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por
J.P.
O selo DIALÓGICA da Editora InterSaberes
faz referência às publicações que
privilegiam uma linguagem na qual o autor
dialoga com o leitor por meio de recursos
textuais e visuais, o que torna o conteúdo
muito mais dinâmico. São livros que criam
um ambiente de interação com o leitor –
seu universo cultural, social e de
elaboração de conhecimentos –,
possibilitando um real processo de
interlocução para que a comunicação se
efetive.
Rito, mito e símbolo
como fenômenos
religiosos e
sociológicos
Conselho editorial Dr. Ivo José Both (presidente) | Dra Elena Godoy | Dr. Neri dos
Santos | Dr. Ulf Gregor Baranow | Editora-chefe Lindsay Azambuja | Gerente
editorial Ariadne Nunes Wenger | Preparação de originais Rodapé Revisões
Edição de texto Letra & Língua LTDA. – ME | Monique Francis Fagundes Gonçalves
| Capa Sílvio Gabriel Spannenberg (design) | Tracey Jones Photography e
Amovitania/Shutterstock (imagens) | Projeto Gráfico Silvio Gabriel Spannenberg
| Diagramação Carolina Perazzoli | Designers responsáveis Débora Gipiela| Silvio
Gabriel Spannenberg | Iconografia Sandra Lopis da Silveira | Regina Claudia Cruz
Prestes
Bibliografia.
ISBN 978-65-5517-770-1
1ª edição, 2020.
Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida por qualquer meio ou forma sem a prévia
autorização da Editora InterSaberes.
A violação dos direitos autorais é crime estabelecido na Lei n. 9.610/1998 e punido pelo art. 184 do
Código Penal.
SUMÁRIO
7 | | Apresentação
10 | | Como aproveitar ao máximo este livro
APRESENTAÇÃO
é importante observar que os ritos têm uma forte densidade que permite
refletir sobre a função social que carregam, uma vez que não são realizados no
vazio, isto é, alienados das experiências do cotidiano de homens e de mulheres.
Nesse sentido, os grupos humanos expressam a própria identidade, sobretudo,
pelos ritos.
Nos capítulos 3 e 4 trazemos à luz reflexões a respeito do mito.
Enganam-se aqueles que concebem o mito como fantasia. Trata-se, sim, de
uma maneira de interpretar o mundo e de dar-lhe sentido. Com base em
histórias sagradas para os mais diversos povos, o cotidiano de cada um deles é
interpretado e entendido. Portanto, compreender os mitos é também
compreender formas distintas de conhecer e apreender o mundo e a existência.
Nos capítulos 5 e 6, por sua vez, abordamos especificamente o tema do
símbolo. Evidenciamos que os seres humanos são os únicos que podem criar
símbolos e dar-lhes sentido. E, mais do que isso, o símbolo traz em seu DNA a
polissemia, ou seja, o fato de poder assumir indefinidas possibilidades de
significado. É possível também verificar a formação de certa unidade
relativamente àqueles sentidos que se inserem no mesmo gradiente de um
símbolo.
A fim de permitir uma percepção mais estética e prática dos temas
analisados – ritos, mitos e símbolos este livro traz, ao final, como anexo,
alguns relatos míticos, ritos e símbolos de várias culturas religiosas. São
informações relevantes para que o interessado em Ciências da Religião perceba
que essas diversas culturas religiosas produzem mitos, ritos e símbolos
significativos para dar sentido e finalidade à estrutura do próprio mundo.
10
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1 RITOS:
APROXIMAÇAO AO TEMA
ação coletiva. Trata-se de uma atividade repetitiva que pode ser aplicada tanto
em cerimônias relacionadas com o sobrenatural quanto nos hábitos, usos e
costumes sociais. Rito, portanto, pode ser compreendido como repetição de
algo feito anteriormente pelos deuses ou ações a serem empreendidas a mando
deles para conseguir certos resultados, inclusive o de penetrar em espaços e
tempos dominados pelo sagrado invisível. Há, por assim dizer, uma força
operativa no rito.
O ser humano religioso sente que, na ação ritual, algo é produzido, razão
pela qual se sobressai a convicção de que o que é feito no rito não pode ser
reduzido a uma ação puramente humana, uma vez que é uma ação dos deuses
e, por isso, necessariamente eficaz. O que torna o rito eficaz, assim, é a ação
primeira dos deuses repetida ritualmente pelos seres humanos religiosos. Na
lógica demarcada pelo fenômeno religioso, seria possível inferir que o que é
instaurado pelos deuses é reinstaurado pela repetição ritual. Acredita-se,
então, que a divindade realmente age no rito, e, portanto, os ritos são ações
religiosas e devem ser compreendidos como tais. Eliade (1988, p. 53) recupera
a intensidade do rito em diferentes culturas:
A relação que se constrói com os ritos não são aquelas marcadas pela
indiferença, como se tai relação fosse casual. Os ritos são ações significativas
por si mesmas e jamais podem ser apontados como um produto tardio de
alguma religião intelectualizada. Justamente por isso é que os ritos são
considerados como obra dos deuses. E, consequentemente, os sujeitos que
celebram os ritos não o fariam se tivessem a mínima consciência de que eles
eram os próprios autores dos ritos. Assim, os ritos existem como ritos porque
se crê que se alguém, em algum momento, teve condições de instituí-los; foram
os deuses que o fizeram e, dessa forma, os deuses devem ser percebidos como
seus verdadeiros agentes. Veja a clara explicação que Bouyer (1967, p. 68)
oferece:
CURIOSIDADE
CURIOSIDADE
Um rito ou festival permite que um grupo vivencie a si mesmo de uma forma
ideal. Cada sociedade tem ocasiões importantes nas quais a comunidade
demonstra sua melhor natureza e consolida seus laços grupais. Isso pode ser
feito mediante observâncias [pelo pesquisador] como festivais elaborados,
trocas de presentes, visitas a parentes ou locais ancestrais, dramatizações
religiosas
22 Ritos: aproximação ao tema
FIQUE ATENTO
As pessoas, muitas vezes, estão acostumadas com os ritos que são inerentes
à própria confissão religiosa. E, com isso, acabam esquecendo de que todas
as outras tradições religiosas operam com o rito. Sair da zona de conforto de
“segurança” dos próprios ritos e conhecer os de outras culturas religiosas
viabiliza não somente a aquisição de novos conhecimentos, mas também a
produção de tolerância.
No entanto, uma situação singular nasce e pode ser explicada por meio
da segmentação do mercado religioso. Nesse sentido, conforme o campo
religioso vai sendo ocupado por diferentes culturas religiosas, a competição
se potencializa, razão pela qual se tornam necessárias a banalização e a
desclassificação dos ritos religiosos ofertados pelas agências concorrentes.
Para determinada agência religiosa, os ritos das demais igrejas, seitas e
denominações tradicionais são ineficazes, e não produzem resultado algum
se comparados à eficácia dos próprios ritos. Os ritos católicos e todas as
tendências dos cultos afro-brasileiros são demonizados
23 Ritos: aproximação ao tema
CURIOSIDADE
CURIOSIDADE
De acordo com Croatto (2010, p. 333): “Um gesto ou um rito são por si só
polissêmicos. Mergulhar no rio Ganges é um rito homólogo a mergulhar no rio
Jordão. Mas a cosmovisão da índia impõe ao rito de submersão no rio Ganges
uma intenção diferente da intenção do batismo no rio Jordão”.
Rivière (1997), por sua vez, relembra que o rito de passagem institui uma
linha entre um antes e um depois, razão pela qual ele sanciona e santifica uma
ordem estabelecida. Diz Rivière (1997, p. 44) textualmente: “Ao notificar
alguém sobre o seu novo papel, o ato solene de investidura – rito de passagem
– produz o que designa e tem efeito de confirmação estatutária e encoraja o
promovido a viver segundo as expectativas sociais ligas à sua posição”.
Quando, no rito, é realizada uma ação que tenta produzir um efeito
especial (a saúde, a graça, a benção, a consagração de uma colheita), esse
efeito, produzido simbolicamente, é tão real nesse plano quanto é a
instauração de uma realidade segundo o mito. O que importa é compreender a
experiência religiosa como tal, sem preconceitos racionalistas. Caso se entenda
a eficácia ritual somente no nível profano, perde-se o essencial. Em outras
palavras, trata-se de uma eficácia simbólica que tem a ver com o sentido
da realidade: o que é instaurado pelos deuses (segundo o relato mítico)
também é reinstaurado pela repetição ritual. “O funcionamento dos ritos
encontra- se ligado à sua utilidade social”, e sua execução é imperativa para
recriar periodicamente a identidade moral da sociedade (Rivière, 1997, p. 11).
Uma precaução muito bem distinguida pelo pesquisador Croatto (2010,
p. 334) pode ser assim expressa:
Além dos citados no Quadro 1.1, muitos outros podem ser elencados,
como: ritos de nascimento, matrimônio sagrado, ritos anuais, ritos do
sacrifício, ritos de passagem, ritos de participação na vida divina, ritos de
propiciação, ritos de construção e ritos de iniciação.
FIQUE ATENTO
O que é o rito de iniciação?
O rito de iniciação pertence a uma categoria mais geral denominada rito de
passagem. Eles existem em todas as religiões, pois fazem referência a
momentos decisivos em que o indivíduo não somente nasce, mas também
renasce ou se inicia em uma nova forma de ser ou de agir. Iniciar-se é
morrer para voltar a nascer. De modo geral, os ritos de iniciação tentam
expressar uma nova forma de vida, religiosa e social. Uma expressão
simbólica da nova realidade é o nome outorgado na circuncisão ou no
batismo – ou o novo nome que a pessoa recebe quando ingressa em um
novo status ontológico, como por exemplo a entronização do rei, a coroação
de um novo papa, a consagração na vida religiosa mediante os votos.
(Croatto, 2010, p. 359-360)
religioso, uma vez que também estão inseridos no cotidiano público de cada
pessoa.
SÍNTESE
I. Toda manifestação do sagrado, ou seja, a hierofania, provoca a
fragmentação do espaço e do tempo.
VI. O que torna o rito eficaz é a ação primeira dos deuses repetida
ritualmente pelos seres humanos religiosos.
ATIVIDADES DE AUTOAVALIAÇÃO
1. A hierofania provoca a fragmentação do espaço e do tempo em áreas
sagradas e profanas. Assinale a alternativa que define o termo hierofania:
A] Manifestação do sagrado.
B] Atividade ritual.
C] Rito de passagem.
D] Princípio metodológico.
E] Manifestação humana.
ATIVIDADES DE APRENDIZAGEM
Questões para reflexão
1. Todas as religiões e sociedades têm ritos de renovação periódicos que
relembram valores do grupo e renovam o ânimo daqueles valores. Escolha
um rito de uma comunidade religiosa e um rito da sociedade civil e
compare-os, refletindo sobre suas diferenças e suas semelhanças.
Ao pensar o rito, também precisamos refletir sobre a função social que ele
carrega. Grupos humanos expressam a própria identidade, sobretudo, pelos
ritos. Por isso, todos os ritos inscrevem-se no marco social que lhes dá sentido
e que é reforçado pelo ambiente social. Assim, todos ritos são validados como
importantes por aqueles que os vivenciam:
CURIOSIDADE
Veja um relato de Eliade (1996, p. 126) sobre a influência dos ritos de
iniciação dos Nias e dos Mentawei na formação da função sacerdotal:
(é muito provável que o jovem tenha sido conduzido ao céu); ele volta
à aldeia depois de três ou quatro dias; caso contrário, inicia-se uma
busca por ele e, costumeiramente, ele é encontrado na copa de uma
árvore, conversando com os espíritos. Parece que ele se encontra
privado de razão e, por isso, é necessário que se faça [sic] sacrifícios
para a sua recuperação. A iniciação exige também uma marcha ritual
em um cemitério, em uma água corrente e em uma montanha. Entre
os Mentawei, por outro lado, o futuro xamã é levado ao céu pelos
espíritos celestes e ali recebe um corpo maravilhoso. Geralmente cai
enfermo e imagina que subiu ao céu. Após estes primeiros sintomas
um mestre efetua a cerimônia de iniciação. Em algumas ocasiões,
durante a iniciação ou imediatamente após ela, o aprendiz de xamã
perde o conhecimento e seu espírito sobe ao céu em uma barca
conduzida por águias, para conversar com os espíritos celestes e
pedir remédio a eles.
CURIOSIDADE
Veja a seguir o exemplo de Vilhena (2005, p. 101) sobre o ritual do Shabat
judeu:
Não há sociedade sem rito nem rito sem sociedade. Sendo inúmeras as
sociedades, são incontáveis os ritos que geram. Os ritos seriam conaturais ao
ser humano como dimensão expressiva de seu ser e sua realidade, permitindo
a criação de um espaço no qual os indivíduos transcendem. Paden (2001, p. 71)
assim explica esse processo de transcendência do sujeito que participa do
ritual:
Nesse mesmo sentido, Franco Junior (2010, p. 82) diz que “toda
ritualização – seja dirigida a uma divindade, a um líder político, seja a um time
de futebol – tende a construir uma identidade coletiva”. Por isso, ao expressar
valores coletivos, a vivência ritual dá aos seus participantes a sensação não
apenas de pertencer ao seu momento, mas também de fazer parte de uma
história. Graças aos ritos que um grupo social toma consciência de si e cria
outras formas imaginárias que ajudarão a consolidar a vida coletiva.
44 Rito e compreensão do ser humano
multicultural
O estudo dos fenômenos relacionados à cultura tem sido uma preocupação
central na atualidade. Na verdade, podemos falar sempre no plural: culturas.
Afinal de contas, quando absolutizamos e/ou dogmatizamos um caso
específico de cultura, sempre o fazemos em prejuízo de outra. Assim, se
conhecemos a expressão imperialismo aplicada a ações de nações
desenvolvidas sobre nações menos desenvolvidas, podemos também falar de
imperialismo cultural e, por que não, de colonialismo cultural – uma ação que
se torna vetor
45 Rito e compreensão do ser humano
CURIOSIDADE
O sacerdote é uma figura sagrada e, para chegar a sê-lo, deve se submeter a um
rito de passagem ou de consagração por meio do qual entra em outra esfera e
pode estar em contato com o sagrado, sem perigo algum (está protegido contra
o tabu). No plano simbólico, sua consagração e condição de pessoa separada
do resto expressam-se pelo uso de ornamentos especiais para a celebração dos
ritos. O simbolismo das vestes é um dos mais universais. (Croatto, 2010, p.
350)
O ritual pode ser considerado uma exibição, razão pela qual adquire uma
função pública e precisa, naturalmente, de assistência. Pois é justamente no
processo de exibição que é conferido um valor intensificado ao rito, pelo
simples motivo de que a exibição pública é coletivamente conduzida,
testemunhada e vivenciada. Na exibição pública, a visão de foco e de conjunto,
segundo Paden (2001, p. 69), “imprime a realidade e a validade do rito e seu
conteúdo nos participantes”. Nesse ambiente ritual, o tempo é intensificado. O
tempo ritual torna a fé plausível e real de um modo que o tempo desritualizado
não tem condições de fazer.
Da Matta (citado por Rivière, 1997, p. 18) aprofunda a questão:
Sabemos que não há sociedade, qualquer que seja sua escala, que não
sinta a necessidade de, periodicamente, reafirmar em comum seus
valores comuns. É daí que nasce o comportamento ritual, cujo protótipo
encontra-se no sacrifício, pouco importando que
49 Rito e compreensão do ser humano
VOCÊ SABIA?
Muitas vezes realizamos determinados rituais e não sabemos a origem deles –
apenas reproduzimos o que nos foi passado e não refletimos a respeito do
porquê. Conheça alguns exemplos interessantes:
50 Rito e compreensão do ser humano
SÍNTESE
I. Todos os ritos inscrevem-se no marco social que lhes dá sentido e que
é reforçado pelo ambiente social.
II. Ao estudar os ritos estamos, conhecemos um pouco melhor sobre nós
mesmos. Entendemos, assim, o ser humano que os produz e neles
atua.
III. O rito representa a sociedade em ato, ou seja, exprime o ritmo da vida
social da qual é resultado.
IV. Não há como compreender os ritos negando as dimensões históricas
deles.
V. Nos espaços sagrados, os ritos cumprem duas finalidades específicas:
(1) a entronização do sagrado – ou seja, no novo
51 Rito e compreensão do ser humano
ATIVIDADES DE AUTOAVALIAÇÃO
1. O rito tem uma função social, ou seja, grupos humanos expressam sua
identidade, sobretudo, por meio dos ritos. Nesse sentido, é possível afirmar
que o rito é uma dimensão da vida:
A] coletiva.
B] aliénante.
C] individual.
D] para iniciados.
E] emocional.
ATIVIDADES DE APRENDIZAGEM
Questões para reflexão
1. Reflita sobre os comportamentos atuais de ritualização da vida, tais como o
fost-food, anotando as vantagens e desvantagens deles.
2. Vivemos inseridos em culturas diferentes a cada dia. Explique a importância
de nos referirmos sempre a “culturas”, no plural, em vez de nos referirmos à
“cultura”, no singular.
1 1No princípio, Deus criou o céu e a terra. 2A terra estava sem forma e
vazia; as trevas cobriam o abismo e um vento impetuoso soprava sobre
as águas. 3Deus disse: “Que exista a luz!” E a luz começou a existir.
4Deus viu que a luz era boa. E Deus separou a luz das trevas: 5à luz Deus
chamou “dia”, e às trevas chamou “noite”. Houve uma tarde e uma
manhã: foi o primeiro dia. 6Deus disse: “Que exista um firmamento no
meio das águas para separar
56 Mitos: aproximação ao tema
Deus fez as feras da terra, cada uma conforme a sua espécie; os animais
domésticos, cada um conforme a sua espécie; e os répteis do solo, cada
um conforme a sua espécie. E Deus viu que era bom. 26Então Deus
disse: “Façamos o homem à nossa imagem e semelhança. Que ele
domine os peixes do mar, as aves do céu, os animais domésticos, todas
as feras e todos os répteis que rastejam sobre a terra”. 27E Deus criou o
homem à sua imagem; à imagem de Deus ele o criou; e os criou homem
e mulher. 28E Deus os abençoou e lhes disse: “Sejam fecundos,
multipliquem-se, encham e submetam a terra; dominem os peixes do
mar, as aves do céu e todos os seres vivos que rastejam sobre a terra”.
29E Deus disse: “Vejam! Eu entrego a vocês todas as ervas que produzem
semente e estão sobre toda a terra, e todas as árvores em que há frutos
que dão semente: tudo isso será alimento para vocês. 30E para todas as
feras, para todas as aves do céu e para todos os seres que rastejam sobre
a terra e nos quais há respiração de vida, eu dou a relva como alimento”.
E assim se fez. 31E Deus viu tudo o que havia feito, e tudo era muito
bom. Houve uma tarde e uma manhã: foi o sexto dia.
2 1Assim foram concluídos o céu e a terra com todo o seu exército. 2No
sétimo dia, Deus terminou todo o seu trabalho; e no sétimo dia, ele
descansou de todo o seu trabalho. 3Deus então abençoou e santificou o
sétimo dia, porque foi nesse dia que Deus descansou de todo o seu
trabalho como criador. 4Essa é a história da criação do céu e da terra.
(Bíblia Nova Pastoral, 2016, p. 17-18)
A sagrada escritura judaica e cristã inicia-se com o texto ora citado. Esse
texto alimenta a fé de inumeráveis fiéis, bem como desencadeia os mais
acalorados debates tanto entre acadêmicos quanto entre leigos. Rossi (2003, p.
59) explica o debate:
58 Mitos: aproximação ao tema
CURIOSIDADE
Os mitos dos orixás originalmente fazem parte dos poemas oraculares
cultivados pelos babalaôs. Falam da criação do mundo e de como ele foi
repartido entre os orixás. Relatam uma infinidade de situações envolvendo
os deuses e os homens, os animais e as plantas, elementos da natureza e da
vida em sociedade. Na sociedade tradicional dos iorubas, sociedade não
histórica, é pelo mito que se alcança o passado e se explica a origem de tudo,
é pelo mito que se interpreta o presente e se prediz o futuro, nesta e na outra
vida. Como os iorubas não conheciam a escrita, seu corpo
62 Mitos: aproximação ao tema
Leituras com viés fundamentalista não são uma novidade, argumenta Rossi
(2009). Alguns exemplos do passado e de um tempo mais recente nos ajudam
a bem compreender:
MÃOS À OBRA
Analise os possíveis conceitos fundamentalistas herdados em decorrência de
sua tradição religiosa e, de forma crítica, reflita a respeito de métodos de
superação desses conceitos para que novas epistemologias sejam
contempladas.
▪ história; ▪ diários;
▪ lendas; ▪ itinerários;
▪ anedotas; ▪ genealogias;
▪ epopeias; ▪ listas;
▪ sagas; ▪ catálogos;
▪ mitos; ▪ apologias;
▪ fábulas; ▪ parábolas;
▪ etiologias; ▪ alegorias;
▪ narrações em forma de novela; ▪ oráculos;
▪ relatos paradigmáticos; ▪ visões;
▪ crônicas; ▪ advertências;
▪ anais; ▪ apocalíptica.
CURIOSIDADE
Os mitos de criação do mundo estão presentes em muitas narrativas. Veja, a
seguir, uma das mais conhecidas dos orixás:
PARA REFLETIR
As leis, para que tenham mais força, recebem uma “carga” mítica a fim de
evidenciar que elas existem desde sempre.
IMPORTANTE!
Existem duas maneiras inadequadas de ler e interpretar o mito. Uma
primeira leitura nega ao mito a pretensão de ser uma “história verdadeira”.
E uma segunda leitura, mais ingênua, assume a literalidade do que o relato
mítico expressa, imaginando-o como
78 Mitos: aproximação ao tema
SÍNTESE
I. O mito, por ser um texto, pertence, naturalmente, à ordem literária e,
em razão disso, deve ser interpretado como um discurso.
II. O mito é “um relato de um acontecimento originário, no qual os
deuses agem e cuja finalidade é dar sentido a uma realidade
significativa” Croatto (2010, p. 209, grifo do original).
79 Mitos: aproximação ao tema
ATIVIDADES DE AUTOAVALIAÇÃO
1. Assinale a alternativa que descreve os três elementos de comunicação
presentes no mito:
A] Emissor, destinatário e realidade.
B] Introdução, desenvolvimento e conclusão.
C] Tese, síntese e antítese.
D] Passado, presente e futuro.
E] Sujeito, destinatário e emissor.
80 Mitos: aproximação ao tema
E] Grécia.
ATIVIDADES DE APRENDIZAGEM
Questões para reflexão
1. Qual a natureza do fundamentalismo? Quais os limites para bem
compreender o gênero literário mitológico?
2. “O mito não é uma falsidade”. Apresente teses contundentes que ratifiquem
o mito como uma forma legítima de epistemologia.
mitos estão vivos e ativos nos mais diferentes grupos humanos e sempre
presentes no espírito de seus membros, desempenhando importante função.
Com certeza estamos, como precisamente nos conduz Schaden (1989), na
esfera de uma “sociologia dos mitos”.
Do ponto de vista da sociologia e da antropologia social, é possível seguir
a proposta matizada por Schaden (1989, p. 19) de que os textos míticos podem
ser encarados quanto a três aspectos mais ou menos distintos:
4.1.1 El Condor
Nos Andes colombianos, ouvem-se relatos sobre o Condor. Nesse mito, o
Condor é uma das possíveis formas que, às vezes, um espírito dos tesouros
assume quando é muito perseguido, manifestando cólera e provocando
desmoronamento e transbordamento de rios e lagos – uma manifestação que
tem como objetivo impedir a saída dos tesouros dos povoados aborígenes da
América Latina. Observamos, ainda, nos relatos míticos recolhidos nessa
região, que está presente a recordação de fatos históricos específicos que se
relacionam com a sobrevivência do povo, fazendo com que este reviva com
horror a sangrenta investida dos conquistadores. Rossi (2003, p. 57), salienta
que “na memória coletiva identifica-se o conquistador como seres
monstruosos, metade homem e metade animal, que irrompiam ferozmente nas
aldeias deixando somente desolação e morte”.
86 Mito como ferramenta de investigação sociológica
4.1.2 Atrahasis
O mito de Atrahasis, ou Inuma ilu, tem enorme valor sociológico. Trata-se de
um mito babilônico, provavelmente, dos anos 1150-1015 a.C. Nesse mito, os
deuses se reúnem e decidem criar os seres humanos para que estes sejam
colocados a serviço dos deuses menores (Artuso, 2018).
De acordo com Rossi (2003, p. 60), o tema principal do mito é “o da
rebelião do trabalhador oprimido, os deuses menores primeiro, os seres
humanos depois. O motivo da criação do ser humano é essencial, porém
sujeito precisamente ao trabalho”, ou seja, o ser humano é criado
objetivamente para substituir os deuses que se achavam oprimidos. No
entanto, é preciso fazer uma ressalva: se os deuses se rebelaram e exigiram
mudança e foram atendidos, quando o próprio ser humano se rebela, suas
reivindicações não são escutadas. Ao contrário, só há repressão para dizimar a
humanidade (fome, peste, dilúvio e criação de mulheres estéreis). A conclusão
sociológica do mito parece presumida, isto é, o ser humano foi criado para
livrar os deuses de seu castigo. Vejamos uma transcrição parcial do mito de
Atrahasis:
Tábua I
A revolta dos deuses
Quando (alguns) deuses eram homens
Trabalhavam em demasia, suportavam o
trabalho,
Grande era o trabalho dos deuses,
Pesado o trabalho, grande a angústia.
Os grandes Anunnaki, os sete
Iguigui quiseram fazer suportar o trabalho
Anu, seu pai era o rei.
Seu conselheiro era Enlil, o guerreiro,
Seu ajudante era Ninurta
87 Mito como ferramenta de investigação sociológica
▪ Trabalho
▪ excediam o trabalho (hora extra)
▪ suportavam o trabalho
▪ grande era o trabalho
89 Mito como ferramenta de investigação sociológica
▪ pesado o trabalho
▪ excessivo (por 40 anos)
▪ dia e noite
▪ o trabalho nos tem matado
[...]
▪ grande angústia
▪ queixavam-se (clamar)
▪ acusavam
▪ murmuravam
[...]
▪ cercam a casa
▪ desejo de mudar a situação
[...]
Grupo 1:
Grupo 2:
“Eu suprimi vosso trabalho pesado e vosso duro labor, ao homem o
tenho imposto. O clamor foi transferido para a humanidade: para vós
desatei o jugo e estabeleci a liberdade”.
Grupo 3:
“Os homens se multiplicaram. O país bramava como um touro. Deus
estava perturbado por seus gritos. Enlil escutou seu grito... Demasiado
pesado é para mim o clamor da humanidade”. Enlil não consegue achar
tranquilidade.
Uma possível melhor tradução do texto bíblico nos leva a pensar em uma
“cidade com uma torre ou um forte”. No Antigo Oriente Próximo, as cidades
eram os espaços privilegiados onde habitavam os que tinham o controle da
sociedade, ou seja, um espaço onde havia concentração de poder: reis,
príncipes e comerciantes ali se refugiavam, e as palavras deles eram
consideradas como se fossem leis.
Rossi (2003, p. 64) enfatiza que a cidade no mundo antigo era tida como
os mitos analisados
Ao analisarmos os três mitos selecionados, tínhamos em mente salientar o
valor deles para a pesquisa social. Todos eles refletem um modo de ver a
sociedade e sinalizam os conflitos que são inerentes ao fazer histórico.
Resumidamente, temos o seguinte esquema:
Nesse contexto, surgem duas perguntas finais, pois, de certa forma, elas
possibilitam refletir sobre o alcance social dos mitos:
humanos a partir da terra, ela fez os aristocratas com uma bela argila
amarela, enquanto os homens comuns foram moldados com barro
marrom. [...]
CURIOSIDADE
No universo dos orixás, encontramos muitos relatos míticos que procuram
explicar a realidade. Um deles relata como Ogum extraiu o poder das
mulheres repassando-o para os homens:
SÍNTESE
I. o mito visto como expressão das formas peculiares de uma sociedade
apresenta-se como tradição histórica, o que significa que a
interpretação dele pode revelar não somente a organização social do
grupo no presente, mas também uma série de transformações sociais
ocorridas na comunidade em épocas talvez remotíssimas.
II. O mito é social não apenas em suas origens, mas igualmente em sua
função.
III. O mito organizador de qualquer cultura funciona de maneira criativa,
saudável ou patológica.
97 Mito como ferramenta de investigação sociológica
IV. Por meio da análise de três mitos de origens distintas, realizada com
base em uma chave de leitura sociológica e libertadora, foi possível
evidenciar que as narrativas mitológicas apresentam densidade
histórica e procuram, com isso, responder às contradições do
cotidiano.
ATIVIDADES DE AUTOAVALIAÇÃO
1. Schaden (1989) ensina que os textos míticos podem ser refletidos sob vários
aspectos distintos com base em duas ciências. Quais são elas?
A] Sociologia e antropologia.
B] Teologia e psicologia.
C] Política e antropologia.
D] Psicologia e filosofia.
E] Teologia e filosofia.
ATIVIDADES DE APRENDIZAGEM
Questões para reflexão
1. Quais são as possíveis conclusões em chave hermenêutica de libertação, ao
se comparar os mitos do Condor, de Atrahasis e da Torre de Babel?
2. Qual a importância dos mitos na sociedade contemporânea?
IMPORTANTE!
Confira, a seguir, como se caracteriza o símbolo para Croatto (2010, P-117):
invisível
É necessário compreender a infinita variedade de símbolos e a
heterogeneidade do fenômeno religioso. Assim, o sagrado sempre é percebido
como refletido na multiplicidade de coisas e fenômenos do mundo. Schlögl
(2009, p. 12) diz que “Há algo invisível que se faz representar por meio do
símbolo”; percepção confirmada por Kast (citado por Schlögl, 2009, p. 12): “é
um sinal visível de uma realidade invisível”. É exatamente por isso que, na
interpretação dos símbolos, busca-se uma realidade invisível, que se encontra
atrás de algo invisível e de suas possíveis conexões. Todavia, é necessário
prestar atenção ao alerta de Croatto (2010, p. 88):
Podemos considerar o símbolo como uma lente que permite ver o que
sem ela não se vê. Na visão de Eliade (1996), se os objetos não são convertidos
em símbolos, apaga-se a própria percepção do sagrado na forma como se
experimenta, e muito menos é possível expressá-la. Os exemplos dados pelo
autor são significativos:
CURIOSIDADE
Muitas são as possibilidades para explicar o simbolismo do mal. Vejamos
algumas a seguir:
CURIOSIDADE
A água cotidiana recebe muitas explicações simbólicas, entre as quais podemos
observar as seguintes:
da realidade divina. São duas as perguntas mais importantes que podem ser
feitas diante de um símbolo. Vamos a elas: “qual o seu significado”; “o que ele
quer dizer?'. Tomemos a cruz como exemplo. A cruz é um símbolo que se
reveste de altíssima importância para o cristianismo. Mas, para outras pessoas
que vivem experiências e realidades diferentes das experiências e realidades
dos cristãos, a cruz assume significados diferentes. Para um indivíduo que vive
uma experiência religiosa distinta do cristão, a cruz poderia ser considerada
algo de menor importância e para um soldado romano do primeiro século,
acostumado à prática da crucificação, a cruz seria considerada um instrumento
de tortura utilizado contra aqueles iam contra a nova ordem mundial proposta
pelo Império Romano. Os símbolos, portanto, ganham sentido a partir de
experiências muito específicas. Assim, os símbolos religiosos de uma confissão
religiosa distinta do cristianismo poderiam ser considerados, aos olhos de um
cristão, justamente por ele não conhecer e não conseguir decodificar o símbolo,
algo de menor importância. Qual a razão desse comportamento? A resposta a
considerar é que é o lugar social de cada pessoa que define a maneira pela qual
ela interpretará e que sentido dará aos símbolos que estão ao seu redor.
Vejamos um exemplo de um símbolo extraído das Sagradas Escrituras
que pode ser manipulado inadequadamente quando o leitor não conhece
adequadamente seu sentido original. No livro do Apocalipse, último livro do
Novo Testamento, em seu capítulo 13, verso 18 nos deparamos com o número
seiscentos e sessenta e seis (666), que é considerado por muitos como o
número da besta. Todavia, deixando o senso comum de lado e suas
interpretações fantasiosas, sabe-se que em grego, idioma em que o Novo
Testamento foi escrito, cada letra possuía um valor numérico e, mais ainda,
que o número de um nome próprio era o total do valor
113 Símbolos: aproximação ao tema
CURIOSIDADE
Símbolos têm importância desde o mundo antigo. Com base neles, procurava-
se compreender o mundo:
SÍNTESE
I. Símbolos são um produto do ser humano, e, mais especificamente, o ser
humano é o único capaz de criar símbolos e sistemas simbólicos.
II. O símbolo pode ser considerado como linguagem originária e fundante
da experiência religiosa, a primeira e a que alimenta todas as demais.
III. O símbolo apresenta-se como a linguagem do profundo e da intuição, da
poesia, dos sonhos e da experiência religiosa.
IV. Por meio do símbolo, o ser humano pode mediar uma compreensão com
o sagrado. O sagrado interage com o ser humano de forma incondicional
e, por isso, é expresso por meio de símbolos.
V. O símbolo é remissivo, ou seja, ele envia para outra realidade aquilo que
importa existencialmente.
VI. Na interpretação dos símbolos, busca-se uma realidade invisível, que se
encontra atrás de algo invisível e de suas possíveis conexões.
115 Símbolos: aproximação ao tema
ATIVIDADES DE AUTOAVALIAÇÃO
1. As culturas são o berço de onde provêm toda a criação humana e a expressão
de suas formas de vivência. Com base nessa premissa, assinale a alternativa
que indica o sujeito produtor do símbolo:
A] O ser humano.
B] Deus.
C] Sistemas religiosos.
D] Os animais.
E] Sistemas filosóficos.
5. É possível considerar o símbolo como uma lente que permite ver o que sem
ela não se vê. O que, de fato, busca-se na interpretação do símbolo?
A] Uma realidade fática.
B] Uma realidade passada.
C] Uma realidade futura.
D] Rituais.
E] Uma realidade invisível.
ATIVIDADES DE APRENDIZAGEM
Questões para reflexão
1. “O ser humano é o único criador de símbolo.” Reflita e discorra a respeito de
algumas teses que ratifiquem esse enunciado.
2. O símbolo é, por natureza, polissêmico. Defina polissemia e faça uma
reflexão sobre a maneira pela qual ela é aplicada ao símbolo.
Nessa mesma direção segue a reflexão de Jung (citado por Eliade, 1996).
Para ele, o processo de autorrealização do ser individido encontra impulso
justamente na dinâmica dos símbolos. E acrescenta “que os símbolos conferem
unidade àquilo que aparentemente encontra-se separado” (Jung, citado por
Eliade, 1996, p. 180). A crítica de Paul Tillich (1996) ao processo de
“demitização” é, no mínimo, interessante. Para o teólogo da cultura, é um
equívoco expulsar mitos e símbolos. Ele mesmo esclarece por que considera o
expurgo um equívoco: “nunca será bem- sucedido, porque símbolo e mito
revelam formas de pensamento e de intuição que estão inseparavelmente
ligados à estrutura da consciência humana” (Tillich, 1999, p. 36). O papel dos
símbolos religiosos é dar significação à vida do ser humano.
“Os índios pueblos acreditam que são filhos do pai Sol, e esta crença dá a
suas vidas uma perspectiva (e um objetivo) que ultrapassa a sua limitada
existência: abre-lhes espaço para um maior desdobramento de suas
personalidades e permite-lhes uma vida plena como seres humanos” (Jung,
citado por Schlögl, 2009, p. 127).
Em razão dessa função, “sua própria existência representa um ato social”
(Croatto, 2010, p. 113). O simbolismo, portanto, é considerado um
acontecimento social; ou, como afirma Mauss (citado por Croatto, 2010, p.
114), uma vez que “as coisas sagradas são coisas sociais [...] considera- se
sagrado tudo aquilo que qualifica a sociedade por meio do grupo e de seus
membros”. Com base nas pesquisas de Schlögl (2009, p. 119), podemos
perceber que diferentes imagens, estátuas, objetos, vestimentas, posições,
entre outras possibilidades, são, muitas vezes, expressões simbólicas
importantes nas várias culturas religiosas. Só após o estabelecimento de
contato com essa linguagem, e depois de ser atingido por ela, intelectual e
emocionalmente, é que o sujeito poderá buscar significações. Schlögl (2009)
sugere que o símbolo sempre é
121 Símbolo como linguagem da fé
maior do que si mesmo. Nesse caso, ele funciona como um farol lançando
luz para algo mais distante. Vale destacar os aspectos importantes da
linguagem simbólica que são fundamentais para o sentido da vida e que se
expressam de maneira comunitária na celebração religiosa. Silva (2013, p. 18-
19) faz referência a cinco possíveis características, apontadas como essenciais
tanto em Campbell quanto em Tillich, assim sumarizadas:
MÃOS À OBRA
Símbolos são polissêmicos, e o sentido deles é produzido com base em seus
lugares específicos. Procure conhecer os símbolos de outras tradições
religiosas e a maneira como eles ajudam a interpretar melhor o mundo e o
cotidiano pelas relações com o sagrado.
FIQUE ATENTO
Você sabia que uma das formas de anular o símbolo é a leitura historicista de
qualquer texto religioso? Vejamos.
Considerar, por exemplo, a serpente do Gênesis 3 um animal real não é
apenas criar um ser prodigioso que nunca existiu, mas também esvaziar
totalmente o “segundo sentido” que o narrador busca estabelecer como
mensagem. Esvaecido o símbolo, o texto converte-se em uma fábula
interessante. A própria figura do demônio é um símbolo poderoso em diversas
religiões; quando é “historicizado” e explicado como um ser vivente concreto,
nesse exato momento mata-se o símbolo: a origem do mal, então, é projetada
no ser real extraordinário, e não é buscada onde verdadeiramente pode estar.
O demônio como símbolo remete ao mistério do mal; se alguém consegue
“explicar” esta ou aquela manifestação do mal como tal, não precisa remeter
para ele simbolicamente.
pessoais e estruturais
Poder, poder simbólico e discurso religioso estão mais próximos do que
podemos imaginar. Contudo, é necessário apresentar algumas possíveis
definições de poder que aparecem no decorrer desta seção. Valemo-nos da
definição de três autores que indicam o ambiente em que nossa reflexão deve
realizar-se.
126 Símbolo como linguagem da fé
Mais uma vez, Foucault (2002) faz uma grave advertência a fim de não
tomar o poder como se fosse um fenômeno maciço e homogêneo, isto é, como
se fosse uma dominação de um indivíduo sobre outros, de um grupo sobre
outros, de uma classe sobre as outras. A orientação dele é precisa nesse
aspecto:
uma teologia feita a partir da ótica do povo. Eu, teólogo, é que iria
pensar, refletir em favor dele. Agora vejo que eu era vítima de
preconceito academicista, que afirma só fazer discurso crítico quem
passou pela universidade. Aí eu confundia criticidade com
academicismo. Um bom teólogo profissional é apenas um servidor do
teólogo verdadeiro – que é a comunidade.
SÍNTESE
ATIVIDADES DE AUTOAVALIAÇÃO
1. “O papel dos símbolos religiosos é dar significado à vida do ser humano” é
uma tese ligada a qual pesquisador?
A] Jung.
B] Campbell.
C] Croatto.
D] Schlögl.
E] Frazer.
132 Símbolo como linguagem da fé
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Ritos, mitos e símbolos provocam a reflexão de que o ser humano pode ser
considerado um ser “religioso ou simbólico”. No entanto, o homo religiosus
não se resume, necessariamente, a uma ou a outra religião em particular. Essa
expressão revela, de fato, que ele é um ser de vivências, ou seja, um ser que se
apresenta no mundo como um experimentador da dimensão do sagrado
conforme a própria consciência. A religiosidade, nesse sentido, pode ser
pensada como algo inerente ao ser humano.
Assim, ao analisarmos ritos, mitos e símbolos, recuperamos uma parte
do patrimônio de sabedoria que existe em cada ser humano e que, por alguma
razão, encontrava-se esquecida. Olhar para o passado ajuda, nesse caso, a
interpretar o ser humano no presente. Nesse contexto, o fenômeno religioso
nos faz olhar para o passado e, ao mesmo tempo, ponderar o presente. Passado
e presente se apresentam como necessários e simultâneos. Ao ser humano não
é permitido viver nas brumas do passado e, muito menos, vivenciar o presente
desconectado com a tradição. Podemos afirmar, então, que o fenômeno
religioso, nesse caso, auxilia o ser humano a assumir a função de hermeneuta,
isto é, de intérprete da realidade.
Os valores presentes no ser humano desde milênios são, claramente,
também fatores de renovação de nossa visão de mundo e, sem dúvida, têm a
capacidade de dar um novo sentido à vida. Na denominada sociedade do
conhecimento, os ritos, mitos e símbolos não devem ser pensados como
acessórios descartáveis após certo tempo de uso.
135
REFERÊNCIAS
PRANDI, R. Mitologia dos orixás. São Paulo: Companhia das Letras, 2017.
REIMER, H. Toda a criação: Bíblia e ecologia. São Leopoldo: Oikos, 2006.
RITZER, G. McDonaldization: the reader. Thousand Oaks: Pine Forge
Press, 2002.
RIVIERE, C. Os ritos profanos. Petrópolis: Vozes, 1997.
ROSSI, L. A. S. A criação no livro de Gênesis. In: SANCHES, M. A. (Ed.).
Criação e evolução: diálogo entre teologia e biologia. São Paulo: Ave Maria,
2009. p. 63-77.
ROSSI, L. A. S. A origem do sofrimento do pobre. São Paulo: Paulus,
2017.
ROSSI, L. A. S. Mitos: ferramentas que proporcionam investigações
sociológicas. Revista Cesumar, v. 8, n. 2, p. 54-66. jul. 2003. Disponível em:
<https://periodicos.unicesumar.edu.br/index.php/revcesumar/article/view/2
31/925>. Acesso em: 10 ago. 2020.
ROSSI, L. A. S. Simbologia bíblica. Páginas Abertas, São Paulo, ano 43, n.
72, p. 16-17, 2018.
ROSSI, L. A. S.; DIETRICH. L. J. Bíblia: palavra de Deus em linguagem
humana. São Paulo: Paulus, 2017.
SANTOS, B. de S. A crítica da razão indolente. São Paulo: Cortez, 2000.
SANTOS, M. I. de A. Gênero e comunicação. São Paulo: AnnaBlume, 2004.
SCHADEN, E. Mitologia heroica de tribos indígenas do Brasil. São
Paulo: Edusp, 1989.
SCHLÖGL, E. Ensino religioso: perspectivas para os anos finais do ensino
fundamental e para o ensino médio. Curitiba: ibpex, 2009.
SCHWANTES, M. Projetos de esperança: meditações sobre Gênesis 1- 11.
Petrópolis: Vozes, 1989.
SILVA, E. P. A linguagem da fé: a importância do símbolo religioso em Paul
Tillich. Revista Eletrônica Correlatio, v. 12, n. 24, dez. 2013.
SNPC – Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura. Rituais fúnebres no
mundo: budismo. 2010. Disponível em:
<https://www.snpcultura.org/vol_rituais_funebres_budismo.html>. Acesso
em: 10 ago. 2020.
TILLICH, P. Dinâmica da fé. 5. ed. São Leopoldo: Sinodal, 1996.
139
BIBLIOGRAFIA COMENTADA
O livro de Croatto é leitura sine qua non para o estudante e leitor interessado.
Com estilo e profundidade, o autor consegue demonstrar que todas as culturas
e todos os povos têm uma expressão religiosa. Após definir a fenomenologia da
religião, analisa a experiência religiosa em si e, então, aborda as linguagens
próprias e interfaciais do mito, do rito e do símbolo.
O autor dessa obra procura expor e analisar com clareza as diversas maneiras
como a religião foi e é entendida do ponto de vista dos diversos campos do
saber moderno. Temas como interpretação crítica da religião, perspectiva
comparada das religiões e interpretações religiosas são desenvolvidos pelo
autor.
PRANDI, R. Mitologia dos orixás. São Paulo: Companhia das Letras, 2017.
ANEXOS
A) MITOS
1) Mitos da criação babilônico e judaico-cristão comparados
Enuma Elish (Tábua I) Gênesis 1
A criação do universo A criação do universo
“Quando no alto o céu ainda não havia sido “No princípio, Deus criou o céu e a terra.
nomeado, e, abaixo, a terra firme não havia Ora, a terra estava vazia e vaga, as trevas
sido mencionada com um nome, só Apsu, cobriam o abismo, e um sopro de Deus
seu progenitor, e a mãe, Tiamat, a geradora agitava a superfície das águas. Deus disse:
de todos, mesclavam juntos suas águas: 'Haja luz', e houve luz. Deus viu que a luz era
ainda não se haviam aglomerado os juncos, boa, e Deus separou a luz e as trevas. Deus
nem os canaviais tinham sido vistos. Quando chamou a luz 'dia' e as trevas 'noite'. Houve
os deuses ainda não haviam aparecido, nem uma tarde e uma manhã: primeiro dia.”
tinham sido chamados com um nome, nem (Bíblia de Jerusalém, Gênesis, 2002,1:1-5)
fixado nenhum destino, os deuses foram
procriados dentro deles.” (Tábua 1, linhas 1-
9)
“Voltou atrás em direção a Tiamat que ele “Deus disse: ‘Haja um firmamento no meio
havia abatido. O Senhor pôs seus pés sobre das águas e que ele separe as águas das
a parte inferior de Tiamat e com sua arma águas', e assim se fez. Deus fez o
inexorável, despedaçou- lhe o crânio. Depois firmamento, que separou as águas que
cortou as artérias de seu sangue, e deixou estão sob o firmamento das águas que estão
que fossem levadas a lugares secretos pelo acima do firmamento, e Deus chamou ao
vento do norte. Ao ver isto, seus pais se firmamento ‘céu'. Houve uma tarde e uma
alegraram jubilosos e os mesmos levaram- manhã: segundo dia. Deus disse: ‘Que as
lhe dons e presentes. Com a cabeça águas que estão sob o céu se reúnam num
repousada, o senhor contemplava o cadáver só lugar e que apareça o continente', e assim
de Tiamat. Dividiu (logo) a carne monstruosa se fez. Deus chamou ao continente ‘terra' e
para fabricar maravilhas, a dividiu em duas à massa das águas chamou ‘mares', e Deus
partes, como se fosse um peixe (destinado) viu que isso era bom.” (Bíblia de Jerusalém,
a secagem, e dispôs uma metade, com a Gênesis, 2002,1:6-10)
qual fez o céu, em forma de abóbada.
Esticou a pele, e pôs uns guardiões,
mandando-lhes que não permitissem sair
suas águas.” (Tábua 4, linhas 128-140).
(CONTINUA)
144
(CONCLUSÃO)
Enuma Elish (Tábua I) Gênesis 1
“Oh Marduk, tu és o mais importante entre “Deus disse: 'Que haja luzeiros no
os grandes deuses! Teu destino não tem firmamento do céu para separar o dia e a
igual, teu mandato é como o de Anu! Desde noite; que eles sirvam de sinais tanto para as
este dia tuas ordens serão irrevogáveis, festas quanto para os dias e os anos; que
exaltar ou rebaixar dependerá de tua mão. À sejam luzeiros no firmamento do céu para
sua palavra, segundo sua ordem, a iluminar a terra', e assim se fez. Deus fez os
Constelação desapareceu e a uma nova dois luzeiros maiores: o grande luzeiro como
ordem a Constelação ficou restaurada. poder do dia e o pequeno luzeiro como
Quando os deuses, seus pais, viram a poder da noite, e as estrelas. Deus os
eficácia de sua palavra o saudaram colocou no firmamento dos céus para
alegremente: ‘Só Marduk é o rei!'.” (Tábua iluminar a terra, para governar o dia e a
4, linhas 5-8.25-28). noite, para separar a luz e as trevas, e Deus
viu que isso era bom. Houve uma tarde e
uma manhã: quarto dia.” (Bíblia de
Jerusalém, Gênesis, 2002,1:14-19).
“Quando [Marduk] ouviu as palavras dos “Deus disse: ’Façamos o homem à nossa
deuses, seu coração o empurrou a criar imagem, como nossa semelhança, e que eles
maravilhas; e [abrindo] sua boca dirige sua dominem sobre os peixes do mar, as aves do
palavra a Ea para comunicar-lhe o plano que céu, os animais domésticos, todas as feras e
havia concebido em seu coração: 'vou juntar todos os répteis que rastejam sobre a terra'.
sangue e formar ossos; farei surgir um Deus os abençoou e lhes disse: ’Sede
protótipo humano que se chamará 'homem'! fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra e
Vou criar este protótipo, este homem, para submetei-a; dominai sobre os peixes do mar,
que lhe sejam impostos os serviços dos as aves do céu e todos os animais que
deuses e que eles estejam descansados'.” rastejam sobre a terra'. Deus disse: ’Eu vos
(Tábua 6, linhas 1-8). “Ataram-no (Kingu) e o dou todas as ervas que dão semente, que
mantiveram coagido diante de Ea. Infligiram- estão sobre toda a superfície da terra e
lhe seu castigo: cortaram-lhe o sangue. E todas as árvores que dão frutos que dão
com seu sangue (Ea) formou a humanidade. semente: isso será vosso alimento...'.”
Impôs sobre ela o serviço dos deuses, (Bíblia de Jerusalém, Gênesis, 2002,1: 26-29)
liberando a estes.” (Tábua 6, linhas 31- 34)
2) Mitos dos povos originários do Brasil
[Um mito] indígena nheengatu, da Amazônia, assim registra a origem do mundo
No princípio, contam, havia só água, céu.
Tudo era vazio, tudo noite grande.
Um dia, contam, Tupana desceu de cima no meio de vento grande,
quando já queria encostar na água saiu do fundo uma terra pequena,
pisou nela.
145
Nesse momento Sol apareceu no tronco do céu, Tupana olhou para ele.
Quando Sol chegou no meio do céu seu calor rachou a pele de Tupana, a
pele de Tupana começou logo a escorregar pelas pernas dele abaixo.
Quando Sol ia desaparecer para o outro lado do céu a pele de Tupana
caiu do corpo dele, estendeu-se por cima da água para já ficar terra
grande.
No outro Sol [no dia seguinte] já havia terra, ainda não havia gente.
Quando Sol chegou no meio do céu Tupana pegou em uma mão cheia de
terra, amassou-a bem, depois fez uma figura de gente, soprou-lhe no
nariz, deixou no chão. Essa figura de gente começou a engatinhar, não
comia, não chorava, rolava à toa pelo chão. Ela foi crescendo, ficou
grande como Tupana, ainda não sabia falar.
Como tudo é bonito para mim! Aqui está água com que hei de esfriar
minha sede. Ali está fogo do céu com que hei de aquecer meu corpo
quando ele estiver frio. Eu hei de brincar com água, hei de correr por
cima da terra; como o fogo do céu está no alto, hei de falar com ele aqui
de baixo.
Tupana, contam, estava junto dele, ele não viu Tupana. (Martins, 1994,
p. 5)
Foi então que ele cantou e do seu canto as estrelas começaram a nascer.
E ele cantou, cantou e cantou, até quando num determinado momento
ele disse:
Mas um dia Tupi sonhou com a nossa Mie Terra. Foi quando ele criou
do seu próprio pensamento um petenguá. Petenguá é um cachimbo
sagrado. E através do petenguá ele soprou o espírito da futura Mie
Terra. E o espírito da futura Mie Terra ficou viajando pelo espaço, se
alongando, se transformou numa serpente luminosa e prateada. Até o
momento em que ela escolheu um lugar e disse:
- É aqui.
Algum tempo depois Tupi foi seguindo o rastro do espírito da Terra que
havia sido deixado pelo espaço, no grande céu, até chegar ao lugar onde
havia escolhido para adormecer e sonhar. Tupi olhou e no casco da
grande tartaruga desenhou as futuras montanhas, os futuros vales, os
futuros rios, desenhou as futuras cachoeiras. E pensou:
E Tupã falou:
– Ei, você! Você pode me ensinar alguma coisa sobre viver aqui na
Terra?
Endovi disse:
Foi quando sentiu pela primeira vez, através das raízes, o que era estar
na Terra. E viu que era muito bom. E foi ficando, foi ficando, foi
ficando...
A rocha disse:
Ela disse:
– Quem é você?
Ela disse:
– Ah! Então você pode me ensinar alguma coisa sobre viver aqui.
– Então me mostre.
– Arara!
– Nossa! Araraí!
– Arararuna!
– Pirarucu!
– Tambaqui!
151
E foi falando muitos nomes que viraram peixes. Muitos e muitos nomes.
Ele olhou para o chão e falou:
– Djacaré!
– Panambi!
E ele foi cantando, cantando, cantando nomes. Até o dia que ele olhou
para os e viu que estavam todos os seres criados: os seres das águas, os
seres do céu, os seres da terra.
Nhanderovussu falou:
Olha, faz o seguinte: anda mais um pouco pelo mundo, vive mais um
pouco a sua experiência nesse chão, depois quando você realmente
cansar você não precisa mais vir até mim; abre um espaço em qualquer
lugar e entregue esse manto que eu te dei.
– Agora eu vou.
B) Ritos
1) Rituais fúnebres no budismo
Por essa razão, entre a morte e a cremação [...], há uma série de rituais,
como a recitação de textos sagrados e a doação de esmolas aos monges
que vêm presidir ás cerimônias, que são indispensáveis.
4) Ritos de esquimós
Os esquimós dedicam-se à caça e à pesca. O ambiente ártico em que
vivem lhes fornece necessariamente os bens essenciais à vida: comida,
vestuário, combustível. São obrigados a adaptar seu estilo de vida ao
modelo determinado pelo seu meio ambiente. As mudanças de estação e
a escolha de regiões para a caça obrigam-nos a contínua migrações. Seu
interesse vital em animais, tão essencial para a sua existência, reflete-se
na mitologia, no culto, nas proibições, ritos e organização.
Particularmente interessante é oculto da deusa do mar (Sedna), a
guardiã dos animais marinhos, que é muito popular entre os esquimós
do centro. Os numerosos espíritos, com que os esquimós, com sua fértil
imaginação povoam seu meio ambiente, devem ser constantemente
aplacados, a fim de garantir sua cooperação na consecução do
necessário suprimento de animais de caça. Os nativos acreditam que só
se os adequados ritos propiciatórios forem observados é que as almas
dos animais por eles mortos não perecerão, mas retornarão à terra em
novos corpos. Amuletos eficazes e fórmulas são avidamente procurados.
Um sistema de proibições muito rígido controla as atividades destes
povos – como fixação em determinada localidade e alimentos. A caça
satisfaz praticamente a todas as necessidades materiais dos esquimós,
consequentemente, em sua maioria, as interdições visam aos espíritos
ou ás divindades protetoras dos animais. Espera-se que o “angelok”, o
sacerdote esquimó, profeta ou feiticeiro, que se comunica com os
espíritos em sessões especiais, dê boa sorte e êxito ao caçador. Se o
“angelok” for tão infeliz a ponto de faltar com seu dever religioso, ele é
então punido de maneira apropriada. (Wach, 1990, p. 268)
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Foi fundamental para a difusão do cristianismo. A palavra peixe, do
grego Ichthys, representa o acrônimo lesous Christos, Theou Yios Soter, que
156
157
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RESPOSTAS
Capítulo 1 Capítulo 4
1. a 1. a
2. b 2. b
3. c 3. c
4. d 4. d
5. e 5. e
Capítulo 2 Capítulo 5
1. a 1. a
2. b 2. b
3. c 3. c
4. d 4. d
5. e 5. e
Capítulo 3 Capítulo 6
1. a 1. a
2. a 2. b
3. c 3. c
4. d 4. d
5. e 5. e
160
SOBRE OS AUTORES