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ESCOLA SUPERIOR DE PROPAGANDA E MARKETING – ESPM/RJ

MESTRADO PROFISSIONAL EM GESTÃO DA ECONOMIA CRIATIVA

MAURÍCIO VIDAL SILVA DE ANDRADE

ACTING DO PERSONAGEM EM ANIMAÇÃO E


O PROCESSO DE PRODUÇÃO

RIO DE JANEIRO
2017

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2
MAURÍCIO VIDAL SILVA DE ANDRADE

ACTING DO PERSONAGEM EM ANIMAÇÃO E


O PROCESSO DE PRODUÇÃO

Dissertação apresentada como


requisito parcial para obtenção do
título de Mestre em Gestão da
Economia Criativa pela Escola
Superior de Propaganda e Marketing
– ESPM.

Orientador: Prof. Dr.


Leonardo Marques de Abreu

RIO DE JANEIRO
2017

3
Maurício Vidal Silva de Andrade
Formado em arquitetura pela UFRJ em 1993, no mesmo ano iniciou sua carreira em
computação gráfica em maquete eletrônica no mercado carioca e, posteriormente,
na TV Globo. Desde 1996, trabalha no campo acadêmico do ensino superior,
começando como professor na UFRJ. Em 1999, foi um dos fundadores do Estúdio
Conseqüência de Animação, onde segue dirigindo e animando filmes autorais e
comerciais. Alguns dos filmes que dirigiu foram premiados em festivais, como
Festival Anima Mundi, Festival de Cinema de Havana, VMB/MTV, Prêmio
Multishow, tendo uma indicação ao Grammy Latino na categoria Melhor Videoclipe
de Animação. Faz parte do júri profissional do Festival Anima Mundi desde 2005,
mesma época em que começou a lecionar na graduação em design de animação
da ESPM/RJ.

4
Para Marcia,
João Antônio e Gabriela,
Léo e Nylda.

5
AGRADECIMENTOS

Ao meu orientador Leonardo Marques pelo conhecimento partilhado,


profissionalismo, incentivo, paciência e confiança durante a produção deste
trabalho.

Aos coordenadores da ESPM que estiveram envolvidos direta ou indiretamente


neste trabalho e me apoiaram no decorrer deste programa de mestrado.

À equipe de professores do programa de mestrado da ESPM, que


compartilharam seus conhecimentos com entusiasmo com todos os alunos.

À Eliana Formiga, Marcos Magalhães e Carlos Saldanha, pelas primeiras


palavras de incentivo quando decidi participar deste projeto de pesquisa e por
toda a atenção e carinho.

Ao mestre Cesar Coelho, pelo incentivo e empolgação de sempre.

Aos diretores do Festival Anima Mundi, que há muitos anos me proporcionam


adquirir conhecimento através das palestras, oficinas e sessões de filmes do
festival. O trabalho de vocês é muito importante para muita gente.

Aos animadores que participaram das entrevistas concedendo depoimentos


autênticos e enriquecedores para este projeto. Tenho grande carinho e
admiração por cada um de vocês.

Aos amigos Péricles Carvalho de Barros e Marcelo Marão pela atenção na leitura
e sugestões em trechos do projeto.

Aos meus irmãos, Gustavo e Marcelo, pela força de sempre.

Aos meus amigos, que falaram para eu aprender logo...

6
“Quando a pessoa está efetivamente criando, inventando,
se expressando, sendo autoral no acting, inventando
soluções que têm a ver com a própria personalidade e com
a personalidade daquele personagem que ela tá animando,
tudo se torna mais honesto, autêntico, verdadeiro”.

Marão

7
RESUMO

O presente estudo tem como proposta uma investigação no campo da utilização


das técnicas de acting de artes cênicas na criação de cenas de animação em
produções para cinema, televisão ou novas mídias. Após o surgimento da 2ª Era
de Ouro da Animação, em meados dos anos 1990, com o lançamento do filme
“Toy Story”, a técnica de animação digital passou a ganhar espaço nas
produções e efeitos do cinema. O desenvolvimento da utilização dessa técnica
ocorreu durante a mesma época em que a internet se estabeleceu como meio
de comunicação para todas as parcelas da sociedade. Através de vídeos e
treinamentos on-line, bem como nos extras de filmes animados, percebe-se um
crescimento na discussão e utilização de técnicas de acting como parte
integrante do processo de produção para animação, mesmo tendo os princípios
da animação tradicional por trás do sucesso dos filmes de animação digital. A
metodologia de análise qualitativa utilizada foi a técnica de Análise do Conteúdo,
seguindo o modelo de Laurence Bardin (1988), que permite a inferência (deduzir
de maneira lógica) de conhecimento sobre o emissor ou sobre o destinatário da
comunicação. O corpus da pesquisa foi composto por experientes e premiados
animadores brasileiros. Procuramos apresentar um panorama do processo de
produção de animação para ilustrar com mais clareza as questões voltadas para
a inserção do acting em animação e as reflexões que possam ser geradas.

Palavras-chave: Animação. Acting. Produção de animação.

8
ABSTRACT

The present study aims to investigate the use of acting techniques, from the
performing arts, in the creation of animated scenes in productions for cinema,
television or new media. After the rise of Animation’s 2nd Golgen Age, in the mid-
1990s, with the release of ‘Toy Story’ movie, the digital animation technique came
to gain space in movies productions and visual effects. The development of the
use of this technique occurred as the internet was established as a media for the
whole society. Through online videos and trainings, as well as animated movie
extras, there is a growing discussion and use of acting techniques as part of the
production process for animation, even though the principles of traditional
animation remain behind the success of digital animation movies. The qualitative
methodology used was the Content Analysis technique, following the model of
Laurence Bardin (1988) that allows the inference of knowledge about the sender
or the recipient of the communication. The corpus of the research was composed
by experienced and award-winning Brazilian animators. We propose an overview
of the animation production process to more clearly illustrate the issues related
to the insertion of acting in animation and the reflections that can be generated.

Keywords: Animation. Acting. Producing animation.

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10
SUMÁRIO

1. Introdução 13

2. Panorama da animação 27
2.1. A Nova Era de Ouro da Animação 32
2.2. Economia Criativa 45
2.3. Mercado da animação 51
2.4. Inovação em modelo de negócio 63

3. Acting e produção em animação 70


3.1. Processo de produção 70
3.2. Acting em animação 90

4. Métodos e técnicas 102


4.1. Metodologia 104
4.2. Análise dos resultados 108

5. Conclusões e achados da pesquisa 112

6. Considerações finais 114

7. Referências 115

8. Apêndice 120

11
12
1. Introdução

A motivação para propor o presente projeto de pesquisa surgiu em função do


interesse do autor em processos criativos de técnicas de acting1 na animação de
personagens, visando a ampliar a utilização destes conhecimentos na orientação
das equipes de animadores, durante a direção de filmes autorais e comerciais,
e dos estudantes de design de animação de uma forma mais didática. Pretende-
se investigar o quanto a utilização das técnicas de atuação do teatro pode
contribuir como um diferencial artístico e metodológico, visando a uma melhoria
de qualidade das cenas animadas.

Animar2 é dar vida a formas em movimento e criar atuação para personagens de


filmes de ficção. Esta definição é o resultado do processo criativo e produtivo
utilizado na produção de filmes animados. Assim como ocorre em outros
segmentos, tais processos poderiam ser abordados na literatura em maior
quantidade e mais especificamente voltados para as técnicas de acting, no intuito
de ajudar animadores que já exercem o ofício a compreender o que pode ser
desenvolvido, bem como para elevar o nível dos futuros animadores.

Animação não é a arte dos desenhos que se movem, mas a arte dos
movimentos que são desenhados. (MCLAREN, in CHONG, 2011, p.
103)

Percebe-se que, no país, existe uma dificuldade de produtores e diretores de


filmes em live-action3 em compreenderem como deve ser realizada uma etapa
de animação quando esta se faz necessária em suas produções. Isso se dá
possivelmente pela falta de conhecimento de como ocorre este processo,
impedindo-os de desenvolver uma metodologia de trabalho para controlar a
criação, produção e orçamento das cenas animadas em suas séries e filmes.

1
Acting (em português, atuação) é a atividade desenvolvida por um ator ou atriz de teatro,
cinema, televisão ou outro meio de comunicação, através de técnicas específicas de atuação,
com a finalidade imprimir vida e realidade a um personagem.
2
Animar vem do latim “animare”, que significa “dar vida”. Animar, através do cinema ou de outros
artifícios óticos ou eletrônicos, é conferir a ilusão do movimento a desenhos, objetos inanimados
ou modelos virtuais. (MAGALHÃES, 2004, p. 23).
3
Cinema com atores. Ação nos filmes em que são filmados pessoas ou animais reais, em
oposição à animação ou aos efeitos gerados por computador. (CHONG, 2011, 100).

13
O mesmo se aplica aos diversos profissionais da academia. Percebe-se que os
professores podem carecer de uma metodologia de acting e de produção de
animação mais clara e eficiente para aplicar junto ao corpo discente. Pretende-
se que as reflexões levantadas nesta dissertação (i) possam auxiliar a cadeia
produtiva do audiovisual na interlocução entre animadores, diretores de
animação e produtores de live-action no país e (ii) possibilitem um maior
alinhamento de conhecimento técnico e executivo sobre produções em
animação.

Após trabalhar inicialmente com maquetes artesanais na segunda metade da


década de 1980, a trajetória profissional do pesquisador se voltou para a
computação gráfica tridimensional (3D), a partir da entrada dos computadores
pessoais nas universidades e escritórios de arquitetura do país, ao mesmo
tempo em que cursava a graduação da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo
da Universidade Federal do Rio de Janeiro.

Seus primeiros experimentos com animação em maquete eletrônica em um


ambiente 3D vieram logo em seguida com alguns movimentos de câmera e de
objetos na representação de projetos de arquitetura e animação de marcas
corporativas. Na época, tais representações eram consideradas como algo
avançado e inovador para todos, assim como para os que davam esses
primeiros passos.

O campo que se abria com a utilização da computação gráfica era promissor.


Durante a faculdade que cursava, houve uma aula inaugural na qual Luiz Paulo
Conde4, na época diretor do curso de arquitetura e um dos principais arquitetos
do Brasil, relatou que poderia destacar três pontos importantes na evolução dos
estudos da arquitetura: o primeiro, as teorias de Vitrúvio5; o segundo

4
Luiz Paulo Conde (1934-2015) foi um renomado arquiteto brasileiro. Em duas oportunidades
Conde foi presidente do IAB – Instituto de Arquitetos do Brasil, tendo sido também diretor da
Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Rio de Janeiro, centro
acadêmico no qual lecionava. No campo da política, foi prefeito da cidade do Rio de Janeiro entre
1997 e 2001.
5
As teorias de Vitrúvio se referem ao entendimento das dimensões e proporções das várias
partes do corpo humano e seu bom uso nos espaços projetados, criadas no Século I A. C. Tais
teorias ganharam grande importância no Renascimento, influenciando artistas como Leonardo
Da Vinci em seus desenhos no trabalho intitulado “O Homem de Vitrúvio”.

14
(possivelmente) seria a invenção do concreto armado; e, por fim, o arquiteto citou
o advento da computação gráfica, tamanha a gama de possibilidades que se
abriam para estudos e projetos com essa ferramenta.

Os primeiros passos profissionais como artista 3D vieram em 1992. Desde então,


o autor desse projeto atua em produções de animação, em sua grande maioria
com a técnica 3D. Neste mesmo ano, iniciou a carreira docente em cursos livres
em escritórios de arquitetura e, a partir de 1996, no meio universitário, como
professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Nesta instituição, atuou
como pesquisador, primeiramente como aluno, e, em seguida, como arquiteto
formado, sempre na área de computação gráfica. Em 2005, passou a fazer parte
do corpo docente da Faculdade de Design da Escola Superior de Propaganda e
Marketing do Rio de Janeiro, onde permanece até os dias atuais.

Em 1996, então na sua quarta edição, o Festival Anima Mundi6 começou a fazer
parte da formação profissional do pesquisador. Naquele ano, ele foi selecionado
para participar de um ciclo de palestras ministradas pelo diretor de animação
Carlos Saldanha7, até então desconhecido do público brasileiro. Neste evento,
Saldanha realizou suas primeiras participações neste festival e em eventos pelo
país. O trabalho em computação gráfica utilizando os princípios básicos da
animação tradicional era o ponto de partida dos projetos realizados e partilhados
por Saldanha.

6
Anima Mundi, Festival Internacional de Cinema de Animação, é o principal festival de animação
da América Latina, realizado nas cidades do Rio de Janeiro e de São Paulo.
7
Carlos Saldanha é diretor de cinema e animador brasileiro. Saldanha foi o co-diretor de A Era
do Gelo (2002) e Robôs (2005) e o diretor de A Era do Gelo 2 (2006), A Era do Gelo 3 (2009),
Rio (2011) e Rio 2 (2014), estes dois últimos incluídos nos filmes de maior bilheteria de todos os
tempos. O animador cursou Mestrado em Artes e se especializou em animação digital na School
of Visual Arts, em Nova York.

15
Jornal O Globo, julho de 1996. Acervo do autor.

As lições aprendidas foram de grande valor, levando o conhecimento do


pesquisador a outro patamar de interesse pela computação gráfica: o cinema de
animação e a atuação de personagens em 3D. Esta passagem acabou por
mudar o rumo da sua carreira profissional para algo que considerou mais
interessante, rico, completo e, ao mesmo tempo, mais complexo e desafiador em
relação ao que praticava anteriormente.

Em paralelo, na mesma década, houve a popularização da microinformática


trazendo para os usuários uma falsa ideia de que a animação em computação
gráfica simplesmente “ficava pronta” quando produzida com auxílio de softwares.
O fato de os resultados serem frutos de processo ou metodologia de trabalho
para o desenvolvimento criativo e planejamento era comumente ignorado, uma
visão tecnicista que incrivelmente ainda pode ser encontrada nos dias atuais.

16
De certa forma, essa afirmação também pode ser vista nas primeiras
apresentações de John Lasseter8, um dos fundadores da produtora Pixar e
atualmente presidente criativo da Disney, na feira de computação gráfica mais
prestigiada do mundo, a Siggraph9:

Quando apresentei a primeira animação que eu tinha criado com um


computador, The Aventures of Andrew and Wally B., na Siggraph '84,
uma série de pessoas me perguntou sobre o novo software que eu
tinha usado para conseguir personagens tão críveis. Expliquei-lhes que
o software era um sistema de animação em keyframe, não muito
diferente na teoria de outros sistemas que existiam no momento. A
diferença foi que eu havia utilizado os princípios básicos de animação
que eu tinha aprendido como um animador tradicional. Não foi o
software que deu vida aos personagens, foram os princípios da
animação, esses truques que os animadores tinham desenvolvido há
mais de cinqüenta anos atrás. Fiquei surpreendido com a forma como
algumas pessoas na comunidade de animação em computação
estavam inconscientes destes princípios. (LASSETER, 1994).
[Tradução do autor].

Uma das áreas que mais atrai o interesse do pesquisador nesse universo da
animação é a atuação de personagens. As escolhas de acting, o desenho das
suas poses principais, o enquadramento, o gestual, a linguagem corporal
traduzindo emoções e personalidades e todo o processo utilizado até chegar às
cenas animadas que transformam os personagens em atores e os objetos
inanimados em seres vivos são considerados por ele como fascinantes.

O pesquisador se aproximou desse interesse na arte de atuar por se dedicar de


forma espontânea à constante observação das pessoas em suas expressões
gestuais durante a comunicação interpessoal. Mais do que absorver o que as
pessoas comunicam com palavras, muitas vezes sua atenção recai sobre a
riqueza existente nos gestuais, trejeitos, expressões faciais e corporais utilizadas
por elas. O mesmo acontece durante um filme, imaginando quais são os
pensamentos e sentimentos daqueles personagens em determinadas cenas e

8
John Lasseter é diretor e produtor norte-americano, chefe de criação da Pixar, Walt Disney
Animation Studios e DisneyToon Studios. Ele liderou as primeiras tentativas de animação por
computador e é o criador das duas maiores franquias da Pixar, Toy Story e Carros.
9
Siggraph, abreviação de Grupo de Interesse Especial em Gráficos e Técnicas Interativas (em
português), é o nome da conferência sobre computação gráfica que ocorre anualmente. Nela,
dezenas de trabalhos de pesquisa do mundo todo são apresentadas a cada edição.

17
quais podem ser suas próximas ações. Estes elementos podem ser
considerados componentes do princípio de ação e reação, contidos na
comunicação entre os seres humanos, tão importantes para uma atuação natural
e espontânea, convincente, na ficção, no teatro, na animação e na vida real.

Em oficina realizada por Mike Cachuela10 no Festival Anima Mundi, em 2009,


houve uma reflexão semelhante. Durante a apresentação de storyboards das
histórias criadas em exercício proposto, Cachuela solicitou que os alunos
descrevessem o sentimento dos personagens em cada parte da história que
estava sendo contada através dos desenhos. Dessa forma, ele pôde deixar clara
a importância da análise de sentimentos, ações e reações dos personagens para
a criação de cenas animadas, levando as conclusões como ponto de partida para
a animação de cada personagem desenvolvido pelos alunos.

Visando ao engajamento e interesse do animador em toda a produção, para que


se chegue a um acting bem realizado e convincente, o processo de animação
deve estar claro durante a produção, bem como o trecho da história que está
sendo contado em cada cena. Caso contrário, o animador perde a conexão com
a obra, o que fatalmente também irá ocorrer com os espectadores. É
fundamental que se tenha uma boa história para ser contada e animada.

A animação é repleta de dicas, truques e experiências individuais e em equipe,


conforme apresentou John Lasseter em uma de suas palestras de lançamento
de “Toy Story”. Lasseter minimiza a escolha do software, ressaltando
indiretamente a importância da habilidade e competência do artista de animação.

Animação tradicional é basicamente uma sucessão de truques um


após o outro. O que for preciso para fazê-la funcionar perfeitamente na
tela é válido. O mesmo deve ser feito em animação por computador.
Na Pixar, estamos constantemente usando truques, velhos e novos,
para conseguir o resultado que queremos na tela. Nesta palestra, vou
mostrar alguns segredos que serão úteis para quem pretende animar

10
Mike Cachuela trabalha com direção de desenvolvimento e roteiros de longas-metragens.
Cachuela é roteirista e artista de storyboard em filmes como Os Incríveis, Toy Story,
Formiguinhas, James and the Giant Peach e The nightmare before Christmas. Desenvolveu os
primeiros tratamentos de roteiro de Ratatouille e supervisionou storyboards dos longas-
metragens A Noiva Cadáver e Coraline. Mike Cachuela estudou na Cal Arts, na Califórnia.

18
personagens com computadores, independentemente do software que
usarem. (LASSETER, 1994). [Tradução do autor].

Ed Hooks11, diretor e professor de atores, especializou-se em atuação para


animação após ser convidado para desenvolver um treinamento para
animadores na PDI, empresa que se tornaria a divisão de animação da
DreamWorks. Hooks tomou como base o sistema de atuação criado por
Constantin Stanislavski, bastante utilizado no meio das artes cênicas e pelo
próprio professor. Hooks cita algumas diferenças entre a utilização deste método
nas duas áreas:

Animadores não precisam trabalhar exercícios sensoriais, relaxamento


físico, lembranças de emoções passadas ou desenvolvimento de voz,
todos essenciais para atores de teatro que atuam “no momento
presente”. Animadores devem criar a ilusão de um momento presente
com 24 desenhos por segundo. Para visualizar e criar essa ilusão, o
animador precisa de um conjunto completamente diferente de
habilidades. (...) Animadores são atletas do coração. (HOOKS, 2012).
[Tradução do autor].

O método de Stanislavski tem como base conhecimentos intuitivos, que, de


alguma forma, podemos relacionar aos princípios básicos de animação
tradicional, como veremos em capítulos posteriores.

Coube a Stanislavski a importante tarefa de sistematizar os


conhecimentos intuitivos dos grandes atores do passado e de explicar
ao ator contemporâneo como agir no momento da criação ou da
realização. (GONÇALVES, apud STANISLAVSKI, 2008, p8).

Sistema Stanislavski consiste numa série de procedimentos de


interpretação desenvolvidos pelo teatrólogo, diretor e ator Constantin
Stanislavski (1863-1938 – Moscou), os quais apresentam “alguns
conceitos básicos de atuação como super objetivo, objetivos físicos e
psicológicos, subtexto, circunstâncias internas e externas, imaginação
artística, memória emotiva, entre outros. Todos se destinam para um
objetivo central: fornecer ao ator sentimentos análogos ao do
personagem e por ele – viver o papel. Basicamente, o sistema tenta

11
Ed Hooks é ator, autor e professor de atuação teatral. Hooks foi pioneiro no ensino da arte da
atuação para animadores para computação gráfica, em 1998, quando trabalhou com os
animadores da PDI / DreamWorks no norte da Califórnia. Desde então, ele apresenta sua
masterclass na maioria dos grandes estúdios de animação e empresas de jogos por todo o
mundo. Ed Hooks é autor de dois livros, Acting for Animators e Acting in Animation, voltados para
atuação em animação.

19
resolver um problema fundamental: como criar vida no palco”. (TORO,
1990, p.81, apud SILVA FILHO, 2015, p. 19).

Milt Kahl12, legendário animador da Disney, disse ao então animador do estúdio


Richard Williams, como era o seu método de vencer problemas em animação:

Eu apenas faço (a animação). Se você tem algum problema, você deve


deixá-lo para depois. Procure ter um entendimento do que deve ser
animado a seguir. Se você sabe o que deve ser animado a seguir, você
continua animando até chegar nesse ponto. (WILLIAMS, 2001, p. 316).

Realizar uma dissertação em um programa de mestrado profissional que tem


como base reflexões sobre Economia Criativa, Design e Inovação, alinhadas ao
mercado, permite a este pesquisador lançar mão da própria experiência
profissional para investigar de maneira mais assertiva o tema proposto. Cada um
desses assuntos tem espaço no contexto das ideais propostas. Sendo assim
surgiu de maneira natural a formação dos capítulos e rumos deste projeto que
serão posteriormente apresentados.

Todo o universo que gira em torno da animação na criação de histórias –


personagens, cenários, a estética e o clima dos filmes – credencia o cinema de
animação a fazer parte de uma área criativa e inovadora, alguns dos requisitos
que a colocam inserida na Economia Criativa.

A indústria criativa envolve uma gama de disciplinas que se articulam


e interagem entre si gerando uma estrutura em rede, semelhante ou
mais próxima dos formatos contemporâneos de inter-relacionamentos.
Os setores originais componentes dessa indústria são os setores de
propaganda, arquitetura, design, software interativo, filme, teatro,
rádio, TV, música, museus, publicações e artes performáticas. (REIS,
2015, p. 17).

Para uma melhor compreensão da inserção da animação dentro da Economia


Criativa, podemos fazer uma breve visita ao que dizem órgãos mundialmente

12
Milton Erwin Kahl foi um animador dos Estúdios Disney e um dos Nine Old Men, da Disney.
No livro The Animator's Survival Kit, o autor Richard Williams faz várias citações relacionadas ao
animador. Kahl foi um dos principais formadores de Brad Bird, diretor do filme de animação “Os
Incríveis” (2004).

20
reconhecidos, como a Unesco e as Nações Unidas. Porém, antes, traremos uma
definição de indústrias criativas, do British Council:

Definimos indústrias criativas como aquelas que têm sua origem na


criatividade, habilidade e talento individuais e que têm potencial para a
criação de renda e empregos por meio da geração de exploração de
propriedade intelectual. (in REIS, 2007 p. 283).

O relatório de Economia Criativa de 2013, elaborado pela Unesco e pelo


Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), destaca que,
atualmente, a Economia Criativa é uma poderosa força transformadora. Este é
um dos setores que mais cresce no mundo econômico, tanto em termos de
geração de renda quanto na criação de empregos e ganhos na exportação. O
texto destaca que criatividade e inovação humana, individuais e em grupo, se
tornaram a verdadeira riqueza das nações no século 21.

Outro fator crucial para o desenvolvimento da estrutura social da


criatividade é o surgimento de novas instituições e sistemas para a
produção dos frutos da criatividade. A transformação criativa não se
limita a produtos inovadores; ela também se estende aos métodos de
produção. (FLORIDA, 2002, p. 52).

No âmbito nacional, o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) indica


que quase todos os lares no Brasil têm no mínimo um aparelho de televisão,
segundo dados de 2012, o que demonstra que as produções audiovisuais são
consumidas em grande escala no país. No cinema nacional, a presença do
público também merece destaque. A ANCINE, Agência Nacional do Cinema,
apresenta nos seus dados de 2014 um aumento de 34% nas salas de cinema
nos seis últimos anos. A compra de ingressos ao longo desse período cresceu
38%. Outro dado informa que, em 7% dos municípios do país, há salas de
exibição de filmes, totalizando quase 400 cidades com mais de 100 milhões de
habitantes no total, ou seja, mais da metade da população do Brasil.

A crescente participação da economia da cultura no total da produção


capitalista, tanto na escala nacional, como na mundial, decorre do
aumento do tempo livre para consumo de produtos culturais, ou pela
intensificação do uso desse tempo livre. (FIGUEIREDO, 2009, p. 3).

21
O mapeamento realizado pela FIRJAN, Federação das Indústrias do Rio de
Janeiro, no ano de 2014 aponta a Indústria Criativa nacional como um dos
territórios mais produtivos do mundo neste setor, com uma geração superior a
R$ 126 bilhões/ano, 2,6% do total do PIB do país no mesmo ano. O aumento
chegou por volta de 70% se comparado a 2004, bem acima do avanço de 36,4%
do PIB brasileiro no mesmo período. O mercado formal de trabalho na Indústria
Criativa em 2014 era composto por pouco menos de 900 mil profissionais, um
crescimento de 90% neste mesmo período, superando com folga os 56% do
mercado de trabalho brasileiro, indicativos que incentivam a aposta na formação
de profissionais cada vez mais gabaritados em nichos da Economia Criativa,
como a animação.

No aspecto histórico, o boom da 2ª Era de Ouro da Animação, iniciado em


meados da década de 1990, é o ponto de partida para uma espécie de marco
que dialogue com o momento atual do mercado e colabora para a sua
fundamentação. Uma apresentação mais aprofundada sobre a história da
animação, os aspectos técnicos e artísticos do cinema de animação, bem como
explicações relativas à ilusão do movimento foram propositalmente deixados de
fora deste projeto por já terem sido apresentados magistralmente por outros
estudiosos, que contribuíram significativamente para o esclarecimento do tema,
permitindo assim tratarmos de assuntos mais recentes e menos explorados.

O foco inicial deste projeto é apontado para uma etapa fundamental na cadeia
produtiva de um projeto de animação: o acting da cena animada. As bases para
essa escolha são oriundas da experiência profissional do autor nos quase vinte
anos à frente do Estúdio Conseqüência de Animação, local onde trabalha e é um
dos fundadores, bem como na sua vivência lecionando no meio acadêmico e
como professor na mesma instituição em que cursa este programa de mestrado
profissional.

Como a falta de utilização de técnicas de acting de personagens no processo


produtivo pode depreciar o resultado de cenas animadas e de que forma isso se
reverte na queda da qualidade final da produção audiovisual? BOOTH,
COLOMB, WILLIAMS (2008) dizem que “um problema origina-se na mente, a

22
partir de um conhecimento incompleto ou de uma compreensão falha”. Assim, a
atual pesquisa poderá ajudar a dar mais dados sobre o problema observado pelo
pesquisador, que cenas de animação podem estar sendo produzidas com baixo
nível de qualidade. Os autores afirmam que “resolve-se o problema de pesquisa
aprendendo mais sobre um assunto ou entendendo-o melhor”. (BOOTH,
COLOMB, WILLIAMS, 2008, p. 66)

Nesse sentido, observa-se a necessidade de uma investigação sobre acting em


animação e o possível ganho de qualidade das produções com a sua utilização.
O autor desse projeto propõe uma investigação com animadores
contemporâneos, sua formação, background artístico e cultural, suas inspirações
e processos criativos na produção de cenas animadas, tomando como base a
realização de entrevistas junto a profissionais de animação e computação gráfica
do mercado.

GIL (2010) diz que entende-se por hipótese “uma suposição ou explicação
provisória do problema” (GIL, p. 34, 2010). Nesse sentido, frente ao problema
observado, o pesquisador formula a seguinte hipótese: será que o conhecimento
de técnicas de atuação em artes cênicas pode elevar o nível de qualidade final
das cenas animadas?

O objetivo geral do presente projeto é analisar o quanto o aprofundamento no


entendimento e na utilização de métodos de atuação teatral pode contribuir para
um melhor processo de produção e, consequentemente, um melhor
desempenho dos animadores na interpretação, comunicação e planejamento de
cenas em animação.

Os objetivos específicos desta pesquisa são (i) investigar animadores


contemporâneos e experientes, seus backgrounds artísticos e culturais,
processos criativos e inspirações, através de técnicas de pesquisa qualitativa;
(ii) avaliar, nesse sentido, quais são as possibilidades de um aumento de
qualidade das cenas de personagens animados com os resultados que espera-
se obter; e (iii) auxiliar, desta forma, diretores e animadores na produção de seus

23
filmes, assim como professores de animação na formação de novos talentos em
sala de aula.

O conhecimento do tema, aliado à experiência, tanto acadêmica de professor


quanto técnica e de mercado, ajuda o autor na realização deste trabalho. No
trecho abaixo, o designer Bruno Munari13 destaca a experiência, uma das
credenciais citadas acima:

Problema  Solução: ‘Quando um problema não pode ser resolvido,


não é um problema. Quando um problema pode ser resolvido, também
não é um problema’. E, com efeito, é verdade. Em primeiro lugar, é
necessário saber distinguir se um problema tem solução ou não. E,
para isso, é preciso ter a experiência, sobretudo técnica (...). Mas que
pode fazer um designer no início da sua atividade? (MUNARI, 1981, p.
29).

Atualmente no Brasil, muitos jovens animadores atuam na área da publicidade,


em particular, os de animação gráfica 3D, distantes das produções autorais de
longas-metragens e séries de animação. Podemos perceber que muitos são
autodidatas, carecendo de mais informações estruturadas no seu período de
formação. Estes animadores podem aproveitar mais as técnicas de acting no
processo de criação de cenas animadas, evitando, assim, que o resultado final
das cenas siga para a um nível de menor qualidade, ficando para os animadores
mais experientes a responsabilidade de resolver as atuações das cenas que têm
um nível maior de complexidade.

Assim, desde as primeiras realizações do cinema de animação até


nossos dias, sucederam-se várias fases produtivas, cada uma com
suas características e interesses que, aos poucos, foram inserindo
procedimentos, técnicas e ferramentas aos modos de realização,
compondo, assim, um processo evolutivo da arte de realizar animação
como um todo e de modo especifico, como um processo evolutivo do
planejamento da atuação (acting) do personagem animado. (SILVA
FILHO, 2015, p. 26).

13
Bruno Munari foi um artista e designer italiano, que contribuiu com fundamentos em muitos
campos das artes visuais e também com outros tipos de arte, com a investigação sobre o tema
do jogo, a infância e a criatividade.

24
As informações apresentadas nesta introdução terão sequência no segundo
capítulo, que se iniciará com breves comentários sobre alguns dos principais
acontecimentos que influenciaram o momento atual da animação. Logo em
seguida, apresentaremos um panorama da animação contemporânea, iniciada
na chamada 2ª Era de Ouro da Animação, narrando como foi bem aproveitada a
utilização dos princípios básicos da animação tradicional aplicados à técnica de
computação gráfica 3D e de que maneira essa inovação influenciou o mercado.

Após esta contextualização, seguiremos dissertando sobre a Economia Criativa


nacional. Será apresentado, inicialmente, um resumo sobre o surgimento da
Economia Criativa na Austrália e no Reino Unido, em meados da década de
1990, até começar a figurar recentemente na economia brasileira. No item 2.3,
dissertaremos sobre o mercado brasileiro e alguns de seus pontos de contato
como o mercado estrangeiro, dando exemplos de modelos de produção.

No capítulo seguinte, a apresentação de um projeto inovador ilustrará o momento


atual de aproveitamento da Economia Criativa no que tange o
empreendedorismo. A produção do filme “La Noria” mostra como um animador
pôde agregar três objetivos em um mesmo projeto: a produção de um curta-
metragem, seu financiamento através de plataforma de crowdfunding e a
divulgação de uma plataforma de gerenciamento de produção de projetos em
animação digital, utilizando, em todas essas vertentes, a internet como
centralizadora das ações. Assim, fecharemos a proposta do capítulo 2
apresentando um panorama da animação.

Iniciaremos o terceiro capítulo abordando o processo de produção elencado


através das etapas de um filme de animação (representados nas pipelines),
situando com maior clareza a relação entre as etapas e fases, que acabam por
dar suporte à inserção do acting nas produções. Apresentaremos cada fase de
produção de uma das principais técnicas de animação utilizada em filmes de
longa-metragem, a animação 3D.

Criar animação de personagens exige uma série de competências e


conhecimentos técnicos e artísticos por parte dos animadores: conhecimento de

25
animação tradicional e design de poses, familiaridade com o funcionamento da
mecânica do corpo, bom timing de movimento, conhecimento de expressão
corporal e facial.

Após o início da 2ª Era de Ouro da Animação, com a criação e disseminação do


uso da técnica de animação digital, autores, professores e diretores passaram a
buscar mais a inclusão das técnicas de acting no processo de produção de cenas
de animação. No item 3.2, esta será a temática desenvolvida a partir de textos
de autores e profissionais como Walt Disney, Constatin Stanislavski, Ed Hooks
e Kate Alexander, relacionados aos processos de animação e técnicas de acting
em artes cênicas.

O quarto capítulo, intitulado Métodos e Técnicas, tratará da metodologia utilizada


na pesquisa. Buscar-se-á uma abordagem científica sobre o ganho significativo,
partindo-se inicialmente de um ganho significativo por achismo para, em
seguida, alcançar dados científicos. No que se refere à técnica de pesquisa, a
Análise do Conteúdo permite, por meio da inferência, obter conhecimento sobre
o emissor ou sobre o destinatário da comunicação, conforme fundamentação de
Laurence Bardin (1988), extraindo informações nas entrelinhas dos relatos
coletados contidos nas entrevistas realizadas.

De posse do corpus da pesquisa, no quinto capítulo, uma análise de resultados


será realizada, buscando triangular a hipótese e os objetivos da pesquisa com
os resultados da técnica de Análise de Conteúdo aplicada, analisando a fala dos
animadores entrevistados relacionada às categorias de cada pergunta realizada
em busca de conclusões.

Em Conclusões e achados da pesquisa, dissertar-se-á, no quinto capítulo, sobre


o delineamento da pesquisa, a análise dos resultados obtidos e o referencial
teórico, buscando confrontar os resultados, as hipóteses e as técnicas de
pesquisa trabalhadas. Nas considerações finais, fazemos um breve relato da
experiência, indicando possibilidades de sequência para estudo do tema.

26
2. Panorama da animação

No intuito de contextualizar o acting em animação, iniciaremos pelo panorama


no qual ele está inserido, a indústria da animação propriamente dita. Dessa
forma, será estabelecida a abordagem do que trabalharemos, voltando a
atenção prioritariamente para esse segmento. Abordaremos dois momentos de
maior destaque da história da animação.

O primeiro grande momento se inicia nos primórdios da animação, com as


primeiras descobertas técnicas e criativas, passando pela revolução criativa e de
entretenimento do universo Disney, esta considerada a 1ª Era de Ouro da
Animação.

O segundo momento acontece após um período que muitos consideram como


de pouca novidade e de um certo marasmo. Em 1995, surge a chamada 2ª Era
de Ouro da Animação, tendo como marco o lançamento do filme “Toy Story”, o
primeiro longa-metragem de animação criado em computação gráfica produzido
pela Pixar Animation Studios em parceria com a Disney.

A chegada do longa-metragem animado digitalmente ofereceu ao


público uma alternativa à forma estabelecida pela Disney e renovou o
interesse pela animação como um todo – tanto para o público quanto
como um possível meio para novos animadores e cineastas. (CHONG,
2011, p. 110)

Sendo assim, neste capítulo, iremos apresentar alguns destaques da história da


animação, passando pela industrialização dos desenhos até chegarmos a 1ª Era
de Ouro da Animação. Como desfecho, um breve relato sobre a 2ª Era de Ouro
da Animação e as inovações da animação digital 3D, que será apresentado com
mais detalhes no início do capítulo seguinte.

As pinturas rupestres são consideradas por diversos historiadores como sendo


informações passadas para novos caçadores. Já para os pesquisadores que
enveredam para animação, tais imagens são vistas como representações
sequenciais de movimento. Outra interpretação para tais ilustrações recaem

27
sobre um aspecto didático, quando os “autores” pretendiam informar sobre a
diferença entre animais úteis para a caça e animais que ofereciam perigo para o
homem. Da mesma forma, podemos encontrar representações de movimento
nas civilizações egípcias e gregas, através da arte em painéis esculpidos em
paredes e em vasos de cerâmica com ilustrações que contavam a história do
povo.

Como relatado por MAGALHÃES (2004) e SILVA FILHO (2015), no século XVII,
alguns instrumentos começaram a ser inventados e desenvolvidos visando à
exibição de sequência de imagens para se ter a ilusão de movimento, o que se
seguiu pelos séculos seguintes. Durante esse período, podemos destacar
invenções como a lanterna mágica, o taumatrópio, o fenaquistoscópio, o
zootrópio e o flip-book que, apesar de terem limite de tempo bastante curto e
também limite de platéia, foram fundamentais para as descobertas que se
sucederam, principalmente após os anos 1830, quando a fotografia foi
descoberta.

A partir da criação do praxinoscópio, adaptações foram sendo feitas e o caminho


para um mecanismo mais avançado e para um público maior se abriu. Pouco
tempo depois, o projetor foi inventado de forma quase simultânea em dois
lugares distintos: na França, pelos irmãos Lumière14, e nos Estados Unidos, por
Thomas Edison15.

Animações começaram a ser produzidas, porém tratava-se mais de desenhos


animados do que de filmes de animação propriamente ditos. Os desenhos
animados eram apresentados em salas de cinema como entretenimento que
antecedia a exibição de filmes com atores reais, atração principal do evento.
Nestas animações, a atuação dos personagens se dava de forma

14 Auguste Marie Louis Nicholas Lumière (1862-1954) e Louis Jean Lumière (1864-1948), os
irmãos Lumière, foram os inventores do cinematógrafo.
15 Thomas Alva Edison (1847-1931) foi um empresário dos Estados Unidos. Edison patenteou
e financiou o desenvolvimento de muitos dispositivos importantes de grande interesse industrial.
Ele foi um dos primeiros a aplicar os princípios da produção maciça ao processo da invenção.

28
despretensiosa, sendo trabalhada com o apelo de gags16 visuais, pouco
contribuindo para se contar uma história.

Nas primeiras décadas dos anos 1900, as primeiras animações foram criadas
por J. Stuart Blackton, produzindo “Humorous phases of funny faces”; Emile
Cohl, com o seu “Fantasmagorie”; e Winsor McCay, com “Gertie, the Dinosaur”,
que se destacava dos outros filmes pelo carisma transmitido por este
personagem. Outro personagem que se destacou foi o Gato Felix, criado por Pat
Sullivan e Otto Messemer. O fato de a atuação do personagem ir muito além da
realidade pode ser considerado um dos fatores de sucesso, pois pouco, até
então, havia sido feito com tamanho exagero, levando à reflexão sobre ser este
um dos precursores da animação exagerada estilo cartoon, que surgiria anos
depois.

Em 1923, os irmãos Walt e Roy Disney fundam a Walt Disney Company. Disney
inovou ao perceber que as produções careciam de uma história realmente
elaborada que pudesse ultrapassar as barreiras das já desgastadas gags dos
desenhos animados produzidos na época. Outro ponto trabalhado à exaustão
por ele se referia a atuação do personagem animado. Walt queria que todos os
aspectos do comportamento do ser humano fossem conhecidos pelos
animadores antes de serem utilizados de forma exagerada na criação da
animação cartoon. Dessa forma, o empresário unia a atuação convincente, cheia
de vida e carisma de seus personagens, a histórias criadas para cativar os
espectadores.

Pouco depois da fundação da Disney, na década de 1930, outros estúdios foram


criados e seguiram seus passos, como a Warner Bros., que começou a produzir
seus primeiros cartoons. Na mesma época, surge o Walter Lantz Studios,
produzindo séries para Universal Studios, com destaque para o personagem
Pica-Pau.

16
Gags são atuações que transmitem humor visualmente, quase sempre sem o uso de palavras.

29
Na década seguinte, a United Productions of America foi inaugurada, motivada
por uma greve de animadores dos Estúdios Disney insatisfeitos com o estilo
adotado por Disney, que consideravam ultrarrealista. O estúdio começou
produzindo filmes para treinamento militar, para, posteriormente, investir em
séries de TV e filmes de curta-metragem. Durante a sua existência até os anos
1970, a UPA procurou adotar um estilo próprio de animação e estética.

Outro estúdio fundado nessa época foi o Hanna-Barbera, criador de séries como
“Tom & Jerry” e “Os Flintstones”. Um animador que merece destaque neste
período é Chuck Jones. Seu estilo próprio de dirigir e animar filmes no estilo
cartoon foi reconhecido algumas vezes pela Academia, recebendo três
estatuetas do Oscar.

Entre 1950 e 1960, com a consolidação da televisão nos lares, chegamos ao fim
da chamada Era de Ouro da Animação, que se iniciara no final dos anos 1920.
Em função do alto custo da produção, os filmes de longa-metragem com
animação mais elaborada perdiam terreno para os desenhos produzidos para a
televisão com a utilização da animação limitada, estilo menos elaborado e de
mais baixo orçamento, como os utilizados pelos estúdios UPA. Dessa maneira,
a atuação na animação dos personagens perdia cada vez mais qualidade,
situação que se agravou pelo fato de a animação ter passado a ser considerada
apenas para o público infantil, como uma espécie de passatempo para as
crianças. Outros recursos utilizados para se baixar custos contribuíram para
afastar a empatia do público com os desenhos animados, principalmente no que
se refere a acting.

Uma alternativa ao período pós-guerra, que resultara em momentos de


dificuldades financeiras para as realizações dos estúdios, acabou sendo o
intevalo comercial na televisão (SILVA FILHO, 2015, p. 114). As séries surgiriam
logo em seguida, abrindo o leque de possibilidades de produção.

Em paralelo à animação comercial e industrial simbolizada pela Disney,


empresas e instituições foram sendo criadas com o intuito de estudar e
desenvolver a animação autoral e experimental e se aprofundar nela, como o

30
National Film Board of Canada. O escocês Norman McLaren foi o responsável
pela criação do departamento de animação da instituição, em 1941.

Com suas pesquisas e produções experimentais, o animador criou e


desenvolveu várias novas técnicas de animação. Seus filmes receberam
dezenas de prêmios, incluindo o Oscar, da Academia. McLaren acabou por
influenciar diversos animadores no NFB, que utilizaram as diferentes técnicas
desenvolvidas por ele (MAGALHÃES, 2004).

Em 1985, a instituição foi incluída num acordo de troca de tecnologia entre o


Brasil e o Canadá, tendo o desenvolvimento do cinema de animação brasileiro
como um dos objetivos. Poucos anos depois, quatro integrantes do grupo de
artistas brasileiros envolvido no projeto fundariam o Festival Anima Mundi, um
grande marco da animação no Brasil.

Voltando aos Estúdios Disney, podemos destacar alguns pontos principais entre
a trajetória da empresa e o acting em animação. O primeiro refere-se ao
memorando escrito por Walt Disney em 1935, descrevendo quais caminhos Dom
Graham deveria seguir nas aulas de desenho vivo para as quais fora contratado.
Outro destaque refere-se aos princípios básicos da animação tradicional
desenvolvidos no estúdio neste mesmo período. Por fim, mais recentemente,
temos a fusão entre a Disney e a Pixar Animation Studios, em 2006, coroando a
2ª Era de Ouro da Animação, período de grandes inovações que teve seus
fundamentos iniciados décadas antes, com o desenvolvimento da computação.

31
2.1. A Nova Era de Ouro da Animação

A chamada 2ª Era de Ouro da Animação teve a forte influência do avanço


tecnológico da computação e a forma como foi utilizada no cinema. O início das
primeiras descobertas nesse campo aconteceu bem antes da década de 1990,
momento em que se iniciaram as produções de filmes em computação gráfica,
resultado das negociações de parceria firmada entre a Disney e a Pixar. A
computação se tornaria fundamental para as produções, apesar de a essência
da criação vir do mesmo princípio básico da animação dos tempos anteriores.
Muito do sucesso do casamento da computação com da sétima arte foi possível
pelo aproveitamento feito por cientistas da computação a partir dessas
descobertas inovadoras.

O que a tecnologia tem de maravilhoso é que as pessoas acabam


fazendo com ela algo diferente para o que foram originalmente criadas.
É essa fortuidade que subjaz à criatividade na sociedade e à inovação
nos negócios. (CASTELLS, 2001, p. 160)

Em 1958, nos Estados Unidos, foi construído o primeiro circuito integrado que
consistia em um só componente que poderia substituir a utilização de vários
transistores. Com isso, foi possível diminuir custos tornando possível a produção
industrial, bem como diminuir o tamanho dos computadores. No ano seguinte,
um computador foi construído no MIT17, incluindo um elemento que se tornaria
um fator decisivo para o desenvolvimento da computação gráfica: o monitor de
tubo de raios catódicos (CRT), permitindo um monitor menor e de melhor
qualidade nas imagens.

Inicialmente, as ferramentas desenvolvidas tinham seu manuseio a cargo de


técnicos de computação, cientistas e pesquisadores, tornando naturalmente o
resultado menos atraente nos aspectos visuais, apesar de todos os esforços. No
início dos anos 1960, a Digital Equipment Corporation se torna a pioneira no
lançamento do computador interativo com a Interface Gráfica do Usuário18

17
Massachusetts Institute of Technology é uma universidade particular em Cambridge, nos
Estados Unidos.
18
Sistema de interação com a tecnologia baseado em imagens e ícones ou invés de textos ou
códigos.

32
(expressa por meio da sigla GUI). Somente após a melhoria permitida pelas GUI,
os artistas e animadores começaram a se familiarizar com a animação digital e
passaram a utilizar a computação gráfica para a criação de elementos bi e
tridimensionais, passando a gerar imagens para as produções animadas com
destreza, integração e estética mais apurada do que os usuários mais técnicos.
Na época anterior a esse acontecimento, Don Bluth19, animador que utilizava a
técnica tradicional, chegou a afirmar que

No mundo da animação, as pessoas que entendem de lápis e papel


normalmente não entendem de tecnologia, e as que entendem de
tecnologia, em geral não são pessoas do mundo artístico, então elas
estão sempre em lados opostos (BLUTH, in CHONG, 2011, p. 33).

Mesmo na animação desenhada à mão é muito difícil desenhar seres


humanos, pois todo o mundo tem alguma ideia de como eles se
movem. (BIRD20, in CHONG, 2011, p. 90).

A tecnologia começa a chegar mais perto dos profissionais e usuários criativos


dos estúdios e dos profissionais autônomos, saindo do nicho das indústrias, das
pesquisas acadêmicas, da engenharia e da geração de imagens para propósitos
militares, passando a ter suas ferramentas de criação de imagens adaptadas ao
entretenimento da animação, filmes e games.

Dois anos após a criação da primeira GUI e imerso nesse panorama de


possibilidades que se abria, é lançado Space War, o primeiro game. Em seguida
vieram os arcades21 com Pong22, adaptado um ano depois pela Atari para
consoles de uso doméstico utilizando televisores como tela de jogo, inaugurando
assim os jogos eletrônicos sem a necessidade de comprar fichas para jogar
novamente – ao término, o jogo apenas reiniciava com o comando do usuário.

19
Don Bluth é um animador e produtor norte-americano, produtor de Bernardo e Bianca (1977).
20
Brad Bird graduou-se na CAL Arts, EUA. Ele dirigiu os longas-metragens O Gigante de Ferro,
Os Incríveis e Ratatouille, (estes últimos na Pixar). Bird trabalhou como desenvolvedor da série
Os Simpsons
21
Arcade é um aparelho de jogo eletrônico profissional popular nas décadas de 1970 e 1980.
Estes jogos funcionavam a base de inserção de fichas compradas nos estabelecimentos
comerciais nos quais eram instalados.
22
O jogo consistia em uma linha divisória vertical e duas barrinhas também verticais uma de
cada lado, semelhante a um jogo de tênis ou ping-pong. O jogador deveria rebater uma bolinha
(em forma de um quadrado, um somatório de grandes pixels) para o outro campo, onde o outro
jogador deveria rebater e mandar de volta, e assim sucessivamente, com gradativo aumento de
velocidade e consequente grau de dificuldade.

33
Uma década mais tarde é criado o game Space Invaders, pela empresa Taito23,
que teve grande impacto na indústria dos games. Os games chegavam para ficar
e levar o usuário para experiências interativas que, desde então, crescem de
forma exponencial até os dias atuais.

No cinema, em meados da década seguinte, é fundada a ILM, Industrial Light &


Magic, tamanha a demanda de efeitos especiais solicitados no primeiro episódio
da franquia “Guerra nas Estrelas”, de George Lucas. Vale ressaltar que a grande
maioria das cenas foi realizada com efeitos especiais sem a utilização da
computação gráfica, o que se inverteria cada vez mais nas produções seguintes.
No filme “Blade Runner”, poucos anos depois, um design de interface com estilo
futurista é adotado nos dispositivos utilizados por Decard, personagem
encarnado por Harrison Ford. Em uma cena, são exibidos movimentos de
câmera de um simulador de análise de fotografias através de comandos
interativos de voz e marcações de zoom, ampliações e reduções de imagens em
multiplano.

No final dos anos 1970, George Lucas precisava criar um departamento de


computação gráfica para aproveitar os novos adventos e alavancar a produção
de seus filmes. Depois de fazer uma pesquisa sobre os expoentes da
computação gráfica, Lucas chega até o cientista Edwin Catmull como o nome
certo a ser contratado para o cargo. Após a sua efetivação, o cineasta foi
contratando um a um os cientistas da equipe de Catmull do NYIT (New York
Institute of Technology), para formar o seu time de computação gráfica na ILM.

Interessante observar como a indústria norte-americana se aproxima do meio


acadêmico e se aproveita de pesquisas para implementá-las na prática e
desenvolvimento dos seus negócios. Nesse caso em que Catmull e sua equipe
foram pinçados, podemos considerar que suas aparições anuais na Siggraph, a
mais tradicional e mais importante feira de computação gráfica do mundo,
possibilitavam a exibição dos seus trabalhos e artigos científicos com suas

23
Empresa de games de consoles, como o Arcade.

34
descobertas, tornando o grupo conhecido e reconhecido no meio da computação
gráfica e academia.

A divisão de computação gráfica da ILM é o embrião para a fundação da Pixar,


inicialmente chamada de Graphics Group, tendo Ed Catmull liderando o estúdio.
Mesmo carecendo de peças na engrenagem, a produtora concentra-se na
criação de filmes de animação, apesar de outras diretrizes traçadas por George
Lucas. No ano seguinte, uma futura concorrente é fundada, a PDI, Pacific Data
Image. A produtora, que posteriormente se aproximaria da DreamWorks na
produção de longas-metragens, se destaca por suas produções em computação
gráfica realista e por criar um programa de computação gráfica que se tornaria
referência em animação digital para grandes produções. Apesar disso, o acting
era pouco trabalhado.

John Lasseter, então funcionário da Disney, foi convidado por dois amigos para
assistir uma sequência animada do filme “Tron”, filme comercial que apresentaria
pela primeira vez um personagem em computação gráfica. Após assistir a cena,
o animador se certifica do potencial da computação gráfica (ou CG) como nova
ferramenta. O aproveitamento da CG em cenários tridimensionais compostos
com personagens em CG animados com os princípios da animação tradicional
surge como uma visão para ele, pois tal recurso com tratamento de cenário
tridimensional nunca fora usado na Disney, apenas cenários animados em
multiplanos.

Fato curioso foi que, no filme, um membro da equipe se transformaria, anos mais
tarde, em um diretor e produtor de primeira linha em filmes de animação digital.
Chris Wedge participou do filme como animador. Podemos apostar que teve a
mesma influência que Lasseter (ou até maior) para enveredar para a animação
de personagens em computação gráfica. Em 1987, fundaria a Blue Sky com
outros cinco companheiros que trabalharam na equipe de “Tron”.

Após a descontinuidade do projeto no qual estava envolvido, John Lasseter foi


demitido da Disney, também por divergências no que se referia ao
distanciamento da empresa da técnica de animação 3D. Um ano depois,

35
Lasseter reencontra Ed Camull numa conferência de computação gráfica e os
dois retomam contato. Em seguida, Catmull consegue efetivar o animador na
ILM, apesar de George Lucas estar mais interessado em efeitos especiais para
os filmes com atores que produzia, ignorando animação com personagens.
Dessa forma, Catmull conseguiu colocar uma peça importante que faltava para
direcionar artisticamente o grupo de cientistas e aumentar o foco de todos os
integrantes do departamento: produzir filmes de longa-metragem.

Em 1987, Lasseter e a equipe de Catmull terminam a produção do curta “As


Aventuras de André e Wally B”. e apresentam o filme na Siggraph, em Los
Angeles. A aceitação do filme pelo público presente na feira de computação
gráfica, na sua maioria cientistas e simpatizantes da computação, foi imediata.
Todos ficaram curiosos para saber quais softwares estavam por trás da
animação tão convincente realizada no filme. Conforme mencionado no início
desta dissertação, John Lasseter explica que utilizou os princípios básicos da
animação tradicional, os mesmos utilizados pelos estúdios Disney há décadas.
O animador se impressiona com a falta de conhecimento da maioria do público
presente sobre tais princípios. Sobre o software utilizado, Lasseter explicou que
era um sistema baseado em keyframe, igual a outros em computação gráfica,
nada mais que isso. (LASSETER, 1987)

Desde o início da sua participação na Pixar, John Lasseter teve como natural
escolha a utilização dos princípios básicos da animação tradicional,
provavelmente pelo fato de ter sido formado pela CalArts e pela utilização da
técnica de animação tradicional durante a sua carreira profissional, com
passagem pela Disney. Vale destacar que a CalArts teve Walt Disney como um
dos seus fundadores.

Independente de a técnica de animação utilizada ser a computação gráfica, a


utilização dos princípios da animação tradicional foi a premissa de Lasseter,
aliada ao cuidado com o acting. Essa escolha viria a dar um diferencial artístico
nas suas primeiras histórias que envolviam personagens baseados em objetos
inanimados. Dessa forma, percebe-se que a cooperação entre Lasseter e

36
Catmull, cientista da computação, fez com que as questões voltadas para as
barreiras de produção dos filmes fossem resolvidas com o tempo.

O fato de ter estudado na CalArts e o legado de sua passagem pelos


Estúdios Disney no começo de carreira permitiam a Lasseter seguir
certos atributos conquistados por Walt Disney e seus animadores, em
muitos anos de sucesso na produção de animação. Assim com os
princípios de animação, ele sabia que a atribuição de qualidades reais
a objetos inanimados sempre teria um importante potencial cômico.
(SILVA FILHO, 2015, p. 131).

Por mais que a tecnologia da computação avançasse, os custos para se produzir


efeitos e cenas em computação gráfica permaneciam como uma barreira a ser
transposta. Da mesma forma, o tempo de produção e processamento deveria
ser melhorado.

A entrada de John Lasseter pode ter acelerado essas conquistas na Pixar pelo
fato de a atenção da produção se deslocar um pouco de perfeccionismos da
computação gráfica e se voltar mais para o acting dos personagens em favor de
contar a história, algo que o grupo carecia. Esse era o diferencial de Lasseter
em relação aos engenheiros e que poderia preencher uma lacuna existente.
(SILVA FILHO, 2015)

Devido ao alto custo e prazo de execução, produções em animação digital só se


justificavam e aconteciam quando a estética fugia do real, dotada de estilo
próprio, e quando as cenas eram inexequíveis em filmagem ao vivo. O caso das
animações da Pixar recaía sobre estes dois aspectos.

A técnica 3D, a princípio aplicada buscando o máximo de realismo,


começou a conhecer maior popularidade ao incorporar o vocabulário
visual da animação tradicional, e criar personagens e histórias
paradoxalmente caricaturais e realistas ao mesmo tempo. Um dos
grandes responsáveis por esta virada foi John Lasseter, mente criativa
dos estúdios Pixar, um ex-animador da Disney que descobriu o
caminho para juntar os dois paradigmas: fantasia (desenho animado)
e simulação (computação gráfica). (MAGALHÃES, 2004, p. 47)

37
Nesse período, houve o crescimento desenfreado de PCs24, invadindo lares e a
vida dos profissionais da indústria e freelancers. Os modelos de negócios foram
se alterando gradativamente, ancorados na cada vez maior utilização da internet
como base de comunicação e troca de arquivos após a entrada da web no ar,
em 1991. Distâncias foram transformadas em lugares próximos e pessoas
desconhecidas passaram a ser parceiras de trabalho em potencial.

Mais tarde, com o aumento da velocidade da internet, vídeos-tutoriais são


lançados e assistidos por jovens artistas 3D, ampliando a quantidade de fãs e
usuários. O software Photoshop foi criado nessa seara e se tornaria um dos
programas mais utilizados em manipulação e edição de imagens digitais em
bitmap25.

A Pixar seguiu suas produções de curtas, pesquisas e aparições em feiras de


computação gráfica, se aproximando cada vez mais das condições de realizar
um filme mais ambicioso de maior duração. Em 1986, a Apple compra a
produtora, porém estava mais interessada no que se referia a comercializar o
Pixar Image Computer, um computador que eles produziam, do que na vertente
da animação de personagens. Ainda naquele ano, Lasseter dirige o curta Luxo
Jr. e o lança no mercado, aumentando aos poucos as produções de curtas de
animação na técnica 3D.

Após o fracasso na comercialização do computador e do déficit financeiro da


companhia sem conseguir se firmar no mercado de filmes comerciais, Steve
Jobs faz sucessivas demissões, buscando solucionar os problemas, e acaba por
fazer um acordo com a Disney para a produção de três filmes. Poucos anos mais
tarde, com o sucesso de “Toy Story”, um novo contrato seria assinado,
aumentando o acordo para cinco filmes nos dez anos seguintes.

Nos primeiros testes de “Toy Story” apresentados para aprovação junto à Disney,
John Lasseter fez questão de apresentar cenas com recursos quase

24
IBM-PC, peronal computers, criados pela IBM.
25
Bitmap: imagem baseada em pixels, por sua vez, uma abreviação de picture elements (PICture
ELements).

38
inexequíveis na produção de animação tradicional, com o intuito de impressionar
os executivos. Uma das cenas tinha o cowboy Woody com uma camisa xadrez
funcionando perfeitamente, fato impossível de ser imaginado pela Disney, que
utilizava apenas roupas lisas em seus personagens, tamanha a dificuldade de
animar texturas em movimento com perfeição (SILVA FILHO, 2015).

Em 1995, a Disney lança “Toy Story”, produzido pela Pixar. O filme é o primeiro
longa-metragem em animação feito em CGI26. Em pouco tempo, o público se
identificou com o roteiro atual e moderno criado por John Lasseter e sua equipe,
marca que se estabeleceria dali por diante, aliado a uma produção de alta
qualidade estética. O acting dos personagens, quase que na sua maioria
brinquedos inanimados, tem um nível de empatia bastante elevado junto ao
público.

Em seguida ao lançamento de “Toy Story”, outros grandes estúdios se voltaram


para essa nova forma de contar histórias, com personagens carismáticos e
acting bem elaborado. Com o intuito de viabilizar as produções, assim como
ocorreu no início da industrialização da animação, uma série de aquisições
passou a ocorrer. Independente disso, em 1998, a Pixar lança seu segundo filme
em parceria com a Disney, “Vida de Inseto”, que tem a mesma fórmula de “Toy
Story”. O novo filme tem um estilo mais apurado que seu concorrente daquele
ano, “FormiguinhaZ”, resultado da parceria entre a DreamWorks, a empresa de
Steven Spilberg, e a PDI27.

Com o protagonismo alcançado pela animação digital, deixando de coadjuvar


como mero recurso de apoio e passando a ocupar todas as fases da produção
até distribuição e transmissão, George Lucas passa a adotar a computação
gráfica como padrão das suas realizações. Na sequência dos recentes filmes da
Pixar e da DreamWorks, a ILM lança “Guerra nas Estrelas, Episódio I, a Ameaça
Fantasma”, utilizando computação gráfica de peso, com destaque para todo o
universo digital produzido no filme e com seu personagem principal sendo pela

26
Computer-generated Imagery, imagens geradas por computador
27
PDI, Pacific Data Image, produtora de computação gráfica, comprada pela DreamWorks, em
2000.

39
primeira vez no formato digital. O filme “O Senhor dos Anéis, Duas Torres” segue
um caminho mais realista e utiliza a computação gráfica para criar o Gollum, um
personagem principal com estilo foto-realista.

Em 2001, a DreamWorks lança “Shrek”, seu primeiro filme de animação que teria
grande sucesso, pouco antes de a Pixar lançar “Monstros S. A.”, em novembro
do mesmo ano. Com toda essa atmosfera, foi criada a categoria de melhor filme
de longa-metragem de animação na premiação do Oscar em 2002, devido ao
sucesso dos longas em animação 3D. Apesar de já terem sido premiados com a
estatueta anteriormente em outras categorias, os Estúdios Disney, concorrendo
com “Monstros S. A.”, perdem a primeira edição para a DreamWorks, que
concorrera com o carismático “Shrek”.

Após a experiência com “FormiguinhaZ” e “Shrek”, a DreamWorks se certificou


da importância da PDI como um atalho para a criação da sua própria divisão de
animação gráfica. Inicialmente, a PDI era uma produtora de computação gráfica
de excelência, da mesma forma que a divisão de computação de Catmull. Suas
produções figuravam em festivais internacionais, como o Anima Mundi, no Brasil,
bem antes de ser parceira da DreamWorks e posteriormente transformada na
DreamWorks Animation, após ser comprada. A 20th Century Fox seguiu o
mesmo modelo, adquirindo a Blue Sky e transformando-a na sua produtora de
animação.

Ainda em 2002, o primeiro filme da franquia “A Era do Gelo” seria lançado pela
20th Century Fox, já contando com a Blue Sky debaixo do seu guarda-chuva. O
estúdio criado por Chris Wedge e mais cinco sócios, a maioria tendo as ciências
exatas como formação, já havia ganhado um Oscar de curta-metragem com o
filme “Bunny”, que narrava a história de uma coelhinha bem agitada. Wedge
finalmente conseguia entrar para o hall dos grandes produtores de animação
digital anos depois de ter participado de “Tron”. Na co-direção do longa estava o
brasileiro Carlos Saldanha, talentoso animador e diretor de filmes em
computação gráfica, que havia sido aluno de Chris na School of Visual Arts, em
Nova York. Posteriormente, Saldanha dirigiria em empreitada solo “A Era do
Gelo 2” e ” A Era do Gelo 3”, seguidas das franquias “Rio 1” e “Rio 2”.

40
Os sucessos de bilheteria e as novas produções programadas em sequência
demonstravam a confiança dos estúdios na nova estética criada para os filmes
e caracterizavam a retomada do cinema como alternativa de sucesso para a
animação, marcando o surgimento da nova era da animação. Resultado desse
momento é espelhado na produção da recém-formada DreamWorks Animation,
após a fusão com a PDI, em 2004. O filme “Espanta Tubarões” conta com o voice
talent28 de medalhões, como Robert de Niro, Angelina Jolie, Martin Scorsese,
Will Smith, Renée Zellweger e Jack Black.

No mesmo ano, o filme “O Expresso Polar” é lançado, tendo como técnica de


animação o motion capture29, com resultados de acting muito próximos de
movimentos humanos. O preciso recurso desta técnica hiper-realista de
movimentos corporais e faciais já havia sido utilizado no filme “Final Fantasy”
(1999), apresentando o uncanny valley, fenômeno que causa desconforto na
platéia tamanha a semelhança com o comportamento de humanos, porém
encarnados em personagens digitais.

A Pixar seguiu produzindo e lançando longas e curtas-metragens de animação


sucessivamente, como se fosse uma fábrica de animação, recebendo diversas
estatuetas do Oscar. Ao final do contrato de cooperação bem-sucedido com a
Disney, surge uma série de especulações sobre o futuro da parceria. Steve Jobs
fecha negócio de aquisição com a Disney, que adquire a Pixar a partir de
negociação de troca de ações e uma série de condições estipuladas. Uma
dessas condições é a manutenção da Pixar independente da Disney, mesmo
tendo, na prática, John Lasseter e Ed Catmull como os principais executivos em
ambas as empresas. Os filmes, então, passam a ser assinados Disney-Pixar.
Um dos fatores determinantes para a aquisição da Pixar foi a perda de
faturamento da Disney nos últimos dez anos e a vasta criação de propriedade
intelectual desse período ser oriunda dos filmes produzidos pela Pixar com suas
histórias contemporâneas, carisma e acting apurado dos personagens e um
visual primoroso.

28
Voice talents são os artistas que criam as vozes que compõem um personagem animado.
29
Motion Capture é a técnica de captura de movimentos através de sensores transferidos para
um personagem criado em computação gráfica.

41
Outros filmes em animação aproveitaram esse novo momento e foram
produzidos por meio de outras técnicas, também com alta qualidade. Podemos
destacar as produções dos Estúdios Aardman, de Bristol, Inglaterra,
internacionalmente conhecido pelos filmes “Fuga das Galinhas” e “Wallace and
Gromit”. O sombrio “A Noiva Cadáver”, do talentoso diretor Tim Burton, surgiria
um pouco depois, nessa mesma seara, com uma animação e acting irretocáveis
e direção de arte impressionante.

O acting dos personagens das produções específicas citadas acima é de


altíssima qualidade, concorrendo de igual para igual com a animação digital,
ainda mais se levarmos em consideração o alto grau de dificuldade para a
realização de stop motion, técnica utilizadas nessas produções. Os filmes feitos
por meio dessa técnica são realizados sem o comando undo (desfazer), por
exemplo, existente na computação e de fundamental importância para
experimentações e correções.

Nesse período, a animação digital atingiu sua maturidade estética, quando


artistas e profissionais passaram a se especializar na técnica e se separaram
dos primeiros estilos “gráficos” com visual futurista para a época, passando a
trabalhar sua própria estética. Entre outros aspectos positivos, a computação
gráfica foi responsável por materializar as vantagens de duas técnicas muito
utilizadas e vitoriosas: a animação tradicional, no que se refere ao carisma dos
personagens, e a animação em stop-motion, pela tridimensionalidade das
formas tanto dos cenários quanto dos personagens.

Os próprios filmes de George Lucas e tantos outros passaram a ter a


contribuição da animação digital incorporada e integrada no que se refere tanto
a efeitos visuais quanto à estética do design. A busca da CGI pelo seu próprio
caminho tinha chegado ao seu destino.

42
Dessa forma, os filmes em computação gráfica puderam se distanciar tanto do
impositivo visual wireframe30, quanto do realismo, tendência natural pelas
possibilidades que tal ferramenta propiciava. O mesmo aconteceria com o estilo
cartoon dado a animação, porém mais colado com o acting para atores do que
as outras técnicas, talvez pelas próprias possibilidades de controle presentes na
animação da produção digital.

Contudo, esses ganhos evidentes são contrabalançados por uma


diminuição no conhecimento das habilidades e técnicas tradicionais no
setor, o que resulta em produções feitas com animação e efeitos
“padrão”. Resta esperança no fato de o público absorver novidades
rapidamente – enxergando além da estética pura e simples e exigindo
mais qualidade do que apenas efeito. (CHONG, 2011, p. 168)

Nessa mesma linha, outra vantagem competitiva de filmes de animação


realizados com a técnica 3D entra em outro aspecto da cadeia produtiva: o
licenciamento de produtos. Os personagens e objetos de cena já têm projetada
toda uma modelagem tridimensional, facilitando tanto a visualização de produtos
comercializáveis, quanto a própria produção dos mesmos, bem como a
aceitação e interesse do público. Tais aspectos propiciam outro aspecto
competitivo com a oferta de ações crossmedia, por exemplo, a criação de games.

Em vez de reproduzir os estilos desenhados ou de quadro a quadro,


os animadores digitais puderam experimentar os recursos das imagens
e da animação por computador, criando movimentos e formas
impossíveis ou impraticáveis nas outras técnicas.

A liberdade oferecida pela produção digital inclui a flexibilidade sobre o


design, que permite uma influência direta e uma integração mais fácil
com outras mídias, especialmente porque muitas mídias diferentes
também são produzidas ou montadas com ferramentas digitais.
(CHONG, 2011, p. 122)

Nesse aspecto, podemos observar que qualquer meio digital propicia a


proliferação de produtos criados nesse mesmo ambiente, o que deixa a
animação digital um passo à frente das demais técnicas em vários pontos, como
a utilização em aplicativos, mídias sociais e nas interfaces de todos os

30
Wireframe é o modelo na sua mais pura forma tridimensional, tendo como aspecto visual as
suas arestas e polígonos formando sua superfície.

43
incontáveis eletroeletrônicos dos tempos atuais, que acabam sendo maiores até
que o cinema e a televisão. A seguir, abordaremos aspectos mercadológicos da
animação tomando como base a Economia Criativa.

44
2.2. Economia Criativa

Conforme mencionado na introdução deste trabalho, a Economia Criativa vem


se tornando cada vez mais uma força transformadora, sendo um dos setores que
mais desponta em aspectos econômicos, segundo a UNESCO31. Mais do que
os crescentes resultados de geração de renda, criação de empregos e aumento
da exportação, a criatividade e a inovação, por parte de indivíduos e seus pares,
estão sendo largamente valorizadas.

A Economia Criativa é a geração de conteúdo criativo com valor econômico.


Diversos segmentos fazem parte desta economia, tais como música, design,
audiovisual, software e artes cênicas, entre outros. Os termos criatividade e
inovação, utilizados acima, mais do que credenciam a animação a fazer parte
desse grupo, tamanho o envolvimento das suas produções nos conceitos até
aqui apresentados, podendo estar inserida tanto no segmento audiovisual
quanto no de artes cênicas.

Ed Catmull, presidente da Pixar e da Disney, destaca que a criatividade ganha


força quando se torna uma atividade de grupo. Misturar, reunir e comunicar é a
ideia de comunidade de Steve Jobs, idealizador do edifício principal da Pixar,
onde toda essa interação foi projetada para acontecer. Para Catmull (CATMULL,
2015) a criatividade é mais forte se em grupo e os resultados são colhidos com
mais eficácia.

O início da atenção dada à Economia Criativa surge com o governo australiano


de maneira original e pioneira, com a divulgação do projeto Creative Nation, no
início da década de 1990, e com isso democratiza um conceito de Economia
Criativa. Quase em paralelo, em 1994, no Reino Unido, o Partido dos
Trabalhadores, com a criação do grupo de trabalho sobre Indústrias Criativas,
mapeia e mede a importância e o impacto das atividades deste novo setor para
a economia local.

31
Organização das Nações Unidas para Educação, Ciência e Cultura.

45
Tal iniciativa foi de grande valia para a compreensão da relação da Economia
Criativa com as políticas culturais. O partido respeita dois tipos de pressão
política e mantém o compromisso com princípios básicos de políticas sociais,
mas ainda tendo que se submeter à lógica do mercado. Como os trabalhistas
britânicos defendiam o amplo acesso da população à informação e aos bens
culturais, a nova política cultural do partido foi considerada perfeita. No discurso,
o termo “indústrias criativas” estrategicamente substitui “indústrias culturais”,
englobando diversas atividades.

A Economia Criativa, economia da cultura, acontece atualmente em escala


mundial e se define como um processo de valorização cultural cada vez maior
nas sociedades globalizadas. Governos de diversos países, bem como
organizações internacionais, têm despertado para a ideia da Economia Criativa
nas últimas três décadas por diferentes necessidades. Na maior parte das vezes,
seguem em busca de novos rumos para modelos de desenvolvimento
socioeconômico e cultural numa era pós-industrial. Os processos culturais são
importantes fontes de geração de emprego e renda e elementos fundamentais
na construção da diversidade cultural e identidade local, regional e nacional.

A ONU passa a considerar a Economia Criativa como alternativa para


desenvolvimento, deixando de lado o desacreditado e ultrapassado projeto
baseado na intensa industrialização de culturas locais, ressaltando o
comprometimento em sustentabilidade e meio ambiente desse novo modelo. A
consequência é a grande adesão de diversos governos de todo o mundo ao
conceito de criatividade, respeitando suas características históricas e culturais.

A criatividade de indivíduos ou de grupos sociais tem tido mais destaque nos


padrões econômicos do que o velho modelo de economia industrial baseado em
ganhos de produtividade e financeiros. Assim, a cultura se aproxima da
economia e da sociedade, mexendo com as estruturas de políticas públicas
culturais nas mais variadas definições de “criatividade”.

O termo “criatividade” tem sua definição direcionada para habilidade e talento


individuais, com seus produtos voltados para geração de empregos e riqueza. A

46
indústria criativa ampliava o conceito de “cultura” por agregar atividades que
antes eram do comércio ou indústria, devido à geração de ativos com
propriedade intelectual. O reconhecimento do trabalho imaterial recompõe a
economia das indústrias, que migrava para países com mão de obra barata.

Desta maneira, o centro do pensamento econômico e político deveria se voltar


para as indústrias criativas e suas produções, deixando de lado a distribuição e
consumo. As políticas públicas britânicas incluem nos seus objetivos uma
melhoria de condições para as indústrias criativas, ampliando seu potencial
competitivo no mercado mundial. Como todos os países têm “criatividade”, a
adoção de políticas públicas eficientes pode gerar transversalidade com a
economia global.

O governo brasileiro despertou para essa realidade após quase vinte anos e
seguiu nessa corrente, criando a Secretaria da Economia Criativa (SEC) em 1º
de junho de 2012, vinculada ao Ministério da Cultura do Brasil (MinC). Porém,
quatro anos depois, a recém-criada secretaria sofreu um retrocesso. Logo nas
primeiras ações na mudança de governo, em 2016, a pasta da Cultura voltou a
ser fundida com a da Educação como era anteriormente e, mais uma vez, passou
ao papel de coadjuvante, pois, historicamente, os recursos destinados à
educação sempre foram de valores astronomicamente maiores. Apesar desta
mudança radical e da perda de força da ação brasileira em direção à Economia
Criativa, este capítulo sobre os conceitos e os objetivos propostos pelo MinC e
pela SEC segue com a mesma importância, talvez até maior.

A pasta do MinC considera que os setores criativos são aqueles cujas atividades
produtivas têm como insumos principais a criatividade e o conhecimento,
caracterizados pela variedade infinita e pela abundância, ao invés de pela
escassez. O principal objetivo da SEC, em 2012, era o de implementar políticas
que envolvessem a Economia Criativa com propósito de crescimento econômico
e inclusão social, tendo a cultura como base.

Voltando um pouco no tempo e ao nosso território, curioso perceber que algumas


(poucas) vozes sobre os conceitos da Economia Criativa eram ouvidas no Brasil,

47
antes mesmo do despertar dos governos da Austrália e do Reino Unido. O
economista Celso Furtado marcou presença nesse campo. Ele apoiou a prática
criativa e destacou a importância das funções do estado na área da cultura.
Quando foi ministro da Cultura, em 1986, promoveu uma série de ações no
campo da política cultural, como os incentivos voltados à participação da
população na produção de cultura, visando ao fortalecimento de saberes locais
e gerando riqueza e reforço à cultura de diferentes grupos locais.

Furtado acreditava que a força criativa ajudava a afastar a ideia de que políticas
culturais deveriam se restringir ao consumo de bens culturais e que a inovação
surge quando a criatividade do povo aflora. Essa nova visão do papel da cultura
abria possibilidades de transformá-la em recurso, refletindo em crescimento
econômico e inclusão social. Com tudo o que se compreende das definições
sobre Economia Criativa, pode-se afirmar que o então ministro brasileiro foi um
visionário dessa inovadora economia do desenvolvimento que surgiria no mundo
logo na década seguinte.

Entretanto, os governos brasileiros que iniciaram o segundo período de governos


democráticos na década de 1990 descontinuaram por completo as direções
apontadas por Celso Furtado. Nesse período, o MinC ficou sem função efetiva
relacionada a políticas públicas culturais, tendo fracassado igualmente na
criação de um sistema eficiente de financiamento privado da atividade cultural.
Apenas recentemente, a Economia Criativa voltou a ter atenção das autoridades.

O novo modelo idealizado recentemente simboliza um movimento do MinC na


"redefinição da cultura no nosso país”. O texto de introdução do documento exibe
um novo papel do estado no âmbito da cultura e, consequentemente, uma nova
função para o Ministério da Cultura. Demonstra ainda ter percebido que a nova
tendência da economia praticada em diversos países se encaixa em vários
aspectos do país.

A conceituação de Economia Criativa do plano da SEC se difere da britânica por


uma questão relacionada aos diferentes níveis de desenvolvimento existente
entre os dois países. Enquanto no britânico as atividades criativas geram

48
propriedade intelectual, o plano brasileiro tem outra compreensão e recorre à
precariedade do atual estágio de desenvolvimento do país em ensino, mão de
obra e produção científica.

Após considerar a definição britânica com enfoque excessivamente


“economicista”, o MinC define as indústrias criativas como a comercialização de
bens e serviços de valor simbólico, deixando de lado a capacidade de produção
e exploração de propriedade intelectual.

Mesmo assumindo uma posição inferior, porém mais realista, se comparado ao


plano britânico, o PSEC32 se apresenta incapaz de ser gerido pelo MinC em suas
demandas nas diferentes indústrias criativas, tendo o ministério estrutura e
competência insuficientes para desafiadora tarefa. Sem mencionar a limitação
orçamentária da pasta, que tem dez vezes menos recursos financeiros do que o
ministério da educação, por exemplo.

A cultura fica submetida aos ousados objetivos de inovação (para as


possibilidades do país), sustentabilidade e inclusão social e tem a sua lógica
alterada, passando a cultura da margem para o centro econômico e político.

Segundo Ranieri (RANIERI, 2012), apesar dos avanços nesse campo, ainda há
muito a ser feito para que a Economia Criativa se torne um campo de práticas
capaz de gerar desenvolvimento socioeconômico para o Brasil. Ele reforça a
necessidade de estudos que explorem o tema da Economia Criativa brasileira e
os setores que a compõem.

Entre relatos de autores estudados, como Marchi (MARCHI, 2014), percebe-se


que a SEC está apenas no início, tanto na sua estruturação quanto nas ações,
e depende diretamente de movimentações políticas e equiparação orçamentária.
Mesmo neste cenário, a criação da SEC é uma realidade e expõe a necessidade
de uma revisão da relação entre Estado e cultura no âmbito do desenvolvimento

32
Plano da Secretaria de Economia Criativa.

49
socioeconômico e da inclusão social. Talvez esse seja o maior legado da criação
do plano a médio prazo.

Os autores defendem que, para a Economia Criativa deslanchar no país, são


necessárias políticas públicas culturais que visem ao desenvolvimento e à
democratização dos meios de produção. Para tal, a sociedade e os governantes
devem pensar e agir na defesa da continuidade de programas entre os
sucessivos governos para favorecer o amadurecimento e experiências de maior
duração nesse setor.

Tais ações são de suma importância para o sucesso do crescimento econômico


e aumento de renda tendo a cultura como base, reforçando valores como
solidariedade e democracia, e tendo o empreendedorismo criativo da população
estimulado e presente em todo o processo, onde o mercado da animação
brasileira está inserido.

50
2.3. Mercado da animação

Dando sequência aos aspectos econômicos, passamos para o campo do


mercado da animação mais especificamente. Vamos partir de uma abordagem
cronológica, apresentando pontos de destaque da própria história da animação
brasileira, mais voltados para acontecimentos do próprio mercado nacional, por
este ser um dos campos do presente trabalho.

Consideramos relevante a discussão sobre as alternativas encontradas por


produtoras de animação para a criação de séries para televisão, a partir das
oportunidades que surgiram com iniciativas de fomento, com as leis de incentivo
criadas e parcerias firmadas visando à produção e distribuição, acabando por
concorrerem com as grandes e tradicionais produtoras internacionais já
estabelecidas e tradicionalmente na vanguarda da indústria.

O mercado internacional é majoritariamente dominado por países da América do


Norte (Estados Unidos e Canadá), Europa (Alemanha, França e Inglaterra) e
Ásia (Japão). Os Estados Unidos se destacam dos demais por motivos como a
força do poder aquisitivo da população e pela indústria já estabelecida há muitas
décadas, tanto para o cinema quanto para a televisão, contando com estúdios
de grande porte nas produções. O Oscar, prêmio da Academia de Artes e
Ciências Cinematográficas33, condecora, quase exclusivamente, produções
norte-americanas como as melhores do cinema, tamanha é a qualidade dos
filmes produzidos por lá. Já na televisão, os grandes estúdios possuem, há
tempos, algo que falta aos brasileiros: expertise na criação e manutenção de
equipe própria, distribuição e vasta receita sobre licenciamento, entre outros
aspectos.

No Brasil, percebe-se que ainda impera a falta de continuidade nas produções,


impedindo o desenvolvimento local em diversos aspectos e atrasando o
crescimento da indústria local que está começando. Um destes aspectos pode
ser considerado a manutenção da equipe de profissionais. As iniciativas partem,

33
Em inglês, Academy of Motion Picture Arts and Sciences.

51
em maior número, por puro empreendedorismo de animadores (muitas vezes,
vocacional), confiando em suas ideias criativas e levando-as à frente.

Lembremos aqui que uma indústria audiovisual do porte da norte-


americana teve seu desenvolvimento comercial estimulado a partir de
políticas protecionistas que visavam salvar o cinema daquele país do
domínio europeu, sobretudo francês. Isso nos mostra que uma
indústria não nasce do acaso, mas depende do comprometimento
entre os setores público e privado. (NESTERIUK, 2013, p. 12)

A experiência do trabalho em equipe e o crescimento dos métodos produtivos


possibilitam uma melhoria de produção e descobertas inovadoras para um
estúdio adquirir mais vantagens competitivas, o que é praticamente dizimado
quando a “fábrica” passa a ser interrompida ao término de uma produção, muitas
vezes, quase voltando à estaca zero nessa busca quando, tempos depois, se
monta uma nova equipe.

O MinC considera imprescindível a contribuição do audiovisual para o


desenvolvimento econômico e social do Brasil, desde a criação artística até a
preservação, a renovação e a difusão da história e da cultura brasileiras, e, em
sua dimensão econômica, sua vasta cadeia produtiva. Segundo o ex-ministro da
Cultura Juca Ferreira, o Brasil tem hoje uma das mais robustas políticas públicas
para o segmento audiovisual no mundo.

Caminhamos para ser o quinto maior produtor do mundo nesse setor.


Esses números são resultado do talento, da organização e do
empenho de todos os brasileiros que ocupam a imensa cadeia do
audiovisual, e da realização de políticas públicas de fomento (MINC,
2015).

Apesar de o início das produções de animações no país datar de pouco antes


de 1920, há quase cem anos, poucas realizações aconteceram por iniciativa de
produtoras. Os filmes dependiam do esforço solitário dos animadores que, de
forma artesanal, acabavam sendo os responsáveis pelas próprias produções,
ficando as produções industriais do cinema de animação a cargo dos grandes
estúdios norte-americanos da primeira era de ouro.

52
Apenas recentemente, o panorama iria mudar no país, após avanços
tecnológicos que surgiram a reboque do boom da animação digital, por volta de
1995. Nesta época, o mercado de TV nos EUA já se encontrava estabelecido
com suas animações de curtos prazos de execução e orçamentos mais
modestos, se comparados às produções para o cinema, que dominavam o
mercado internacional.

A chegada da animação digital trouxe um aquecimento do mercado publicitário


para a animação nacional e a utilização de computação gráfica nos
departamentos de arte das emissoras de televisão, onde se encontravam
diversos animadores do mercado. Os demais segmentos da animação ainda
careciam de amadurecimento e passaram por uma fase difícil, mesmo com o
crescente surgimento de animadores se profissionalizando. Tais artistas se
envolviam em produções voltadas para os curtas-metragens autorais, que
dependiam de fomentos e editais do governo, o que gerava insegurança e
instabilidade na carreira profissional.

Após o surgimento das TVs nos lares, veio a publicidade como alternativa para
o desenvolvimento de mercado. Contabilizamos, atualmente, um total de 50
longas-metragens e mais de 50 séries de televisão já produzidos e finalizados.
Este número aumentou exponencialmente após o recente crescimento do
fomento às produções, leis de incentivo e editais regionais e nacionais de
diversos órgãos (FSA, BNDES, Riofilme – RJ, SEC-RJ, Prêmio Estímulo – SP,
Fundarpe – PE, CEMIG – MG e outros). Até então, a publicidade dominava o
mercado de animação no país. Apesar desse cenário, uma série de animadores
surgiu com produções experimentais autodidatas, figurando com destaque em
festivais de cinema no país.

Quase em paralelo à 2ª Era de Ouro da Animação, num momento complicado


na economia do país, surge um divisor de águas da animação brasileira. O
festival Anima Mundi é criado por quatro visionários e entusiastas da animação
brasileira: Aída Queiroz, Cesar Coelho, Lea Zagury e Marcos Magalhães. Os
quatro diretores se conheceram durante um programa de colaboração de
tecnologia firmado entre o Brasil e o Canadá no início dos anos 1980. Marcos

53
fez parte do grupo de professores, junto com outros canadenses, do National
Film Board of Canada. Sua experiência como animador visitante na produtora
canadense, bem como sua premiação no Festival de Cannes com o filme de
curta-metragem “Meow!”, foram, provavelmente, algumas das credenciais para
ocupar o posto.

A partir dessa empreitada inovadora dos quatro artistas, os animadores


passaram a ter uma janela de exibição e uma fonte de inspiração, passando a
ter a oportunidade de assistir uma diversidade de produções de várias partes do
mundo. Com o aumento de produção, vieram o crescimento do mercado
brasileiro e o surgimento de novos animadores, fazendo com que os órgãos
governamentais começassem a se mobilizar visando a fomentar o mercado que
surgia ou reaparecia. Vale destacar que a mídia passa a cobrir o evento, a ponto
de uma matéria de destaque passar a figurar anualmente no Fantástico, da TV
Globo, um dos programas de maior audiência do país, chegando a exibir curtas
do festival.

Tendo como objetivo formar público e fazer com que as produções de animação
sejam percebidas, a reboque o festival abre as portas para a confraternização e
reunião de animadores. Realizadores e profissionais, bem como aspirantes, de
todas as parte do país, passam a frequentar, se reunir e trocar experiências
sobre técnicas e processos de produção de seus filmes – e dos filmes que
assistem nas sessões do festival – durante o evento no Rio de Janeiro e,
posteriormente, também na cidade de São Paulo. Estes encontros podem ser
considerados como o embrião do que seria a ABCA, Associação de Cinema de
Animação do Brasil, fundada em 2003, dez anos após a primeira edição do
Anima Mundi.

Com a criação da associação de animadores, as reivindicações dos artistas


passam a ser representadas por uma classe junto aos órgãos públicos (e
também privados), ao invés de manifestações isoladas feitas por indivíduos. Em
2008, após atuação da ABCA junto ao MinC – Secretaria do Audiovisual,
envolvendo ainda a TV Brasil e a TV Cultura entre outros, é lançado o

54
ProAnimação, um programa público/privado ambicioso, que tinha como objetivo
sedimentar uma indústria de animação no país.

O ProAnimação, Programa Nacional de Fomento à Animação Brasileira, era


composto por duas etapas. A primeira etapa, denominada ProAnima, consistia
em fomentar o desenvolvimento de capacitação, produção, difusão e distribuição
da animação produzida em todo o território nacional e no exterior. A outra era
voltada para pesquisar e mapear a produção nacional, para se entender qual era
o potencial produtivo do setor.

Com verba girando em torno de R$ 4 milhões, o ANIMA TV foi projetado para


financiar a produção de episódios-piloto de dezessete séries de animação com
duração de onze minutos por episódio, cada um tendo que criar a sua própria
bíblia34 de comercialização. Complementando o objetivo de fomento ao
desenvolvimento, o programa capacitava os profissionais envolvidos nas fases
de produção e venda das séries.

Um concurso foi realizado após a criação dos projetos-piloto e dois projetos


foram transformados em série: “Tromba Trem”, do Copa Studio, e “Carrapatos e
Catapultas”, da Zoom Elefante. Outros três projetos viraram série após um
tempo. Inicialmente, foram inscritos 257 projetos representando ideias e criações
de dezessete estados brasileiros. Até o momento, as séries seguem sendo
exibidas nos canais de TV. Já a etapa voltada para a pesquisa foi suspensa e
jamais foi realizada até hoje.

O ano de 2007 pode ser considerado o início das séries de animação brasileiras,
com “Peixonauta”, da TV Pinguim, e “Meu Amigãozão”, da 2DLab, entre outros
casos de sucesso do recente inaugurado mercado. Estas encontraram na co-
produção internacional o seu modelo de negócio ideal para a realização de suas
produções, sendo exportadas para o mundo inteiro desde então.

34 A bíblia de comercialização possui textos resumidos contendo a apresentação geral da série,


descrição das personagens principais, sinopses técnicas de cerca de cinco episódios, a arte da
série (cenários, objetos de cena, logo etc.) e o contato dos responsáveis. Trata-se de um primeiro
documento, que é apresentado pelo autor e/ou produtor proponente da série para produtores e
executivos de estúdios interessados na realização do projeto. (NESTERIUK, 2011).

55
As produções pelo país continuaram a crescer durante a década, alavancadas
por dois acontecimentos em um curto espaço de tempo. O primeiro foi o
lançamento da Lei 12.485. Datada de 2011, a lei obriga que os canais de TVs
fechadas (pagas) incluam na sua grade de programação uma cota de produção
nacional, influenciando diretamente no aumento da produção de conteúdo
realizada por produtoras brasileiras.

O segundo ocorreu dois anos depois, quando o Governo Federal anunciou


investimentos de mais de um bilhão de reais no programa Brasil de Todas as
Telas, tendo como fonte financiadora o Fundo Setorial do Audiovisual (FSA)35.
Os objetivos do programa giram em torno dos pilares fundamentais para o
desenvolvimento da área, tais como desenvolvimento de projetos e formatos de
obras brasileiras; produção e difusão de conteúdos brasileiros no cinema e na
televisão; capacitação e formação profissional; e implantação e modernização
de salas de cinema (FARIA, 2015).

No início dessas empreitadas, as produtoras sofreram com a falta de experiência


no processo de toda a cadeia produtiva. Naqueles anos, séries de animação
envolvendo co-produção já eram utilizadas em diversos países, porém os
produtores brasileiros ainda estavam engatinhando, precisando de uma chance
para mostrar trabalho. Sem um respaldo de caso de sucesso para apresentar
sua capacidade de entrega e profissionalismo com o cumprimento de prazos, os
animadores/empresários tiveram que arregaçar as mangas para apresentar suas
ideias com alto nível de qualidade na busca de convencer investidores e
parceiros a comprarem suas propostas, tanto no Brasil quanto no exterior.

Segundo GATTI, GONÇALVES e BARBOSA (2014), três produtoras que nesses


primeiros anos despontaram na batalha por séries de animação, a Flamma, a TV
Pinguim e a 2DLab, tiveram diferentes modelos de negócio no que se refere ao
direito de roylaties. A manutenção ou cessão da propriedade intelectual
envolvida nos personagens da série para geração de renda através de

35
Fundo Setorial do Audiovisual.

56
licenciamento de produtos foi usada como moeda de troca em cada caso de
forma específica na busca de co-produção e investimento. O licenciamento é de
suma importância, respondendo por uma boa fatia do faturamento das séries.

A Flamma trabalhou seu projeto “Princesas do Mar” com ideias próprias e co-
produção com Austrália e Espanha para a produção das animações. Os direitos
de propriedade do projeto foram fatiados entre as três produtoras de acordo com
suas entradas nos territórios de maior relacionamento, conseguindo, assim,
realizar a série. Nenhum recurso brasileiro foi utilizado no negócio.

A TV Pinguim, com o seu projeto “Peixonauta”, utilizou o artigo 39 da


CONDECINE36 para viabilizar a produção das animações no próprio país,
somando recursos próprios e financiamento adquirido junto ao BNDES. A
propriedade intelectual da série foi mantida com a produtora. No caso da 2DLab,
seu modelo de negócio também envolveu recursos nacionais e foi semelhante
ao da TV Pinguim no que se refere à manutenção de propriedade intelectual dos
personagens.

Todas tiveram passagem pelo MIPCOM37 procurando alavancar co-produções e


contratos de distribuição pelo mundo todo, sem tirar o olho do mercado de
distribuição e exibição brasileiro com seus canais de televisão, uma janela já em
franco crescimento na época.

Assim, a troca de experiências com as produtoras do exterior, trazendo a


expertise de que os brasileiros careciam, aliada à certeza da produção e
realização de suas séries, foi o modelo ideal encontrado pelas produtoras
naquele momento inicial de produção de séries animadas no país.

Com experiência e longevidade dos projetos, aumentaram as possibilidades de


inovação na criação de novos (e mais maduros) modelos de negócios e

36
CONDECINE é a Contribuição para o Desenvolvimento da Indústria Cinematográfica
Nacional (www.ancine.gov.br/pt-br/condecine).
37
MIPCOM é o mercado mundial de conteúdo de entretenimento para todas as plataformas.

57
processos de produção para os projetos seguintes. No que se refere a vantagens
competitivas, os três casos apresentaram:

(...) a convergência de duas fontes de vantagem competitiva. A


primeira ligada a fatores internos às produtoras estudadas
(conhecimento técnico e visão do negócio/mercado) e a segunda fonte
ligada a fatores ambientais, criados pela cadeia produtiva dessa
indústria (criação de novos canais de TV, interesse de parceiros
internacionais e linhas de financiamento para a produção). (GATTI,
GONÇALVES, BARBOSA, 2014, p. 489).

Os governos de diversos países despertaram para a geração de empregos e


divisas no que se refere à Economia Criativa. No mercado da animação nacional,
por exemplo, a busca por profissionais aumentou 104% no período de 2004 a
2014, enquanto os salários do segmento cresceram 8% (FIRJAN, 2014). Apesar
do incremento na demanda por profissionais, o salário médio sofreu um leve
acréscimo, se comparado com outros setores, e segue abaixo da média dos
profissionais da Economia Criativa (SEC, 2012).

O fenômeno da reorganização do mercado de trabalho no Brasil tem,


então, suscitado a necessidade de se buscar maior articulação das
diversas políticas de emprego, e entre elas e as políticas
macroeconômicas. Também deve ser vislumbrada a necessidade de
aprimoramento das instituições que regulam o mercado de trabalho de
modo a torná-lo mais adaptado à nova realidade. (TAFNER, 2006 p.
426).

A facilidade ao acesso a equipamentos e a tecnologia para produzir animação


pode ser considerada a responsável pela tendência de crescimento, bem como
a queda de custos das etapas do processo nos últimos tempos.

Hoje, a tecnologia está disponível para o público e para o criador,


aumentando as expectativas e o desenvolvimento da prática industrial.
A simplificação das ferramentas permitiu seu uso por uma quantidade
maior de usuários, não apenas animadores e profissionais da área,
mas pessoas interessadas em áreas diversificadas da arte e do design.
Isso dá a oportunidade para a reintrodução de técnicas de animação

58
desenvolvidas nas origens das imagens em movimento e a adição de
novas influências de práticas antes díspares. (CHONG, 2011, p. 168).

O mercado do audiovisual teve seu desenvolvimento impulsionado pela criação


de leis de incentivo governamentais, bem como através de programas de
fomento, editais e o Fundo Setorial do Audiovisual (FSA).

Também contribuem para o desenvolvimento do mercado as leis de incentivo


governamentais, por meio de programas de fomento ao setor audiovisual, editais
e o Fundo Setorial do Audiovisual (FSA). Outro fator que merece destaque
refere-se ao aumento da demanda de distribuidoras e canais de televisão por
conteúdo nacional (filmes, séries e animações), decorrentes da Lei da TV Paga,
Lei 12.485/11, já citada anteriormente.

Com modelos de negócio e vantagens competitivas adotados, as séries


brasileiras foram aos poucos penetrando num mercado geralmente ocupado
pelos estúdios estrangeiros. Com as medidas que garantiam a janela de exibição
de produtos nacionais nos canais de televisão brasileiros através de cotas e
diferentes possibilidades de investimento e financiamento em suas produções, o
mercado voltado para a TV atingiu patamares de sucesso inimagináveis uma
década atrás, o que destoa dos resultados de bilheteria dos filmes brasileiros no
País. Entretanto, no exterior, os filmes brasileiros têm conquistado cada vez mais
reputação, conseguindo se destacar em festivais e premiações em diversos
países nos últimos anos.

No que se refere às clássicas produções de filmes de longa-metragem para o


cinema, há décadas produzidas em escala industrial nos EUA, Maurício de
Souza se destaca neste segmento comercial no Brasil. Dos 44 filmes produzidos
até 2017 no país, o criador da Turma da Mônica produziu cinco filmes com seus
personagens, sendo assim um dos principais responsáveis da difusão da
animação nos cinemas nos anos 1980 – outros quatro filmes do empresário
viriam nas décadas seguintes.

59
Boa parte dos filmes comerciais produzidos no Brasil, quase a metade, foi
realizada nos últimos quinze anos. Trabalhos mais autorais marcam presença,
se opondo (sem que seja de forma proposital) ao estilo Disney e apresentando
uma vocação nata dos animadores locais a criações autênticas.

O destaque fica a cargo de “O Menino e o Mundo”, filme criado e dirigido por Alê
Abreu. O filme é o longa-metragem de maior sucesso, premiado dezenas de
vezes em festivais por todo o mundo, tendo como ápice a indicação ao Oscar na
categoria animação. Antes de Alê Abreu, somente um brasileiro havia atingido
este feito. Em 2003, Carlos Saldanha concorreu como co-diretor de “A Era do
Gelo”, produzido pela Blue Sky Studios. Como a maior parte das produções do
cinema americano, o orçamento dos dois filmes era completamente diferente. O
filme de Alê Abreu foi comercializado em quase noventa países, um marco para
o cinema brasileiro, não só para filmes de animação, mas para o cinema nacional
como um todo.

As produções norte-americanas e da Europa Ocidental levam considerável


vantagem sobre os filmes produzidos no Brasil até mesmo no território deste
país, começando pela distribuição dos filmes. O marketing promocional que
envolve o lançamento de filmes comerciais norte-americanos acaba roubando
espaço nas salas de cinema de forma desigual, restando poucas sessões para
serem disponibilizadas para as produções nacionais.

Um exemplo recente de caso de sucesso em bilheterias, relatado por Marcos


Buccini (BUCCINI, 2017), se refere ao filme “Lino”, de Rafael Ribas. Distribuído
pela Fox Film do Brasil, o filme teve a receita de mais de R$ 2 milhões, batendo
o recorde de lançamento de um filme animado no país, com mais de 115 mil
expectadores. Apesar de “Emoji Movie”, produção norte-americana, ter atingido
o triplo de ingressos vendidos, o feito do filme de Ribas merece destaque.
Podemos perceber o quanto é importante fechar um bom acordo de distribuição
para o sucesso do filme, contando, sem dúvida, com a qualidade da história e da
produção como um todo.

60
No aspecto de vantagens competitivas, o Brasil está na frente dos mercados
asiáticos, estes fortes na execução de filmes por encomenda, sem que se
fortaleçam e capitalizem sobre a geração de propriedade intelectual e divulguem
cultura e valores locais através da realização de filmes autorais próprios.
Segundo Cesar Coelho, o Brasil vem sendo percebido no cenário mundial como
autor, deixando como legado, para os ainda muito jovens, personagens e heróis
que serão lembrados quando atingirem a idade adulta (COELHO, in BUCCINI,
2017).

Há pouco mais de dois anos, em uma carta aberta lida no encerramento do


Anima Mundi 2015, de autoria da Associação Brasileira de Cinema de Animação
(ABCA), consta que, pelo terceiro ano seguido, um filme brasileiro sagrou-se
vencedor do Festival Internacional de Cinema de Animação de Annecy38, na
França, considerado um dos maiores festivais de animação do mundo. Depois
dos longas “História de Amor e Fúria”, de Luiz Bolognesi, em 2013, e “O Menino
e o Mundo”, de Alê Abreu, em 2014, “Guida”, curta-metragem de Rosana Urbes,
recebeu o prêmio da crítica e o prêmio de melhor curta de estreia em 2015. “Este
reconhecimento legitima a história da animação no Brasil, é preciso dar
continuidade a este projeto, e acredita-se que isso só será possível com um forte
incentivo ao curta-metragem”, aponta a carta.

O Anima Mundi, presente em toda a trajetória do desenvolvimento da animação


no Brasil, tem como grande estrela o curta-metragem, formato que permite a
pesquisa e a experimentação de linguagem como arte plena e livre. É a partir do
curta que se revelam novos talentos e que se forma uma cinematografia sólida
e diversa. Mesmo os grandes estúdios, como Pixar e Disney, usam o formato
como pesquisa e oxigenação de novas ideias. “Precisamos aproveitar este
momento único em que vive a animação brasileira e ampliar o fomento à
produção de curtas-metragens, para desenvolver nossa linguagem e acima de
tudo nossa identidade. O mundo da animação está olhando para o país e
lutamos para que os órgãos responsáveis pelo apoio cultural tenham consciência
dessa importância e retomem os incentivos ao formato”.

38
Festival de Animação de Annecy, França, um dos mais antigos e importantes do mundo.

61
Coincidência ou resultado do conteúdo da carta, em fevereiro de 2016, a ABCA
foi chamada para debater com o Banco Nacional de Desenvolvimento
Econômico e Social (BNDES) sobre o edital para curtas de animação que há
anos estava parado. Em nove de maio do mesmo ano, o site Tela Viva publicou
a notícia de que o Edital de Cinema 2016 do BNDES contemplaria pela primeira
vez curtas-metragem de animação.

Possivelmente impulsionado pelos recentes sucessos da animação brasileira em


seus eventos citados acima, o Festival de Annecy anunciou que terá o Brasil
como tema da edição 2018, elevando o patamar da animação brasileira no
cenário mundial, segundo o site da ABCA.

Atualmente, muitos projetos têm sido criados a partir de diferentes modelos de


negócio, principalmente no que se refere a mídias e plataformas utilizando o
cyberspace. A internet tem funcionado como meio multifuncional em várias fases
da cadeia produtiva do audiovisual na busca de inovação e vantagem
competitiva de forma independente. Animadores buscam empreender da mesma
forma que os criadores do Festival Anima Mundi e os pioneiros nas séries
televisivas no Brasil. No sentido de ilustrar essa busca, seguimos apresentando
o projeto “La Noria”, um projeto de curta-metragem criado pelo animador Carlos
Baena, internacionalmente reconhecido pela qualidade da sua animação e pelo
empreendedorismo no ensino on-line. O investimento para a produção foi gerado
a partir de plataforma de crowdfunding, formato cada vez mais utilizado em
projetos inovadores.

62
2.4. Inovação em modelo de negócio

Frequentemente, nos deparamos com muitas definições de inovação. As mais


vistas se referem ao efeito ou a ação de inovar ou ainda remetem ao que é o
novo, coisa nova, novidade. Os autores Joe Tidd, John Bessan e Keith Pavitt
(TID, BESSAN, PAVITT, 2008) afirmam que a inovação é especialmente
aprendizagem. Esta aprendizagem pode se dar pela obtenção ou pela
exploração do conhecimento de maneira estratégica ou ainda pela aquisição e
reforço de padrões de comportamento (rotina) que permitam que ocorra a
aprendizagem de construção da competência.

Um dos fatores fundamentais na gestão da inovação é a habilidade de


estabelecer relações, detectar oportunidades e saber aproveitá-las. A tecnologia
é fundamental quando se trata de opção radicalmente nova. É possível se
reinventar a partir de uma mudança tecnológica ou aplicá-la em produtos e
processos já estabelecidos de maneira que gere melhorias. O sucesso das
empresas está cada vez mais atrelado à capacidade de inovação. A vantagem
competitiva pode ser o tamanho ou o patrimônio de uma empresa, mas é
substancial e evidente que o cenário é volátil e favorece as organizações que
conseguem mobilizar conhecimento e avanços tecnológicos na concepção do
novo (TIDD, Joe; BESSANT, John; PAVITT, Keith, 2008).

Hoje, ter acesso a pessoas talentosas e criativas está para os negócios


assim como ter acesso a carvão e minério de ferro estava para a
siderurgia (FLORIDA, 2011, p. 06).

Para que um profissional seja reconhecido por possuir estas duas


características, criativo e inovador, a sua trajetória costuma contemplar vários
projetos e organizações, até adquirir reconhecimento suficiente e capacidade de
definir (ou ter influência) sobre sua própria trajetória. Não existindo um
reconhecimento formal (diploma, curso, certificado) para criatividade e inovação,
o “valor de mercado” de uma carreira depende da reputação do profissional; seu
objetivo passa a ser o de construir um nome, uma “marca própria”. Ele precisa
ser perspicaz para fazer a gestão da própria carreira, habilidade improvável de

63
adquirir apenas na trajetória acadêmica. Bendassolli e Wood (2010) sugerem
que, para controlar a própria carreira, o profissional necessita dominar três
competências.

(...) primeiro, o know-why, ou seja, conhecer as razões e os


motivadores intrın
́ secos de suas escolhas para construir a sua própria
identidade profissional, de forma que possa ser reconhecida pelos seus
pares e pela sua audiência (ARTHUR; ROUSSEAU, 1996; JONES,
2002; SCHEIN, 1993; REIS, 2007; THROSBY, 2001b); segundo, o
know-how, ou seja, dominar os recursos pessoais, cognitivos, afetivos
e técnicos capazes de levá-lo a atingir seus desejos e objetivos
(ARTHUR & ROUSSEAU, 1996); e, terceiro, o know-whom, ou seja,
saber construir e manter redes sociais para projetar sua imagem e
conseguir trabalho (REIS, 2007; SHORTHOSE; STRANGE, 2004,
p.264).

Figura 1 – Ilustração de La Noria. (BAENA KORELLIS, 2014).

Uma característica da Economia Criativa e de muitas atividades praticadas no


cyberspace39 é o trabalho colaborativo e seus múltiplos objetivos. O curta-
metragem intitulado “La Noria”, dirigido pelo premiado animador Carlos Baena,
é um exemplo de projeto com diversas vertentes e desdobramentos possíveis.

39
Espaço cibernético; o ambiente da internet.

64
O projeto apresenta fortes traços da Economia Criativa no que se refere a
territórios e produções locais voltadas para o global, com trabalho coletivo
fortalecendo profissionais que realizam a sua fatia do trabalho de seus próprios
territórios. Porém, a união desses territórios ocorre no cyberspace, sem ser um
espaço físico, mas sim virtual, portanto um território em outra dimensão.

Para uma maior compreensão da riqueza cultural desta produção, podemos citar
que os colaboradores são pessoas de diversas nacionalidades, que residem em
diferentes locais e trouxeram para o projeto bagagens culturais e experiências
organizacionais as mais variadas.

Esta deve ser entendida como a forma organizacional e territorial da


criatividade, que diferentemente do passado quando era relacionada à
capacidade individual, o dom de um gênio, atualmente passa a ser
compreendida como uma competência construída coletivamente.
(FIGUEIREDO, 2015, p. 31).

Por se tratar de um filme de animação em computação gráfica 3D tendo a


internet não só como elemento agregador de profissionais de diversas partes do
planeta, mas como engrenagem, pode-se dizer que o projeto está alinhado aos
conceitos de modelos inovadores praticados recentemente no meio da
tecnologia da informação. A criação de rede de profissionais, a prévia
experiência do diretor em negócios on-line e a popularização de um software de
gerenciamento são alguns dos outros pontos que merecem destaque.

Estamos passando por um período de rápidas mudanças na


sociedade, comandadas pela revolução digital e a integração de
pessoas e negócios por meio das redes sociais e da internet. Hoje
converter informação em conhecimento por meio de redes vivas e
sustentáveis é mais importante do que acessar bases de dados de
informação. (DUBEUX, 2015. P. 127).

Um filme de animação pode ter diferentes modelos de negócio e fontes de receita


para financiar a sua produção, sendo que a maioria é baseada em trabalho
remunerado, como no antigo modelo fordista. Alguns poucos têm como base a

65
permuta ou o trabalho colaborativo sem remuneração neste mercado. No que se
refere ao formato da produção, o filme de longa-metragem possui uma janela de
exibição consolidada há muitos anos, enquanto o filme de curta-metragem sofre
para chegar a salas de exibição de massa, muitas vezes, ficando limitadas aos
festivais de cinema. Dessa maneira, a procura de financiamento para um filme
de curta-metragem por parte dos realizadores tem se voltado para os novos
modelos de negócio emergentes da Economia Criativa, sendo o crowdfunding40
uma alternativa eficaz tanto no Brasil como no exterior.

A tecnologia permite a expansão da produção e distribuição desses


bens e serviços, e amplia o acesso de pessoas aos meios de produção,
viabilizando o potencial criativo das pessoas, que cada vez mais se
organizam em rede. (FIGUEIREDO, 2014, in DUBEUX, 2015, p. 130)

Podemos considerar as produções de curta-metragem com importância de


destaque na cadeia produtiva do audiovisual por trazerem, em diversas
ocasiões, ideias inovadoras e realizações criativas, frequentemente assinadas
por artistas independentes. Tais filmes, muitas vezes, apresentam novos
conceitos visuais e narrativos, podendo atingir resultados de inovação e
relevância no mercado audiovisual de tal forma que passam a ser considerados
referências estéticas e culturais no meio criativo, passando a influenciar tanto
artistas e cineastas independentes quanto publicitários.

Entretanto, poucas são as iniciativas que conseguem aproveitar tais


características e a oportunidade de inovar e empreender ao mesmo tempo. O
projeto do filme “La Noria”41 faz parte dessa minoria. Mais do que criar
propriedade intelectual com a realização do filme, percebe-se que o projeto tem
a inteligência competitiva implícita desde seu formato inicial. O autor Carlos
Baena42 é proprietário de uma escola on-line internacionalmente reconhecida no

40
Financiamento coletivo on-line.
41
La Noria, do espanhol, significa roda gigante.
42
Carlos Baena é cineasta e animador nascido na Espanha. Sua sólida carreira conta com
passagens por renomados estúdios, como a Industrial Light & Magic, Paramount Pictures e Pixar
Animation Studios, em filmes como Star Wars: Episódio II, Procurando Nemo, Os Incríveis, Cars,
Ratatouille, Wall-E e Toy Story 3. Por seu trabalho no filme Cars, Carlos recebeu um Annie Award
em 2007. Baena também é co-fundador do Animation Mentor, Escola de Animação On-line.

66
meio da animação e computação gráfica, desde sua fundação no início dos anos
2000. Baena aproveita esta oportunidade para divulgar com mais abrangência
um software de gerenciamento de informações e projetos no ambiente digital de
propriedade da sua escola on-line quando propõe a utilização do mesmo na
produção do filme, quase que criando um case para o produto.

Sendo assim, este artista/empresário, ao mesmo tempo, cumpre o seu papel de


realizador e demonstra toda a sua visão de mercado perante as demais escolas
concorrentes ao juntar duas marcas, Artella43 e o curta “La Noria”, ancorando o
software de gerenciamento de produções on-line à super-produção do curta-
metragem. Artella é uma plataforma criada pela escola de animação on-line
Animation Mentor, uma das precursoras do gênero e uma das melhores desde
a sua fundação, em 2005. Artella visa simplificar este tipo de produções com
comunicação integrada, gerenciamento de arquivos e ferramentas de revisão. O
software é encarregado de gerenciar os itens produzidos, arquivos gerados
pelos softwares de produção de arte, animação, som e finalização. Por fim, o
software não apenas fornece uma plataforma para produções distribuídas, mas
também ajuda a conectar as pessoas criativas.

Ao optar por captação via crowdfuding, podemos considerar este como o


primeiro aspecto competitivo do visionário Baena, pois este formato já tem uma
grande divulgação na campanha, atingindo seu público-alvo com vasta
abrangência e, mais, colocando-o como protagonista da realização do projeto.
Nos tempos atuais, em que a Economia Criativa vem ganhando o espaço do
antigo formato fordista da Economia Industrial, uma boa parte dos serviços e
negócios tem se baseado na internet.

A Economia Criativa deve ser compreendida pela sua capacidade de


mobilizar produtivamente o saber, a cultura, o conhecimento, a
criatividade das pessoas para a produção de um bem ou de um serviço,
cujo principal atributo de valor é simbólico, intangível, uma vez que tem
origem cultural e cognitiva, e não material. (FIGUEIREDO, 2015, p. 31)

43
Artella vem da língua galega (língua românica falada na Galiza, Espanha) e significa “articula”.

67
A busca por alta qualidade na realização e apuro visual do filme é prontamente
percebida na pré-produção apresentada no projeto. “La Noria” pretende trazer
uma nova visão para os filmes de animação por explorar, ao mesmo tempo,
temas sombrios, estilo visual elegante e produção utilizando tecnologia de
produção on-line.

Mas há uma esfera importante da expressão cultural que está sendo


profundamente transformada pela tecnologia digital e pela Internet: a
arte. (BOYD at AL., 1999).

Figura 4 – Ilustração de La Noria. (BAENA KORELLIS, 2014).

A história é sobre um menino que gosta de desenhar e de construir rodas


gigantes de brinquedo. Depois de uma perda devastadora, o menino passa a
encontrar algumas criaturas que viram a sua vida de cabeça para baixo.
Segundo os produtores, “La Noria” traz uma nova visão para o cinema de
animação ao explorar temas sombrios, estética visual elegante e produção
utilizando tecnologia de produção on-line. (BAENA, KORELLIS, 2014).

Para a produção, foi necessária uma série de conexões para garantir a


realização de reuniões via internet em diferentes fusos horários. Pode-se afirmar
que o design se destaca como disciplina de necessidade indispensável para
esse modelo de produção.

A ideia de concentração de competências distintas como forma de


incentivar a produção de novos conceitos, produtos e técnicas para a

68
produção de soluções está presente na história da humanidade desde
as primeiras formas de organização social. (REIS FILHO, 2015, p. 18).

Observando o projeto em sua totalidade, percebe-se que seus realizadores


conseguem diversas finalidades com o mesmo produto, conforme citado mais
acima. O projeto consegue produzir um filme de curta-metragem como
expressão artística, como peça de divulgação de competências e
interconectividade de profissionais do setor, bem como permite ao público
visualizar desdobramentos para um filme de longa-metragem, um seriado de
animação e/ou um game. Desta forma, entende-se que todos os envolvidos
saem ganhando.

Enquanto no século XX a comunicação era focada na informação, na


transição atual nota-se uma trajetória mais global e holística, em que
se destaca a Economia Criativa. Nela, quanto mais criativo torna-se o
funcionário a partir de seu conhecimento e de sua conectividade, mais
destaque ele tende a receber em sua área de atuação (SANTOS-
DUISENBERG, 2008, in KAMLOT, in TEIXEIRA; CORRÊA, 2015, p.
66).

Em produções de países como os Estados Unidos, onde o cinema de animação


já é industrializado, tais etapas já foram amplamente experimentadas e
consolidadas, mesmo havendo um grande desafio em cada novo projeto. A
qualidade de animação segue em alto padrão e todo o investimento que possa
ser voltado para essa fase do processo é muito bem-vindo, pois é um diferencial
competitivo tanto na indústria internacional quanto no mercado emergente
brasileiro.

69
3. Acting e produção em animação

3.1. Processo de produção

Em projetos de animação, um fluxograma de etapas e fases e suas inter-relações


são normalmente chamados de pipeline de produção. As etapas têm como ponto
de partida uma lista de tarefas a serem realizadas em todo o processo durante
várias fases, suas dependências e suas entregas, levando em consideração a
realização de diferentes pesquisas (artística ou tecnológica), produção de
material, apresentações dos resultados para supervisores, comentários
propostos e realização de ajustes para a criação de um cronograma.

No início da criação dos curtas-metragens do Estúdio Conseqüência, do qual o


autor desse projeto foi um dos fundadores, ele e outros diretores tiveram a
oportunidade de acompanhar as primeiras pipelines do processo produtivo dos
filmes da Pixar, no website deste renomado estúdio. Por meio da experiência,
eles aprenderam como se realizava o fluxo de trabalho. Tal exemplo de processo
de animação foi seguido pela produtora brasileira nos seus primeiros passos de
criação de filmes.

Na época, em 1999, a pipeline de produção de filmes de animação era


semelhante a que temos hoje em dia. Apesar de ser bastante útil para iniciantes
em animação digital, o material divulgado era voltado para o público em geral
tendo, portanto, pouco aprofundamento do desdobramento das etapas,
principalmente sobre acting. Nos dias atuais, o panorama continua o mesmo em
boa parte da literatura e material divulgado. Sendo assim, buscaremos
apresentar as etapas e fases de produção, suas interdependências e o desenho
de produção ilustrado ao final do capítulo.

A compreensão das etapas em todas as escalas deve ser analisada, bem como
a compreensão do processo que se desenha. Pouco efeito seria alcançado ao
se produzir um fluxo de informação que fosse de difícil compreensão, o que só
afastaria o usuário de utilizá-lo e o aproximaria de cometer erros,
comprometendo a produção. Dessa forma, os profissionais envolvidos na

70
produção devem compreender do que se tratam as etapas anteriores e
posteriores, no sentido de colaborarem com o bom andamento do projeto e evitar
perda de material por erros de fluxo de informação e perda de arquivos. O
produtor é o responsável por garantir esse fluxo.

Os conceitos de múltiplas formas de organização de dados podem


impactar no emocional que isso pode ter na mensagem.
Apresentações de informação podem sempre seduzir, às vezes no
conteúdo, mas sempre na apresentação visual. O mais importante é a
sua forma e habilidade de comunicar com clareza. (SHEDROFF, 2009,
p. 35) [Tradução do autor]

No que se refere à realização de trabalhos on-line, levando em consideração o


avanço das possibilidades de utilização da internet, as produções em
computação gráfica passaram a contar com este recurso, aproximando
profissionais de diversos lugares do planeta. Enquanto projetos de geração e
manipulação de imagens estáticas solicitam o tráfego de apenas um arquivo
(apesar de em altíssima resolução), os projetos em animação precisam de 24 a
30 imagens por segundo produzido, aumentando exponencialmente o trânsito
de arquivos na internet quando processado à distância em render farms44
virtuais. Nesse caso, a troca de arquivos se dá desde o envio dos arquivos
criados nos softwares 3D, até o envio das imagens processadas (renderizadas).

Com a cada vez maior viabilidade de plataformas como o YouTube exibirem


filmes e vídeos em alta definição (HD e Full HD), a quantidade de pixels dos
arquivos de imagem gerados tem acompanhado esse crescimento, o que acaba
por aumentar o tamanho dos arquivos em quantidade de bytes45. O desafio atual
relacionado a produções no cyberspace está na etapa de render, que consiste
no processamento das imagens.
O processo de produção de uma animação comercial pode variar de acordo com
alguns aspectos. Um destes aspectos se refere ao seu formato. O produto pode

44
Render farm se refere a uma série de computadores ligados em rede dedicados para a
renderização (processamento) de imagens geradas através de computação gráfica.
45
Um byte é composto por oito bits, este a menor unidade de medida do tamanho dos arquivos
na memória do computador. Assim como um quilômetro (km) é equivalente a mil metros, um
kilobyte (kb) são mil bytes e assim sucessivamente.

71
ser um filme de longa-metragem, curta-metragem, séries de televisão, comercial
de televisão ou internet, ações para um game, entre outros.

Outro destes aspectos é a mídia, que também influencia da mesma forma este
processo. Uma animação pode ter as salas de exibição como saída final, bem
como a internet, todo o universo mobile ou consoles de games. Cada um desses
macro-aspectos (projeto e saída) influencia diretamente o desenho de produção
do projeto.

As produções sofrem influência tanto do orçamento quanto da finalidade dos


empreendimentos e seus objetivos de marketing. Na verdade, as produções são
resultantes deles. Tais quesitos influenciam diretamente no tamanho da equipe,
tempo de realização e condições de produção. Outros aspectos produtivos giram
em torno da experiência dos profissionais envolvidos, do momento de
maturidade da produtora e dos principais responsáveis pela realização do
projeto, o que acaba por ampliar a variação de modelos de produção até aqui
apresentada.

Cada estúdio tem a sua própria linha de produção de acordo com o perfil da
produtora, experiência adquirida, formato de projetos que costuma tocar e
recursos financeiros destinados. A cada nova produção, o processo se torna
mais apurado, permitindo um controle cada vez maior, melhor acompanhamento
de orçamento e um alcance de nível técnico e artístico mais apurado. O avanço
tecnológico de ferramentas de planejamento e acompanhamento de produção
contribui nesse sentido.

Visando a um direcionamento na apresentação do processo de produção de


animação, as produções de filmes de longa-metragem comercial serão
priorizadas, bem como a técnica 3D, precursora da nova Era de Ouro da
Animação e, possivelmente, a mais utilizada nas produções atuais desse
formato.

Animação em computação 3D é a mais revolucionária forma de


produzir filmes de longa-metragem desde a introdução da cor. A força

72
da computação tem um ilimitado potencial para transformar a arte da
realização de filmes, fornecendo a artistas e técnicos ferramentas para
levar as visões mais fantásticas de vida para a tela. (WEISHAR, 2002,
p. 6) [Tradução do autor]

Vale aqui ressaltar que, das quatro grandes etapas do processo de produção
(desenvolvimento, pré-produção, produção e pós-produção), apenas a fase de
produção propriamente dita se diferencia substancialmente entre as técnicas,
sendo as demais etapas muito similares às utilizadas em CG46.

Quando a animação do personagem é bem-sucedida e a audiência fica


completamente entretida, é porque os personagens e a história
tornaram-se mais importantes e evidentes do que a técnica em que foi
realizada a animação. Seja desenhado à mão ou pelo computador, o
sucesso da animação de personagens reside na personalidade dos
personagens. (LASSETER, 1887, p. 43) [Tradução do autor]

Sendo assim, no que se refere a diferentes aspectos produtivos, consideraremos


um modelo padrão de produção para apresentarmos as etapas do processo
produtivo, levando em consideração a experiência do autor na produção de
trabalhos de curta duração.

3.1.1. As etapas de produção

Semelhante ao cinema ao vivo, os filmes de animação têm quatro macro etapas


de produção: desenvolvimento, pré-produção, produção e pós-produção. Em
diversos momentos, as etapas se interpolam e, muitas das vezes, são uma via
de mão dupla de (retro)alimentação de informações, conteúdos e inputs
criativos.

De uma maneira geral, a gênese de um filme começa por uma ideia. O primeiro
desafio é encontrar uma boa ideia, uma boa história, com personagens
interessantes, ter um conceito. No aspecto comercial, ideias e histórias que
agradem ao público. Tendo uma boa história, bons personagens, uma
compreensão coesa do mercado e público-alvo desejado, bem como uma

46
CG: abreviação de computação gráfica, animação digital.

73
apresentação de projeto atraente e bem trabalhada, o filme possui requisitos
básicos para ser apresentado para um comprador/investidor.

A origem das ideias pode surgir de diferentes fontes. Podem ser ideias originais,
ideias adaptadas de outros formatos, como livros, contos, músicas, ou mesmo
ideias de domínio público. A vantagem de se produzir um filme com uma história
já conhecida (como as adaptadas) está relacionada ao fato de que, de alguma
forma, o resultado já foi testado e os personagens já são conhecidos do público.
Já nas novas ideias, o personagem e seu universo serão apresentados para o
público pela primeira vez.

A ideia pode vir de um autor ou diretor, que partirá para viabilizá-la, ou mesmo
de um produtor, que formará uma equipe para desenvolvê-la. Neste caso de
ideias originais, a criação de propriedade intelectual é um forte ativo e moeda de
troca do projeto, apesar do risco de ser um universo novo, sem ter sido testado
e experimentado com o público.

Apesar de todo o desafio envolvido nessa aposta, a geração de propriedade


intelectual (PI) é um dos maiores objetivos de um projeto comercial de animação,
conforme citado nos capítulos iniciais deste trabalho. Já em projetos autorais,
onde o diretor é o próprio autor, este objetivo pode continuar existindo, porém
seu peso é bem menor e as pesquisas de aceitação e possibilidades de
aproveitamentos posteriores passam a ter outra abordagem no projeto, o que
normalmente já ocorre em filmes de curta-metragem. Mesmo assim, muitos
projetos de longa e de séries para televisão surgiram através da criação de
personagens e histórias completamente independentes.

Numa abordagem mercadológica, vale citar que um material para venda do


projeto e busca por um investidor/comprador do filme, contendo o conceito,
personagem e história, tanto textual quanto visual, deve ser cuidadosamente
desenvolvido e preparado para apresentação. Após a escolha da ideia, formato,
público e forma de financiamento do filme definido, a primeira etapa de produção
está pronta para ser iniciada.

74
Esta fase é chamada de etapa de desenvolvimento. Ela começa com a formação
da equipe criativa principal, que irá permanecer até o final do projeto, composta
pelo produtor, pelo escritor e pelo criador da ideia. Nos aspectos visuais, juntam-
se a equipe o diretor, o supervisor de efeitos visuais, o designer de produção, o
diretor de arte e artistas de concept art47.

Contando com esses profissionais, as movimentações iniciais são desenvolvidas


no que se refere à criação da história propriamente dita e aos aspectos visuais
dos personagens, cenários e todo o universo do filme. Dependendo do tamanho
da produção, os profissionais de arte podem ocupar mais de uma função no time
inicialmente. Para se atingir um trabalho de qualidade, o funcionamento e
desempenho de todos em equipe são tão importantes quanto a qualidade
artística e criativa dos indivíduos.

As etapas fundamentais de roteiro e desenvolvimento visual devem ser tratadas


em contato, uma auxiliando a outra. Dependendo da característica do projeto,
uma etapa pode conduzir a outra. Por exemplo, se os personagens e cenários
são mais importantes e predominantes em relação à história, o roteiro seguirá
as características criadas pelos concept artists. Nos casos em que a história é
mais marcante, os aspectos físicos dos personagens e o design dos cenários e
props48 serão conduzidos pela força do texto. Um equilíbrio de importâncias,
muitas vezes, pode acabar sendo o mais indicado.

Em relação à parte textual, a ideia do projeto é trabalhada inicialmente para se


alcançar o conceito da história, criar um fio condutor do filme, apresentar uma
ideia clara de objetivos. Na sequência, uma storyline49 é produzida para resumir
e organizar as ideias principais em poucas palavras, em uma frase apenas. Em
seguida, a sinopse da história é produzida contendo a trama principal da história,
de forma que se possa apresentar, em um parágrafo, o filme de uma maneira
abrangente.

47
Concept art se refere às artes produzidas na conceituação de filmes, oriundas de qualquer
técnica.
48
Props são objetos de cena que se referem aos personagens. Exemplo: uma espada do
personagem ou seu carro.
49
Storyline é o resumo da história de um filme em uma frase.

75
Antes da produção do roteiro propriamente dito, um argumento e uma escaleta
são criados. O argumento passa a dar forma à história e apresenta um resumo
das ações, contando a trama de forma literária, em forma de conto. Em seguida,
uma escaleta é produzida para apresentar um resumo do que será o roteiro,
dividindo a história de forma cronológica em sequências e cenas pela primeira
vez.

Estas tarefas permitem que produtor, diretor e roteirista estejam com as ideias
claras e alinhadas de como será o filme, discutam sobre a criação e avaliem a
produção. Em seguida, o roteiro começa a ser produzido por um ou mais
roteiristas, apresentando a divisão de cenas, diálogos e descrições técnicas da
estrutura da história. Nesta etapa, as cenas são descritas informando a
locação/cenário e, de preferência, contendo uma primeira ideia de diálogo.

No que se refere à imagem, o desenvolvimento visual se volta para a


conceituação do universo da história, os personagens envolvidos na trama e
suas características físicas e psicológicas, bem como os cenários e o clima50 em
que o filme se passa. Os profissionais envolvidos nessas etapas são o designer
de produção, o diretor de arte e o designer de personagens.

Um dos objetivos iniciais desta equipe é definir o estilo do filme. Dependendo


das ideias iniciais para o desenvolvimento visual, uma pesquisa mais objetiva é
produzida. Caso o estilo ainda esteja indefinido, uma pesquisa inicial deve ser
realizada com diferentes artistas, buscando uma variedade de possibilidades
artísticas e conceituais até se chegar a um conceito final que atenda as
expectativas e orientações do diretor e do produtor. O tamanho da equipe de
artistas dependerá do orçamento planejado para esta etapa.

Nas produções de primeira linha, viagens a localidades semelhantes as do filme


em produção são realizadas com a equipe criativa. Os artistas observam todos
os tipos e escalas de detalhes, possibilitando uma imersão no universo proposto

50
Clima, humor. Do inglês, mood.

76
e gerando inúmeros insights criativos e peças de pura arte que servirão de
inspiração no desenvolvimento do universo da história.

Esta fase de desenvolvimento deve ser muito bem resolvida para se ter o melhor
aproveitamento possível das premissas visuais do projeto, evitando, assim,
retrocessos nas etapas posteriores de produção, caso haja uma decisão de
aprovação precipitada. Uma fase de desenvolvimento mal realizada pode fazer
com que o diretor, o produtor ou o investidor solicitem que a produção, já numa
etapa mais avançada, volte algumas casas para corrigir erros de conceituação.
Neste caso, tempo do cronograma e verba do orçamento são desperdiçados.

Vale destacar que quanto melhor for o resultado alcançado nas fases iniciais,
mais chances de talentos se interessarem para trabalhar no projeto. Sendo
assim, o investimento em profissionais competentes deve ser considerado já nos
primeiros passos do projeto. E os talentos vão desde concept artists e
animadores, até atores que “emprestam” suas vozes e performances para os
personagens.

Um aspecto positivo que pode ser destacado se refere ao marketing através do


contato com a imprensa e o público-alvo. Com o projeto em andamento e a
divulgação das imagens, os futuros espectadores acompanham o andamento do
filme e aumentam suas expectativas para a conclusão do trabalho.

No que se refere ao acting, estas etapas influenciam na criação da


personalidade, comportamento e riqueza de detalhes de cada personagem, o
que será discutido, no próximo capítulo, mais especificamente.

Ao final desta etapa de desenvolvimento, o material produzido dará subsídios


para a etapa posterior destinada à pré-produção. De posse do roteiro pronto e
com o desenvolvimento visual conceituado e aprovado, um planejamento de
produção é desenvolvido pela equipe criativa e técnica, passando para o papel
toda a visão que o produtor tem sobre o projeto.

77
Após analisar o nível de complexidade de cada etapa e das necessidades do
projeto, uma estimativa de cronograma, com etapas, tarefas e duração das
etapas, é gerada pela equipe executiva, definindo quais profissionais são
necessários para a realização do filme.

Na fase de pré-produção, duas frentes de produção se abrem: o editorial e o


design. Ambas têm como base o material da etapa de desenvolvimento. O
editorial trata inicialmente da criação dos storyboards e dos voice talents,
produção das vozes dos personagens, cabendo ao design toda a produção
visual do filme. Essas duas trilhas podem ser vistas no esquema da pipeline de
produção mais à frente neste projeto de pesquisa.

O design e a direção de arte têm como objetivo criar um style guide, que se trata
de um inventário dos aspectos visuais do filme em forma de um livro, semelhante
ao aspecto artístico de uma bíblia de produção para projetos voltados para séries
de televisão.

A partir da realização de minuciosa pesquisa buscando autenticidade e


qualidade artística pertinente ao estilo e estética definidos, a equipe de artistas
cria o design dos personagens, dos cenários e dos props através de desenhos,
pinturas e esculturas (artesanais e digitais), definindo os elementos visuais que
fazem parte do filme. O design de efeitos visuais segue a mesma premissa.

No que se refere à cor, o departamento de arte desenvolve a escala macro do


clima do filme. Um grande painel semelhante ao de apresentação de storybords
é criado, formando um color script das sequências. Essa visão geral do filme
quanto às sensações transmitidas através de cores, possibilita que o diretor e a
equipe criativa observem se o ritmo que está sendo proposto está alinhado aos
objetivos do roteiro. Desta forma, o diretor e o produtor podem avaliar o mood do
filme e realizar os ajustes que julgarem necessários. Vale destacar que
historicamente a cor sempre foi um elemento de destaque nas produções de
filmes de animação.

78
Seguindo as informações macro em produção no color script, artes são
desenvolvidas e detalhadas ao mesmo tempo, com o objetivo de estudar tons
claros e escuros dos personagens e cenários banhados pelas luzes propostas,
ajudando a definir a direção de iluminação desejada para cada cena. Outro
aspecto relacionado à cor se refere ao design de cor dos personagens, cenários
e props. Todas as cores dos elementos são estudas e definidas, tanto para o
equilíbrio de cada um isoladamente quanto em conjunto.

De posse do material produzido, um style guide é editado, servindo de base tanto


para pesquisa e desenvolvimento das tarefas posteriores do próprio
departamento de design, quanto para a criação do storyboard, responsabilidade
do departamento editorial e que será explicada posteriormente neste capítulo.

Neste momento, o departamento de design passa a se concentrar na criação


dos elementos digitais que fazem parte da narrativa visual do filme. Após a
realização de pesquisa sobre desafios relacionados a aspectos técnicos de CG
que sejam relevantes e cruciais a estas tarefas, os personagens, cenários e
props são modelados e preparados para serem animados (rigging/articulation).
Em paralelo, as superfícies dos modelos digitais são tratadas para apresentarem
visualmente a textura e propriedades projetadas no style guide.

Todos os modelos articulados dos personagens e props são submetidos a testes


de animação para serem aprovados para animação. Ao mesmo tempo, são
gerados modelos de baixa resolução para serem utilizados nas primeiras
montagens de layout 3D. Os layouts são criados para se ter uma pré-
visualização das cenas animadas, oriundas do animatic, por sua vez, gerado
pelo departamento editorial.

Os profissionais envolvidos neste departamento seguem auxiliando na


supervisão das etapas posteriores, porém sua maior contribuição é coroada com
a montagem do layout 3D / pré-visualização, quando se encontra com o editorial
do filme. O outro ponto de contato mais marcante com o outro departamento
durante a linha de produção se refere ao style guide, conforme citado mais
acima.

79
O departamento editorial segue na pipeline, cuidando da espinha dorsal da
narrativa do filme e trabalhando em paralelo com a cinematografia do filme e a
atuação dos personagens através da criação do storyboard e da produção das
vozes dos personagens.

A escolha dos atores que irão interpretar os diálogos do roteiro pode ser
considerada uma das etapas mais cruciais na produção de um filme de
animação. As vozes que são gravadas são nada menos do que o resultado da
qualidade de atuação e interpretação do ator e servem posteriormente como
inspiração e material-guia para a criação do acting nas cenas animadas pelos
animadores, tornando este um momento decisivo, de suma importância.

O produtor e o diretor fazem uma pesquisa para descobrir atores que tenham
características em sua voz semelhantes às definidas para os personagens. Um
segundo passo deve ser a realização de testes utilizando material já existente
dos atores que julguem mais pertinentes para tal papel. Num momento posterior,
o ator é convidado a fazer alguns testes com base em trechos do roteiro, até que
a direção se sinta segura da escolha.

Porém, num primeiro momento, antes mesmo da definição dos atores, as vozes
são escolhidas e gravadas provisoriamente por membros da equipe de produção
do filme. Esses primeiros testes ajudam na avaliação do roteiro e no
desenvolvimento do timing e atuação que os diretores pretendem para o projeto.
Posteriormente, tais vozes são editadas junto com os desenhos do storyboard,
colocados sequencialmente no storyreel51, e servem de material auxiliar nas
reuniões criativas de interpretação com os atores convidados. Em alguns casos,
as interpretações dos membros da equipe são consideradas tão boas e
integradas à proposta que acabam sendo escolhidas como vozes finais,
normalmente para personagens secundários, ficando a cargo de atores as vozes
dos personagens principais.

51
Storyreel: filmagem do storyboard. Edição dos desenhos do storyboard com timing das cenas.

80
Em paralelo à produção das vozes, o filme vem sendo montado
cinematograficamente. Partindo do roteiro fechado e do style guide criado pelo
departamento de design, o storyboard do filme começa a ser produzido. Nesta
etapa o diretor procura passar o máximo de inovação na narrativa visual,
respeitando o estilo e a estética escolhidos para o filme. O diretor propõe
diferentes enquadramentos, perspectivas, escolhas de lentes de câmera,
composição da cena e componentes visuais básicos da imagem em prol da
narrativa.

Desde o início dos Estúdios Disney, os storyboards são utilizados para


conceituar visualmente como se pretende contar a história. A leitura das
sequências dos desenhos é um excelente recurso para verificar se a história que
está sendo produzida funciona e quais partes precisam de ajustes. Esta é uma
excelente etapa para se investir tempo e recursos visando a maximizar a
comunicação da história e resolução de problemas que existam no roteiro.

Primeiramente, são desenhados thumbnails com poucas indicações de


expressão facial, com indicações das linhas principais dos cenários pouco
detalhados. Posteriormente, o artista aumenta o tamanho do campo de desenho
e parte para explorar os cenários e detalhar as poses e expressões faciais.

De posse do roteiro, das vozes provisórias e com o storyboard desenhado, um


storyreel começa a ser editado. As vozes são colocadas em ordem sincronizadas
com as imagens do storyboard, de acordo com a cronologia do roteiro. Esse é o
momento em que o filme começa a ser editado e a sequência de acontecimentos
é apresentada em movimento pela primeira vez.

Com o elenco de atores definido e contratado, a etapa de gravação das vozes


pode entrar em produção. Os produtores organizam sessões de ensaio,
preparação e, finalmente, a gravação das vozes. Os detalhes do desenho de
produção desta etapa variam em cada produção, mas é comum que diretores de
atuação sejam contratados para ajudar na execução destas tarefas,
principalmente na interpretação e nas sessões de gravação propriamente ditas.

81
Durante os ensaios, os atores passam a ter um contato mais aprofundado com
os outros personagens e como eles são interpretados, ajudando na preparação
do próprio personagem que estão interpretando. Os testes também servem
como laboratório para o diretor avaliar o quanto o roteiro está funcionando ou
carece de ajustes. Quanto melhor estiver o roteiro e a interpretação espontânea
dos atores, mais próximo do fim estará o ensaio.

As sessões de gravação propriamente ditas são o resultado de toda a


preparação do ator para interpretar o personagem para o qual foi escalado,
contando para isso as sessões de ensaio com os diretores. A qualidade
alcançada dependerá da capacidade do ator de interpretar as emoções contidas
no roteiro através da voz e da capacidade do diretor de expor para o ator com
clareza para qual direção a atuação deve seguir.

As sessões de gravação das vozes devem ser filmadas para que o material seja
utilizado como fonte de pesquisa e inspiração para os animadores. É
fundamental que o diretor de animação e o supervisor de animação, líderes de
equipe, estejam presentes nas sessões e vivenciem a interpretação dos atores.

Interessante imaginar como essas sessões de gravação de vozes com atores


pode remeter às antigas novelas de rádio existentes no Brasil, que utilizavam as
interpretações e atuações dos artistas para contar histórias e entreter o
imaginário dos espectadores, neste caso, nunca chegando a se transformar em
imagem.

No aspecto técnico, o material gravado é editado e encaminhado para o editorial


dar sequência a montagem do filme através do animatic52, que será explicado
em seguida.

Podemos considerar que o resultado de toda esta etapa seja ao mesmo tempo
uma síntese do que se planeja para o acting do personagem e uma base

52
Animatic é uma evolução do storyreel. No animatic, os animadores criam os desenhos
principais que conceituam a cena (keyframes e breakdowns), conceituando o timing, acting e
enquadramento das cenas, tomando o storyboard como base.

82
fundamental para o que se pretende quanto a qualidade e possibilidades para
os animadores realizarem as animações dos personagens do filme.

Esse panorama apresentado considera o melhor dos mundos no que se refere


à indústria na qual o filme está sendo produzido, o orçamento disponível e a
reputação da produtora e do próprio filme que esteja sendo desenvolvido. A força
dos envolvidos no projeto e o material textual e visual que esteja sendo
desenvolvido são muitas vezes decisórios nas fases de contato com os atores e
seus representantes na busca de envolvê-los no filme. Normalmente, os atores
convidados para interpretar as vozes dos personagens principais são escolhidos
visando agregar valor ao projeto e fortalecer os aspectos de marketing do
projeto, sempre respeitando os requisitos artísticos e técnicos propostos pelos
executivos do filme.

Na etapa do animatic o filme começa a ganhar corpo. A edição que é iniciada no


storyreel com poucos desenhos por segundo, estes aproveitados do stoyboard,
passa a ser detalhada no animatic, muitas vezes chegando a ter fluidez na
animação semelhante a filmes com a técnica de animação tradicional. Quanto
mais detalhes o diretor e o editor puderem explorar, mais claras estarão a história
do filme e a animação que deverá ser realizada pela equipe de animadores de
CG.

No animatic, a equipe editorial e de animadores busca representar vários tipos


de informação visual e de movimento, tais como a pose e a linha de ação do
personagem, expressões corporais e faciais, perspectiva da cena e abertura da
lente da câmera, antecipação e acomodação do personagem. É nessa etapa que
se fundamentam o timing das cenas e a pose dos personagens.

Outro aspecto importante do animatic se refere à continuação da edição. Nesse


momento, o editor conta com uma quantidade bem maior de imagens referentes
às ações que ocorrem nas cenas e com mais detalhes de atuação do que no
storyreel para poder melhorar o nível de qualidade da edição.

83
A trilha sonora do filme começa a ser produzida a partir do animatic. Seguindo a
mesma ideia da produção de vozes, inicialmente é produzida uma trilha sonora
provisória para ambientar a edição dos desenhos contendo os diálogos do
roteiro, música temporária e efeitos provisórios. Após o encerramento da fase de
produção e edição das imagens, a equipe de som produz a trilha sonora final,
tomando como base a trilha temporária e a edição final do filme.

O animatic permanece em constante atualização, recebendo os resultados


parciais das cenas animadas. A edição do animatic passa a ter diferentes níveis
de finalização de cenas, ora com desenhos, ora em renders53 provisórios ou
finalizados. Podemos considerar que a etapa de animatic passa a ser chamada
de edição nesta fase da produção. Esta edição pode ser usada para realizar
testes do filme junto ao público-alvo, precisando ressaltar o aspecto visual do
animatic para evitar um choque nos espectadores quando estes assistirem
cenas alternando entre desenho e CG.

A etapa de pré-visualização e layout do filme tem o animatic como base para


uma maximização do aproveitamento do ambiente 3D, posicionamento e
animação de câmeras, bem como escolha de lentes e perspectivas. Nesta fase,
os modelos produzidos pelo departamento de design são montados e testados
cena a cena, preparando os ambientes para serem animados e iluminados. Esse
será o arquivo recebido pelo animador para dar vida aos personagens.

Após a produção do animatic e o layout/pré-visualização criados pelos


departamentos de design e editorial, a fase de pré-produção se encerra, tendo
esse material produzido como ponto de partida para a fase de produção, que
começa com as etapas de animação e iluminação.

Um material que vem sendo cada vez mais utilizado por animadores de CG como
referência para animar seus personagens é a filmagem de atuação. Dependendo
do desenho de produção, essa etapa pode ser realizada num momento anterior

53
Render é o processamento de geração de imagens em pixels, transformando os arquivos
tridimensionais com modelos, cores e iluminação em arquivos bidimensionais, iguais aos que
são gerados por uma câmera digital ou de um telefone celular.

84
ao animatic, servindo, assim, como inspiração para a própria criação dos frames
desenhados do animatic. Neste caso, os animadores acabam contribuindo mais
efetivamente para as decisões acerca do acting do filme.

Utilizando o animatic como base, animadores e membros da equipe são filmados


atuando nas cenas em que seus personagens aparecem. Os animadores se
preparam de forma semelhante a que é feita por atores e realizam a filmagem
das suas performances e de seus pares. Posteriormente, os movimentos e as
expressões corporais e faciais são analisados e tomados como referência e
inspiração para a produção das animações de seus personagens.

Alguns animadores que têm conhecimento de técnicas de atuação em artes


cênicas conseguem atingir um alto nível de interpretação, tornando suas
filmagens de extrema importância no resultado das animações de seus
personagens.

Durante a análise das filmagens, o animador busca compreender o movimento


no que se refere à fluidez e poses principais (keyposes), bem como qual parte
do corpo conduz o movimento e quais partes do corpo chegam antes nas
keyposes. Junto com a análise, o animador executa pequenos desenhos
(thumbnails) representando suas conclusões e esboçando as keyposes que
serão inicialmente “desenhadas” na cena em 3D.

Esta preparação é fundamental para evitar dúvidas sobre como deve ser a
animação do personagem, perda de tempo, problemas no processo e queda de
qualidade de acting do personagem. Depois de ter essas questões esclarecidas,
o animador está pronto para trabalhar no software de CG. Nesse sentido, muitas
vezes, o animador se reúne com o responsável pela supervisão da cena, discute
suas escolhas de acting e toma nota das conclusões tiradas.

No aspecto técnico, as cenas são animadas a partir de arquivos gerados na


etapa de layout. Os animadores recebem as cenas com as câmeras ajustadas e
animadas, os cenários modelados e posicionados, com os personagens prontos
para serem animados.

85
Já no ambiente 3D, o animador começa realizando uma “blocagem”54 da cena,
criando as poses principais (keyposes) que planejou na preparação, colocando
cada uma das poses no tempo que foi estudado com as filmagens de referência
das ações. Esse é o primeiro checkpoint que deve ser apresentado para o
supervisor de animação. Após a aprovação do blocking, o animador parte para
refinar a animação.

O processo de animação é algo particular para cada animador, porém muitos


dos que trabalham nas grandes produções de animação utilizam alguns dos
mesmos procedimentos, como os Princípios Básicos da Animação Tradicional55,
independente da técnica com que trabalhar. Como a produção de cenas
animadas é um trabalho comprovadamente árduo e caro, os processos são
desenvolvidos no sentido de evitar desperdício de trabalho, criar etapas claras
de checkpoints de validações durante a produção e alcançar um acting de alto
nível.

Após o blocking trabalhado e refinado atingindo o timing e as poses desejadas,


o animador passa a trabalhar os intervalos das poses principais (inbetweens)
“soltando” as curvas de animação que estavam anteriormente travadas para o
estudo estar concentrado na pose e no timing. A sincronia labial do diálogo é
trabalhada no personagem, seguida do detalhamento da animação facial das
partes do rosto que já haviam sido esboçadas na etapa de blocking. Entre as
etapas de animação dos inbetweens e das expressões faciais, uma nova
validação do supervisor deve ser considerada.

Após os ajustes finais de animação, a cena é apresentada para nova avaliação


e comentários. Todo o tráfego de aprovações e ajustes deve ser computado pelo
produtor do projeto referente a orçamento e tempo de produção. Depois de
aprovada, a cena é enviada para a etapa de finalização de personagem, quando

54
Blocagem consiste em criar uma animação com poses com espaçamento de tempo visando a
avaliar o funcionamento da atuação e animação antes de detalhar uma quantidade maior de
poses na animação.
55
Princípios Básicos da Animação Tradicional, assunto tratado no capítulo sobre acting.

86
aspectos complexos de CG relacionados aos modelos são adicionados. Alguns
desses complicadores geralmente são pelos, cabelos, roupas e simuladores de
movimento.

Então, a cena é enviada para o layout final, onde o modelo final do personagem
é colocado no lugar do provisório. O cenário tem suas texturas e cores aplicadas
e preparadas para a fase que vem a seguir, a iluminação. O diretor confere a
câmera e a composição da cena para verificar se a cinematografia planejada
está funcionando ou se necessita de ajustes. Os props que estejam faltando são
colocados no ambiente.

Em paralelo à produção da animação, o departamento de iluminação e pintura


de cenários 2D desenvolve os aspectos visuais desta etapa de produção. Os
modelos entregues pelo departamento de design e as indicações do visual
desenvolvido para o filme são utilizados para a produção da iluminação das
cenas e as artes para matte painting56.

A etapa de iluminação de um filme de animação utilizando a técnica 3D é


semelhante a de um filme em live-action, bem como a de um filme em stop-
motion. As luzes são posicionadas da mesma forma, buscando os mesmos
objetivos, sendo que em CG a produção é feita em um ambiente virtual. As luzes
são colocadas nos arquivos criados no layout final e são ajustadas até atingirem
o resultado planejado no style guide. O diretor e o diretor de arte acompanham
a produção, comentam e têm a palavra final na aprovação das tarefas.

O processo de finalização da iluminação tem suas peculiaridades, algumas


vantajosas, outras nem tanto. Um dos aspectos complicadores é o tempo de
processamento da imagem (render) necessário. Por outro lado, o controle de
iluminação e composição que se tem numa produção em CG é invejável.

Toda a cena que é iluminada passa por um planejamento de subdivisão de


elementos para serem renderizados separadamente e posteriormente montados

56
Matte painting consiste em pinturas utilizadas como pano de fundo de uma cena, integradas
ao ambiente, simulando um cenário real condizente com a estética do filme.

87
em um software de composição de imagens e efeitos, com funcionamento
semelhante ao popular programa de edição de imagens Photoshop, porém com
uma linha do tempo e recursos para produções de imagens em movimento.

Após a iluminação das cenas animadas, a produção do filme segue para a


composição e o render final. Durante a etapa de composição, os efeitos visuais
são trabalhados e inseridos na composição de imagens.

Na fase de composição, os elementos são inseridos em um software de


composição em diferentes camadas (layers). O objetivo é integrar visualmente
as camadas para que pareçam ter sido “filmadas” numa única tomada. O
conceito visual escolhido para cada cena serve como guia, levando em
consideração o destaque necessário para os elementos principais das cenas,
normalmente os personagens principais. Com o filme fechado e suas cenas
renderizadas, a etapa de pós-produção pode ser iniciada. Esta etapa tem a
criação, tratamento e ajustes de áudio como maior objetivo de contribuição para
o filme.

Podemos considerar que todas as etapas, fases e tarefas orquestradas e


realizadas na produção dos filmes de animação têm no resultado da atuação dos
personagens seu ponto mais importante, comunicando a emoção da história
para os espectadores, assim como a atuação do ator está para um filme de live-
action.

Em seguida, apresentamos o desenho da pipeline de uma produção em


animação digital sobre as fases detalhadas no presente capítulo. Na imagem
podemos perceber de maneira clara como as fases da produção fornecem inputs
para as próximas fases. Importante notar como as informações criativas
referentes a imagens e texto vão se convergindo até chegarem à espinha dorsal
da produção, no início da etapa de produção com a fase da animação.

A representação criada teve como base o material do referencial bibliográfico do


capítulo e a experiência profissional do autor.

88
3.2. Acting em animação

Uma história existe quando alguém tem algo para contar para alguém ouvir.
Pode ser algum acontecimento vivido, presenciado, imaginado ou observado.
Algumas das histórias podem interessar para muitas pessoas, para plateias
inteiras, por exemplo. Por entendermos que uma investigação sobre o acting
começa bem antes da etapa de produção de animação propriamente dita,
iniciamos esse capítulo destacando uma das principais finalidades de um filme,
que se refere a contar e comunicar uma história para o público.

Contudo, muito do que foi aprendido teve valor nos cinemas por várias
centenas de anos e continua a ser válida sempre que exista
comunicação com um público. (JOHNSTON, THOMAS, 1981, p.9)

De uma maneira geral, histórias são sobre personagens, sobre os objetivos dos
personagens e seus conflitos. O público se entretém quando entende e se
identifica com uma história contada de forma verdadeira e real, simplesmente
porque as histórias de ficção são um espelho do cotidiano das pessoas,
acostumadas a vivenciar suas rotinas. Portanto, é necessário construir um
universo autêntico e contextualizado com o tema da história – que gira em torno
de algum personagem ou situação – e comunicá-los da forma mais realista
possível.

O personagem deve estar contextualizado no universo da trama, representando,


no decorrer do filme, suas características psicológicas (internas) e físicas
(externas) de forma integrada, para os espectadores perceberem sentido no que
se passa com o personagem no ambiente proposto. Se as ações dos
personagens forem mal interpretadas pelos atores, a plateia perde o interesse
em assisti-las e o filme deixa de ser um entretenimento para o público, perde o
motivo. O personagem deve parecer real dentro do contexto, possibilitando ao
público conexão e imersão na história que está sendo contada.

Qualquer que seja o personagem, um ser humano, um animal, um objeto


inanimado ou um ser extraterrestre, se as características humanas (human
conditions) forem abordadas, a platéia pode se reconhecer no personagem e

90
criar empatia por ele. Dessa forma, as pessoas entendem as características e
atributos do personagem, se veem nele como seres humanos e passam a se
importar com as suas buscas pelos seus objetivos e superações. Um exemplo
que pode ser dado é o personagem Remy, o carismático ratinho de “Ratatouille”,
da Disney-Pixar.

As ações (ou reações) dos personagens são resultados de suas necessidades


em alcançar seus próprios objetivos, desejos e motivações, que vão sendo
comunicados para a plateia durante a trama, que reage dando atenção ao
personagem. Para comunicar as ações dos personagens e contar suas histórias
de forma convincente, técnicas de atuação e animação são utilizadas pelos
atores e animadores nas produções de filmes e animação.

3.2.1. Memo Disney

Podemos apresentar Walt Disney como pioneiro na busca pelo acting na


animação de personagens. O que comprova essa afirmação é um memorando
escrito por Walt Disney em meados da década de 1930 destinado a Don
Graham, professor de desenho da companhia, no qual relata a direção a ser
seguida nas aulas destinada aos animadores.

No documento, Disney apresenta uma orientação para um aprofundamento


inicial no comportamento real do ser humano antes de direcionar para o caricato
estilo cartoon e os princípios de animação praticados no estúdio. Como disse
Disney, “Definitivamente, eu sinto que nós não podemos fazer coisas fantásticas
baseadas no real, a menos que primeiro conheçamos o real“. (DISNEY, in
JOHNSTON; THOMAS, 1981, p.71)

Na década 1930, uma série de procedimentos de animação que vinham sendo


desenvolvidos e praticados nos Estúdios Disney foi formalizada internamente na
produtora, sendo denominados os Doze Princípios da Animação, e publicados
tempos depois no livro Illusion of Life, de Frank Thomas e Ollie Johnston. Disney

91
participou intensamente na construção dos personagens e na criação do estilo
cartoon de animação da produtora.

De uma maneira geral, a maioria dos doze princípios de animação desenvolvidos


nas animações da Disney tem como base o comportamento humano real. No
entanto, esses aspectos reais sofrem a influência da utilização de um exagero
adotado no estilo cartoon dos filmes realizados nos Estúdios Disney, alterando
e deformando os desenhos dos personagens nas cenas animadas para que se
tornem mais cômicos e caricatos.

Voltando para o memorando, os objetivos de Disney giravam em torno de ampliar


a visão dos animadores sobre diversos aspectos de interpretação e atuação,
como a busca por observar as razões pelas quais os personagens devem se
mover de determinada maneira. Análises relativas ao exagero nas atuações e
interpretações cômicas, bem como o que conduz essa faceta hilária dos
personagens, faziam parte dessa reflexão.

Outro ponto que pode ser destacado se refere ao equilíbrio do corpo relacionado
ao exagero na forma dos personagens (como o personagem deve ser
representado no desenho) e à ação interpretada por eles nas cenas. Estudos da
representação do peso do personagem, expressão corporal e silhueta são
apresentados no texto como fundamentais para representar a história através
das ações dos personagens, ao invés de tentar se resolver as cenas com ajustes
e truques, em expressões faciais ou em animação de roupas.

Expressar as ideias através do corpo e representá-las em expressões faciais e


as inter-relações existentes entre olhos, sobrancelhas e boca combinados com
ações expressivas do corpo poderiam valorizar as animações, segundo Disney.
Os animadores deveriam ser encorajados a fazer uma análise e planejamento
da cena de uma maneira sistemática para se certificarem de como deveria ser a
cena em questão.

Aspectos relacionados à música, voltados para ritmo, dança, sua relação com o
equilíbrio do corpo e com ações subconscientes de equilíbrio do corpo, reforçam

92
o cuidado no estúdio com a preparação do pensamento do animador em
interpretar o que deve ser representado propriamente no acting do personagem.
Walt Disney também sugere aulas que abordem as influências que poderiam
existir sobre o diálogo estilizado para a animação cartoon.

No comunicado, as questões mais diretamente relacionadas ao acting talvez


sejam o desdobramento do que ele considera um bom exemplo de análise e
planejamento. Disney sugere que os animadores devem perceber o que
realmente faz as coisas se moverem, quais são as forças que estão por trás da
motivação dada à atitude do personagem, ao humor/clima, à sua personalidade.
Ele é enfático ao dizer que a mente está no comando e exemplifica, relatando
que o ser humano pensa sobre alguma coisa antes de o corpo realizar uma ação
relacionada ao pensamento.

E vai mais além ao dizer que fazemos coisas que são reações a estímulos
nervosos no cérebro, ações e reflexos subconscientes. Segundo ele, todos estes
aspectos internos influenciam as posteriores ações físicas do corpo, muitas
vezes executadas apenas por um estímulo inicial, desencadeando no cérebro
ações sobrepostas, sem a necessidade de terminar uma ação para iniciar outra,
o que deveria ser representado nas animações também de forma contínua,
descartando a necessidade de ter que encerrar uma ação para só depois
começar outra.

Apesar de poucas vezes Walt Disney se referir ao termo acting, é possível


perceber que o seu discurso visionário permeia conceitos semelhantes ao
método de acting para interpretação em artes cênicas criado por Constantin
Stanislavski, utilizado por alguns autores, professores e diretores de acting para
animadores.

3.2.2. Técnicas de acting

Animadores são considerados atores por alguns autores da literatura


internacional, como Hooks (2000), quando faz uma citação na qual afirma que o

93
animador é um atleta do coração. O autor relata que o animador se diferencia do
ator do teatro porque estes artistas atuam no palco, no momento presente,
enquanto o animador atua pensando em qual deve ser a reação da platéia num
momento futuro, sem que realize a atuação do seu personagem no momento
presente. Segundo Hooks, o animador busca criar a ilusão de vida no momento
presente, criando animação a 24 frames por segundo, buscando representar o
sentimento interno que está produzindo para o personagem.

Para Alexander (2006), as habilidades, conhecimentos e sensibilidade dos


animadores dão vida aos personagens que animam, com o intuito de transmitir
para os espectadores de forma convincente os sentimentos dos personagens.
Os animadores devem buscar sentir as emoções dos próprios personagens,
assim como no trabalho de outros artistas que buscam transmitir o sentimento
em suas criações.

No que se refere a acting, os atores são treinados para sentir o que os


personagens sentem. Eles transmitem os sentimentos para o público através das
expressões e gestos dos seus personagens. Bons atores que buscam boa
atuação procuram recriar os sentimentos emocionais. Os princípios
fundamentais do acting vêm através da construção do personagem.

Na construção do personagem, a vida interior (do inglês, inner life) do


personagem deve ser desenvolvida pelo ator para assegurar que o estado
emocional do personagem seja transmitido através de expressões e gestos
durante a atuação em cena. Os pensamentos do personagem devem conduzir a
emoção. Essa emoção, por sua vez, deve levar à ação gestual do ator.

Já a vida exterior do personagem é definida na atuação através da identificação


dos objetivos, táticas e ações do personagem. O pensamento leva à emoção e
a emoção leva à ação (HOOKS, 2000), assim como acontece com o ser humano.
Exemplificando: se uma pessoa pensa num sorvete de morango, numa fração
de segundos, ela tem a sensação agradável do sabor da fruta gelada e, logo em
seguida, ela parte em direção à sorveteria mais próxima para saborear um
sorvete de morango.

94
Buscando um acting de qualidade e com a pretensão de evitar o uso de clichês
de atuação, o ator/animador deve lançar mão das técnicas de resgate emocional
(emotional recall) e empatia, servindo de base para a compreensão de como
caracterizar um personagem e criar características diferentes das que o próprio
animador tem. Quando compreendidas pelo animador, as técnicas de acting
podem ser utilizadas durante o processo de criação das cenas animadas para
ajudar a criar personagens reais e cativantes, que sejam capazes de emocionar
a plateia.

As técnicas de acting e criação do personagem foram criadas e desenvolvidas


pelo ator e diretor russo Constantin Stanislavski (1863-1938). Mesmo passados
quase cem anos da criação e primeiras utilizações do método, muitas escolas e
diretores continuam partindo das suas premissas, tamanha a qualidade do que
foi desenvolvido. O método criado por Stanislavski apresenta como o ator deve
lançar mão das emoções comuns aos seres humanos e expressá-las no palco,
representando para uma plateia, de forma que possa entretê-la.

Ele (seu sistema) só tem utilidade quando se transforma numa


segunda natureza do ator, quando este deixa de se preocupar com ele
e quando seus efeitos começam a aparecer naturalmente em seu
trabalho. (GONÇALVES, in STANISLAVSKI, 2008, p. 8)

Inicialmente, o ator deve investir na construção do personagem, partindo da


criação da vida interior do personagem, definindo suas emoções, pensamentos
e gestual, buscando formar um conjunto de características específicas,
autênticas e próprias para o personagem. Tais características poderão ser
transmitidas para os espectadores, ilustrando o quanto ele é real e cheio de vida.

Na utilização do método, conhecido como Theory of Psycho-Physical Action


(Teoria da Ação Físico-Psicológica), o ator deve trabalhar dois elementos para
criar as emoções fundamentais do seu personagem: a psychological mind
(mente psicológica) e o physical body (corpo físico). Na psychological mind, o
ator deve aprender a trabalhar imagens na sua mente que criem emoções,

95
enquanto que no physical body o ator deve expressar gestual e movimentos que
transmitam as imagens contidas na psychological mind.

Ao contar com esses dois elementos, o ator – ou o animador – pode pensar,


sentir e se mover da forma que o seu personagem deve ser na realidade,
proporcionando uma atuação mais intensa e possibilitando escolhas
emocionalmente mais coerentes, revelando aos poucos o crescimento do
personagem durante a história. A utilização destes dois elementos, psychological
mind / physical body, permite ao animador criar personagens autênticos e com
características próprias.

O aproveitamento do processo psicológico (psychological mind) consiste em


compreender e utilizar o fato de que imagens criadas na mente transmitem
emoção ao ser humano. No caso do physical gesture, o corpo serve como se
fosse uma cópia da mente, porque cada gesto físico representado expressa o
estado emocional do ser humano. Pela natureza, a emoção e a expressão
corporal são interligadas, trabalhando em conjunto: cada gesto é o resultado de
emoções sentidas, que acabam por influenciar os movimentos do corpo.

Para se aplicar as técnicas de acting nos personagens, o animador deve recorrer


à utilização do acesso a sentimentos autênticos de resgate emocional e de
empatia, citados anteriormente. Para utilizar o resgate emocional, o ator deve se
lembrar de algum acontecimento que marcou a sua vida de tal forma que gere
um fluxo de emoção e sentimento na sua própria mente no momento em que
surgir essa lembrança, assegurando de que pode resgatar esse fluxo de emoção
exatamente no momento que estiver atuando.

A empatia é o processo de imaginar de forma positiva uma experiência


desconhecida relacionada a alguma pessoa em forma de imagens no cérebro.
As imagens que surgem na mente das pessoas durante todo o dia determinam
seu estado emocional. Para um ator, as imagens selecionadas servem como
uma forma de descobrir o sentimento de um personagem em uma específica
situação.

96
Independente de já ter vivido ou não a experiência de uma situação descrita no
roteiro, o ator ou animador pode interiorizar sentimentos correlatos através de
resgate emocional ou empatia. A escolha de imagens semelhantes a situações
específicas torna possível produzir emoções autênticas e conectadas aos
sentimentos do personagem durante a realização da cena, com linguagem
corporal pertinente e expressiva, criando, dessa forma, empatia com o público e
emocionando as pessoas.

Exercícios de observação de seus sentimentos e dos sentimentos de outros


devem ser praticados pelos atores para desenvolver essas habilidades,
buscando atuações novas e autênticas. O ator deve conhecer como as emoções
de acesso a sentimentos autênticos de resgate emocional e de empatia o afetam
e como ele deve transportar os sentimentos para o personagem.

Aprender a identificar no roteiro quais são os momentos corretos que envolvem


sentimentos dos personagens que precisam ser representados, bem como
identificar quais são esses sentimentos, são indispensáveis para a prática
dessas técnicas de acting.

As armadilhas dos atores iniciantes recaem na utilização de gestual e


interpretação corporal sem internalizar o sentimento nem utilizar as técnicas de
acting. Nesse sentido, os inexperientes atores fatalmente caem em clichês de
atuação e expressões corporais sem conexão com os sentimentos expressados,
representando sentimentos genéricos e vazios, sem convencer a plateia, que
perde o interesse logo nas primeiras cenas.

Apesar de ser um planejamento individual em boa parte da preparação, a


atuação do personagem é pensada dentro de um contexto que envolve os
anseios de outros personagens da história. Para contextualizar e testar o
personagem na cena como um todo, o estudo do acting do personagem tem uma
fase destinada a sua inserção no ambiente da cena e sua inter-relação com os
demais personagens e com o andamento do filme.

97
Após compreendermos os fundamentos do acting do personagem, ao
observarmos um personagem numa cena, segundo Alexander (2006), cada
personagem deve necessariamente ter como base três elementos essenciais
que são o objetivo, as intenções e as ações do personagem. Eles devem ser
expressos pelas emoções e gestos criados pelo ator. No campo da animação,
os termos objetivo e intenções são substituídos por meta e táticas.

Podemos fazer um breve resumo da proposta dos elementos essenciais da


seguinte maneira. Em cena, o personagem tem um objetivo a ser atingido. Para
conseguir o seu objetivo, ele lança mão de diferentes táticas que tem ao seu
alcance. O personagem tem sua expressão corporal representada de acordo
com as suas intenções de atingir o objetivo.

Uma analogia pode ser feita com a vida que está a nossa volta. Conforme já foi
citado neste texto, uma história de ficção é um espelho do cotidiano das pessoas.
Para a história atingir e emocionar sua plateia, essa premissa deve ser seguida.
Nossa vida é cercada de interações entre as pessoas, podendo ser entre duas
ou mais pessoas. Toda essa interação e conversas entre elas são movidas por
metas e ações de cada uma delas, sendo que cada uma usa suas táticas,
consciente ou inconscientemente. A partir do momento que os objetivos vão
sendo atingidos, a pessoa passa instintivamente para o próximo objetivo.

Os objetivos podem ser pequenos ou grandes, difíceis ou fáceis, interligados ou


independentes. Por fim, podem ser metas conscientes ou inconscientes no dia a
dia de cada um. No filme de ficção, é a mesma coisa, tanto para os atores ou
personagens animados, quanto para a plateia que os assiste.

As táticas variam de acordo com o que é estabelecido nas características físicas,


psicológicas e da biografia do personagem. Caso o personagem encontre
dificuldade em atingir o seu objetivo, ele passa a utilizar outras táticas que
estejam ao seu alcance, de acordo com cada situação e pessoas envolvidas.

Suas táticas vêm à tona de acordo com cada uma das suas características
psicológicas ou físicas, bem como as de seus “oponentes”. Por exemplo, se um

98
personagem for mais inteligente que o seu “oponente” e isso for percebido por
ele, a tática escolhida pode envolver um convencimento verbal. No aspecto
físico, o personagem que tiver mais força e tamanho terá supremacia no uso
dessa tática, até que consiga atingir o seu objetivo.

As necessidades e objetivos mostram para a plateia quem é esse personagem,


como é o seu caráter e o sentido de suas vontades, se para o bem ou para o
mal, por exemplo, formando, assim, na mente do público, quem é aquele
personagem e o que pode se esperar das suas ações e atitudes. E o mais
importante de tudo, gerando conexão e empatia entre o personagem e o público.

Durante o filme, cada situação acaba tendo naturalmente diferentes metas,


táticas e ações (elementos essenciais). Quanto mais esses elementos são
utilizados, maiores são o conflito e a necessidade de negociação entre os
personagens envolvidos, dando mais sentido para cada cena e no desenrolar da
história como um todo.

As negociações podem acontecer por diferentes motivos em cada cena. Os


personagens podem estar buscando um objetivo em comum ou objetivos
opostos, qualquer que seja o número de personagens envolvidos. No entanto, o
motivo por trás de cada um deles deve ser apresentado de forma clara para os
espectadores.

Assim, as tramas são construídas cena a cena com o objetivo de contar a história
dos personagens, seus anseios, obstáculos que devem ser superados em cada
conflito, até chegar ao desfecho do filme e o destino dos personagens principais
(os que normalmente mais têm a empatia e o interesse do público).

No acting de filmes live-action, os elementos essenciais são trabalhados nos


diálogos em real-time, pois o objetivo das ênfases, timing e interpretações são
decididos no momento da gravação. Essas decisões influenciam diretamente na
qualidade do acting. Na animação, essa etapa é criada na gravação das vozes
dos atores, na fase de pré-produção, como vimos no capítulo anterior. Em

99
seguida, elas são utilizadas como referência e base para o acting dos
personagens criados pelos animadores.

Todas as táticas que são utilizadas na criação do acting do personagem animado


dependem da interpretação dos diálogos e das ações dos personagens, junto
com todo o aparato de técnicas apresentado nesse capítulo para transmitir a
emoção do personagem e criar empatia do público por eles.

Assim, os diálogos devem ser trabalhados para transmitir o máximo possível de


metas e táticas durante as atuações, aproveitando tanto o texto interpretado,
quanto o subtexto que vem a reboque das palavras. Muitas vezes, os subtextos
que são representados nas ações silenciosas expressam emoções importantes
que todos os seres humanos sentem e que também devem estar presentes nos
personagens e ser percebidos pelos espectadores.

A ampliação da utilização do diálogo acaba por ajudar a dar mais sentido às


ações, deixando mais claros os elementos essenciais do acting do personagem,
influenciando positivamente nas escolhas de resgate emocional e empatia, bem
como suas influências no contato com a plateia, que acompanha e torce para
que as metas dos seus personagens favoritos sejam alcançadas.

Outro recurso utilizado em artes cênicas na busca por um acting autêntico e


carismático é a improvisação. Um animador (ou ator) pode recorrer à
improvisação por necessidade inspiracional ou por necessidade de encontrar o
papel do seu personagem. O artista pode visar tanto os movimentos mais amplos
quanto os mais sutis, aproveitando o caráter livre e intuitivo existente na
improvisação de atuação, levando, muitas vezes, o artista a descobrir algo novo
em relação ao seu personagem.

A improvisação também pode auxiliar o acting do animador no sentido de


quebrar barreiras criativas, quando o animador produz filmagens de suas
próprias performances, que podem ser utilizadas como referência de animação
da sua cena. Esses resultados podem ser apresentados aos diretores antes
mesmo de serem gravadas pelos voice talents, ainda na fase de conceituação

100
das cenas, podendo contribuir para um ganho no realismo e motivações dos
personagens, já que os animadores podem sugerir alternativas para a
interpretação do texto. As falas dos atores podem ser modificadas e adaptadas
ao que foi improvisado, elevando o nível do conteúdo dramático das cenas e do
próprio gestual dos atores na interpretação do texto durante as sessões de
gravação de vozes.

No caso dos momentos emblemáticos dos filmes, o acting de animação do


personagem pode ser bem aproveitado por se tratar de momentos de emoção
em que o público normalmente fica vidrado na cena, “pensando na vida”, fazendo
reflexões. Nesses momentos, a empatia com o personagem aumenta. A atuação
deve ser muito bem conceituada e executada. Caso o animador atinja um nível
de excelência na utilização das técnicas de atuação, o resultado da cena pode
ficar para sempre na lembrança dos espectadores.

Como vimos nesse capítulo, o animador se difere do ator no que se refere a


internalizar os sentimentos do personagem e externá-los na criação do acting no
momento em que está animando o personagem, imaginando como deverá
comunicar a cena para plateia e como ela reagirá, ao invés de realizá-lo no
momento atual, como o ator.

Animar é um processo muito particular e individual, da mesma forma que o acting


para um ator. Muitas vezes, o animador trabalha de forma intuitiva a utilização
de princípios de animação tradicional junto com a observação do acting de artes
cênicas no planejamento das suas cenas. Cada animador pode desenvolver o
seu próprio processo de animar, de acordo com suas virtudes, percepções,
habilidade, passando até por superações de bloqueios criativos.

Por esse motivo, essa pesquisa foi direcionada para uma investigação sobre o
processo criativo de um grupo de animadores, procurando uma maior
compreensão do planejamento do acting do animador, bem como suas
influências artísticas, inspirações e utilização de técnicas de acting de artes
cênicas durante seus métodos produtivos de cenas de animação de
personagem.

101
4. Métodos e Técnicas

De acordo com Gil (2010), essa pesquisa pode ser classificada como qualitativa
e exploratória devido à investigação que o presente trabalho se propõe a realizar
com informações a serem coletadas referentes a hipóteses da possibilidade do
conhecimento de técnicas de acting em artes cênicas elevar o nível de qualidade
final das cenas animadas.

Da mesma forma, tais classificações foram ancoradas no que se refere aos seus
objetivos de analisar o quanto o aprofundamento no entendimento e na utilização
de técnicas de atuação teatral pode contribuir para um melhor processo de
produção e um melhor desempenho dos animadores na interpretação,
comunicação e planejamento de cenas em animação.

A avaliação do possível ganho de qualidade da atuação dos personagens com


a utilização das técnicas de acting por parte dos animadores no referido projeto
deverá ser investigada a partir da análise de resultados de entrevistas, podendo
seu resultado contribuir para preencher lacunas deixadas pelas bibliografias.

Para acompanharmos a trajetória dos recursos de acting, desde os


primórdios até os dias atuais, seria bem mais conveniente se
tivéssemos uma leitura abrangente não só da linha do tempo evolutiva
do aprofundamento das técnicas de atuação do personagem animado,
mas também um cenário teórico-crítico e, principalmente, uma
discussão sobre a estética da linguagem do cinema de animação de
modo mais específico. (SILVA FILHO, 2015, p. 26)

Busca-se, portanto, uma abordagem científica, uma comprovação sobre o ganho


significativo, partindo-se de um ganho significativo por achismo para, em
seguida, alcançar dados científicos. Segundo Gil, trata-se, portanto, de
transformar as noções iniciais em outras mais úteis, que se refiram diretamente
a fatos empíricos e não a percepções pessoais. (GIL, 2010, p. 12)

A bibliografia sobre acting em animação é escassa. Os métodos que envolvem


as produções de cenas de animação relatados nos livros são mais voltados para
as técnicas de animação, abordando pouco as técnicas de acting. Porém,

102
percebe-se que, mesmo desconhecendo as técnicas de acting em profundidade,
muitos animadores produzem cenas de animação de alto nível.

Na redação de um memorando, citado em capítulos anteriores deste projeto,


Disney (1935) convida o animador para uma reflexão a respeito do que move as
pessoas a atuarem, a se moverem. O produtor incentiva a busca sobre quais são
as motivações que estão por trás das ações dos seres humanos para entender
como os personagens devem ser animados, como apresentar para o público que
a mente é a razão dos movimentos e ações dos personagens.

Da mesma forma como foi visto neste projeto, para Hooks (2000), é
desnecessário que o animador aprenda a atuar no exato momento, como fazem
os atores, mas defende que as técnicas de acting com a internalização dos
sentimentos são fundamentais para uma atuação real e convincente. O autor é
categórico ao afirmar que tudo é uma questão de empatia do público pelo
personagem, o que se consegue alcançar utilizando técnicas de acting.

Conforme cita Alexander (2008), animadores são atores. As técnicas de acting


desenvolvidas pelo russo Constantin Stanislavski na construção do personagem
e na sua atuação, tanto nos aspectos psicológicos quanto físicos, fundamentam
e enriquecem as cenas animadas, segundo a autora, subdividindo elementos
essenciais das cenas em busca de um acting convincente e autêntico
contracenando para a audiência.

Com essas colocações, buscando compreender o quanto o conhecimento do


acting em animação por parte dos animadores pode contribuir para um ganho de
qualidade em cenas animadas, foram realizadas investigações através de
entrevistas semiestruturadas e semiestruturadas on-line, com profissionais de
animação e computação gráfica com passagem pelo mercado do Rio de Janeiro
e em fontes secundárias.

Assim, espera-se conhecer mais sobre as inspirações, processos criativos e a


trajetória de um grupo de animadores brasileiros experientes, pesquisando seu

103
background cultural e de artes, em geral, voltado para o processo de animação
e acting.

Não podemos explicar as complexidades de uma entrevista, mas


lembre-se de uma das semelhanças entre aprender com pessoas e
aprender com livros: quanto mais separamos o que sabemos do que
queremos saber, mais eficazmente encontramos aquilo de que
precisamos. Em resumo, planeje. (BOOTH, COLOMB, WILLIAMS,
2008, p. 94)

As entrevistas on-line são adequadas sempre que essa condição


básica for satisfeita e o objetivo da pesquisa permitir seu uso. Elas se
tornam especialmente desejáveis quando os próprios participantes da
pesquisa sugerem que se sentiriam mais à vontade em uma entrevista
on-line (...). (NICOLACI-DA-COSTA, ROMÃO-DIAS, DI LUCCIO,2009,
p. 39)

4.1. Metodologia

A metodologia de análise qualitativa utilizada será a técnica de Análise do


Conteúdo, que permite, através da inferência (deduzir de maneira lógica), obter
conhecimento sobre o emissor ou sobre o destinatário da comunicação
(BARDIN, apud DUARTE; BARROS, 2005, p. 284), possibilitando extrair das
mensagens analisadas informações nas entrelinhas dos relatos coletados
contidos nas entrevistas que já foram realizadas.

As interpretações a que levam as inferências serão sempre no sentido


de buscar o que se esconde sob a aparente realidade, o que significa
verdadeiramente o discurso enunciado, o que querem dizer, em
profundidade, certas afirmações, aparentemente superficiais.
(HOFFMAN CÂMARA, 2013, p. 189)

Segundo Bardin, a técnica de Análise de Conteúdo deve ser dividida em três


fases: pré-análise, exploração do material e tratamento dos resultados:
inferência e interpretações.

Na pré-análise, o material a ser analisado é organizado. Um primeiro contato


com os textos acontece através de uma leitura flutuante, levando-se em
consideração as hipóteses e objetivos da pesquisa. Após a transcrição dos

104
dados, o trabalho segue para a escolha de categorias, tomando como base as
hipóteses ou as questões norteadoras (HOFMAN CÂMARA, 2013). Após a
identificação dos temas com maiores frequências, estes indicam quais devem
ser as unidades de categorização e modalidades de codificação.

A fase seguinte consiste na exploração do material, procedimentos de


codificação, classificação e categorização, procurando identificar quais blocos
de texto representam as categorias escolhidas, tendo como base as respostas
dos entrevistados (ver exemplo no Apêndice 1 – Entrevistas semiestruturadas).

O tratamento dos resultados: inferência e interpretações, na terceira e última


fase, se refere à busca do pesquisador em tornar os resultados brutos em
significativos e válidos, analisando o conteúdo latente nas entrelinhas das
manifestações dos entrevistados. Os conceitos são interpretados de acordo com
a cultura e linguagem dos entrevistados, com o objetivo de comparar enunciados
e ações entre si, buscando semelhanças entre os diferentes temas encontrados.

A amostra dessa pesquisa foi feita levando-se em consideração a relevância dos


animadores em suas áreas de atuação, a diversidade de técnicas de animação
utilizadas e seus envolvimentos em produções autorais e comerciais. Trata-se
de uma amostragem sem nenhum rigor estatístico e com menor rigor do que
outros tipos.

Segundo a pesquisa Retrato do Mercado Brasileiro de Animação, realizada pela


pesquisadora Cristiane Faria e apresentada no fórum profissional do Festival
Anima Mundi, em 2015, 50% dos profissionais de cinema de animação se
encontram no Rio de Janeiro e em São Paulo. 66% das produtoras se encontram
na região sudeste, o que norteou a escolha da amostra da pesquisa. (FARIA,
2015)

O critério utilizado para a formação dos entrevistados apontou para um grupo


equilibrado por conveniência, não propabilístico, de profissionais experientes em
animação, computação gráfica e animação digital, experiência média de mais de
quinze anos de mercado e alguns com experiência de aprendizagem em cursos

105
de longa duração no exterior. Boa parte deles tem experiência em lecionar,
sendo que a maioria em cursos livres.

O grupo de treze entrevistados apresenta os seguintes profissionais: artistas 3D


e animadores da TV Globo; reconhecido animador independente,
internacionalmente premiado; animador premiado no Festival Anima Mundi há
quase dez anos como profissional; animador com experiência profissional e de
estudo no exterior (Dinamarca); animador com experiência profissional (com
passagem pelo grupo Globo) e com estudo no exterior (Canadá), atualmente
cursando doutorado em animação; animador atuante no mercado carioca em
séries de animação, graduado em design gráfico; especialista em games e
animação 3D há mais de dez anos; sócio e artista 3D de produtora carioca com
filial na Califórnia, animador formado na Dinamarca e atualmente trabalhando
naquele país; animador da produtora Casablanca; sócio e animador de
produtora, com experiência de aprendizado na Ecole de l'image Gobelins57
(Paris).

As primeiras entrevistas foram aplicadas como piloto. Como foram proveitosas e


surtiram resultados, foram aproveitadas no conjunto de entrevistas realizadas.
As perguntas foram elaboradas de forma que conduzisse o entrevistado a uma
imersão sobre os temas, iniciando por assuntos mais abrangentes e abstratos,
direcionando, aos poucos, para questões mais objetivas dos seus processos
criativos e percepções técnicas mais detalhadas, até se chegar ao ponto
principal: o acting em animação. Para preservar o anonimato dos participantes,
siglas foram adotadas na indicação dos entrevistados no capítulo de análise dos
resultados.

As perguntas foram:
1. Qual é o seu background artístico relacionado à animação?
2. Quais são as suas inspirações para animar os personagens nas cenas?
3. Quais são as suas referências e materiais didáticos (audiovisual, livros) que
utiliza?

57
Ecole de l'image Gobelins, de Paris.

106
4. Como você conceitua as cenas de animação que cria e como define de que
forma o personagem atuará na cena?
5. Como você trabalha as expressões faciais e corporais dos personagens?
6. Você utiliza referências de filmes/séries live-action ou peças de teatro?
7. Você conhece algo sobre técnicas de atuação de atores em artes cênicas?
8. Você utiliza alguma técnica de atuação para atores na conceituação e
produção das suas cenas?
9. Há algum método de atuação que você siga? Você desenvolveu algum?
10. Você conhece algum guia que ensine atuação para animação?
11. Você consegue perceber alguma diferença na qualidade das animações de
filmes em que os animadores desconhecem técnicas de acting?

Quanto mais as questões foram sendo respondidas, mais tendiam para um


campo intuitivo, pouco analisado pelos entrevistados (pelo que eles mesmos
demonstravam), com ou sem empirismo na prática do ofício. Notou-se que, aos
poucos, os animadores passavam a elaborar as suas respostas com cada vez
mais naturalidade e mais profundidade.

Apesar de relatarem que poucas vezes param para pensar nas técnicas e
processos que utilizam quase de maneira trivial e que lhes pertence, cada vez
mais os participantes demonstraram mais interesse em abordar os assuntos, ora
negando as afirmações da questão, ora concordando e complementando de
acordo com suas interpretações. Vale destacar que a todo o momento os
entrevistados relataram fatos preciosos e enriquecedores para este trabalho.

107
4.2. Análise dos resultados

Foram realizadas investigações através de entrevistas semiestruturadas


presenciais e semiestruturadas on-line com treze profissionais de animação e
computação gráfica com passagem pelo mercado do Rio de Janeiro. O objetivo
das perguntas tinha como finalidade coletar informações para aproveitamento na
técnica de Análise de Conteúdo.

Na Análise de Conteúdo apresentada no Apêndice 1 deste projeto, encontram-


se os destaques dos depoimentos pertinentes às unidades de registro, porém
vale destacar que a riqueza de detalhes nas respostas dos animadores
entrevistados justifica com sobra a leitura das entrevistas na íntegra,
apresentadas no Apêndice 2.

4.2.1. Qual é o seu background artístico relacionado à animação?

A maior parte dos entrevistados citou sua formação acadêmica como parte
integrante da bagagem artística. Mais da metade tem formação em comunicação
visual ou social. Há alguns aproveitamentos da formação acadêmica nos
processos da profissão, porém há outros empíricos. Alguns relataram influência
da Disney e cinema de animação como principal background, bem como arte em
geral. Pode-se perceber uma mente aberta para inputs na maioria das respostas.

4.2.2. Quais são as suas inspirações para animar os personagens nas


cenas?

As inspirações utilizadas nas criações das suas cenas vêm desde os filmes mais
assistidos por eles, quanto pela observação de pessoas ao vivo, quanto por
ilustrações. Tudo envolve observação, tanto do real quanto do irreal. Alguns
demonstram mais apuro no planejamento, enquanto outros relataram uma
produção mais voltada para o aspecto prático. Mesmo assim, o maior peso das
respostas foi relacionado a assistir e analisar material de animação.

108
4.2.3. Quais são as referências e materiais didáticos (audiovisual, livros)
que você utiliza?

No que se refere às referências e materiais utilizados na criação das animações,


a maioria respondeu que utiliza livros como fonte de pesquisa. Outras respostas
se referiram à observação do real e de situações reais do dia a dia ou de filmes.
Os animadores lançam mão de referências como fonte de inspiração e com o
intuito de criar a sua própria interpretação, uma convicta busca por produção
original. Um bom número de entrevistados citou a internet como meio de
pesquisa e cursos on-line, junto com filmagens de referência.

4.2.4. Como você conceitua as cenas de animação que cria e como define
de que forma o personagem atuará na cena?

Três dos entrevistados relataram conhecimento e utilização do método de


atuação para atores, sendo dois diretamente e outro indiretamente. Busca por
particularidades advindas de referências, acervo mental, tom e referência em
pessoas reais conhecidas. Percebe-se que muitas vezes o discurso dos
animadores permeia os conceitos das técnicas de acting de artes cênicas, sem
citar nenhum método propriamente dito.

4.2.5. Como você trabalha as expressões faciais e corporais dos


personagens?

Há relatos sobre soluções particulares, com a maioria das citações apontando


para a utilização das técnicas de animação como solução para a representação
de expressões faciais e corporais. Inspiração em observação do dia a dia com
criação de um acervo na mente, alto tom criativo e particular ressaltaram a
originalidade da busca por representar essas expressões. Presença e ausência
de processo alternaram nos relatos de uma maneira geral. O destaque fica no
bom número (sem ser o maior) de relatos voltados para os conceitos de acting
de forma intuitiva. Um relato voltado para acervo de imagens na memória.

109
4.2.6. Você utiliza referências de filmes/séries live-action ou peças de
teatro?

Algumas citações giraram em torno de peça de teatro e banco de memória sem


que seja feita uma cópia, mas em busca de autenticidade. Quase todos os
entrevistados relataram que utilizam referências de filmes, muitas vezes os de
live-action, em busca de uma referência que ainda não tenha sido utilizada em
animação, evitando uma “releitura”, visando, assim, a sua própria interpretação
e a originalidade de animação que pretende realizar.

4.2.7. Você conhece algo sobre técnicas de atuação de atores em artes


cênicas?

Parte conhece ou tem interesse em técnicas de atuação para artes cênicas


utilizadas em animação de cenas; parte desconhece e alterna o interesse em
conhecer. As duas vertentes tiveram a mesma quantidade de citações de
entrevistados, sendo que todos que conhecem citaram como fonte o russo
Stanislavski, criador das técnicas de acting.

4.2.8. Você utiliza alguma técnica de atuação para atores na conceituação


e produção das suas cenas?

Parte respondeu que não utiliza técnicas de acting em suas animações; parte
relatou que utiliza de forma empírica. Algumas destas respostas foram
percebidas nas entrelinhas dos relatos, possibilitadas pela técnica utilizada, de
análise de conteúdo.

4.2.9. Há algum método de atuação que você siga? Você desenvolveu


algum?

As respostas foram divididas em duas categorias, a dos que responderam que


utilizam técnicas e outros que não utilizam, porém a grande maioria apresentou
as respostas voltadas mais para o campo das técnicas de animação do que as
técnicas de acting. Alguns acham os métodos fundamentais. Outros desconfiam

110
que utilizam de maneira empírica, por observação, desconfiam que haja um
sentido acadêmico por trás dessa utilização espontânea, sem confirmar. Um
dado curioso é que alguns que têm opiniões contrárias nas respostas fazem
parte de uma mesma “escola” de animação. Sendo assim, há empirismo
observado nos respondentes. Outros não se consideram utilizando método
algum.

4.1.10. Você conhece algum guia que ensine atuação para animação?

Um bom número de entrevistados demonstrou observar conexão entre atuação


em artes cênicas e animação. O livro Acting for Animators, de Ed Hooks, talvez
o principal divulgador do método de Stanislavski no meio da animação, foi citado
em todas as respostas positivas. Outros comentaram que encontram as
informações pulverizadas pelos livros, sem perceber que exista um material
específico.

4.1.11. Você consegue perceber alguma diferença na qualidade das


animações de filmes em que os animadores desconhecem técnicas de
acting?

Pouco mais da metade dos entrevistados que responderam a pergunta


afirmaram que percebem a diferença de qualidade ao citarem fundamentos de
técnicas de acting como justificativa na colocação. Em algumas respostas, foi
observado que a qualidade depende da relação orçamento e tempo de
dedicação na construção da cena. Há relato sobre a existência de fórmulas
criadas atualmente que diminuem a originalidade e autenticidade do acting dos
filmes. Em uma das respostas, um dos animadores se colocou em dúvida sobre
a questão e levantou uma reflexão, tomando a iniciativa de sugerir uma outra
pesquisa mais aprofundada somente sobre este tema.

111
5. Conclusões e achados da pesquisa

A hipótese levantada no presente projeto, em que questionamos se o


conhecimento de técnicas de atuação em artes cênicas pode elevar o nível de
qualidade final das cenas animadas, pode ser considerada como parcialmente
confirmada. Porém, nota-se, com clareza, a necessidade de um aprofundamento
maior e mais específico relacionado à percepção do ganho de qualidade,
podendo partir da investigação e dos fundamentos apresentados nesta
pesquisa.

Ao escolher o referencial teórico de autoria de Walt Disney, Ed Hooks e Kate


Alexander, procuramos apresentar suas abordagens sobre animação e atuação.
Foi feito um prévio detalhamento sobre o processo de produção em animação,
buscando situar o leitor e provocar reflexões e questionamentos sobre o tema
principal.

Buscamos apresentar o processo de produção de animação tomando como base


a experiência profissional do autor desta pesquisa, aliada à bibliografia
pesquisada, com o intuito de ambientar a etapa da animação, ilustrando as fases
de conceituação visual e textual que a precedem. Dessa maneira tentamos dar
ferramentas para o leitor construir uma compreensão sobre como a fase da
animação está inserida na produção, auxiliando um entendimento das
possibilidades de utilização das técnicas de acting na conceituação das cenas e
na comunicação da história para os espectadores.

Tomando como base o referencial teórico, pode-se perceber, na análise dos


resultados das entrevistas semiestruturadas, que muitos dos animadores
apresentam um conhecimento empírico das técnicas de acting, ao
interpretarmos suas respostas. O pesquisador se arrisca a dizer que, tomadas
as devidas proporções, da mesma forma que DISNEY (1935) apresenta em seu
discurso uma série de reflexões que podem ser consideradas presentes também
nas técnicas de acting, os animadores participantes desta pesquisa seguem
esse mesmo caminho, apesar de, em alguns momentos, hesitarem quanto ao
conhecimento.

112
Nesse sentido, considerando as proposições de HOOKS (2000) e ALEXANDER
(2008), pode-se afirmar que um conhecimento mais sólido dos animadores sobre
as técnicas de acting pode agregar valor aos seus já sedimentados e bem
executados métodos de animação, possivelmente propiciando um ganho de
qualidade no planejamento de cenas animadas.

113
6. Considerações finais

A produção de filmes de animação, onde se transforma a vida e os sentimentos


de personagens fictícios em histórias que parecem reais, tem como finalidade
entreter e emocionar os espectadores. Realizar animação é um trabalho intenso
e minucioso. É através da atuação dos personagens que as histórias dos filmes
são contadas.

O resultado alcançado por esta pesquisa pode ir além da resposta da hipótese,


possivelmente abrindo portas para uma utilização de técnicas de acting em
produções de animação de personagens de forma mais ampla, sempre somadas
aos princípios básicos da animação tradicional.

Futuros trabalhos podem abordar o tema sob um viés relativo à busca de


aumento de qualidade nas cenas animadas com a utilização das técnicas de
acting, por exemplo, ou mesmo no sentido da análise de observação de
experiências práticas do acting no processo criativo em diferentes técnicas de
animação. Com as informações aqui compiladas, sugerimos a produção de um
livro em língua portuguesa, bem como a criação de workshops de acting em
animação para serem ministrados em escolas pelo país.

O material específico sobre acting em animação é raro, ainda mais em língua


portuguesa. Procuramos trazer um pouco de informações relevantes para o
campo científico relacionadas ao tema. Esperamos que esta dissertação possa
contribuir de alguma forma para a prática dos animadores (onde o autor do
projeto se inclui) na criação das cenas animadas dos seus personagens, que
tanto entretêm e emocionam as plateias.

114
7. Referências

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119
8. Apêndice

Apêndice 1 – Entrevistas semi-estruturadas.

1 - Qual é o seu background artístico relacionado à animação?

Categoria Unidades de Contexto, Unidades de Registro (sublinhado) e Codificação Frequência

E2: "Eu cursei Desenho Industrial, na UFRJ."

E6: "(...) formado em design com especialização em animação tradicional e


CGI."

E7: "Sou designer, formado pela ESPM."

E10: “(...) é dividido entre desenho e o cinema. Me formei em Cinema, na


PUC-RIO, e fiz um curso de desenho na Quanta, em São Paulo. Em seguida,
ganhei uma bolsa para fazer o curso de animação de personagens, no The
Animation Workshop, na Dinamarca. "

E11: “Estudei publicidade. (...) Fiz curso de animação tradicional (...) Em


seguida eu fiz o primeiro ano de animação de personagem da Animation
Workshop, na Dinamarca.”

E12: "(...) eu sou formado na Belas Artes, da UFRJ. (...) eu aplico os conceitos
que eu aprendi de historia da arte, de desenho de ilustração de pintura
quando eu vou fazer animação. Não necessariamente aquilo tava relacionado
à animação. Eu faço essa relação enquanto eu to trabalhando.”

E2: "(...) desenhos animados japoneses (animes)"

E4: "(...) o que realmente me fez querer trabalhar com animação foram os
filmes de 3D, principalmente da Dreamworks e Pixar."

E5: “Eu comecei a me interessar por animação com as series de TV dos anos
80. Depois vieram os desenhos japoneses e os filmes estilo Disney/Pixar”

E13: "Quando eu comecei, eu não tinha estudo nenhum. Eu comecei muito


nova e as únicas coisas que eu tinha visto mesmo era animação da Disney,
clássica mesmo, as animações que passavam no cinema."

E1: "Fotografia e música são inspiradoras. Exercita o pensamento sinestésico


do som falar pela animação. Tem todos os tipos de arte, pintura, literatura."

E8: "(...) A música e a animação partilham do mesmo princípio que é essencial


para as duas artes. O ritmo, né? (...) . Fotografia ajuda na composição de
cena, no staging do personagem.

E9: Na verdade, a única razão para eu ter estudado lá (Belas Artes, UFRJ) foi
por conta de duas disciplinas específicas que eram quadrinhos e animação.”

E7: "(...) trabalhar com ilustração, o que me levou para o meio da animação."

E13: "Então o que eu tenho hoje é um apanhado assim das pessoas com
quem eu trabalhei, dos trabalhos dos meus chefes.”

120
Apêndice 1 – Entrevistas semi-estruturadas

2 - Quais são as suas inspirações para animar as suas cenas?

Categoria Unidades de Contexto, Unidades de Registro (sublinhado) e Codificação Frequência

E3: “Minha inspiração para animar vem de animações da Disney, Estúdio Laica
e Pixar, animes, filmes e cinematics de jogos.”

E4: "(...) mas em geral curto buscar inspiração nos cartoons clássicos.”

E6: “(...) filmes que gosto, como Ghibli e Pixar.”

E7: “Eu trago como bagagem as referências que eu tenho de animação para
mim mesmo.

E8: “As inspirações são as mais diversas, desde os Nine Old Man até os
animadores antigos da Disney, até animadores atuais, estudantes. (...) Eu
gosto muito de ver curtas-metragens de alunos da Ringling College, da Cal
Arts, da Gobelins.

E9: “São praticamente de duas direções distintas. A inspiração vem da


observação e referência do real, de como as pessoas se movem, de uma
maneira naturalista que as pessoas se movem e em paralelo, de uma maneira
oposta, quase, das cenas de ação e exageradas com movimentos quase
impossíveis e inverossímeis.”

E11: “(...) dependendo o estilo de animação, lembro de alguma animação que


eu vi. Mas pra fazer mesmo, eu tento pensar em alguém que teria aquela
personalidade.”

E12: “As minhas inspirações geralmente são animações que eu já conheço. Eu


busco muito olhar o trabalho de animadores"

E13: "(...) Eu sempre gostei das mesmas coisas e até hoje eu assisto Disney
mesmo, umas coisas mais parecidas. E muitas dessas pessoas com que eu
trabalhei que, como eu sempre fui free-lancer e trabalhei com muita gente que
fazia muita coisa diferente (...)"

E1: “Eu procuro me inspirar nos sentimentos do cotidiano, do dia a dia. (...) Eu
me inspiro na vida cotidiana para animar as minhas cenas.”

E5: “Tudo que você vê na vida fica registrado no cérebro. Então sempre
funciona como referência em algum momento”

E9: “São praticamente de duas direções distintas. A inspiração vem da


observação e referência do real, de como as pessoas se movem, de uma
maneira naturalista que as pessoas se movem e em paralelo, de uma maneira
oposta, quase, das cenas de ação e exageradas com movimentos quase
impossíveis e inverossímeis.”

E11: “Eu tento pensar em alguém que conheça. (...) eu tento pensar em
alguém que teria aquela personalidade."

121
E1: “(...) tudo que o personagem pode estar sentindo naquela cena. (...)"

c) Informações do
personagem
E4: "(...) dependendo do tipo de personagem que vou trabalhar" 3
(sentimentos e
características)
E10: “Antes de animar uma cena eu me inspiro primeiro no storyboard /
animatic, geralmente as poses já possuem o sentimento certo e tem uma razão
de estar ali.

E6: “Referências filmadas (...)"

e) Filmes e séries
E6: “(...) Também sempre referencias de cinema live-action.” 1
em live-action

122
Apêndice 1 – Entrevistas semi-estruturadas

3 - Quais são as suas referências e materiais didáticos (audiovisual, livros) que você utiliza?

Categoria Unidades de Contexto, Unidades de Registro (sublinhado) e Codificação Frequência

E1: “Materiais didáticos são: The illusion of life Animator´s Survival Kit."

E4: “Os livros que são meus guias de cabeceira são principalmente o "Acting for
Animation" e o "Animators Survival Kit".”

E6: “Utilizo (...) livros clássicos como Story, Animatior´s Survival Kit e Cartoon Animation.”

E7: “Essa parte eu acho que o pessoal tem muito como bagagem o Animator´s Survival
Kit, e tem outros livros de animação muito bons, apesar de não chegar no Brasil. (...) Mas
eu utilizo mais o Animator´s Survival Kit. Tanto o livro quanto as vídeo aulas que me
deram uma base boa, que abriram minha cabeça para animação.”

E8: “(...) o livro de cabeceira de qualquer animador é o Animator´s Survival Kit. Acho que
eu nunca vou deixar de usar. (...) Um outro livro também importante, incrível, é O Corpo
Fala, né? Ele faz uma introdução sobre a linguagem corporal e ajuda você a pensar e a
trabalhar na comunicação não verbal do seu personagem. (...) eu uso o Animals in
Motion, do Edgware Muybridge (...)”

E9: (...) e de uma maneira também quase autodidata lendo os livros que durante muito
tempo, principalmente quando eu era jovem, nos anos 80, lendo livros de animação que
raramente chegavam por aqui na época pré internet. ”

E10: “Eu ainda uso o Animator's Survival Kit quando tenho alguma dúvida. Mas na
maioria das vezes procuro por referências no YouTube. Acho importante analisar as
pessoas, animais ou objetos em movimento. Ao buscar inspiração na vida ao nosso redor
podemos colocar algo mais original nas nossas animações. E enriquecemos a nossa
biblioteca mental.”

E12: Eu uso o The Illusion of Life como referência, o livro do Preston Blair, o Cartoon
Animation, o Animator´s Survival Kit.

E1: “(...) Na internet, movimentos e animação no YouTube. (...)"

E3: “Hoje em dia como o acesso a informação é muito mais fácil, costumo usar YouTube,
Vimeo, Behance e Pinterest como principais fontes de referência.”

E5: “Google images, pinterest, artstation, youtube.”

E6: “Utilizo muito YouTube, Vimeo (...)”

E10: “(...) Mas na maioria das vezes procuro por referências no YouTube. Acho importante
analisar as pessoas, animais ou objetos em movimento. (...)”

E11: “Referência, direto assim, usando sempre, não, mas tem o Richard Williams, muita
gente usa ou já usou alguma vez.

E1: “(...) Utilizo também filmagem dos animadores se expressando na cena.”

E9: “(...) e referências desde sempre, desde a época do vídeo cassete, de animações de
outros animadores, assistindo quadro a quadro (...)"

E12: “Bem, as minhas referências eu já falei. São principalmente animadores, mas eu


também, animadores 3D, mas eu também me dou o direito de ver animações 2D. (...)"

E13: “Não utilizo livros. Eu até tenho, mas eu não olho nunca. Eu gosto de ver vídeos,
mas eu nunca assisto quando eu to fazendo. Eu prefiro assistir muitas vezes, procurar
num dia inteiro e só animar no outro dia. Daí é o meu método de fazer um resumo assim
de tudo que eu vi. Eu estudo num dia e só no outro eu vou animar. Eu não gosto de ver e
fazer porque me atrapalha.”

123
E2: “(...) os principais sites/cursos on-line que pago atualmente são o "Lynda.com" e
"Digital Tutors". A partir deles consigo aprender e solucionar a maioria dos problemas
que aparecem nos trabalhos.”

d) Cursos
3
on-line E7: “(...) Mas hoje em dia você tem infinitos cursos na internet de formação de animador
que você pode também, é, buscar isso. (...)"

E12: Em relação aos materiais didáticos, em termo de audiovisual, eu geralmente vou


procurar cursos on-line, como o da Udemy,

E9: “As referências são a observação do real. Você entra no metrô, por exemplo, tem oito
pessoas sentadas cada uma tá sentada de uma maneira diferente de acordo com a
personalidade dela, o peso, a idade, as leis da física, o que ela tiver carregando, inércia,
gravidade (...)"

E10: “(...) Ao buscar inspiração na vida ao nosso redor podemos colocar algo mais
original nas nossas animações. E enriquecemos a nossa biblioteca mental.”

E11: “Referência, direto assim, usando sempre, não, (...). Eu prefiro filme para ter alguma
referência de filme filmado mais do que alguma referência de animação porque na
animação já foi feito, eu não gosto muito. Já foi interpretado como animação, como um
jeito de se mexer, um tipo de movimento aquilo já é uma interpretação. Então usar um filme
como idéia ou referência que é alguma coisa legal aquilo já é um produto que já é feito,
mas pelo menos é um outro tipo de meio, é uma interpretação que não é uma interpretação
do mesmo tipo que a gente faz quando anima.”

E12: Então eu gosto de ver algumas animações da Disney, da Hanna Barbera ou de alguns
estúdios independentes, como, por exemplo, o estúdio Ghibili, que eu admiro muito.

124
Apêndice 1 – Entrevistas semi-estruturadas

4 - Como você conceitua as cenas de animação que você cria e como você define a forma que o personagem
atuará na cena?

Categoria Unidades de Contexto, Unidades de Registro (sublinhado) e Codificação Frequência

E1: “(...) é como o personagem falando por si, como se eu fosse o personagem,
encarnado naquele corpo. (...) é o que ele tá sentindo do personagem na hora,
acho que fica mais natural assim. Prefiro straight ahead do que pose to pose por
gosto pessoal.”

E3: “Tudo depende do motivo da cena, das intenções do personagem e tentar


imaginar o que ele está sentindo.”

E4: “Primeiramente eu estudo o estilo do personagem (...) criar meu acting


próprio.”

E6: “Tudo depende de cada personagem e cada filme. Tento pensar como o
personagem e daí criar a estética do movimento na cena.”

E7: "(...) Mas muita coisa vem assim do próprio sentimento que o animador vai
botar ali, né? (...)"

E8: “É, o primeiro passo é tentar extrair o máximo de informação possível sobre o
personagem que você está animando.

E9: “(...) Antes de começar a animar é sempre bem importante definir qual dessas
quatro direções você vai escolher e em seguida você levar em consideração a
idade, o peso, a idade e a situação emocional do personagem.”

E11: "(...) o tom daquela história ali e qual que é o tipo do personagem, qual que é
a personalidade daquele personagem. Eu tento pensar em alguém e fazer de um
jeito que funcione pra aquilo ali e que caiba e fique de acordo com a ideia geral
que o filme tem que ser. (...)"

E5: “Primeiro penso no enquadramento, levando em consideração o anterior e o


posterior. Também existem questões técnicas, do tipo qual enquadramento seria
menos custoso. O posicionamento dos personagens vem depois, sempre levando
em consideração a câmera.”

E7: “Isso vem do processo antes do animador pegar a cena. Toda essa
conceituação vem bem lá de trás, da hora que o board é feito, que o diretor tá
pensando naquela cena, e ele talvez vá conversar com o diretor de animação para
ver o melhor acting que vai ser tirado dali. (...)"

E10: “Eu procuro primeiro entender o propósito da cena em relação a uma série de
fatores. Em relação à história, à continuidade, ao tom do filme. Em seguida, depois
de conversar com diretor/supervisor, eu começo a fazer rascunhos e a escrever as
principais ideias para a cena (...)"

125
E9: “O Stanislavski classifica, categoriza a atuação praticamente de quatro formas,
que são: realista, naturalista, estilizada e grotesca. Eu acho que apesar de ser para
atores, eu acho que é uma referência fundamental para o momento que a gente
vai animar o personagem. (...)"

E12: Mas a questão de definir a forma como o personagem vai atuar na cena vai
depender muito do contexto em que ele está. (...) A partir daí tem o subtexto, que é
justamente quais são as motivações internas do personagem para tomar aquelas
c) Técnicas de ações, ou seja, como é que ele tá passando, de acordo com o que, com a história.
3
acting O que leva ele a tomar determinada ação?

E13: "(...) Quando é um filme que eu to fazendo pra mim, eu já tenho tudo muito
definido, assim, o clima todo do filme, das coisas, do que é que eu quero passar,
então, é muito espontâneo. Eu não sei assim como que eu sei o que é que ele vai
fazer. É como se fosse um ator mesmo. A gente vai atuar, então, é, eu faço
alguma coisa que provavelmente eu já vi, misturado com alguma coisa que eu
queria ver, mas é muito difícil definir um lugar onde eu busquei isso.

126
Apêndice 1 – Entrevistas semi-estruturadas

5 - Como você trabalha as expressões faciais e corporais dos personagens?

Categoria Unidades de Contexto, Unidades de Registro (sublinhado) e Codificação Frequência

E4: “Após estudar referências costumo tentar fazer as poses e expressões para tentar
entender se a dinâmica do movimento está natural e plausível.”

E5: “Se tiver diálogo, primeiro anima a mandíbula. Depois os olhos e sobrancelhas.
Depois o resto da musculatura facial. Pro corpo eu começo com posições chaves e
depois intervalamento.”

E6: “Eu costumo blocar as expressões faciais depois da linguagem corporal.”

E9: eu acho bem importante trabalhar bastante os keyframes, as posições chave,


levando em consideração toda essa biblioteca prévia. Mas na hora de animar, fazendo
uma combinação que é de uma tentativa de fazer, criar, desenvolver uma expressão
facial específica mais original, que você não tenha usado antes, combinada com uma
solução gráfica que você vai dar para esse personagem. Então às vezes demora muito
pra você chegar a uma solução que é específico (...)"

E10: “Na maioria das cenas, eu trabalho primeiro as expressões corporais. As


expressões faciais são tão ou mais importantes, mas o corpo tem uma linguagem
bastante forte e pode comunicar um sentimento rapidamente.

E11: “Eu faço da minha cabeça assim mesmo. Eu não uso muita referência de
espelho, nem de olhar muito outra, um rosto, uma expressão. Eu tento fazer pelo
desenho daquele personagem ali, desenho e tento fazer por mim mesmo uma coisa
que seja de acordo com o design do personagem e faço do zero assim mesmo.

E12: “Bem, expressões faciais, além das referências que eu pego, a gente sempre
anima com espelho na frente. Então expressão facial é normalmente vendo você no
espelho. Eu mesmo me vejo no espelho e vou animar, segundo aquelas referências,
minha própria referência. (...) E a partir desse tipo de referência, ou seja, de um
storyboard construído a partir disso, eu vou para a vídeo referência que eu mesmo
faço. Eu acho importante o amimador atuar para a animação.”

E1: Pensa no que o personagem estaria pensando naquela hora e como ele reagiria
de acordo com a personalidade dele.

E7: "(...) trabalhar na animação buscando a forma mais clara de expressar o


sentimento do personagem. (..)"

E8: “Eu acredito que as expressões corporais e as expressões faciais são resultado
daquilo que o personagem está pensando ou está sentindo.

E13: “É, é, não sei. Depende muito do personagem, depende muito do meu humor no
dia. Em geral eu não gosto tanto de assistir umas coisas muito exageradas e eu não
gosto, por exemplo, de filme de comédia. Então eu procuro não exagerar na atuação
mesmo para não ficar muito pateta, muito engraçado, ainda que eu queira que tenha
humor, eu não faço uma cena muito exagerada. Acho que é uma coisa minha assim,
que eu posso dizer que é minha.

E9: “Eu acho que é bem importante a gente prestar atenção no dia a dia, seja na rua,
seja assistindo filme ou séries na atuação, nas expressões, na variedade de soluções
c) Acervo na de postura de braço, de perna de movimento, de variação facial dos atores ou das
1
memória pessoas. Na verdade, você vai criando um acervo, uma biblioteca na sua memória. (...)
Quanto mais específico é o conjunto de informações que você tem, mais fácil é você
consegui criar uma solução que é original e honesta e autêntica.”

d) Aspectos E3: “Um bom rigging sempre ajuda bastante. Gosto de trabalhar bastante com morphs
1
técnicos ou blend shapes no Zbrush.”

127
Apêndice 1 – Entrevistas semi-estruturadas

6 - Você utiliza referências de filmes/séries live-action ou peças de teatro?

Categoria Unidades de Contexto, Unidades de Registro (sublinhado) e Codificação Frequência

E1: “Sempre utilizo referências de filmes e séries, peças porque atuação é muito
importante. Caso contrário, seria movimentação, nem convenceria que está ali vivo. É
um ator em cena. O animador também é. O personagem acaba sendo uma marionete do
animador.”

E5: “Referências (...) só se for algum animal especifico. Utilizo filmes de animação e live-
action como enriquecimento do olhar clínico. Mas para animar uma cena especifica só
usaria referência se fosse algum movimento muito especifico de alguma profissão por
exemplo. Ginasta. Bailarina...”

E6: “Acho que por hábito uso mais de filme do que de teatro.”

E7: "(...) Então referência de filme, você geralmente tá fazendo uma composição de
cenas e você quer uma fotografia legal, o filme tem já uma fotografia bacana, e você
pode usar aquilo, você pode se inspirar nessas coisas assim. (...)"

E8: “Sempre. Eu sempre uso referência de live-action, de série, porque é bom observar
como o ator resolveu aquela cena específica.

E9: “Uso, mas não quando eu to animando. Normalmente eu tento absorver, sem estar
vinculado a uma cena específica, absorver essas referências no dia a dia pra formar uma
biblioteca de memória (..)"

E11: “Filme sim, mas não de abrir e olhar pra fazer. Eu me lembro de algum momento,
de algum personagem que eu acho muito bom, assim, mas eu não faço olhando na hora
não.”

E12: “Sim. Eu utilizo referências de filmes, séries de live-action raramente, peças de


teatro eu nunca usei. Pode ser que algum dia eu venha a usar, mas a questão do ator no
palco é meio diferente para mim. Eu falo isso porque eu já conversei com ator. O objetivo
do ator muitas vezes não é exagerar no palco, entendeu? Muitas vezes é ele ficar
contido, entendeu? Embora a gente deva ter essa noção de como o ator se comporta no
palco, eu não sei se a peça de teatro ela é o mais importante pra gente na questão da
atuação, o mais importante para o animador, a referência mais importante.”

E13: “Sim. Muito. Peças de teatro não (...) Mas uma vez eu fui e achei muito bom pra
estudar acting. Mas vídeo com certeza, mais do que animação até. Se eu tenho que
animar uma cena raramente eu vejo uma cena de animação. Especialmente se for um
personagem humano porque eu acho que já é uma releitura o que a pessoa fez. Aí eu
prefiro ver uma pessoa real, em vez de ver um desenho que alguma pessoa já fez e que
provavelmente foi em cima de alguém que ele viu. Então sim, não imediatamente como
eu disse. Eu lembro mesmo de alguma coisa que eu vi, de alguém que dá o tom do
personagem na hora e faço pensando nele, nessa pessoa específica.”

b) Usa
para fins E4: “Não muito para movimentos e expressões, mais para enquadramentos e direção.” 1
técnicos

c)
Referência 0
teatro

128
Apêndice 1 – Entrevistas semi-estruturadas

7 - Você conhece algo sobre técnicas de atuação de atores em artes cênicas?

Categoria Unidades de Contexto, Unidades de Registro (sublinhado) e Codificação Frequência

E6: “Eu tenho conhecimento teórico, mas não prática. “

E8: “Eu sei muito pouco sobre as técnicas de atuação, na verdade. Eu conheço a
técnica do Stanislavski, mas eu desconheço várias outras técnicas de atuação que
tem por aí.”

E9: “Ler o manual do ator, do Stanislavski, foi mais importante do que, sei lá, o livro
de anatomia do Burne Hogarth, e acho essencial esse interesse. Cada vez que eu
ouço entrevistas ou oficinas com um ator ou atriz falando sobre o trabalho deles,
apesar de parecer distante, tá muito mais próximo do raciocínio do animador, das
minhas preocupações e das minhas dificuldades, está muito mais próximo do que
seria um pintor, por exemplo.”

E10: “Eu conheço bem superficialmente o método desenvolvido pelo russo


Constantin Stanislavski. Na época em que estudei atuação, fizemos alguns
exercícios de visualização e de atuação baseados nesse método. Também tivemos
aulas com um mímico, onde fizemos exercícios corporais e mentais. O intuito era de
nos deixar familiarizados com o corpo humano e suas diferentes formas de
expressar sentimentos.”

E12: “Sim, porque eu já tive alunos que foram atores e eles me deram várias dicas
sobre atuação (...) Então de vez em quando eu tinha uns bate papos com eles, mas
óbvio que eu não tenho nenhuma... eu nunca entrei num palco, eu nunca estudei
teatro, mas eu conheço técnica por ter conversado com essas pessoas e porque eu li
uma vez parte do livro do Stanislavski. Então eu conheço alguma coisa, mas
conhecimento teórico e não prático.”

E1: “Conheço poucas técnicas de atuação, mas o pouco que aprendi em literatura e
observação são movimentos exagerados.

E3: “Nunca estudei a fundo, mas é sempre bom entender disciplinas fundamentais.”

E4: “Não muito, o pouco que estudei sobre o assunto foi no livro Acting for Animators.”

E7: “Na verdade, não conheço nenhuma técnica, mas sei de amigos que são
animadores que trabalharam ou trabalham com teatro. Eles usam o corpo como uma
forma de expressão artística.

E13: “Não. Eu até já peguei alguns livros emprestados, mas eu não li não (risos). Não
tenho tanto interesse assim não.”

E5: “Todo animador deve acabar seguindo algumas regras usadas por atores.
Mesmo que de forma instintiva, sem ter aprendido sobre isso”.

E11: “Não conheço. Eu tive mesmo umas aulas mais sobre orientação do peso do
corpo, onde que o peso do corpo está em cada momento, que isso faz diferença pro
personagem pra ficar crível assim o movimento, mas sobre atuação não.”

129
Apêndice 1 – Entrevistas semi-estruturadas

8 - Você utiliza alguma técnica de atuação para atores na conceituação e produção das suas cenas?

Categoria Unidades de Contexto, Unidades de Registro (sublinhado) e Codificação Frequência

E4: “Eu não aplico especificamente nenhuma técnica na produção das minhas cenas,
apenas utilizo meus conhecimentos básicos como regras gerais.”

E6: “Não tenho um método específico para atuação, varia de trabalho a trabalho.“

E7: “Não, não uso nenhuma técnica. O que a gente faz, de vez em quando, é que a gente
se filma, mas a gente vai muito mais no feeling, (...) A gente se filma para ter essas cenas
de referência, mas eu pelo menos desconheço de alguma técnica de atuação assim. (...)”

E8: “Eu particularmente não utilizo nenhuma técnica. Eu sou péssimo para fazer vídeo de
referência e atuar. (...) A maioria dos animadores grava um vídeo de referência para ter
uma ideia geral da atuação da cena, mas eles também buscam diversas informações de
mecânica do corpo, por exemplo. (...) pode pegar informações de timing, pode pegar
várias informações no nosso vídeo de referência e atuação de uma forma geral.”

E11: “Não, porque não conheço nada assim. Eu tento é fazer pensando em alguma coisa
que eu já vi, em alguém que eu já vi assim.”

E1: “Acredito que uso alguma técnica, mas é por simples observação pelo que vejo em
TV, cinema, teatro, mas não uso uma técnica determinada.”

E5: “(...) Não sei sobre atuação de atores. Mas talvez eu acabe fazendo algo parecido.”

E10: “Eu sempre lembro da frase de um dos grandes animadores da Disney, de que "não
devemos animar desenhos, mas sim sentimentos." E a partir dessa idéia eu penso em
uma série de fatores: motivação do personagem; personalidade, fatores físicos, como se
ele está com frio, fome, etc. Tudo depende de como a atuação vai servir à história e fazer
sentido naquele momento do filme/série.”

E13: “Não diretamente. Mas se eu assisto filme pra fazer, se o que eu tenho de acervo
dentro de mim é baseado em filmes que eu vi, em coisas que eu assisti, provavelmente eu
tenho alguma coisa que eu não sei o que é que é, né, assim. Não tá organizado de
maneira acadêmica, mas provavelmente a gente, acho que todo mundo tem, porque todo
mundo assiste muito e já tem esse acervo mesmo de expressões, de expressão corporal.
Tudo isso é um estudo só. Só não é acadêmico da minha parte.”

c) Utiliza
E9: “Se eu defino que esse personagem vai se mover de maneira naturalista, eu me
técnica de 1
dedico pra tentar seguir isso até o final.
acting

130
Apêndice 1 – Entrevistas semi-estruturadas

9 - Há algum método de atuação que você siga? Você desenvolveu algum?

Categoria Unidades de Contexto, Unidades de Registro (sublinhado) e Codificação Frequência

E1: “Não sigo técnica, mas desenvolvi as próprias soluções, valorizando o arco na
animação, valorizando a pose final, dar mais tempo na pose final para marcar a
expressão, usar o silêncio para contar a história ou marcar um algum momento na
animação que queira tornar perceptível para a platéia.”

E5: “Gosto primeiramente de dividir em cenas de ação e de comunicação. As de ação


eu gosto de trabalhar bem as poses chave e depois intervalar. As de comunicação eu
tenho que animar seguindo o fluxo dos diálogos.”

E6: “Eu não tenho um específico, tenho o meu próprio tanto de atuação quanto de
técnica para animação no computador.”

E7: “Não. (...) Mas geralmente a gente vai direto no desenho. A gente vai criando
desenho. Se tá ruim, apaga e desenha de novo. (...) Então a técnica de atuação pra
gente, a principal vai ser desenhar mesmo (...)"

E9: “Não sei se é método, mas quando você anima, da mesma maneira que tem o estilo,
o design do seu traço, também tem o estilo, o design do movimento que você está
fazendo. Isso fica bem claro no planejamento da cena.

E11: “Não. Eu nem sigo nada que é pronto. Eu tento fazer algo que fique de acordo com
o estilo do filme (...)"

E12: “Não, eu não tenho um método de atuação que eu sigo, mesmo porque eu não
conheço os métodos de atuação. Há pessoa que realmente se aprofundam nisso, nessa
questão, e vão realmente entrevistar atores de teatro e profissionais dessa área e
realmente entendem quais são os métodos (...)"

E8: “Não, eu não acredito que eu use nenhum método de atuação. Eu penso que eu uso
o método para roteiro que se chama Character Driven, que é quando você pensa no
personagem, nos seus conflitos internos. Aí sim, pensando nesses confeitos internos do
personagem, aí você parte para a animação, que é animar o exterior do personagem.
Eu filmo a minha referência e eu vou fazendo várias versões do que eu penso, durante
vários minutos. Aí eu sento e vou escolher a melhor referência que eu gravei para
animar.”

E10: “Eu não uso nenhuma técnica específica, mas tento sempre pensar nos fatores
que falei anteriormente.

E13: “Acredito que sim. Acho que foi isso que eu falei. Provavelmente eu sigo alguma
coisa porque eu gosto das coisas que são parecidas. (...) eu gosto de movimentos mais
rápidos, eu gosto de pausa. (...) Então eu acredito que isso tenha uma ligação com algum
método acadêmico, mas eu só não sei qual é.”

131
Apêndice 1 – Entrevistas semi-estruturadas

10 - Você conhece algum guia que ensine atuação para animação?

Categoria Unidades de Contexto, Unidades de Registro (sublinhado) e Codificação Frequência

E4: “O único que estudei até hoje foi o Acting for Animators mesmo.”

E8: “Conheço, conheço um livro excelente inclusive, que é o Acting for Animators, do Ed
Hooks. Acredito que seja um guia completo para o animador. Ele detalha a diferença entre
atuação de animador, atuação do ator, em quais pontos as atuações se conversam. É
incrível o livro. É uma ajuda muito importante para você ter uma noção mais abrangente
sobre o tema de atuação. É uma ajuda muito importante para o animador.”

E9: “Eu acho que a maioria dos livros, dos manuais, dos guias que ensinam animação
tem uma parte grande, uma contribuição grande especificamente sobre atuação,
animação. Acho que tá bem próximo da outra. Ao mesmo tempo, sempre me interesso
bastante em ler ou assistir entrevistas ou palestras de atores e atrizes sobre atuação,
independente de ser especificamente para animação. Eu acho que é muito próximo.”

E10: “Como livro, eu conheço o Acting for Animators, do Ed Hooks. Existem também
diversos animadores profissionais que disponibilizam dicas sobre acting on-line.

E12: “Eu conheço Acting for Animators e tirando isso eu não vejo muito guia. (...)"

E1: “Não conheço guia que ensine. Meu conhecimento é de observação, filme, teatro,
cinema.”

E7: “Existem sim alguns livros, mas eu não tive nenhuma leitura desses livros que
ensinem acting para animação diretamente. Eu sei que tem alguns livros que tratam sobre
isso, mas nunca li assim. O Animator´s Survival Kit tem algumas coisas que falam bastante
sobre isso, sobre acting e formas de resolver as cenas de uma maneira mais clara,
melhorando o staging, melhorando essa parte, mas não tem nenhum livro que trate disso
especificamente.”

E13: “Não, mas na verdade, não, eu não acho que existe não. Talvez só para vivo. É,
não.”

132
Apêndice 1 – Entrevistas semi-estruturadas

11 - Você consegue perceber alguma diferença na qualidade das animações de filmes em que os animadores
desconhecem técnicas de acting?

Categoria Unidades de Contexto, Unidades de Registro (sublinhado) e Codificação Frequência

E1: “Consigo perceber quando os animadores não utilizam essas técnicas.


Normalmente a animação cai muito a qualidade porque não conseguem passar para
quem está sentindo a animação e a emoção daquela cena. (...) Eu consigo perceber
quando não tem um acting bacana porque a cena não funciona, não fica um boneco
animado, fica um boneco se mexendo.”

E4: “Eu não saberia citar casos específicos, mas indiscutivelmente o conhecimento
das regras de atuação traz uma enorme gama de ferramentas essenciais na
formação de um animador diferenciado.”

E7: “Eu acho que depende da produção do filme, de qual vai ser o acompanhamento
que esse filme tem, de quem são as pessoas que estão por trás da direção, de
supervisão de animação porque quando você não tem uma cena muito boa que não
esteja funcionando, num filme bom com certeza ela não vai passar então a gente não
vai ver. Mas quando a gente tem toda uma produção que não necessariamente
peque por qualidade, por fazer o filme em si funcionar, né, aí a gente percebe uma
diferença de qualidade sim. Mas uma coisa que a gente vê muito é que os
animadores é que, não necessariamente que dominem a técnica, mas que não tem
uma bagagem de ilustração, de ilustrar e criação mesmo, assim, eles têm uma
dificuldade, mesmo, um pouco maior para animar. (...) , o timing, o spacing que a
cena vai ter pro personagem se mover naquele tempo de cena que você tem. Então
faz diferença, porque eu acho que, na verdade, pro animador a coisa do acting ele tá
muito com essa coisa do cara conseguir desenhar e trabalhar bem as poses assim,
sabe?"

E9: “Sim, mas nitidamente. Mesmo quando na superfície o trabalho parece ser de
um virtuosismo técnico do animador, um animador virtuoso, é muito, mas muito
diferente quando ele tá repetindo soluções que milhares de pessoas já fizeram antes
e ou até quando ele está repetindo soluções que ele já usou antes e mantém essa
biblioteca limitada e contínua, de quando a pessoa está efetivamente criando,
inventando, se expressando, sendo autoral no acting, inventando soluções que tem
a ver com a própria personalidade e com a personalidade daquele personagem que
ela tá animando, que torna tudo mais honesto, autêntico, verdadeiro.”

E10: “É possível perceber quando o animador não teve o tempo necessário para
planejar e usar referências nas suas cenas. E isso afeta bastante os filmes em que
não houve esse cuidado. Na maioria das vezes, eles possuem personagens
genéricos e sem uma motivação clara. No entanto também é importante lembrar que
a atuação deve servir a história acima de tudo. A ideia de simplificação é essencial
na hora de animar. Por isso, nunca é demais lembrar que animação é comunicação.

133
E8: “Não, eu não vejo essa diferença de qualidade na animação. Eu acredito que um
bom filme tenha uma boa supervisão. Existem supervisores de animação que estão
lá só para garantir que todos os animadores, toda a equipe de animadores vai animar
aquele personagem do mesmo jeito. Eu acho que isso é a principal diferença, é a
peça fundamental para que todos os animadores animem aquele personagem e o
personagem não perca a sua essência durante o filme.”

E11: “Eu não sei, não dá pra saber se usam técnica de animação ou que não usam.
A diferença que eu percebo é que os filmes de animação de Hollywood, da Pixar,
b) Não Dreamworks, da Disney, eles são todos parecidos em estilo de animação e
interpretação e pelos making ofs a gente vê eles usando muito essas coisas de usar 3
percebe
espelho e de usar eles mesmo para animar em cima e usa o tempo e até ir copiando
as expressões deles mesmo. Acho que isso é que dá para saber de uma escola de
interpretação assim, apesar de que as expressões, apesar de estúdios bem
diferentes, é muito parecido

E13: “Não consigo porque na verdade eu não sei se alguém estudou isso mesmo
para animação, né. Eu acredito, eu já ouvi de alguns animadores que eles estudam
métodos de atuação pra vivo, mas não consigo, eu não consigo identificar porque eu
não li. Então não é imediato pra mim. Eu também acredito que quem não leu
desenvolveu de qualquer maneira, igual eu falei antes, desenvolveu algum método
aí eu acho que é difícil, é difícil identificar assim sem a pessoa..., não é tão explícito

E12: “Sim, qualidade de filme sim, mas eu não sei se a qualidade passa pelo
desconhecimento do animador em relação a técnica de atuação ou se passa pela
experiência do animador. Nós sabemos que os estúdios mais novos eles não têm
recursos pra contratar ou manter os melhores animadores. Então conforme esses
c) Em animadores vão se aprimorando, até nas técnicas de atuação, eles vão procurando
1
dúvida lugares melhores para ficar. Ou seja, para conseguir seus empregos, e
reconhecimento e tudo. Então, sim, a gente sempre percebe que tem uma diferença
na qualidade de filme de alguns estúdios, mas eu me questiono se essa diferença de
qualidade é só pelo conhecimento da técnica da atuação, mas eu acredito que essa
é outra pesquisa, é algo que seria mais aprofundado.”

134
Apêndice 2 – Entrevistas na íntegra sobre o conhecimento de técnicas de
acting e o processo criativo do animador brasileiro.

PERGUNTA 1
Qual é o seu background artístico relacionado à animação?

E1: “Background artístico para animação não é necessariamente algo visual ou


relacionado ao movimento. Fotografia e música são inspiradoras. Exercita o
pensamento sinestésico do som falar pela animação. Tem todos os tipos de arte,
pintura, literatura, transformados em animação. Como animação significa animar
alguma coisa, dar vida a algo inanimado, todas essas sensações artísticas que
a gente consegue perceber servem como background artístico para animação.
É quase que uma leitura artística em movimento.”

E2: “A primeira experiência que tive foi com os desenhos animados japoneses
(animes), a partir deles fui me interessando cada vez mais por desenho,
animação e edição, o que acabou resultando no interesse de fazer uma
faculdade/curso na área. Eu cursei Desenho Industrial, na UFRJ. Logo cedo, no
meu primeiro estágio na TV Globo, tive o primeiro contato com animação 2D/3D
e desde então quis estudar e me aprofundar mais na área de motion graphics.
Participei de projetos importantes para o Jornal Nacional e aprendi muito com a
equipe de outras áreas.”

E3: “Aprendi muito sobre animação nos 10 anos que trabalhei na Seagulls Fly e
nos 5 anos da minha empresa. Muitos projetos entre motion graphics e animação
de personagens me ensinaram a flexibilizar meu trabalho.“

E4: “Sempre curti desenhos animados, mas o que realmente me fez querer
trabalhar com animação foram os filmes de 3D, principalmente da Dreamworks
e Pixar.”

E5: “Eu comecei a me interessar por animação com as series de TV dos anos
80. Depois vieram os desenhos japoneses e os filmes estilo Disney/Pixar”

135
E6: “Sou formado em design com especialização em animação tradicional e CGI.
Sempre produzo conteúdo autoral independente e dentro do meu estúdio.”

E7: “Sou designer, formado pela ESPM. Desde o começo da faculdade, sempre
gostei muito de ilustrar, de fazer trabalhos artísticos nessa área. Acabou que sai
da faculdade com isso na cabeça, trabalhar com ilustração, o que me levou para
o meio da animação. Trabalhei num projeto com a Conseqüência, e emendei em
outros projetos em animação com a 2dLab e agora no Copa Studio.”

E8: “Eu tenho duas atividades de background artístico que me ajudam na


animação. O primeiro é a música. A música e a animação partilham do mesmo
princípio que é essencial para as duas artes. O ritmo, né? Toda a música, seja
ela rock, MPB, samba, qualquer gênero, tem aquele momento calmo, o momento
de pico, aí volta a ficar calmo de novo, isso é muito utilizado na animação
também. Sempre antes de animar eu escuto áudio personagem. Eu fecho o olho
fica imaginando qual momento eu posso mudar o ritmo, qual momento da fala
do personagem que eu posso fazer alguma ênfase, algum movimento que
quebre o ritmo da cena. Isso tudo adiciona textura, deixa a cena o mais natural
possível.
O segundo background artístico que eu tenho é da fotografia. Fotografia ajuda
na composição de cena, no staging do personagem. É, eu acho incrível como os
fotógrafos contam a história com apenas um frame, né? Tem apenas um frame
pra contar a história e eles conseguem fazer isso de forma magistral. Eles sabem
direcionar o olhar do espectador exatamente pra onde eles querem que o
espectador veja e é um princípio muito desafiador da animação fazer isso,
principalmente quando você lida com mais de um personagem na mesma cena,
com dois, três personagens. A fotografia ajuda você, ajuda muito você a pensar
naquela visão do espectador.”

E9: “Eu estudei na (Escola de) Belas Artes, da UFRJ, desenho industrial,
habilitação em programação visual, que era voltado para design. Não me
apetecia, não me apetece. Na verdade, a única razão para eu ter estudado lá foi
por conta de duas disciplinas específicas que eram quadrinhos e animação.”

136
E10: “Meu background artistíco é dividido entre desenho e o cinema. Me formei
em Cinema, na PUC-RIO, e fiz um curso de desenho na Quanta, em São Paulo.
Em seguida, ganhei uma bolsa para fazer o curso de animação de personagens,
no The Animation Workshop, na Dinamarca. Durante esse tempo, aprendi
bastante sobre animação 2D e 3D e sobre o processo de fazer um filme.”

E11: “Estudei publicidade. Fiz alguns trabalhos de animação por conta própria
em disciplinas de vídeo, sem orientação. Fiz curso de animação tradicional na
AAAD – Academia de Animação e Artes Digitais, em São Paulo. Depois eu
comecei a trabalhar. Em seguida eu fiz o primeiro ano de animação de
personagem da Animation Workshop, na Dinamarca.”

E12: “Meu background artístico, eu sou formado na (Escola de) Belas Artes, da
UFRJ. Então geralmente eu aplico os conceitos que eu aprendi de história da
arte, de desenho de ilustração de pintura quando eu vou fazer animação. Não
necessariamente aquilo tava relacionado à animação. Eu faço essa relação
enquanto eu to trabalhando.”

E13: “Quando eu comecei, eu não tinha estudo nenhum. Eu comecei muito nova
e as únicas coisas que eu tinha visto mesmo era animação da Disney, clássica
mesmo, as animações que passavam no cinema, mas eu não tive acesso a muita
coisa de livro, nem de coisa alternativa assim antes. Então o que eu tenho hoje
é um apanhado assim das pessoas com quem eu trabalhei, dos trabalhos dos
meus chefes.”

PERGUNTA 2
Quais são as suas inspirações para animar as suas cenas?

E1: “Inspira em tudo que o personagem pode estar sentindo naquela cena.
Movimento, velocidade, agressividade. Eu procuro me inspirar nos sentimentos
do cotidiano, do dia a dia. Pode ser uma referência visual, pode ser a minha filha

137
que ficou irritada com qualquer coisa, pode ser uma música, um fato do dia a dia.
Eu me inspiro na vida cotidiana para animar as minhas cenas.”

E2: “Depende muito do tom de cada trabalho. Tento sempre me atualizar pela
internet (em sites como Behance e Abduzeedo) das tendências do mercado e
procurar adaptá-la com algum tipo de inovação para o gosto do cliente.”

E3: “Minha inspiração para animar vem de animações da Disney, Estúdio Laica
e Pixar, animes, filmes e cinematics de jogos.”

E4: “Varia muito, dependendo do tipo de personagem que vou trabalhar, mas
em geral curto buscar inspiração nos cartoons clássicos.”

E5: “Tudo que você vê na vida fica registrado no cérebro. Então sempre funciona
como referência em algum momento”

E6: “Referências filmadas e de filmes que gosto, como Ghibli e Pixar. Também
sempre referencias de cinema live-action.”

E7: “Eu trago como bagagem as referências que eu tenho de animação para
mim mesmo. No Brasil, a maioria tem referência da Disney, mais ocidentais, o
que nos é apresentado desde pequeno, mais main stream, mais blockbuster. A
partir daí você vai aperfeiçoando a sua técnica, o seu repertório de animação,
você vai procurando outras coisas em animações mais experimentais,
animações com talvez uma bagagem de referências mais variáveis. Tem muita
coisa da Gobelins que tem alto nível de animação muito boa e que serve de
experiência muito boa para referência para animar. Uma coisa interessante é
que às vezes o animador gosta de botar movimento em quase tudo. Às vezes o
que a direção de animação, o serviço tá pedindo é uma coisa contida, mas o
animador vai quere movimentar aquilo ali com overlaps, exagerar, de uma
maneira que não é necessária. Então você tem que envoluir (sic) ali, um
processo reverso. Você tem que diminuir a quantidade de animação, como se
fosse, para você chegar num estilo de animação que está sendo pedido. Acho
que é mais ou menos por aí assim.”

138
E8: “As inspirações são as mais diversas, desde os Nine Old Man até os
animadores antigos da Disney, até animadores atuais, estudantes. Eu estou
sempre de olho no que tão fazendo por aí, seja de uma grande produtora ou
filmes de graduação de alunos gosto. Eu gosto muito de ver curtas metragens
de alunos da Ringling College, da Cal Arts, da Gobelins. Eu acho que o animador
tem que se atualizar constantemente e ver o que eles estão fazendo por aí.”

E9: “São praticamente de duas direções distintas. A inspiração vem da


observação e referência do real, de como as pessoas se movem, de uma
maneira naturalista que as pessoas se movem e em paralelo, de uma maneira
oposta, quase, das cenas de ação e exageradas com movimentos quase
impossíveis e inverossímeis.”

E10: “Antes de animar uma cena eu me inspiro primeiro no storyboard/animatic,


geralmente as poses já possuem o sentimento certo e tem uma razão de estar
ali. Depois, ver as outras cenas e conversar com o diretor/supervisor de
animação eu então começo a pesquisar referências. Dependendo do tempo
disponível eu tento filmar. Ou procurar por referências na internet. Também acho
útil buscar inspiração nos colegas de trabalho e pedir sempre feedback. Ao
animar uma cena por muito tempo acabamos perdendo a habilidade de ver o
"todo" e focamos somente nos detalhes.”

E11: “Eu tento pensar em alguém que conheça. Na maioria das vezes quando é
animação de personagem, que tenha personalidade, para pensar no jeito que a
pessoa se mexeria, como que é o tipo de reação, eu acho que é o principal assim.
Ou, dependendo o estilo de animação, lembro de alguma animação que eu vi.
Mas pra fazer mesmo, eu tento pensar em alguém que teria aquela
personalidade.”

E12: “As minhas inspirações geralmente são animações que eu já conheço. Eu


busco muito olhar o trabalho de animadores com, por exemplo, Victor Navone,
ou então Carlos Baena, que são referências pra mim. Eu também busco muito
fazer ilustrações também, ou seja, tem um ilustrador que eu gosto muito que é o

139
Paschoal Campbell, que ele tem umas poses que são muito boas e são
perfeitamente aplicáveis a animação. Eu geralmente faço vídeo referências
quando eu tenho que animar, ou seja, eu não animo da cabeça não. É muito
difícil fazer isso.”

E13: “Quando eu comecei, eu assistia muito mais as cenas dos filmes que eu já
assistia, que eram os filmes da Disney. Então eu assistia em câmera lenta, eu
reassistia muitas vezes a mesma coisa porque eu nunca gostei muito de assistir
muita coisa diferente uma da outra, muitos estilos não. Eu sempre gostei das
mesmas coisas e até hoje eu assisto Disney mesmo, umas coisas mais
parecidas. E muitas dessas pessoas com que eu trabalhei que, como eu sempre
fui free-lancer e trabalhei com muita gente que fazia muita coisa diferente, eu fui
tendo que aprender um pouquinho de cada assim, dependendo do que eu tava
fazendo aquela hora. Então eu acho que é muito difícil falar numa coisa que eu
assistia muito ou no que eu me inspiro. Varia muito do trabalho que eu tô
fazendo.”

PERGUNTA 3
Quais são as suas referências e materiais didáticos (audiovisual, livros) que você
utiliza?

E1: “Materiais didáticos são: The illusion of life, Animator´s Survival Kit. Na
internet, movimentos e animação no YouTube. Utilizo também filmagem dos
animadores se expressando na cena.”

E2: “Como trabalho mais com motion design, os principais sites/cursos on-line
que pago atualmente são o "Lynda.com" e "Digital Tutors". A partir deles consigo
aprender e solucionar a maioria dos problemas que aparecem nos trabalhos.”

E3: “Hoje em dia como o acesso a informação é muito mais fácil, costumo usar
YouTube, Vimeo, Behance e Pinterest como principais fontes de referência.”

140
E4: “Os livros que são meus guias de cabeceira são principalmente o "Acting for
Animation" e o "Animators Survival Kit".”

E5: “Google images, pinterest, artstation, youtube.”

E6: “Utilizo muito YouTube, Vimeo e livros clássicos como Story, Animatior´s
Survival Kit e Cartoon Animation.”

E7: “Essa parte eu acho que o pessoal tem muito como bagagem o Animator´s
Survival Kit, e tem outros livros de animação muito bons, apesar de não chegar
no Brasil. Mas hoje em dia você tem infinitos cursos na internet de formação de
animador que você pode também, é, buscar isso. Mas eu utilizo mais o
Animator´s Survival Kit. Tanto o livro quanto as vídeo aulas que me deram uma
base boa, que abriram minha cabeça para animação.”

E8: “Bom, eu acho que o livro de cabeceira de qualquer animador é o Animator´s


Survival Kit. Acho que eu nunca vou deixar de usar. É incrível porque a cada vez
que você abre o livro você descobre alguma coisa que você ainda não tinha visto
antes, você consegue ver rever alguns conceitos que, às vezes, no dia a dia do
seu trabalho, você que eu estava esquecendo. Um outro livro também
importante, incrível, é O Corpo Fala, né? Ele faz uma introdução sobre a
linguagem corporal e ajuda você a pensar e a trabalhar na comunicação não
verbal do seu personagem. Eu utilizo também, às vezes, pra fazer alguma
animação de animais, eu uso o Animals in Motion, do Edgware Muybridge, que
é uma excelente referência para as poses de animais quadrúpides e por aí vai.”

E9: “As referências são a observação do real. Você entra no metrô, por exemplo,
tem oito pessoas sentadas cada uma tá sentada de uma maneira diferente de
acordo com a personalidade dela, o peso, a idade, as leis da física, o que ela
tiver carregando, inércia, gravidade e referências desde sempre, desde a época
do vídeo cassete, de animações de outros animadores, assistindo quadro a
quadro, e de uma maneira também quase autodidata lendo os livros que durante
muito tempo, principalmente quando eu era jovem, nos anos 80, lendo livros de
animação que raramente chegavam por aqui na época pré internet. ”

141
E10: “Eu ainda uso o Animator's Survival Kit quando tenho alguma dúvida. Mas
na maioria das vezes procuro por referências no YouTube. Acho importante
analisar as pessoas, animais ou objetos em movimento. Ao buscar inspiração na
vida ao nosso redor podemos colocar algo mais original nas nossas animações.
E enriquecemos a nossa biblioteca mental.”

E11: “Referência, direto assim, usando sempre, não, mas tem o Richard
Williams, muita gente usa ou já usou alguma vez. E filme. Eu prefiro filme para
ter alguma referência de filme filmado mais do que alguma referência de
animação porque na animação já foi feito, eu não gosto muito. Já foi interpretado
como animação, como um jeito de se mexer, um tipo de movimento aquilo já é
uma interpretação. Então usar um filme como ideia ou referência que é alguma
coisa legal aquilo já é um produto que já é feito, mas pelo menos é um outro tipo
de meio, é uma interpretação que não é uma interpretação do mesmo tipo que a
gente faz quando anima.”

E12: “Bem, as minhas referências eu já falei. São principalmente animadores,


mas eu também, animadores 3D, mas eu também me dou o direito de ver
animações 2D. Então eu gosto de ver algumas animações da Disney, da Hanna
Barbera ou de alguns estúdios independentes, como, por exemplo, o estúdio
Ghibili, que eu admiro muito. Em relação aos materiais didáticos, em termo de
audiovisual, eu geralmente vou procurar cursos on-line, como o da Udemy, às
vezes até no YouTube eu acho alguma coisa. Ou agora mesmo eu achei um site
chamado EduK, que também pareceu muito bom. Agora quanto a livros eu uso
muito os livros clássicos, tanto os livros de história da arte, o seja, eu gosto muito
de Caravagio, Leonardo da Vinci. Eu uso o The Illusion of Life como referência,
o livro do Preston Blair, o Cartoon Animation, o Animator´s Survival Kit. Sempre
quando eu posso, eu compro alguns livros diferentes de animação, ou seja, eu
vejo quais são os autores que tão publicando e aí vou comprando. Claro, nem
sempre dá, mas eu sempre procuro estar atualizado em relação a isso e vendo
algumas técnicas novas. Geralmente o material didático que eu uso não é
brasileiro, infelizmente.”

142
E13: “Não utilizo livros. Eu até tenho, mas eu não olho nunca. Eu gosto de ver
vídeos, mas eu nunca assisto quando eu to fazendo. Eu prefiro assistir muitas
vezes, procurar num dia inteiro e só animar no outro dia. Daí é o meu método de
fazer um resumo assim de tudo que eu vi. Eu estudo num dia e só no outro eu
vou animar. Eu não gosto de ver e fazer porque me atrapalha.”

PERGUNTA 4
Como você conceitua as cenas de animação que você cria e como você define
a forma que o personagem atuará na cena?

E1: “Normalmente não gosto de preparar, é como o personagem falando por si,
como se eu fosse o personagem, encarnado naquele corpo. Deixa o que tá
definido no final da cena e o que acontece na cena é o que ele tá sentindo do
personagem na hora, acho que fica mais natural assim. Prefiro straight ahead do
que pose to pose por gosto pessoal.”

E2: “No meu caso, cada telejornal (Jornal Nacional, GloboNews, Fantástico) já
possui uma identidade visual pré-estabelecida. A partir dela, adapto a arte para
o tema (política, esporte, médica), em um tom mais sério ou divertido,
dependendo do texto que recebemos.”

E3: “Tudo depende do motivo da cena, das intenções do personagem e tentar


imaginar o que ele está sentindo.”

E4: “Primeiramente eu estudo o estilo do personagem, para tentar definir qual o


tipo de animação que mais se adequa a sua atuação, depois busco referências
em filmes semelhantes, para buscar particularidades e maneirismos, que eu
possa usar na hora de criar meu acting próprio.”

E5: “Primeiro penso no enquadramento, levando em consideração o anterior e o


posterior. Também existem questões técnicas, do tipo qual enquadramento seria
menos custoso. O posicionamento dos personagens vem depois, sempre
levando em consideração a câmera.”

143
E6: “Tudo depende de cada personagem e cada filme. Tento pensar como o
personagem e daí criar a estética do movimento na cena.”

E7: “Isso vem do processo antes do animador pegar a cena. Toda essa
conceituação vem bem lá de trás, da hora que o board é feito, que o diretor tá
pensando naquela cena, e ele talvez vá conversar com o diretor de animação
para ver o melhor acting que vai ser tirado dali. Então provavelmente o diretor de
animação ou o supervisor vai passar esse briefing pra gente para falar como
essa cena vai ser feita e o animador vai começar a trabalhar a partir daquelas
especificações que ele levar de briefing. Mas muita coisa vem assim do próprio
sentimento que o animador vai botar ali, né? É muito difícil você ter cinco
animadores trabalhando numa cena e essa cena sair igual. Eu acho que isso aí
vai ser assim, vai ser a identidade que o animador vai botar ali como realmente
um desenho, uma ilustração. A parte de conceituação vem toda de fora pra gente
do que o diretor tá pedindo. Não sei se é isso a pergunta assim, mas é mais ou
menos por aí.”

E8: “É, o primeiro passo é tentar extrair o máximo de informação possível sobre
o personagem que você está animando. Então, você precisa saber se ele é um
jovem, se é um velho, se ele é um homem, uma mulher, se ele é calmo, se ele é
ansioso. Tudo isso influencia as ações do seu personagem. Você pode estar
trabalhando numa cena onde uma criança vai tomar um susto, por exemplo. Se
a criança for extrovertida, ela vai se assustar de uma forma. Se ela for
introvertida, ela vai se assustar de outra forma. Então cada personagem lida com
uma situação diferente, cada personagem é único. Esse eu acho que é o desafio
principal da animação. Eu acho que o animador em primeiro lugar tem que ser
um bom observador. Por exemplo, eu conheço um rapaz que tem excesso de
suor nas mãos. Então, quando ele vai cumprimentar alguém, ele sempre dá uma
enxugada com a mão na calça antes de cumprimentar a pessoa. E se você
adiciona esse tipo de detalhe, a sua animação, o seu personagem, ficar único. A
sua animação fica mais rica, deixa tudo bem mais natural.”

144
E9: “O Stanislavski classifica, categoriza a atuação praticamente de quatro
formas, que são: realista, naturalista, estilizada e grotesca. Eu acho que apesar
de ser para atores, eu acho que é uma referência fundamental para o momento
que a gente vai animar o personagem. Na minha concepção, na minha leitura,
animação ou acting realista seria rotoscopia, onde o personagem repete
exatamente o que é o movimento que, apesar de ser repetição idêntica do real,
acaba não sendo tão verossímil quanto seria a naturalista, como uma animação
feita a partir da observação de como a pessoa, o ator, atriz, a pessoa se move e
você tenta reproduzir isso sem passar por cima, sem copiar exatamente igual.
Estilizado, como sendo animação para a maioria dos personagens que são
cartoons, onde o movimento todo é mais exagerado. E o grotesco como uma
coisa mais, uma animação mais bizarra, arg! arg!, uma arte mais experimental.
Antes de começar a animar é sempre bem importante definir qual dessas quatro
direções você vai escolher e em seguida você levar em consideração a idade, o
peso, a idade e a situação emocional do personagem.”

E10: “Eu procuro primeiro entender o propósito da cena em relação a uma série
de fatores. Em relação à história, à continuidade, ao tom do filme. Em seguida,
depois de conversar com diretor/supervisor, eu começo a fazer rascunhos e a
escrever as principais ideias para a cena. Nessa etapa, eu tento me colocar na
cabeça do personagem e tento atuar um pouco. Mas nem sempre é possível.
Então a imaginação é a minha primeira ferramenta. Depois peço feedback para
então começar a fazer as poses principais. (Esse workflow pode ser diferente de
acordo com a técnica. Por exemplo, em uma produção de animação 2D é comum
ter alguém que faça as poses principais, deixando aos outros animadores os
breakdowns e inbetweens).”

E11: “Eu acho assim. Tem sempre o tom daquele filme como é que eu acho que
faz diferença o tamanho da cena, eu vou ver quanto tempo de tela que eu tenho
pra fazer aquilo ali e qual que é o tom daquela história ali e qual que é o tipo do
personagem, qual que é a personalidade daquele personagem. Eu tento pensar
em alguém e fazer de um jeito que funcione pra aquilo ali e que caiba e fique de
acordo com a ideia geral que o filme tem que ser. Pensar no tempo que tenho
para fazer tudo e no tempo de tela e no tempo de trabalho também. A gente

145
pensa em fazer algo diferente, mais elaborado a mais num trejeito de um
personagem, mas naquela produção às vezes não cabe ali e tem que ficar
pronto. Então cada vez uma coisa influencia mais.”

E12: “Geralmente eu vou procurar alguma referência, ou seja, uma referência


visual ou com vídeo, ou seja, uma ilustração, ou seja, uma referência que eu
venha a gravar. Mas a questão de definir a forma como o personagem vai atuar
na cena vai depender muito do contexto em que ele está. Tem um artigo que é
do Eleven Second Club em que o autor fala sobre texto, contexto, subtexto.
Então eu gosto muito de ler o texto algumas vezes, pegar algumas palavras
chave, que eu acredito que vão ser as palavras em que o meu personagem ele
vai fazer alguns movimentos mais exagerados. E aí eu procuro entender o
contexto da cena, ou seja, onde que ele tá, o que é que tá acontecendo ao redor,
com que ele tá falando, de onde ele veio, o que é que tava acontecendo antes
dessa cena começar e o que é que vai acontecer depois dessa cena começar.
E aí a partir disso eu gero, eu imagino esse contexto. A partir daí tem o subtexto,
que é justamente quais são as motivações internas do personagem para tomar
aquelas ações, ou seja, como é que ele tá passando, de acordo com o que, com
a história. O que leva ele a tomar determinada ação? Eu preciso compreender
isso pra entender se ele vai ter um gesto que vai ser mais contido se ele estiver
mais triste, ou se um gesto que ele vai estar mais exagerado porque ele tá mais
efusivo, ou então ele tá com raiva e ele vai segurar um pouco aquela, reter um
pouco os sentimentos e depois explodir. É esse tipo de coisas que eu penso. É
assim que eu conceituo.”

E13: “Então eu acho que o conceito é isso. Quando é um filme que eu to fazendo
pra mim, eu já tenho tudo muito definido, assim, o clima todo do filme, das coisas,
do que é que eu quero passar, então, é muito espontâneo. Eu não sei assim
como que eu sei o que é que ele vai fazer. É como se fosse um ator mesmo. A
gente vai atuar, então, é, eu faço alguma coisa que provavelmente eu já vi,
misturado com alguma coisa que eu queria ver, mas é muito difícil definir um
lugar onde eu busquei isso. Eu, raramente eu sei. É sempre uma mistura de tudo
que eu já vi de filme, sei lá, de atuação de vivo mesmo, de pessoa, com o que
eu imagino que vai rolar ali, não sei. E lógico, com o que o diretor me passou no

146
caso de eu estar fazendo para outra pessoa. Então depende muito da direção e
quando é para mim, depende muito das minhas referências naquele momento,
que variam muito assim de onde eu busco.”

PERGUNTA 5
Como você trabalha as expressões faciais e corporais dos personagens?

E1: “Expressões corporais e faciais. Pensa no que o personagem estaria


pensando naquela hora e como ele reagiria de acordo com a personalidade dele.
Se ele é atrapalhado, engraçado, expressões mais exageradas. Em animação
tenta exagerar pra o sentimento que o personagem está passando naquele
momento fique bem claro para quem vai assistir.”

E2: Não respondeu.

E3: “Um bom rigging sempre ajuda bastante. Gosto de trabalhar bastante com
morphs ou blend shapes no Zbrush.”

E4: “Após estudar referências costumo tentar fazer as poses e expressões para
tentar entender se a dinâmica do movimento está natural e plausível.”

E5: “Se tiver diálogo, primeiro anima a mandíbula. Depois os olhos e


sobrancelhas. Depois o resto da musculatura facial. Pro corpo eu começo com
posições chaves e depois intervalamento.”

E6: “Eu costumo blocar as expressões faciais depois da linguagem corporal.”

E7: “Tem a ver com a pergunta anterior, a resposta é mais ou menos o mesmo
caminho. A gente tende a trabalhar na animação buscando a forma mais clara
de expressar o sentimento do personagem. A gente tem que buscar sempre a
melhor forma de leitura. E o rosto é uma das principais formas de comunicação
que o personagem vai ter com o público, com a audiência. Precisa muito
identificar o que o personagem tá falando só com as expressões, como o olhar,

147
as formas que ele tá gesticulando, não só no rosto, mas no acting das mão e
tudo mais. Então a gente tem sempre que buscar isso. E sempre exagerar. Dar
um passo além porque a gente não tá trabalhando com as figura humanas, a
narrativa filmada. A gente tá trabalhando com personagens que na verdade não
tem vida e a gente tem que justamente dar vida para esses personagens e as
pessoas absorverem o máximo da história e da vida daquele personagem que
tá passando na tela ali.”

E8: “Eu acredito que as expressões corporais e as expressões faciais são


resultado daquilo que o personagem está pensando ou está sentindo. Elas, as
expressões corporais e faciais, são sempre um reflexo externo do que ocorre
internamente no personagem que você está animando. Então eu procuro sempre
trabalhar construindo uma pose do começo ao fim, posando o corpo, posando o
rosto, tudo no mesmo frame, porque isso acaba dando uma boa leitura para você
saber o que o personagem está sentindo, para onde está indo, de onde ele está
vindo, sempre trabalhando o espaço negativo, quebrando a simetria do corpo,
nunca deixando as poses totalmente simétricas.”

E9: “Eu acho que é bem importante a gente prestar atenção no dia a dia, seja na
rua , seja assistindo filme ou séries na atuação, nas expressões, na variedade
de soluções de postura de braço, de perna de movimento, de variação facial dos
atores ou das pessoas. Na verdade, você vai criando um acervo, uma biblioteca
na sua memória. Aí na hora de animar e de desenhar, eu acho bem importante
trabalhar bastante os keyframes, as posições chave, levando em consideração
toda essa biblioteca prévia. Mas na hora de animar, fazendo uma combinação
que é de uma tentativa de fazer, criar, desenvolver uma expressão facial
específica mais original, que você não tenha usado antes, combinada com uma
solução gráfica que você vai dar para esse personagem. Então às vezes demora
muito pra você chegar a uma solução que é específico para aquele cara, sei lá,
que tem 80 quilos, que tá muito cansado, que ele correu muito, e que ele não
costuma correr, e ele tá muito bravo e na verdade é uma pessoa que nunca fica
brava. Quanto mais específico é o conjunto de informações que você tem, mais
fácil é você consegui criar uma solução que é original e honesta e autêntica.”

148
E10: “Na maioria das cenas, eu trabalho primeiro as expressões corporais. As
expressões faciais são tão ou mais importantes, mas o corpo tem uma linguagem
bastante forte e pode comunicar um sentimento rapidamente. Podemos saber
como um personagem está se sentindo, mesmo ele estando de máscara. Basta
analisar sua postura, suas mãos e ombros, a maneira como respira, etc. No
entanto, em muitas cenas os olhos são o foco maior para o expectador. Nessas
ocasiões, eu dedico um tempo maior às piscadas, mundanças de direção no
olhar e sobrancelhas.”

E11: “Eu faço da minha cabeça assim mesmo. Eu não uso muita referência de
espelho, nem de olhar muito outra, um rosto, uma expressão. Eu tento fazer pelo
desenho daquele personagem ali, desenho e tento fazer por mim mesmo uma
coisa que seja de acordo com o design do personagem e faço do zero assim
mesmo. E aí a expressão corporal é a mesma coisa. Quando é uma coisa mais
difícil assim ou a gente fica mais em dúvida às vezes é mais difícil mesmo, aí eu
olho no Youtube ou penso em fazer ou peço pra alguém fazer um movimento ou
uma posição quando fica mais difícil.”

E12: “Bem, expressões faciais, além das referências que eu pego, a gente
sempre anima com espelho na frente. Então expressão facial é normalmente
vendo você no espelho. Eu mesmo me vejo no espelho e vou animar, segundo
aquelas referências, minha própria referência. Por outro lado, as referências
corporais eu pego muito de ilustração mesmo. Eu tive um professor que me falou
sobre as poses que existiam no Asterix e eu já tinha os livros do Asterix desde
que eu era criança, ou seja, eu passei a observar aquilo com mais cuidado. Então
tanto as expressões faciais quanto corporais são retiradas desse tipo de
referências. E a partir desse tipo de referência, ou seja, de um storyboard
construído a partir disso, eu vou para a vídeo referência que eu mesmo faço. Eu
acho importante o amimador atuar para a animação.”

E13: “É, é, não sei. Depende muito do personagem, depende muito do meu
humor no dia. Em geral eu não gosto tanto de assistir umas coisas muito
exageradas e eu não gosto, por exemplo, de filme de comédia. Então eu procuro
não exagerar na atuação mesmo para não ficar muito pateta, muito engraçado,

149
ainda que eu queira que tenha humor, eu não faço uma cena muito exagerada.
Acho que é uma coisa minha assim, que eu posso dizer que é minha. Mas
depende muito de tudo, do que que é que eu tô animado. Se é uma peça muito
curta, se eu preciso passar uma informação muito rápida. Então acho que
quando é pra mim, acaba sendo uma coisa... eu faço as coisas muito... eu gosto
de corte rápido, eu gosto da atuação rápida e eu gosto também, apesar disso,
que ela não seja muito exagerada, assim.”

PERGUNTA 6
Você utiliza referências de filmes/séries live-action ou peças de teatro?

E1: “Sempre utilizo referências de filmes e séries, peças porque atuação é muito
importante. Caso contrário, seria movimentação, nem convenceria que está ali
vivo. É um ator em cena. O animador também é. O personagem acaba sendo
uma marionete do animador.”

E2: “Sim. Atualmente para a criação da nova identidade do Jornal Nacional


estamos usando como referência as interfaces HUDs usadas em filmes como
Iron Man, Minority Report e Avatar.”

E3: “Uso como referência visual para luz, timing e ângulo de câmera.”

E4: “Não muito para movimentos e expressões, mais para enquadramentos e


direção.”

E5: “Referências eu uso mais pra modelar. Animar só se for algum animal
especifico. Utilizo filmes de animação e live-action como enriquecimento do olhar
clínico. Mas para animar uma cena especifica só usaria referência se fosse
algum movimento muito especifico de alguma profissão por exemplo. Ginasta.
Bailarina...”

E6: “Acho que por hábito uso mais de filme do que de teatro.”

150
E7: “Isso é bem legal, porque muitas vezes a gente tem uma cena para resolver
ou a gente tá fazendo a parte de planejamento dessa cena e a gente precisa de
referência. Como que isso vai ficar? Com que a gente pode dar o movimento pra
cena e a gente tem que ter essa bagagem. A gente tem que ter essas
referências. Não, aqui eu vou fazer uma coisa mais ou menos nesse estilo, e ir
puxando coisa pra ir somando na cena. A gente conseguir fazer a cena funcionar.
Então referência de filme, você geralmente tá fazendo uma composição de cenas
e você quer uma fotografia legal, o filme tem já uma fotografia bacana, e você
pode usar aquilo, você pode se inspirar nessas coisas assim, sabe? E a própria
animação mesmo. Vários filmes de animação já têm cenas fantásticas que você
consegue buscar referências para o seu personagem na forma como ele se
movimenta, na forma como ele vai falar, gesticular, isso é bastante importante
assim. A gente tem o YouTube que tem infinitos vídeos pra gente buscar
referência de movimentação. Não só filme, mas a gente também se filma
bastante para se chegar em algum resultado legal. A gente usa espelho para
chegar nas expressões que a gente queira atingir. Lipsync que precisa ser feito
a gente usa espelho pra conseguir ver a movimentação da boca e as coisas
funcionarem na nossa cena. Aqui a referência de teatro que você falou é bem
legal falar também que o teatro, a animação surgiu de toda essa linguagem
humana que o ser humano foi desenvolvendo dentro da sua história. Então o
teatro é muito legal por causa disso, porque é um meio de peça, de atuação que
o homem faz que ele não pode ser ouvido. Isso vem lá do teatro grego, quando
o cara (o ator) tava no anfiteatro, tava lá embaixo (no palco) e na última fileira
ele (o espectador) tinha que saber o que tava se passando no palco, para ele
conseguir interagir com a peça, rir com a peça, ou chorar com a peça. Então o
ator tinha que fazer uma atuação bem exagerada, com silhuetas bem eficientes
para que todo o público conseguisse entender. E esses teatros eram muito
difíceis. O cara lá no final não ia conseguir ouvir talvez o que tava sendo falado
lá embaixo. Então você tinha que ter essa expressão corporal muito boa e o
teatro é uma das formas que o corpo do artista mais atua.”

E8: “Sempre. Eu sempre uso referência de live-action, de série, porque é bom


observar como o ator resolveu aquela cena específica. Às vezes, ele fez um
gesto com o ombro, um gesto com a cabeça, ele faz um olhar diferente. E esses

151
detalhes pequenos podem fazer a sua cena ficar muito mais natural. E os atores
sabem fazer isso muito bem. Na minha visão, você precisa assistir filme como
espectador uma vez. Aí você pode voltar e assistir esse filme de novo com o
olhar do animador. Coloca os óculos do animador e vai assistir o filme. Analisa,
vê frame a frame, se possível anotando o que o ator fez naquela cena. Observa.
Você acha uma cena que você gosta e você se pergunta por que é que você
gostou dessa cena. Então você pode buscar por que é que você gostou tanto
daquela cena e aí tenta buscar no ator como ele resolveu aquilo lá, e isso vai te
dar uma referência muito boa na hora que você for animar.”

E9: “Uso, mas não quando eu to animando. Normalmente eu tento absorver, sem
estar vinculado a uma cena específica, absorver essas referências no dia a dia
pra formar uma biblioteca de memória pra você poder acessar, sem ter a
referência imediata, sem assistir, copiar, para fazer a partir do que eu tô vendo.”

E10: “Eu uso referências de filmes, vídeos no YouTube e séries. Não me lembro
de ter usado peças de teatro como referências, mas acho que seria uma boa
idéia. O teatro tem uma outra linguagem em ralação ao cinema, e os atores
tendem a atuar de forma mais clara, com silhuetas fortes e expressões bem
claras. Sem contar o fato de estarem no mesmo ambiente da platéia, o que pode
gerar alguns momentos interessantes.”

E11: “Filme sim, mas não de abrir e olhar pra fazer. Eu me lembro de algum
momento, de algum personagem que eu acho muito bom, assim, mas eu não
faço olhando na hora não.”

E12: “Sim. Eu utilizo referências de filmes, séries de live-action raramente, peças


de teatro eu nunca usei. Pode ser que algum dia eu venha a usar, mas a questão
do ator no palco é meio diferente para mim. Eu falo isso porque eu já conversei
com ator. O objetivo do ator muitas vezes não é exagerar no palco, entendeu?
Muitas vezes é ele ficar contido, entendeu? Embora a gente deva ter essa noção
de como o ator se comporta no palco, eu não sei se a peça de teatro ela é o mais
importante pra gente na questão da atuação, o mais importante para o animador,
a referência mais importante.”

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E13: “Sim. Muito. Peças de teatro não porque eu não tenho o costume de ir, né?
Deveria ir. Mas uma vez eu fui e achei muito bom pra estudar acting. Mas vídeo
com certeza, mais do que animação até. Se eu tenho que animar uma cena
raramente eu vejo uma cena de animação. Especialmente se for um personagem
humano porque eu acho que já é uma releitura o que a pessoa fez. Aí eu prefiro
ver uma pessoa real, em vez de ver um desenho que alguma pessoa já fez e
que provavelmente foi em cima de alguém que ele viu. Então sim, não
imediatamente como eu disse. Eu lembro mesmo de alguma coisa que eu vi, de
alguém que dá o tom do personagem na hora e faço pensando nele, nessa
pessoa específica.”

PERGUNTA 7
Você conhece algo sobre técnicas de atuação de atores em artes cênicas?

E1: “Conheço poucas técnicas de atuação, mas o pouco que aprendi em


literatura e observação são movimentos exagerados. Uma preparação para
pegar um copo com antecipação, por exemplo, é bem mais exagerada. Todos
os movimentos têm que ser expressivos.”

E2: Não respondeu.

E3: “Nunca estudei a fundo, mas é sempre bom entender disciplinas


fundamentais.”

E4: “Não muito, o pouco que estudei sobre o assunto foi no livro Acting for
Animators.”

E5: “Todo animador deve acabar seguindo algumas regras usadas por atores.
Mesmo que de forma instintiva, sem ter aprendido sobre isso”.

E6: “Eu tenho conhecimento teórico, mas não prática. “

153
E7: “Na verdade, não conheço nenhuma técnica, mas sei de amigos que são
animadores que trabalharam ou trabalham com teatro. Eles usam o corpo como
uma forma de expressão artística. E isso tem tudo a ver com animação. São
coisas que se comunicam totalmente bem.”

E8: “Eu sei muito pouco sobre as técnicas de atuação, na verdade. Eu conheço
a técnica do Stanislavski, mas eu desconheço várias outras técnicas de atuação
que tem por aí.”

E9: “Ler o manual do ator, do Stanislavski, foi mais importante do que, sei lá, o
livro de anatomia do Burne Hogarth, e acho essencial esse interesse. Cada vez
que eu ouço entrevistas ou oficinas com um ator ou atriz falando sobre o trabalho
deles, apesar de parecer distante, tá muito mais próximo do raciocínio do
animador, das minhas preocupações e das minhas dificuldades, está muito mais
próximo do que seria um pintor, por exemplo.”

E10: “Eu conheço bem superficialmente o método desenvolvido pelo russo


Constantin Stanislavski. Na época em que estudei atuação, fizemos alguns
exercícios de visualização e de atuação baseados nesse método. Também
tivemos aulas com um mímico, onde fizemos exercícios corporais e mentais. O
intuito era de nos deixar familiarizados com o corpo humano e suas diferentes
formas de expressar sentimentos.”

E11: “Não conheço. Eu tive mesmo umas aulas mais sobre orientação do peso
do corpo, onde que o peso do corpo está em cada momento, que isso faz
diferença pro personagem pra ficar crível assim o movimento, mas sobre atuação
não.”

E12: “Sim, porque eu já tive alunos que foram atores e eles me deram várias
dicas sobre atuação, e porque a irmã da minha ex-mulher era atriz. Então de vez
em quando eu tinha uns bate papos com eles, mas óbvio que eu não tenho
nenhuma... eu nunca entrei num palco, eu nunca estudei teatro, mas eu conheço
técnica por ter conversado com essas pessoas e porque eu li uma vez parte do

154
livro do Stanislavski. Então eu conheço alguma coisa, mas conhecimento teórico
e não prático.”

E13: “Não. Eu até já peguei alguns livros emprestados, mas eu não li não (risos).
Não tenho tanto interesse assim não.”

PERGUNTA 8
Você utiliza alguma técnica de atuação para atores na conceituação e produção
das suas cenas?

E1: “Acredito que uso alguma técnica, mas é por simples observação pelo que
vejo em TV, cinema, teatro, mas não uso uma técnica determinada.”

E2: Não respondeu.

E3: Não respondeu.

E4: “Eu não aplico especificamente nenhuma técnica na produção das minhas
cenas, apenas utilizo meus conhecimentos básicos como regras gerais.”

E5: “Como eu disse. Não sei sobre atuação de atores. Mas talvez eu acabe
fazendo algo parecido.”

E6: “Não tenho um método específico para atuação, varia de trabalho a


trabalho.“

E7: “Não, não uso nenhuma técnica. O que a gente faz, de vez em quando, é
que a gente se filma, mas a gente vai muito mais no feeling, eu acho, de que a
coisa, sei lá, tá funcionando e talvez desse jeito ou desse outro, e a gente vai
muito no teste, eu acho. A gente se filma para ter essas cenas de referência,
mas eu pelo menos desconheço de alguma técnica de atuação assim. Não sei.”

155
E8: “Eu particularmente não utilizo nenhuma técnica. Eu sou péssimo para fazer
vídeo de referência e atuar. Mas tem animadores como o Jeff Gabor, da Blue
sky, ele consegue atuar no vídeo de referência e a animação dele fica muito
próxima da referência e da atuação que ele fez antes. Mas acredito que isso seja
um dom, não é a maioria dos animadores que consegue fazer isso. A maioria
dos animadores grava um vídeo de referência para ter uma ideia geral da
atuação da cena, mas eles também buscam diversas informações de mecânica
do corpo, por exemplo. Por exemplo, se o seu personagem está parado e ele
começa a andar, aí você grava o vídeo referência disso, você vai buscar uma
informação do tipo: quando ocorre a troca de peso das pernas? Ou quando você
vai fazer um head turn: quem que lidera o movimento? É o queixo, é o nariz?
Qual o eixo que foi primeiro: foi o eixo X que começou a virar primeiro, foi o eixo
Y? Em quantos frames esse movimento foi feito? Então a gente também pode
pegar informações de timing, pode pegar várias informações no nosso vídeo de
referência e atuação de uma forma geral.”

E9: “Se eu defino que esse personagem vai se mover de maneira naturalista, eu
me dedico pra tentar seguir isso até o final. Se ele tem uma necessidade de
atuação que é naturalista ele não vai esticar, squash and streatch, o olho não vai
sair do rosto. Se o personagem tiver assim uma animação estilizada, vou definir
essa estilização, talvez com momentos naturalistas, mas o contrário não.”

E10: “Eu sempre lembro da frase de um dos grandes animadores da Disney, de


que "não devemos animar desenhos, mas sim sentimentos." E a partir dessa
idéia eu penso em uma série de fatores: motivação do personagem;
personalidade, fatores físicos, como se ele está com frio, fome, etc. Tudo
depende de como a atuação vai servir à história e fazer sentido naquele
momento do filme/série.”

E11: “Não, porque não conheço nada assim. Eu tento é fazer pensando em
alguma coisa que eu já vi, em alguém que eu já vi assim.”

E12: Não respondeu.

156
E13: “Não diretamente. Mas se eu assisto filme pra fazer, se o que eu tenho de
acervo dentro de mim é baseado em filmes que eu vi, em coisas que eu assisti,
provavelmente eu tenho alguma coisa que eu não sei o que é que é, né, assim.
Não tá organizado de maneira acadêmica, mas provavelmente a gente, acho
que todo mundo tem, porque todo mundo assiste muito e já tem esse acervo
mesmo de expressões, de expressão corporal. Tudo isso é um estudo só. Só
não é acadêmico da minha parte.”

PERGUNTA 9
Há algum método de atuação que você siga? Você desenvolveu algum?

E1: “Não sigo técnica, mas desenvolvi as próprias soluções, valorizando o arco
na animação, valorizando a pose final, dar mais tempo na pose final para marcar
a expressão, usar o silêncio para contar a história ou marcar um algum momento
na animação que queira tornar perceptível para a platéia.”

E2: Não respondeu.

E3: Não respondeu.

E4: “Eu nunca criei um método próprio, apenas como disse uso meus
conhecimentos como regras gerais para avaliar se a cena está funcionando”.

E5: “Gosto primeiramente de dividir em cenas de ação e de comunicação. As de


ação eu gosto de trabalhar bem as poses chave e depois intervalar. As de
comunicação eu tenho que animar seguindo o fluxo dos diálogos.”

E6: “Eu não tenho um específico, tenho o meu próprio tanto de atuação quanto
de técnica para animação no computador.”

E7: “Não. A maioria das minhas cenas eu vou resolver, talvez quando eu tenha
uma dificuldade muito grande, eu vou utilizar uma técnica de filmar alguma coisa.
As formas mais comuns que tem é, sei lá, eu vou usar um espelho, eu vou ver

157
alguma expressão que eu precise botar nesse personagem, algum ângulo de
cabeça que eu tenha que fazer no espelho para funcionar no meu personagem,
isso na forma de desenhar, fazendo um esboço, um sketch da cena, a gente vai
usar essas formas assim. Mas geralmente a gente vai direto no desenho. A gente
vai criando desenho. Se tá ruim, apaga e desenha de novo. A pose não ficou
boa, a silhueta não tá funcionando, a gente apaga e desenha de novo, mas não
necessariamente todas as cenas a gente vai usar alguma técnica de atuação
assim com ator ou com uma filmagem assim. Acho que mais uma coisa muito
específica quando a cena exige muito trabalho assim, que a gente faça isso, mas
não é necessariamente em toda a cena. Então a técnica de atuação pra gente,
a principal vai ser desenhar mesmo, tipo é rabiscar e ver se tá funcionando. E
fazer de novo se precisar de novo e por aí vai.”

E8: “Não, eu não acredito que eu use nenhum método de atuação. Eu penso
que eu uso o método para roteiro que se chama Character Driven, que é quando
você pensa no personagem, nos seus conflitos internos. Aí sim, pensando
nesses confeitos internos do personagem, aí você parte para a animação, que é
animar o exterior do personagem. Eu filmo a minha referência e eu vou fazendo
várias versões do que eu penso, durante vários minutos. Aí eu sento e vou
escolher a melhor referência que eu gravei para animar.”

E9: “Não sei se é método, mas quando você anima, da mesma maneira que tem
o estilo, o design do seu traço, também tem o estilo, o design do movimento que
você está fazendo. Isso fica bem claro no planejamento da cena. Uma coisa que
eu acho bem importante e que eu tento fazer, é tentar variar esse estilo, esse
design de movimento. No planejamento isso acontece pela definição das poses
que o personagem, dos keyframes que ele vai ter naquela sequência, da
velocidade que acontece mudança de um keyframe pro outro, e na ordem que
você define. Se o personagem leva um susto ele levanta a cadeira e olha pro
lado e arregala o olho, diferente do resultado se você altera a ordem, se ele
arregala o olho, olha pro lado e levanta da cadeira, mudando a ordem de como
as coisas acontecem, o resultado é diferente emocional e de como ele tá
processando raciocínio, pensamento dentro da cabeça dele.”

158
E10: “Eu não uso nenhuma técnica específica, mas tento sempre pensar nos
fatores que falei anteriormente. O uso de piscadas e movimentos dos olhos pode
ajudar bastante na hora de animar o personagem pensando, por exemplo. Em
cenas com muitos personagens é importante manter o foco em um de cada vez,
mantendo os outros em segundo plano. Outro ponto importante é o estilo da
animação do projeto. Se for algo mais cartoon, o personagem deve agir de forma
bem mais estilizada, com silhuetas claras e dinâmicas.”

E11: “Não. Eu nem sigo nada que é pronto. Eu tento fazer algo que fique de
acordo com o estilo do filme, o estilo da animação também, o propósito de cada
cena, a personalidade do personagem e o design do personagem e uma
animação e atuação que combine com tudo assim pra fazer sentido. É mais isso.”

E12: “Não, eu não tenho um método de atuação que eu sigo, mesmo porque eu
não conheço os métodos de atuação. Há pessoa que realmente se aprofundam
nisso, nessa questão, e vão realmente entrevistar atores de teatro e profissionais
dessa área e realmente entendem quais são os métodos e eu nem posso dizer
que eu já desenvolvi algum, mas eu tenho conhecimento, entendeu? Mas é um
conhecimento muito teórico, pouco empírico. Então eu acredito que não, eu não
desenvolvi, eu não sigo nenhum método ou desenvolvi. Eu vejo muitos exemplos
dos animadores que eu curto no vimeo ou no YouTube. Então eu sigo aquilo que
eles vazem. Nem sei se isso seria o mais correto para animação, mas já que nós
temos que criar cenas que são novas e em geral cenas inéditas.”

E13: “Acredito que sim. Acho que foi isso que eu falei. Provavelmente eu sigo
alguma coisa porque eu gosto das coisas que são parecidas. Então quando eu
assisto, eu identifico, como eu não estudei eu não sei te dizer o que é que é, mas
assistindo a gente sabe, né, o que que parece com que, do que que você gosta
mais, e aí como eu me baseio nas coisas que eu gosto mais, a não ser que eu
tenha uma direção diferente, então eu desenvolvi esse método assim, que é uma
coisa mais curta, né? Curta assim: eu gosto de movimentos mais rápidos, eu
gosto de pausa. E quando ele se mexe eu gosto que ele se mexa muito. Então
eu acredito que isso tenha uma ligação com algum método acadêmico, mas eu
só não sei qual é.”

159
PERGUNTA 10
Você conhece algum guia que ensine atuação para animação?

E1: “Não conheço guia que ensine. Meu conhecimento é de observação, filme,
teatro, cinema.”

E2: Não respondeu.

E3: Não respondeu.

E4: “O único que estudei até hoje foi o Acting for Animators mesmo.”

E5: “Não.”

E6: “Na Gobelins tive um professor muito bom de expressão corporal e acting,
Robert W. Bennet. Lá eles abordam animação com uma direção legal pra
atuação.”

E7: “Existem sim alguns livros, mas eu não tive nenhuma leitura desses livros
que ensinem acting para animação diretamente. Eu sei que tem alguns livros
que tratam sobre isso, mas nunca li assim. O Animator´s Survival Kit tem
algumas coisas que falam bastante sobre isso, sobre acting e formas de resolver
as cenas de uma maneira mais clara, melhorando o staging, melhorando essa
parte, mas não tem nenhum livro que trate disso especificamente.”

E8: “Conheço, conheço um livro excelente inclusive, que é o Acting for


Animators, do Ed Hooks. Acredito que seja um guia completo para o animador.
Ele detalha a diferença entre atuação de animador, atuação do ator, em quais
pontos as atuações se conversam. É incrível o livro. É uma ajuda muito
importante para você ter uma noção mais abrangente sobre o tema de atuação.
É uma ajuda muito importante para o animador.”

E9: “Eu acho que a maioria dos livros, dos manuais, dos guias que ensinam
animação tem uma parte grande, uma contribuição grande especificamente

160
sobre atuação, animação. Acho que tá bem próximo da outra. Ao mesmo tempo,
sempre me interesso bastante em ler ou assistir entrevistas ou palestras de
atores e atrizes sobre atuação, independente de ser especificamente para
animação. Eu acho que é muito próximo.”

E10: “Como livro, eu conheço o Acting for Animators, do Ed Hooks. Existem


também diversos animadores profissionais que disponibilizam dicas sobre acting
on-line. Posso recomendar nomes como Cameron Fielding no campo do 3D e
Toniko Pantoja no 2D. Ambos possuem material on-line com dicas de animação
e atuação.”

E11: “Não conheço.”

E12: “Eu conheço Acting for Animators e tirando isso eu não vejo muito guia. Eu
vejo muitos vídeos do Animation Mentor, ou seja, críticas do Eleven Second
Club. Então, um guia não, mas eu sei que existem técnicas para isso, porque o
pessoal do Animation Mentor faz e de algumas escolas de animação também
fazem. O próprio Keith Lango naquele vídeo tutorial dele naquele Video Tutorial
Service ele fala um pouco sobre atuação. Então não existe um guia, mas existe
uma série de conhecimentos que estão dispersos e que eu acho importante
conhecer. Acredito que seria muito útil para o animador se esses conhecimentos
tão dispersos estivessem publicados em algum lugar.”

E13: “Não, mas na verdade, não, eu não acho que existe não. Talvez só para
vivo58. É, não.”

PERGUNTA 11
Você consegue perceber alguma diferença na qualidade das animações de
filmes em que os animadores desconhecem essa técnica?

58
Filme live-action

161
E1: “Consigo perceber quando os animadores não utilizam essas técnicas.
Normalmente a animação cai muito a qualidade porque não conseguem passar
para quem está sentindo a animação e a emoção daquela cena. Mesmo que seja
uma coisa sutil, uma cena que você nem acha que caiba uma animação tão
fortes mas que o personagem precisa dar continuidade e ligar uma cena a outra
ou simplesmente uma cena de preenchimento do filme. Eu consigo perceber
quando não tem um acting bacana porque a cena não funciona, não fica um
boneco animado, fica um boneco se mexendo.”

E2; E3: Não responderam.

E4: “Eu não saberia citar casos específicos, mas indiscutivelmente o


conhecimento das regras de atuação traz uma enorme gama de ferramentas
essenciais na formação de um animador diferenciado.”

E5: “A qualidade varia conforme o budget mesmo. Melhores animadores sendo


mais bem pagos. Com tempo pra produzirem produzem melhor.”

E6: “Acho que dá pra chegar na mesma qualidade com o tempo e experiência,
mas saber um pouco de atuação com certeza encurta bem o caminho.”

E7: “Eu acho que depende da produção do filme, de qual vai ser o
acompanhamento que esse filme tem, de quem são as pessoas que estão por
trás da direção, de supervisão de animação porque quando você não tem uma
cena muito boa que não esteja funcionando, num filme bom com certeza ela não
vai passar então a gente não vai ver. Mas quando a gente tem toda uma
produção que não necessariamente peque por qualidade, por fazer o filme em si
funcionar, né, aí a gente percebe uma diferença de qualidade sim. Mas uma
coisa que a gente vê muito é que os animadores é que, não necessariamente
que dominem a técnica, mas que não tem uma bagagem de ilustração, de ilustrar
e criação mesmo, assim, eles têm uma dificuldade, mesmo, um pouco maior para
animar. A gente tem hoje vários tipos da animação que a não necessariamente
você vai ter que meter a mão num desenho assim. Por exemplo, a própria
animação 3D você tem o pupet que você anima direto. A própria animação cutout

162
já tem o pupet fechado. Mas a técnica de desenhar sempre vai fazer você
conseguir explorar melhor o personagem que você tem na sua cena, pode ser
por 3D ou por cutout, tanto pra uma silhueta boa, trabalhar os volumes de uma
forma melhor dos personagens. Isso é que eu acho que vai fazer a diferença de
uma cena ser realmente boa e a outra talvez nem tanto. Além de, claro, o timing,
o spacing que a cena vai ter pro personagem se mover naquele tempo de cena
que você tem. Então faz diferença, porque eu acho que, na verdade, pro
animador a coisa do acting ele tá muito com essa coisa do cara conseguir
desenhar e trabalhar bem as poses assim, sabe? Acho que é mais ou menos por
aí. Mas eu percebo sim. Eu acho que a principal diferença que eu percebo de
animadores e dos caras que conseguem desenhar, que tem uma facilidade maior
para desenhar, e dos caras que não tem uma facilidade tão grande para
desenho. Então eu acho assim que isso é uma balança que pesa um pouco.
Uma cena que talvez o cara tenha mais facilidade o outro cara não tenha tanta
facilidade para resolver. E é claro, tempo de mercado, enfim, toda a bagagem
que o cara vai ter para botar a qualidade na cena. Acho que é mais ou menos
isso.”

E8: “Não, eu não vejo essa diferença de qualidade na animação. Eu acredito que
um bom filme tenha uma boa supervisão. Existem supervisores de animação que
estão lá só para garantir que todos os animadores, toda a equipe de animadores
vai animar aquele personagem do mesmo jeito. Eu acho que isso é a principal
diferença, é a peça fundamental para que todos os animadores animem aquele
personagem e o personagem não perca a sua essência durante o filme.”

E9: “Sim, mas nitidamente. Mesmo quando na superfície o trabalho parece ser
de um virtuosismo técnico do animador, um animador virtuoso, é muito, mas
muito diferente quando ele tá repetindo soluções que milhares de pessoas já
fizeram antes e ou até quando ele está repetindo soluções que ele já usou antes
e mantém essa biblioteca limitada e contínua, de quando a pessoa está
efetivamente criando, inventando, se expressando, sendo autoral no acting,
inventando soluções que tem a ver com a própria personalidade e com a
personalidade daquele personagem que ela tá animando, que torna tudo mais
honesto, autêntico, verdadeiro.”

163
E10: “É possível perceber quando o animador não teve o tempo necessário para
planejar e usar referências nas suas cenas. E isso afeta bastante os filmes em
que não houve esse cuidado. Na maioria das vezes, eles possuem personagens
genéricos e sem uma motivação clara. No entanto também é importante lembrar
que a atuação deve servir a história acima de tudo. A idéia de simplificação é
essencial na hora de animar. Por isso, nunca é demais lembrar que animação é
comunicação. Na maioria das vezes, nos comunicamos de forma bem simples:
através de um olhar, gesto com as mãos, movimento dos ombros, etc. O desafio
é procurar a essência do personagem e traduzir esse sentimento para o papel
ou computador.”

E11: “Eu não sei, não dá pra saber se usam técnica de animação ou que não
usam. A diferença que eu percebo é que os filmes de animação de Hollywood,
da Pixar, Dreamworks, da Disney, eles são todos parecidos em estilo de
animação e interpretação e pelos making ofs a gente vê eles usando muito essas
coisas de usar espelho e de usar eles mesmo para animar em cima e usa o
tempo e até ir copiando as expressões deles mesmo. Acho que isso é que dá
para saber de uma escola de interpretação assim, apesar de que as expressões,
apesar de estúdios bem diferentes, é muito parecido, eu não tenho muito mais
interesse nesses filmes porque é muito igual, muito parecido, meio que parecido
com interpretação de série americana, mais de humor, mas ainda é mais
exagerado. E é sempre um mesmo exagerado, um mesmo trejeito assim, os
personagens têm um mesmo trejeito, falam as coisas de um mesmo jeito, tem
sempre uma mesma expressão, com uma sobrancelha pra baixo e uma pra cima
assim, e uma boca com um sorrisinho de canto. É uma fórmula, parece que eles
usam mesmo um monte de fórmulas que acaba deixando os filmes muito
parecidos. Aí outros filmes e principalmente os curtas assim não dá pra gente
saber quando eles são feitos assim, mas costuma ter muito mais sutileza de
interpretação, de movimento, de sutileza de interpretação. E aí eu acreditaria se
alguém falasse que a maioria dessas pessoas segue nenhuma técnica e nenhum
manual assim de interpretação. E eu acho que fica muito melhor assim, muito
mais válido se cada um fizer por si mesmo, senão é muito mais uma repetição
de um monte de coisa que já foi feita. E cada pessoa é uma pessoa, tem um jeito

164
de fazer as coisas. E aí quando a gente anima, a gente quer fazer um
personagem ali. Se você copia um outro personagem, ele já foi feito. Até quando
você copia uma outra pessoa, aquilo ali já foi feito, mas você seguir um manual
eu acho que fica muito pronto já, fica muito fácil de ter um outro parecido.”

E12: “Sim, qualidade de filme sim, mas eu não sei se a qualidade passa pelo
desconhecimento do animador em relação a técnica de atuação ou se passa
pela experiência do animador. Nós sabemos que os estúdios mais novos eles
não têm recursos pra contratar ou manter os melhores animadores. Então
conforme esses animadores vão se aprimorando, até nas técnicas de atuação,
eles vão procurando lugares melhores para ficar. Ou seja, para conseguir seus
empregos, e reconhecimento e tudo. Então, sim, a gente sempre percebe que
tem uma diferença na qualidade de filme de alguns estúdios, mas eu me
questiono se essa diferença de qualidade é só pelo conhecimento da técnica da
atuação, mas eu acredito que essa é outra pesquisa, é algo que seria mais
aprofundado.”

E13: “Não consigo porque na verdade eu não sei se alguém estudou isso mesmo
para animação, né. Eu acredito, eu já ouvi de alguns animadores que eles
estudam métodos de atuação pra vivo, mas não consigo, eu não consigo
identificar porque eu não li. Então não é imediato pra mim. Eu também acredito
que quem não leu desenvolveu de qualquer maneira, igual eu falei antes,
desenvolveu algum método aí eu acho que é difícil, é difícil identificar assim sem
a pessoa..., não é tão explícito assim eu acho. Não acho que seria mas, não sei.”

165

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