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SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIGA Processo n,° 782/18.3TSBJA.ELS1 Revista, ‘Tribunal reorrido: Tribunal dx Relagt de vera Acordam no Supremo Tribunal de Justica (6* Seceo): 1-RELATORIO Carlos Filipe Banza Martins demandou, pelo Tribunal Judicial de Beja ¢ em autos de ago declarativa com proceso na forma comum, Companhia de Seguros Allianz Portugal, S.A., peticionando (apés subsequente liquidag4o) a condenago desta no pagamento da quantia de €327 677,73, acrescida de juros a taxa legal contados desde a citago ou, em alternativa, na referida quantia de €327 677,73 atualizada de acordo com a taxa da inflagdo ou os indices de pregos por forma a corrigir a desvalorizagiio da moeda, desde a data de propositura da ago e até & sentenga e em juros & taxa legal contados apés a mesma, Alegou para o eftito, em apertada sintese, que: ~ Quando conduzia 0 veiculo automével matricula 60-MN-67, foi este embatido de frente pelo veiculo automével matricula 15-08-PZ; ~ O acidente ficou a dever-se a culpas do condutor deste ultimo veiculo, pois que, despistando-se, foi invadir a faixa de rodagem por onde seguia 0 Autor; = Do embate resultaram para 0 Autor os danos patrimoniais ¢ ndo patrimoniais que descreve, alguns dos quais com projeco para o futuro; ~ A responsabilidade civil inerente a utilizagdo do veiculo 15-08-PZ estava transferida para a Ré, razio pela qual a esta compete reparar o prejuizo softido pelo Autor. + Contestou a Ré, de facto e de direito, concluindo pela improcedéncia da ago ou que fosse julgada de acordo com a prova a produzir em julgamento. + SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIGA Seguindo o proceso seus devidos termos, veio, a final, a ser proferida sentenga (Juizo Central Civel e Criminal de Beja) que, em procedéncia parcial da ago, condenou a Ré a pagar ao Autor o montante de €39,872,73 (sendo €25.000,00 a titulo de “danos morais” @, aps abatimento daquilo que o Autor jé recebera a titulo de indemnizago pelo simultaneo acidente de trabalho, €14.872,33 a titulo de “dano biolégico”), acrescendo juros desde a data da decisto. ‘7 Inconformado com o assim decidido, apelou o Autor. Fé-lo com parcial éxito, pois que a Relagio de Evora fixou em €70.000,00 a indemnizagdo devida a titulo de dano no patrimonial, aqui incluido 0 dano biolégico. Mais foi decidido que nao havia que deduzir & indemnizagZo 0 montante que 0 Autor jé recebera a titulo de reparagio do dano em sede de acidente de trabalho, + E agora a vez da Ré, insatisfeita com este desfecho decisério, pedir revista. Autor contra-alegou, concluindo pela improcedéncia do recurso. Mais interp6s recurso subordinado. So as seguintes as conclusdes que a Ré extrai da respetiva alegacdo: 1. 0 Acbrdao recorrido nao deduziu a verbs de 20.127,27 € que o Recorrido ja recebera a titulo de indemnizago por acidente de trabalho, acabando por cumular ambas as indemnizagées, ou seja por acidente de viagao e a laboral atrés referida. 2. Ainda que defendendo a no cumulacao das indemnizagdes por acidente de trabalho € de viagio, 0 acérdéo recorrido acaba por fazé-lo quando refere - « Contudo, caso se verifique alguma parte da indemnizaglo que se encontre cumulada ~ 0 que, como se disse, se néo vislumbra =, esté a entidade patronal ou a seguradora do acidente de trabalho, investida no direto de regresso contra o recorrente/lesado, nos termos gerais » e arranjar uma pseudo solugdo que defende ser semnelhante ~ mas no é - & prosseguida no acérdao nele citado do S.T.J, de 2/6/2015, Ana Paula Boularot, Proc? 464/1 1.7TBVLN.G1S1; 3. Na verdade, no caso deste citado Aresto trata-se de indemnizagio acordada onde nao se distinguiu entre indemnizagdes por danos morais e por danos patrimoniais e, no caso sub judice, 0 Tribunal a elaborar decisto onde ja prevé @ eventual necessidade de voltar aos Tribunais para ‘compor uma ma solugio; O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTICA 4, Néo se recorre ao Tribunal para ser 0 préprio Julgador a formular solugdes para as Partes ali voltatem, com toda a probabilidade; 5. A fungdo é garantir a defesa dos dieitos e dos interesses dos cidadéos, protegidos por Jei, reprimir a violagdo da legalidade democrética e dirimir os conflitos de interesses piblicos e privados, cf art® 202° da Constituicdo da Repiblica; 6. No caso presente esti provado que: 36. Por sentenca do Juizo de Trabatho de Beja, no dmbito do processo 1549/16 9TSBIA, ao autor foi atribuida wma indemnizacdo por acidente de trabalho que apds os cdleulos de remigdio foi definida em 13.755,14 Euros e 6,372,13 Euros, isto é um capital de 20,127,27 Euros; 37. Foi ainda atribuida ao autor a quantia de € 7.594,94 a titulo de indemnizagdo por ‘ineapacidade temporéria para o trabalho. 7. Ora, salvo devido respeito, a decisio em causa peca por contraditéria nos seus fundamentos e conclusto, o que acarreta a sua nulidade nessa parte, of alinea c) do art® 615° n° 1 doCPC. 8. Nao € preciso destringar entre morais e pattimoniais, pois ja se encontra provada tal 0, 9. De resto, é 0 préprio Acérdo que, para valorar os danos nao pattimoni ‘confunde-os com o dano biolégico, invocando a ineapacidade para o trabalho e o défice funcional temporério e total e parcial, operando assim claramente a duplicapao, j& que estas realidades haviam sido objeto de indemnizagéo por via laboral (20.127,27€), por decisdo transitada em julgado operada na jurisdigdo competente; 10, Embora merecedora da tutela do direito e indemnizével, a perda de capacidade de ‘ganho decorrente do défice funcional permanente da integridade fisico-psiquica de 8 pontos e o de 6 pontos relativa a perturbagbes persistentes do humor com ligeira repercussio na autonomia pessoal, social ¢ profissional, ndo se situam dentro das incapacidades significatives ou de monta, ‘que a doutrina médico-legal situa nas incapacidades a partir dos 30 @ 35%; 11, © dano biolégico sé poderd ser objeto de indemnizacéo auténoma, quando se verifique que as consequéncias da lesio, para além de determinantes de uma IPP ow ITP ressarcivel ao nivel da perda de capacidade (total ou parcial de ganho), revestem autonomia pela sua gravidade por forma a constituir (igualmente) uma lestio biolégica irreversivel e, consequentemente, determinante de progressiva deterioragao do estado de saiide do lesado, o que no é 0 caso sub judice; a SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTICA 12. Com um dano estético de 1/7e um quantum doloris de 4/7correspondente a0 sofrimento fisico eo mal estar do ofendido provocades pelas lesdes derivadas do acidente de que foi vitima, nomeadamente durante 0 periodo de incapacidade temporéria, 13, Assim decidindo, 0 Acérdao recorrido infringe, salvo melhor opinitio, 0 disposto no art? 17° da Lei 98/2009, de 4 de Setembro que aprovou 0 novo regime juridico dos acidentes de trabalho ¢ das doengas profissionai 14. E 0 tipo de lesdes, da zona em que ocorreram, do tempo que levaram a curar € que uraram, deve ser mantido 0 quantum indemnizatério por danos morais em € 25.000,00, 0 que é equilibrado face & fungao desempenhada pela indemnizacdo ¢ & orientagdo jurisprudencial em ‘casos semelhantes. 15, Este valor atribuldo permite ao A. Recorrido contrapor as dores e sofrimentos ou, pelo menos, é apto @ minorar de modo significativo os danos delas provenientes. 16, Portanto, dentro da equidade, deveré manter-se a verba atribufda na sentenga recorrida de I* Instancia, para 0 A. poder distrair-se e esquecer a dor que suportou. 17. O acérdao recorrido violou, entre outros o disposto nos n.°s 1 € 4 do artigo 496.° do Cédigo Civil, no artigo 494.° no n.° 5 do art. $60.° do Cédigo Civil, bem como nao recorreu & equidade, nos termos do n.°6 do art.° $60.%do mesmo diploma; 18. O Acérdio recorrido atribuiu o valor global de 97.722,21 €, sendo 70,000,00 € para danos morais € biolégico, mio deduzindo os valores ja recebidos 20.127,27€ ¢ 7.594,94€, por osto no art’, 17 da citada Lei 98/2009, de 4 acidente de trabalho, © que viola, entre outros, o dis de Setembro que aprovou o novo regime juridico dos acidentes de trabalho e das doengas profissionais; 19. A sentenga recorrida de 1° Instincia deve ser integralmente mantida, por nao violar qualquer preceito legal Termina dizendo que deve ser revogado 0 acérdéo recorrido e repristinada a sentenga da 1* instancia + Sfio as seguintes as conclusbes que o Autor extrai da alegago do seu recurso subordinado: i, Em caso de acidente de viagdo ¢ de trabalho, as respetivas indemnizagSes néo sto cumuléveis, mas antes complementares, assumindo a responsabilidade infortunistica laboral cardcter subsidiério, O SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTICA ji, Na condenagiio da seguradora no pagamento da indemnizagao devida pot acidente de viagio ndo se deve deduzir a indemnizaggo devida por acidente de trabalho jé paga 2o sinistrado em processo de acidente de trabalho. (Resumo do acérdio do STI de 11 de Julho de 2019, 6* Secgao processo 1456/15.2T8FNC.LLS1) iii, Importa, pois, revogar parcialmente a deliberago recorrida € concluir que o autor/sinistrado, aqui recorrente, tem direito a uma indemnizagéo por danos_patrimoniais destinada a compensar a perda da sua capacidade geral de ganho calculada nos termos do direito civil & qual néio se deduzird a indemnizagao j6 arbitrada em processo de acidente de trabalho. iv, Procedem-se as operagtes de liquidagao e quantificagio do dano, 0 autor/recorrente pretende a revogagdo parcial do douto acérdéo recorrido e que o Venerando Supremo Tribunal de Justiga condene @ companhia ré/recorrida no pagamento de uma indemnizagio pelo dano patrimonial resultante da incapacidade genérica parcial permanente (posterior & consolidacko meédico-legal), indemnizagao que foi totalmente negada nas instancias e a aditar & condenagao ja constante do ac6rdio recorrido, aumentando-se deste modo a indemnizagto ja arbitrada: ¥. Pretende, assim, 0 autor/recorrente face & seguinte matéria dada por provada nas instancias: a) A data da consolidagao médico legal das suas lesdes & 7 de Fevereiro de 2017 (facto provado 13); ») A sua ineapacidade permanente corresponde a 14%, 0 somatério de 8 + 6 pontos (factos provados 19 e 28); ©) O seu rendimento no ano do acidente foi de 29.552,76Euros + 3.513,48Euros = 33.066,24 Euros (facto provado 32) e no ano seguinte 19.862,65 Euros + 1.466,78 Euros (facto provado 33), rendimentos de trabalho dependente e independente; @) A esperanga de vida do autor/recorrente ¢ 44 anos, isto é até aos 79 anos de idade lactos provados 34 e 35); ©) Rendimento médio do capital nos préximos 44 anos serd de 1%; inflagao esperada nos préximos 44 anos serd de 2% (presungio de facto segundo critério de normalidade e de experiéncia); ¢ realizados 0s célculos, que 0 Supremo Tribunal de Justiga condene a ré/recorrida num valor compreendido num méximo de 492.929,00 Euros e num minimo de 194.423,00 Euros, segundo jutzos de legalidade e de equidade, vi. Assim e face 2o princfpio do pedido, aponta-se o valor de 257.677,73 Euros como a condenagao possivel em sede de danos patrimoniais SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTICA vii. O valor constante no pedido 327.677,73 Euros (que correspondera ao somatério de todas as indemnizagdes formuladas) mostra-se inteiramente razodvel face & subsungéo © aos critérios hermenéuticos juridieos anunciados do corpo destas alegagdes. viii. Valor de 327.677,73 Euros no qual deverd a companhia ré/tecorrida ser condenada, acrescidos de juros contados & taxa legal desde a data da sentenga. ix. Julgando de outro modo em sede de ressarcimento de danos patrimoniais o Tribunal “a quo” ver uma errada aplicagao ¢ interpretagdo das regras que resultam, entre outros, dos Artigo 17 da Lei n.? 98/2009, de 4 de Setembro e Artigos 483 e segts, 493, 495, 496, 562 ¢ segts. 563, 564 todos do Cédigo Civil e ainda as demais normas de direito que o Venerando Supremo Tribunal de Justiga queira aplicar suprindo as insuficiéncias do recorrente. Termina dizendo que deverd ser 0 acérdio recortido parcialmente revogado O substituido por acérdéo que julgue procedente ¢ provada a ago © condene a companhia rW/recorrida no pedido: no pagamento ao autor/recorrente de 327.677,73 Euros ¢ juros de mora contados desde a data da sentenga recorrida, + 11 - AMBITO DO RECURSO Importa ter presentes as seguintes coordenadas: = O teor das conclusdes define 0 ambito do conhecimento do tribunal ad guem, sem prejuizo para as questées de oficioso conhecimento, posto que ainda ndo decididas; ~ Ha que conhecer de questdes, e ndo das razées ou argumentos que as questdes subjazam; = Os recursos niio visam criar decisées sobre matéria nova, sendo o seu émbito delimitado O pelo conterido do ato recorrido. So quest6es a conhecer: Recurso da Ré: - Se o acérdaio recorrido padece de nulidade; ~ Se 0 montante da indemnizagao que foi fixada ¢ excessivo; ~ Se ha que deduzir & indermnizagao o valor do capital de remigao recebido pelo Autor. Recurso subordinado do Autor: oO Oo SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIGA - Se o montante da indemnizagio que foi fixado ¢ insuficiente. + Ill - FUNDAMENTACAO De facto Estiio provados os factos seguintes: 1. No dia 20 de setembro de 2015, pelas 11 horas e 25 minutos, na Estrada Municipal 1088, ao seu KM “O", junto a Monte Viegas, freguesia de Alcaria Ruiva, concelho de Mértola, ‘ocorreu um acidente de viagtio no qual foram intervenientes as seguintes duas viaturas: + Viatura lig de mercadorias, matricula 15-08-PZ, conduzida por Joaquim Manuel dos Santos Izidoro; - Viatura lige de mercadorias, mat ula 60-MN-67, conduzida pelo autor Catlos Filipe Banza Martins. 2. A primeira viatura estava segura na companhia de seguros ré Allianz Portugal, SA ea segunda viatura estava segura na companhia de seguros Agoreana Seguros, SA; 3. 0 A, tripulava 0 60-MN-67 na execugio de ordens recebidas pela Tractomoz - Tractores e Maquinas Agricolas de Estremoz S.A., sua entidade patronel e proprietéria do mesmo; 4. A viatura conduzida pelo autor seguia pela sua mAo, na faixa direita atendendo ao seu sentido de marcha, quando a vietura PZ, saiu da sua faixa de rodagem, invadiu a faixa de rodagem contréria e 0 embateu de frente; i 5. O-embate das duas viaturas ocorreu ma faixa de rodagem da viatura do autor; 6. Na altura estava bom tempo, 0 piso encontrava-se alcatroado em bom estado de conservagio; 7. Apés 0 acidente 0 autor foi transportado, com imobilizagdo lateral e cervical, para o hospital de Beja, Hospital Distrital José Joaquim Fernandes, onde foi sendo avaliado clinica imagiologicamente (radiografias do membro superior direito e joelhos), e Ihe foram desinfetadas as lesbes que apresentava e colocado pensos; 8. O autor apés ter efetuado uma ecografia teve alta; 9. Dois dies apds 0 evento recorreu, novamente, ao Servigo de Urgéncia do hospital de Beja, por queixas dlgicas, insénias e pesadelos relacionados com o evento, tendo sido medicado com analgésico Lexotan, 1 comprimido 3 vezes por dis, durante cerca de um més, passando depois a fazer 1 comprimido uma vez ao dia, a noite, acompanhado de Vietan3 em SOS; SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIGA 10. O autor realizou urna artroscopia em 07 de julho de 2016; 11. Manteve queixas élgicas € limitagdes na mobilidade do joctho dircito pelo que realizou nova RMN do joetho direito © em 16 de novembro de 2016, foi novamente submetido a artroscopias 12, Atualmente softe de uma gonalgia direita com limitagdes na mobilidade do joelho ireito, apresenta rigidez do joetho e dor & palpacao; 13. A data da consalidago médico-legal das lesGes & fixével em 07.02.2017; 14. O periodo de défice funcional temporério total éfixdvel em 238 dias; 15. 0 perlodo de défice funcional temporério parcial é fixivel em 98 dias. 16, O periodo de repercusstio tempordria na atividade profissional total é fixavel em 238 dias; 17. O periodo de repercussto temporaria na atividade profissional parcial é fixAvel em 98 dias; 18. O quantwn doloris &fixavel no grau 4/7; 19. 0 défice funcional permanente da intepridade fisico-psiquica € fixavel em 8 pontos; 20. Em termos de repercussio permanente na atividade profissional as sequelas sto compativeis com 0 exercicio da atividade profissional habitual, mas implicam esforgos suplementares; 21. Apresenta um dano estético permanente fixavel no grau 1/75 22. A repercusséo permanente nas ati idades desportivas e de lazer € fixével no grau 3/7; 23. Necessita de tratamentos médicos regulares; 24, Antes do acidente 0 Autor era saucével; 25. Praticava virios tipos de atividades no profissionais, nomeadamente equitagdo ¢ desportos ao ar livres 26. O autor era uma pessoa alegre ¢ comunicativa; 27. Apés o acidente passou a isolar-se ¢ a distanciar-se da familia, amigos, coleges de trabalho e clientes; 28. Atualmente apresenta perturbagSes persistentes do humor com ligeira repercussdo na ‘autonomia pessoal, social e profissional, com atribuigdo de 6 pontos; 29, Apresenta perturbagdes do sono. 30. Na altura do acidente, o autor tinha a categoria profissional de trabalhador por conta de terceiro e era técnico de vendas, recebendo a sua remuneracdo a titulo de trabalho dependents € \dependente; SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTICA 31. Em 2014 0 autor auferiu como rendimentos de trabalho dependente 15.873,56 Euros € como rendimentos de trabalho independente 22.769,53 Euros; 32. O autor auferiu em 2015 como rendimentos de trabalho dependente 29.552,76 Euros ¢ ‘como rendimentos de trabalho independente 3.513,48 Euros; 33. O autor auferiu em 2016 como rendimentos de trabalho dependente 19.862,65 Euros ¢ ‘como rendimentos de trabalho independente 1.466,78 Euros; 34. O autor no momento do acidente tinha 44 anos de idade; 35. E previsivel que o autor viva até perto dos 79 anos de idade; 36. Por sentenga do Juizo de Trabalho de Beja, no ambito do processo 1549/16.9TSBIA, 20 autor foi atribuida uma indemnizagao por acidente de trabalho que apés os eAleulos de remigao foi definida em 13.755,14 Euros ¢ 6.372,13 Euros, isto é um capital de 20.127,27 Euros; 37. Fol ainda at fda ao autor a quantia de € 7.594,94 a titulo de indemnizagao por incapacidade temporéria para o trabalho. Foi considerado nao provado que: ‘A) O Autor invadiu parte da metade direita da faixa por onde seguia 0 ve lo segurado aR; B) O autor foi sempre acompanhado pelo médico da companhia de seguros “Agoreana”, no Centro Clinico de Beja (Dr. Gaspar Cano), com inicio em 23 de Setembro de 2015, tendo estado cerca de um més com incapacidade absoluta, periodo apés 0 qual teve alta; ©) O autor tentou retomar a atividade profissional, chegando a exercer fungées profissionais durante cerca de 3 ou 4 meses, apés o que apresentou de novo queixas, nomeadamente de dificuldade de exercer qualquer fungo profissional e pessoal, de conduzir, de andar no campo, de manter concentragiio ¢ vestirse, de calgar-se e de higiene pessoal, ¢ por isso se viu na necessidade de suspender qualquer tipo de atividade; D) Por queixas dlgicas em ambos os joelhos (com mais incidéncia no direito), foi solicitada ecografia pela médica assistente de Medicina Geral e Familiar; E) Apés rececdo de relatério de ressondncia magnética (RMN) ao joetho direito 0 autor foi encaminhado para a clinica GIGA; F) O autor foi avaliado nessa Clinica em margo/abril 2016, pelo Dr. Beja da Costa, que solicitou nova RMN, que fez no SAMS; G) O autor foi internado no dia da cirurgia de manha, tendo tido alta no dia seguinte ao almogo, locomovendo-se com dues muletas eanadianas, com indicagao para descarga; SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTICA H) O autor fez descarga durante dois meses, sendo reavaliado quinzenalmente na clinica GIGa; 1) O autor iniciou tratamentos de reabilitago no Centro Clinico de Fisioterapia, em Beja, em 12 de junho de 2016 tendo sido transferido para o centro Clinico de Fisioterapia em Santiago do Cacém; J) © autor retomou os tratamentos de reabilitagio no Centro Clinico de Fisioterapia em Santiago do Cacém, ao final de uma semana, que realizou até janeiro de 2017; K) © autor iniciou quadro de acufenos, tendo sido avaliado por médico otorrinolaringologista privacio em Coimbra ¢ passou a utilizar um aparelho auditivo em cada um dos ouvidos; L) O Autor nao apresenta antecedentes familiares patolégicos. Dedireito Reeurso principal ‘Quanto a questo da nulidade do acérdZo recortido Sustenta a Recorrente, citando (na conelusio 7.*) a alinea c) do n.° 1 do art. 615.° do CPCivil, que o acérdio recorrido enferma de nulidade por contradigio entre os fundamentos e a decisio. Isto (¢ se bem se entende) porque o acérdio recorrido defende a nfio acumulagio das \demnizages por acidente de trabalho e de viagtio mas depois acaba por decidir que nfo hd lugar ao abatimento do montante da indemnizago (capital de remigio) que foi atribuida ao Autor em sede de processo que correu pelo tribunal do trabalho, Mas é por demais 6bvio que a anunciada nulidade ndo ocorre. ‘Como tem sido reiteradamente afirmado na doutrina e na jurisprudéncia, nfo ha que confundir entre nulidades de decisio e erros de julgamento (seja em matéria substantiva, seja em matéria processual). As primeiras (errores in procedendo) so vicios de formagio ou atividade (referentes & autenticidade, a inteligibilidade, a estrutura ou aos limites da decistio, isto é, trata-se de vicios que afetam a regularidade da decisdo ou do silogismo judiciério) da pega processual que é a decisio, nada tendo a ver com erros de julgamento (errores in iudicando), seja em matéria de facto seja em matéria de direito. As 10 a SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTICA nulidades ditam a anulagdo da decisio por ser formalmente irregular, as ilegalidades ditam a revogagiio da decisto por ser destituida de mérito juridico (ilegal).. Ora, se € certo que o acérdio recorrido (pp. 21 ¢ 22) defende que as indemnizagdes pelo simultineo acidente de viaglo e de trabalho nfo sio cumuliveis, menos certo no & que também entende que nfo estamos aqui perante uma situagao de reparagdo do mesmo dano, além de que, a haver cumulago, é em sede de direito de regresso da seguradora laboral contra o lesado que a cumulago deve ser neutralizada. E foi por estas razies que decidiu néo deduzir & indemnizagao que arbitrou aquilo (capital de remigo) que o Autor receben em sede de acidente de trabalho. Portanto, a questo s6 poderia ser de error in iudicando (erro de decistio), assunto que nada tem a ver com a tematica das nulidades de decisdo (error in procedendo).. © que significa que improcede imediatamente a arguiglio da nulidade do acérdio recorrido. juanto a questo da valoracio do dano softido pelo Autor ‘A Recorrente sustenta que deve ser revogado o acérdio recorrido ai onde este teve por efeito elevar 0 quantum indemnizatério do dano do Autor, devendo ser repristinada a valorago do dano operada pela sentenca da I* instncia, Mas nao se Ihe pode dar razio Justificando: A sentenga da 1* insténcia valorou em €60.000,00 0 dano adveniente ao Autor, sendo €25.000,00 a titulo de “danos morais” € €35,000,00 a titulo do chamado “dano biol6gico” © acérdao recorrido, conquanto faga alusio também ao dano bioldgico, procedeu a uma avaliago global (em bloco) do dano, considerando-o todo ele de natureza niio patrimonial, concluindo por uma indemnizagao de €70,000,00 (quantia onde fez incluir expressamente o dano biolégico). Da factualidade provada decorre que o Autor, para além de ter experienciado 0 facto do acidente (o que constitui em si mesmo um dano), viu ofendida a sua integridade 1 SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTICA fisica © psiquica (dano biolégico'), tendo de suportar deslocagio (com imobilizagio lateral e cervical) para o hospital, foi submetido a tratamentos médicos e a exames médicos, foi submetido a artroscopia ao joelho, sofreu dores (grau 4 numa escala de 7 raus), sofreu défice funcional temporario total de 238 dias e défice funcional tempordtio parcial de 98 dias, ficou a padecer de limitagdes funcionais permanentes (grau 3 numa escala de 7 graus) nas atividades desportivas ¢ de lazer, ficou afetado de dano estético permanente (grau 1 numa escala de sete graus), ficou a padecer de perturbagées do sono, passou a isolar-se ¢ a distanciar-se da familia, amigos, colegas de trabalho e clientes. ‘Alguns destes danos projetam-se para 0 futuro. Tais danos assumem a natureza de danos nao patrimoniais, Estando-se perante danos no patrimoniais, regem pata 0 caso os art.s 496.°, n.° 3 ¢ 494° do CCivil. A indemnizagéo do dano néo patrimonial nao visa, nem pode visar, pagar 0 que quer que seja ou reconstituir a situagao anterior, sendo (e para além de punir, pelos meios préprios do direito civil, 0 causador do dano) conferir ao lesado uma compensago que Ihe dé algum conforto ou seguranga, ou The proporcione a possibilidade de adquirir meios que tornem a sua vida um pouco mais gratificante. Trata-se, numa palavra, de conferir a0 Tesado a possibilidade de acesso a vantagens materiais ou imateriais que, de alguma forma, Ihe possam proporcionar uma qualquer autogratificago ou satisfagao capaz de iludir 0 dano softido. De outro lado, a apreciago da gravidade do dano, embora tenha de assentar no circunstancialismo concreto envolvente, deve operat sob um critério objetivo, num 4 Por dano biolégico deve entender-se o dano decorrente da ofensa a integridade fisica e psiquica independentemente de dele resultar ou nfo perda da capacidade de ganho, Pelo menos é assim que o art. 32, alinea 6) da Portaria n° 37/2008 0 encata. Nio se trata, segundo pensamos, de um dano auténomo (no sentido de constituir um ¢ertium genus relativamente a dano patrimonial ¢ néo patrimonial), mas sim de tum alargamento da compreensto do Ambito do prejuizo (dano real) sofrido pela vitima. Como nos diz Maria da Graga Trigo (Responsabilidade Civil, Temas Especiais, p. 82), “Dispondo o direito portugués de ‘alargados regimes de ressarcibilidade dos danos-consequéncia, quer de natureza patrimonial quer de natureza ndo patrimonial, e afigurando-se-nos que esta dicotomia se mantém apta a abarcar a totalidade dos efeitos de qualquer categoria de dano-evento, a natura com a estrutura tradicional no traria vantagens particulares. Ainda assim, 0 estudo do dano biolégico - que nao a adogio do conceito como dano auténomo ~ reveste-se de potencialidades inegdvels, na medida em que a andlise das componentes ‘que intogram esta categoria tem conduzido ao significativo alargamento da compreensdo do dmbito dos prejuizos efetivamente sofridos pelas vitimas de factas geradores de responsabilidade civil delitual”. 12 Oo SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTICA quadro de excluséo, tanto quanto possivel, da subjetividade inerente a alguma particular sensibilidade humana, Nesta medida, a fixago da indemnizag&o deve orientar-se em harmonia com os padrdes de célculo adotados pela jurisprudéncia mais recente, de modo a salvaguardar as exigéncias da igualdade no tratamento do caso andlogo, uniformizando critérios, Sao de ponderar circunstincias varias, como a natureza e grau das lesbes, as sequelas fisicas e psiquicas, as intervengGes cirtirgicas eventualmente softidas e seu grau de risco inerente, os internamentos e a sua durag4o, 0 quantum doloris, 0 dano estético, 0 periodo de doenga, a situagdo anterior ¢ posterior da vitima em termos de afirmago social, apresentago © autoest a, alegria de viver, a idade, a esperanga de perspetivas para o futuro, Ora, vista a factualidade apurada (com destaque para a culpa do autor da lesfo, para a extensio e gravidade do dano e para a condigao econdmica do lesado) ¢ convocando para 0 caso 0 comparativo jurisprudencial, somos levados a concluir que @ indemnizagio global de €70.000,00 estabelecida no acdrdo recorrido mostra-se justa e adequada a0 caso. Mais propriamente, afigura-se-nos que, no que se refere ao dano nfo patrimonial supra mencionado, € aceitével a indemnizaglio de €25,000,00. Tal indemnizagio apresenta-se, em termos comparativos (comparagio em fungo da gravidade das les6es), razoavelmente compativel com jurisprudéncia corrente deste Supremo, como se retira dos casos a seguir exemplificados (de que se extratam os sumérios dos acbrdios, todos acessiveis em www. sti/jurisprudéncia/sumérios) Acérdio de 22-11-2018, Revista n.° 2236/14.8T8GMR.G1.S2: provado que a lesada, em consequéncia de ter sido atropelada pelo condutor do vefculo causador do acidente com culpa grave ¢ exclusiva deste, sofieu diversas lesSes traumaticas ao nivel do erdnio e dos membros superiores e in I~ Resultando ainda , bem como abalo psiquico, teve de ser submetida a cinco intervenstes cirdrgicas, com sucessivos internamentos e tratamentos, tendo decorrido quase dois anos até & estabilizagio das sequelas, bem como o graui de quantum doloris e de dano estético fixados cada um deles em 5 pontos, numa escala crescente de 1 a 7, deve a indemnizagio por danos nifo patrimoniais ser fixada em € 40.000,00, IV - Tendo outra lesada do mesmo acidente de viaglo sido atropelada quando tinha 15 anos de ‘dade, softido diversas lesBes trauméticas ao nivel dos membros superiores, tendo tido de ser submetida a duas intervenpdes cirdrgicas, com os consequentes internamentos ¢ tratamentos, tendo decorride cerca de seis meses até & estabilizagao das sequelas que determinaram um défice funcional de 1 ponto, bem como 0 13 SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTICA rau de quantum doloris ¢ de dano estético fixados, respetivamente, em 4 2 pontos, numa escala crescente de 1 a7, deve a indemnizagio por danos nfo patrimoniais ser fixada em € 25.000,00.” = Acérdio de 14-03-2019, Revista n.° 9913/15.4T8LSB.LISI: *V - Provando-se, ainda, que, em consequéncia do acidente: (i) 0 autor sofrew dores no momento do embate de que foi vitima sente-se triste por nfo poder acompanhar @ sua companheira ¢ amigos como antes fazia; (ii) sente desgosto por nfo poder mais , posteriormente, aquando das intervengdes cinirgicas a que foi submetido; exercer a profissio de mectinico; (iv) softeu, respectivamente, um quantum doforis e um dano estético permanente fixiveis no grau 4 numa escala crescente de 7 graus de gravidade, mosira-se de acordo com os critérios de avaliagdo ¢os limites previstos na legislagfo e na jurisprudéncis, a fixapdo pela Relagao de uma indemnizago no valor de € 25.000 a titulo de danos néo patrimoniais.” - Acérdio de 06-06-2019, Revista n.° 1209/16.0TSCBR.CI.S1: “IV - Resultando dos actos provados que: (i) a recorrente foi sujeita aintervengbes cirirgicas; (i) softeu dores quantificéveis em 5 numa escala de 7 pontos; ‘um quadro ango-depressivo; revela-se ajustado o montante de € 22.000 fixado pela Relagao (em lugar do ‘valor de € 30,000 achado em 1. instinci) para compensar os danos néo patrimoniais por aquela sofridos.” - Acérdio de 04-07-2019, Revista n.° 633/14.8TBPFR.PI.SI: “Il - Decorrendo dos factos provados que: (i) « autora contava com 18 anos na data do acidente; (ji) cue o mesmo se deu por i) sofreu um dano estético quantificado em 2 pontos; (iv) ¢ ficou a padecer de culpa exclusiva do segurado da ré; (ii) que aquela foi, na sequéncia do sinisto, submetido a cinco eirurgias com fempos prolongados de internamento; (iv) softeu dores quantifiefveis em 6 numa escala de 7 © que permanecerio para o resto da vide, ¢ajustado 0 quantitativo de € 50,000 achado pela Relagéo.” - Acérdao de19-09-2019, Revista n.° 2706/17.6T8BRG.GI.SI: “IV - Resultando dos {actos provados que: (i) o recorrent foi sueito a exames médicos e vérios ciclos de fisioterepia, bem como uma intervengao cing soffeu ddores quantficdveis em 5 numa escala de 7 pontos; (iv) softeu um dano estéico quantificado em 3 numa scala de 7 pontos; (v) a repercussio das sequelas softidas nas atividades desportivas © de lazer & quantifieada em 3 numa escala de 7 pontos; (vi) recorrente softeu um rebate em termos psicotégicos, em }) ficou afetado com um défice funcional permanente de 32 pontos; (i virtude das lestes e sequelas permanentes, designadamente por no poder voltar a exercer a sua profissao habitual e/ow outra no mbito da sua formapio profissional; revela-se ajustado © montante de € 50.000,00 para compensar os danos nao patrimoniais por aquele softidos.” - Acérdio de 17-10-2019, Revista n° 3717/16.4T8STB.EL-SI: “I- Nao é excessive 0 montante de € 32,000,00 a titulo de danos morais do autor que softeu dores de grau 4/7; foi submetido a $ {ntervengGes cirirgicas; softeu tratamentos de fisioterapia durante 1 ano e 6 meses; s6 teve alta médica 1 ‘ano © 10 meses apés 0 permanente de grau 3/7; sofreu uma repercussGo permanente nas atividades desportivas ¢ de lazer que habitualmente praticave fixivel em 5/7; tinha 35 anos & data do acidente.” lente; ficou com cicatrizes e deformidades quantificiveis como dano estético 14 Oo = SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIGA - Acérdtio de 29-10-2019, Revista n.° 7614/15.2T8GMR.GI.S1: “IV - Considerando i) 0s tratamentos de fisioterapia durante (as cinco intervengies cinirgicas a que o autor se submeteu, ccerea de dois anos, (ii) a dor fsica que padeceu (grau 4 numa escala de 1 a 7), (iv) 0 dano estético (grau 3 ‘numa escala de 1 2 7), a afetaco permanente nas atividades desportivas e de lazer (grau 3 numa eseala de 1 2.7), (¥) a limitagéo funcional do membro superior esquerdo em relapdo a alguns movimentos, (vi) @ dor ligeira da anca no méximo da flexto ¢ a0 ficar de eécoras, (vii) a tristeza, a depressio © © desposto, considera-se adequado compensar estes danos nto patrimoniais no montante de € 30,000,00, reduzindo-se, assim, a indemnizagéo fixada pela Relagio.” - Acérdio de 5 de maio de 2020, revista n.° 224/13.0T2AND.P1.S1: “I - Afigura-se Justa © adequada a indemnizagio de €35,000,00 fixada pela Relasfo, ademais também com referéacia implicita a 2013, a titulo de dano no patrimonial dentro do seguinte enquadramento factual nuclear, decomrente de acidente de viagdo: - (i) 0 lesado, que tinha a idade de 37 anos i data do acidente, soften teaumatismo da coluna vertebral, na regido cervical ¢ erlnio-encefilica, com perda (momentdnes) de ‘consciéncia; (i) foi conduzido para o hospital, onde ficou em observagao (tendo, porém, alta no mesme dia); consultas médicas ¢ a TAC erdnio-encefilico e da coluna cervical; (v) foi forgado 2 usar colar cervical ppadeceu de cefaleias, néusess, tonturas ¢ parestesias das mios; (iv) teve que ser submetide @ durante cerca de 6 meses; (vi) apresenta sequelas ao nivel da coluna cervic i) apresenta um quadro hneuropsiquidtrico caracterizado por sintomatologia angodepressiva, humor triste © depressivo, cefaleias, 0s, initabilidade fic, tendéncia de isolamento, labilidade de atenglo, sensagte de tonturas, desequi prejuizos mnésicos € alterag&o do padrao normal do sono; (viii) teve ¢ tem dores, valoradas no grau 4 numa scala de 7 graus de gravidade crescente; (ix) teve de se submeter a vérias consultase exemes médicos, bem como a sessGes de fisioterapia, que lhe causaram dores; (x) ficou a softer de ansiedade na condugo.” Para além do dano nfo patrimonial que acaba de ser considerado, © Autor ficou afetado de um défice funcional permanente da integridade fisico-psiquica de 8 pontos, sequelas que, conquanto sejam compativeis com o exercicio da sua atividade profissional habitual, implicam esforgos suplementares. Mais revelam os factos provados que o Autor ficou a padecer de perturbagdes persistentes do humor com ligeira repercussto (e para além do ambito social e pessoal) no Ambito profissional, o que tudo the causa um défice funcional de 6 pontos. Estamos aqui perante um dano auténomo, com repercussio no ambito profissional e funcional do Autor ~ dano futuro - , que deve ser indemnizado como tal. Questiio é saber se deve ser indemnizado como dano néo patrimonial, se como dano patrimonial, na certeza de que se encontra na jurisprudéncia quer uma quer outra orientagao. 15 SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIGA No acérdao recorrido foi entendido que tal dano deve ser visto como assumindo natureza nfo patrimonial, na medida em que, ainda que implicando esforgos suplementares, as sequelas advindas ao Autor so compativeis com o exercicio da sua atividade profissional habitual. certo que estamos perante umn dano que nao compromete a capacidade aquisitiva do Autor em si mesma (quantidade de rendimento), simplesmente implica que 0 exercicio dessa capacidade se torne mais custoso (quantidade de esforgo). E, em principio, a demanda de um maior esforgo (penosidade) repereute-se diretamente na esfera pessoal do lesado e, a menos que os factos indiquem o contrétio, nfo também na sua esfera patrimonial”, A verdade & que os factos provados revelam que os rendimentos auferidos pelo ‘Autor decresceram significativamente (em cerea de um tergo) no ano seguinte a0 do acidente, 0 que, parece-nos, deve conduzir a encarar 0 dano futuro em questo como de natureza essencialmente patrimonial e reparado como tal (arts. 562.°, 564°, n.°2 © 5662 do Civil), De resto, existe neste Supremo uma corrente jurisprudencial bem estabelecida que tende a ver neste tipo de situagdes a emergéncia de um dano patrimonial. Como caleular o quantum indemnizatério de tal dano? Vamos comegar por ficcionar uma situagio de efetiva perda da capacidade aquisitiva, Dentro do que tem sido uma constante na jurisprudéneia, interessa para o efeito alcangar uma indemnizago que represente um capit I que se extinga ao fim do tempo em que o lesado pudesse angeriar rendimento ¢ seja suscetivel de garantir durante esse tempo as prestagGes periddicas correspondentes a sua perda aquisitiva. Entretanto, ¢ parafraseando aqui o que jé houve oportunidade de se deixar dito no acérdio deste Supremo Tribunal de 8 de janeiro de 2018 (processo n° 275/13.5TBTVR.E1.S1, disponivel em ywww.dgsi.pt), «importa refinar um pouco esta conclusao, de ples (in)eapacidade para aquisigdo de réditos laborais ou profssionais (lato sensu). A primeira é mais ampla, abrangendo a atvidade geral do lesado (que modo a ndo reduzir a (in)eapacidade aquisitiva a uma fica comprometida na sequéncia do atingimento na sua integridade psicossomética), prolongando-se = Pese embora ser pacifico que o disposto na Portaria n.° 377/2008 nto € vinculativo no plano judicial (mas, ‘quando muito, otientador ou referencial), observe-se que a alinea ¢) do respetivo art. 4° qualifica precisamente como dano moral o esforgo acrescido no desempenho da atividade profissional habitual. 16 ) ) SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIGA naturalmente para além da vide ativa aboral ou profissional. E assim, 0 que deve ser objeto de reparago & precisamente @ supresslo (total ou parcial) da normal capacidade aqui ou parcial) da capacidade de obtengio de renimentos de indole laboral ou profissional, Como se aponta no acérdio deste Supremo Tribunal de Justiga de 10 de Outubro de 2012 (processo n® 632/2001.G1.SI, relator Lopes do Rego, disponivel em www.dgsipt), “constiul entendimento jurisprudencial reiterado que a iva, € nfo apenas a supressto (total indemnizagio a arbirar por tais danos patrimoniais fuuras deve correspond a um capital prositor do rendimento de que a vitima ficou privada e que se extinguird no termo do periodo provével da sua vida determinado com base na esperanga média de vida (@ nao apenas em fungiio da duragio da vida profissional activa do lesado, até este atingir a idade normal da reforma, aos 65 anos): (...) as necessidades bésicas do lesado ndo cessam obviamente no dia em que detxar de trabathar por vrtude da reforma, sendo manifesto que seré nesse perfodo temporal da sua vida que as suas limitagées e stuagbes de dependéncia, ligadas ds sequelas permanentes das lesées softidas, com toda a probabilidade mais se acentuardo; além de que, como é evident, as limitagdes as eapacidades labora do lesado nao deixardo deter reflevas negativos na respectiva carreira contribuliva para a seguranga social, repereutindo-se no valor da pensao de reforma a que venha a ter direito.”” Relevante para a aferigéo do prejuizo em questi & sempre, ¢ para além do grau do défice funcional que atinge 0 lesado, a idade deste e © montante pecuniério do seu rendimento, No caso vertente a idade que nos deve servir de referéncia é a de 45 ou 46 anos, a idade que 0 Autor tinha aquando da consolidagdo médico-legal das lesdes (Fevereiro de 2017). A tal data era expectivel que o Autor pudesse angariar pelo seu proprio esforgo 0 inerente rendimento profissional por mais uns 20 anos (altura em que se reformaria), € que, para além do periodo de atividade tipicamente profissional, pudesse obter pelo seu esforgo e por mais algum tempo (vem dado como provado que é previs{vel que o Autor viva até perto dos 79 anos de idade) algum tipo de vantagens com repercussio pattimonial. De outro lado, sabe-se que o Autor auferia do seu trabalho (com reporte ao ano do acidente) um rendimento anual de cerca de €33.000,00. Ora, aqui chegados, usando a metodologia expedita preconizada pelo Exmo. Conselheiro Dr. Sousa Dinis (Coletdnea de Jurisprudéncia - Acérdaos do Supremo Tribunal de Justiga, 2001, tomo I, pp. $ ¢ seguintes), e apelando a uma taxa de juro média de uns 3% (alcangavel em aplicagées financeiras junto do Estado, de nenhum risco) e a0 abatimento, a partida, de 1/3 do valor encontrado (a fim de neutralizar o efeito de enriquecimento indevido que resultaria de circunstincia de se receber no imediato aquilo que s6 se iria 7 SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTICA alcangar ao longo de muitissimos anos), atinge-se, visto o défice funcional permanente da integridade fisico-psiquica de 16 pontos, um valor de cerca de €100.000,00. Este seré um valor meramente indicativo, é uma base de trabalho, Mas é um valor que tem de ser imediatamente objeto de uma radical redugo, na medida em que resulta simplesmente do facto de estarmos a ficcionar uma situagto de efetiva perda da capacidade aquisitiva, quando afinal ndo é essa a real situagdo do Autor (mas muito menos gravosa). Afigura-se adequada uma redugio na ordem dos 50%, de sorte que chegamos a um valor de cerea de €50,000,00. ‘A partir daqui hi que fazer intervir a equidade, levando-se em linha de conta todas as circunstincias que possim ter rebate no caso. E assim, importa atender a idade do ‘Autor (que j4 nfo era jovem) ¢ & natureza das fungdes profissionais que exerce (que néo apresentam um grau de exigéncia especial), cireunsténcias que depdem a favor de uma iminuiggo do valor que vem de ser estimado. Deste modo, tudo ponderado, conclui-se que o valor de €45,000,00 se apresenta justo ¢ adequado a reparago do dano futuro que para 0 Autor advém do facto de ter de desenvolver esforgos suplementares em ordem a alcangar os réditos profissionais que aleangaria se acaso niio tivesse softido o acidente, Improcede pois o recurso na parte aqui em apreciagiio, sendo de manter, embora mediante fundamentagio nfo inteiramente coincidente, a indemnizagao de €70.000,00 estabelecida pelo acérdiio recorrido, juanto A ques leducio a indemnizacio do montante dos €20.127.2: recebidos pelo Autor a titulo de capital de remigio Pretende a Recorrente que, diferentemente do que fez 0 acérdio recorrido, importaria deduzir & indemnizagao devida ao Autor o montante que este recebeu a titulo de capital de remigio no contexto da reparagdo do dano em sede de acidente de trabalho. Afigura-se-nos, porém, que o acérddo recorrido decidiu adequadamente. E certo, disso ninguém duvida, que (como é precisamente 0 caso) quando o acidente reveste simultaneamente @ natureza de acidente de trabalho e de viagdo as indemnizagdes (embora assentes em critérios distintos e com a sua funcionalidade propria) a atribuir ao lesado a cada um desses titulos nfo sto cumuléveis mas 18 CO e- SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIGA complementares até ao ressarcimento total do dano, assumindo a responsabilidade pelo acidente de trabalho cardter subsididrio. De outro modo estarfamos perante um duplo ressarcimento do mesmo dano, com o consequente enriquecimento sem causa do lesado, ‘Trata-se de entendimenta pacifico? A responsabilidade primacial e definitiva é a que incide sobre o responsével civil, quer com fundamento na culpa, quer com base no isco, podendo sempre o devedor da indemnizagao pelo acidente laboral (a entidade patronal ou respetiva seguradora) fazer repercutir aquilo que, a titulo de responsavel objetivo pelo acidente laboral, tenha pago a0 istrado. Estamos aqui perante uma situagio de concurso ou concorréncia de responsabilidades que preenche, no essencial, a figura da solidariedade imprépria ou imperfeita, na medida em que (plano das relagdes externas) 0 lesado pode exigir alternativamente a indemnizagao ou ressarcimento dos danos a qualquer dos responséveis, a tais titulos, optando por aquele de quem pretende obter em primeira linha a indemnizagio; e na medida em que (plano das relagGes intemas) o responsivel provisério (@ entidade patronal ou respetiva seguradora) que tenha sido chamado a indemnizar goza do diteito ao reembolso das quantias que tiver pago, fazendo-as repercutir defini amente, direta ou indiretamente, na pessoa do responsével ci I pelo acidente, No caso vertente podemos aceitar (embora o ponto seja porventura discutivel*) que ao indemnizar © Autor pelo dano (calculado como dano patrimonial) inerente ao défice funcional permanente da integridade fisico-psiqu ros termos sobreditos se esté, no fundo, @ reparar por outra via um dano que, em parte, foi objeto de reparago no contexto do simultaneo acidente de trabalho. Questo ¢ saber qual a forma juridicamente devida de operacionalizar essa nfo cumulagao, assunto sobre que tem divergido a jurisprudéncia. Cremos que as coisas devem ser vistas como foram vistas no acérdio deste Supremo Tribunal de Justiga de 11 de dezembro de 2012 (processo n° 9 Vaz Serra, RLJ ano 111, p. 331: “A soluedo de que as indemmizagdes por acidentes simulianeamente de viagdo e de trabatho se ndo cumulam e apenas se completam até ao ressarcimento total do dano causado 20 lesado é manifestamente exact pois a finalidade da indemnizagdo é reparar o prejulzo causado ao lesado e ndo atribuir a este wm lucro”. Tal principio recebe, ads, respaldo expresso no art. 9.° da supra citada Portaria n° 377/2008, “Em situagdo similar entendew-se no acérddo deste Supremo de 11 de jutho de 2019 (processo 1456/15.2T8FNC.LISI, disponivel em woew,dasi.pt) que se trataria de danos distintos. 19 SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIGA 40/08.1TBMMY.C1.S1, disponivel em www.dgsi.pt), 0 que nos leva a subscrever o entendimento de que a ora Recorrente no pode opor ao Autor a excegao do pagamento coperado no ambito da responsabilidade laboral. O que ¢ dizer, ndo hé que deduzir & indemnizagao arbitrada ao Autor o montante que este recebeu oportunamente a titulo de indemnizagao (capital de remiga0) pelo simultaneo acidente de trabalho. Pode ler-se desse acérdio o seguinte, ¢ passa-se a citar’: “Bm beneffelo desta orientasto, pode, desde logo, invocarse a letva da lei ~ ou se, 0 regime consagrado no art. 31° da Lei 100/97, que efectivamente nfo contempla a faculdade de o responsivel civil ‘por ao lesado(snistrado, como verdadeira excepetio peremptoria, 0 anterior pagamento de indemnizasto labora, reportada previsamente aos mesmos danos que suportam a pretensio indemniztbria formulada na no caso de o lesado

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