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CapiTuLo 1 P A perspectiva sdcio-historica: umd possibilidade critica para a Psicologia € pora a Educacéo Mario do Groca Marchina Goncalves (PUC-SP) ‘i Odoir Furtado (PUC-SP) AGUIAR oe o 2B A RADICALIDADE DA LEITURA E A CONCEPCAO DE HOMEM tiva sécio-historica em psicologia radicaliza, frente a o stray a importancia do fendmeno social e de sua re] com a constituigao da subjetividade. een : Psicologia, an definir seu objeto, em diferentes ¢ diversas abordage desconsidero, , 0 fenémeno social como produtor da subjetividade ou reduziu-o a alga dado, que influencia de alguma maneira igubietividade, mas de wi ponto de vista interacionista que produz dicotomia entre 0 fendmeno social e a producéo do psiquismo. A radicalizagao promovida pela perspectiva s6cio-histérica im, poe considerar o fendmeno social como processo, como realidade constituida por sujeitos, como algo que s6 pode ser compreendido plenamente quan- do se considera os sujeitos e suas possibilidades de agir, relacionar-se, produzir bens necessarios asua vida e produzir e registrar representacdes do objeto e de sua relagao com ele. Ao mesmo tempo, impée considerar a subjetividade também como processo, sem nenhum atributo origindrio que seja natural e/ou univer- sal, a nao ser a capacidade de vivenciar, registrar e comunicar as vivén- cias e utilizar esses registros. Entretanto, as vivéncias, os registros, a comunicagao, a utilizagao das experiéncias sao elementos da subjetivi- dade também eles configurados e delimitados a partir da realidade ob- jetiva, do fendmeno social constituido historicamente. Aperspec! teorias da psicologia, aGao, Esses atributos e essa configurac¢ao de sujeito foram produzidos na modernidade como experiéncias e potencialidades de um individuo assim concebido e que deveria assumir a responsabilidade por sua pré- pria existéncia. Assim, desde o século XIII com 0 tomismo (doutrina de Santo Tomas de Aquino, 1225-1274) e mais adiante, com René Descartes (1596-1650), vai se moldando uma nova nogao de individuo que suben- tendia que ele deveria se responsabilizar por suas decis6es (tomismo); ©, ao mesmo tempo, poderia ter uma ciéncia e seu método livres do ‘A DIMENSAO SUBJETIVA DO PROCESO EDUCACIONAL 29 age al: em uma afirmacao do Sujeito que produziu a conhecida ed mente e corpo (Descartes). Essa mudanca na visdo de mundo do . e maecieval €ta acompanhada do processo de acumulagao pri- mitiva do ane e fortalecimento da burguesia como classe social, e tal processo hist6rico preconizava para o futuro um sujeito com maior li- berdade e capacidade de decisao que ganharé maior expressao na inter- pretacao do filésofo prussiano Immanuel Kant (1724-1804). A revolugo burguesa (Revolucao Francesa de 1789, a Americana de 1776 e a Revo- lugao Industrial na Inglaterra a partir de 1760) consolida politicamente a nova configuracao de sujeito e de expressdo de subjetividade que, doravante, concebe esse sujeito como livre e auténomo. Estas sao as condicGes materiais e politicas que inauguram a modernidade e o modo de producao capitalista. Ou seja, devemos compreender que as experiéncias subjetivas nao foram sempre as mesmas, nao estiveram organizadas, estruturadas, concebidas e registradas sempre da mesma forma. Interessa-nos, nesse sentido, para compreender 0 homem contemporaneo, ter em conta essa configuracao histérica do sujeito dada pela modernidade. Para continuar, vale esclarecer que os pressupostos tedrico-metodo- légicos dessa leitura fundamentam-se no materialismo histérico e dialé- tico. Dentro dessa concep¢ao, entende-se que as ideias de um tempo hist6rico expressam, de maneira mediada e contraditéria, a realidade material vivida de forma concreta pelos homens. No caso da moderni- dade, compreendida como conjunto de formulac6es filos6ficas e episte- molégicas, deve ser considerada como representagées (mediadas e contraditérias) do modo de producgao capitalista, juntamente com a forma de organizacao da produgao, as relagdes sociais e as expressdes superestruturais que ele engendra. Assim, a afirmagao do homem como sujeito, na modernidade, deve ser referida a um tipo de experiéncia hist6rica, possibilitada pelo desen- volvimento das forcas produtivas capitalistas. Por isso mesmo, trata-se de uma concepcio contraditéria, que, ao mesmo tempo, afirma e nega ao individuo (outra configuragéo da experiéncia subjetiva histérica) a possibilidade de se constituir como sujeito. Aafirmacao do homem como sujeito e da Psicologia como ciéncia se dé no bojo da modernidade, entendida como o conjunto de ideias e concepcdes AGUIAR « 5, modo de producao capitalista. Entretanto, a Modern; ira contraditoria. Afirmou-o como indiy dual 1 tural. E afirmou-o como social, ativo e hist6rico. As contragj. nee ee na modernidade engendraram a afirmagao e a negacio q, ee sua historicidade (Goncalves, 2015a, p. 48) que representam dade afirmou o sujeito de mane Contraditoriamente, tal configuragao do homem como sujeito jn dicou a possibilidade de uma plena realizagao, mas também limitou essa possibilidade. As possibilidades que se apresentavam ao in dividuc de ser livre e dono de seu destino, estavam atreladas a sua participa¢a, no mercado capitalista, fosse como produtor ou consumidor. E, desde sempre, 0 capitalismo impés limites: para os despossuidos dos meios de produgao, a venda, na concorréncia do mercado, da forga de trabalho definia seu lugar de produtor; para todos, 0 consumo, mediado pek dinheiro e disciplinado pela produgao de massa, definia seu lugar consumidor. Essa estruturagao de base, brevemente referida, indica as condigoes hist6ricas dadas a esse sujeito. Em fungao delas, as proposigées do libe- ralismo, principal ideologia do modo de produgao capitalista, se mostram ilus6rias. O individuo “livre” é 0 que participa “livremente” do merca- do e esta, nesse sentido, submetido a suas leis. Por isso a formulagao liberal, do sujeito como individual, racional e natural, mostrou muito cedo seus limites. Que sujeito individual é esse, cuja realizagao esta totalmente atre- lada as condigées sociais e politicas impostas pelos interesses do merca- do? A resposta liberal é de que se trata do sujeito natural, igualado, na Sua origem, a todos os outros. Ou seja, 0 liberalismo proclama a igual- ee Fa nna: eee Suis con ft concretiza, entretanto, 6 uma experiéncia ee : pelo contexto social e histérico, o que, eee aa elas ° liberalismo, termina Por ser ocultado na : xperiéncia concreta. Exemplo disso, até hoj en tena sociedade, €a meritocracia, como explicagao para H i ge as } produzidas, na verdade, pelo contexto hist6rico e social, lesigualdades No classico texto de Karl Ma: : rx (2 econdmico-filoséficos, 0 autor aponta: a (eel Eaameemaeescrits em fungao de posi- ‘A DIMENSAO SUBIETIVA DO PROCESSO EDUCACIONAL rt ais riquezas produz, em poder e extensio. O trabalhador fa quanto mais mercadorias cria. aumenta em proporcao direta a 0 produz somente mercado- trabalhador se torna tanto mais pobre quanto m quanto mais a sua produgao aumenta se torna uma mercadoria tao mais barat 0 do mundo das coisas 40 do mundo dos homens. O trabalho n: smo e ao trabalhador como uma mercadoria em geral. Com a vale desvaloriz mercadorias; ele produz a si me ria, e isto na medida em que produz, de fato, Assim, a expressdo subjetiva produzida pelo trabalhador a partir dessa condig&o ocorre como sua desefetivacao do que produz (objetiva- cao) e se realiza como estranhamento e alienagao da producao. Essa, segundo Marx, é a condicao conereta de vida dos trabalhadores e assim sera mediada sua vida material. O trabalhador se conceberé como sujei- to que estara alheio ao que produz e s6 terd como critério de ser no mundo o que sera possivel consumir a partir do seu salario. S40 essas as condigdes materiais que determinam a forma de sua insergao no mun- do e a sua producao de vida. Entretanto, as contradigGes hist6ricas apare: lagao de ideias, como indica a perspectiva materialista dialética. Sea modernidade expressa tais concepgoes como representagdes do modo de produgao capitalista, expressa, também, as concepgdes que representam o contraponto dialético a essa forma de organizagao da sociedade. Isso também é uma experiéncia concreta que surge NO Ambito da sociedade de classes no capitalismo, por meio da expressao de interesses contrarios aos da burguesia. As contradig6es entre capital e trabalho que se eviden- ciam no antincio da necessidade do fim do capitalismo, ja em meados do século XIX, momento das primeiras crises desse modo de producao, criam as condigdes para o questionamento das ideias dominantes e o estabelecimento de novas concep¢oes. cem também na formu- Dessa forma, a nogao liberal de sujeito, como individual e natural, é questionada e contraposta 4 ideia de sujeito social e histérico. Gude sujeito social é esse? E aquele que, para se tornar individuo, um indivi duo humano, deve se apropriar da histéria e da cultura, a ras ie relagdes sociais historicamente constitufdas (Leontiev, 1978) “an iS de fica considera-lo concretamente, no interior do lugar wcia . ao) signi- trabalho, como indica a concep¢ao materialista histori definido pelo Significa, portanto, consideré-lo como ser histérico, istorica e dialética. BAAR © BOCK. Como aponta Furtado (2011, p. 93): Ha, de fato, uma contradigao que reflete a contradigao de classe ocultag, na relagio social e de trabalho na forma como se apresenta no atual modo de produgio. O campo de sentidos € artificialmente separado do campo de significados, e a crenga e valores se apresentam como dados, como valores extraterrenos que parecem valer desde todo o sempre. Essa contra. digdo esta expressa, como apontamos quando discutimos relacGes de tra. palho, na consciéncia fragmentada e é a fonte dessa fragmentacao. A su. peragao da fragmentacao nao ocorre no plano do sujeito e s6 € possivel na experiéncia concreta do conjunto no confronto com as forgas que subjugam ‘as classes em condicaéo de dominagao. Tais concepgdes fundamentam-se no marxismo, que se apresenta no século XIX como leitura critica do capitalismo. Leitura critica que come- ¢a por um posicionamento filoséfico e epistemolégico que opée, as concepcées idealistas e/ou metafisicas, o materialismo dialético. Pela concep¢ao materialista, nada existe além da mateéria; e a maté- ria da vida humana é o substrato social produzido historicamente. Ou seja, a materialidade da vida humana comega pela existéncia de um organismo biolégico que, entretanto, s6 se torna humano por meio da produgao da prépria existéncia, no ambito de relacdes sociais historica- mente constituidas, incluindo a produgao de bens materiais e imateriais, fisicos e simbélicos. Pela concepgao dialética, 0 ser de todas as coisas inclui, necessariamente, o ndo ser, unidade de contrarios que resulta no vir a ser; ou seja, o processo real da vida é a transformacao constante Isso pensado na concretude da vida humana remete & nogao de historia. Em sintese, a materialidade da vida humana se constitui em um proces" so de transformagao constante da propria vida, processo que resulta na produgao da histéria (Kahhale e Rosa, 2009). Quais as implicagdes dessas diferentes concepcdes de sujeito pata 4 delimitagao do objeto da Psicologia, a ciéncia que é também fruto da modernidade e que, poderiamos dizer, grosso modo, se propoe a investiga’ a subjetividade, ou seja, aquilo que é préprio do sujeito? Podemos iden- tificar, a0 longo do desenvolvimento dessa drea de conhecimento, pe! menos duas concepg6es de subjetividade, uma liberal e outra hist6ric- de saga patdetando 0 que foi apontado anteriormente, a concepsio liberal uujeito pode ser sinteticamente colocada da seguinte forma: 0 sujeit® © A DIMENSAO SUBJETIVA DO PROCESSO EDUCACIONAL . racional, possuidor de consciéncia e livre-arbitrio; é natural, em fungao da presenga, autonomia e universalidade da razao; e é individual, ou seja, individualidade 6 0 modo de ser do homem racional. As implicagdes para a nogao de subjetividade sao de que o homem tem desenvolvimento na- tural e uma subjetividade intrinseca; e de que o meio social pode agir sobre isso, impedindo o desenvolvimento natural dessa subjetividade. Por outro lado, a concepgao histérica de sujeito coloca que ele é, para além de racional, ativo, pois se constitui no trabalho que transforma a natureza e 0 proprio homem; social, porque a realizagao do trabalho é necessariamente social e nesse processo é que ele se torna individuo; e hist6rico, pois nada que pertence ao homem, desde suas produgGes até seus atributos, caracteristicas, 0 fisico e o simbélico, nada pode ser con- siderado a parte da acao social, entendida como praxis. As implicagées para a subjetividade que derivam dessa concep¢ao de sujeito questionam a subjetividade natural e supostamente intrinseca ao sujeito da concepgao liberal. Diferentemente disso, compreende-se que existe uma dialética subjetividade-objetividade, em um processo que se constitui no sujeito inserido em relagées sociais e histéricas. E que € necessario considerar 0 contetido histérico que esse processo carrega, em fungao das caracteristicas do contexto cindido pela divisdo da sociedade em classes: O papel do proprio sujeito na constituigio de sua subjetividade é reconhe- cido tanto na concepcao liberal como na concepgao histérica. [...] Todavia, duas possibilidades de compreensao dessas capacidades se apresentam: podemos compreendé-las como inerentes ao homem, como processos naturais, universais que se desenvolvem em oposigao as determinacdes sociais e que buscam uma “verdadeira” realizagéo das potencialidades individuais; ou podemos compreender essas capacidades como produgdes hist6ricas, isto é, surgidas em um processo histérico contraditério e pro- duzido ativamente pelos homens em relagGes sociais concretas (Bock e Goncalves, 2005, p. 114). As diferentes concepgoes de sujeito e subjetividade irao aparecer na Psicologia e suas diversas abordagens. Como ciéncia surgida na moder- nidade, a Psicologia sera pautada pelas formulagées desse periodo sobre o homem e 0 conhecimento. Boa parte dessas formulac6es leva a leituras dicotémicas, desde a discussao sobre a telagado suj ito-objeto até relacdes AGUIAR 34 ULAR « caras & Psicologia e que sao baseadas nessa dicotomia no Ambito episte. moldgico. Por sua vez, as dicotomias implicam um proceso de natura. lizagao dos fendmenos sociais € humanos.' A leiture do Bevenvoly imen. to da Psicologia por esse viés permite uma peaittcet que considera 0 carater histérico do conhecimento, suas possibilidades e limites. ‘Tanto nas visGes objetivistas como nas subjetivistas da Psicologia ocorrem a separacdo e a naturalizagao desses aspectos [aspectos objetivos e subje. tivos da vivéncia humana] [...] ‘Assim, as visdes objetivistas absolutizam os fatores objetivos e submetem 0 sujeito, e a subjetividade, a realidade externa a ele. E, nas visdes subjetivistas, sujeito e subjetividade sao iluso- riamente tornados auténomos e absolutos. No primeiro caso, o resultado é uma subjetividade desconsiderada na sua complexidade, seja por sua reducéo ao comportamento observavel ou 20s aspectos racionais-cognitivos. No segundo caso a subjetividade ¢ ilusoria. mente tomada em sua complexidade, j4 que, embora apresentada como complexa, termina por ser limitada por uma realidade hostil que impede sua realizacao (Gongalves, 2015a, p. 60). Estes breves apontamentos tém por objetivo indicar as bases meto- dolégicas (incluindo concepgao de mundo, de homem, de historia ¢ de conhecimento) da perspectiva sécio-histérica. Derivam dessas bases as categorias centrais da abordagem. Categorias te6rico-metodologicas, como historicidade, contradigao, totalidade, mediagao. E categorias ted- ricas, que delimitam, junto ao objeto da Psicologia campos de investiga- cao de processos constantes de transformagao. O objeto da Psicologia, para além de conceituagées objetivistas ou subjetivistas, resultantes das dicotomias produzidas pela modernidade, pode ser configurado como a dialética subjetividade-objetividade; as 1 Trata-se da discussio epistemol6gica sobre a relacio sujeito-objeto, surgida também na modernidade e que configura todo o debate a respeito das possibilidades de conheciment© derivam dessa questdo as formulagoes da ciéncia moderna e as definigoes de métodos ci ficos. £ um debate complexo, mas que termina por produzir reducionismos auc mencam ° desenvolvimento das ciéncias nos séculos XIX € XX e que estabelecem dicetrane in Ts Mie ices en i cipal entre sujeito e objeto. Tais dicotomias alimentam as perspectivas Seteeizadceas » P Be ‘s loras, pois descon- ‘em si ricos e dialéticos da perspectiva sécio-hist6rica apontai Be respeito ver Gongalves (2015a; 2015b). poniam Pata\a extica dessa dicotomia. A es ‘A DIMENSAO SUBJETIVA DO PROCESSO EDUCACIONAL categorias tedricas, que conferem visibilidade aos principais processos dessa dialética, sio atividade, consciéncia, identidade, afetividade, di mensdo subjetiva da realidade, nogdes que serio brevemente apresenta das no proximo tdpico. ATEGORIAS DA PERSPECTIVA SOCIO-HISTORICA Na perspectiva s6cio-historica, a compreensao a respeito do psiquis mo e dos fendmenos psicolégicos esta pautada pela categoria historici dade, que implica considerar que a subjetividade, conjunto de todos os aspectos psicoldgicos, produzidos pelo psiquismo, é constituida em um processo ativo de relagao entre o sujeito ea realidade objetiva. A com reensdo desses processos & aspectos pela via da historicidade impoe considerar de forma dialética a relagao subjetividade-objetividade, for mulagao que aponta exatamente para a atividade do sujeito sobre o objeto, transformando a ambos e constituindo as experiéncias que sao registradas a partir dessa dinamica. Esse processo complexo tem sui artir do trabalho, que define o home: oduzida, Embora tenha sua génese na ativ es articuladas com ela e que apontam para a do homem sobre a realidade, a génese na atividade, definida a P m em sua humanidade, historica- mente pr idade, 0 processo apresenta outras dimens6 formatacao de uma compreensao consciente sobre os outros homens e sobre si mesmo. Apontam ainda tros afetivos e emocionais, que acompanham todas as experi a constituicao do sujeito como um ser social que se singulariza a partir das experiéncias sociais historicamente determinadas. Dito de outra for- ma, 0 processo de constituigao da subjetividade pode ser apreendido por meio das categorias atividade, consciéncia, afetividade e identidade. ; O processo ativo, consciente, afetivo e identitario que constitui o Bujelto e sua subjetividade tem uma dimensao simbdlica e fica dessa maneira registrado e pode ser comunicado. Isso é possivel por meio da eae ecieeaae Mckenn com 0 pensamento, tem ‘uma BSH vigsta 2009), ete lo individuo com a realidade objetiva e periaas ee des ie trabalho da consciéncia com 0s signos le acao histérica e social, de compreensao do para os regis éncias. E para 36 AGUIAR « g mundo e da sociedade, as possibilidades de compreensao de si Mesm, de criagao e transformacao do objeto pelo sujeito. E resulta em uma ' namica de construgio social da realidade social, na qual a subjetividade esta dialeticamente articulada com a objetividade. A agao do sujeito sobre 4 objeto agrega subjetividade ao objeto; ai esté a historicidade. Nesse sentido, a linguagem desempenha papel central na constitu. ao da dialética subjetividade-objetividade. Conforme Vigotski (2009), palavra com significado é a unidade de andlise na qual se deve deter o pesquisador que procura captar esse processo de constituigao da subje. tividade em sua complexidade. di- Dentre essas mediac6es, a linguagem é a que melhor representa a sintese entre objetividade e subjetividade. Isso porque o signo é, ao mesmo tem- po, produto social que designa a realidade objetiva; construcao subjetiva compartilhada por diferentes individuos por meio da atribuigao de ficados; e construgao subjetiva individual, que se da pelo processo de apropriagao do significado social e da atribuicao de sentidos pessoais (Goncalves, 2015a, p. 63). A linguagem € considerada no que representa como processo de atribuir significagéo, capacidade humana desenvolvida historicamente dentro do processo de constituigao da vida social. As significagSes pro- duzidas pelos sujeitos sociais referem-se a imbricacao entre significados e sentidos. E importante perceber que a dimensio dos sentidos traz mais cla- ramente o sujeito na sua singularidade, sem, entretanto, deixar de con- siderar o contexto social e hist6rico no qual se constitui. Por isso, ao se considerar as significagdes pretende-se identificar os significados, dado que séo mais explicitos na imediaticidade da apresentagao social com- partilhada. Mas, também, alcangar os sentidos subjetivos, ou pelo menos elementos de sentidos, que revelariam as zonas mais amplas do que ° significado (Vigotski, 2009; Gonzalez Rey, 2005), produzidas a partir do Sujeito e suas vivéncias. __ Outra categoria tedrica desenvolvida pela perspectiva s écio-histo- tica é a dimensao subjetiva da realidade. A nogao de dimensao subjet va apresenta uma compreensao da relagao individuo-sociedade deco rente do uso da categoria historicidade. Com esse recurso teorico © ‘A DIMENSAO SUBJETIVA DO PROCESSO EDUCACIONAL 37 metodolégico, trabalha-se na diregado de superar a dicotomia individuo- -sociedade, quando as explicacgdes da Psicologia, especificamente da Psicologia Social, tomam cada um dos polos da relagdo em si mesmos, para em seguida tratar das relagées entre eles. Sao as concepgées socio- légicas e psicoldgicas presentes na Psicologia Social. As concepgdes sociolégicas colocam a énfase da relagdo nos aspectos 7 as con- cepcdes. psicoldgicas colocam a énfase nos aspectos individuais, estabe- lecendo dicotomias. As implicag6es da visao dicot6mica sao: naturalizar fendmenos sociais (Gongalves e Bock, 2003; Gongalves e Bock, 2009; Gongalves, 2015a); desconsiderar os fenémenos sociais como tal, reduzindo-os a condicgao de mero contexto em que acontecem os fenémenos da indivi- dualidade; deixar de perceber as mediagGes que produzem, efetivamen- ‘os fenémenos sociais e que devem ser consideradas para sua trans- ociais, te, formacao. Torna-se necessario, entao, superar os limites de visdes subjetivistas e objetivistas, psicolégicas ou socioldgicas, e examinar a nogao de subje- tividade trabalhando sua compreensao como dialética subjetividade-ob- jetividade. Esse processo, compreendido de forma materialista historica e dialética, obriga a considerar dialeticamente a relagdo subjetividade- -objetividade e a relacao individuo-sociedade. Nesse sentido, a realidade social é vista como uma construcdo que resulta dessa imbricagao, em uma construgao social da realidade social.’ Para designar esse processo, utiliza-se a categoria dimensao subjetiva da realidade, a fim de indicar que se trata de uma dimensao constitutiva da realidade social. Nessa perspectiva, consideram-se subjetividade e objetividade como elementos contraditérios, mas insepardveis no processo. A nogao de contradicao vinda da dialética indica isso: 6 uma unidade de contrarios, que implica movimento e superacao; e o que resulta é algo objetivo e Subjetivo, ao mesmo tempo. Ou seja, uma realidade na qual a subjetivi- dade ganha objetividade e a objetividade se subjetiva. A compreenséo do sujeito deve ter isso presente. Mas também os fenédmenos sociais es 2. Esta formulacdo pretende dar conta da superagio de outra dicotomia, promovida por autores que " ra ue tentam superar a dicotomia individuo-sociedade: a construcao social da realidade el suckman) versus a construcéo da realidade social (Searle). Furtado (2002) faz essa Propondo sair dessa dicotomia pela via da historicidade. 38 PSMIAR © BOC, devem ser assim considerados, superando dicotomias e “referindo.. fa realidade: um Ambito subjetivo/do sujeito ¢ y, m ambitos diferentes d ambito objetivo /das coisas” (Goncalves e Bock, 2009, p. 141). uilacao tedrica, aponta-se para a relacdo individuo. Com essa form -sociedade procurando jdentificar os aspectos oriundos da relagao que terminam por constituir a propria tealidade, sem priorizar 0 Ambito do individuo ou o Ambito da sociedade. Isso que assim se identifica é 0 que se denomina dimensio subjetiva da realidade, categoria tedrica da Psicolo- gia Sécio-historica. A elaboragao dessa e de outras categorias tedricas tem, como dissemos anteriormente, o apoio das categorias metodolégicas da dialética materialista e histérica. Oaspecto fundamental dessa elaboragao é apontar para os produtos de natureza subjetiva que sao compartilhados no Ambito social, sem cair em reducionismos que levem a visdes psicologizantes da sociedade e da historia. Contudo, sem também deixar de reconhecer que SA0 0s sujeitos que, objetivamente, produzem a sociedade e a histéria. Dessa forma, evidencia-se que os fenémenos sociais sao marcados pela presenca dos hd neles uma dimensao subjetiva que é produzida, no capitalis- do valor-de-uso e o valor-de-troca. Assim, Se a sujeitos; mo, pela inversio da relacao como aponta Furtado (2011, p. 87): Este mecanismo de inversao, permitido pela relagao jé discutida de causa- lidade/teleologia/ontologia, produz um valor ético e estético descolado da propria realidade. A relacao necessidade/consumo, como apontou Heller (1986), mantém sua base econdmica (causalidade), mas subjetiva- mente é compreendida de outra forma e sua relacao material permanece ocultada por um viés ideol6gico. Toda produgao de valores e crencas, de referéncias simbélicas que fazem parte da realidade e, no caso do capita: lismo, justificam a forma aparente do consumo (e também nos convence da inversao) é 0 que chamamos de dimensfo subjetiva da realidade. Pee ede a ride pen nos remetermos as suas bases concretas rEabRIS) ee. a identificacao da mais-valia e real valor da fora de producio, Pa, ae uma insercao estranhada/ alienada nas relacdes de subjetivos de prod i false dicotomia entre os processos objetivos © Tece como BSeinde 3 la vida. A dimensao subjetiva da realidade ap le suas bases materiais. A nogao de liberdade, t#° ‘A. DIMENSAO SUBJETIVA DO PROCESSO EDUCACIONAL importante para justificar a Gemocracia) garante a ordem constituida no capitalismo eé uma crencga muito importante nas nossas relacées sociais, mas a base material de exploracao do trabalhador (a mais-valia) nega essa condicao. Assim, é preciso uma justificativa descolada do real pro- que se apresenta como a liberdade de procurar emprego. cesso objetivo, A cisao artificial entre o campo objetivo e subjetivo produz uma dimen- sao subjetiva da realidade que se apresenta contaminada pela ideologia e justifica as formas de dominagao. O objetivo das leituras criticas 6 o de superar visGes que separaram seu mundo social; é enfrentar concepg6es naturalizadas o individuo de idade humana e de sua presenga nos fendmenos eachistoricas da subjetiv: sociais, em um esforco de desnaturalizagao. ‘A forma de pesquisar deve ser coerente com essa compreensao do fendmeno. Partindo-se de uma leitura da realidade social e do sujeito materialista hist6rica e dialética, recorre-se as categorias metodoldgicas da dialética: totalidade, mediacao, singular-particular-universal para fazer a abordagem do real. Para isso, seguem-se as orientacdes da epistemologia qualitativa definida por Gonzdlez Rey (2005). O autor apresenta uma critica, na pesquisa em Psicologia, ao que chama de instrumentalismo (pesquisa li- mitada e definida pelas caracteristicas dos instrumentos de coleta de dados) e de epistemologia da resposta (quando uma concep¢ao objetivista produz respostas em funcao da forma como busca informagées, em vez de criar condigdes para o levantamento de aspectos das vivéncias sub- jetivas dos individuos). Gonzalez Rey discute também que essas posturas empiricistas desconsideram o papel da produgao teérica, a partir do trabalho de teflexao do pesquisador, 0 que termina por estabelecer dicotomias en- tre © empirico € 0 teGrico, entre a objetividade e a subjetividade, entre © objeto e o sujeito. Na direcéo de superar as dicotomias, enfatiza o oe Pee Petro do conhecimento, em que o dado como tal a pa ii fk nee ° qualy entretanto, 86 se configura mento, na Palicac Bese construcao S interpretacao do pensa- . Nessa perspectiva, as categorias tedricas Permitem, por um tr ‘abalho do pensai aes observa empiricamente. pensamento, dar visibilidade ao que se 40 AGUAR «Soc, A POSSIBILIDADE E A NECESSIDADE DA CRITICA Aperspectiva socio-histérica em Eeicologia Sareerase como uma perspectiva critica. Segundo Eariade (2009), é possivel dizer que ainda nao temos uma Psicologia critica e que a Beuoea eomente atingira esse estatuto quando ela for reconhecida como referéncia para 0 pensamenty critico em geral. Entretanto, entendemos que essa possibilidade est, sendo construida através da elaboracao dos recursos teérico-metodols- gicos da abordagem que apontam para a historicidade dos fenémenos sociais humanos, indicando que tudo que é como é poderia ser diferen- te. Ou seja, tudo que existe na vida social é fruto da atividade humana, desse homem, ele proprio, constituido social e historicamente. Esse ponto de partida, agregado das categorias que orientam o pensamento no movimento de desnaturalizacao, de busca da génese dos fenémenos, de reconhecimento das contradigdes que movimentam a realidade, permite uma leitura critica, propicia tomar a racionalidade produzida pela modernidade na sua possibilidade autorreflexiva, mas, para além disso, permite tomar a racionalidade como elemento da praxis histérica, em que a atividade é elemento fundante (Konder, 2000). Ou seja, os recursos da leitura materialista hist6rica e dialética e das proposigées, a partir disso, da perspectiva sécio-histérica, permitem uma leitura critica da realidade; ela é possivel. Para além disso, 6 uma leitura necesséria. Os filésofos limitaram-se a interpretar 0 mundo diferentemente, cabe transformé-lo (Marx, 1978). Sea Psicologia apenas descrever 0 que é observado ou enfocar o Individuo ee na i. de sua individualidade, ela teré uma agao conservadora, homem nao for Pie, — quaisquer que sejam as praticas decorrentes. Seo mas da histéria de re produto e produtor, nao s6 de sua histéria pessoal Sociedade, a Psicologia estard apenas reproduzindo as Condicoes necessria . i s para impedir a emergéncia das contradigées e a transfor Hacao social (Lane, 1984, p. 15), 78! radig ; ‘a DIMENSAO SUBIETIVA DO PROCESSO EDUCACIONAL +f REFERENCIAS K, A. M. B. GONGALVES, M. G. M. O sujeito e a dimensao subjetiva dos GONZALEZ-REY, F. L. (Org.). Subjetividade, complexidade e pesquisa em In: K ate Sao Paulo: Pioneira Thomson Learning, 2005. p. 109-26, FURTADO, Odair. ‘As dimensdes subjetivas da realidade — uma discussao sobre an entre a subjetividade e a objetividade no campo social. In: _; a NZALEZ-REY, Fernando (Orgs.). 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