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História da saúde pública no

Brasil
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:
„„ Identificar os principais desafios de saúde ao longo da história da
saúde pública no Brasil.
„„ Diferenciar os sistemas de saúde que existiram.
„„ Relacionar as Conferências Nacionais de Saúde (CNS) aos momentos
históricos.

Introdução
Neste texto, você vai estudar a evolução da história da saúde pública
e das políticas públicas de saúde no Brasil, conhecendo as principais
características do sistema de saúde durante os diferentes períodos
históricos até a implantação do atual Sistema Único de Saúde (SUS).
Você aprenderá que os principais marcos regulatórios da construção
da saúde pública brasileira atual foram a Constituição Federal de 1988
e o Projeto da Reforma Sanitária, responsáveis pela idealização e im-
plantação do Sistema Único de Saúde (SUS), que tornou o acesso à
saúde universal para todos os cidadãos.
O texto faz uma retrospectiva histórica sobre o contexto social do
surgimento do SUS, identificando os fatores relacionados com a sua
consolidação, assim como a importância e significado da implanta-
ção de um sistema único e universal em um país com as dimensões e
diversidades como o Brasil.

História da saúde pública no Brasil

Período colonial e século XIX


No período colonial, os investimentos privilegiavam melhorias mínimas de
estrutura, que permitissem o escoamento da matéria-prima explorada por
aqui. Não havia interesse em investir para melhorar as condições de vida da
população, em sua maioria composta por indígenas, escravos e senhores. Esse
período foi marcado por epidemias de doenças transmissíveis comomalária

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(1549), varíola (1561), hanseníase e febre amarela (1680), todas trazidas pelos
colonizadores, aventureiros e por meio do comércio de escravos.
A assistência à saúde era inexistente. Famílias abastadas podiam ir à Eu-
ropa ou trazer médicos ao país quando necessitavam de tratamento médico. A
maioria da população, sem condições, buscava ajuda na medicina popular. As
Santas Casas de Misericórdia abrigavam pobres e doentes mentais.
Durante o século XVIII, com o crescimento das cidades, houve também
maior chegada ao país de médicos e nobres portugueses, modificando a situ-
ação da saúde. Ainda assim, a maior preocupação era com as questões sanitá-
rias e o acúmulo de lixo nas vias públicas. As precárias condições sanitárias
eram responsáveis por graves problemas de saúde.
O início da prática de políticas públicas de saúde no Brasil se deu com a
vinda da família Real em 1808, fugindo de Napoleão Bonaparte. Esse evento
trouxe melhorias, pois era preciso que a corte encontrasse aqui toda a assis-
tência necessária em saúde. Mas essa assistência se concentrou nas cidades
nas quais a nobreza se instalou. Surgiram as primeiras escolas de Cirurgia.
A abolição da escravatura em 1888 provocou aumento expressivo nos nú-
meros de imigrantes europeus que chegavam ao Brasil. O objetivo era manter a
mão de obra da cafeicultura, na época a principal produção econômica do país.
Essa movimentação culminou com o desenvolvimento das cidades produtoras
de café e das cidades litorâneas. A maior concentração demográfica nessas ci-
dades estava associada com a ocorrência dos surtos de doenças como a febre
amarela, varíola e outras; essas epidemias prejudicavam os negócios. os navios
temiam em ancorar nos portos das cidades litorâneas tomadas pelas epidemias.

Século XX
No Brasil, o século XX foi um intenso período de industrialização, instabili-
dade política e governos autoritários; os períodos democráticos tiveram curta
duração. A reforma sanitária foi impulsionada pela sociedade civil. O dinâmico
e complexo Sistema Único de Saúde (SUS) foi instituído pela Constituição de
1988, com base no princípio de que a saúde é um direito do cidadão e dever do
Estado. É objetivo do SUS prover atenção abrangente e universal, preventiva e
curativa, por meio da gestão e prestação descentralizada de serviços de saúde,
promovendo a participação da comunidade em todos os níveis de governo.
Esse contexto histórico foi decisivo para que o governo brasileiro tomasse
a iniciativa de resolver o problema das epidemias nas cidades litorâneas e nos

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principais portos do país. Para isso, os médicos Oswaldo Cruz (diretor geral de
saúde pública) e Emílio Ribas tomaram medidas como a vacinação obrigatória,
além do controle das pragas e dos criadouros de mosquitos. As campanhas de
vacinação aconteciam de forma autoritária, com atuação e vigilância da polícia
sanitária, gerando oposição popular, vide a Revolta da Vacina em 1904.
No Rio de Janeiro, Oswaldo Cruz conseguiu sanear a cidade e controlar
as epidemias, passando a ser reconhecido como importante figura da saúde
pública brasileira, responsável pela criação do Departamento Nacional de
Saúde, que veio a se tornar o Ministério da Saúde.
Entre 1915 e 1920, greves reivindicaram melhorias nas condições de tra-
balho, de vida e de saúde. Criaram-se fundos financeiros em diversas cate-
gorias, com contribuições que incidiam sobre uma porcentagem do salário
individual de acordo com as categorias. O dinheiro arrecadado com esses
fundos era destinado à assistência médica, pensões e casos de invalidez. Os
ferroviários foram os primeiros a buscar esse tipo de organização.
A partir de 1920, influenciados por ideias trazidas da Europa e Estados
Unidos, os médicos sanitaristas iniciaram discussões para desenvolver um
sistema de saúde a partir dos centros de saúde, com foco nos cuidados de
higiene e alimentação, voltado para gestantes e crianças. Nessa década foram
criados órgãos especializados no combate a doenças como tuberculose, lepra
e doenças sexualmente transmissíveis (DST).
As Caixas de Aposentadoria e Pensão (CAP), criadas em 1923 pela Lei
Elói Chaves, são consideradas a origem do sistema de previdência no Brasil.
Funcionavam como poupanças coletivas, em que os assalariados depositavam
dinheiro mensalmente, e o montante funcionava como um seguro para as fa-
mílias dos empregados.
Até a década de 1930, a saúde pública ficou conhecida como “campa-
nhista”, com foco nas ações da políciasanitária, atacando os problemas de
saúde que afetavam a população e tinham impacto econômico importante.
Mas avanços importantes para a saúde conquistados nessa época incluem o
controle das doenças transmissíveis e a criação dos primeiros laboratórios
públicos de pesquisa em saúde.
O governo de Getúlio Vargas (1930-1945) teve forte caráter centralizador,
com o fechamento do Congresso Nacional e deportação de presos políticos. Ca-
racterizado por uma política populista, ficou conhecido como “Pai dos pobres”,
tomando medidas que mascaravam o regime autoritário – havia repressão e, ao
mesmo tempo, eram promulgadas as Leis do Trabalho, mas sem participação ou
discussão popular. Nesse período houve expansão do sistema de proteção social

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brasileiro, no qual a gestão era realizada sem participação da sociedade, com


centralização burocrática, resultando em fragmentação e desigualdade.
O sistema era formado por um ministério financiado pelo sistema de as-
sistência médica da previdência social, cujos serviços proviam de institutos
de aposentadoria e pensões que eram diversificados entre as diferentes cate-
gorias profissionais.
Na década de 1930, as Caixas de Aposentadoria e Pensão (CAP) foram
unificadas, dando origem aos Institutos de Aposentadoria e Pensão (IAP),
que estenderam a previdência social à maioria dos trabalhadores urbanos. A
gestão desses institutos era do governo;assim, o dinheiro dos IAP foi utilizado
em obras públicas, financiamento de iniciativas privadas na área da saúde e
construções de hospitais, propagando a existência de um modelo que centra-
lizava a saúde no cuidado hospitalar.
Durante a Era Vargas, os principais desafios de saúde foram representados
pelas endemias rurais (doença de chagas, esquistossomose, ancilostomíase,
malária), tuberculose, sífilis e deficiências nutricionais.
O período “desenvolvimentista” de 1945 a 1964 foi de instabilidade de-
mocrática, com fortalecimento da indústria e aumento da malha rodoviária.
Brasília foi inaugurada em 1960. Nesse período, a emergência das doenças
crônico-degenerativas, os acidentes de trabalho e de trânsito foram os maiores
desafios enfrentados pelo sistema de saúde. Na época houve permanência da
dualização: de um lado, a assistência voltada para problemas coletivos, de
outro, a assistência de caráter curativo, ligada aos IAP.
Em maio de 1953, com escassos recursos financeiros, demonstrando o
descaso com a saúde da população, foi criado o Ministério da Saúde (MS).
Em 1956, foi criado o Departamento Nacional de Endemias Rurais (DNERU),
para promover a educação sanitária da população rural.
O Brasil abriu espaço para grupos estrangeiros e, na área da saúde, houve
entrada de grupos estrangeiros de medicina que começaram a administrar di-
versos hospitais que haviam sido construídos com dinheiro do Estado. Surgiram
as primeiras empresas de saúde e houve expansão da assistência hospitalar.
Em 1963, ocorreu a III Conferência Nacional da Saúde (CNS), que propôs
a reordenação dos serviços de assistência médica-sanitária e alinhamentos ge-
rais para determinar uma nova divisão das atribuições entre os níveis político-
-administrativos da Federação com o objetivo de municipalizar a saúde.
A partir de 1964, incidiram reformas governamentais que impulsionaram
a expansão das iniciativas privadas na área da saúde, principalmente nas
grandes cidades. A cobertura da previdência social sofreu expansão, pas-

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sando a contemplar o meio rural. Nesta época, os principais desafios de saúde


foram o aumento da prevalência das doenças crônico-degenerativas, a persis-
tência das endemias rurais, as doenças parasitárias e infecciosas. Destaca-se
a epidemia de meningite em 1974, cujas informações e números foram censu-
rados pelo Governo. Para a construção de hospitais, o Estado provia fundos
de forma duplicada: primeiro emprestando dinheiro aos investidores e pela
segunda vez ao financiar a assistência de saúde prestada à população.
Em 1966, os IAPs foram unificados no Instituto Nacional e Previdência
Social (INPS), que hoje é o Instituto Nacional de Seguridade Social (INSS),
com privatização da assistência médica e capitalização do setor da saúde. A
assistência médica individual prestada pelo INPS contemplava apenas os tra-
balhadores que contribuíam com a previdência social (em regime de trabalho
com carteira assinada). Assim, os trabalhadores rurais permaneciam exclu-
ídos do sistema de saúde, configurando o nascimento dos planos de saúde,
desenvolvendo nas empresas a prática de prestar serviços de saúde aos empre-
gados. Mas isso não diminuiu a ampliação da cobertura que esse movimento
exigiu, assim como uma grande expansão da assistência médica, o que explica
problemas enfrentados na atualidade envolvendo o sistema único de saúde e
a previdência social.
Em 1974, o regime militar dividiu o INPS em Instituto Nacional de Se-
guridade Social (INSS) e o Instituto Nacional de Assistência Médica da
Previdência Social (INAMPS). O INAMPS ficou responsável pela assistência
médica ambulatorial e hospitalar. Saúde e previdência passaram a ser tratadas
juntas. A maior parte do atendimento realizado pelo INAMPS era realizado
pela iniciativa privada, e os convênios eram remunerados por procedimento
realizado, consolidando o modelo de cuidado da doença e não da saúde. Para
contemplar essa ampliação a solução encontrada foi comprar a oferta desses
serviços da rede privada. Assim, o governo não provia esses serviços de
forma direta,incentivando o desenvolvimento do mercado privado de saúde.
Em meados da década de 70, com o fim do milagre econômico, ocorreu
uma crise do financiamento da previdência social, com repercussões no
INAMPS. Entre 1970 e 1974, com recursos do governo federal, houve a re-
forma e a construção de hospitais privados, e a responsabilidade pela oferta
de atenção à saúde foi estendida aos sindicatos e instituições filantrópicas que
ofereciam assistência de saúde a trabalhadores rurais. Os subsídios diretos
a empresas privadas para a oferta de assistência médica a seus empregados
foram substituídos por descontos no imposto de renda, o que levou à expansão
da oferta dos cuidados médicos e à proliferação de planos de saúde privados.

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A maior cobertura da previdência social e um mercado de saúde baseado em


pagamentos e prestadores do setor privado com base nos serviços realizados
geraram uma crise de financiamento na previdência social, que, associada à
recessão econômica da década de 1980, alimentou os anseios pela reforma.
É importante destacar que o benefício, historicamente, estava vinculado à
inserção do indivíduo no mercado de trabalho, com características de seguro
e não de direito (cidadania). O Sistema Nacional de Saúde foi criado em 1975,
promulgado pela Lei nº 6.229, de 17 de julho, reforçando o que já era estabe-
lecido à época: a previdência social continuava responsável pela assistência
médica individual e curativa, enquanto o Ministério da Saúde e as secretarias
estaduais e municipais se responsabilizavam pelos cuidados preventivos.
A proposta para a reforma no setor da saúde teve início em meados de
1970, agrupando iniciativa de diversos setores da sociedade. Esse movimento
questionava o modelo biomédico, defendendo que a saúde era também uma
questão social e política. Em 1976, foi criado o Centro Brasileiro de Estudos
de Saúde (CEBES), organizando o movimento da reforma sanitária, e em
1979 fundou-se a Associação Brasileira de Pós-Graduação em saúde coletiva
(ABRASCO).
Ganhavam força, em diversos países da América Latina, as teorias sobre a
complexidade do processo saúde-doença e sobre a necessidade de mudanças
no sistema de saúde. No fim dos anos 70, surgiu o Movimento pela Reforma
Sanitária, que buscava encontrar respostas para o dilema da política de saúde
nacional. Em 1979, aconteceu o I Simpósio sobre Política Nacional de Saúde.
Na década de 1980, o Programa Nacional de Serviços Básicos de Saúde
(PREV-SAÚDE), o Conselho Nacional de Administração da Saúde Previ-
denciária (CONASP) e as Ações Integradas de Saúde (AIS) foram criados
para evitar as fraudes e lutar contra o monopólio das empresas particulares
de saúde. O INAMPS passou por uma universalização progressiva do aten-
dimento, já em processo de transição com o Sistema Único de Saúde (SUS).

A hora da virada: a VIII conferência nacional e a


Constituição de 1988
A necessidade da reforma sanitária ganhou destaque no Brasil. Era impor-
tante implantar um modelo de atenção à saúde que estivesse organizado na
participação comunitária, com regionalização dos serviços existentes, inte-
grando o sistema público-privado e colocando a atenção primária como foco.

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Essa proposta foi aceita em 1986 durante a VIII Conferência Nacional de


Saúde (CNS), que convocou sociedade e profissionais para discutirem a saúde
como direito, o sistema de saúde e o financiamento da saúde.
A proposta obtida ao final da VIII Conferência Nacional de Saúde determinava
a saúde e o acesso à saúde como direitos universais, sem obrigatoriedade da pre-
sença de vínculo empregatício, assim como garantia à população a participação
no processo de planejamento, implantação e avaliação do novo sistema de saúde.
A VIII Conferência Nacional de Saúde foi um marco na história do SUS:
foi a primeira CNS a ser aberta à sociedade e foi importante na veiculação do
movimento da Reforma Sanitária, resultando na implantação do Sistema Uni-
ficado e Descentralizado de Saúde (SUDS), um convênio entre o INAMPS e
os governos estaduais, além de formar as bases para que a seção “Da Saúde”
tomasse parte da Constituição Brasileira de 1988. O SUDS baseava-se no
princípio de integração dos serviços de saúde, e foi na época o responsável
pela municipalização da saúde e pela fiscalização da aplicação das verbas
destinadas à saúde.
A proposta da VIII Conferência Nacional de Saúde foi aprovada na
Constituição de 1988, seção II, art. 196, capítulo 1: “A saúde é direito de todos
e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que
visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal
e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação”.
A promulgação da constituição unificou a saúde, ficando os serviços de cui-
dados preventivos, curativos e de reabilitação sob responsabilidade desse
setor, definindo a saúde como de relevância pública.
Este foi um marco importante, pois os diversos segmentos formadores da
área da saúde conquistaram o direito e o dever de participarem das definições
e avaliações das políticas de saúde no Brasil nos níveis Federal, Estadual e
Municipal. Assim o SUDS foi extinto, surgindo o Sistema Único de Saúde
(SUS), encarregado de organizar no plano regional, as ações do Ministério da
Saúde, dos serviços Estaduais e Municipais de saúde, sendo uma importante
conquista da sociedade brasileira. O SUS surgiu baseado nas seguintes dire-
trizes: universalidade de acesso aos serviços de saúde em todos os níveis de
assistência; descentralização político-administrativa, com direção única em
cada esfera de governo; participação da comunidade.
Assim, com base nesses princípios, a Lei nº 8.080 de setembro de 1990
regulamentou o Sistema Único de Saúde (SUS), dispondo sobre as condições
para promover, proteger e recuperar a saúde, a organização e o funcionamento
dos serviços correspondentes.

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Não existiram políticas de saúde pública até a chegada da corte portuguesa em 1808.
Isso provocou mudanças na estrutura da saúde do país, mas a saúde coletiva e a in-
dividual ainda não eram um problema tratado pelo Estado. A partir de 1900, com o
objetivo de conter prejuízos econômicos do país, começaram a ser tomadas algumas
medidas de saneamento nos portos voltadas para o controle de epidemias. Por muito
tempo a saúde pública foi responsabilidade do Departamento Nacional de Saúde,
atual Ministério da Saúde. A assistência individual e curativa estava ligada à Previdência
Social, e só era atendido quem tinha carteira assinada ou quem podia pagar serviços de
saúde da iniciativa privada. O restante da população era atendido pelas Santas Casas.
Em 1988, a saúde se tornou um direito reconhecido na constituição, universalizando o
atendimento em saúde, garantindo com a nova estrutura: o Sistema Único de Saúde
(SUS) criado pela Lei nº 8.080, de 1990.

A implantação do SUS no Brasil foi gradual: primeiro veio o SUDS; de-


pois, a incorporação do INAMPS ao Ministério da Saúde (1990); e por fim
a Lei Orgânica da Saúde (Lei nº 8.080, de 19 de setembro de 1990) fundou o
SUS. A Lei nº 8.142, de 28 de dezembro de 1990, deu ao SUS o controle social
(participação dos usuários na gestão do serviço). O INAMPS foi extinto em
1993 pela Lei nº 8.689. A construção do SUS rompeu com o caráter merito-
crático que caracterizava o sistema de assitência à saúde no Brasil até 1988,
incorporando a saúde como direito, dentro do conceito de cidadania, com
igualdade de bem-estar.

Antes da implantação do Sistema Único de Saúde (SUS), o Ministério da Saúde apenas


promovia a saúde e prevenia doenças (p. ex., campanhas de vacinação) e investia na
assistência médico-hospitalar para poucas doenças; servindo quase exclusivamente a
aqueles que não tinham acesso ao atendimento pelo Instituto Nacional de Assistência
Médica da Previdência Social, que atuava na assistencia de saúde curativa restrita aos
segurados.

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32 Políticas públicas de alimentação e nutrição

A legislação das políticas de saúde


No ano de 1923, o Congresso Nacional aprovou a Lei Elói Chaves e por meio
dela as Caixas de Aposentadoria e Pensões (CAPs), configurando o primeiro
sistema previdenciário brasileiro.
A constituição de 1934 contemplou a garantia à assistência médica, li-
cença maternidade remunerada e jornada de trabalho de oito horas por dia
para os trabalhadores. Nos anos seguintes foram incorporados outros benefí-
cios como o salário mínimo e, em 1943, a Consolidação das Leis do Trabalho.
A CLT agregou benefícios que incluíam indenização aos acidentados, trata-
mento médico aos doentes, pagamento de horas extras, férias remuneradas,
entre outros benefícios aos trabalhadores com registro em carteira de trabalho.
A Lei Orgânica da Previdência Social (LOPS), criada em 1960, unificou
os serviços de saúde para todos os profissionais que fizessem parte do re-
gime da CLT, exceto os trabalhadores rurais, empregados domésticos e os
servidores públicos e de autarquias e que tivessem regimes próprios de previ-
dência. A Constituição Federal de 1988 formulou um novo conceito de saúde,
com acesso universal e igualitário.

Linha do tempo das políticas de saúde


As políticas de saúde foram influenciadas por eventos históricos e pela eco-
nomia de cada época:

„„ Século XVI: chegada da família Real (carência de profissionais e receio da


população em aceitar ajuda médica). Proliferação de curandeiros e boticários.
„„ 1892: criação dos primeiros laboratórios bacteriológicos.
„„ 1904: como diretor de saúde pública, Oswaldo Cruz implementou a desin-
fecção sanitária e obrigação da vacinação antivaríola (Revolta da Vacina).
„„ 1920: criação de órgãos especializados no combate a doenças.
„„ 1923: criação da Lei Elói Chaves que instituiu as Caixas de Aposentado-
rias e Pensões.
„„ 1934: durante o governo Vargas foram implementados programas de assis-
tência médica aos trabalhadores para garantir o processo de industrialização.
„„ 1943: criação da CLT agregando benefícios como indenização e pensões, a
acidentados e tratamento médico aos doentes portadores de carteira assinada.
„„ 1953: criação do Ministério da Saúde;
„„ 1956: criação do DNERU para a população rural.

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História da saúde pública no Brasil 33

„„ 1960: criação da Lei Orgânica da Previdência Social unificando os ser-


viços de saúde aos trabalhadores do regime CLT.
„„ 1966: criação do INPS.
„„ 1974: criação do Ministério da Previdência e Assistência Social. INPS
transforma-se em INAMPS.
„„ Fim da década de 70: surge o movimento pela Reforma Sanitarista.
„„ Década de 80: são criados programas de assistência básica de saúde.
„„ 1986: VIII Conferência Nacional de Saúde.
„„ 1988: a Constituição estabelece a saúde como relevância pública e direito
básico de todos os cidadãos. Criação do SUS.

Conferências Nacionais de Saúde (CNS)


As Conferências Nacionais de Saúde começaram com a promulgação da
Lei  nº  378, de 13 de janeiro de 1937, que instituiu o Conselho Nacional de Saúde.
Nessa época, o Estado não oferecia assistência médica, a não ser em situações es-
peciais, como nos casos de tuberculose, hanseníase e doença mental. Atualmente,
as Conferências representam os segmentos sociais para avaliar e propor diretrizes
de política de saúde nos níveis municipais, estaduais e federal.
Entre 1941 e 1986 foram realizadas oito Conferências Nacionais de Saúde,
das quais se destaca a VIII Conferência Nacional de Saúde por ter aberto
discussão e propiciado que a Saúde chegasse até a Constituição de 1988, ga-
rantida como direito Universal.

É nas Conferências de Saúde que a sociedade se organiza para garantir os interesses


e as necessidades da população na área da Saúde e assegurar as diversas formas de
pensar o SUS, disseminando junto à sociedade informações sobre o Sistema, para forta-
lecê-lo. A partir da Lei nº 8.142, ficou estabelecido que as Conferências de Saúde devem
contar com a participação de movimentos organizados, de entidades da área da Saúde,
dos gestores e dos prestadores de serviços de saúde.

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34 Políticas públicas de alimentação e nutrição

Segue um resumo de todas as Conferências Nacionais de Saúde com os


principais tópicos de discussão e resolução:

„„ 1ª CNS (1941): situação sanitária e assistencial.


„„ 2ª CNS (1950): legislação em higiene e segurança do trabalho.
„„ 3ª CNS (1963): descentralização na área de Saúde.
„„ 4ª CNS (1967): recursos humanos para as atividades em saúde.
„„ 5ª CNS (1975): implementação do Sistema Nacional de Saúde; programa
de Saúde Materno-Infantil; Sistema Nacional de Vigilância Epidemioló-
gica; Programa de Controle das Grandes Endemias e Extensão das Ações
de Saúde às Populações Rurais.
„„ 6ª CNS (1977): situação do controle das grandes endemias; interiorização
dos serviços de saúde e Política Nacional de Saúde.
„„ 7ª CNS (1980): extensão das ações de saúde por meio dos serviços básicos.
„„ 8ª CNS (1986): Saúde como Direito; reformulação do Sistema Nacional
de Saúde.
„„ 9ª CNS (1992): Municipalização é o caminho.
„„ 10ª CNS (1996): Saúde, cidadania e políticas públicas; gestão e organi-
zação dos serviços de saúde; controle social na saúde; financiamento da
saúde; recursos humanos para a saúde e atenção integral à saúde.
„„ 11ª CNS (2000): acesso, qualidade e humanização na atenção à saúde com
controle social.
„„ 12ª CNS (2003): Saúde: um direito de todos e um dever do Estado. A
saúde que temos, o SUS que queremos.
„„ 13ª CNS (2007): Saúde e Qualidade de Vida: Política de Estado e Desen-
volvimento
„„ 14ª CNS (2011): SUS na Seguridade Social - Política Pública, Patrimônio
do Povo Brasileiro

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História da saúde pública no Brasil 35

1. Vários foram os sistemas de saúde até Ações de Saúde às Populações


a formulação do SUS. Considerando Rurais”.
a República Velha, é possível afirmar b) A 8ª CNS, em 1986, com os temas:
que o acesso à saúde se dava via “Saúde como Direito; Reformu-
caixas de aposentadoria e pensão lação do
(CAPs) para: c) A 11ª CNS, em 2000, com o tema:
a) Todos! A saúde é um direito de “Efetivando o SUS: acesso, quali-
todos e dever do Estado. dade e humanização na atenção
b) Os trabalhadores rurais. à saúde com controle social”.
c) Os ferroviários. d) A 6ª CNS, em 1977, com os temas:
d) Todos os trabalhadores. “I. Situação atual do controle das
e) Os políticos. grandes endemias; II. Operaciona-
2. Sobre o sistema de saúde no colonia- lização dos novos diplomas legais
lismo português, assinale a alterna- básicos aprovados pelo governo
tiva CORRETA: federal em matéria de saúde; III. In-
a) Foram criadas as primeiras insti- teriorização dos serviços de saúde;
tuições de controle sanitários dos e IV. Política Nacional de Saúde”.
portos e de epidemias. e) A 3ª CNS, em 1963, que teve
b) Ocorreu a articulação incipiente como tema: “Descentralização na
entre saúde pública e previdência área de Saúde”.
social. 4. São diretrizes do SUS:
c) Surgiu o INAMPS. a) Universalidade de acesso aos
d) A organização sanitária era serviços de saúde em todos os
incipiente. níveis de assistência; descentra-
e) Foram criados os IAPs. lização político-administrativa,
3. As CNS constituem um espaço de com direção única em cada esfera
controle social e gestão participativa de governo; participação da
que objetiva articular a sociedade civil, comunidade.
a fim de garantir os interesses e as b) Preservação da autonomia das
necessidades da população na área da pessoas na defesa de sua integri-
saúde. A Conferência que contribuiu e dade física e moral; igualdade da
antecipou a formulação do SUS: assistência à saúde, com privilé-
a) A 5ª CNS, em 1975, que teve como gios; direito à informação às pes-
temas “I. Implementação do soas assistidas sobre sua saúde.
Sistema Nacional de Saúde; II. Pro- c) Divulgação de informações
grama de Saúde Materno-Infantil; quanto ao potencial dos serviços
III. Sistema Nacional de Vigilância de saúde e a sua utilização pelo
Epidemiológica; IV. Programa de usuário; utilização da epidemio-
Controle das Grandes Endemias; logia para o estabelecimento de
e V. Programa de Extensão das prioridades, a alocação de re-

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36 Políticas públicas de alimentação e nutrição

cursos e a orientação programá- lógicos, materiais e humanos da


tica; participação da comunidade. União e dos Municípios na pres-
d) Divulgação de informações tação de serviços de assistência à
quanto ao potencial dos serviços saúde da população; capacidade
de saúde e a sua utilização pelo de resolução dos serviços em
usuário; utilização da epidemio- todos os níveis de assistência.
logia para o estabelecimento de 5. Atualmente, NÃO faz parte do SUS:
prioridades, a alocação de recursos a) A Agência Nacional de Saúde
e a orientação programática; de- Suplementar (ANSS).
sigualdade da assistência à saúde, b) A política nacional de atenção
beneficiando os que têm menos. básica (PNAB).
e) Integração em nível executivo das c) A Lei Arouca.
ações de saúde, meio ambiente e d) O Serviço de Atendimento Móvel
saneamento básico; conjugação e Urgência (SAMU).
dos recursos financeiros, tecno- e) O INAMPS.

Leituras recomendadas

MENICUCCI, T. M. G. História da reforma sanitária brasileira e do Sistema Único de Saúde:


mudanças, continuidades e a agenda atual. História, Ciências, Saúde-Manguinhos, Rio de
Janeiro , v. 21, n. 1, p. 77-92, jan./mar. 2014. Disponível: <http://dx.doi.org/10.1590/S0104-
59702014000100004>. Acesso em: 20 jun. 2016.

PAIM, J. et al. O sistema de saúde brasileiro: história, avanços e desafios. The Lancet,
Londres, n. especial série Brasil, p. 11-31, maio 2011. Disponível em: <http://actbr.org.br/
uploads/conteudo/925_brazil1.pdf>. Acesso em: 20 jun. 2016.

SOLHA, T. R. D. Saúde coletiva para iniciantes: políticas e práticas profissionais. 2. ed. São
Paulo: Érica, 2014. Ebook. Disponível em: <https://online.minhabiblioteca.com.br/#/
books/9788536510972/>. Acesso em: 20 jun. 2016.

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