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Poemas de Oswald de Andrade

vicio na fala

Para dizerem milho dizem mio


Para melhor dizem mió
Para peor pió
Para telha dizem têia
Para telhado dizem teado
E vão fazendo telhados

o gramático

Os negros discutiam
Que o cavalo sipantou
Mas o que mais sabia
Disse que era
Sipantarrou

o medroso

A assombração apagou a candeia


Depois no escuro veiu com a mão
Pertinho dele
Ver se o coração ainda batia

o capoeira

_ Qué apanhá sordado?


_ O quê?
_ Qué apanhá?
Pernas e cabeças na calçada
relicário

No baile da Corte
Foi o Conde d´Eu quem disse
Pra Dona Benvinda
Que farinha de Suruí
Pinga de Parati
Fumo de Baependi
É comê bebê pitá e caí

o violeiro

Vi a saída da lua
Tive um gosto singulá
Em frente da casa tua
São vortas que o mundo dá

a laçada

O Bento caiu como um toro


No terreiro
E o médico veiu de Chevrolé
Trazendo um prognóstico
E toda a minha infância nos olhos

pronominais

Dê-me um cigarro
Diz a gramática
Do professor e do aluno
E do mulato sabido

Mas o bom negro e bom branco


Da Nação Brasileira
Dizem todos os dias
Deixa disso camarada
Me dá um cigarro
erro de português

Quando o português chegou


Debaixo d´uma bruta chuva
Vestiu o índio
Que pena!
Fosse uma manhã de sol
O índio tinha despido
O português

Fonte: ANDRADE, Oswald. Poesias reunidas. São Paulo: Companhia das Letras,
2017.

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