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Aclinica das psicoses e a teoria do amadurecimento de Winnicott Elsa Oliveira Dias Psicanaisia, mestra em Fiosola pala PUGISP e douiora em Psicologia Girica pala PUGS ‘Quero congratulas-me com os organizadores deste simpésio em sade mental infantil e eumprimentar 08 profissionais da satide aqui presentes pelo importante @ indispensével trabalho que realizam ao tratarem de criangas doentes e ao aprofundarem o estudo e a pesquisa sobre os distirbios psiquicos infantis. O trabalho terapéutico tem um trago que Ihe é, ou deveria ser, inerente e que consiste no fato de que oferecemos os usturios de nossos servigos,além do saber sempre ampliado que buseamos, nada menos que a nossa personalidade. E possivel que, em outros campos, se ossa fazer um trabalho competente de modo mecdnico bwimpessoal. Em nossa area, ou estamos presentes e“al- fgamos" a alma, ou nada acontece. Isso, naturalmente, carreta um tipo especifico de envolvimento e desgaste nao € 4 toa que a OMS tenha considerado o trabalho do terapeuta como a terceira tarefa mais insalubre dontre todas. ‘Quero fazer, de inicio, uma consideracao de ordem mais geral. Creio que ela é importante, sobretudo, para ‘nds que, tendo-nos proposto a euidar de pessoas que fadoeceram, sejam elas eriangas ou adultos, precisamos ter sempre em mente que a tarefa de viver ¢ dificil por simesma. Bssatarefa torna-se, em nossos tempos, ainda mais ardua, devido a um cerio espirito da epoca ~ a racionalidade téeniea ~ que prevalece hoje, em escala planetaria, em todos os ambitos da vida. O espirito da {éeniea esvazia 0 mundo de sua feigdo humana. Essa é uma questao complexa, que vem sendo tema predominante nos varios campos do conhecimento em que o interesse central é a preservagao do que ¢ especificamente humano, mas sobre a qual nao farei ‘mais que essa pequena mengio. Blase reveste da maior gravidade porque diz respeito nao a este ou aquele individuo, mas ao ser humano enquanto tal. Ba propr condiggo humana que est ameagada de desapareeer. © ‘poder controlador da técnica nao tem limites © Imiseui-se em tudo. A racionalidade téeniea fornece alivio imediato para a dor e para o sofrimento e esconhece o valor da angtstia relativa ao proprio fato de estarmos vivos ¢ termos que dar conta da tarefa de viver. Atalhos faceis e luminosos vém sendo produzides para afastar e obscurecer as dificuldades inerentes & Vida, Necessidades intrinsecamente humanas ~ de intimidade ecomunicagto,de deixar-se afetar pelo outro ‘Artis origins pelos acontecimentos, a capacidade de estar s6, de se atristecer e de se alegrar, de um fazer que nao seja mera defesa contra 0 vazio e que tenha sentido para o| individuo que o realiza ~ todas essas necessidades esto ‘em via de desaparecimento, porque solugdes mecanicas, quimicas, téenicas, imediatas, magicas, enfim,se ofere- cem & mao e impedem que o homem se aproxime das experiéncias que o determinam enquanto homem, Esse 6 0 panorama mais amplo em que vivemos ¢ ‘no qual nosso trabalho se insereve. Nao podemos perdé- Inde vista, mas, por outro lado, ni nos devemos deixar ‘ofuscar por ele. Ha de se tratar dos problemas com que nos defrontamos no cotidiano de nossa profissae. embora devamos permitir que essas questdes perma- negam como pano de fundo, orientando nossas reflexoes Winnicott e as psicoses ‘Tendo em vista tema das psicoses na infancia e 0 pano de fundo que acabo de esbogar, nada mais apropriado do que trazer para voces, como contribuic&o para este simpésio, uma breve enunciacao do pen- samento de D.W, Winnicott. Refiro-me, sobretudo, sua teoria do amadurecimento pessoal. Ela foi formulada por ele como o horizonte tesrico necessério para a compreensio e classifieagao dos distirbios psiquicos, em especial das psicoses, e para orientar 0 terapeuta na finalidade eminentemente clinica de fornecer a0 paciente o cuidado que é concernente & sua necessidade specifica. Por que Winnicott? Porque ele nos oferece uma coneepgio verdadeiramente original dos distarbios psiquicas, baseada em uma nova forma de conecber a natureza humana e suas formas de adoecer. Essa originalidade, tanto em relagao a psiquiatria quanto & prépria psicandlise tradicional - representada aqui por Freud Melanie Klein -, deve-se, em parte, ao lugar a partir do qual Winnicott pode amadurecer sua, perspectiva tedrica. Winnicott foi um pediatra que, tendo abragado a psicandlise, jamais abandonou a pratica pediatrica que foi ransformando-se, aos poucos, fem psiquiatria infantil. Sua proximidade com a area médica permitiu-Ihe avaliar os limites de uma ‘abordagem puramente organicista. Por outro lado, Tafunto Ree. Newropeig. da Inf e Adak. Tieuph.je 3 1i, 7280 16 continua observagio de bebés ¢ suas maes forneceu- Ihe uma evidéncia, que foi decisiva em seu desen- volvimento te6rico, de que os bebés, mesmo os fisicamente saudaveis, podiam adoecer logo nos primeiros momentos da vida. Segundo Winnicott, esses istarbios esto relacionados com as dificuldades no estabelecimento da relacao muito peculiar do bebé com ‘a mae nesse periodo mais primitive da vida, Natural- mente, isso colocou em questo a primazia da questo edipiana, tal como vinha sendo difundida pelos psica- nalistas da época. Alem disso, a observacio paralela de bebes psiedticos mostrou-Ihe que 0 amadurecimento emo- cional, nos seus estagios primitivos, refere-se exata ‘mente aos mesmos fendmenos que aparecem no estudo da esquizofrenia adulta e nos estados esquizsides em geral. Essencialmente, essas dificuldades dizem res- peito a constituigao do si-mesmo (se//) como identidade © ao contato com a realidade externa. Nos bebés, elas estao relacionadas a sua extrema imaturidade; nos psibticos, porque se perderam em algum ponte da longa Jornada que leva a maturidade. Desse modo, o estudo pprofundo de um individuo esquiz6ide de qualquer idade transforma-se em um estudo profundo do amadure- cimento inicial desse individuo (1952: PP, 379). ‘A partir dessas constatagies, Winnicott elaborou uma teeria dos distarbios psiquicos, em especial das psicoses, baseada na teoria do amadurecimento pessoal Ele explicitou claramente a necessidade de tal teoria em um texto de 1962, ano decisivo de seu desen- volvimento intelectual, quando afirmou que “preci- ‘samos chegar a uma teoria do amadurecimento normal para podermos ser capazes de compreender as doengas © as vérins imaturidades, uma vez que nao nos damos por satisfeitos, a menos que possamos preveni-las e curd-las” (1962: APM, 65). A teoria do amadurecimento pessoal do individuo Segundo a teoria do amadurecimento pessoal, todo ser humano 6 dotado de uma tendéncia inata ao amadurecimento e & integracio em uma unidade e isso 6 a sua heranga mais importante. O principal da here- ditariedade, diz ele,"6 a tendéncis inerente do individuo a crescer, a se integrar, a ge relacionar com objetos, a amadurecer” (1954-69: APM, 126). Contudo, embora inata, a tendéncia para o amadurecimento nao vai de si como se bastasse a mera passagem do tempo. Trata- se de uma tendéneia, ¢ nao de uma determinagao. A tendéncia ¢ dada, mas os caminhos pelos quais ela se realiza ou os descaminhos pelos quais se perde so inteiramente indeterminados: a tendencia ao ama- Artis originate durecimento pode ou nfo— vir a realizarse. Para que 0 amadurecimento prossiga, 0 bebe depende da presenga de um ambiente facilitador que forneca euldados suficientemente bons. Quanto mais cedo 0 ‘momento que consideramos, tanto maior aimportincia dos cuidados ambientais. No infeio, a dependéneia do bebé om relagio & mae é absoluta’e esta deve poder adaptar-se de forma também absoluta as necessidades do bebé. Trata-se de necessidades de ser. “Os lactente humanos nao podem comegar a ser, exceto sob certas ‘condigdes.” (1960: APM, 43) Nenhum bebé, nenhuma crianga pode tornar-se uma pessoa real, a nfo ser sob os cuidados de um ambiente que dé sustentacao e facilite os processos de amadurecimento; os bebés que ‘nao recebem esse tipo de cuidados suficientemente bons “Ao eonseguem se realizar nem mesmo como bebe. Os genes nao sao suficientes.” (1968: BM, 84). Isso mostra que o amadureeimento, ein Winnicott, nao diz respeito nem ao bioldgico nem ao pulsional ou mental, mas ao que 6 especificamente pessoal: a0 sentimento de ser, de ser real, de existir em um mundo real. Estar e sentir-se vivo no 6 dado pelo fato da concepead ou do nascimento biolégico. Mesmo quando fas estruturas biolégicas © cerebrais esto dadas intaetas, 0 estar vivo pelo nascimento nao 6 ainda 0 estar vive de um ser humano capa7 de ter osentimento de um eu, de estabelecer relagdes sentidas como reais e de habitar em um mundo real. E 0 process de aleangar a vida pode falhar. 114 bebés que, embora fisicamente saudaveis, morrem porque nao encontram. desde o comeco, uma base para ser, para continuarem vivos, sendo, Ha outros que nfo necessariamente ‘morrem: eles sto persuadidos “a alimentar-se ea viver ainda que a base para esse viver seja débil ou mesmo ausente” (1954-79: NH, 127). Desde 0 inicio absoluto,o| problema fundamental do homem consiste em chegar aexistir. Bxistir nao ¢ uma dédiva, mas uma conquista, Essa conquista, onde radica u problematicidade da vida humana, nao é realizada pelos psicéticos, cujos disturbios sao derivados dos estdigios mais precoces da vida, Suas dificuldades e problemas, diz Winnicott,"ndo fazem parte da vida, mas sim da luta para aleangar @ vida...” (1954-70: NH, 100), ‘Uma das maiores contribuighes de Winnicott a0 estudo da natureza humana e & psicandlise é a sua deserigilo minuciosa do que se passa com 0 bebé nos testdgios iniciais do amadurecimento, que se inicia em ‘algum momento apos a concepeao. Nesses estagios, 0 bebé esta em estado de nao-integracdo, nao sabe da existéncia desi mesmo ou do mundo, nao tem objetos ¢ nao habita no corpo. Aos poucos, com a ajuda do ambiente,cle fard conquistas basieas que se constituem em fundamentos da personalidade: a integracao no ‘tempo e no espago,o alojamento da psique no corpo e 9 inicio do contato com os objetos. Paralelamente, 0 si ‘Taftsnto ~ Ree. Neuropeia. da Inf ¢ Adok. Houph Dis 8 ii. 1880 mesmo esta sendo constituide como identidade. Se 0 ambiente falha em fornecer as condigoes facilitadoras para que o amadurecimento siga seu préprio curso, 0 bebé fracassa na realizagao das conquistas iniciais. Quando ha um padrao de falhas ambientais, o bebe sofre um trauma, Nesses casos, ha interrupeao do proceso de amadurecimento pessoal, Uma cisao da per- sonalidade se estabelece e uma organizagio defensiva se arma para evitar o retorno da experiéncia trau- matica. Tudo isso ocorre em um momento em que 0 bebé ainda nao é um eu estruturado, Esse ¢ o caso das psicoses'. O individuo continua a erescer, fisica ¢ intelectualmente, mas a integracdo em um cerne pessoal nao pode ser realizada. Para Winnicott, portanto,os distarbios psfquicos nao sa0 doengas no sentido tradicional do termo, Nao sao ‘entidades nosolégicas que se alojam no individuo, sejam orginieas ou relativas a intensidades pulsionais. Sto distarbios do processos de amadurecimento. A ‘compreensao e a classificaco dos disttirhios nao So feitas com base na sintomatologia. Muitas vezes, uma crianga que nfo apresenta sintomatologia prépria ao seu momento maturacional pode estar adoecendo. Outras vezes, a doenga 6 0 recurso que o individuo necessita para poder deseansar ou recuperar-se de uma sobrecarga. Nesse sentido, cla é menos uma doenga do que um sinal de sade. Pela teoria do amadurecimento, a natureza do disturbio refere-se a origem do mesmo, fou seja, ao ponto, na linha do amadurecimento em que © proceso foi interrompido em funcao de fathas ambientais traumaticas para o bebé. No caso das psicoses, isto ocorreu nos estagios iniciais da vida, ‘quando o bebé ainda nao era um eu que podia defender- seda falha ambiental sem aniquilar-se. A clinica das psicoses No caso das psicases, se quisermos chegar & raiz do problema, a regressao a dependéncia faz-se necessaria © € por isso que o prototipo do analista na clinica \winnicottiana das psicoses 6 mie sulicientemente boa Nesse sentido, a clinica infantil torna-se parecida com ‘clinica dos adultos porque estaremos cuidando sempre do bebé que existe na crianga maior ou noadulto, Bssas pessoas tiveram seu amadurecimento paralisado em algum momento inicial e precisam viver, talvez pela i primeira vez em suas vidas, experidneias coneretas de ser, com 0 ambiente agora tendo éxito em vex de fracassar no atendimento as necessidades. Elas precisam chegar, nas condighes especializadas do setting analitico, ao trauma original, & agonia impensavel que nelas habita e que nao foi experimentada no momento ‘em que ocorreu em virtude da extrema imaturidade do individuo, Esse impulso de reviver a “loucura original”, diz. Winnicott, “faz parte da tendéncia dos individuos para a satide e a integraao. Se nds, como terapeutas, lidamos com a situagao com urgéncia de “eurar”, a finalidade do colapso perde-se por completo ja que, a0 enlouquecer, o paciente persegue uma finalidade positiva e seu colapso nao é tanto uma doenga senio ‘um primeiro passo em direcio a satide."(1965: ExI, 233). Para tanto, precisamos estar disponiveis para que individuo tenha tempo e protecao suficientes para experimentar ser do modo que é e pode ser, seja qual for a possibilidade de ser que se apresente em um dado momento da relacdo terapéutica, Precisamos estar preparados para reconhever qual é a possibilidade de ser do momento ¢ acompanhé-lo enquanto perdurar essa possibilidade, por mais restrita que seja. Como para Winnicott, “é apenas da nao-existéncia que a existéncia pode comecar”, deixar ser significa dar sustentagao a longos periodos de tempo em que o individuo, regredindo a dependéncia, permite-se aban- donar o esforco de existir e entregar-se a estados muito primitivos, de amorfia, de desorganizagao, de nao- existéncia, ‘Temos, também, que saber reconhecer ¢ deixar ser © paciente quando a possibilidade se altera e traz consigo novas necessidades ou exigencias. Ou, ainda, deixar aberto o caminho de retorno a uma regressio. A ‘medida que amadurece, o paciente precisa de nés como abjetos subjetivos, isto é, nao destacados de si mesmo, ‘Mais tarde, usaré o setting para comecar a exercitar sua criatividade, a brincar. Depois comecara a nos destruir, sem nenhuma raiva, apenas porque precisa saber se sobrevivemos a sua destruigao, Podera, entio, comecar a nos conhecer e, talvez, a nos amar, por termos Ihe permitido ser. 86 entao, comecara a entender que seu sentimento 6 ambivalente. ‘Tudo isso s6 ¢ possivel se pudermos criar e manter ‘um lugar protegido, um mundo onde o paciente, quando for o tempo, possa comegar a ser. Esse lugar consiste na totalidade dos euidados que fornecemos, incluindo o ‘Wc os cere a ow & Graben aro Ta peo pra Hae apa apacca qu ae USC CMG, ua wee Wve © sn ro ftw eras danse vago comprare poo abana, 2 lngo Go erga dees atop 8 or ear reacorago com a psa de arhaeaes ‘Rnotylcas coma stemnolona peurcr Pacrnens ae, saps pase sraseta tes cuades De cero modo, au rider le ipliaco pus ecea para momar et us manos gstaram ue oa ese aberaorada Supe, conto. que ess lo a poss se enpceanao seer enaaefaecssan anocioa ave nao cts noice nce ros rauroea gu doproseso neuen. St gun ah paguta oemo pase ado Dare aceevrvars chon gust beso sca Eee outa ote da cortusto hse anki como ge Pode ca vetando ut pala eve(APM, 120) Artin originate “Infunto Rea Newropelg. da Taf « Adol Wouph ih: 8 1 1989 setting analitico em todos os seus aspectos,a pessoa do analista, a pontualidade e os objetos. Quem trabalha com criangas sabe de quanto temos que cuidar dos objetos que elas constroem ou com os quais brineam. “Um paciente contou-me um sonho no qual ele carregava, um bebe nos bragos. O bebé tinha uma cabeca muito grande, mas era raquitico, sem vitalidade e extrema- monte fragil c ora dificil Soguré-lo. Perguntei-Ihe de que o bebé precisava, Ele disse:“De um lugar para viver © poder crescer”.A caracteristiea central desse mundo € a confiabilidade, Temos que sustentar um grau de confiabilidade de que, certamente, nio somos eapazes em nossa vida privada. Por essa confiabilidade, protegemos nosso paciente de qualquer tipo de Imprevisibilidade Se fornecemos esse lugar, o paciente poder, talvez pela primeira ver, estar em um mundo caja base 6 a familiaridade. A participacao da hereditariedade organica A psiquiatria classica, como um ramo da medicina, interpreta os distirbios como sintomas de processos patologieos do organismo que estao relacionados ou tima disfuneio orginiea adquirida ow & transmisse0 hereditarin. A doenga acomete o individu, esta no individuo, mas nada tem a ver com o individuo como pessoa. Seja como eiéneia da somatoyénese do psiquico Seia como ciéncia da psicogénese do priquico 0 fato é que a psiquiatria observa e trata de entidades hosologieas sem vinculagao com o fato de o individuo hhumano ter que se haver, desde o inicio, com o mundo, ‘om o outro ¢ com sua propria exstencia, ‘Winnicott nao nega, obviamente, a existencia de distarbios de earater organico nem 0 fato de haver tondéncias hereditérias predispondo patologias. Mas no Gaese tipo dedistbio que ele dedieaoseuesforgo teorico e clinic, Se 0 cérebro, enquanto ente natural Clue, esta daniicado, tara do profisional da sadde Teconiecer ofenémeno eencaminhar aim tratamento concernente a essa dimensio. Mas os distirbios peicoldgicos secundérios que decorrem das lesbes bnginieas devem ser considerados distirbios de base somatica oe devem ser distinguidos dos disturbios ‘otquicos, nome que Winnicott reserva aos distarbios {que sao relatives & pessoa do doente em sua luta pelo madurecimento, E claro que, aos distirbios psico- Togas de base somatiea,podom ainda estar agregadas, cena maioria das vezesestao, as dficuldades relativas ‘0 processo de amadurecimento, 0 problema é que, na matoria dos casos em que a sintomataloga éfacilmente atribuida adanos nocérebro,naoha lost, oindividuo padece de problemas relativos a fato de tr ido o seu fmadureeimento interrompido por falhas ambientais Artigos originals ~ ‘em um perfodo muito primitive. Mas, mesmo no caso dda paralisia geral progressiva, por exemplo, que é uma ‘enfermidade causada par uma perturbacio orgénica do eérebro, é possivel achar, na psicologia do paciente, “uma enfermidade que pertence especificamente a ele ao seu cardter e personalidade e cujos detalhes derivam de sua hist6ria primitiva” (1965: ExI, 152). ‘A questio relativa & fungio intelectual 6 um bom. ‘exemplo de como incluir a hereditariedade organica na consideracao do disturbio sem atribuir-Ihe sentido cetiol6gico: quando a capacidade intelectual é restrita, devido a um tecido cerebral geneticamente mal dotado, fica diminuida a capacidade que,em geral,o bebé tem de converter uma adaptacao ambiental insatisfatoria em uma adaptacao ambiental suficientemente boa, Disso resulta que algumas psicoses so mais comuns em deficientes mentais que na populagao normal. Um tecido cerebral excepcionalmente hem dotado pode capacitar um bebé a lidar com um sério fracasso na adaptacao a necessidade, mas, nesse caso, diz ‘Winnicott, “também pode ocorrer uma prostituigio da atividade mental, encontrando-se clinicamente uma hipertrofia dos processos intelectuais relacionada a ‘um colapso esquizofrénieo potencial” (1952:PP, 383), A possibilidade de deficit existe tanto no easo de um tecido cerebral mal dotado (mas este sera um caso de deficiéneia orginica) como em um excepeionalmente dotado, O que pesa sa0.08 cuidados adaptativos da mae, porque, mesmo quando a capacidade cerebral do individuo 6 restrita (Q.1. 80, por exemplo),se existirem ‘as condigdes especiais do ambiente facilitador, 0 individuo pode apresentar um amadurecimento -mocional saudavel ¢ tornar-se até mesmo uma pessoa interessante e de valor, “com um bom carater & merecedora de confianca, capaz inclusive de tornar- ‘se um bom cnjuge e de criar bem 0s seus filhos” (1954- 70: NH, 31). Por outro lado, uma erianga com ‘excepcionais dotes cerebrais (QI. 140, por exomplo) ¢ talentosa, se 0 seu amadurecimento foi seriamente perturbado devido a um ambiente nao facilitador, pode tornar-se extremamente doente, sujeita a crises psicétieas, apresentando um carater indigno de confianga ¢ com poueas chances de vir um dia a cuidar de si mesma. Muitas vezes, diz Winnicott, em vez de poder usar sua inteligéncia, “elas eaem em estado de confusao irremediavel ou, ainda, apresentam di ficuldades que acabam sendo diagnosticadas como deficiéneia mental” (1949: PP, 420). 0 potencial herdado ¢ diferente nos dois casos, mas nao é isso que determina a pessoa que o individuo sera. 0 fato € que, para Winnicott, 0 distarbio psiquico nao é uma entidade nosoldgiea, constitucional ou adquirida, localizada dentro do individuo, mas um disturbio do amadurecimento relativo a dificuldade de existir e continuar existindo. A psicose, diz Winnivolt, “nao ¢ uma doenga, Para aqueles que estao mais interessados em doengas que em pessoas ~ doenas da ‘mente, eles as chamariam—a vida 6 relativamente fil ‘Mas, para aqueles entre nés que tendem a conceber os pacientes psiquiatricos néo como doentes, mas como pessoas que sto vitimas da batalha humana pelo desenvolvimento para a adaptagao e para a vida, nossa tarefe torna-se infinitamente eomplexa."(1959: FDI, 91). Ele diz, ainda, que desconsiderara aqueles es- pecialistas que pretendem fornecer tratamento fisico para distarbios psiquicos, uma vez que “nao importa 0 que se saiba ou se descubra sobre a bioquimica ou a neuropatologia ou a farmacologia da esquizofrenia, 0 ‘certo é que igualmente teremos ai os pacientes, pessoas ‘como nds, em cada easo com uma histéria sobre ocomeco do transtorno, com uma boa carga de canseira e softi- mentos pessoais e com um ambiente que é simples- mente mau ou bom ou entao gerador de confusao em um grau que pode resultar inclusive desconcerto referente a ele” (1967: ExT, 234). Aeesperanga de Winnicott 6 “trazer a esquizofrenia para. esfera da luta humana universal e poder afasti- Ia da dimensao do processo especificn de uma daenca. As doencas que surgem da luta humana nao deveriam artigos originaie ser agrupadas junto com os distirbios que sao secundarios a processos degenerativos.” (1965: TCC, 139). Bibliogratia © As siglas apontadas entre paréntesis, apéso titulo do livro em portugués, sa0 as que uso para citacao no corpo do texto, seguidas dos nimeros da pagina onde o texto pode ser encontrado. \WanNICOTT, DW 1958 (tad. bras 1952) Testos selecionados: da ‘pedlatviapsicandlse(P), Rode Janet Francisco Ales. 1865 (tad. ras 1888) O ambiente e os processos de maturagso (APM), Porto Alogre: Artes Medics. — 1066 (tas. bras. 1960) A familia eo desenvolvimento do Inalviduo (FON, Belo Horzorte’Iterives — 1986 (waa, 1969) Tudo comepa em casa (TCC), So Pao Martine Foros, = 197 (wal bras, 1988) O ebée @ uae moe (61h), So Pav: Marine Fontes, — 1988 (wad ras. 1960) Natureza humana (NH), Ro de Jane Imago. ~ 1089 (a8 argentina, 199) Exploraciones psicoanaiitias |e (Gd ¢ Ex) Buenos Ares: Pacos. “Infemto Rev. Neuropeia. da Inf Adok MoupLD: $11, 1989

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