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UNIFESP GUARULHOS - Nathalia Ekert Pegoraro - Vespertino - 135.

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1 – Escolha e comente dois aspectos do processo de construção da memória da Segunda


Guerra Mundial na França.

A França foi ocupada pela Alemanha durante a Segunda Guerra de 1940 a 1944, e a baixa
resistência e o colaboracionismo são questões que afligem a memória social francesa.
Na década de 1970 e 1980, a sociedade Ocidental passa por grandes instabilidades e
mudanças, principalmente com relação à questões de identidade nacional, e, nesse período,
são retomados assuntos que tratam da memória da nação e seus aspectos, sendo o Holocausto
um desses temas.
Luciana Heymann trabalha as questões de Identidades Nacionais e suas mudanças ocorridas
na sociedade Ocidental a partir dos anos 80, onde é possível encontrar identidades
insurgentes, que antes não foram incluídas na construção da História, e que agora buscam
espaço para reescrever e se inserir nela.
Nesse contexto, a revisitação do tema da construção da memória da Segunda Guerra Mundial
na França entra em foco desde os anos 70, e segue sendo trabalhado principalmente pela
segunda geração dos que tiveram participação e sofreram com a Segunda Guerra. Dessa
forma, Heymann trabalha o conceito do Dever de Memória que tange a reparação do
sofrimento e opressão dos que viveram diretamente o conflito, ligando diretamente o passado
com o presente onde a reparação seria feita pelo Estado aos grupos que possuíam um Direito
de Reparação. Assim, o Estado Francês cria leis para que ações de reparação possam ser
executadas, acionando os âmbitos político e judicial ao reconhecer a opressão sofrida por
certos grupos, como os Judeus e Armênios.
Uma das leis criadas foi a Lei Gayssot, que reconhece o Holocausto ao penalizar a negação
do extermínio de Judeus, bem como proibir discriminações por questões etnicas, raciais, de
nação ou religião. Esta lei fez parte das Leis Memoriais da França. O genocídio Armênio
também foi reconhecido e Políticas de Reparação foram acionadas pelo Estado.
Já o autor Andreas Huyssen trabalha com o surgimento da discussão de memória nos anos 80,
onde se percebia desconfortos no campo da memória, principalmente na França, uma vez que
sua participação na Segunda Guerra foi colaboracionista. Diante disso, Huyssen verifica o
desenvolvimento de práticas memorialistas voltadas para o desenvolvimento de uma sensação
de conforto, como por exemplo a nostalgia sendo comercializada. Huyssen também percebe a
retomada do tema do Holocausto durante esse período no campo cultural com o planejamento
do Museu do Holocausto nos Estados Unidos e também séries de televisão abordando o tema.
Assim, ele analisa como essa fato histórico passou a ser um modelo para se pensar em outras
situações de atrocidades, no rompimento com o Iluminismo e também o abandono da
humanidade presente no Holocausto.
Denise Rollemberg também trabalha a construção da memória da II Guerra na França a partir
dos “justos entre as nações”, pessoas ajudaram os judeus durante a Guerra. O Museu de Shoá
trouxe à tona a discussão sobre os anos 40, mexendo na questão de como foi e quando
começou a resistência francesa, separando sociedade e Estado.

2 – Sobre as consequências da Revolução Francesa no campo das antiguidades e dos


monumentos, Dominique Poulot afirmou em Uma história do patrimônio no Ocidente:
“(...)ao dar testemunho eloquente de um mundo fragmentado, o patrimônio assegurava
também a continuidade – de um passado regenerado a um futuro estabilizado. Ele podia
configurar a permanência dos valores e dos recursos diante da incerteza do futuro – com a
condição de não implicar o retorno ao antigo estado das coisas, perspectiva indubitavelmente
ameaçadora, e portanto, fundamentar-se na razão. A materialidade das coisas podia servir de
vínculo entre a história e a posteridade, encarnar uma lição do passado que corresponde à
afirmação dos princípios; ela era não tanto uma ameaça para a experiência revolucionária,
mas uma possibilidade de elaborar a definição abstrata da nação, ao manifestar sua realidade
concreta.” (p.89)
Comente esta afirmação fazendo uso do capítulo sobre a Revolução Francesa do livro
Alegoria do Patrimônio, de Françoise Choay.

Poulot, em sua citação, marca o patrimônio como a representação material do passado


- passado este que passa de um contexto instável e de crises sendo ressignificado para caber
em novos valores sociais que acompanham a sociedade - mantendo-o presente, porém, sem
riscos de retorno ao seu antigo estado devido às ressignificações trazidas pela Revolução.
Durante o período da Revolução Francesa, diversos monumentos e antiguidades
foram destruídos por alguns grupos que buscavam o rompimento com o Antigo Regime.
Sendo assim, são criadas as primeiras formas de proteção às antiguidades.
Françoise Choay, em seu livro Alegoria do Patrimônio, traz dois fatores importantes
que explicam a situação em que se encontravam os bens a serem protegidos no período da
Revolução. A primeira sendo a transferência de bens do clero e da Coroa para a nação através
do processo de regramento de herança, que passava pelo inventário e depois transmitido à
Nação de forma a ressignificar sua existência. E a segunda prática consistia em conter as
ações de vandalismo dos grupos e fazer inventários dos bens.
Dominique Poulot aborda o processo de transferência dos bens para se tornar
Patrimônio da nação francesa, e explica que nessa transferência ocorre também uma
ressemantização onde o bem em questão adquire um novo significado em relação ao seu
contexto e ideal de origem. Nesse processo os bens são catalogados em inventários, onde
passam a ter algum valor nacional, econômico ou educativo.
A Revolução Francesa também foi carregada dos ideais Iluministas, trazendo, assim,
uma perspectiva racional sobre o mundo que também refletiu na forma de encarar o
patrimônio, passando da mera conservação para, também, a valorização da sua diversidade e
riqueza, rompendo com o passado do Antigo Regime mas permitindo uma continuidade com
um passado comum dos franceses sem manter o sentimento de nostalgia ou de desejo de
retornar a este passado. Também para a questão educacional, o patrimônio é parte constituinte
da educação da aristocracia européia, principalmente com o avanço do Iluminismo que trouxe
os ideais de razão que transformaram a forma de observar o patrimônio como testemunhos do
passado, além de informarem sobre as técnicas construtivas utilizadas, de modo que o
patrimônio se torna um elemento de construção do nacional.

BIBLIOGRAFIA
CHOAY, Françoise. A Revolução Francesa. A alegoria do patrimônio. São Paulo: Estação
Liberdade/UNESP, 2001, p.76.
ROLLEMBERG, Denise. Aos grandes homens a pátria reconhecida: os ‘justos’ no Panteão.
IN: Angela de Castro Gomes (coord.). Direitos e cidadania: memória, política e cultura. Rio
de Janeiro, FGV, 2007, p.45-63.
HEYMANN, Luciana Quillet. O devoir de mémoire na França contemporânea: entre
memória, história, legislação e direitos. IN: Angela de Castro Gomes (coord.). Direitos e
cidadania: memória, política e cultura. Rio de Janeiro, FGV, 2007, p. 15-43.
HUYSSEN, Andreas. Seduzidos pela memória: arquitetura, monumentos, mídia. Rio de
Janeiro: Aeroplano, 2000.
POULOT, Dominique. Uma representação do saber e da memória. Uma história do
patrimônio
no Ocidente, séculos XVIII-XXI: do monumento aos valores. São Paulo: Estação Liberdade,
2009, p.39-70.

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