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Dimensões Humanas e Sistemas de

Relações no século XXI (DHSR)


Sumário

UNIDADE I .................................................................................................................... 3

O Contexto Atual de Mudanças .................................................................................. 3

UNIDADE II ................................................................................................................. 10

E a Educação Diante das Mudanças? ...................................................................... 10

BIBLIOGRAFIA ........................................................................................................... 22
UNIDADE I

O Contexto Atual de Mudanças

É bem provável que já tenha se tornado um verdadeiro modismo, a


afirmação de que o mundo está mudando constantemente e que a única
constante na sociedade seja a mudança.

De fato, os avanços tecnológicos contínuos e ao mesmo tempo


impactantes, os desequilíbrios econômicos, as crises sociais, a competitividade
exacerbada, o aumento e as exigências da sociedade por maior sustentabilidade,
exercem elevadas pressões por mudanças sobre os profissionais e
organizações, incluindo aqueles e aquelas ligados à educação.

Sem dúvida, nesse contexto, a intensidade, a velocidade e o impacto


dos avanços tecnológicos são impressionantes. Hoje, não há como não
olharmos para nosso dia-a-dia pessoal e profissional e não observarmos
a profusão de novas tecnologias: internet, telefones celulares de última
geração (agora, presentes em nossas vidas em todos os momentos),
softwares de comunicação online, redes sociais, as impressoras 3D, os
carros elétricos, os carros autônomos, a realidade virtual, a realidade
aumentada, o poder da inteligência artificial, apenas para citar alguns
exemplos do que já está ou estará em curso brevemente.

Atualmente, as comunicações e conexões antes lentas ou


impossíveis de serem realizadas são criadas em frações de segundos,
realizadas em tempo real e com alcances nunca antes imaginados, bem
como se tornou exponencial a capacidade de processamento de dados e
informações. Em resumo, estamos diante de uma verdadeira revolução
digital.

Nesse sentido, ainda é interessante notar a velocidade da entrada


no mercado de massas das novas tecnologias. Enquanto o primeiro
telefone demorou cerca de 60 anos, entre sua invenção e entrada no
mercado, atualmente novos equipamentos e aplicações tecnológicas têm
levado apenas alguns meses e em certos casos alguns dias para
alcançarem grandes contingentes populacionais em todo o mundo.

Em soma, é importante também observarmos as mudanças sociais.


O envelhecimento da população e o aumento substancial da expectativa
de vida, a busca por educação permanente, o desemprego elevado, o
aumento das famílias sem filhos e de solteiros, a formação de novos
modelos de família, o isolamento social, os relacionamentos via redes
sociais, a depressão como uma epidemia global, entre tantas outras
velozes e intensas mudanças.

Em suma, não é modismo dizermos que a sociedade está em


constante movimento e transformação e que tais movimentos podem
trazem consequências para o aprimoramento e desenvolvimento da
educação.

Nesta direção, entendermos com sensibilidade esse contexto é o


primeiro passo. Ou seja, como profissionais de educação devemos pelo
menos ter consciência das mudanças em curso, bem como de seus
impactos. Ainda nessa perspectiva, é provável que Zigmunt Bauman,
sociólogo e filósofo polonês tenha sido um dos autores que mais tenha
captado e traduzido com grande sensibilidade esses novos tempos,
marcados pela tecnologia e seus impactos negativos e positivos.

Bauman ganhou popularidade mundial com seus livros, onde os


títulos traziam a palavra “líquida”. Termo que de maneira geral, segundo
as obras produzidas pelo autor traduzia a natureza das relações atuais.
Isto é, demonstrava a fragilidade e superficialidade dos relacionamentos
do mundo moderno.

Em seu livro 44 Cartas do Mundo Líquido Moderno, no capítulo


“Sozinho na Multidão” o autor faz intrigantes indagações, mediante a
realidade das relações por meio das redes sociais.

Vejamos na íntegra alguns parágrafos do autor e façamos a


nossa própria reflexão!

“Com esses aparelhinhos na mão, você pode inclusive se afastar de


uma situação de pânico, se quiser, instantaneamente – no momento exato
em que a companhia se acerca demais de você e parece opressiva para
seu gosto. Você não tem de jurar fidelidade até que a morte os separe; por
outro lado, pode esperar que todo mundo esteja “acessível” quando você
precisar, sem ter de suportar as consequências desagradáveis de estar
sempre disponível para os outros.

Isso será o paraíso na Terra? Nosso sonho enfim realizado? Será


esta a solução definitiva para a pungente ambivalência da interação
humana, a um só tempo confortadora e estimulante, mas incômoda e cheia
de ciladas? As opiniões se dividem a esse respeito. O que parece estar
fora de dúvida é que pagamos um preço por tudo isso – um preço que
pode se revelar alto demais. Se você está sempre “conectado”, pode ser
que nunca esteja verdadeira e completamente só. Se você nunca está só,
então “tem menos chance de ler um livro por prazer, de desenhar um
retrato, de contemplar a paisagem pela janela e imaginar outros mundos
diferentes do seu. É menos provável que você estabeleça comunicação
com pessoas reais em seu meio imediato. Quem vai querer conversar com
parentes quando os amigos estão a um clique do teclado?” (E esses
amigos são incontáveis, de uma diversidade fascinante; há cerca de
quinhentos ou mais “amigos” no Facebook).
Fugindo da solidão, você deixa escapar a chance da solitude: dessa
sublime condição na qual a pessoa pode “juntar pensamentos”, ponderar,
refletir sobre eles, criar – e, assim, dar sentido e substância à
comunicação. Mas quem nunca saboreou o gosto da solitude talvez nunca
venha a saber o que deixou escapar, jogou fora e perdeu.”
Fonte: Zigmunt Bauman. 44 cartas do mundo líquido moderno. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.
Outra reflexão do autor, também contida no mesmo livro é sobre o
“o futuro dos jovens”. Novamente, vejamos na íntegra alguns parágrafos
do autor e façamos a nossa própria reflexão!

“Contudo, enquanto escrevo estas palavras, nuvens escuras vêm se


acumulando sobre esse mundo, nuvens cada dia mais sombrias. O estado
de felicidade, otimismo e confiança que o jovem pensava ser o estado
“natural” do mundo pode não durar muito tempo. O sedimento da última
depressão econômica – o prolongado desemprego que diminui as
oportunidades de vida das pessoas e obscurece suas perspectivas de
futuro – pode se recusar a desaparecer depressa, se é que um dia
desaparecerá; e não há mais tanta certeza quanto a um retorno rápido aos
dias ensolarados.

Assim, ainda é muito cedo para determinar se as atitudes e visões


de mundo que impregnam os jovens de hoje acabarão se ajustando ao
mundo que está por vir, nem como esse mundo se ajustará às suas
expectativas mais profundas.”
Fonte: Zigmunt Bauman. 44 cartas do mundo líquido moderno. Rio de Janeiro: Zahar, 2011.

Há quem dia que as obras do autor eram um tanto pessimistas. Por


outro lado, outros afirmam que apenas retratam de forma profícua a
realidade presente.
Sem querer estabelecer, elencar ou esgotar quais transformações são e
irão continuar mais impactantes, é importante destacarmos certas
mudanças ligadas ao mundo do trabalho, dado a envergadura dos
desafios educacionais impostados por tais transformações e o impacto
econômico e social provocado pelos desafios do mundo do trabalho.

Nessa perspectiva, outro pensador que apresenta contribuições


importantes sobre o tema e que ganhou notoriedade mais recente foi o
historiador Yuval Noah Harari com seus livros Sapiens, Homo Deus e o
mais atual 21 lições para o século 21.

Em seu último livro o autor, dentre uma séria de provocações, sobre


relevantes temas faz uma importante reflexão sobre o futuro do trabalho.
Vejamos: “não temos ideia de como será o mercado de trabalho em 2050.
Sabemos que o aprendizado de máquina e a robótica vão mudar quase
todas as modalidades de trabalho – desde a produção de iogurte até o
ensino da ioga. Contudo, há visões conflitantes quanto à natureza dessa
mudança e sua iminência. Alguns creem que dentro de uma ou duas
décadas bilhões de pessoas serão economicamente redundantes. Outros
sustentam que mesmo no longo prazo a automação continuará a gerar
novos empregos e maior prosperidade para todos”.

Nessa mesma ótica já se foram mais de vinte anos, quando Jeremy


Rifkin, em seu livro “Fim dos Empregos” (1996), afirmou que mais de 75%
da força de trabalho na maior parte das nações industrializadas já
desempenhavam funções que podiam ser automatizadas, robotizadas ou
terceirizadas.

Portanto, uma característica já marcante do século XXI é a mudança


crescente nas exigências do mercado de trabalho para os mais diversos
profissionais. Pois, a competição entre as empresas é constante e enorme,
assim como, as oscilações na economia e seus impactos no mercado de
trabalho.

Neste contexto, o perigo de uma demissão está sempre presente e


o sonho do emprego seguro por um longo período em grandes
organizações tem desaparecido, até mesmo para os profissionais mais
qualificados.

De fato, o contexto para o emprego mudou, a conjuntura é outra e


há a necessidade de criação de alternativas para um “mundo sem
empregos”. No Brasil, não é diferente. Seja pelas sucessivas e graves
crises econômicas ou pela própria realidade imposta pelas mudanças no
mundo do trabalho.

O que podemos observar é que estudos recentes tem apontado


fortemente o alto impacto da automação no mercado de trabalho. Em um
de seus estudos sobre o futuro do trabalho a OCDE – Organização para a
Cooperação e Desenvolvimento Econômico estimou que 14% dos
empregos do bloco europeu tem alta probabilidade (70% de probabilidade)
de serem automatizados em um futuro próximo. Outro estudo também
nesta direção, publicado no Brasil pelo IPEA – Instituto de Pesquisa
Econômica Aplicada concluiu por meio da avaliação de cerca de 2000
ocupações no Brasil que aproximadamente 25 milhões de empregos estão
alocados em funções com alta probabilidade (60 a 80%) ou muito alta
(80%) de automação. Nessas estão incluídas funções como: cobradores
de ônibus, operadores de telemarketing, mas outras funções até então não
pensadas como passíveis de automação, como fonoaudiólogos e
advogados.

Segundo extrato do próprio estudo é possível perceber que:

“Apesar da porcentagem aparentemente alarmante de profissões


em risco no futuro próximo, há diversos cenários de transformação a se
considerar na dinâmica do mercado de trabalho brasileiro. Por um lado,
atividades tipicamente rotineiras e não cognitivas, como a de ascensorista,
devem de fato ser automatizadas. Por outro, outras profissões que
integram tanto subtarefas facilmente automatizáveis quanto as de difícil
execução por robôs devem sofrer transformações em função do
desenvolvimento da tecnologia e da inteligência artificial. A tendência é
que essas ocupações fiquem cada vez mais centradas em tarefas
intensivas em criatividade e análise crítica e gradualmente se afastem de
atividades corriqueiras e repetitivas – profissões como as de secretariado
e contador se encaixam nessa categoria”. Fonte: Texto para discussão.
Na era das máquinas, o emprego é de quem? Estimação da probabilidade de Automação de ocupações no Brasil.
Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Brasília. Ipea, 2019.

De fato, não há como prever o que irá prevalecer, ou se até mesmo


teremos uma combinação das duas visões. Isto é, se os avanços
tecnológicos irão trazer novas ocupações ou se simplesmente irão
provocar o desaparecimento de inúmeras ocupações. O fato é que
ocupações já estão em substituição e outras surgindo. Um exemplo é o
atendimento por telefone ou telemarketing, onde boa parte, dos serviços
de mensagem já foram automatizados; e por outro lado, o surgimento de
novas profissões como designer de games e mundos virtuais. Em suma,
estamos diante de perguntas sem respostas prontas ou fáceis!
UNIDADE II

E a Educação Diante das Mudanças?

Para entendermos melhor o contexto até então apresentado, vale a pena


recorrermos aos trabalhos de Edgar Morin. Antropólogo, Filósofo e Sociólogo
francês.

Morin nos chama atenção para o denominado pensamento complexo.

Conforme transcrições e análises dos trabalhos do autor, primeiramente,


devemos procurar entender o termo complexidade. Segundo o mesmo,
“complexidade” vem do latim complexus, “aquilo que é tecido”. Nesse sentido,
ainda segundo o autor nosso sistema educacional tem nos tornado incapazes de
conceber e entender a complexidade. Isto é, as inumeráveis ligações entre os
diferentes aspectos do conhecimento. E isto é mais grave no contexto atual, onde
há uma extrema interação entre fatores diversos: econômicos, religiosos,
políticos, étnicos, demográficos etc. Fatores estes extremamente necessários
para o entendimento e resolução dos problemas enfrentados pela sociedade.

Ao contrário do pensamento simplificado, onde por meio da divisão de um


problema em várias partes, se preconiza que será mais fácil resolvê-lo, o
pensamento complexo nos impulsiona para a compreensão do todo e das
interligações entre os diversos aspectos que compõe um determinado tema,
situação, problema ou conjunto de conhecimentos.

Por exemplo, segundo MORIN (2000), “a economia, que é das ciências


humanas, a mais avançada, a mais sofisticada, tem um poder muito fraco e erra
muitas vezes nas suas previsões, porque está ensinando de um modo que
privilegia o cálculo e esquece todos os outros fatores, os aspectos humanos;
sentimento, paixão, desejo, temor, medo. Quando há um problema na bolsa,
quando as ações despencam, aparece um fator totalmente irracional que é o
pânico, que, frequentemente, faz com que o fator econômico tenha a ver com o
humano, e por sua vez se liga à sociedade, à psicologia, à mitologia. Essa
realidade social é multidimensional, o econômico é uma dimensão dessa
sociedade, por isso, é necessário contextualizar todos os dados”.

Nesse contexto e perspectiva multidimensional observado por Morin e


diante do cenário de transformações de diversas naturezas (econômicas,
tecnológicas, sociais, entre tantas outras), além das incertezas crescentes, uma
das questões mais prementes é sobre o papel da educação. Ou seja, qual é, e
será a Educação necessária ao presente e ao futuro? Uma pergunta ampla e
complexa com toda certeza.

Nesta direção, vamos voltar aos trabalhos de Yuval Noah Harari. Em seu
livro 21 lições para o século 21 o autor aborda o tema Educação nesse contexto.
Já no primeiro parágrafo da unidade do livro dedicada ao tema nos deparamos
com suas pertinentes indagações:

“Como podemos nos preparar e a nossos filhos para um mundo repleto de


transformações sem precedentes e de incertezas tão radicais? Um bebê nascido
hoje (2019) terá trinta anos por volta de 2050. Se tudo correr bem, esse bebê
ainda estará por aí em 2100, e até poderá ser um cidadão ativo no século XXII.
O que deveríamos ensinar a esse bebê que o ajude, ou a ajude, a sobreviver e
progredir no mundo de 2050 ou no século XXII? De que tipo de habilidades ele
ou ela vai precisar para conseguir um emprego, compreender o que está
acontecendo a sua volta e percorrer o labirinto da vida?”

Observemos que o autor em suas indagações aponta alguns importantes


elementos do contexto atual, assim como levanta possíveis consequências.
Apesar das enormes carências sociais e econômicas ainda presentes em boa
parte do mundo, as pessoas estão vivendo mais tempo e a tendência é de que a
expectativa de vida continuará a aumentar ao longo dos próximos anos. Portanto,
não só o bebê hipotético criado pelo autor poderá passar dos 100 anos de vida,
mas milhões de pessoas. Assim, tudo indica que teremos mais tempo de vida
produtiva, mas não necessariamente um mesmo emprego por um longo tempo.

Em adição, como talvez já tenhamos percebido, a estabilidade em um


emprego já tende a ser apenas uma lembrança do passado. Conforme os
professores Mandelli e Cortella no interessante livro Vida e Carreira - Um
Equilíbrio Possível, neste novo contexto, pode ser preciso mudar de emprego
com mais frequência, mudar de cidade, mudar de carreira ou até mudar de país.

Nessa mesma linha, conforme Hariri em seu livro 21 lições para o século
21: “Aos cinquenta anos, você não quer mudar, e a maioria das pessoas desistiu
de conquistar o mundo. Já esteve lá, já fez o que fez. E prefere a estabilidade.
Há razões neurológicas para isso. Embora o cérebro adulto seja mais flexível e
volátil do que se imagina, ela ainda é menos maleável do que o cérebro de um
adolescente. Reconectar neurônios e religar sinapses é um trabalho duríssimo.
Mas no século XXI dificilmente você pode se permitir ter estabilidade. Se tentar
se agarrar a alguma identidade, algum emprego ou alguma visão de mundo
estáveis, estará se arriscando a ser deixado para trás quando o mundo passar
voando por você. Como a expectativa de vida aumentará, você poderia ter de
passar muitas décadas como um fóssil. Para continuar a ser relevante não só
economicamente, mas acima de tudo socialmente você vai precisar aprender e
se reinventar o tempo inteiro, numa idade tão jovem como a dos cinquenta anos.”

Ainda analisando as indagações e ponderações acima, podemos inferir


que já não é e não será nada fácil lidar emocionalmente com tantas incertezas e
mudanças. Sabemos que mudar não é necessariamente algo agradável para
muita gente, assim como lidar constantemente com o incerto pode trazer sérias
consequências para nossa saúde mental e emocional.

Voltando ao bebê do século XXI!

Quais as competências deverá possuir diante do que está em curso e


está por vir? Como a educação e os educadores podem contribuir neste sentido
para formação dos estudantes do século XXI?
Mais uma vez perguntas complexas e sem respostas prontas. Contudo,
esforços em direção à compreensão acerca das competências necessárias a um
contexto de transformações e incertezas têm sido empreendidos.

Mas antes de avançarmos para essa compreensão, é importante


relembrarmos o conceito de competências. De maneira objetiva, competência é
o conjunto de conhecimentos, habilidades e atitudes de um indivíduo, ou de
forma popularmente reconhecida significa CHA (Conhecimentos, Habilidades e
Atitudes).

Imagine um médico reconhecido por sua competência. Em resumo, ele


possui conhecimentos apurados para identificar as necessidades dos pacientes,
habilidade para aplicar esses conhecimentos, utilizando os métodos e
instrumentos adequados, motivado por uma atitude diferenciada de sempre fazer
o melhor trabalho.

Imagine agora um executivo que lide com exportações. No mínimo ele


precisará ter conhecimentos relacionados às regras e leis de comércio
internacional, ter habilidades de negociação e uma atitude de persistência para
enfrentar os obstáculos e a concorrência envolvida.

Agora, avancemos para importantes trabalhos que abordaram e


identificaram um conjunto de competências necessárias aos desafios
educacionais de hoje e de amanhã, isto é, para o século 21.

Em estudo coordenado pelo National Research Council, relevante organização


de pesquisa americana, foi identificado um conjunto de competências
necessárias ao século XXI. O estudo foi denominado como Education for Life
and Work (Educação para a vida e trabalho): Developing Transferable
Knowledge and Skills in the 21st Century. Logo, por meio da figura abaixo
podemos destacar e observar algumas das competências identificadas e
agrupadas em três domínios.
Domínio Domínio
Domínio Cognitivo
Interpessoal Intrapessoal
• Pensamento • Colaboração • Ética
Crítico • Responsabilidade • Iniciativa
• Alfabetização em • Resolução de • Flexibilidade
TICs Conflitos • Aprendizado
• Inovação contínuo

Figura 1 – Síntese de Competências

Conforme as definições do próprio estudo, em síntese, o domínio cognitivo


envolve o raciocínio e a memória; o domínio intrapessoal envolve a capacidade
de gerenciar o comportamento e as emoções para que o indivíduo alcance suas
próprias metas (incluindo metas de aprendizado); e o domínio interpessoal
envolve o expressar ideias, interpretar e responder a mensagens de outros.

Com a realização de outros estudos com estruturas semelhantes, ao longo


dos anos foram também definidas as chamadas habilidades críticas para o
século 21. Nesse sentido, vale destacar as habilidades divulgadas pelo Fórum
Econômico Mundial no ano de 2015, conforme as tabelas abaixo:

Habilidades críticas para Habilidades críticas para Habilidades críticas


tarefas diárias desafios complexos para lidar com
ambientes em
constantes mudanças
Domínio da Linguagem Pensamento Crítico Curiosidade
Alfabetização numérica Criatividade Iniciativa
Alfabetização científica Colaboração Persistência
Educação financeira Comunicação Adaptabilidade
Alfabetização nas TIC´s Liderança
(Tecnologias de Informação e
Comunicação)

Educação cultural e cívica Consciência social e


cultural

Tabela 1 – Habilidades Críticas para o Século XXI


Habilidades Críticas para tarefas diárias
Habilidade Descrição Resumida
Domínio da Linguagem Habilidade de ler, entender e usar a
linguagem escrita.

Alfabetização numérica Habilidade de usar números e outros


símbolos para entender e expressar
relacionamentos quantitativos.

Alfabetização científica Habilidade de usar os princípios e o


conhecimento científico para entender o
ambiente e testar hipóteses.

Educação financeira Habilidade de entender e aplicar conceitos


e práticas para a gestão financeira
pessoal.

Alfabetização nas TIC´s Habilidade de usar, aplicar e criar


conteúdo e interações por meio das
tecnologias de informação e

comunicação.

Educação cultural e cívica Habilidade para entender, apreciar e


aplicar o conhecimento relacionado à área
de humanidades.

Tabela 2 – Tarefas Diárias

Habilidades Críticas para desafios complexos


Habilidade Descrição Resumida
Pensamento Crítico Habilidade para identificar, analisar e
avaliar situações, ideias e informações
para formular respostas e soluções.

Criatividade Habilidade para imaginar e criar o novo,


bem como soluções fora do lugar comum
para os problemas.

Colaboração Habilidade de trabalhar em time em prol de


objetivos comuns.

Comunicação Habilidade de interagir, contextualizar as


informações e se expressar por meio da
linguagem oral e escrita.

Tabela 3 – Desafios Complexos


Habilidades Críticas para lidar com ambientes em constantes mudanças
Habilidade Descrição Resumida
Curiosidade Habilidade e desejo de questionar e
aprender.

Iniciativa Habilidade de fazer acontecer, de realizar


antes de ser solicitado.

Persistência Habilidade de manter o esforço e a


disciplina rumo a determinados objetivos.

Adaptabilidade Habilidade de mudar/adaptar planos,


caminhos e metas.

Liderança Habilidade de envolver as pessoas em


torno de objetivos.

Consciência social e cultural Habilidade de interagir, se relacionar e


cuidar do meio onde vive.

Tabela 4 – Ambientes em constante mudanças

Ainda, nessa mesma direção é também importante observarmos as 10


competências gerais estabelecidas em nosso país, por meio da BNCC (Base
Nacional Comum Curricular):

• Conhecimento;
• Pensamento Científico, crítico e criativo;
• Repertório Cultural;
• Comunicação;
• Cultura Digital;
• Trabalho e Projeto de Vida;
• Argumentação;
• Autoconhecimento e autocuidado;
• Empatia e cooperação;
• Responsabilidade e Cidadania.
Uma análise geral e preliminar dos três estudos, sem a pretensão de
esgotar o tema e/ou priorizar um determinado conjunto de habilidades, nos
mostra claramente a importância das habilidades sociais e emocionais.

Ainda, segundo outro estudo publicado pelo Fórum Econômico Mundial em


2016 (New Vision for Education: Fostering Social and Emotional Learning
through Technology) os estudantes para prosperarem no século XXI
necessitam aprender além das habilidades tradicionais e das competências
tecnológicas.

Conforme o estudo e como já observamos os estudantes devem estar


aptos, sobretudo, para a colaboração, comunicação e resolução de
problemas, que são algumas das habilidades desenvolvidas por meio do
aprendizado emocional e social, como aponta o trabalho. Assim, juntamente
com o domínio das tradicionais habilidades, a proficiência social e
emocional pode equipar os alunos desse novo século a não terem
“sucesso”, mas principalmente, lidarem com uma sociedade digital e em
rápida evolução.

Como já observamos estamos diante de um mundo com profissões que


acabaram de nascer, com profissões que ainda nem nasceram e com novas
formas de trabalho (não necessariamente um emprego); o que por si só, já
seria motivo suficiente para colocar o desenvolvimento de cidadãos dotados
de habilidades como criatividade, iniciativa e adaptação na prioridade da
agenda de governos e educadores.

Mas o que poderia ser feito em relação ao processo de ensino


aprendizagem para o desenvolvimento das habilidades sociais e
emocionais?
O mesmo estudo ainda aponta algumas possibilidades e iniciativas,
como pode ser visualizado na figura abaixo:
Pensamento
Oferecer feedback
Crítico
Consciência construtivo
Cultural e Social
Encorajar a empatia Colaboração
Adotar a tolerância e Adotar a tolerância e
respeito aos outros respeito aos outros
Criar oportunidades para
Como Ensinar todas as o trabalho em grupo
Habilidades
• Incentivar a aprendizagem baseada em jogos;
Liderança • Dividir o aprendizado em peças menores e coordenadas ;

Fomentar a negociação
• Criar um ambiente seguro para aprender; Comunicação
• Desenvolver uma mentalidade de crescimento ;
Encorajar a empatia • Fomentar relacionamentos carinhosos; Criar um ambiente rico
• Fornecer tempo para a concentração; para o desenvolvimento
• Fomentar o raciocínio e análise reflexiva; da linguagem
• Oferecer elogios apropriados;
• Guiar a descoberta de tópicos de uma criança;
Adaptabilidade • Ajudar as crianças a aproveitarem sua personalidade
• e forças; Criatividade
Incentivar a gestão das • Fornecer desafios apropriados;
emoções • Fornecer objetivos claros de aprendizado, visando Oferecer oportunidades
Praticar a flexibilidade e habilidades explícitas ; para construir e inovar
a estruturação • Usar uma abordagem prática.

Persistência Curiosidade Incentivar os


questionamentos
Construir oportunidades Instigar conhecimento
para aprender com os Prover oportunidades para questionamentos e
erros Iniciativa de engajamento em inovação
projetos de longo prazo Evocar a contradição
Fornecer autonomia
Fonte: WEF – New Vision for Education para fazer escolhas

Segundo a pesquisa realizada, dentre os exemplos visualizados na figura


acima é importante destacar a criação de um ambiente de aprendizado
seguro para as crianças, com o desenvolvimento e a nutrição de
relacionamentos, tempo para brincar livre e de forma criativa. Por exemplo,
a aprendizagem baseada em jogos sem um agenda programada pode
fornecer oportunidades para a exploração criativa sem restrições, regras ou
pressão (uma componente central de um criativo e ativo processo de
aprendizado).

Outro exemplo, citado no mesmo estudo, está centrado na nutrição, ou


seja, no fomento à criação de uma mentalidade de crescimento (frase criada
por Carol Dwek), Professora de Psicologia da Universidade de Stanford nos
Estados Unidos. Quando as pessoas possuem a “mentalidade fixa”, não
voltada para o crescimento, elas acreditam que qualidades básicas como
inteligência e talento são traços físicos que comandam/governam o que as
crianças podem fazer.
Ainda segundo o trabalho, ao contrário, uma mentalidade de crescimento,
sustenta que o cérebro funciona como um músculo (fica mais forte e melhor
com a prática e com “trabalho duro”). Ensinar, adotando uma mentalidade
de crescimento motiva os alunos e pode criar uma sala de aula onde os
alunos são encorajados a aceitar desafios, experimentar novas coisas e
aprender com seus erros.

Portanto, a criatividade e uma mentalidade aberta para o


crescimento serão fundamentais. E para validarmos a importância dessas
capacidades não necessariamente precisamos nos prender ao futuro.
Podemos também voltar ao passado.

No livro a Emoção e a Regra o sociólogo italiano Domenico de Masi


apresenta a história de grandes empreendimentos criativos, como a
revolucionária e lendária escola de arquitetura alemã Bauhaus, cuja
existência foi de 1919 a 1933. Constituindo-se como uma ponte entre
artesanato, arte, indústria e academia, em um ambiente capaz de
desenvolver profissionais capazes de conhecer todo o processo produtivo e
de expressar uma criatividade constante, a escola cunhou a chamada
criatividade racional da Bauhaus, onde, conforme o autor destacavam-se as
características dos grupos criativos como:

• A habilidade de concentração de energias de cada um no objetivo comum;


• A capacidade de encontrar recursos;
• O estilo de liderança informativo, orientado para a integração e para o
intercâmbio contínuo;
• Uma alta cooperação e participação nos processos decisórios; • As
relações informais e processos informativos incentivados ao máximo;
• Um clima de trabalho estimulante, flexível e entrosado.
Em continuidade à importância do
desenvolvimento das habilidades sócio emocionais ainda vale a pena
voltarmos aos trabalhos de Morin. Em seu livro os sete saberes
necessários à educação do futuro o autor destaca que:

“o século XX produziu avanços gigantescos em todas as áreas do


conhecimento científico, assim como em todos os campos da técnica. Ao
mesmo tempo, produziu nova cegueira para os problemas globais,
fundamentais e complexos, e esta cegueira gerou inúmeros erros e ilusões,
a começar por parte dos cientistas, técnicos e especialistas. Por quê?
Porque se desconhecem os princípios maiores do conhecimento pertinente.
O parcelamento e a compartimentação dos saberes impedem apreender “o
que está tecido junto”.

Nesse contexto, em soma, ainda segundo o autor:

“O problema da compreensão tornou-se crucial para os humanos. E, por


este motivo, deve ser uma das finalidades da educação do futuro.
Compreender significa intelectualmente apreender em conjunto,
comprehendere, abraçar junto (o texto e seu contexto, as partes e o todo, o
múltiplo e o uno). Lembremo-nos de que nenhuma técnica de comunicação,
do telefone à Internet, traz por si mesma a compreensão. A compreensão
não pode ser quantificada. Educar para compreender a matemática ou uma
disciplina determinada é uma coisa; educar para a compreensão humana é
outra. Nela encontra-se a missão propriamente espiritual da educação:
ensinar a compreensão entre as pessoas como condição e garantia da
solidariedade intelectual e moral da humanidade.”

Por último e em síntese, parece haver certo consenso quanto às questões


relacionadas às habilidades necessárias ao século XXI, bem como o desafio
de um cenário de mudanças constantes e intensas. Por outro lado, nesse
contexto, temos outras questões sem posições e respostas ainda
claramente definidas: quais novos modelos educacionais serão
necessários? Quais novos formatos de escolas serão necessários? Como
poderemos aproveitar o potencial das novas tecnologias? Quais novos
métodos de ensino-aprendizagem serão necessários? Qual deve/deverá
ser o papel do professor nesse cenário?

Portanto, a única certeza é a Mudança!

Leia também síntese do Livro Os Sete Saberes necessários à Educação do Futuro.


BIBLIOGRAFIA UTILIZADA

ALBUQUERQUE, Pedro. et al. Na era das máquinas, o emprego é de quem?


Estimação da probabilidade de automação de ocupações no Brasil. Brasília:
Ipea, mar. 2019. (Texto para Discussão, n. 2457).

BAUMAN, Zigmunt. 44 Cartas do Mundo Líquido Moderno. Rio de Janeiro:


Jorge Zahar Editor, 2011b.

CORTELLA, Mário Sergio; MANDELLI, Pedro. Vida e Careira – um equilíbrio


possível? Campinas: Papirus 7 Mares, 2011.

HARARI, Yuval Noah. 21 lições para o século 21. 1ª ed. São Paulo: Companhia
das Letras, 2018.

MASI, Domenico de. A Emoção e a Regra: os grupos criativos na Europa de


1850 a 1950. Rio de Janeiro/Brasília: José Olympio/UnB Editora, 1999.

MORIN, Edgar. Os Sete Saberes Necessários à Educação do Futuro. 3ª ed. São


Paulo: Cortez, Brasília, 2001

World Economic Forum. New Vision for Education: Fostering Social and
Emotional Learning through Technology. Disponível em www.weforum.org.
Consultado em Ago 2019.

Education for Life and Work: Developing Transferable Knowledge and Skills in
the 21st Century. Disponível em www.nap.edu. Consultado em Ago 2019.

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