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Instituição, organização

e estabelecimento
Objetivos de aprendizagem
Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados:

„„ Caracterizar a sociedade e as suas instituições.


„„ Diferenciar instituído de instituinte, organizantes de organizados e
sua relação dialética.
„„ Identificar a intervenção do assistente social para favorecer o instituinte
e o organizante.

Introdução
Neste capítulo, você vai estudar a organização social. Como você vai
ver, a sociedade passou por diversos estágios de desenvolvimento até
chegar ao capitalismo contemporâneo, o capitalismo financeiro. Além
disso, para compreender a organização da sociedade, é imprescindível
entender a categoria trabalho como central na vida do ser social. Afinal,
é por meio do trabalho que o homem estabelece a sua relação com a
natureza e com os demais sujeitos.
A fim de contribuir com a organização da sociedade, o homem criou
algumas instituições. Essas instituições são estruturas lógicas, regidas por
leis, normas e hábitos que regularizam a atividade humana. As instituições
se materializam nas organizações, dispositivos concretos que são com-
postos por unidades menores, os estabelecimentos. Além disso, como
você vai verificar, existem as vertentes do instituinte e do instituído, além
das vertentes do organizante e do organizado.
Com tudo isso em mente, você deve refletir sobre a atuação do as-
sistente social no contexto das organizações. Ao longo do capítulo, você
vai perceber que as vertentes do instituinte e do organizante convergem
com os princípios do Código de Ética Profissional, que possui um posi-
cionamento ético-político voltado à transformação social.
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A sociedade e as suas instituições


A sociedade e a sua forma de organização atual são fruto do desenvolvimento e
das mudanças que ocorreram ao longo da história da relação dos homens com a
natureza. No princípio, o homem vivia em comunidades e retirava da natureza
os meios para a sua sobrevivência. Com o passar do tempo, ele percebeu que
poderia construir instrumentos para facilitar as suas tarefas cotidianas. Essa
reflexão recebe o nome de “teleologia”, que designa a presença de metas, fins
ou objetivos guiando a natureza e a humanidade.
Ao movimento de refletir sobre a ação, de construir os instrumentos e de
objetivar a ação na realidade, dá-se o nome de trabalho. É na relação do homem
com a natureza e com os outros homens que existe a possibilidade de objetivação
das ações pensadas. Dessa forma, o homem desenvolve suas potencialidades
e estabelece regras de convivência. Segundo Segal (1945, documento on-line):

Nenhuma sociedade pode viver e desenvolver-se sem produzir as utilidades


necessárias à sua existência. Ora, as utilidades necessárias à existência não são
fornecidas espontaneamente pela natureza; o homem deve produzi-las com o
seu trabalho. Ao fabricar os objetos de uso, o homem modifica as substâncias
da natureza, transforma-as e adapta-as a fim de satisfazer as suas necessidades.
Nesse sentido, a produção é a ação do homem sobre a natureza. O homem, porém,
existe e produz não como indivíduo isolado, mas como membro da sociedade.
Assim, pois, o processo de produção supõe uma determinada relação não
apenas entre a sociedade e a natureza, mas também entre os próprios homens.

O processo de desenvolvimento da sociedade passou por diversas fases.


Assim, a sociedade foi se modificando conforme novas necessidades surgiam.
Você pode considerar que a sociedade teve seu ápice de desenvolvimento com a
ascensão do modo de produção capitalista, que provocou diversas transforma-
ções nas relações sociais estabelecidas. Conforme a sociedade foi evoluindo,
foram sendo determinadas algumas categorias de grande importância para a
manutenção das relações sociais. Por exemplo: cultura, conhecimento, educa-
ção, linguagens, valores e costumes, entre outras. Como você pode imaginar,
tais categorias também foram se modificando com o passar do tempo.
A ascensão do modo de produção capitalista trouxe mudanças nas relações
sociais e também nas relações de trabalho. Até então, o homem detinha o
conhecimento do processo de produção e também possuía os meios de pro-
dução. Com o capitalismo, as alterações no modo de produção e a introdução
das indústrias, a grande maioria das pessoas não detém mais o conhecimento
sobre o processo de produção, nem tem mais posse dos meios de produção, que
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agora pertencem ao capitalista. O processo de trabalho se torna fragmentado.


Assim, cada trabalhador realiza uma parte do processo de produção e fica
alienado, ou seja, não conhece mais o processo de produção por completo. O
trabalho se torna assalariado e o trabalhador se vê forçado a vender a sua força
de trabalho para o capitalista a fim de garantir a sua sobrevivência.
Acerca dessa questão, Baremblitt (2002, documento on-line) afirma o
seguinte: “Nossa civilização tem produzido um saber acerca de seu próprio
funcionamento como objeto de estudo e tem gerado profissionais, intelectuais,
experts que são os conhecedores dessa estrutura e do processo dessa sociedade
em si [...]”. Portanto, esses experts (conhecedores da estrutura e da vida social)
estão a serviço do Estado e das empresas, e a sociedade civil se vê submissa a
esse saber produzido. Em contrapartida, se vê despossuída de um saber sobre
a sua história que vinha sendo construído e acumulado ao longo dos anos.
Considere o seguinte:

Esse saber, criado e acumulado pelas comunidades sociais durante tantos anos
de experiência vital, a partir do surgimento do saber científico e tecnológico,
fica relegado, colocado em segundo plano, como se fosse rudimentar e inade-
quado. Então, as comunidades de cidadãos têm visto esse saber subordinado
ao saber dos experts. Junto com seu saber, elas têm perdido o controle sobre
suas próprias condições de vida, ficando alheias à capacidade de gerenciar
sua própria existência. Elas dependem, então, quase incondicionalmente, dos
organismos do Estado, empresariais, do saber e de serviços dos experts. E a
quais experts refiro-me? Aos dos ramos produtivos, primários, secundários
e terciários, aos especialistas de bens materiais, ou seja, comida, vestuário,
moradia, transporte: aqueles bens materiais indispensáveis à sobrevivência
(BAREMBLITT, 2002, documento on-line).

Nesse contexto, você deve levar em consideração um importante componente


da sociedade: as instituições. As instituições fazem parte de estruturas lógicas,
que podem ser leis, normas, hábitos ou regularidades de comportamento. Ou
seja, pode-se entendê-las como estruturas discriminativas. Segundo Baremblitt
(2002, documento on-line, acréscimo nosso), “[as instituições] significam a
regulação de uma atividade humana, caracterizam uma atividade humana e se
pronunciam valorativamente com respeito a ela, esclarecendo o que deve ser, o
que está prescrito, e o que não deve ser, isto é, o que está proscrito, assim como
o que é diferente [...]”.
Nesse sentido, são exemplos de instituição:

„„ a linguagem — por meio das normas gramaticais, é possível estalecer a


comunicação dos falantes de determinada língua;
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„„ a regulamentação do parentesco — define entre quais membros pode se dar


uma união ou não e qual é o tipo de vínculo, bem como aquilo que é proibido;
„„ a divisão do trabalho — existem especificidades de cada tipo de produção
e tarefa, e essa divisão vem acompanhada de uma hierarquia que institui
diferenças de poder, prestígio e lucro.

Você pode considerar também outras instituições, como a educação, a


religião e a justiça. Veja:

Em um plano formal, uma sociedade não é mais que isso: um tecido de insti-
tuições que se interpenetram e se articulam entre si para regular a produção e a
reprodução da vida humana sobre a Terra e a relação entre os homens. Agora,
entendidas assim, as instituições são entidades abstratas, por mais que possam
estar registradas em escritos ou conservadas em tradições (BAREMBLITT,
2002, documento on-line).

As instituições se materializam nas organizações, que são dispositivos


concretos. Elas são formas variadas que compreendem desde um grande com-
plexo organizacional, como os ministérios, até um pequeno estabelecimento.
As instituições não teriam vida, não teriam realidade social, se não fosse por
meio das organizações. A organização é composta por unidades menores, os
estabelecimentos. Estes seriam as escolas, conventos, lojas, fábricas ou bancos.
Existem diversos tipos de estabelecimentos e cada um tem suas características.
Portanto, é o conjunto de estabelecimentos que compõe uma organização.
A instituição, a organização e o estabelecimento só adquirem dinamismo por
meio dos agentes. Nada se mobiliza ou opera se não for por meio deles. Veja:

Os agentes são “seres humanos”, são os suportes e os protagonistas de toda


essa parafernália. E os agentes protagonizam práticas. Práticas que poder ser
verbais, não verbais, discursivas ou não, práticas teóricas, práticas técnicas,
práticas cotidianas ou inespecíficas. Mas é nas ações que toda essa parafer-
nália acaba por operar transformações na realidade (BAREMBLITT, 2002,
documento on-line).

É importante você notar que os dispositivos não podem ser confundidos


a fim de adquirir um sentido universal. É como explica Baremblitt (2002): é
como chamarmos a escola de instituição, visto esta não ser uma instituição,
mas um estabelecimento que faz parte de uma organização, ou seja, o Minis-
tério da Educação, que realiza uma grande instituição, que é a educação, uma
estrutura lógica, com uma série de prescrições ou leis.
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Instituinte e instituído, organizante


e organizado
A instituição se manifesta por meio dos comportamentos e modos de pensa-
mento. É também um instrumento de controle dos problemas sociais. Além
disso, é utilizada para a apropriação dos bens sociais e instrumentos de trabalho
na sociedade capitalista, criando normas, leis, padrões e valores que legitimam
essa apropriação. Isso justifica, por exemplo, a origem das instituições discipli-
nares. Assim, “Qualquer sociedade que se estrutura com base na diferenciação
entre grupos sociais ou na divisão social do trabalho progressivamente cria
padrões, normas, leis e práticas para controlar e reger essa diferenciação [...]”
(SOUZA, 1988, p. 40).
Você pode notar, portanto, que o surgimento da burguesia ampliou as insti-
tuições sociais, visto que estas são o instrumento básico para a reprodução da
sua estrutura de relações. A divisão social do trabalho é uma das expressões
da institucionalização da propriedade privada. Veja:

Consideradas como conjunto de normas, padrões, leis, valores e práticas que


regem as relações entre os homens, as instituições são das instâncias funda-
mentais da sociedade. Têm sentido a partir da compreensão da dinâmica global
dessa realidade, que é a sociedade. Como tal, as instituições, longe de serem um
componente estático, são essencialmente dinâmicas, são essencialmente relações.
Destarte, quando há mudanças na estrutura das relações que fazem a ordem social,
o há também nas instituições. É só observar como as instituições sustentadoras
da ordem social feudal são banidas na ordem burguesa (SOUZA, 1988, p. 41).

À medida que as pessoas entendem a instituição como uma forma doura-


doura, elas interiorizam em sua consciência valores, sentimentos e crenças.
As circunstâncias em que as instituições são criadas estão relacionadas ao
conceito de Estado forte coletivo, ou seja, a um momento de entusiasmo social.
Essa noção é diferente daquela da divisão social do trabalho, que é uma forma
contrária à consciência coletiva, institucionalizando valores e crenças para
encobrir suas determinações fundamentais. Portanto:

Entender as instituições [...] é entender o processo histórico que as produziu.


Conforme foi dito, as instituições surgem sempre a partir de determinadas
demandas. Como no confronto entre classes, os grupos privilegiados têm mais
poder para fazerem valer as suas demandas, são dominantemente as soluções
para responder a essas demandas que emergem como instituições, mescladas
a supostos interesses dos demais grupos sociais (SOUZA, 1988, p. 42).
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Assim, em nome da proteção coletiva, muitos valores, normas, ideologias,


bem como práticas sociais institucionalizadas, são aceitas, escondendo a
defesa da ordem social assumida como função principal. Por isso, o caráter
formal e neutro precisa ser combatido para que as reais determinações das
instituições sejam reconhecidas.
Para Marx (2008) as instituições, assim como a ideologia, são partes integran-
tes das superestruturas, ou seja, do complexo das ideologias religiosas, filosóficas,
jurídicas e políticas de determinada classe social, dominante na sociedade. A
instituição se manifesta pela organização das relações de produção, e a inserção
de padrões culturais não é um dos efeitos da educação, e sim da luta de classes,
visto os sistemas cuturais possuírem relação com o modo de produção.
As instituições estão permeadas tanto pelo aspecto econômico como pelos
aspectos político e ideológico. Não se pode separar, na análise e na luta social, o
econômico do político. A instituição não pode ser assimilada apenas no plano do
instituído, pois ficaria privada do dinamismo do instituinte. De forma dialética,
a superestrutura atua sobre a base material e esta atua sobre a estrutura.
Em uma instituição, podem-se distinguir duas vertentes importantes: ins-
tituinte e instituído. Para uma sociedade existir, é necessário haver no mínimo
quatro instituições: língua, relações de parentesco, religião e divisão do trabalho.
Essas instituições são sinônimos da existência de um coletivo humano.
Em alguns momentos históricos, pode-se presenciar a revolução de uma ins-
tituição, com profundas transformações. A esses momentos de transformação
dá-se o nome de instituinte, que são forças produtivas de lógicas institucionais:
“Este grande momento inicial do processo constante de produção, de criação
de instituições, tem um produto, gera um resultado, e este é o instituído
[...]” (BAREMBLITT, 2002, documento on-line). O instituído é o efeito da
atividade instituinte. O instituinte se apresenta como um processo, com uma
característica dinâmica, e o instituído se apresenta como um resultado, com
uma característica estática. Veja:

Então, é evidente que o instituído cumpre um papel histórico importante,


porque as leis criadas, as normas constituídas ou os hábitos, os padrões, vi-
goram para regular as atividades sociais, essenciais à vida da sociedade. Mas
acontece que essa vida é um processo essencialmente cambiante, mutante;
então, para que os instituídos sejam funcionais na vida social, ele tem de estar
acompanhando a transformação da vida social mesma para produzir cada
vez mais novos instituídos que sejam apropriados aos novos estados sociais
(BAREMBLITT, 2002, documento on-line).
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Em outras palavras, o instituído possui uma tendência à resistência. Ele


é conhecido politicamente pelo nome de conservadorismo, reacionarismo.
E o instituinte se apresenta como uma atividade revolucionária, criativa,
transformadora. Entretanto, não é exatamente assim que acontece, visto que
faltaria sentido ao instituinte se não se materializasse no instituído. Em con-
trapartida, o instituído não seria efetivo se não estivesse aberto ao instituinte.
No nível organizacional, ocorre o mesmo. Existe uma atividade crítica
e transformadora, que otimiza as instituições, que é o organizante, e há o
organizado, que é reconhecido como organograma ou fluxograma. O organi-
zado, embora seja necessário, possui uma tendência a cristalizar-se, estando
suscetível a vícios, tal como a burocracia. A vida social, entendida como
um processo em constante transformação, deve caminhar em direção ao seu
aperfeiçoamento, visando à saúde, à realização e à felicidade, entre outros
aspectos, de todos os seus membros. Isso só é possível quando a sociedade está
regulada por instituições e organizações que possuem uma relação dialética
entre o instituinte e o instituído, entre o organizante e o organizado (processo
de institucionalização e organização), que se mantêm de forma fluida.

Você sabe o que é análise institucional? Pereira (2007) afirma que é uma análise sus-
tentada pelo coletivo. Tal coletivo pesquisa, questiona e analisa a história, os objetivos,
a estrutura e o funcionamento da organização, bem como os dispositivos, práticas e
agentes grupais. No contrato de trabalho, os participantes se comprometem a expor
suas percepções com abertura e clareza.
A análise institucional tem forças de teor instituinte e entra em contradição com o
já instituído, produtor de uma imobilidade a ser quebrada com a intervenção. Existe
uma relação estreita desses dispositivos analisadores com a consecução do processo
de autoanálise e autogestão. Como os membros do grupo assimilam um saber he-
gemônico sobre suas vidas, se conscientizam da alienação a que estão submetidos.
Assim, desenvolvem um novo clima político de gestão e administração.

Intervenção profissional do assistente social na


vertente do instituinte e do organizante
O assistente social deve compreender o que é instituição e organização, insti-
tuído e instituinte, organizante e organizado a fim de direcionar a sua prática
profissional. Na década de 1960, o Serviço Social iniciou um processo de revi-
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são da teoria e da metodologia, com o chamado Movimento de Reconceituação.


Tal processo está em aperfeiçoamento e nunca fica estático. Atualmente, o
Serviço Social está mais amadurecido teórica e metodologicamente, além de
assumir uma postura ético-política frente à sociedade capitalista.
Situar o Serviço Social no cenário econômico e histórico-político permite
compreender os motivos pelos quais a profissão adotou a teoria social crítica
como referencial teórico e construiu um projeto ético-político com o viés da
transformação social, o que tem seus fundamentos no Código de Ética de 1993
(CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL, 1993). No início, a profissão
atuava a favor do sistema econômico vigente, em suma, no ajustamento dos
indivíduos a fim de manter o sistema social harmônico. Já nos dias de hoje, a
profissão tem um projeto que atua a favor da classe trabalhadora, da equidade
e da justiça social.
Assim, o Serviço Social tem atuado em diversos espaços sócio-ocupacio-
nais. Entretanto, o Estado tem sido o maior empregador. O assistente social
trabalha em organizações de vários segmentos sociais nas políticas de: as-
sistência social, saúde, previdência, habitação, cultura, esportes, entre outras
que requisitam os conhecimentos desse profissional.
Após a instauração do neoliberalismo (década de 1990) no Brasil, pode-se
dizer que o que se tinha de direitos sociais sofreu um grande desmonte, devido
à política de corte de gastos e restrição orçamentária movida pelos novos ideais
econômicos, que influenciaram sobremaneira as políticas sociais. Portanto:

A radicalização liberal em tempos de mundialização do capital reafirma o


mercado como órgão regulador supremo das relações sociais e a prevalência
do indivíduo produtor, impulsionando a competição e o individualismo e
desarticulando formas de luta e negociação coletiva. Impulsiona-se uma
intensa privatização e mercantilização da satisfação das necessidades sociais,
favorecendo a produção e a circulação de mercadorias-capitalistas e sua
realização (IAMAMOTO, 2009, p. 404).

Como você pode notar, Iamamoto (2009) descreve parte do cenário neo-
liberal instaurado. Pode-se ainda acrescentar que, com a política de redução
de gastos, o Estado passa a interferir minimamente na economia, com uma
proposta de políticas sociais residuais, fragmentadas e focalizadas na extrema
pobreza, estabelecendo critérios de elegibilidade para se ter acesso aos benefícios.
São propostos programas e projetos para a inserção de famílias, mas eles não
contribuem com a melhora da qualidade de vida dos usuários dos programas:
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Nesse cenário, cresce o desemprego que alimenta a expansão da população


excedente, ao lado da desregulamentação e informalização das relações de
trabalho, com repercussões na luta salarial e na organização autônoma dos
trabalhadores. Adquirem destaque políticas sociais voltadas à preservação dos
mínimos vitais dos segmentos da crescente população excedente lançados ao
pauperismo; e ao seu controle político, preservando o direito à sobrevivência
de imensos contingentes sociais e alimentando o consenso de classe necessário
à luta hegemônica (IAMAMOTO, 2009, p. 404).

É um cenário de conflito entre as políticas que são oferecidas e a busca pela


garantia de direitos. No cotidiano profissional, o assistente social é chamado a
trabalhar com diversas demandas, já que muitos necessitam de auxílio para sobre-
viver, porém não se enquadram nas políticas oferecidas. A classe trabalhadora se vê
submissa aos mandos do capital, e os assistentes sociais buscam incessantemente
alternativas para tentar solucionar as demandas que chegam. Contudo:

[...] os espaços ocupacionais refratam ainda as particulares condições e relações de


trabalho prevalentes na sociedade brasileira nesses tempos de profunda alteração
da base técnica da produção com a informática, a biotecnologia, a robótica e
outras inovações tecnológicas e organizacionais, que potenciam a produtividade
e a intensificação do trabalho. É esse solo histórico movente que atribui novos
contornos ao mercado profissional de trabalho, diversificando os espaços ocu-
pacionais e fazendo emergir inéditas requisições e demandas a esse profissional,
novas habilidades, competências e atribuições (IAMAMOTO, 2009, p. 405).

As organizações em que os assistentes sociais atuam não ficam de fora


dessa lógica. Atuar nas organizações é atuar em um espaço contraditório e
repleto de tensionamentos. O projeto profissional adotado pelo Serviço Social
é uma resistência frente aos mandos do capital, ou seja, o projeto profissional
é adverso ao projeto societário instituído.
Nesse sentido, é certo dizer que o instituído e o organizado desempenham uma
função a serviço da exploração exercida pelo sistema vigente. Em contrapartida,
o instituinte e o organizante seguem o viés da justiça social e da igualdade.
Sob a perspectiva da totalidade, um necessita do outro para que haja dinâmica
na sociedade, ou seja, eles mantêm uma relação dialética entre si. Porém, os
assistentes sociais, em seu cotidiano de trabalho, devem pensar e realizar as suas
ações pelo viés do instituinte e do organizante, pois estes têm os mesmos propó-
sitos do projeto profissional adotado, que vai contra o instituído e o organizado.
Segundo Baremblitt (2002, documento on-line), “[...] a característica essencial
do instituinte, do organizante e dos seus produtos operantes é serem propícios
à produção, produção que é geração do novo, daquilo que almeja a utopia [...]”.
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Assim, é importante você ter em mente que o assistente social deve atuar
na vertente do instituinte e do organizante a fim de firmar o compromisso
com o seu projeto profissional. Tal projeto também almeja a transformação da
sociedade, fundamentada na igualdade e na justiça social, visto que o Código
de Ética de 1993 (CONSELHO FEDERAL DE SERVIÇO SOCIAL, 1993), em
seus princípios fundamentais, elenca a busca pela construção de uma nova ordem
societária. Além disso, o valor ético central que está em jogo é a liberdade, bem
como a defesa intransigente dos direitos humanos, do pluralismo, da equidade e
da justiça social, entre outros valores que vão contra o instituído e o organizado.
É dever do assistente social, em sua atuação profissional, construir junto
aos usuários as alternativas para as demandas vivenciadas. Nesse sentido,
é imprescindível que os profissionais lembrem-se sempre do ideal da trans-
formação social e da busca por uma sociedade com um funcionamento mais
otimizado, mais igualitário e menos burocrático. A ideia é que eles possam
contribuir para a superação da ordem estabelecida.

BAREMBLITT, G. F. Compêndio de análise institucional e outras correntes: teoria e prática, 5.


ed. Belo Horizonte: Instituto Felix Guattari, 2002. Disponível em: http://repocursos.una-
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8.662/93 de regulamentação da profissão aprovado em 13 de março de 1993 com as
alterações introduzidas pelas resoluções CFESS nº. 290/94, 293/94, 333/96 e 594/11.
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MARX, K. Contribuição à crítica da economia política. 2. ed. São Paulo: Expressão Popular, 2008.
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