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ISSN: 1645-7250
revista.lusofona@gmail.com
Universidade Lusófona de Humanidades e
Tecnologias
Portugal
Cabral, Arlinda
Reseña de "Pedagogia do Oprimido" de Paulo Freire
Revista Lusófona de Educação, núm. 5, 2005, pp. 200-204
Universidade Lusófona de Humanidades e Tecnologias
Lisboa, Portugal
homens são seres da procura e a sua vo- cando, dialógico, problematizador, não
cação ontológica é humanizarem-se. é uma doação mas uma devolução or-
Segundo Paulo Freire, os homens edu- ganizada, sistematizada e acrescentada
cam-se entre si mediatizados pelo mun- ao povo dos elementos que entregou de
do, pela educação problematizadora que forma desestruturada. A educação au-
exige a superação da contradição edu- têntica, nas palavras do autor, faz-se de
cador-educando e o diálogo, e em que «A com B, mediatizados pelo mundo»
ambos se tornam sujeitos do processo e (p. 84), incidindo a sua acção na reali-
crescem juntos em liberdade, procuran- dade a ser transformada com os homens,
do o conhecimento verdadeiro e a cul- conhecendo as condições estruturais em
tura pela «emersão» (p. 70) das cons- que o pensar e a linguagem do povo dia-
ciências para uma inserção crítica na lecticamente se constituem.
realidade. O autor chama a atenção para A investigação temática implica uma
que em nenhum propósito, mesmo na li- observação simpática, atitudes compre-
derança revolucionária, o homem aliene ensivas e uma percepção crítica da reali-
os outros nas suas decisões mas sim que dade do povo, constituída pelo seu con-
os incentive à luta pela sua emancipa- junto de dúvidas, anseios e esperanças,
ção no mundo. por parte do educador para que expresse
No capítulo 3, o autor aborda a ques- uma acção cultural, procurando os in-
tão da dialogicidade enquanto essência vestigadores como objectivo da edu-
da educação como prática da liberdade. cação problematizadora centrarem-se
O diálogo assente na palavra é visto na consciência máxima possível e não
como fenómeno humano, pois segundo na consciência real. O programa tem
Paulo Freire não há palavra verdadei- de sair do povo e o tema central deve
ra que não seja práxis, enquanto acto ser o conceito antropológico de cultura
de criação que procura a conquista do descoberto numa visão crescentemente
mundo para a libertação dos homens. crítica.
Na perspectiva de Paulo Freire só O capítulo 4, centra-se nas teorias da
há diálogo com um profundo amor ao acção antidialógica e nas teorias da ac-
mundo e aos homens, com humilda- ção dialógica. O autor começa por rea-
de sincera e mediante a fé no poder de firmar que os homens são seres da práxis
criar do homem, sendo assim um acto e que emergem do mundo objectivando-
de criação e recriação, de coragem e de o, podendo conhecê-lo e transformá-lo
compromisso e de valentia e liberdade. com o seu trabalho. O diálogo com os
Assim, o diálogo faz-se numa relação oprimidos é um compromisso para a li-
horizontal baseada na confiança entre bertação que implica a transformação da
os sujeitos e na esperança transformada realidade, porque os homens são comu-
na concretização de uma procura eterna nicação e diálogo enquanto análise crí-
fundamentada no pensamento crítico. O tico-reflexiva sobre a realidade. Afirma
diálogo começa na busca do conteúdo Paulo Freire que evitar o diálogo é temer
programático que para o educador-edu- a liberdade e não crer no povo, pelo que
chama a atenção para que as lideranças e com ela para a libertação, visto que a
revolucionárias não se deixem arrastar acção unificadora é indispensável à prá-
para posturas características das classes tica libertadora.
dominadoras, como a absolutização da A manipulação é referida pelo autor
ignorância, a descrença no homem e a como outro instrumento de manutenção
impossibilidade do diálogo. da opressão que leva à massificação,
Neste capítulo o autor começa por re- que anestesia as massas para não pen-
ferir as características da teoria da ac- sarem, pois ao pensarem ganham «cons-
ção antidialógica, que são a conquista, ciência revolucionária ou consciência
a divisão do povo, a manipulação e a de classe» (p. 146) que gera a procura
invasão cultural. O segundo tema em incessante pela libertação. Sobre a or-
destaque refere-se às características da ganização, em oposição à manipulação,
teoria da acção dialógica, que são a co- o autor refere que, ao procurar a unida-
laboração, a união, a organização e a de, a liderança já se encontra a efectu-
síntese cultural. ar a organização das massas populares.
A conquista, que implica um sujeito e Segundo Paulo Freire, a organização é
um objecto conquistado, impõe o anti- um momento altamente pedagógico em
diálogo para oprimir económica e cul- que a liderança e o povo fazem juntos o
turalmente para manter a opressão. A aprendizado da autoridade e da liberda-
co-laboração é referida por Paulo Freire de verdadeiras que ambos como um só
em oposição à conquista, visto que os procuram instaurar com a transforma-
sujeitos encontram-se para a transfor- ção da realidade que os mediatiza.
mação do mundo juntos através do diá- A invasão cultural, caracterizada por
logo que funda a comunicação, nomea- manipulação de conquista, é também
damente através da problematização da uma acção antidialógica, alienante e
sua própria opressão. O autor chama a uma forma de dominar cultural e eco-
atenção para o facto de a liderança revo- nomicamente, procurando incutir a in-
lucionária estar comprometida com uma ferioridade intrínseca nos invadidos.
comunhão com o povo que provoca a Sobre a síntese cultural, em oposição à
«co-laboração» (p. 165), denominando invasão cultural, o autor refere que toda
Paulo Freire esta revolução de biófila na a acção cultural é uma forma sistemati-
medida em que é criadora de vida. zada e deliberada de acção que incide
Dividir para manter a opressão é ou- sobre a estrutura social para mantê-la
tro instrumento das elites opressoras, ou transformá-la, constituindo-se na
que recorrem a formas focalistas de ac- dialeticidade «permanência-mudança»
ção que dificultam a percepção crítica (p. 179).
da realidade, procurando manter o seu Em conclusão, esta obra de Paulo
status quo. Na união para a libertação, Freire é um trabalho de conscientiza-
em oposição ao dividir para manter a ção, recomendado a todos os homens e
opressão, a liderança deve obrigar-se à mulheres que se preocupam com a sua
procura da união dos oprimidos entre si existência, e a todos os educadores em
Arlinda Cabral