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ATIVIDADE

MOTORA
ADAPTADA
Deficiência
intelectual: déficit
de atenção (TDAH)
Ana Paula Maurilia dos Santos

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

>> Identificar as principais características e sintomas do TDAH.


>> Descrever os diferentes tipos e graus de TDAH.
>> Planejar atividades físicas inclusivas para pessoas com TDAH.

Introdução
Neste capítulo, você vai estudar o Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperativi-
dade (TDAH). Você vai verificar quão heterogêneo é esse transtorno e conhecer
os seus diversos sintomas, que incluem a tríade desatenção, hiperatividade e
impulsividade. Você também vai ler sobre os fatores de risco associados ao sur-
gimento do TDAH.
Como você vai ver, o diagnóstico do TDAH é complexo. Ele considera a combina-
ção de diversos padrões de comportamentos, que necessitam ser persistentes a
longo prazo e gerar prejuízos significativos às atividades diárias, como as realizadas
na escola e no ambiente familiar.
2 Deficiência intelectual: déficit de atenção (TDAH)

No contexto escolar, o TDAH interfere decisivamente no sucesso acadêmico das


crianças e jovens. Nas aulas de educação física, em particular, pode-se perceber
atrasos no desenvolvimento motor de crianças com TDAH. Por outro lado, estudos
têm demonstrado os benefícios dos programas de atividade física para os indiví-
duos com TDAH. Portanto, o planejamento de programas de intervenção focados
no desenvolvimento motor, social e cognitivo de crianças é de suma importância.
Tais programas melhoram a qualidade de vida dos estudantes e contribuem para
o manejo de comportamentos inadequados, o que é muito importante, já que o
transtorno costuma acompanhá-los em outras fases da vida.

O TDAH e suas causas


O TDAH é um transtorno que se inicia no período do desenvolvimento, co-
mumente antes de a criança ingressar na escola. Ele é caracterizado por
atrasos no desenvolvimento que acabam gerando prejuízos na aprendizagem
escolar, no convívio social e familiar e na realização das atividades diárias.
Sua prevalência é de 5% em crianças e 2,5% em adultos. O TDAH trata-se
de um transtorno altamente hereditário e multifatorial: fatores genéticos
combinados a fatores ambientais constituem aspectos de risco para o seu
surgimento (ROHDE et al., 2019; AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION , 2014).
É comum que o TDAH presente na infância persista na vida adulta, gerando
prejuízos também em vários âmbitos da vida, como relacionamento, educação,
finanças e trabalho. Esse transtorno pode aumentar o risco de acidentes, abuso
de drogas e crimes, além de gerar outros problemas mentais e emocionais.
De modo geral, os indivíduos com TDAH apresentam um padrão persistente
de desatenção e/ou hiperatividade-impulsividade. A seguir, veja como esse
padrão se manifesta no TDAH (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION , 2014).

„„ Desatenção: incapacidade de focar uma tarefa, falta de persistência,


dificuldade de manter o foco, aparência de não ouvir, desorganização,
perda de materiais em níveis inconsistentes com a idade ou o nível de
desenvolvimento.
„„ Hiperatividade: atividade motora excessiva quando não apropriado,
inquietação, incapacidade de permanecer sentado, hábito de remexer,
batucar ou conversar em excesso.
Deficiência intelectual: déficit de atenção (TDAH) 3

„„ Impulsividade: intromissão em atividades de outros, incapacidade de


aguardar, atitudes precipitadas, tomada de decisões importantes sem
consideração às consequências a longo prazo. Esse comportamento
pode ser decorrente do desejo de obter recompensas imediatas ou
da incapacidade de postergar a gratificação.

De acordo com Barkley e Benton (2011), grande parte desses comporta-


mentos pode ser compreendida a partir de três categorias: baixa inibição,
baixo autocontrole e problemas nas funções executivas. Indivíduos com baixa
inibição são aqueles que têm dificuldades de parar pelo tempo suficiente para
pensar no que estão prestes a fazer. Sem essa pausa, não é possível exercer
o autocontrole, que consiste em “[...] qualquer reação dirigida a si mesmo e
a seu próprio comportamento provável que o levaria a fazer algo diferente
daquilo que seu primeiro impulso diria” (BARKLEY; BENTON, 2011, p. 47).
Já as funções executivas são as ações autodirecionadas específicas que os
indivíduos utilizam para se controlar. Essas funções podem ser representadas
pelas habilidades de inibição, memória de trabalho, controle emocional,
planejamento e atenção (BARKLEY; BENTON, 2011). Para os autores, as três
condições estão inter-relacionadas: a baixa inibição conduz a um baixo auto-
controle, e problemas com as funções cognitivas podem produzir problemas
diferentes de autocontrole.
Corroborando esses achados, Rohde et al. (2019) defendem que os défi-
cits cognitivos são frequentemente parte do TDAH e incluem: problemas na
função executiva e no processamento de recompensas, déficits de tempo,
variabilidade do tempo de reação, diversos fatores de regulação atencional e
orientação, problemas em processos perceptivos e na regulação da excitação.
Apesar dos avanços em pesquisas, acredita-se que a compreensão que a
neurobiologia tem do TDAH ainda é limitada (ROHDE et al., 2019). Na prática,
alguns comportamentos/sintomas típicos em pessoas com TDAH podem
ser agrupados nas três categorias mencionadas, conforme os resultados de
décadas de estudos (BARKLEY; BENTON, 2011). Veja a seguir.

„„ Baixa inibição: o indivíduo tem dificuldade de esperar e tolerar, é


impaciente e toma decisões impulsivamente. Ele faz comentários sem
pensar e tem dificuldade de parar as atividades ou reprimir determi-
nado comportamento quando deve fazê-lo.
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„„ Baixo autocontrole: o indivíduo parece não conseguir esperar uma


compensação ou adiar coisas que são imediatamente vantajosas, ou
seja, tem dificuldades para trabalhar visando a um objetivo posterior.
Tende a fazer as coisas sem considerar as suas consequências. Tende
também a fugir da atividade prematuramente se ela é entediante,
buscando fazer algo mais divertido. Inicia uma tarefa sem ler ou ouvir
as instruções com atenção.
„„ Problemas nas funções executivas: o indivíduo tem pouca noção de
tempo; esquece de fazer as coisas que deveria; não entende o que lê tão
bem quanto é capaz, por isso necessita reler para captar o significado;
fica facilmente frustrado.

Tais condições causam sérios prejuízos em diversas áreas da vida das


pessoas com TDAH. Elas precisam lidar, por exemplo, com: baixo manejo em
relação ao tempo, ao planejamento e aos objetivos; baixas auto-organização,
resolução de problemas e memória operacional; baixa autodisciplina; baixa
automotivação; baixas autoativação, concentração e prontidão (BARKLEY;
BENTON, 2011).
De acordo com Rohde et al. (2019), o TDAH está relacionado a outras co-
morbidades psiquiátricas, sendo que 70 a 80% dos indivíduos afetados têm
pelo menos um outro transtorno, como transtorno de oposição desafiante,
transtorno de ansiedade e dificuldades de aprendizagem (em crianças). Na
vida adulta, são comuns transtornos por uso de substâncias e transtor-
nos de ansiedade e humor. Além disso, os autores relatam que uma criança
com TDAH é 10 vezes mais propensa a apresentar transtorno de conduta ou
transtorno de oposição desafiante, bem como tem cinco vezes mais chances
de desenvolver depressão e três vezes mais possibilidades de desenvolver
transtorno de ansiedade. Além disso, atrasos no desenvolvimento motor e
social e na linguagem não são específicos do TDAH, no entanto costumam
ser comórbidos (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014).

O TDAH é identificado frequentemente durante os anos do ensino


fundamental. A desatenção é o padrão de comportamento mais mar-
cante e prejudicial. Na pré-escola, a principal manifestação é a hiperatividade.
Nos anos iniciais da adolescência, o transtorno permanece estável, porém pode
haver piora, como no caso de adolescentes que manifestam comportamen-
tos antissociais. Nesse período, os sintomas de hiperatividade motora ficam
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menos evidentes, assim como na vida adulta. No entanto, os adolescentes


podem apresentar comportamento mais inquieto ou ter sensação interna de
nervosismo, inquietude ou impaciência; ademais, persistem dificuldades com
planejamento, desatenção e impulsividade. Grande parte das pessoas com TDAH
permanece relativamente prejudicada ao longo da vida (AMERICAN PSYCHIATRIC
ASSOCIATION, 2014).
O TDAH está relacionado ao baixo desempenho escolar e acadêmico. Ge-
ralmente, associa-se a ele um transtorno específico da aprendizagem. Nesse
contexto, as crianças podem parecer desatentas devido a frustração, falta
de interesse ou capacidade limitada. Os problemas de aprendizagem escolar
relacionam-se aos sintomas elevados de desatenção, ao passo que a rejeição
por colegas e as lesões acidentais (em menor grau) são mais acentuadas
em padrões de comportamento hiperativo ou impulsivo. Geralmente esse
comportamento é mais frequente no sexo masculino, como uma proporção de
cerca de 2:1 em relação ao sexo feminino na infância (AMERICAN PSYCHIATRIC
ASSOCIATION, 2014).

Na prática, crianças e adolescentes com TDAH comumente apresentam


dificuldade para se manterem atentos em sala de aula. Eles costumam
deixar tarefas escolares pela metade, cometem erros por não prestarem
atenção aos detalhes e são desorganizadas com seu material. Além disso,
estudantes com TDAH frequentemente exigem atenção extra dos profes-
sores e, no dia a dia, comumente têm dificuldades para seguir instruções
(especialmente se essas instruções forem dadas em uma sequência) (LOUZÃ
NETO, 2010).
Especificamente nas aulas de educação física, espera-se que crianças
com TDAH apresentem comprometimentos motores. Pesquisas estimam
que crianças com TDAH podem apresentar déficits motores em 30 a 50% dos
casos, principalmente nas áreas de motricidade fina, equilíbrio e organização
temporal (GOULARDINS, 2010; POETA; ROSA NETO, 2005).

Fatores de risco e prognóstico do TDAH


Durante décadas, pesquisas têm sido realizadas no intuito de desvendar
as possíveis etiologias do TDAH. Atualmente, tanto os fatores genéticos
quanto os riscos ambientais podem ser considerados causas do trans-
torno (ROHDE et al., 2019). No Quadro 1, a seguir, veja as principais causas
genéticas e ambientais do TDAH de acordo com as pesquisas que vêm
sendo realizadas.
6 Deficiência intelectual: déficit de atenção (TDAH)

Quadro 1. Causas genéticas e ambientais do TDAH

Causas genéticas Causas ambientais

Aspectos gerais Exposição a toxinas, privação


„„ Há maior risco de desenvolver o nutricional ou traumas
TDAH quando mãe, pai ou irmãos „„ A deficiência de ferro e zinco está
apresentam o transtorno. associada ao TDAH, pois ambos
„„ Em gêmeos, há uma herdabilidade são elementos essenciais para
estimada em 74%. a produção de norepinefrina e
dopamina no cérebro.
Genética molecular „„ Pacientes com TDAH apresentam
„„ Há variantes do DNA associadas maior chance de terem sido
ao TDAH: genes do transportador expostos ao chumbo.
de serotonina (5HTT), do „„ Complicações na gravidez e no
transportador de dopamina parto (como privação de oxigênio)
(DAT1), do receptor de dopamina são fatores de risco associados ao
D4 (DRD4), do receptor de TDAH.
dopamina D5 (DRD5), do receptor „„ Bebês muito prematuros e/ou com
de serotonina 1B (HTR1B), além peso muito baixo ao nascer têm
do gene codificante da proteína até três vezes mais chances de
reguladora de vesícula sináptica, desenvolver o TDAH no futuro.
conhecido como SNAP25. „„ Filhos de mães que fumaram
„„ 12 loci no genoma abrigam durante a gravidez têm um risco
variantes que aumentam o risco para TDAH aumentado em 2,4
de TDAH. vezes.
„„ O transtorno é poligênico; „„ Pessoas que sofreram lesões
muitas variantes de DNA estão cerebrais traumáticas leves podem
associadas ao risco do TDAH e desenvolver TDAH.
representam cerca de um terço da „„ Crianças que viveram em orfanatos
herdabilidade. que ofereciam nutrição pobre e
praticamente nenhum contato
O risco genético para o TDAH é cor- humano têm mais chances de
desenvolver o transtorno.
relacionado ao risco genético para
outras características, como obesi- Estressores psicossociais
dade e tabagismo, doença arterial
coronariana e câncer de pulmão. Relacionamento conflituoso dos
Isso sugere que pessoas com TDAH pais, disfunções familiares, classe
têm maior risco de desenvolver es- social baixa e baixa escolaridade da
sas doenças. mãe são fatores que aumentam o
risco de desenvolver TDAH.

Fonte: Adaptado de Rohde et al. (2019).


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Em suma, acredita-se que os genes e o ambiente atuam em conjunto para


causar o transtorno. Nesse contexto, a interação entre gene e ambiente e
a epigenética (paradigma que busca investigar a forma como o ambiente
modifica o genoma e a expressão genética) são mecanismos que têm clara
importância teórica no TDAH (ROHDE et al., 2019). Porém, novas pesquisas são
necessárias para oferecer resultados conclusivos sobre a etiologia do TDAH.
Deficiências visuais e auditivas, anormalidades metabólicas, deficiências
nutricionais, transtornos do sono e epilepsia devem ser considerados possíveis
fatores de risco para o TDAH (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014). O
TDAH também tem a ver com “[...] níveis menores de inibição comportamental,
de controle à base de esforço ou de contenção, a afetividade negativa e/ou
maior busca por novidades. Esses traços predispõem algumas crianças ao
TDAH, embora não sejam específicos do transtorno” (AMERICAN PSYCHIATRIC
ASSOCIATION, 2014, p. 62). Considere o seguinte:

Não há marcador biológico que seja diagnóstico de TDAH. Como grupo, na com-
paração com pares, crianças com TDAH apresentam eletroencefalogramas com
aumento de ondas lentas, volume encefálico total reduzido na ressonância mag-
nética e, possivelmente, atraso na maturação cortical no sentido póstero-anterior,
embora esses achados não sejam diagnósticos. Nos raros casos em que há uma
causa genética conhecida (p. ex., síndrome do X-frágil, síndrome da deleção 22q11),
a apresentação do TDAH ainda deve ser diagnosticada (AMERICAN PSYCHIATRIC
ASSOCIATION, 2014, p. 61).

Portanto, o TDAH deve ser considerado de uma perspectiva multifatorial,


dado o conjunto de fatores de risco associados, bem como a diversidade dos
seus sintomas. A seguir, você vai verificar como se dá o diagnóstico do TDAH
a partir do Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais (DSM–5).

Diagnóstico do TDAH
A principal característica do TDAH é um padrão persistente de desatenção
e/ou hiperatividade-impulsividade que interfere no funcionamento ou no
desenvolvimento do sujeito (AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014). Um
ponto de suma importância a se considerar no diagnóstico do TDAH é que
os sintomas não se apresentam de forma isolada; eles se fazem presentes
durante a trajetória de vida do indivíduo e prejudicam significativamente as
suas atividades diárias, como as realizadas na escola e no ambiente familiar.
8 Deficiência intelectual: déficit de atenção (TDAH)

O DSM–5, da Associação Americana de Psiquiatria (APA, 2014, p. 59-60),


considera como critério diagnóstico do TDAH as seguintes características:

A. Um padrão persistente de desatenção e/ou hiperatividade-impulsividade que


interfere no funcionamento e no desenvolvimento, conforme caracterizado por
(1) e/ou (2):
1. Desatenção: Seis (ou mais) dos seguinte sintomas persistem por pelo menos
seis meses em um grau que é inconsistente com o nível do desenvolvimento e têm
impacto negativo diretamente nas atividades sociais e acadêmicas/profissionais:
Nota: Os sintomas não são apenas uma manifestação de comportamento opositor,
desafio, hostilidade ou dificuldade para compreender tarefas ou instruções. Para
adolescentes mais velhos e adultos (17 anos ou mais), pelo menos cinco sintomas
são necessários.
a. Frequentemente não presta atenção em detalhes ou comete erros por descuido
em tarefas escolares, no trabalho ou durante outras atividades (p. ex., negligencia
ou deixa passar detalhes, o trabalho é impreciso).
b. Frequentemente tem dificuldade de manter a atenção em tarefas ou atividades
lúdicas (p. ex., dificuldade de manter o foco durante aulas, conversas ou leituras
prolongadas).
c. Frequentemente parece não escutar quando alguém lhe dirige a palavra direta-
mente (p. ex., parece estar com a cabeça longe, mesmo na ausência de qualquer
distração óbvia).
d. Frequentemente não segue instruções até o fim e não consegue terminar traba-
lhos escolares, tarefas ou deveres no local de trabalho (p. ex., começa as tarefas,
mas rapidamente perde o foco e facilmente perde o rumo).
e. Frequentemente tem dificuldade para organizar tarefas e atividades (p. ex.,
dificuldade em gerenciar tarefas sequenciais; dificuldade em manter materiais e
objetos pessoais em ordem; trabalho desorganizado e desleixado; mau gerencia-
mento do tempo; dificuldade em cumprir prazos).
f. Frequentemente evita, não gosta ou reluta em se envolver em tarefas que exijam
esforço mental prolongado (p. ex., trabalhos escolares ou lições de casa; para
adolescentes mais velhos e adultos, preparo de relatórios, preenchimento de
formulários, revisão de trabalhos longos).
g. Frequentemente perde coisas necessárias para tarefas ou atividades (p. ex.,
materiais escolares, lápis, livros, instrumentos, carteiras, chaves, documentos,
óculos, celular).
h. Com frequência é facilmente distraído por estímulos externos (para adolescentes
mais velhos e adultos, pode incluir pensamentos não relacionados).
i. Com frequência é esquecido em relação a atividades cotidianas (p. ex., realizar
tarefas, obrigações; para adolescentes mais velhos e adultos, retornar ligações,
pagar contas, manter horários agendados).
2. Hiperatividade e impulsividade: Seis (ou mais) dos seguintes sintomas persis-
tem por pelo menos seis meses em um grau que é inconsistente com o nível do
desenvolvimento e têm impacto negativo diretamente nas atividades sociais e
acadêmicas/profissionais:
Deficiência intelectual: déficit de atenção (TDAH) 9

Nota: Os sintomas não são apenas uma manifestação de comportamento opositor,


desafio, hostilidade ou dificuldade para compreender tarefas ou instruções. Para
adolescentes mais velhos e adultos (17 anos ou mais), pelo menos cinco sintomas
são necessários.
a. Frequentemente remexe ou batuca as mãos ou os pés ou se contorce na cadeira.
b. Frequentemente levanta da cadeira em situações em que se espera que perma-
neça sentado (p. ex., sai do seu lugar em sala de aula, no escritório ou em outro
local de trabalho ou em outras situações que exijam que se permaneça em um
mesmo lugar).
c. Frequentemente corre ou sobe nas coisas em situações em que isso é inapro-
priado.
(Nota: Em adolescentes ou adultos, pode se limitar a sensações de inquietude.)
d. Com frequência é incapaz de brincar ou se envolver em atividades de lazer
calmamente.
e. Com frequência “não para”, agindo como se estivesse “com o motor ligado” (p.
ex., não consegue ou se sente desconfortável em ficar parado por muito tempo,
como em restaurantes, reuniões; outros podem ver o indivíduo como inquieto ou
difícil de acompanhar).
f. Frequentemente fala demais.
g. Frequentemente deixa escapar uma resposta antes que a pergunta tenha sido
concluída (p. ex., termina frases dos outros, não consegue aguardar a vez de falar).
h. Frequentemente tem dificuldade para esperar a sua vez (p. ex., aguardar em
uma fila).
i. Frequentemente interrompe ou se intromete (p. ex., mete-se nas conversas,
jogos ou atividades; pode começar a usar as coisas de outras pessoas sem pedir
ou receber permissão; para adolescentes e adultos, pode intrometer-se em ou
assumir o controle sobre o que outros estão fazendo).
B: Vários sintomas de desatenção ou hiperatividade-impulsividade estavam pre-
sentes antes dos 12 anos de idade.
C: Vários sintomas de desatenção ou hiperatividade-impulsividade estão presentes
em dois ou mais ambientes (p. ex., em casa, na escola, no trabalho; com amigos
ou parentes; em outras atividades).
D: Há evidências claras de que os sintomas interferem no funcionamento social,
acadêmico ou profissional ou de que reduzem sua qualidade.
E: Os sintomas não ocorrem exclusivamente durante o curso de esquizofrenia ou
outro transtorno psicótico e não são mais bem explicados por outro transtorno
mental (p. ex., transtorno do humor, transtorno de ansiedade, transtorno disso-
ciativo, transtorno da personalidade, intoxicação ou abstinência de substância).

Como você viu, para se diagnosticar o transtorno em crianças e adoles-


centes, deve-se identificar seis sintomas relacionados a cada subtipo ou
aos dois (1 ou 2) por um período de seis meses. Tais sintomas ainda devem
ter um grau que seja inconsistente com o nível do desenvolvimento e que
cause prejuízos significativos às atividades sociais e escolares. Assim, de
acordo com os critérios de cada uma das categorias, os indivíduos podem ser
diagnosticados com base em três subtipos de TDAH. Veja a seguir.
10 Deficiência intelectual: déficit de atenção (TDAH)

„„ Apresentação combinada: tanto o critério A1 (desatenção) quanto o


critério A2 (hiperatividade-impulsividade) são preenchidos nos últimos
seis meses.
„„ Apresentação predominantemente desatenta: o critério A1 é preen-
chido, mas o critério A2 não é preenchido nos últimos seis meses.
„„ Apresentação predominantemente hiperativa/impulsiva: o critério A2
é preenchido, e o critério A1 não é preenchido nos últimos seis meses
(AMERICAN PSYCHIATRIC ASSOCIATION, 2014).

Considere também o seguinte:

No tipo predominantemente desatento, mais frequente no sexo feminino, observa-


-se mais prejuízo na esfera de desempenho acadêmico e menos na socialização.
Essas crianças podem ser levadas mais tardiamente a tratamento, por não “inco-
modarem” tanto. Já no tipo predominantemente hiperativo/impulsivo, há maior
prejuízo na área social. Os indivíduos com esse subtipo sofrem mais rejeição pelos
colegas e professores devido à impulsividade e à agressividade. Eles podem ter-
minar rapidamente suas tarefas escolares e atrapalhar os demais alunos, mas não
apresentar dificuldade no aprendizado. O tipo combinado leva a um prejuízo global
e está mais associado a sintomas de oposição e conduta (LOUZÃ NETO, 2010, p. 148).

O manual considera ainda que, para o diagnóstico, é importante especi-


ficar se o indivíduo se encontra em remissão parcial. Nesse caso, “[...] todos
os critérios foram preenchidos no passado, nem todos os critérios foram
preenchidos nos últimos 6 meses, e os sintomas ainda resultam em prejuízo
no funcionamento social, acadêmico ou profissional” (AMERICAN PSYCHIATRIC
ASSOCIATION, 2014, p. 60).
Diferentemente do que ocorre no DSM–4, na versão 5, o TDAH pode ser
classificado pela sua gravidade atual. Veja a seguir (AMERICAN PSYCHIATRIC
ASSOCIATION, 2014).

„„ TDAH leve: nenhum ou poucos sintomas além daqueles necessários


para fazer o diagnóstico estão presentes, e os sintomas resultam
em não mais do que pequenos prejuízos ao funcionamento social ou
profissional.
„„ TDAH moderado: sintomas ou prejuízos funcionais entre “leves” e
“graves” estão presentes.
„„ TDAH grave: muitos sintomas além daqueles necessários para fazer o
diagnóstico estão presentes, ou vários sintomas particularmente graves
estão presentes. Os sintomas podem resultar em prejuízo acentuado
ao funcionamento social ou profissional.
Deficiência intelectual: déficit de atenção (TDAH) 11

O diagnóstico do TDAH é clínico, uma vez que não existem exames labo-
ratoriais que comprovem tal distúrbio. Isso justifica a vulnerabilidade do
diagnóstico e também a importância de realizá-lo criteriosamente. Afinal,
qualquer criança pode facilmente receber o diagnóstico de TDAH e uma pres-
crição para tratamento medicamentoso. No âmbito escolar, os professores
devem tomar cuidado para não “rotular” os estudantes como sujeitos com
TDAH quando eles apresentarem características mencionadas no DSM–5.
O diagnóstico de TDAH é realizado quando há uma combinação específica
de sintomas, nunca de forma isolada. Além disso, para realizar um diagnóstico
preciso, é fundamental atentar às comorbidades, já que muitos sintomas do
TDAH estão presentes em outros transtornos. Uma avaliação neuropsicológica,
que utilize uma série de processo avaliativos além do DSM–5 (como entre-
vistas, análise comportamental e testes psicológicos), é fundamental para o
diagnóstico correto do TDAH. Portanto, é interessante obter o parecer de uma
equipe multidisciplinar, composta, por exemplo, por psicólogo, neurologista
e psiquiatra (profissionais habilitados para diagnosticar o TDAH).
Como você sabe, a escola é um lugar em que ocorre a identificação de
comportamentos inadequados. Logo, os professores envolvidos na educação,
quando notarem indícios significativos de TDAH, devem aconselhar os pais a
encaminhar seus filhos a uma avaliação profissional especializada. Afinal, o
diagnóstico preciso é essencial; ele deve levar em consideração os subtipos e o
grau de prejuízo ao indivíduo, de modo a determinar o tratamento apropriado.

O aumento significativo de diagnósticos de transtornos mentais no


público infantojuvenil foi atribuído às versões anteriores do DSM. De
acordo com um dos responsáveis pela formulação do material, Allen Frances,
no DSM–4, houve imprevistos na elaboração. Como consequência, o manual
desencadeou falsas epidemias de transtornos mentais infantis, entre eles o TDAH.
Frances acredita que o método de elaboração do DSM–4 deveria ter enfatizado
a moderação, com o objetivo de resguardar o manual da individualidade, da
arbitrariedade e da criatividade diagnóstica (MARTINHAGO, 2018).

Tratamento do TDAH
No tratamento do TDAH, os fármacos têm predominado. Nesse contexto, tem
aumentado o número de medicamentos disponíveis no mercado, bem como
o consumo desses medicamentos, principalmente nos Estados Unidos. Os
medicamentos mais recomendados, de acordo com as diretrizes de diver-
12 Deficiência intelectual: déficit de atenção (TDAH)

sos países, são os psicoestimulantes metilfenidato (Ritalina) e dimesilato


de lisdexanfetamina. Já outros fármacos não estimulantes (por exemplo,
atomoxetina e guanfacina) são considerados alternativas de tratamento
(SANTOS; ALBUQUERQUE, 2019).
Apesar das evidências da eficácia das intervenções farmacológicas, o uso
de fármacos é recomendado apenas para crianças acima dos 6 anos. Isso
ocorre porque as restrições ao uso desses medicamentos estão relacionadas
a potenciais efeitos colaterais ou intolerância. Crianças em idade pré-escolar
devem ser tratadas exclusivamente com terapias não farmacológicas. Nesse
sentido, eleva-se a importância das intervenções escolares, principalmente
por meio do movimento, foco da próxima seção (SANTOS; ALBUQUERQUE, 2019).
Na prática, quando o psiquiatra considera o uso de medicamento para
uma criança com TDAH, também realiza um exame completo das funções
psíquicas e de saúde geral, como eletrocardiograma (SANTA CATARINA, 2015).
O uso de fármacos faz parte de um plano de tratamento abrangente que inclui
intervenções psicológicas, de comportamento, educacionais e de aconselha-
mento. Além disso, aconselhamento nutricional e exercícios regulares são
recomendáveis (SANTA CATARINA, 2015).

Uma pesquisa na área da antropologia médica investigou como a


relação entre Ritalina e TDAH é tratada nas redes sociais. Para con-
ferir, leia o artigo “TDAH e Ritalina: neuronarrativas em uma comunidade virtual
da rede social Facebook”, de Fernanda Martinhago. Esse artigo está disponível
on-line; para encontrá-lo, utilize o seu site de buscas preferido.

Atividades físicas e TDAH


Existem crianças com TDAH que lidam bem com brincadeiras ao ar livre e com
alguns jogos. Porém, de modo geral essas crianças têm muita dificuldade em
atividades que envolvem regras, rotinas e percepção de detalhe (BRITES,
2018). Isso ocorre porque no TDAH há baixa inibição, baixo autocontrole e
problemas nas funções executivas. Por esses motivos, pode-se esperar que, no
contexto das aulas de educação física escolar, esses estudantes apresentem
Deficiência intelectual: déficit de atenção (TDAH) 13

dificuldades para seguir regras, estabelecer rotinas e acompanhar atividades


que envolvam sequências repetitivas e monótonas. Além disso, eles podem
ter dificuldades para se envolver em atividades que demandam atenção.
No planejamento das aulas, é interessante o professor considerar esses
aspectos a fim de propor atividades capazes de minimizar as dificuldades
de alunos com TDAH. Considerando esses aspectos, Costa, Moreira e Seabra
Junior (2015) descrevem algumas estratégias de ensino e recursos para o
planejamento das aulas de educação física com alunos com TDAH. Os autores
salientam a necessidade de o professor criar rotinas, estabelecer regras e
selecionar um recurso adequado e um ambiente favorável para facilitar a
aprendizagem. No Quadro 2, a seguir, veja estratégias e recursos que podem
ser utilizados.

Quadro 2. Estratégias e recursos pedagógicos para o ensino de alunos com


TDAH em aulas de educação física

Categorias Subcategorias Objetivos (exemplos)

Vínculo: pro- I) Dinâmicas em Proporcionar que os alunos se reconheçam


fessor–aluno e grupo pelo próprio nome como primeiro procedi-
aluno–aluno II) Identificação mento de aproximação e como estímulo à
das atividades memória e à atenção. Estabelecer uma boa
experienciadas relação com o outro, bem como incentivar o
pelos alunos “espírito” de equipe, que deve estar presente
III) Estímulos em todas as intervenções. Estabelecer víncu-
às experiências los com os alunos e estimular que estabele-
interpessoais dos çam vínculos uns com os outros.
alunos

Trabalho I) Atividades com Propor atividades em grupos que tenham


cooperativo jogos cooperativos como princípio o auxílio do outro (para a
II) Compartilha- construção e a execução). Ambientes de
mento de recursos aprendizagem cooperativos devem ser
pedagógicos ofertados a todas as crianças, em especial
àquelas com TDAH, por aumentar a autonomia
e a motivação. Assim, os alunos aprendem
a compartilhar, a socializar e a se preocupar
com o outro. Além disso, no âmbito do TDAH,
o trabalho cooperativo exige a atenção e o
controle da agitação motora, para que seja
possível se relacionar com o outro.
(Continua)
14 Deficiência intelectual: déficit de atenção (TDAH)

(Continuação)

Categorias Subcategorias Objetivos (exemplos)

Mediação I) Encorajamento Proporcionar aos estudantes estímulos nos


do aluno para que momentos em que eles disserem ou demons-
inicie, permaneça trarem que não se sentem capazes de realizar
e termine a a atividade, especialmente nos jogos. Também
atividade é interessante utilizar estímulos verbais
II) Feedback do com palavras de incentivo, com o intuito de
professor como encorajar os alunos a realizarem a atividade.
estímulo para que O professor deve enfatizar as qualidades dos
o aluno realize a alunos, reconhecer e reforçar os seus pontos
tarefa fortes e transmitir sentimentos de segurança
III) Mediação de e confiança. Além disso, deve estimulá-los a
conflitos serem autônomos, para que possam tomar
cada vez mais decisões por si próprios.

Rotina I) Construção de Possibilitar um bom convívio com o professor


regras e entre os alunos, ou seja, a construção de
II) Organização dos regras. Todos os alunos devem ter a oportu-
materiais nidade de contribuir para a elaboração das
III) Disposição dos regras. Para iniciar as intervenções, os alunos
alunos ao iniciar a sentam-se no círculo central da quadra em
atividade roda e de mãos dadas. Isso estimula o aluno
IV) Apresentação com desatenção a se concentrar durante a
da tarefa explicação/demonstração da atividade; ao
V) Feedback do mesmo tempo, faz com que o estudante com
professor e do hiperatividade contenha sua agitação motora,
aluno por estar de mãos dadas com os demais
alunos da turma.

Recurso I) Seleção do Chamar a atenção dos estudantes para que


pedagógico recurso eles lembrem-se de situações cotidianas
II) Interação do em que o recurso se faz presente, a fim de
aluno com o minimizar comportamentos de ansiedade e de
recurso agitação motora. Também é importante sele-
III) Utilização, cionar jogos com elementos que fazem parte
construção e/ do cotidiano das crianças, de modo a facilitar
ou adaptação do a interação dos estudantes com os recursos.
recurso Adicionalmente, os alunos devem auxiliar nas
construções de jogos e brinquedos para as
intervenções.

Ambiente I) Escolha do local Desenvolver a atividade sem grandes dis-


II) Delimitação do persões. O ambiente deve ser organizado
local e possibilitar que o aluno compreenda e se
III) Reconheci- localize no espaço.
mento do local

Fonte: Adaptado de Costa, Moreira e Seabra Junior (2015).


Deficiência intelectual: déficit de atenção (TDAH) 15

Os autores destacam que, na prática, essas estratégias se interligam aos


conteúdos das aulas (atividades psicomotoras, atividades lúdicas e jogos),
complementando-as e possibilitando estímulos relacionados à memória, à
atenção e à concentração.
Muitas intervenções voltadas ao atendimento de crianças com dificuldades
de aprendizagem, transtornos do desenvolvimento e síndromes têm gerado
efeitos positivos no desenvolvimento cognitivo, afetivo e social desses sujei-
tos. A seguir, veja algumas sugestões de atividades adequadas a um protocolo
de intervenção motora eficaz. Essas sugestões podem ser aplicadas durante
as aulas de educação física escolar, contribuindo para o desenvolvimento
global dos alunos com ou sem TDAH (SANTOS; WEISS; ALMEIDA, 2010).

„„ Motricidade fina (óculo-manual e destreza): jogos de encaixe, quebra-


-cabeças, alinhavos, boliche, dobraduras, brincadeiras com massinha
de modelar, atividades de ligar os pontilhados, criação de bijuterias
com miçangas.
„„ Motricidade global (coordenação e controle do corpo): circuito com
obstáculos (banco, elástico, corda, bola, cones), jogos com música
(estátua), vivo ou morto, jogos com bolas.
„„ Equilíbrio (postura, equilíbrio dinâmico e estático): saltos, atividades
de rastejar e escalar, circuito com obstáculos, amarelinha, “pé de lata”,
diferentes posições (com diversos materiais, auxiliares ou não), jogos
de troca de nível (subir e descer, correr e parar).
„„ Esquema corporal (imitação, partes do corpo e rapidez): brinquedo
cantado, jogo de mímica, imitação de expressões faciais, imitação de
animais, brincadeiras no espelho com imitação de posturas, relacio-
namentos (monitor, pais, amigos), brincadeiras cantadas, atividades
com papel, tinta e figuras geométricas.
„„ Organização espacial (percepção do espaço e percepção sensorial):
jogos de quebra-cabeças e encaixe, manuseio e classificação de vários
materiais (por exemplo, grande ou pequeno).
„„ Organização temporal (linguagem e estruturas temporais): brincadeiras
com música (ritmo), palmas, dança da cadeira, uso de instrumentos
musicais, pulação de corda.
„„ Lateralidade (dominância de mãos, pés, olhos): jogos de arremesso,
saci-pererê, circuitos, dança de roda.

Esse protocolo é baseado em diversos autores que abordam a psicomo-


tricidade. Veja:
16 Deficiência intelectual: déficit de atenção (TDAH)

A sessão de psicomotricidade estabelece um roteiro educativo de maturação global


(motora, afetiva e cognitiva), marcado e contido por um dispositivo espaço-temporal
[...] constitui um lugar privilegiado para a criança em que, através da expressão, da
comunicação e da relação, pode se manifestar como é sem ser rechaçada (ARNAIZ
SÁNCHEZ; RABADAN MARTINEZ; VIVES PEÑALVER, 2003, p. 105).

O objetivo geral do programa de intervenção é estimular o desenvolvi-


mento da motricidade da criança, dando ênfase às áreas de maior compro-
metimento, de modo a proporcionar o aprimoramento de todas as áreas.
Atividades motoras, quando lúdicas e estimulantes, podem ser aplicadas na
educação infantil e nas séries iniciais do ensino fundamental, por meio de
jogos e brincadeiras, danças e ginástica. Elas estão em consonância com as
habilidades a serem desenvolvidas nesses anos escolares de acordo com a
Base Nacional Comum Curricular (BRASIL, 2017).
O professor de educação física precisa levar em consideração que, se há
prejuízos em áreas motoras específicas nas crianças com TDAH (motricidade
fina, equilíbrio e organização temporal, por exemplo), é necessário enfatizar
atividades que promovam o aperfeiçoamento nessas áreas. O objetivo disso
não é apenas gerar melhorias na competência motora, mas sobretudo tra-
balhar outros aspectos deficitários do TDAH, como atenção, concentração
e noção de tempo.
No âmbito da motricidade fina, ao confeccionar um colar de miçangas,
por exemplo, a criança precisa atentar aos detalhes do gesto motor para
uma execução correta. Ela precisa trabalhar, portanto, a sua atenção e a sua
concentração, e isso repercutirá em outras atividades, como as de sala de aula.
No que concerne ao equilíbrio, o aluno deve realizar conscientemente
(movimento práxico, isto é, movimento pensado) as atividades que envolvem
estabilidade, equilíbrio estático e dinâmico. Isso significa que, se o professor
solicitar que a criança ande sobre uma corda, ela deverá tentar realizar o
trajeto de maneira consciente, tomando cuidado para não se desequilibrar.
Considere que, se o professor elaborasse a atividade com uma proposta
competitiva, solicitando que o aluno atravessasse a corda o mais rápido
possível até o outro lado, essa ação seria realizada de “qualquer jeito” e não
traria os benefícios almejados, já que o foco do aluno seria chegar primeiro
e vencer, e não realizar o trajeto com proficiência.
Quanto à organização temporal, em função dos problemas nas funções
executivas, pode haver dificuldades em atividades que envolvam sequên-
cia de ações, sucessão, ordem e repetição. Propor atividades criativas que
promovam o sequenciamento de estruturas rítmicas, com música e dança, é
interessante. Além da escolha do conteúdo adequado para contemplar essa
Deficiência intelectual: déficit de atenção (TDAH) 17

área motora, a adoção de estratégias faz-se necessária. É preciso estabelecer


rotinas para a realização das atividades (sempre guardar o material depois
de utilizá-lo, por exemplo). Além disso, enfatizar a importância de terminar
a atividade iniciada antes de partir para a próxima é fundamental para lidar
com os comportamentos inadequados típicos do TDAH.
Não há na literatura “atividades específicas para o TDAH”, como uma
receita de bolo a ser reproduzida. Existem, sim, casos de sucesso, como os
programas e estratégias citados. Assim, os professores devem considerar
que crianças com ou sem TDAH podem apresentar déficits motores. Portanto,
propor atividades que estimulem o desenvolvimento motor é o objetivo
básico de qualquer programa de educação física escolar. Nas atividades, os
conteúdos são os mesmos para todos os alunos; o que muda são as estratégias
adotadas. Em suma, deve-se atender às especificidades dos alunos com TDAH,
mas sempre considerando também todos os demais estudantes da turma.
Nas outras modalidades e séries, como séries finais do ensino fundamen-
tal, ensino médio, educação de jovens e adultos e ensino profissionalizante,
verifica-se que as atividades físicas também são muito benéficas. Eles repre-
sentam uma contribuição importante para a superação dos prejuízos típicos
do TDAH. É isso que você vai ver a seguir.

Benefícios das atividades físicas no âmbito do TDAH


Os benefícios das atividades físicas sobre os sintomas de TDAH podem ser
verificados em diferentes estudos, e os efeitos do exercício físico podem ser
tanto agudos quanto crônicos (PAIANO et al., 2019). Veja alguns efeitos agudos
da atividade física realizada no ambiente escolar sobre os sintomas de TDAH:

„„ melhora da atenção;
„„ melhora da competência motora;
„„ melhora do desempenho de leitura e cálculo;
„„ redução da desatenção;
„„ redução dos indicadores de depressão em adolescentes com TDAH;
„„ melhora do humor ao realizar atividades antes do início das aulas;
„„ redução de hiperatividade, impulsividade e comportamento opositor;
„„ melhora do humor em casa (relatada pelos pais).

Agora veja os efeitos crônicos da atividade física realizada no ambiente


escolar sobre os sintomas de TDAH:
18 Deficiência intelectual: déficit de atenção (TDAH)

„„ melhora do funcionamento executivo (atenção, memória, memória


de trabalho);
„„ mudanças comportamentais positivas em vários domínios das funções
cognitivas (que promoverão autocontrole, auto-organização, concen-
tração da atenção e resistência à frustração);
„„ melhora do comportamento, das capacidades físicas, das habilidades
motoras e do nível de processamento de informações;
„„ melhora na escala de sintomas de TDAH;
„„ melhora do desempenho das funções cognitivas e das relações sociais
e comportamentos cooperativistas;
„„ melhora da precisão, da coordenação motora e do controle inibitório;
„„ melhora das habilidades de locomoção e de controle de objetos;
„„ melhora da função cognitiva, assim como da inibição cognitiva e
comportamental;
„„ melhora significativa da taxa de precisão e do tempo de reação.

Nos estudos que avaliaram os efeitos agudos, a duração das sessões de


exercícios variou de 5 a 30 minutos; as atividades envolveram exercícios em
esteira rolante, corridas e circuitos lúdicos. Já nos estudos que avaliaram os
efeitos crônicos, as sessões ocorriam pelo menos duas vezes por semana,
com duração de 45 minutos, e envolviam esportes (basquetebol, tênis de
mesa, ioga, natação) e programas de contraturno escolar (PAIANO et al., 2019).
Os programas de atividade física utilizaram métodos de intervenção dis-
tintos, desde atividades leves (por exemplo, ioga) até práticas de diferentes
modalidades esportivas (individuais e coletivas), “[...] que demandam alto
grau de percepção, atenção, antecipação, memória, pensamento, inteligência
e tomada de decisão” (PAIANO et al., 2019, documento on-line). Além dos
efeitos fisiológicos induzidos no cérebro pelo exercício, os autores destacam
que há os estímulos produzidos por meio do processo pedagógico da ativi-
dade física e do esporte. Veja alguns estímulos produzidos por meio desse
processo pedagógico:

„„ aprendizado do convívio social;


„„ respeito ao adversário;
„„ conhecimento das regras, das técnicas e das táticas do jogo (podem
favorecer os circuitos neurais).
Deficiência intelectual: déficit de atenção (TDAH) 19

Os estudos concluíram que, de modo geral, a prática de exercícios físicos e


esportes melhora os sintomas do TDAH em crianças e jovens. Também se pode
verificar os efeitos de programas de intervenção motora realizados especifica-
mente no âmbito do TDAH; porém, existem poucos estudos sobre a temática.
Na pesquisa de Poeta e Rosa Neto (2005), o objetivo foi verificar a eficiência
da intervenção motora em uma criança de 10 anos com TDAH. Foram realizadas
25 sessões, duas vezes por semana, com duração de 45 minutos. As sessões eram
compostas por atividades lúdicas e estimulantes que trabalhavam as principais
áreas motoras. Os principais resultados evidenciaram que o desenvolvimento
motor geral da criança passou de “inferior” para “normal baixo” após o pro-
grama de intervenção. Nas áreas da motricidade fina e do esquema corporal,
o desenvolvimento passou de “inferior” para “normal baixo”; já no equilíbrio e
na organização temporal, ele passou de “muito inferior” para “inferior”.
A pesquisa de Guerra, Vasconcelos e Palácio (2013) objetivou analisar os
efeitos da psicomotricidade sobre o desempenho motor de estudantes de
7 a 10 anos com TDAH. Para isso, foram realizadas 25 sessões de atividades
psicomotoras com foco nas dificuldades das crianças (duas sessões semanais
com duração de 45 minutos). Os autores verificaram melhora do desempenho
motor, sobretudo das habilidades de destreza manual e equilíbrio. Também
houve melhora da pontuação total do teste motor.
Cardoso et al. (2017) analisaram os efeitos de um programa interativo de
exercícios físicos no tempo de reação de crianças com idade entre 6 a 7 anos
com TDAH. Como método, eles utilizaram intervenções ludomotoras por meio de
exergames (combinação de movimento humano com realidade virtual). Foram
realizadas 12 sessões, três por semana, com duração de 15 minutos. Os resultados
demonstraram aumento na capacidade de atenção e melhoria das habilidades
perceptivo-motoras e da velocidade de processamento de informação. De acordo
com os autores, as intervenções facilitaram o desenvolvimento da capacidade
de seleção e elaboração de resposta durante a execução do ato motor.
Assim, além de ofertar programas de intervenções motoras, os professores
de educação física escolar podem focar as principais áreas do desenvolvimento
motor (motricidade fina, motricidade global, equilíbrio, esquema corporal,
organização espacial, organização temporal e lateralidade) ao planejar suas
atividades. Intervenções pautadas nas principais áreas do desenvolvimento
motor têm proporcionado benefícios significativos para estudantes com de-
ficiências e transtornos globais do desenvolvimento, inclusive TDAH.
20 Deficiência intelectual: déficit de atenção (TDAH)

Como você viu ao longo deste capítulo, durante as aulas de educação


física escolar, o professor deve adotar estratégias que contribuam
para a superação dos comportamentos inadequados típicos do TDAH. No pla-
nejamento e na execução de um programa específico de atividade física eficaz,
como no contraturno escolar, é importante ter em mente os principais objetivos
a serem alcançados, bem como os benefícios e as atividades mais indicadas
para lidar com o tipo de TDAH em questão.
A atividade física está associada à inclusão social. Assim, é fundamental que
durante as aulas de educação física o professor consiga atender às demandas
tanto dos alunos com TDAH como da turma em geral. Estratégias e propostas
adequadas permitirão que os estudantes que têm o transtorno se mantenham
numa posição igual ou similar à das demais crianças da sua faixa etária, con-
quistando mais autonomia e proatividade e tendo sua competência reconhecida,
metas de todo trabalho inclusivo.

Referências
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mentais: DSM–5. 5. ed. Porto Alegre: Artmed, 2014.
ARNAIZ SÁNCHEZ, P.; RABADAN MARTINEZ, M.; VIVES PEÑALVER, I. A. A psicomotricidade
na educação infantil: uma prática preventiva e educativa. Porto Alegre: Artmed, 2003.
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Leitura recomendada
PAIANO, R. et al. Programas de intervenção para alunos com TDAH no contexto escolar:
uma revisão sistemática de literatura. Revista Educação Especial, v. 32, 2019. Disponível em:
https://periodicos.ufsm.br/educacaoespecial/article/view/28255. Acesso em: 9 nov. 2020.

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