5,31 (no ouvido direito) e 17,19,
22,05 e 3,75 (no ouvido esquerdo) - para os grupos A, B e C, respectivamente. Observou-se diferença
estatística na comparação do grupo controle e grupos de estudo, mas não entre os grupos de estudo entre
si. Estes resultados foram bastante semelhantes aos obtidos na freqüência de 6 KHz, como pode ser
observado nos gráficos apresentados.
As médias dos limiares auditivos em 8 KHz foram de 16,9, 25,88 e 8,12 (no ouvido direito) e de 24,06;
24,12 e 9, 35 (no ouvido esquerdo)- para os grupos A, B e C, respectivamente.
Para o ouvido direito, obteve-se diferença entre o grupo controle e o grupo B, mas não entre o grupo
controle e o grupo A. Já à esquerda, observou-se diferença estatisticamente significativa entre o grupo
controle, C, e os grupos de estudo (A e B), mas não entre os grupos de estudo entre si.
DISCUSSÃO
Analisando-se apenas as freqüências graves (0,5, 1 e 2 KHz), não se observa déficit auditivo
neurossensorial em pacientes com insuficiência renal crônica, quer seja em tratamento hemodialítico ou
não.
Entretanto, nas freqüências de 4, 6 e 8 KHz, a acuidade auditiva dos pacientes renais mostrou-se
estatisticamente diferente do grupo controle, com pequenas perdas auditivas neurossensoriais. Nestas
freqüências, o resultado foi bem semelhante aos observados por Kligerman e colaboradores12, que
encontraram grande incidência de perdas auditivas nas freqüências agudas. Gatland7 e Nikolopoulos14
obtiveram resultados que mostraram déficits auditivos neurossensoriais com repercussão clínica
importante. Já Facharzt4 encontrou perdas neurossensoriais consideráveis, mas reversíveis após correção
da anemia (própria da IRC) com o uso de eritropoetina na dose de 120U/kg por semana, por cerca de seis
meses.
A literatura refere que cerca de 80% dos casos de perda auditiva neurossensorial em pacientes com
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insuficiência renal crônica seriam devidos a causas que já sabidamente levam a perdas deste tipo, como
uso de aminoglicosídeos ou exposição ocupacional a ruídos10, 13. Os 20% restantes seriam diretamente
devidos à IRC. Entretanto, por ser condição clínica complexa, que demanda o uso de várias drogas, que
têm múltiplas etiologias e atingem sobremaneira idosos, torna-se difícil o estudo da sua correlação com a
acuidade auditiva. Daí surgem as numerosas controvérsias sobre este assunto.
Pelos resultados obtidos, sugere-se a existência de relação direta da IRC como causa de perda auditiva
neurossensorial, notadamente nas freqüências agudas.
Considerando a inexistência de diferença significativa entre o grupo com IRC em tratamento conservador e
aquele em tratamento hemodialítico, pode se afirmar que tal terapêutica não se relaciona à perda auditiva,
o que também é sustentado por outros trabalhos citados.
Na verdade, a hemodiálise, por corrigir grande parte dos distúrbios hidroeletrolíticos e metabólicos, tende
a diminuir os riscos para a ocorrência de perdas auditivas, já que promove a estabilização e correção das
alterações metabólicas ocasionadas pela doença renal crônica. Desta forma, o tratamento correto da IRC
deve ser instituído o mais precocemente possível, evitando lesões ao organismo, inclusive à cóclea e vias
auditivas.
CONCLUSÕES
Os limiares de audibilidade mínima foram piores nos pacientes com insuficiência renal crônica,
notadamente nas freqüências agudas.
A hemodiálise não é fator gerador de perda auditiva neurossensorial em pacientes renais crônicos sob
tratamento dialítico.
Observou-se relação direta entre insuficiência renal crônica e perdas auditivas neurossensoriais em
freqüências agudas.
O exame audiométrico revelou-se fidedigno no diagnóstico de doença auditiva nos indivíduos portadores
de IRC.
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