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ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO

CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA ADJUNTA DO COMANDO DA AERONÁUTICA

PARECER n. 00177/2022/COJAER/CGU/AGU

NUP: 67280.000231/2022-17
INTERESSADOS: VI COMAR
ASSUNTOS: DIREITO ADMINISTRATIVO E OUTRAS MATÉRIAS DE DIREITO PÚBLICO

EMENTA:
I. Direito Administrativo. Direito Penal e Direito Penal Militar. Consulta a respeito
das atribuições, competências e limites de atuação dos militares do Campo de
Provas Brigadeiro Velloso (CPBV), por ocasião de realização de missões
patrimoniais por parte de seu efetivo.
II. Considerações sobre o poder de polícia. Conceito. Sentido amplo e sentido
estrito. Polícia administrativa e polícia judiciária. Críticas à expressão "poder de
polícia". Exercício do poder de polícia administrativa das Forças Armadas.
Atribuições subsidiárias particulares de cada Força. Exercício do poder de polícia
judiciária militar. Dever de realização de prisão em flagrante. Necessidade de
comando legal. Ausência de dever amplo e genérico. Hipóteses restritas em que o
militar está obrigado a realizar a prisão em flagrante. Definição de crime
propriamente militar, crime impropriamente militar e crime militar por extensão.
III. Respostas aos questionamentos formulados pelo órgão assessorado.
Apreensão de natureza puramente administrativa, à qual compete ao próprio
Comando da Aeronáutica regulamentar internamente os procedimentos de
apreensão e seus consectários, inclusive dispondo a respeito da guarda,
alienação ou destruição de tais bens, com fulcro no art. 23, inciso XI e § 1º, do
Anexo I do Decreto nº 6.834/2009. Atuações administrativas que não competem
precipuamente às Forças Armadas, mas a outros órgãos públicos (por exemplo, a
apuração de infrações administrativas por condutas e atividades lesivas ao meio
ambiente, matéria regulamentada pela Instrução Normativa Conjunta
MMA/IBAMA/ICMBIO nº 1, de 12 de abril de 2021). Observância dos limites das
atribuições dessa Força Armada. Apreensão decorrente do poder de polícia
judiciária: só será realizada por militares da Aeronáutica em se tratando
de maquinário e equipamentos utilizados para a prática de crime militar. Crimes
ambientais previstos na Lei n° 9.605/1998 podem, teoricamente, vir a
constituir crimes militares, se realizados em área sob administração militar. Por
se tratar de crime militar, e não comum, não é o caso de formalizar boletim de
ocorrência em alguma delegacia de polícia, mas, sim, de instaurar o competente
inquérito policial militar (IPM). Quanto à destinação dos bens apreendidos,
dever-se-á observar o art. 25 da Lei n° 9.605/1998.
IV. Possibilidade de posse ou utilização do maquinário e dos equipamentos que já
estão no Campo de Provas Brigadeiro Velloso. N atureza de sua apreensão. Se o
bem foi apreendido pelo exercício do poder de polícia administrativa do próprio
Comando da Aeronáutica, em matéria de sua atribuição, competirá a ele
próprio regulamentar internamente os procedimentos de apreensão e seus
consectários. Se o bem foi apreendido por outro órgão público, no exercício do
seu poder de polícia administrativa, e então confiado em depósito ao Comando
da Aeronáutica, deve-se observar a regulamentação respectiva do ente
apreensor, e eventual solicitação de uso deverá ser dirigida a ele - no caso de
apreensão promovida pelos órgãos ambientais federais, por exemplo, a questão
é tratada pelo art. 134 do Decreto nº 6.514/2008. Por fim, em se tratando de
bens utilizados para a prática de crime militar, o art. 12, alínea "b", do Código de
Processo Penal Militar (CPPM) determina a sua imediata apreensão. Nesse caso,
o destino final dos bens apreendidos dependerá da natureza da sentença penal
transitada em julgado, se absolutória ou condenatória, nos termos dos arts. 196
e 197 do CPPM.
V. Atribuição para a lavratura de auto de prisão em flagrante. Em se tratando do
cometimento de crime militar - inclusive de crime militar por extensão, tal como
aquele cometido por civil contra o patrimônio sob a administração militar (art. 9º,
inciso III, alínea "a", do CPM) - impõe-se a realização da prisão em flagrante
delito, a teor do art. 243 do CPPM. Nesse caso, será realizada a lavratura de
auto de prisão em flagrante (APF) e a abertura de inquérito policial militar (IPM).
O procedimento para tanto, tal como o local de encarceramento do autor do fato
ou a forma de realização do exame de higidez física, será rigorosamente aquele
já utilizado pelo Organização Militar em questão quando da ocorrência de crime
militar em suas dependências. Caso se esteja diante de flagrante de crime
comum, convém relembrar inexistir o dever de os militares prenderem em
flagrante o autor do fato, por não ser atribuição própria das Forças Armadas
prover segurança pública (Parecer n. 00484/2019/CONJUR-MD/CGU/AGU, de 05 de
julho de 2019). Caso, ainda assim, se decida pela prisão em flagrante do infrator,
a sua condução à Polícia Federal ou à Polícia Civil estadual dependerá da
natureza da infração. Será atribuição da Polícia Federal lavrar o auto de prisão
em flagrante se se tratar de crime de competência da Justiça Federal ou quando
houver repercussão interestadual ou internacional que exija repressão uniforme
dos crimes previstos no art. 1º da Lei nº 10.446/2002. De outro lado, os crimes
de competência da Justiça Estadual serão, salvo na hipótese prevista na Lei nº
10.446/2002, encaminhados à Delegacia de Polícia Civil. A delegacia responsável
pela lavratura do auto de prisão em flagrante, como regra, será aquela da
comarca em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, naquela em
que for praticado o último ato de execução, na forma do art. 70, caput, do Código
de Processo Penal).
VI. Destinação de madeiras apreendidas por órgãos federais ambientais no bojo
de processos administrativos para apuração de infrações ambientais. Disposição
expressa a respeito, no art. 134, inciso II, do Decreto nº 6.514/2008. Assim, basta
que se formule requerimento à autoridade ambiental competente, no sentido de
que as madeiras por ela apreendidas possam ser utilizadas pela Administração
castrense, ou mesmo que lhe sejam doadas. Vale destacar que o requerimento
pode ter por objeto até mesmo madeiras apreendidas em outros lugares que não
a área sob administração militar, pois o Decreto nº 6.514/2008 não traz essa
limitação geográfica.

1. RELATÓRIO

1. Trata-se o presente de consulta jurídica encaminhada pelo Sexto Comando Aéreo Regional
(VI COMAR), por meio do Ofício nº 46/AJUR/265, de 31 de março de 2022 (Seq. 01), a respeito
das atribuições, competências e limites de atuação dos militares do Campo de Provas Brigadeiro
Velloso (CPBV), por ocasião de realização de missões patrimoniais por parte de seu efetivo. Aduz o
consulente:

2. Sobre o assunto, cumpre ressaltar que o CPBV possui extensa área patrimonial e
enfrenta problemas relacionados à grilagem de terra, ao garimpo ilegal e à extração ilegal
de madeiras com elevado valor comercial, bem como, a inexistência, em alguns trechos, de
delimitação física da área do COMAER, dificultando a fiel atuação por parte daquela OM.
3. Com a alteração da sede administrativa para o Município de Guarantã do Norte - MT,
publicada no BCA nº 028/2022 - Portaria GABAER nº 238/GC3, de 08 de FEV de 2022, as
dificuldades acerca da competência territorial se mostram uma crescente, e, tendo em
vista a OM não possuir Assessoria Jurídica própria, solicitou o devido assessoramento deste
Comando.
4. Por tratar-se de assunto sensível, envolvendo dentre outras, demandas oriundas da
esfera ambiental, com relevância e repercussão do tema para a Força, e em atenção ao
preconizado na DCA 19-4/2019, itens 2.1.2, "l", 4.1.3, faz-se necessário a remessa para
apreciação por parte dessa Consultoria.

2. O Ofício nº 12/DIR/465 (PDF1, Seq. 02), do Diretor do Campo de Provas Brigadeiro


Velloso (CPBV) traz ainda as seguintes informações:

2. Como é de conhecimento do Sr., o CPBV possui uma área patrimonial imensa


(aproximadamente 21.500 km² de área e um perímetro aproximado de 730 km) e,
conforme previsto em nosso ROCA, compete à OM zelar pela integridade da área, sob sua
responsabilidade, jurisdicionada ao COMAER.
3. Neste contexto, a OM enfrenta problemas relacionados à grilagem de terra, ao garimpo
ilegal e à extração ilegal de madeiras de alto valor comercial, sendo este último o problema
mais recorrente nos dias atuais.
4. Faz-se oportuno registrar que em muitos trechos a delimitação física da área do COMAER
não existe (não há cercas ou sinalização) e pode-se supor que o ingresso ocorreu de forma
não intencional. Todavia, em algumas partes os limites são claramente definidos (existem
cercas e sinalização) e mesmo assim ocorrem incursões em nossas áreas.
5. Neste sentido, com o intuito de coibir e dissuadir a ação desses contraventores, esta
Direção tem intensificado as ações de patrulhamento da área patrimonial, com o objetivo
de demonstrar presença e demover esses madeireiros ilegais de sua intenção de
ingressarem na área sob nossa responsabilidade. No entanto, pesam muitas dúvidas sobre
como devemos proceder nos casos de apreensão de material ou até mesmo de prisão de
pessoal.

3. A partir disso, encaminha-se, anexo, o documento "Questionamentos sobre as


Competências e os Limites de Atuação do Efetivo do CPBV" (PDF2, Seq. 02), em que se formulam quatro
quesitos a serem respondidos por esta Consultoria Jurídica:

1. No caso de apreendermos maquinário e equipamentos dentro da nossa área, como


devemos proceder? Precisamos registrar um boletim de ocorrência em alguma delegacia
de polícia? Em qual município? Existe a possibilidade de solicitar a posse do bem? Existe
algum tempo de “guarda” para essa solicitação? Quais são os procedimentos e a quem
devemos recorrer?
2. Em relação a maquinário e equipamentos que já estão no CPBV, existem alguns que já se
encontram em condição bastante deteriorada. Existe a possibilidade de solicitarmos a
posse do bem? Existe a possibilidade de utilizarmos esses equipamentos como alvos
táticos para o estande? A quem podemos fazer essas solicitações?
3. No caso de prendermos pessoas dentro da nossa área, em condição de flagrante delito,
como devemos proceder? Considerando que não possuímos xadrez para a guarda de
presos, realizamos o APF ou encaminhamos o indivíduo para alguma delegacia de polícia?
Em qual município? Se tivermos que realizar o APF, onde devemos realizar o exame de
higidez física?
4. No caso de apreensão de madeira, como devemos proceder? Podemos recolher e utilizar
esse material na OM? Seria possível “doar” esse material para outras OM da FAB ou outro
órgão público? No caso de madeiras que já estamos como fiel depositário, podemos
“doar” esse material para outras OM da FAB ou outro órgão público?

4. Foram remetidos à análise desta COJAER os seguintes documentos, que se encontram


digitalizados no sistema SAPIENS:

Ofício nº 46/AJUR/265, de 31 de março de 2022 (Seq. 01);


Ofício nº 12/DIR/465 (PDF1, Seq. 02); e
Documento "Questionamentos sobre as Competências e os Limites de Atuação do Efetivo
do CPBV" (PDF2, Seq. 02).

5. O presente processo deu entrada nesta Consultoria Jurídica-Adjunta no dia 1º de abril de


2022, tendo sido distribuído a este subscritor no dia 05/04/2022. Em razão da complexidade do assunto,
bem como de diversos processos a que se teve de dar prioridade no período, não restou plenamente
observado o prazo disposto no artigo 42 da Lei nº 9.784/99 e no Enunciado n° 14 do Manual de Boas
Práticas Consultivas da Advocacia-Geral da União.

6. Ademais, a questão do poder de polícia das Forças Armadas, análoga ao objeto da presente
consulta, já foi abordada por esta COJAER no Parecer nº 00114/2018/COJAER/CGU/AGU e no Parecer n.
00076/2019/COJAER/CGU/AGU. No presente opinativo, serão repisados os conceitos já firmados,
acrescentando-se a eles o tema específico ora em análise, como forma de enriquecer e traçar um
panorama mais completo do assunto em comento.

7. É o relatório.

2. FUNDAMENTAÇÃO

8. De início, convém destacar que compete à COJAER prestar consultoria sob o prisma
estritamente jurídico, não lhe competindo adentrar em aspectos relativos à conveniência e à
oportunidade da prática dos atos administrativos, que estão reservados à esfera discricionária do
administrador público competente, tampouco examinar questões de natureza eminentemente técnica,
administrativa e/ou financeira. Nos termos do Manual de Boas Práticas Consultivas da Advocacia-Geral
da União, Enunciado BPC nº 07:

Enunciado BPC nº 7: A manifestação consultiva que adentrar questão jurídica com potencial
de significativo reflexo em aspecto técnico deve conter justificativa da necessidade de fazê-
lo, evitando-se posicionamentos conclusivos sobre temas não jurídicos, tais como os
técnicos, administrativos ou de conveniência ou oportunidade, podendo-se, porém, sobre
estes emitir opinião ou formular recomendações, desde que enfatizando o caráter
discricionário de seu acatamento.

9. Ademais, entende-se que as manifestações da COJAER são de natureza opinativa e,


portanto, não são vinculantes para o gestor público, o qual pode, de forma justificada, adotar orientação
contrária ou diversa daquela emanada pela consultoria jurídica. Assim, o presente opinativo tem
natureza obrigatória, porém não vinculante.

3. BREVES COMENTÁRIOS SOBRE O TEMA OBJETO DA CONSULTA

10. Antes que se possa adentrar diretamente os questionamentos formulados, convém tecer
algumas noções a respeito do exercício de poder polícia administrativo e judiciário pelas Forças
Armadas, dos casos em que existe ou inexiste dever de realização de prisão em flagrante e da natureza
dos crimes cometidos em local sujeito à administração militar.

11. De início, merece menção uniformização de entendimento jurídico promovida em 2019 pela
Consultoria Jurídica junto ao Ministério da Defesa (CONJUR-MD) a respeito de áreas sob servidão militar.
Por ocasião da prolação do Parecer n. 00484/2019/CONJUR-MD/CGU/AGU, de 05 de julho de 2019 (anexo
ao presente), fixaram-se as seguintes conclusões:

66. De tudo quanto exposto, esta CONJUR-MD apresenta as seguintes conclusões:

i) segundo as regras da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, concluímos que


apenas a alínea "a" do art. 2º do Decreto-Lei nº 3.437/41 foi revogada tacitamente pelo
Decreto-Lei nº 9.760/46, de modo que o perímetro de 1.320 metros em torno dos
estabelecimentos militares continua a constituir área de servidão militar sobre a qual o
Estado (Forças Armadas) possui o direito real de gozo, em prol do interesse público ínsito à
função militar;
ii) é possível que as Forças Armadas promovam, na área de 1.320 metros ao redor dos
estabelecimentos militares, ações típicas de polícia administrativa, incidentes
sobre bens, direitos ou atividades, citando-se como exemplos: patrulhamento, fiscalização
de trânsito no perímetro da OM, com estabelecimento temporário de posições estáticas ao
longo do seu itinerário, junto aos limites das instalações militares, bem como o bloqueio dos
acessos ao quartel;

iii) como regra geral, é dever do Estado, por meio de suas autoridades policiais, realizar
prisões em flagrante delito quando ocorrem crimes comuns, estando tais autoridades
listadas no art. 144 da CF; por outro lado, aos militares compete efetuar prisões em
flagrante na hipótese de cometimento de crimes militares, nos termos do art. 7º e 243
do Código de Processo Penal Militar. Logo, dentro do contexto criminal militar, é possível a
condução de rondas externas (motorizadas e a pé) no perímetro da OM;

iv) prover segurança pública à sociedade não constitui atribuição própria das Forças
Armadas, razão pela qual o argumento de manutenção da ordem pública não enseja o
dever legal de realizar prisões em flagrante nos crimes comuns, mesmo quando ocorridos
em áreas de servidão militar, exceto quando se tratar de operações de Garantia de Lei e da
Ordem ou, ainda, quando do exercício das atribuições subsidiárias de que trata a Lei
Complementar nº 97/99;

v) o instrumento cabível para a regulamentação jurídica dessas áreas seria, eventualmente,


um ato de natureza normativa, sendo oportuno lembrar que já se encontra em elaboração
projeto de decreto presidencial visando estabelecer, para fins de proteção e garantia da
soberania nacional, as áreas de interesse da defesa e segurança nacional. O citado projeto
de decreto está em trâmite nos autos do NUP 60410.000207/2018-11; e

vi) orienta-se, como consequência das conclusões anteriores, a aplicação da seguinte tese
de uniformização: "O Decreto-Lei nº 3.437/41 encontra-se válido e vigente, tendo
sido revogada tacitamente pelo Decreto-Lei 9.760/46 apenas a alínea "a" do seu
art. 2º, de modo que a área de 1.320 metros em torno dos estabelecimentos
militares continua a constituir área de servidão militar, sobre a qual o Estado
(Forças Armadas) pode promover ações típicas de polícia administrativa, não lhes
competindo, todavia, o dever de efetuar prisões em flagrante nos crimes
comuns."

12. Nessa linha, passa-se ora à delineação de alguns conceitos fundamentais.

3.1 Considerações Prévias Sobre o Poder de Polícia

13. A doutrina aponta que a expressão "poder de polícia" possui duas acepções, uma ampla e
outra estrita. Em sentido amplo, o poder de polícia abrange toda ação estatal que vise a restringir a
liberdade e a propriedade, de forma a satisfazer necessidades coletivas, aí se incluindo a atividade
legislativa. Em sentido estrito, por sua vez, designa o exercício de função administrativa, exercida por
agente da Administração, que restringe e condiciona a liberdade e a propriedade. O poder de polícia
decorre da supremacia geral da Administração Pública, sendo aplicável a todos os particulares, sem a
necessidade de vínculo de natureza especial.

14. Carvalho Filho, baseado no sentido estrito da definição, conceitua o poder de polícia como
"a prerrogativa de direito público que, calcada na lei, autoriza a Administração Pública a restringir o uso
e o gozo da liberdade e da propriedade em favor do interesse da coletividade"[1].

15. O legislador pátrio, por sua vez, conceituou o poder de polícia no artigo 78 do Código
Tributário Nacional, ao tratar de fatos geradores de taxas, fazendo-o nos seguintes termos:

Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou
disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato,
em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes,
à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes
de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à
propriedade e aos direitos individuais ou coletivos.
Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando
desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do
processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso
ou desvio de poder.

16. Uma importante distinção a ser feita diz respeito às atividades de polícia administrativa e
polícia judiciária. A polícia administrativa é o que se denomina comumente "poder de polícia", incidindo
sobre atividades, bens e direitos dos indivíduos, exaurindo-se em si mesma e tendo caráter
eminentemente preventivo[2].

17. Já a polícia judiciária é atividade desenvolvida por corporações específicas (como as polícias
civil e federal), preparatória para a função jurisdicional penal, e incidente sobre indivíduos a quem se
atribui o cometimento de ilícitos penais, possuindo caráter eminentemente repressivo. Conforme
exemplifica Carvalho Filho[3]:

Vejamos um exemplo: quando agentes administrativos estão executando serviços de


fiscalização em atividades de comércio, ou em locais proibidos para menores, ou sobre as
condições de alimentos para consumo, ou ainda em parques florestais, essas atividades
retratam o exercício de Polícia Administrativa. Se, ao contrário, os agentes estão
investigando a prática de crime e, com esse objetivo, desenvolvem várias atividades
necessárias à sua apuração, como oitiva de testemunhas, inspeções e perícias em
determinados locais e documentos, convocação de indiciados etc., são essas atividades
caracterizadas como Polícia Judiciária, eis que, terminada a apuração, os elementos são
enviados ao Ministério Público para, se for o caso, providenciar a propositura da ação penal.

18. A partir disso, parcela da doutrina chega a criticar o uso da expressão "poder de polícia",
que confunde a atividade administrativa com a atividade policial, sugerindo outras nomenclaturas, como
"limitações administrativas à liberdade e à propriedade" ou "Administração ordenadora"[4].

19. Vê-se, pois, que, não obstante exista a atividade de polícia judiciária, a expressão "poder de
polícia" é muito mais associada à atividade administrativa que restringe e condiciona a liberdade e a
propriedade. Ademais, não há óbice a que as duas funções estejam concentradas em um só órgão,
como no caso da polícia militar, que exerce normalmente a polícia administrativa (patrulhamento das
vias públicas) ao mesmo tempo em que é polícia judiciária no tocante a crimes militares, conforme o
artigo 8º do Código de Processo Penal Militar[5].

3.2 Do Poder de Polícia Administrativa das Forças Armadas

20. As normas gerais de organização, preparo e emprego das Forças Armadas na Segurança e
Defesa Nacional estão previstas na Lei Complementar nº 97/1999, modificada pelas Leis
Complementares n° 117/2004 e n° 136/2010. O artigo 15, caput, do diploma normativo dispõe que o
emprego das Forças Armadas ocorrerá na defesa da Pátria e na garantia dos poderes constitucionais, da
lei e da ordem, e na participação em operações de paz, repetindo o mandamento constitucional previsto
no artigo 142, caput, da Lei Maior:

Art. 15. O emprego das Forças Armadas na defesa da Pátria e na garantia dos poderes
constitucionais, da lei e da ordem, e na participação em operações de paz, é de
responsabilidade do Presidente da República, que determinará ao Ministro de Estado da
Defesa a ativação de órgãos operacionais, observada a seguinte forma de subordinação:

21. Às três Forças foram atribuídas as funções de patrulhamento e revista de pessoas, de


veículos terrestres, de embarcações e de aeronaves, no caso delitos transfronteiriços e ambientais
cometidos na faixa de fronteira terrestre, no mar e nas águas interiores, conforme o artigo 16-A da Lei
Complementar. Trata-se de exercício de poder de polícia, na medida em que consubstancia atividade
ostensiva de fiscalização. O mesmo dispositivo trata, ainda, sobre o dever de o militar efetuar prisões
em flagrante delito, o que será abordado adiante.

22. Com relação especificamente à Marinha do Brasil, o artigo 17 da Lei Complementar lhe
designou uma série de atribuições subsidiárias particulares, dentre as quais destacam-se orientar e
controlar a Marinha Mercante e suas atividades correlatas, implementar e fiscalizar o cumprimento de
leis e regulamentos, no mar e nas águas interiores e prover a segurança da navegação aquaviária, todas
atividades de polícia administrativa.

Art. 17. Cabe à Marinha, como atribuições subsidiárias particulares:


I - orientar e controlar a Marinha Mercante e suas atividades correlatas, no que interessa à
defesa nacional;
II - prover a segurança da navegação aquaviária;
III - contribuir para a formulação e condução de políticas nacionais que digam respeito ao
mar;
IV - implementar e fiscalizar o cumprimento de leis e regulamentos, no mar e nas águas
interiores, em coordenação com outros órgãos do Poder Executivo, federal ou estadual,
quando se fizer necessária, em razão de competências específicas.
V – cooperar com os órgãos federais, quando se fizer necessário, na repressão aos delitos
de repercussão nacional ou internacional, quanto ao uso do mar, águas interiores e de
áreas portuárias, na forma de apoio logístico, de inteligência, de comunicações e de
instrução.
Parágrafo único. Pela especificidade dessas atribuições, é da competência do Comandante
da Marinha o trato dos assuntos dispostos neste artigo, ficando designado como
"Autoridade Marítima", para esse fim.

23. Para bem desenvolver suas atribuições, a Marinha dispõe da “Patrulha Naval” (PATNAV),
prevista no Decreto nº 5.129/2004, anteriormente designada "Patrulha Costeira". Trata-se de patrulha
preventiva e repressiva, caracterizando exercício de poder de polícia administrativa, conforme trecho
da Carta de Instrução PATNAV/Comando de Operações Navais n° 003/09 [6]:

A PATNAV e o Poder de Polícia: À PATNAV é reconhecido o necessário poder de polícia


administrativa para cumprir as atribuições subsidiárias determinadas pela Lei
Complementar em referência. Não se pode admitir a existência de um poder para
“implementar e fiscalizar o cumprimento de leis e regulamentos, no mar e nas águas
interiores, em coordenação com outros órgãos do Poder Executivo, federal ou estadual,
quando se fizer necessária, em razão de competências específicas” (Art. 17, inciso IV), sem
a contrapartida da tácita autorização para adotar providências, que o resultado da
fiscalização indicar.
Esse entendimento é corroborado pelo documento em referência l, no qual a Consultoria
Jurídica-Adjunta do Comando da Marinha (CJACM) manifestou-se favoravelmente a que o
navio em PATNAV poderá “exercer e desenvolver atividades executoras da lei, as quais se
caracterizam como poder de polícia administrativa e se concretizam na coibição de
condutas ilícitas que digam respeito à ocorrência de direitos que possam vir a ocorrer em
águas jurisdicionais brasileiras e em altomar.”.

24. No que diz respeito à Aeronáutica, cabem-lhe como atribuições subsidiárias particulares
aquelas definidas no artigo 18 da Lei Complementar nº 97/1999, em especial prover a segurança da
navegação aérea e patrulhar o espaço aéreo contra todos os tipos de tráfego aéreo ilícito, com ênfase
nos envolvidos no tráfico de drogas, armas, munições e passageiros ilegais:

Art. 18. Cabe à Aeronáutica, como atribuições subsidiárias particulares:


I - orientar, coordenar e controlar as atividades de Aviação Civil;
II - prover a segurança da navegação aérea;
III - contribuir para a formulação e condução da Política Aeroespacial Nacional;
IV - estabelecer, equipar e operar, diretamente ou mediante concessão, a infra-estrutura
aeroespacial, aeronáutica e aeroportuária;
V - operar o Correio Aéreo Nacional.
VI – cooperar com os órgãos federais, quando se fizer necessário, na repressão aos delitos
de repercussão nacional e internacional, quanto ao uso do espaço aéreo e de áreas
aeroportuárias, na forma de apoio logístico, de inteligência, de comunicações e de
instrução;
VII - preservadas as competências exclusivas das polícias judiciárias, atuar, de maneira
contínua e permanente, por meio das ações de controle do espaço aéreo brasileiro, contra
todos os tipos de tráfego aéreo ilícito, com ênfase nos envolvidos no tráfico de drogas,
armas, munições e passageiros ilegais, agindo em operação combinada com organismos de
fiscalização competentes, aos quais caberá a tarefa de agir após a aterragem das
aeronaves envolvidas em tráfego aéreo ilícito, podendo, na ausência destes, revistar
pessoas, veículos terrestres, embarcações e aeronaves, bem como efetuar prisões em
flagrante delito.
Parágrafo único. Pela especificidade dessas atribuições, é da competência do Comandante
da Aeronáutica o trato dos assuntos dispostos neste artigo, ficando designado como
‘Autoridade Aeronáutica Militar’, para esse fim.

25. Trata-se de exercício de poder de polícia administrativa pela Força Aérea, que pode ser
exercido, inclusive com uso de medida de destruição ("tiro e destruição" ou "abate"), nos termos do
artigo 303, § 2º, da Lei nº 7.565/86, com redação dada pela Lei nº 9.614/98.

3.3 Do Poder de Polícia Judiciária das Forças Armadas

26. À polícia judiciária compete a elaboração do inquérito policial e a coleta de informações que
embasarão o exercício da função jurisdicional penal. Consiste na longa manus dos órgãos que viabilizam
a persecução penal, como o Ministério Público e o Poder Judiciário. Conforme ensina Nestor Távora [7]:

Da atuação repressiva, que age, em regra, após a ocorrência de infrações, visando angariar
elementos para apuração da autoria e constatação da materialidade delitiva. Neste
aspecto, destacamos o papel da Polícia Civil que deflui do artigo 144, §4º, da Constituição
Federal, verbis: “as polícias civis, dirigidas por delegados de carreira, incumbem,
ressalvada a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de
infrações penais, exceto as militares”. No que nos interessa, a polícia judiciária tem a
missão primordial de elaboração do inquérito policial. Incumbirá ainda à autoridade policial
fornecer às autoridades judiciárias as informações necessárias a instrução e julgamento
dos processos; realizar as diligencias requisitadas pelo juiz ou pelo Ministério Público;
cumprir os mandados de prisão e representar, se necessário for, pela decretação de prisão
(artigo 13 do Código de Processo Penal).

27. Maria Sylvia Di Pietro [8], lecionando sobre a diferença entre a polícia administrativa e a
polícia judiciária, esclarece ainda que esta última é privativa de determinadas corporações
especializadas, enquanto aquela está espraiada por diversos órgãos da Administração Pública:

Outra diferença: a polícia judiciária é privativa de corporações especializadas (polícia civil e


militar), enquanto a polícia administrativa se reparte entre diversos órgãos da
Administração, incluindo além da própria polícia militar, os vários órgãos de fiscalização aos
quais a lei atribua esse mister, como os que atuam nas áreas de saúde, educação,
trabalho, previdência e assistência social.

28. Conforme o artigo 144, § 1º, inciso IV, é a polícia federal o órgão permanente e organizado a
quem compete exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União. Logo, não podem
as Forças Armadas exercer esse mister no que concerne aos crimes comuns.

29. Já a Polícia Judiciária Militar foi instituída em 1895, por regulamento do Supremo Tribunal
Militar, com o nome de Conselho de Investigação[9]. Posteriormente, o Código de Processo Penal Militar
(Decreto-Lei nº 1.002, de 21 de outubro de 1969), em seus artigos 7º e 8º, especificou quais
autoridades exercerão a função de polícia judiciária militar e quais são suas competências. Conforme se
percebe pela leitura de tais dispositivos, o exercício do poder de polícia judiciária militar está restrito a
crimes militares e àqueles sujeitos a jurisdição militar, bem como às atividades de apoio à Justiça Militar.

30. Assim, exemplificativamente, o exercício do poder de polícia judiciária militar permite a


revista pessoal (art. 181 do CPPM) e a revista independentemente de mandado (art. 182 CPPM). Repise-
se, porém, que às Forças somente é concedido o poder de polícia judiciária militar, restrito aos
procedimentos regidos pelo CPPM, e não o poder de polícia judiciária comum.

3.4 Da Prisão em Flagrante Delito

31. A diferenciação entre as atividades de polícia administrativa e de polícia judiciária é de


pouca valia quando se cogita a existência de dever legal de realização de prisão em flagrante. Isso
porque ambas as modalidades do poder de polícia atuam, de formas diversas, na segurança pública.
Conforme Moreira Neto[10]:

O Estado atua na prevenção (precedendo o rompimento da ordem pública) e na repressão


(sucedendo o rompimento da ordem pública) desempenhando funções de polícia de ordem
pública. Também atua no desempenho da função de polícia judiciária, quando da
preparação da repressão penal.
Daí decorrem as duas modalidades de polícia que atuam na segurança pública: a polícia
administrativa de ordem pública e a polícia judiciária, cada uma delas desempenhando
funções distintas e definidas, embora possam estar cumuladas na mesma instituição, tudo
dependendo dos critérios do legislador.

32. De fato, a polícia de segurança é composta pela polícia ostensiva e pela polícia judiciária. A
primeira visa a preservar a ordem pública, através de medidas preventivas, constituindo exercício de
poder de polícia administrativa. Já a segunda apura e investiga as infrações penais, fornecendo
elementos ao Ministério Público para a propositura da ação penal.

33. O dever de realizar a prisão em flagrante, por seu turno, decorre de determinação legal
expressa, não estando necessariamente imbricado ao exercício do poder de polícia (administrativa ou
judiciária). A partir disso, o Código de Processo Penal Militar, em seu artigo 243, designa as pessoas
responsáveis por efetuar a prisão em flagrante, verbis:

Pessoas que efetuam prisão em flagrante


Art. 243. Qualquer pessoa poderá e os militares deverão prender quem fôr insubmisso ou
desertor, ou seja encontrado em flagrante delito.

34. Esse comando fixa um dever jurídico para os militares, estando inserido dentro do estrito
contexto do processo penal militar, conforme dita o artigo 1º do mesmo Codex: "Art. 1º O processo
penal militar reger-se-á pelas normas contidas neste Código, assim em tempo de paz como em tempo
de guerra, salvo legislação especial que lhe fôr estritamente aplicável".

35. Logo, o dever do militar de efetuar a prisão em flagrante, nos moldes previstos no CPPM,
está adstrito aos crimes cuja persecução penal ocorrerá sob as balizas do processo penal militar. Vale
dizer: não se pode estender esse dever legal para fora das hipóteses cujo procedimento é regulado pelo
CPPM.

36. No processo penal comum, por sua vez, as pessoas responsáveis por efetuar a prisão em
flagrante delito são designadas no Código de Processo Penal (Decreto-Lei nº 3.689, de 03 de outubro de
1941), em cujo artigo 301 consta:

Art. 301. Qualquer do povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão
prender quem quer que seja encontrado em flagrante delito.

37. Pela dicção legal, somente têm o dever legal de realizar a prisão em flagrante delito as
"autoridades policiais e seus agentes". Trata-se do que a doutrina chama de "flagrante necessário" ou
"flagrante obrigatório", sendo certo que as instituições policiais estão arroladas no artigo 144 da
Constituição da República, dentre as quais não se encontram as Forças Armadas.

38. Ainda que as Forças possam, excepcionalmente, participar da segurança pública - em


operações de garantia da lei e da ordem, por exemplo -, seu dever primário é a defesa da Pátria e
a garantia dos poderes constitucionais. Caso a lei processual penal quisesse lhes impor o mesmo dever
que o das corporações policiais, deveria fazê-lo expressamente.

39. Ademais, interpretar que as Forças Armadas estejam contidas na expressão "autoridade
policial" é estender por demais o conceito legal, criando um dever jurídico não previsto pelo legislador.
Mais do que isso: entender que haveria dever legal do militar de realizar a prisão em flagrante teria
como consequência lógica a imputação do crime de prevaricação (artigo 319 do Código Penal Militar)
para o membro das Forças Armadas que testemunhasse a ocorrência de uma infração penal comum e
nada fizesse.

40. Essa tese acabaria por levar a situações inusitadas, já que militares não têm o treinamento
necessário para o enfrentamento da criminalidade urbana, nem - muitas vezes - os meios materiais de
fazê-lo. Não obstante, estariam obrigados a confrontar e prender os criminosos cujas atividades ilícitas
testemunhassem, sob pena de sofrerem, eles mesmos, persecução penal por prevaricarem.

41. Não bastasse isso, o próprio legislador definiu, nas hipótese de delitos transfronteiriços e
ambientais cometidos na faixa de fronteira terrestre, no mar e nas águas interiores, o dever do militar
de realizar prisões em flagrante, em reforço à ideia de que só existe tal dever quando a lei dispuser
expressamente. Conforme dispõe o artigo 16-A, inciso III, da Lei Complementar nº 97/1999 (destacou-
se):

Art. 16-A. Cabe às Forças Armadas, além de outras ações pertinentes, também como
atribuições subsidiárias, preservadas as competências exclusivas das polícias judiciárias,
atuar, por meio de ações preventivas e repressivas, na faixa de fronteira terrestre, no
mar e nas águas interiores, independentemente da posse, da propriedade, da finalidade
ou de qualquer gravame que sobre ela recaia, contra delitos transfronteiriços e
ambientais, isoladamente ou em coordenação com outros órgãos do Poder Executivo,
executando, dentre outras, as ações de:
(...)
III - prisões em flagrante delito.

42. Por interpretação sistemática, se a lei pinçou uma determinada hipótese e determinou que,
em ocorrendo, haverá o dever de o militar realizar a prisão em flagrante, não se pode concluir por um
dever genérico de o membro das Forças realizar a prisão em flagrante em qualquer caso. Nesse mesmo
sentido foi o Parecer n. 00484/2019/CONJUR-MD/CGU/AGU, de 05 de julho de 2019:

iii) como regra geral, é dever do Estado, por meio de suas autoridades policiais, realizar
prisões em flagrante delito quando ocorrem crimes comuns, estando tais autoridades
listadas no art. 144 da CF; por outro lado, aos militares compete efetuar prisões em
flagrante na hipótese de cometimento de crimes militares, nos termos do art. 7º e 243
do Código de Processo Penal Militar. Logo, dentro do contexto criminal militar, é possível a
condução de rondas externas (motorizadas e a pé) no perímetro da OM;

iv) prover segurança pública à sociedade não constitui atribuição própria das Forças
Armadas, razão pela qual o argumento de manutenção da ordem pública não enseja o
dever legal de realizar prisões em flagrante nos crimes comuns, mesmo quando ocorridos
em áreas de servidão militar, exceto quando se tratar de operações de Garantia de Lei e da
Ordem ou, ainda, quando do exercício das atribuições subsidiárias de que trata a Lei
Complementar nº 97/99;

43. Percebe-se, pois, não existir um dever amplo e genérico de os militares realizarem a prisão
em flagrante delito em crimes comuns, não se podendo interpretar a expressão "autoridades policiais e
seus agentes", contida no artigo 301 do CPP, de forma tão ampla que os abranja. Nas estritas hipóteses
em que o legislador quis impor tal dever aos membros das Forças, ele o fez expressamente, seja por
meio do art. 243 do CPPM (restrito ao processo penal militar), seja por meio do art. 16-A, inciso III, da Lei
Complementar nº 97/1999 (limitado a delitos transfronteiriços e ambientais cometidos na faixa de
fronteira terrestre, no mar e nas águas interiores).

3.5 Dos Crimes Militares por Extensão

44. Até o advento da Lei n° 13.491/17, somente eram considerados crimes militares aqueles
especificamente previstos no Código Penal Militar (Decreto-Lei nº 1.001, de 21 de outubro de 1969),
podendo eles serem crimes militares próprios (que só poderiam ser cometidos por militares) ou
impróprios (que poderiam ser cometidos por militares ou civis).

45. Aponta a doutrina que a Lei n° 13.491/17, ao lado da tradicional classificação entre os
crimes militares próprios e os crimes militares impróprios, acrescentou os crimes militares por extensão,
tipos penais previstos na legislação comum, que, não obstante, podem vir a configurar crimes militares.
Nas palavras de Ronaldo Roth[11]:

O legislador, ao alterar o artigo 9º do CPM, teve a inequívoca in tenção de incluir no rol de


crimes militares os crimes previstos na legislação penal comum (Código Penal e leis
extravagantes) praticados pelo militar da ativa (inciso II do art. 9º, CPM) e pelo militar da
reserva e/ou reformado, ou civil (inciso III do art. 9º, CPM), conforme as
circunstâncias previstas nas alíneas dos incisos II e III do art. 9º do CPM.
Essa nova categoria de crimes militares, instituída pela Lei 13.491/17, constitui-se, como já
dissemos, nos crimes militares por extensão, a qual, sem alterar a tradicional divisão dos
crimes militares existente antes do advento da referida Lei – consistente nos crimes
militares próprios (exclusivamente previstos no CPM) e os crimes militares impróprios
(previstos com igual definição no Código Penal Comum e no Código Penal Militar) –, passa a
conviver doutrinariamente para o melhor estudo do crime militar.
A manutenção, a nosso ver, dessa tríplice classificação do crime militar diante do advento
da novel lei permitirá atingir com mais precisão a segurança jurídica desejada, pois, no
exame dos rígidos critérios do artigo 9º, inciso II, do CPM, se alcançará a distinção do crime
militar em relação ao crime comum.
Destarte, a nova lei traz a possibilidade de outros tipos penais – estranhos aos CPM – serem
de competência da JMU e da JME, porquanto se considerarão crimes militares se praticados
nas hipóteses do inciso II do art. 9º do CPM, como, por exemplo, aqueles previstos na
legislação comum se praticados em serviço ou em razão da função (art. 9º, II, alínea “c”,
CPM) ou se praticados no interior de local sob administração militar (art. 9º, II, alínea “b”,
CPM), tais quais: o crime de abuso de autoridade (Lei 4.898/65); os crimes de tortura (Lei
9.455/97), os crimes ambientais (arts. 29/69-A da Lei 9.605/98); (...)
Os exemplos acima já nos revelam a dimensão do quanto a competência das Justiças
Militares – da União (JMU) e dos Estados (JME) – foi ampliada, de forma que, agora, as
instituições militares por seus mecanismos de prevenção e repressão ao crime, em especial
de seus integrantes, serão mais atuantes na repressão dos crimes militares, pois se o
militar vier a praticar crime militar – não só os já previstos no CPM, mas também os crimes
militares por extensão – será incumbência da Polícia Judiciária Militar (PJM – arts. 7º e 8º do
Código de Processo Penal Militar – CPPM), por meio do Inquérito Policial Militar (IPM – art. 9º
a 28 CPPM) ou do Auto de Prisão em Flagrante Delito Militar (APFD – art. 243 a 251, CPPM),
reprimir o crime exercendo a persecução penal, na fase da polícia, correspondentemente,
tudo com amparo constitucional (art. 144, § 4º, in fine).
(grifo no original)

46. Com isso, quaisquer outros crimes previstos em legislação extravagante passaram a poder,
ao menos potencialmente, configurar crimes militares. Conforme recente publicação doutrinária na
Revista do Conselho Nacional do Ministério Público[12]:

No que atine à capitulação dos crimes militares ambientais no art. 9º do CPM, a posição
majoritária é no sentido de enquadrar o delito ambiental praticado por militar da ativa “na
hipótese da alínea 'e' do inciso II do art. 9º do Código Penal Militar, que demanda seja o
delito praticado ‘contra o patrimônio sob a administração militar’, já que todas as demais
alíneas do referido inciso II descrevem crimes cometidos contra pessoas físicas” (STJ, CC
162.248, Rel. Min. Reynaldo Soares das Fonseca, DP 04/12/2018, grifo acrescentado).
Na hipótese de a autoria do delito militar ambiental ser atribuída a civil, a capitulação do
crime migrará para a alínea “a” do inciso III do art. 9º (“contra o patrimônio sob a
administração militar, ou contra a ordem administrativa militar”). A exemplo, cita-se caso
de civil que furta areia acondicionada em área sujeita à administração militar, CPM), em
concurso formal com o crime militar ambiental previsto no art. 44 da Lei 9.605/1998 c/c art.
9º, III, “a”, do CPM.
(...)
São, pois, crimes militares ambientais passíveis de acontecer na faixa de fronteira os de
tráfico de plantas e de animais, bem como os que importem em atos lesivos ao meio
ambiente – com previsão na Lei de Crimes Ambientais (Lei 9.605/1998), no Código Florestal
(Lei 12.651/2012) e no Código de Proteção à Fauna (Lei 5.197/1967).

47. Tem-se, pois, que crimes ambientais, por exemplo, podem vir a ser considerados
crimes militares, se cometidos por militar em situação de atividade ou assemelhado, em
lugar sujeito à administração militar (art. 9º, inciso II, alínea "b", do CPM) ou se praticados
por militar da reserva, ou reformado, ou por civil, contra o patrimônio sob a administração
militar (art. 9º, inciso III, alínea "a", do CPM).

4. DA RESPOSTA AOS QUESTIONAMENTOS FORMULADOS

48. Vencida a explanação preliminar de conceitos jurídicos fundamentais para se dirimirem as


dúvidas levantadas, passa-se à resposta pontual dos quesitos formulados.

4.1 Procedimentos quando da apreensão de maquinário e equipamentos

49. O primeiro questionamento formulado foi o seguinte:

No caso de apreendermos maquinário e equipamentos dentro da nossa área, como


devemos proceder? Precisamos registrar um boletim de ocorrência em alguma delegacia de
polícia? Em qual município? Existe a possibilidade de solicitar a posse do bem? Existe algum
tempo de “guarda” para essa solicitação? Quais são os procedimentos e a quem devemos
recorrer?

50. Para o correto enfrentamento dessa questão, há que se diferenciar, preliminarmente, a


apreensão decorrente do poder de polícia administrativa (por exemplo, no caso de maquinário lícito, mas
que foi abandonado em área militar) daquela decorrente do poder de polícia judiciária (por exemplo, no
caso de equipamento utilizado para cortar árvores em floresta considerada de preservação permanente,
sem permissão da autoridade competente, crime previsto no art. 39 da Lei n° 9.605/1998).

51. Em se tratando de apreensão de natureza puramente administrativa, compete ao


próprio Comando da Aeronáutica regulamentar internamente os procedimentos de
apreensão e seus consectários, inclusive dispondo a respeito da guarda, alienação ou
destruição de tais bens, com fulcro no art. 23, inciso XI e § 1º, do Anexo I do Decreto nº
6.834/2009:

Art. 23. Ao Comandante da Aeronáutica, além das atribuições previstas na legislação em


vigor e consoante as diretrizes do Ministro de Estado da Defesa, incumbe:
(...)
XI - aprovar regulamentos do Comando da Aeronáutica;
(...)
§ 1o O Comandante da Aeronáutica poderá delegar, admitida a subdelegação,
competência para a prática de atos administrativos, na forma da legislação em vigor.

52. Vale ressaltar, no entanto, que existem atuações administrativas que não
competem precipuamente às Forças Armadas, mas a outros órgãos públicos. Mencione-se, a
título de exemplo, a apuração de infrações administrativas por condutas e atividades lesivas
ao meio ambiente, matéria regulamentada pela Instrução Normativa Conjunta
MMA/IBAMA/ICMBIO nº 1, de 12 de abril de 2021. Nesse âmbito, não compete ao Comando da
Aeronáutica a expedição de qualquer regulamentação, por não se tratar de matéria de sua
competência. Logo, eventual regulamentação de apreensões administrativas no âmbito da
Força Aérea Brasileira deverá observar os limites das atribuições dessa Força Armada.

53. No que concerne à apreensão decorrente do poder de polícia judiciária, ela só


será realizada por militares da Aeronáutica em se tratando de maquinário e equipamentos
utilizados para a prática de crime militar. Contudo, conforme já explanado acima, a Lei n°
13.491/17 trouxe os crimes militares por extensão, tipos penais previstos na legislação comum, que, não
obstante, podem vir a configurar crimes militares, inclusive os crimes ambientais praticados por civis,
contra o patrimônio sob a administração militar (art. 9º, inciso III, alínea "a", do CPM).

54. Assim, quaisquer dos crimes ambientais previstos na Lei n° 9.605/1998 podem,
teoricamente, vir a constituir crimes militares, se realizados em área sob administração
militar. Por se tratar de crime militar, e não comum, não é o caso de formalizar boletim de
ocorrência em alguma delegacia de polícia, mas, sim, de instaurar o competente inquérito
policial militar (IPM). Quanto à destinação dos bens apreendidos, dever-se-á observar o art.
25 da Lei n° 9.605/1998:

Art. 25. Verificada a infração, serão apreendidos seus produtos e instrumentos, lavrando-se
os respectivos autos.
§ 1o Os animais serão prioritariamente libertados em seu habitat ou, sendo tal medida
inviável ou não recomendável por questões sanitárias, entregues a jardins zoológicos,
fundações ou entidades assemelhadas, para guarda e cuidados sob a responsabilidade de
técnicos habilitados.
§ 2o Até que os animais sejam entregues às instituições mencionadas no § 1o deste artigo,
o órgão autuante zelará para que eles sejam mantidos em condições adequadas de
acondicionamento e transporte que garantam o seu bem-estar físico.
§ 3º Tratando-se de produtos perecíveis ou madeiras, serão estes avaliados e doados a
instituições científicas, hospitalares, penais e outras com fins beneficentes.
§ 4° Os produtos e subprodutos da fauna não perecíveis serão destruídos ou doados a
instituições científicas, culturais ou educacionais.
§ 5º Os instrumentos utilizados na prática da infração serão vendidos, garantida a sua
descaracterização por meio da reciclagem.

55. Por cautela, mencione-se que o Supremo Tribunal Federal, na Arguição de Descumprimento
de Preceito Fundamental (ADPF) nº 640, decidiu que a a Constituição Federal não autoriza abate de
animais apreendidos em situação de maus tratos. Conforme constou do recente Acórdão, publicado em
17/12/2021:

1. No caso, demonstrou-se a existência de decisões judiciais autorizando o abate de


animais apreendidos em situação de maus-tratos, em interpretação da legislação federal
que viola a norma fundamental de proteção à fauna, prevista no art. 225, §1º, VII, da CF/88.
A resistência dos órgãos administrativos à pretensão contida à inicial também demonstra a
relevância constitucional da questão, o que justifica o conhecimento da ação.
(...)
4. O art. 225, §1º, VII, da CF/88, impõe a proteção à fauna e proíbe qualquer espécie de
maus-tratos aos animais, de modo a reconhecer o valor inerente a outras formas de vida
não humanas, protegendo-as contra abusos. Doutrina e precedentes desta Corte .
5. As normas infraconstitucionais sobre a matéria seguem a mesma linha de raciocínio,
conforme se observa do art. 25 da Lei 9.605/98, do art. art. 107 do Decreto 6.514/2008 e
art. 25 da Instrução Normativa nº 19/2014 do IBAMA.
6. Ação julgada procedente para declarar a ilegitimidade da interpretação dos arts. 25, §§1º
e 2º da Lei 9.605/1998, bem como dos artigos 101, 102 e 103 do Decreto 6.514/2008 e
demais normas infraconstitucionais, em sentido contrário à norma do art. 225, §1º, VII, da
CF/88, com a proibição de abate de animais apreendidos em situação de maus-tratos.

4.2 Utilização de maquinário e equipamentos apreendidos

56. O segundo dos quesitos formulados foi o seguinte:

Em relação a maquinário e equipamentos que já estão no CPBV, existem alguns que já se


encontram em condição bastante deteriorada. Existe a possibilidade de solicitarmos a
posse do bem? Existe a possibilidade de utilizarmos esses equipamentos como alvos táticos
para o estande? A quem podemos fazer essas solicitações?

57. Para responder sobre a possibilidade de posse ou utilização do maquinário e dos


equipamentos que já estão no Campo de Provas Brigadeiro Velloso, é necessário também
aferir a natureza de sua apreensão, se foi em decorrência do poder de polícia administrativo (do
próprio Comando da Aeronáutica ou de outro órgão público) ou do poder de polícia judiciária militar.

58. Se o bem foi apreendido pelo exercício do poder de polícia administrativa do


próprio Comando da Aeronáutica, em matéria de sua atribuição, competirá a ele
próprio regulamentar internamente os procedimentos de apreensão e seus consectários,
inclusive dispondo a respeito da guarda, alienação ou destruição de tais bens, com fulcro no art. 23,
inciso XI e § 1º, do Anexo I do Decreto nº 6.834/2009, como já visto.

59. Se o bem foi apreendido por outro órgão público, no exercício do seu poder de
polícia administrativa, e então confiado em depósito ao Comando da Aeronáutica, deve-se
observar a regulamentação respectiva do ente apreensor, e eventual solicitação de uso
deverá ser dirigida a ele. No caso de apreensão promovida pelos órgãos ambientais federais,
por exemplo, a questão é tratada pelo art. 134 do Decreto nº 6.514/2008, in verbis :

Art. 134. Após decisão que confirme o auto de infração, os bens e animais apreendidos
que ainda não tenham sido objeto da destinação prevista no art. 107, não mais retornarão
ao infrator, devendo ser destinados da seguinte forma:
(...)
II - as madeiras poderão ser doadas a órgãos ou entidades públicas, vendidas ou utilizadas
pela administração quando houver necessidade, conforme decisão motivada da autoridade
competente;
(...)
V - os demais petrechos, equipamentos, veículos e embarcações descritos no inciso IV do
art. 72 da Lei nº 9.605, de 1998, poderão ser utilizados pela administração quando houver
necessidade, ou ainda vendidos, doados ou destruídos, conforme decisão motivada da
autoridade ambiental;

60. Mencione-se também a Instrução Normativa Conjunta MMA/IBAMA/ICMBIO nº 1, de 12 de


abril de 2021, que dispõe:

Art. 27. O depósito de bem apreendido deverá ser confiado a pessoa natural ou a órgãos e
entidades de caráter ambiental, beneficente, científico, cultural, educacional, hospitalar,
penal ou militar.
(...)
§ 3º O bem confiado em depósito não poderá ser utilizado pelo depositário, salvo o uso
lícito de veículos e embarcações pelo próprio autuado.

Art. 28. O órgão ambiental federal autuante poderá utilizar o bem apreendido:
(...)

IV - quando a sua conservação depender de funcionamento periódico de seus motores ou


demais mecanismos, atestada tal necessidade por profissional competente, quando
recomendável.
Parágrafo único. Na hipótese do inciso IV, o órgão ambiental federal autuante poderá
autorizar o uso do bem pelo depositário, desde que se comprometa com a sua utilização
para fins exclusivamente institucionais e mediante a sua manutenção.

61. Por fim, em se tratando de bens utilizados para a prática de crime militar, o art.
12, alínea "b", do Código de Processo Penal Militar (CPPM) determina a sua imediata
apreensão (realizada pelos próprios militares do Comando da Aeronáutica, como decorrência do poder
de polícia judiciária militar):

Art. 12. Logo que tiver conhecimento da prática de infração penal militar, verificável na
ocasião, a autoridade a que se refere o § 2º do art. 10 deverá, se possível:
(...)
b) apreender os instrumentos e todos os objetos que tenham relação com o fato;

62. Nesse caso, o destino final dos bens apreendidos dependerá da natureza da
sentença penal transitada em julgado, se absolutória ou condenatória, nos termos dos arts.
196 e 197 do CPPM:

Sentença condenatória
Art. 196. Decorrido o prazo de noventa dias, após o trânsito em julgado de sentença
condenatória, proceder-se-á da seguinte maneira em relação aos bens apreendidos:

Destino das coisas


a) os referidos no art. 109, nº II, letra a , do Código Penal Militar, serão inutilizados ou
recolhidos a Museu Criminal ou entregues às Fôrças Armadas, se lhes interessarem;
b) quaisquer outros bens serão avaliados e vendidos em leilão público, recolhendo-se ao
fundo da organização militar correspondente ao Conselho de Justiça o que não couber ao
lesado ou terceiro de boa-fé.

Destino em caso de sentença absolutória


Art. 197. Transitando em julgado sentença absolutória, proceder-se-á da seguinte maneira:
a) se houver sido decretado o confisco (Código Penal Militar, art. 119), observar-se-á o
disposto na letra a do artigo anterior;
b) nos demais casos, as coisas serão restituídas àquele de quem houverem sido
apreendidas.

4.3 Procedimentos quando das prisões em flagrante delito

63. A terceira indagação do órgão consulente foi a seguinte:

No caso de prendermos pessoas dentro da nossa área, em condição de flagrante delito,


como devemos proceder? Considerando que não possuímos xadrez para a guarda de
presos, realizamos o APF ou encaminhamos o indivíduo para alguma delegacia de polícia?
Em qual município? Se tivermos que realizar o APF, onde devemos realizar o exame de
higidez física?

64. O primeiro passo para a resolução da questão passa pela identificação da natureza do crime
que está sendo cometido, se crime militar ou crime comum.

65. Em se tratando do cometimento de crime militar - inclusive de crime militar por


extensão, tal como aquele cometido por civil contra o patrimônio sob a administração
militar (art. 9º, inciso III, alínea "a", do CPM) - impõe-se a realização da prisão em flagrante
delito, a teor do art. 243 do CPPM:

Pessoas que efetuam prisão em flagrante


Art. 243. Qualquer pessoa poderá e os militares deverão prender quem fôr insubmisso ou
desertor, ou seja encontrado em flagrante delito.

66. Nesse caso, será realizada a lavratura de auto de prisão em flagrante (APF) e a
abertura de inquérito policial militar (IPM). O procedimento para tanto, tal como o local de
encarceramento do autor do fato ou a forma de realização do exame de higidez física, será
rigorosamente aquele já utilizado pelo Organização Militar em questão quando da ocorrência
de crime militar em suas dependências.

67. Caso se esteja diante de flagrante de crime comum, convém relembrar inexistir o
dever de os militares prenderem em flagrante o autor do fato, por não ser atribuição própria
das Forças Armadas prover segurança pública. Nesse sentido foi a uniformização de tese
promovida pelo Parecer n. 00484/2019/CONJUR-MD/CGU/AGU, de 05 de julho de 2019:

iii) como regra geral, é dever do Estado, por meio de suas autoridades policiais, realizar
prisões em flagrante delito quando ocorrem crimes comuns, estando tais autoridades
listadas no art. 144 da CF; por outro lado, aos militares compete efetuar prisões em
flagrante na hipótese de cometimento de crimes militares, nos termos do art. 7º e 243
do Código de Processo Penal Militar. Logo, dentro do contexto criminal militar, é possível a
condução de rondas externas (motorizadas e a pé) no perímetro da OM;

iv) prover segurança pública à sociedade não constitui atribuição própria das Forças
Armadas, razão pela qual o argumento de manutenção da ordem pública não enseja o
dever legal de realizar prisões em flagrante nos crimes comuns, mesmo quando ocorridos
em áreas de servidão militar, exceto quando se tratar de operações de Garantia de Lei e da
Ordem ou, ainda, quando do exercício das atribuições subsidiárias de que trata a Lei
Complementar nº 97/99;

68. Caso, ainda assim, se decida pela prisão em flagrante do infrator, a sua condução
à Polícia Federal ou à Polícia Civil estadual dependerá da natureza da infração. Será
atribuição da Polícia Federal lavrar o auto de prisão em flagrante se se tratar de crime de
competência da Justiça Federal ou quando houver repercussão interestadual ou
internacional que exija repressão uniforme dos crimes previstos no art. 1º da Lei nº
10.446/2002:

Art. 1o Na forma do inciso I do § 1o do art. 144 da Constituição, quando houver repercussão


interestadual ou internacional que exija repressão uniforme, poderá o Departamento de
Polícia Federal do Ministério da Justiça, sem prejuízo da responsabilidade dos órgãos de
segurança pública arrolados no art. 144 da Constituição Federal , em especial das Polícias
Militares e Civis dos Estados, proceder à investigação, dentre outras, das seguintes
infrações penais: (...)

69. De outro lado, os crimes de competência da Justiça Estadual serão, salvo na


hipótese prevista na Lei nº 10.446/2002, encaminhados à Delegacia de Polícia Civil. A
delegacia responsável pela lavratura do auto de prisão em flagrante, como regra, será
aquela da comarca em que se consumar a infração, ou, no caso de tentativa, naquela em que
for praticado o último ato de execução, na forma do art. 70, caput, do Código de Processo
Penal):
Art. 70. A competência será, de regra, determinada pelo lugar em que se consumar a
infração, ou, no caso de tentativa, pelo lugar em que for praticado o último ato de
execução.

4.4 Apreensão e utilização de madeiras

70. O quarto e último questionamento formulado foi:

No caso de apreensão de madeira, como devemos proceder? Podemos recolher e utilizar


esse material na OM? Seria possível “doar” esse material para outras OM da FAB ou outro
órgão público? No caso de madeiras que já estamos como fiel depositário, podemos “doar”
esse material para outras OM da FAB ou outro órgão público?

71. Por se tratar de especificação de pergunta já endereçada no subtópico 4.2 deste opinativo,
ora se remete o leitor à explanação ali delineada.

72. Porém, especificamente em relação à destinação de madeiras apreendidas por


órgãos federais ambientais no bojo de processos administrativos para apuração de infrações
ambientais, existe disposição expressa a respeito, no art. 134, inciso II, do Decreto nº
6.514/2008:

Art. 134. Após decisão que confirme o auto de infração, os bens e animais apreendidos
que ainda não tenham sido objeto da destinação prevista no art. 107, não mais retornarão
ao infrator, devendo ser destinados da seguinte forma:
(...)
II - as madeiras poderão ser doadas a órgãos ou entidades públicas, vendidas ou utilizadas
pela administração quando houver necessidade, conforme decisão motivada da autoridade
competente;

73. Assim, basta que se formule requerimento à autoridade ambiental competente, no


sentido de que as madeiras por ela apreendidas possam ser utilizadas pela Administração
castrense, ou mesmo que lhe sejam doadas. Vale destacar que o requerimento pode ter por
objeto até mesmo madeiras apreendidas em outros lugares que não a área sob
administração militar, pois o Decreto nº 6.514/2008 não traz essa limitação geográfica.

5. CONCLUSÃO

74. Em vista do exposto, conclui-se:

1. Em se tratando de apreensão de natureza puramente administrativa, compete ao próprio


Comando da Aeronáutica regulamentar internamente os procedimentos de apreensão e
seus consectários, inclusive dispondo a respeito da guarda, alienação ou destruição de
tais bens, com fulcro no art. 23, inciso XI e § 1º, do Anexo I do Decreto nº 6.834/2009. Vale
ressaltar, no entanto, que existem atuações administrativas que não competem
precipuamente às Forças Armadas, mas a outros órgãos públicos. Mencione-se, a título de
exemplo, a apuração de infrações administrativas por condutas e atividades lesivas ao
meio ambiente, matéria regulamentada pela Instrução Normativa Conjunta
MMA/IBAMA/ICMBIO nº 1, de 12 de abril de 2021. Logo, eventual regulamentação de
apreensões administrativas no âmbito da Força Aérea Brasileira deverá observar os
limites das atribuições dessa Força Armada;
2. No que concerne à apreensão decorrente do poder de polícia judiciária, ela só será
realizada por militares da Aeronáutica em se tratando de maquinário e equipamentos
utilizados para a prática de crime militar. Quaisquer dos crimes ambientais previstos
na Lei n° 9.605/1998 podem, teoricamente, vir a constituir crimes militares, se realizados
em área sob administração militar. Por se tratar de crime militar, e não comum, não é o
caso de formalizar boletim de ocorrência em alguma delegacia de polícia, mas, sim, de
instaurar o competente inquérito policial militar (IPM). Quanto à destinação dos bens
apreendidos, dever-se-á observar o art. 25 da Lei n° 9.605/1998;
3. Para responder sobre a possibilidade de posse ou utilização do maquinário e dos
equipamentos que já estão no Campo de Provas Brigadeiro Velloso, é necessário também
aferir a natureza de sua apreensão. Se o bem foi apreendido pelo exercício do poder de
polícia administrativa do próprio Comando da Aeronáutica, em matéria de sua
atribuição, competirá a ele próprio regulamentar internamente os procedimentos de
apreensão e seus consectários. Se o bem foi apreendido por outro órgão público, no
exercício do seu poder de polícia administrativa, e então confiado em depósito ao
Comando da Aeronáutica, deve-se observar a regulamentação respectiva do ente
apreensor, e eventual solicitação de uso deverá ser dirigida a ele - no caso de apreensão
promovida pelos órgãos ambientais federais, por exemplo, a questão é tratada pelo art.
134 do Decreto nº 6.514/2008. Por fim, em se tratando de bens utilizados para a prática
de crime militar, o art. 12, alínea "b", do Código de Processo Penal Militar (CPPM)
determina a sua imediata apreensão. Nesse caso, o destino final dos bens apreendidos
dependerá da natureza da sentença penal transitada em julgado, se absolutória ou
condenatória, nos termos dos arts. 196 e 197 do CPPM;
4. Em se tratando do cometimento de crime militar - inclusive de crime militar por extensão,
tal como aquele cometido por civil contra o patrimônio sob a administração militar (art.
9º, inciso III, alínea "a", do CPM) - impõe-se a realização da prisão em flagrante delito, a
teor do art. 243 do CPPM. Nesse caso, será realizada a lavratura de auto de prisão em
flagrante (APF) e a abertura de inquérito policial militar (IPM). O procedimento para tanto,
tal como o local de encarceramento do autor do fato ou a forma de realização do exame
de higidez física, será rigorosamente aquele já utilizado pelo Organização Militar em
questão quando da ocorrência de crime militar em suas dependências;
5. Caso se esteja diante de flagrante de crime comum, convém relembrar inexistir o dever
de os militares prenderem em flagrante o autor do fato, por não ser atribuição própria das
Forças Armadas prover segurança pública (Parecer n. 00484/2019/ CONJUR-MD/CGU/AGU,
de 05 de julho de 2019). Caso, ainda assim, se decida pela prisão em flagrante do
infrator, a sua condução à Polícia Federal ou à Polícia Civil estadual dependerá da
natureza da infração. Será atribuição da Polícia Federal lavrar o auto de prisão em
flagrante se se tratar de crime de competência da Justiça Federal ou quando houver
repercussão interestadual ou internacional que exija repressão uniforme dos crimes
previstos no art. 1º da Lei nº 10.446/2002. De outro lado, os crimes de competência da
Justiça Estadual serão, salvo na hipótese prevista na Lei nº 10.446/2002, encaminhados à
Delegacia de Polícia Civil. A delegacia responsável pela lavratura do auto de prisão em
flagrante, como regra, será aquela da comarca em que se consumar a infração, ou, no
caso de tentativa, naquela em que for praticado o último ato de execução, na forma do
art. 70, caput, do Código de Processo Penal); e
6. especificamente em relação à destinação de madeiras apreendidas por órgãos federais
ambientais no bojo de processos administrativos para apuração de infrações ambientais,
existe disposição expressa a respeito, no art. 134, inciso II, do Decreto nº
6.514/2008. Assim, basta que se formule requerimento à autoridade ambiental
competente, no sentido de que as madeiras por ela apreendidas possam ser utilizadas
pela Administração castrense, ou mesmo que lhe sejam doadas. Vale destacar que o
requerimento pode ter por objeto até mesmo madeiras apreendidas em outros lugares
que não a área sob administração militar, pois o Decreto nº 6.514/2008 não traz essa
limitação geográfica.

75. Em sendo aprovado o presente, sugere-se o encaminhamento dos autos ao órgão


consulente (VI COMAR), para ciência do presente opinativo.

76. Reitere-se, por fim, que as presentes considerações se restringem à análise dos aspectos
jurídico-formais do processo, abstraídas as questões técnicas, financeiras e orçamentárias, as quais
fogem à competência deste órgão consultivo, resguardando-se o juízo de conveniência e oportunidade
ínsito à esfera administrativa.

À consideração superior.
Brasília, 11 de maio de 2022.

VICTOR CHAVES RIBEIRO FRANÇA GUIMARÃES


ADVOGADO DA UNIÃO

Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em http://sapiens.agu.gov.br


mediante o fornecimento do Número Único de Protocolo (NUP) 67280000231202217 e da chave de
acesso 0ad05db4

Notas

1. ^
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo – 31. ed. rev., atual.
e ampl. – São Paulo: Atlas, 2017, p. 84.
2. ^ OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Curso de Direito Administrativo - 3. ed. rev., atual.
e ampl. - Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2015, pp. 246-247.
3. ^ CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo – 31. ed. rev., atual.
e ampl. – São Paulo: Atlas, 2017, p. 87.
4. ^ OLIVEIRA, Rafael Carvalho Rezende. Curso de Direito Administrativo - 3. ed. rev., atual. e ampl. -
Rio de Janeiro: Forense; São Paulo: MÉTODO, 2015, p. 246.
5. ^ Ibid., p. 247.
6. ^ TAVEIRA, Ângela Montenegro. O Poder de Polícia dos Membros das Forças Armadas nas
operações de patrulhamento de fronteiras: limites e implicações com a segurança e o
desenvolvimento nacionais. 2011. 67 f. Trabalho de Conclusão de Curso (Monografia apresentada
ao Departamento de Estudos da Escola Superior de Guerra como requisito à obtenção do diploma
do Curso de Altos Estudos de Política e Estratégia [CAEPE]) – Escola Superior de Guerra, Rio de
Janeiro, 2011 p. 33.
7. ^ TÁVORA, N; ALENCAR, R.R. Curso de Direito Processual Penal. 8. Ed. JUSPODIVM, 2013, p.
98.
8. ^ DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 23ª Edição. São paulo: Atlas, 2010, p.
118.
9. ^ Regulamento Processual Criminal Militar do Supremo Tribunal Militar publicado no DOU em
18/07/1895, p. 5, seção 1
10. ^ MOREIRA NETO, Diogo de Figueiredo. Mutações do Direito Administrativo. 2. ed. Rio de
Janeiro: Editora Renovar, 2001, pp. 328-329.
11. ^ Roth, Ronaldo João. Lei 13.491/17: os crimes militares por extensão e o princípio da
especialidade. Disponível em: https://revista.mpm.mp.br/artigo/artigos-tematicos-lei-13-491-os-
crimes-militares-por-extensao-e-o-principio-da-
especialidade/#:~:text=O%20ordenamento%20jur%C3%ADdico%20p%C3%A1trio%20incorporou,nominamos%20crimes%20militares%20por
em 25/04/2022.
12. ^ Leite, Karolyne. Os crimes militares ambientais e a definição da sua dogmática penal
em três degraus interpretativos. Disponível
em: https://ojs.cnmp.mp.br/index.php/revista/article/view/164/209. Acesso em 25/04/2022.

Documento assinado eletronicamente por VICTOR CHAVES RIBEIRO FRANCA GUIMARAES, de acordo com
os normativos legais aplicáveis. A conferência da autenticidade do documento está disponível com o
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(a): VICTOR CHAVES RIBEIRO FRANCA GUIMARAES. Data e Hora: 11-05-2022 16:45. Número de Série:
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ADVOCACIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA-GERAL DA UNIÃO
CONSULTORIA JURÍDICA JUNTO AO MINISTÉRIO DA DEFESA
CGDAM - COORDENAÇÃO-GERAL DE DIREITO ADMINISTRATIVO E MILITAR
ESPLANADA DOS MINISTÉRIOS, BLOCO Q, SALA 733, CEP: 70049-900, BRASÍLIA-DF TELEFONE: 61-3312-4123. EMAIL: CONJUR@DEFESA.GOV.BR

PARECER n. 00484/2019/CONJUR-MD/CGU/AGU

NUP: 67200.005609/2018-27
INTERESSADOS: COMANDO DE PREPARO - COMPREP
ASSUNTOS: ASSESSORAMENTO ESPECIALIZADO À ATIVIDADE JURÍDICA

EMENTA: DIREITO CONSTITUCIONAL. DIREITO ADMINISTRATIVO MILITAR. UNIFORMIZAÇÃO


DE TESE A RESPEITO DAS ÁREAS DE SERVIDÃO MILITAR. DECRETO-LEI Nº 3.437/41.
QUESTIONAMENTO SOBRE SUA VIGÊNCIA. DÚVIDAS SOBRE A EXTENSÃO DE AÇÕES DE
POLÍCIA ADMINISTRATIVA NAS REFERIDAS ÁREAS.
1. O Decreto-Lei nº 3.437/41 encontra-se válido e vigente, tendo sido revogada tacitamente
pelo Decreto-Lei 9.760/46 apenas a alínea "a" do seu art. 2º, de modo que a área de 1.320
metros em torno dos estabelecimentos militares continua a constituir área de servidão
militar sobre a qual o Estado (Forças Armadas) possui o direito real de gozo em prol do
interesse público.
2. Sendo assim, é possível que as Forças Armadas promovam, nessa área de 1.320 metros
ao redor das Organizações Militares, ações típicas de polícia administrativa, não lhes sendo
dado, todavia, o dever de efetuar prisões em flagrante delito nos crimes comuns.
3. Ciência às três Consultorias Jurídicas-Adjuntas das Forças e ao EMCFA para adoção das
providências cabíveis no âmbito de sua alçada

Sr. Coordenador-Geral,

1. RELATÓRIO:

1. Trata-se de processo administrativo de uniformização de tese relativo às ações de polícia


administrativa, patrulhamento, fiscalização de trânsito e pessoas na área de servidão militar, bem como
do entendimento quanto à vigência do Decreto-Lei nº 3.437/1941 e aos seus efeitos.
2. O assunto teve início por iniciativa do Comando da Aeronáutica com o Ofício n°
596/SIJ/AJUR/6141, por meio do qual o Comando de Preparo daquela Força formulou alguns
questionamentos à sua Adjunta a respeito dos limites de atuação das Forças Armadas nas áreas de
servidão militar de que trata o Decreto-Lei nº 3.437/41, com vistas à preservação da segurança de suas
Organizações Militares (OMs). Para melhor compreensão do tema, eis o exato teor da consulta então
formulada:

[...]
1. Trata o presente expediente acerca do Parecer nº 00114/2018/COJAER/CJU/AGU, no qual
essa Consultoria se manifesta a respeito da inexistência de competência legal para que
membros da Forças Armadas efetuem prisões nas áreas externas aos quartéis, ainda que
em flagrante delito, nas hipóteses de crimes comuns, salvo nos casos expressamente
autorizados pela Constituição Federal e pela Lei Complementar n° 97, de 1999.

2. Em que pese a clareza do referido Parecer, verifica-se que o seu texto deixou de abordar
o tema sob a perspectiva da atuação do efetivo das Forças Armadas na defesa de suas
instalações, a qual, inexoravelmente, vem demandando a presença de militares nas
adjacências das Organizações Militares, sobretudo daquelas localizadas nas regiões com
maiores índices rde violência.

3. É sabido que o interesse público na preservação das áreas contíguas aos quartéis impõe,
inclusive, limitação às construções localizadas dentro do raio de 600 braças (1.320 metros)
no entorno daqueles, em áreas denominadas de servidão militar, conforme inteligência do
art. 2° do Decreto-Lei n° 3.437, de 1941, e entendimento manifestado pelo Superior
Tribunal de Justiça, no AREsp n° 1.214.391 - RJ (2017/0316306-2).

4. Ressaltando o dever das Forças Armadas em promover a adequada proteção das


referidas áreas, o TRF da 2' Região reconheceu a legitimidade de Resolução municipal que
atribuiu ao Exército Brasileiro a competência para fiscalizar o trânsito nas áreas adjacentes
às suas Organizações Militares, localizadas em bairro do Rio de Janeiro, conforme disposto
no julgamento da Ap. Cível n° 1999.51.01.001231-4.

5. Desse modo, tendo em vista que o Poder Judiciário já reconheceu a possibilidade de


atuação das Forças Armadas nas áreas de servidão militar, com vistas à preservação da
segurança de suas OM, consulto o entendimento dessa Douta Consultoria a respeito da
condução de rondas externas - motorizadas e a pé, no perímetro da OM, com
estabelecimento temporário de posições estáticas ao longo do seu itinerário, junto aos
limites das instalações militares, bem como sobre a utilização de militares para controle de
trânsito em área externa, junto aos portões das OM, com vistas à coordenação do tráfego,
evitando acidentes e o bloqueio dos acessos ao quartel.
[...]
3. Respondendo a referida consulta, a CONJUR-FAB emitiu o PARECER n.
00076/2019/COJAER/CGU/AGU (Seq. 2), assinalando, primeiramente, que existem divergências acerca
d a vigência do Decreto-Lei nº 3.437/41 , havendo pareceres da CONJUR-MP e desta CONJUR-MD que
sustentariam sua revogação pelo Decreto-Lei 9.760/46. Em relação aos limites de atuação das Forças
Armadas nas áreas de servidão militar, assim concluiu a Adjunta:

CONCLUSÃO

48. Em vista de todo o exposto, extraem-se as seguintes conclusões:

1. O poder de polícia administrativa é o que se denomina comumente "poder de polícia",


incidindo sobre atividades, bens e direitos dos indivíduos, exaurindo-se em si mesmo e
tendo caráter eminentemente preventivo. Restringe o uso e o gozo da liberdade e da
propriedade em favor do interesse da coletividade;
2. O poder de polícia judiciária é atividade desenvolvida por corporações específicas (como
as polícias civil e federal), preparatória para a função jurisdicional penal, e incidente sobre
indivíduos a quem se atribui o cometimento de ilícitos penais, possuindo caráter
eminentemente repressivo;
3. As normas gerais de organização, preparo e emprego das Forças Armadas na Segurança
e Defesa Nacional estão previstas na Lei Complementar nº 97/1999, em cujos dispositivos
podem ser identificadas atribuições subsidiárias particulares de cada Força e a forma como
cada uma manifestará o seu poder de polícia administrativa;
4. As Forças Armadas exercem o poder de polícia judiciária militar, que está restrito a
crimes militares e àqueles sujeitos a jurisdição militar, bem como às atividades de apoio à
Justiça Militar;
5. O dever de realizar a prisão em flagrante decorre de determinação legal expressa, não
estando necessariamente imbricado ao exercício do poder de polícia (administrativa ou
judiciária). No caso de militares das Forças Armadas, mostra-se presente no art. 243 do
CPPM (restrito ao processo penal militar) e no art. 16-A, inciso III, da Lei Complementar nº
97/1999 (limitado a delitos transfronteiriços e ambientais cometidos na faixa de fronteira
terrestre, no mar e nas águas interiores);
6. Não existe um dever amplo e genérico de os militares realizarem a prisão em flagrante
delito em crimes comuns, não se podendo interpretar a expressão "autoridades policiais e
seus agentes", contida no artigo 301 do CPP, de forma tão ampla que os abranja;
7. O instituto da servidão militar é centenário no Direito brasileiro, tendo sua atual
formatação normativa trazida pelo Decreto-Lei nº 3.437, de 17 de julho de 1941, norma
com força de lei ordinária, para a qual não consta revogação expressa, e que encontra
aplicação na jurisprudência recente dos tribunais Regionais Federais;
8. Existir divergência entre os órgãos consultivos da Advocacia-Geral da União a respeito da
vigência ou da eventual revogação tácita (parcial ou total) do Decreto-Lei nº 3.437/1941,
tendo a Consultoria Jurídica do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão se
manifestado pela sua revogação parcial, e a Consultoria Jurídica junto ao Ministério da
Defesa se manifestado por sua revogação total.
A matéria merece análise aprofundada e necessita de uniformização por parte da CONJUR-
MD.

4. Chegando os autos a esta CONJUR-MD, foi elaborada a COTA n. 00292/2019/CONJUR-


MD/CGU/AGU, por meio da qual admitiu-se que o assunto é comum às três Forças e, por isso, solicitou-se
a coleta do posicionamento do Comando da Marinha e do Exército, a fim de subsidiar manifestação
conclusiva por esta Consultoria Jurídica. Ressaltou-se, na oportunidade, que o EMCFA se manifestou
sobre o tema no bojo do NUP 60240.000059/2019-15, recomendando-se seu apensamento ao presente.
5. Sendo assim, por meio da NOTA EXPLICATIVA de 13 de fevereiro de 2019 ( NUP
60240.000059/2019-15), o EMCFA manifestou da seguinte forma a respeito do exercício de poder de
polícia nas áreas adjacentes aos aquartelamentos militares:

Destarte, vislumbra-se que a Administração Militar, por obediência aos princípios da


indisponibilidade e da supremacia do interesse público, está compelida a utilizar o
poder de polícia, quer preventivo, quer repressivo, nas áreas previstas na
legislações em vigor (raio de 1.320 metros) sempre que estiver em ameaça as
atividades marciais direcionadas ao preparo da tropa e expuserem riscos à
própria segurança dos aquartelamentos. Trata-se da teoria do poder implícito,
indispensável para efetivação dos poderes expressos. Afinal, a lei não pode impor um dever
e não oferecer meio de pronta execução.

[...]

4. CONCLUSÃO

Diante do exposto, solicito parecer da Consultoria Jurídica do Ministério da Defesa quanto


à possibilidade de confirmar entendimento que respalde a conduta das Forças Armadas, no
tocante à adotação do Poder de Polícia nas áreas adjacentes aos aquartelamentos militares.
Especificamente, nas hipóteses previstas pelo Decreto-Lei nº 3.437/41.
Ainda, requeiro ratificar o limite espacial e geográfico do perímetro em torno das
unidades militares em que o Poder de Polícia pode ou deve ser exercido pelos
militares, com o fito de promover a segurança das instalações e do pessoal.
Não obstante, insto a corroborar a possibilidade de adoção pelos militares, nas
áreas em comento, ações tanto em caráter preventivo, como repressivo, com
vistas à segurança das instalações e do seu pessoal, tais como: patrulhamento,
revistas de pessoal, veículos, embarcações e aeronaves, prisões em flagrante
delito, interdições de vias e outras medidas análogas.
Por derradeiro, consulto indicar o instrumento formal adequado, a ser publicado por este
Ministério, de modo a conferir legitimidade às ações imediatas das diversas Organizações
Militares distribuídas pelo território nacional, as quais, em sua maioria, não dispõe de
assessoria jurídica.

(destacou-se)

6. Na sequência, aportou aos autos o entendimento da CONJUR-EB, consubstanciado no


PARECER n. 00358/2019/CONJUR-EB/CGU/AGU, o qual em síntese conclui:

CONCLUSÃO

Em face das informações prestadas pelo Exército brasileiro, conclui-se que:

- a servidão militar é um instituto gerado pela necessidade de se proteger os Fortes


Militares. Em razão da segurança da organização militar e das pessoas que transitam
próximas a essa área, bem como pelo respeito ao princípio da supremacia do interesse
público, o Exército deve prover a segurança das áreas adjacentes aos organismos
militares.

- o Decreto-Lei nº 3.437/1941 traça os limites da ingerência do poder militar em regiões


contíguas às fortificações militares e ainda se encontra em vigor, pois foi recepcionado pela
Constituição Federal de 1988 - CF/88;

- a projeção do poder de atuação da administração militar fora dos muros dos


aquartelamentos se sobrepõe a quaisquer bens existentes dentro do perímetro traçado na
lei, não interessando se de propriedade pública ou de privada;

- a natureza jurídica do instituto previsto no Decreto-Lei nº 3.437, de 17 de julho de 1941, é


de servidão administrativa militar, que pode ser operados em áreas particulares e públicas;

- as ações de patrulhamento e de fiscalização de trânsito de veículos e de pessoas nas


áreas de servidão militar estão fundamentadas no poder de polícia conferido às Forças
Armadas;

- o Exército brasileiro possui pleno poder de polícia nas áreas de servidão militar, tendo um
poder/dever de atuar de diversas formas: expedindo licenças, autorizações, fazendo
controle de trânsito, restringindo a utilização de estacionamento nas imediações de fortes
militares, regulamentando as atividades civis e construções no raio de 1.320 metros após o
término da área de suas fortificações e atuando preventivamente nos delitos que possam
ocorrer em tais áreas.
[...]

7. Por fim, a CONJUR-MB expressou seu entendimento sobre o tema na forma do PARECER nº
00134/2019-ELB/CJACM/CGU/AGU, cuja conclusão foi a seguinte:

III- CONCLUSÃO

Em face do exposto, conclui-se:

a) No que concerne às prisões nas áreas externas aos quartéis, não se pode descurar da
importância das áreas objeto de servidão administrativa - de que trata o Decreto-Lei nº
3.437, de 1941 - para garantir a ordem e a segurança das Instituições Militares, e que,
nesse sentido, há um conjunto de atribuições e responsabilidade para as Organizações
Militares. Assim, embora não se possa falar em obrigatoriedade no sentido do disposto no
art. 301 do CPP acima transcrito, existe inexoravelmente um dever, por parte dos membros
das Forças Armadas, de satisfazer as finalidades em prol do qual o Decreto-Lei nº 3.437, de
1941, foi editado;

b) Não há contradição ou incompatibilidade geral ou parcial, mas o que se desenha, no


sistema jurídico, é a integração plena entre os dispositivos do Decreto-Lei nº 3.437, de
1941, e o do art. 100, alínea "a", do Decreto-Lei nº 9.760, de 1946. Assim, os referidos
preceitos legais podem coexistir, já que se complementam.

8. É o relatório.

2. ANÁLISE:

2.1 NUPs vinculados ao presente. Fixação dos pontos objeto de uniformização.

9. De início, importante esclarecer que existem três processos administrativos, apensados ao


presente, que cuidam de questionamentos jurídicos correlatos, quais sejam:

- NUP 67000.001613/2018-72: o Ministério Público Militar nos dá conta da existência de


dois acórdãos que reforçariam o exercício do poder de polícia das FFAA, inclusive com
prisões em flagrante de crimes comuns, pelo menos nas áreas adjacentes às Organizações
Militares. Assim, o Chefe do GABAER, pelo 1º Despacho Nº 39/GC3/1961, de 1º de março de
2018, suscitou questão sobre o exercício do poder de polícia pelas Forças Armadas e à
realização de prisões em flagrante pelos membros das Forças;

- NUP 67400.002524/2018-31: o Comando-Geral do Pessoal (COMGEP) da FAB, por meio


do Ofício n° 72/AJU/4539, suscitou questões acerca de ações de polícia administrativa,
patrulhamento, fiscalização de trânsito e pessoas na área de Servidão Militar, no âmbito
das três Forças; e
- NUP 60240.000059/2019-15: o EMCFA, nos termos do Memorando n° 36/SC-3.2/SC-
3/CHOC/EMCFA-MD, encaminhou a esta CONJUR-MD a Nota explicativa de 13 de fevereiro
de 2019 (SEI - 1464383, Sapiens Seq. 2), solicitando parecer quanto à possibilidade de as
Forças Armadas exercerem poder de polícia nas áreas adjacentes aos aquartelamentos
militares.

10. Diante disso, esta CONJUR-MD elaborou a COTA n. 00291/2019/CONJUR-MD/CGU/AGU


expondo que, para evitar manifestações dissonantes e por economia processual, a questão seria tratada
por completo no bojo deste NUP, de modo que as nuances e decorrências da questão de fundo (limites
de atuação das Forças Armadas nas áreas de servidão militar) serão abordadas neste parecer.
11. Logo, o objeto da presente análise será a atuação das Forças Armadas nas áreas de
servidão militar de que trata o Decreto-Lei nº 3.437/41, a fim de responder as dúvidas específicas
suscitadas neste e nos demais NUPs acima citados, as quais resumem-se em:

i) realização de prisões em flagrante delito relativamente a crimes comuns;

ii) alcance do poder de polícia das FFAA nas áreas adjacentes às Organizações
Militares, tais como patrulhamento, fiscalização de trânsito e pessoas, condução
de rondas externas - motorizadas e a pé, no perímetro da OM, com
estabelecimento temporário de posições estáticas ao longo do seu itinerário,
junto aos limites das instalações militares, bem como o bloqueio dos acessos ao
quartel.

12. Esclarecidos os contornos da consulta, mostra-se oportuno ressaltar, ainda, as


competências legais desta CONJUR-MD no que toca aos limites da presente análise.
13. Nesse sentido, há que se mencionar que o exame desta Consultoria Jurídica é feito nos
termos do art. 11 da Lei Complementar n° 73/1993 e com base nos elementos dos autos, subtraindo-se
do âmbito da competência institucional deste órgão, delimitada em lei, análises que importem em
considerações de ordem técnica, política e de âmbito discricionário do administrador público.
14. Ainda previamente à análise de mérito, necessário esclarecer breve aspecto acerca do
questionamento do EMCFA sobre eventual instrumento " a ser publicado por este Ministério, de modo
a conferir legitimidade às ações imediatas das diversas Organizações Militares" (vide: NOTA
EXPLICATIVA de 13 de fevereiro de 2019 - NUP 60240.000059/2019-15).
15. Sobre o ponto, vislumbramos que o instrumento eventualmente cabível para a
regulamentação jurídica dessas áreas seria possível ato normativo, sendo oportuno lembrar, inclusive,
que já se encontra em elaboração projeto de decreto presidencial visando estabelecer, para fins de
proteção e garantia da soberania nacional, as áreas de interesse da defesa e segurança nacional. O
citado projeto de decreto está em trâmite nos autos do NUP 60410.000207/2018-11.

2.2 Decreto-Lei 3.437/41. Discussões sobre sua vigência. Jurisprudência.

16. Questão que, por lógica, precede o enfrentamento de mérito acerca dos limites de atuação
das Forças nas áreas adjacentes aos aquartelamentos diz respeito a eventual revogação do Decreto-Lei
3.437/41, o qual estabelece as áreas ora denominadas de servidão militar.
17. Referido Decreto veio a consolidar antigas legislações da época do Brasil imperial que,
historicamente, sempre reservavam às instituições militares áreas em torno do perímetro militar com
vistas à proteção do quartel e à garantia da integridade física dos militares que ali circulavam.
18. Na esteira desse raciocínio, o Decreto-Lei nº 3.437, de 1941, dispôs o seguinte:

CONSIDERANDO que a área indispensável a jurisdição e serviços de defesa do Ministério da


Guerra, de conformidade com a nossa antiga legislação, tem por base as antigas medidas
de 15 braças, em torno dos limbos exteriores dos velhos e novos fortes e a de 600 braças a
contar dos ditos limbos exteriores, como servidão,

DECRETA:

Art. 1º Na 1ª zona de 15 braças (33 metros) em torno das fortificações. nenhum


aforamento de terreno será concedido e nenhuma construção civil ou pública autorizada,
considerando-se nulas as propriedades porventura existentes, sem ônus para o
Estado.

Art. 2º Na 2ª zona de 600 braças (1.320 metros) observar-se-á o seguinte:

a) Nenhum novo aforamento de terreno será concedido;


b ) nenhuma construção ou reconstrução será permitida fora dos gabaritos
determinados pelo Ministério da Guerra que poderá também promover a
desapropriação do imóvel, se necessitar do terreno as obras da Organização da Defesa da
Costa;
c) qualquer construção ou reconstrução em andamento, ou já autorizada, será sustada,
para cumprimento do disposto na letra anterior.

[...] (destacou-se)

19. Analisando-se o texto acima transcrito, percebe-se que o art. 1º trata do perímetro de 33
metros ao redor das organizações militares os quais se consideram, tecnicamente, propriedade da
União, pois o dispositivo menciona expressamente que se reputam nulas as propriedades porventura ali
existentes. Logo, ao cotejar tal dispositivo com o previsto no art. 1º, "i" e "l", do Decreto-Lei 9.760/46, e
com o art. 20, I, da CF/88 [1], é possível inferir que a referida área de 33 metros em torno dos
aquartelamentos constitui bem da União.
20. Por seu turno, o art. 2º fixou o perímetro do que se denomina servidão militar, consistente
em uma área de 1.320 metros ao redor dos quartéis. Sobre aludida área, o legislador impôs aos
particulares restrições de natureza real (proibição de novos aforamentos), de uso e fruição, em face do
interesse público ali envolvido.
21. Conforme alíneas do art. 2º, fixaram-se três restrições legais: i) vedação à concessão de
novos aforamentos; ii) proibição de construção fora das determinações da Forças Armadas; e iii) as
construções em andamento deveriam ser sustadas a fim de adequarem-se às determinações das Forças
Armadas. A partir de então, tais áreas passaram a ser consideradas legalmente como de servidão
militar, sobre as quais a Força Castrense detém poderes administrativos de restringir seu livre uso pelos
particulares.
22. Todavia, a CONJUR-FAB destacou que pairam dúvidas, no âmbito da AGU, sobre a plena
vigência do Decreto-Lei 3.437/41, em razão do advento do Decreto-Lei nº 9.760/46 que, em seu art.
100, "a", supostamente teria promovido a revogação tácita do primeiro. Vejamos o teor de tal
dispositivo:

Art. 100. A aplicação do regime de aforamento a terras da União, quando autorizada na


forma deste Decreto-lei, compete ao S. P. U., sujeita, porém, a prévia audiência:

a) dos Ministérios da Guerra, por intermédio dos Comandos das Regiões Militares; da
Marinha, por intermédio das Capitanias dos Portos; da Aeronáutica, por intermédio dos
Comandos das Zonas Aéreas, quando se tratar de terrenos situados dentro da faixa de
fronteiras, da faixa de 100 (cem) metros ao longo da costa marítima ou de uma
circunferência de 1.320 (mil trezentos e vinte) metros de raio em torno das
fortificações e estabelecimentos militares;

[...]

§ 6º Nos casos de aplicação do regime de aforamento gratuito com vistas na regularização


fundiária de interesse social, ficam dispensadas as audiências previstas neste artigo,
ressalvados os bens imóveis sob administração do Ministério da Defesa e dos
Comandos do Exército, da Marinha e da Aeronáutica.

(destacou-se)

23. Desse modo, a CONJUR do então Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão emitiu o
PARECER Nº 1331 - 5.1.1/2010/AMF/CONJUR/MP, no qual sustentou o entendimento de que o art. 2º do
Decreto-Lei 3.437/41 teria sido revogado pelo retrocitado art. 100, "a", do Decreto-Lei 9.760/46,
porquanto este último passou a dispor sobre o regime de aforamento em terras da União, admitindo-o
dentro da área de 1.320 metros em torno dos estabelecimentos militares, desde que houvesse previa
audiência das Forças Armadas. Veja-se o raciocínio então alinhavado:

(...) I -
Consulta em tese formulada pela Secretaria do Patrimônio da União. Aforamento. Terrenos
em torno de fortificações. Regulamentação pelo Decreto-Lei 3.437/41.
I I - Art. 1º, Decreto-Lei n. 3.437/41. Validade. Norma especial. Compatibilidade
com o regime geral instituído pelo Decreto – Lei n. 9.760/46. Lei de Introdução ao
Código Civil, art. 2º, §2º.
I I I - Art. 2º, Decreto-Lei n.3.437/41. Incompatibilidade com norma posterior,
constante do art. 100, alínea “a” Decreto-Lei n. 9.760/46. Revogação Tácita. Lei
de Introdução ao Código Civil, art. 2º, § 1º.
IV- Concessão de aforamento na faixa de terra de 1320 metros em torno de fortificações.
Desnecessidade de oitiva dos órgãos mencionados na alínea “a”, art. 100. Decreto-Lei
n.9.760/46, nas hipóteses em que as fortificações não mais se prestam ao serviço de
defesa nacional. Interpretação teleológica. Princípio da razoabilidade.
(...)
10. Portanto, no que respeita ao primeiro questionamento formulado pela SPU, constata-
se incompatibilidade normativa apenas entre o art. 2º, Decreto-Lei n. 3.437/41, e
o art. 100, alínea “a”, Decreto – Lei 9.760/46, razão pela qual, ainda que
tacitamente, deve-se considerar o dispositivo mais antigo integralmente
revogado, inclusive no que respeito ao conteúdo de suas alíneas. Já o art. 1º do
Decreto-Lei n. 3.437/41 permanece vigente, na plena produção de seus efeitos
jurídicos, por se tratar de regra especial.

24. Esta Consultoria Jurídica, por sua vez, no bojo do PARECER n. 00745/2018/CONJUR-
MD/CGU/AGU, que analisava na oportunidade minuta de decreto presidencial a respeito das áreas de
interesse da defesa nacional, também manifestou entendimento de que o Decreto 3.437/41 estaria
revogado por força do disposto no Decreto 9.760/46. Veja-se o raciocínio traçado naquele opinativo:

[...]

29. Da análise comparativa entre excertos acima colacionados (parágrafos 27 e


28), percebe-se que o Decreto-Lei nº 9.760, de 1946, passou a tratar
integralmente, e de forma diversa, a matéria objeto do Decreto-Lei nº 3.437, de
1941, que vedava, por exemplo, a concessão de novos aforamentos.
Considerando que o próprio Decreto-Lei nº 9.760, de 1946, determina,
literalmente, em seu artigo 218, a revogação das "disposições em contrário",
necessário concluir que promoveu a revogação expressa inominada do Decreto-
Lei nº 3.437, de 1941.

3 0 . Logo, correta a posição firmada pelo EMCFA (parágrafos 21 e 22) de não


inserir no artigo 3º, inciso I, alínea "d", da minuta de decreto, o Decreto-Lei nº
3.437, de 1941, como fundamentação do dispositivo, mantendo, tão somente, a
referência feita ao Decreto-Lei nº 9.760, de 1946.

[...]
25. Com a devida venia aos posicionamentos dissonantes, esta CGDAM/CONJUR-MD, apreciando
mais detidamente a questão, entende que apenas e tão somente o disposto na alínea "a" do art. 2º do
Decreto-Lei nº 3.437/41 encontra-se de fato revogado, nos termos do art. 2º, §1º, da Lei de Introdução
às Normas do Direito Brasileiro.
26. Isso porque o comando nele contido - vedação de novos aforamento no perímetro de 1.320
metros - realmente foi objeto de tratamento diverso por meio diploma normativo posterior, isto é, pelo
art. 100, "a", do Decreto-Lei 9.760, de 1946. De acordo com este último, tornou-se possível a concessão
de aforamentos na áreas de 1.320 metros em torno das instituições militares, bastando que haja
aquiescência da Força Armada que possua o direito de servidão.
27. Visando ao deslinde do impasse, impõe-se a leitura atenta do art. 2º do Decreto-Lei nº
4.657, de 4 de setembro de 1942 (Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro - LINDB), que
consagra o princípio da continuidade da norma, ao estabelecer que a partir da sua entrada em vigor ela
tem eficácia contínua, até que outra a modifique ou revogue:

Art. 2º Não se destinando à vigência temporária, a lei terá vigor até que outra a modifique
ou revogue.

§ 1º A lei posterior revoga a anterior quando expressamente o declare, quando seja com
ela incompatível ou quando regule inteiramente a matéria de que tratava a lei anterior.

[...]

28. Tomando-se por base teórica o disposto acima, é possível concluir que, à exceção da
possibilidade de novos aforamentos, o Decreto-Lei nº 9.760/46 não dispôs de forma incompatível com o
Decreto-Lei nº 3.437/41, tampouco tratou inteiramente da matéria nele disciplinada, a qual, repita-se,
refere-se especificamente ao tratamento legal das áreas em torno dos quartéis .
29. Logo, com preciso fundamento no §1º do art. 2º da Lei de Introdução às Normas do Direito
Brasileiro - LINDB, é de se concluir que o Decreto-Lei nº 3.437/41 encontra-se vigente, com exceção da
alínea "a" de seu art. 2º. Por conseguinte, as restrições administrativas constantes das alíneas "b" e "c"
continuam válidas, bem como seu art. 1º.
30. É possível que exista, por exemplo, determinado particular detentor de título jurídico
diverso do aforamento (ex: inscrição de ocupação, cessão de uso, permissão de uso, etc) dentro do
perímetro de 1.320 metros e, nesse contexto, pretenda ali construir, ampliar o prédio ou ainda reformá-
lo. Nessa situação, entendemos que as restrições impostas pela alínea "b" do art. 2º do Decreto-Lei nº
3.437/41 são plenamente aplicáveis, devendo-se, previamente, obter o aval do Comando Militar detentor
da servidão administrativa do local.
31. Em síntese, o Decreto-Lei 9.760/46 apenas mitigou u m a das várias restrições
administrativas aos direitos do particular sobre a área de 1.320 metros, não significando que as demais
limitações que naturalmente recaem sobre áreas de servidão administrativa não permaneçam válidas.
32. Corroborando tal posicionamento, é possível notar que os tribunais do país, inclusive o STF
[2]
, utilizam o mencionado Decreto-Lei como fundamento para inúmeras decisões, havendo, inclusive,
precedente expresso acerca de sua vigência, conforme julgado abaixo transcrito, da lavra do TRF-2ª
Região:

APELAÇÕES CÍVEIS. DIREITO ADMINISTRATIVO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA.


DEMOLIÇÃO DE OBRAS LIMÍTROFES À ESCOLA MILITAR. DESNECESSIDADE DE PRÉVIA
OITIVA DOS MINISTÉRIOS MILITARES. PROVIMENTO DA APELAÇÃO DA UNIÃO E PARCIAL
PROVIMENTO DA APELAÇÃO DO MUNICÍPIO.
1. Trata-se apelações cíveis interpostas pela União Federal e pelo Município de Vila Velha
contra sentença proferida nos autos de ação civil pública ajuizada pela União Federal. Pretendia a União
paralisar obras de construção do condomínio Reserva Aldeia Inhoá, em área limítrofe à EAMES, e impedir
o Município de Vila Velha de autorizar, sem prévia anuência da Marinha, obras em locais contíguos a
fortalezas, fortificações e construções militares.
2. O primeiro ponto sob discussão é saber se a EAMES estaria sujeita à legislação atinente às
servidões militares - Decreto-
Lei n. 3.437/41. A resposta é positiva. A lei, antes de tudo, protege a própria
segurança dos civis, que poderiam vir a ser expostos a perigo, caso fossem feitas construções próximas a
instituições militares, com risco, entre outros, de balas perdidas, devido a estande de tiros.
3. O DL n. 3.437/41 não foi revogado pelo DL n. 9.760/46, por tratarem de temas distintos.
4. Não há que se falar em necessidade de prévia oitiva dos Ministérios militares, conforme
previsto no art. 100, “a”, do Decreto-
Lei nº 9.760/1946, por se tratar de norma destinada à União, na concessão do aforamento.
5. Não merece prosperar a alegação do Município de Vila Velha, ao afirmar que teria atendido
às exigências da lei, realizando a consulta prévia às autoridades militares. Tal afirmação não ficou
demonstrada nos autos.
6. Apelação da União Federal provida. Apelação do Município de Vila Velha parcialmente
provida.
(TRF-2ª Região, AC 0007197-89.2013.4.02.5001, DJ 12/05/2017)

(destacou-se)

33. Também em âmbito doutrinário a servidão militar instituída pelo Decreto-Lei nº 3.437/41 é
plenamente reconhecida, podendo-se registrar, como meros exemplos, as obras de direito
administrativo de Raquel Melo Urbano de Carvalho e Maria Sylvia Zanella Di Pietro, para quem o
Decreto-Lei nº 3.437/41 "consolidou a legislação sobre servidão militar " e, " além dessa servidão, outras
podem ser constituídas por acordo ou sentença judicial com base no art. 40 do Decreto-Lei 3.365/41
[...]". [3]
34. Portanto, em relação à vigência do Decreto-Lei nº 3.437/41, concluímos que apenas a alínea
"a" de seu art. 2º foi revogada tacitamente pelo Decreto-Lei nº 9.760/46. Destarte, a área de 1.320
metros em torno dos estabelecimentos militares continua a constituir área de servidão militar sobre a
qual o Estado (Forças Armadas) possui o direito real de gozo com vistas à manutenção da própria
segurança das instalações militares e à preservação do patrimônio que lhe é afetado, estando o
particular sujeito às restrições estatais impostas em prol do interesse público.

2.3 Ações de polícia administrativa dentro das áreas de servidão militar. Ratio legis
do Decreto-Lei 3.437/41. Princípio da supremacia do interesse público sobre o privado.

35. A par das considerações já tecidas pela CONJUR-FAB no PARECER n.


00076/2019/COJAER/CGU/AGU (Seq. 2) acerca da distinção entre polícia administrativa e polícia
judiciária, cumpre-nos acrescentar que ambas diferenciam-se essencialmente em razão dos bens
jurídicos limitados.
36. Consoante abalizada doutrina da professora Raquel Melo Urbano de Carvalho [4], a polícia
administrativa guarda relação com bens, direitos ou atividades (propriedade e liberdade), enquanto a
judiciária incide diretamente sobre pessoas (apuração das infrações penais). Sendo assim, são inerentes
às ações de polícia administrativa a limitação às liberdades individuais (não aos indivíduos).
37. Por seu turno, a servidão administrativa pode ser definida como um direito real de gozo pelo
Poder Público (ou seus delegados) sobre imóvel de propriedade alheia, mediante autorização legal, em
favor de um serviço público ou de um bem afetado a fim de utilidade pública. Definem-se ainda,
doutrinariamente, os elementos básicos desse instituto: direito real de gozo; natureza pública; coisa
serviente e coisa dominante; o Poder Público como titular do direito real; finalidade pública; e exigência
de autorização legal.
38. Na esteira desse entendimento, nítida a conclusão de que o perímetro de 1.320 metros
referido no art. 2º do Decreto nº 3.437/41 consiste exatamente numa servidão administrativa de
natureza militar, porquanto estão presentes todas as citadas caraterísticas do instituto. Inclusive, note-
se que o Decreto-Lei nº 3.437/41 foi expresso ao mencionar em seus "considerandos" a fixação de uma
área de servidão, conforme se observa:

CONSIDERANDO que a área indispensável a jurisdição e serviços de defesa do Ministério da


Guerra, de conformidade com a nossa antiga legislação, tem por base as antigas medidas
de 15 braças, em torno dos limbos exteriores dos velhos e novos fortes e a de 600 braças a
contar dos ditos limbos exteriores, como servidão,
(destacou-se)

39. Nesse contexto, o exercício do poder de polícia nessas áreas exsurge como decorrência
lógica do instituto da servidão administrativa. Aliás, a servidão por si própria traduz o poder de polícia
estatal que, como visto, nada mais é do que a limitação de direitos individuais em razão do interesse da
coletividade.
40. Com efeito, veja-se esclarecedora doutrina acerca do fundamento dessa forma de
intervenção do Estado:

Na monografia sobre Servidão Administrativa (1978:18-22), já nos havíamos colocado entre


os que explicam as várias formas de intervenção do Estado na propriedade privada como
manifestações do poder de polícia : "na realidade, tanto as chamadas limitações
administrativas à propriedade (em sentido estrito), como a ocupação temporária, a
requisição administrativa, a servidão administrativa e a desapropriação constituem
formas de limitações do Estado sobre a propriedade privada, cada uma delas atingindo o
exercício desse direito de maneira mais ou menos intensa, mas sempre com o objetivo de
satisfazer o interesse público.

[...]

Considerando, pois, a servidão administrativa dentro do regime jurídico de direito público a


que se submete, conclui-se que ela constitui uma prerrogativa da Administração
Pública agindo com o poder de império que lhe permite onerar a propriedade
privada com um direito real de natureza pública, sem obter previamente o
consentimento do particular ou título expedido pelo Judiciário. O seu fundamento é
o princípio da supremacia do interesse público sobre o privado . No exercício dessa
prerrogativa, deve a Administração respeitar as restrições decorrentes da lei ou dos
princípios publicísticos que informam a sua atividade, não devendo ultrapassar aquilo que
seja necessário e suficiente para os fins públicos que se pretende atingir com a instituição
da servidão." [5]

41. Desse modo, com escoro no princípio da supremacia do interesse público sobre o privado, a
Administração Militar possui respaldo legal e constitucional para desempenhar medidas de polícia
administrativa nas áreas de servidão, que se consideram imprescindíveis à segurança da Instituição
Militar e ao cumprimento de sua missão constitucional.
42. Outrossim, lembre-se que é dever legal do Poder Público fiscalizar e cuidar do patrimônio
público que lhe é afetado, no caso das Forças Armadas, do patrimônio entregue às Organizações
Militares. O art. 11 da Lei nº 9.636/98, que dispõe sobre o patrimônio imobiliário da União, dispõe
precisamente sobre esse aspecto:

Art. 11. Caberá à SPU a incumbência de fiscalizar e zelar para que sejam mantidas a
destinação e o interesse público, o uso e a integridade física dos imóveis pertencentes
ao patrimônio da União, podendo, para tanto, por intermédio de seus técnicos
credenciados, embargar serviços e obras, aplicar multas e demais sanções
previstas em lei e, ainda, requisitar força policial federal e solicitar o necessário
auxílio de força pública estadual.
§ 1o Para fins do disposto neste artigo, quando necessário, a SPU poderá, na forma do
regulamento, solicitar a cooperação de força militar federal.
§ 2o A incumbência de que trata o presente artigo não implicará prejuízo para:
I - as obrigações e responsabilidades previstas nos arts. 70 e 79, § 2o, do Decreto-Lei
no 9.760, de 1946;
II - as atribuições dos demais órgãos federais, com área de atuação direta ou indiretamente
relacionada, nos termos da legislação vigente, com o patrimônio da União.
(destacou-se)

43. Veja-se que o dispositivo acima é claro ao fixar a responsabilidade da Secretaria do


Patrimônio da União ou do órgão federal a quem foi destinado o imóvel (inciso I do §2º) de fiscalizar e
zelar para que sejam mantidas a destinação e o interesse público dos imóveis, podendo-se solicitar
força militar federal para tanto. Ora, se os demais órgãos federais podem solicitar apoio militar para fins
de resguardar seu patrimônio é certo que também podem as Forças Armadas fazê-lo em defesa de seu
próprio patrimônio.
44. Além disso, caso inexistisse, por suposição, a servidão administrativa militar instituída por
lei, poder-se-ia ainda invocar a teoria dos poderes implícitos para justificar o poder de polícia
administrativa das FFAA nas áreas adjacentes aos aquartelamentos. Em breves palavras, essa teoria
teve sua origem na Suprema Corte dos EUA, fundando-se na ideia de que a Constituição, ao conceder
uma função a determinado órgão ou instituição, também lhe confere, implicitamente, os meios
necessários para a consecução desta atividade.
45. Desse modo, além do poder de polícia administrativa inerente à servidão administrativa
militar fixada por lei, remanesce o ainda o poder de polícia decorrente da imposição legal de guarda e
defesa do patrimônio público destinado às Forças Armadas, por razões óbvias de segurança da
instituição e, ademais, dos particulares que transitam na área militar.
46. Diante do exposto, em resposta aos questionamentos descritos no parágrafo 11, "ii", deste
parecer, considera-se que é possível que as Forças Armadas promovam, na área de 1.320
metros ao redor dos estabelecimentos militares, ações típicas de polícia administrativa,
incidentes sobre bens, direitos o u atividades, citando-se como exemplos: patrulhamento,
fiscalização de trânsito no perímetro da OM, com estabelecimento temporário de posições
estáticas ao longo do seu itinerário, junto aos limites das instalações militares, bem como o
bloqueio dos acessos ao quartel.
47. Sobre o ponto, importante registrar a existência de vasta jurisprudência, com precedentes
inclusive do STF, a favor do exercício da polícia administrativa pelas FFAA nas áreas de servidão militar:

EMBARGOS DE DECLARAÇÃO. ART. 1.022 NOVO CPC. AUSÊNCIA DE OMISSÃO.


PREQUESTIONAMENTO E REDISCUSSÃO. IMPROVIMENTO. 1 - "São possíveis embargos de
declaração somente se o acórdão ostentar pelo menos um dos vícios elencados no artigo
535 do Código de Processo Civil (...) sendo incabível o recurso (ainda mais com efeitos
infringentes) para: a) compelir o Juiz ou Tribunal a se debruçar novamente sobre a matéria
já decidida, julgando de modo diverso a causa, diante de argumentos "novos"(...); b)
compelir o órgão julgador a responder a "questionários" postos pela parte sucumbente, que
não aponta de concreto nenhuma obscuridade, omissão ou contradição no acórdão (...); c)
fins meramente infringentes (...); d) resolver "contradição" que não seja "interna" (...) e)
permitir que a parte "repise" seus próprios argumentos (...); f) pré-questionamento, se o
julgado não contém algum dos defeitos do artigo 535 do Código de Processo Civil, pois
"...necessidade de pré-questionamento não se constitui, de per si, em hipótese de
cabimento dos embargos de declaração" (...)." (TRF3, 1. SEÇÃO, RELATOR: JOHONSOM DI
SALVO, AR Nº 2007.03.00.029798-0, JULGADO EM: 19.03.12 , PUBLICADO NO DJU EM:
23.03.12) 2 - É pacífico que o juiz ou tribunal deve decidir a questão controvertida indicando
os fundamentos jurídicos de seu convencimento, manifestando-se sobre todos os
argumentos capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada, não estando, porém,
obrigado a responder "questionários", a analisar alegações incapazes de conferir à parte os
efeitos pretendidos, tampouco a rediscutir a matéria contida nos autos. 3 - O acórdão
embargado fez análise minuciosa de todo o iter procedimental que resultou na
punição do embargante, bem como recorreu a análise exaustiva acerca da
existência de servidão militar na Avenida Soldado Passarinho e, portanto, da
competência da Polícia do Exército para fazer controle de tráfico. 4 - Embargos
com indevido caráter infringente, os quais devem ser rejeitados. (TRF-3ª, APELAÇÃO CÍVEL -
0006622-16.2008.4.03.6105, Data publicação: 15/12/2016)
[destaques acrescentados]

APELAÇÃO. ADMINISTRATIVO MILITAR. POLÍCIA DO EXÉRCITO. FISCALIZAÇÃO DE TRÂNSITO.


Á R E A MILITAR. POSSIBILIDADE. SINDICÂNCIA. LEGALIDADE, CONTRADITÓRIO E AMPLA
DEFESA VERIFICADOS. MÉRITO ADMINISTRATIVO. PUNIÇÃO DISCIPLINAR. NÃO
INTERFERÊNCIA PELO PODER JUDICIÁRIO. 1 - Entre as missões designadas para a Polícia do
Exército, consta a imposição de normas, planos e ordens referentes ao controle de trânsito
de civis e militares, vislumbrando-se o controle de circulação das vias públicas e
patrulhamento de áreas militares. Há situações em que a Polícia do Exército realiza
controle de trânsito, inclusive no que se refere à população civil transeunte,
desde que se trate de área de servidão militar. Nos termos do art. 2º do Decreto-
Lei nº 3.437/41, compreende-se que, numa área de 1.320 metros das
fortificações, há uma série de limitações a construções e aforamentos, o que
exprime existência de prerrogativas justificadas pelo primado da defesa
nacional. Pareceres da Municipalidade de Campinas/SP, da EMDEC e de uma testemunha
arrolada pelo apelante reforçam esse entendimento. Ausência de violação ao art. 24, V, do
CTB. Precedente do TRF2: (AC 199951010012314, Desembargador Federal RALDÊNIO
BONIFACIO COSTA, TRF2 - OITAVA TURMA ESPECIALIZADA, DJU - Data:21/03/2006 -
Página::249.).[...] (TRF-3ª, AC 0006622-16.2008.4.03.6105, Data publicação: 23/06/2016).
[destaques acrescentados]

ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. FORÇAS ARMADAS. ATRIBUIÇÕES. FISCALIZAÇÃO DO


TRÂNSITO EM BENS PÚBLICOS FEDERAIS, OBJETO DE SERVIDÃO MILITAR. ART. 142, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. LEI COMPLEMENTAR Nº 97/99. ART. 24, INC. V, DO CÓDIGO
NACIONAL DE TRÂNSITO. RESOLUÇÃO SMTR N.º 842, DO SECRETÁRIO MUNICIPAL DE
TRÂNSITO. 1- Ao fiscalizar o trânsito nas ruas e avenidas da Vila Militar, o Exército
exerce sua atribuição constitucional de defesa do patrimônio que lhe é afetado,
assegurando a proteção de seu pessoal e de transeuntes, evitando inclusive
alegações de responsabilidade civil, uma vez que tais logradouros possuem a
natureza jurídica de bens públicos federais, regularmente adquiridos, sujeitos à
disciplina do instituto da servidão militar. 2- Todos os bens e direitos reais federais
gozam da proteção constitucional, que deve ser argüida, na espécie, a favor da União,
sendo lícita e de base constitucional qualquer atividade fiscalizatória ou de
polícia administrativa das Forças Armadas, garantindo-se a segurança e a
integridade dos Próprios Nacionais, das vias que os integram, atravessam ou são
contíguas, dos funcionários e de transeuntes, no raio de 1.320,00 metros à volta
dos estabelecimentos castrenses, decorrente do instituto da servidão militar. 3- É
inequívoca a observância do papel das Forças Armadas, outorgado pelo art. 142 da Lei
Maior e regulamentado pela Lei Complementar 97/99, bem como sua participação na
ordem democrática, no âmbito de seu destino constitucional, estando plenamente
integradas ao Poder Civil, nos projetos comuns de interesse da sociedade. 4- A força
armada pode fazer policiamento ostensivo de trânsito na Área de Servidão
Militar, pois essa atribuição integra o instituto e faz parte da
defesa militar preventiva das instalações e equipamentos, à distância, não se
ferindo, assim, a Resolução SMTR nº 842, do Secretário Municipal de Trânsito, nem
tampouco se contrariando o dispositivo do inciso V, do artigo 24, do Código Nacional de
Trânsito. 5- Apelação e remessa necessária parcialmente providas, reformando-se
parcialmente a r. sentença a quo, para que a atuação da Força Armada só se verifique na
forma e meios constitucionais, assegurando-se-lhe o exercício dos direitos decorrentes
da Servidão Militar na área em questão, mantendo a distância de 1.320,00 metros externa
e paralelamente aos limites dos Próprios Nacionais, inclusive na fiscalização do trânsito,
garantindo a validade da Resolução SMTR nº 842, do Secretário Municipal de Trânsito,
convalidando os atos administrativos praticados, garantindo-se, outrossim, a aplicação de
sanções de trânsito pela Força Armada em outras áreas, temporariamente, quando em
missões de segurança (TRF-2, AC 0001231-30.1999.4.02.5101, Data publicação:
21/03/2006)
[destaques acrescentados]

48. Questão diversa, todavia, diz respeito ao poder de polícia judiciária, que abrange o
questionamento sobre a possibilidade de efetuar-se prisões em flagrante delito, conforme será
abordado no tópico adiante.

2.4 Polícia Judiciária. Prisões em flagrante delito. Dever de atuação das Forças
Armadas quanto aos crimes militares. Mera possibilidade quanto aos crimes comuns.
Exegese do art. 144 da CF, art. 16-A da LC 97/99, art. 243 do CPPM e art. 301 do CPP.

49. A realização de prisões em flagrante delito insere-se no exercício do poder de polícia


judiciária, porquanto envolve o cometimento de possível crime. Logo, devem ser efetuadas pelo órgão
competente levando-se em consideração a natureza do crime, se militar ou comum.
50. Sobre o assunto, o manual da Escola Superior de Guerra traz disciplina semelhante,
explicitando o papel da segurança pública:

Na administração pública, o Poder Executivo exerce o chamado Poder de Polícia, que


engloba duas relevantes funções: a polícia administrativa e a polícia de Segurança
Pública. A primeira consiste no poder estatal de disciplinar, tendo em vista o interesse
público, diversas atividades da sociedade, tais como os setores da saúde pública, costumes,
comunicações, atividades econômicas, situação de estrangeiros, exercício profissional, uso
e fruição da propriedade. A segunda, correspondendo ao dever do Estado em oferecer
condições de segurança à sociedade, seja no plano pessoal seja no coletivo, consiste no
poder-dever estatal de prevenir e reprimir o crime e a criminalidade. [6]

51. Enquanto a polícia administrativa rege-se pelos princípios do Direito Administrativo e " se
difunde por todos os órgãos administrativos, de todos os Poderes e entidades públicas, que tenham
atribuições de fiscalização", a polícia judiciária é regida pelas normas de Direito Processual Penal e " é
privativa dos órgãos auxiliares da Justiça (MP e Polícia em geral), ou seja, é executada por órgãos de
segurança" [7].
52. Nesse sentido, a Constituição Federal, ao tratar da Segurança Pública, definiu em seu art.
144 os órgãos aos quais compete o poder de polícia judiciária, verbis :
CAPÍTULO III
DA SEGURANÇA PÚBLICA

Art. 144. A segurança pública, dever do Estado, direito e responsabilidade de todos, é


exercida para a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do
patrimônio, através dos seguintes órgãos:

I - polícia federal;
II - polícia rodoviária federal;
III - polícia ferroviária federal;
IV - polícias civis;
V - polícias militares e corpos de bombeiros militares.

§ 1º A polícia federal, instituída por lei como órgão permanente, organizado e mantido
pela União e estruturado em carreira, destina-se a:

I - apurar infrações penais contra a ordem política e social ou em detrimento de bens,


serviços e interesses da União ou de suas entidades autárquicas e empresas públicas,
assim como outras infrações cuja prática tenha repercussão interestadual ou internacional
e exija repressão uniforme, segundo se dispuser em lei;
II - prevenir e reprimir o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o contrabando e o
descaminho, sem prejuízo da ação fazendária e de outros órgãos públicos nas respectivas
áreas de competência;
III - exercer as funções de polícia marítima, aeroportuária e de fronteiras;
IV - exercer, com exclusividade, as funções de polícia judiciária da União .

§ 2º A polícia rodoviária federal, órgão permanente, organizado e mantido pela União e


estruturado em carreira, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das
rodovias federais.
§ 3º A polícia ferroviária federal, órgão permanente, organizado e mantido pela União e
estruturado em carreira, destina-se, na forma da lei, ao patrulhamento ostensivo das
ferrovias federais.
§ 4º Às polícias civis , dirigidas por delegados de polícia de carreira, incumbem, ressalvada
a competência da União, as funções de polícia judiciária e a apuração de infrações
penais, exceto as militares.
§ 5º Às polícias militares cabem a polícia ostensiva e a preservação da ordem
pública; aos corpos de bombeiros militares, além das atribuições definidas em lei, incumbe
a execução de atividades de defesa civil.
§ 6º As polícias militares e corpos de bombeiros militares, forças auxiliares e reserva do
Exército, subordinam-se, juntamente com as polícias civis, aos Governadores dos Estados,
do Distrito Federal e dos Territórios.
§ 7º A lei disciplinará a organização e o funcionamento dos órgãos responsáveis pela
segurança pública, de maneira a garantir a eficiência de suas atividades.
§ 8º Os Municípios poderão constituir guardas municipais destinadas à proteção de seus
bens, serviços e instalações, conforme dispuser a lei.

(destacou-se)

53. Como se vê, as funções de segurança pública encontram-se repartidas entre os órgãos
citados no supracolacionado art. 144 da Carta Magna, cabendo à polícia rodoviária federal, à polícia
ferroviária federal e às polícias militares atuarem de forma preventiva por meio de policiamento
ostensivo e, à polícia federal e às polícias civis dos estados, as funções de polícia judiciária.
54. Especialmente acerca da prisão em flagrante delito para os crimes comuns, a disciplina
legal encontra-se estampada no art. 301 do Código de Processo Penal, segundo o qual "qualquer do
povo poderá e as autoridades policiais e seus agentes deverão prender quem quer que seja encontrado
em flagrante delito". Nesses termos, constitui dever do Estado, por meio de suas autoridades policiais,
realizar prisões em flagrante delito caso haja suposto cometimento de crime comum. As autoridades
policiais habilitadas para isso estão, como visto, listadas no art. 144 da CF, anteriormente comentado.
55. Logo, os militares das Forças Armadas, que não são policiais e tampouco estão inseridos no
art. 144 da Carta Magna como integrantes de órgão de segurança pública, não têm o dever legal de
realizar prisões em flagrante delito no caso de crimes comuns.
56. Compete-lhes, de outro lado, o exercício do poder de polícia judiciária na esfera criminal
militar, nos moldes do art. 7º do CPPM:

Exercício da polícia judiciária militar


Art. 7º A polícia judiciária militar é exercida nos têrmos do art. 8º, pelas seguintes
autoridades, conforme as respectivas jurisdições:
a) pelos ministros da Marinha, do Exército e da Aeronáutica, em todo o território nacional e
fora dêle, em relação às fôrças e órgãos que constituem seus Ministérios, bem como a
militares que, neste caráter, desempenhem missão oficial, permanente ou transitória, em
país estrangeiro;
b) pelo chefe do Estado-Maior das Fôrças Armadas, em relação a entidades que, por
disposição legal, estejam sob sua jurisdição;
c) pelos chefes de Estado-Maior e pelo secretário-geral da Marinha, nos órgãos, fôrças e
unidades que lhes são subordinados;
d) pelos comandantes de Exército e pelo comandante-chefe da Esquadra, nos órgãos,
fôrças e unidades compreendidos no âmbito da respectiva ação de comando;
e) pelos comandantes de Região Militar, Distrito Naval ou Zona Aérea, nos órgãos e
unidades dos respectivos territórios;
f) pelo secretário do Ministério do Exército e pelo chefe de Gabinete do Ministério da
Aeronáutica, nos órgãos e serviços que lhes são subordinados;
g) pelos diretores e chefes de órgãos, repartições, estabelecimentos ou serviços previstos
nas leis de organização básica da Marinha, do Exército e da Aeronáutica;
h) pelos comandantes de fôrças, unidades ou navios;

Competência da polícia judiciária militar


Art. 8º Compete à Polícia judiciária militar:
a) apurar os crimes militares, bem como os que, por lei especial, estão sujeitos à jurisdição
militar, e sua autoria;
[...]

57. A respeito das prisões em flagrante, o art. 243 do Código de Processo Penal Militar i mpôs,
coerentemente, aos militares o exercício desse dever legal, dispondo que "qualquer pessoa poderá e os
militares deverão prender quem fôr [sic] insubmisso ou desertor, ou seja encontrado em flagrante
delito".
58. Desse modo, resta claro que as Forças Armadas não detêm competência para o exercício
de poder polícia judiciária quanto aos crimes comuns, tendo em vista que não se inserem no rol dos
órgãos responsáveis por realizar segurança pública. Por essas razões, não há viabilidade jurídica para
advogar-se a existência de dever legal de prisões em flagrante delito quanto a esses crimes, a não ser,
por óbvio, em situações de GLO ou no exercício das atribuições subsidiárias previstas na LC 97/99.
59. Oportunamente, lembre-se que, na forma do art. 142 da CF, as funções das Forças Armadas
são a defesa da Pátria, a garantia dos poderes constitucionais e, por iniciativa de qualquer destes, em
casos excepcionais, da lei e da ordem, não lhes incumbindo, portanto, atividades típicas de segurança
pública.
60. Especificamente sobre segurança pública e Forças Armadas, convém registrar o
posicionamento do ex-Ministro da Defesa Raul Jungmann, em artigo publicado na Revista do Ministério
Público Militar:
[...]
Desse modo, verifica-se que o legislador constituinte não atribui às Forças Armadas o papel
de fazer a segurança pública interna do Estado Brasileiro. Aliás, deixou patente que a
segurança pública é uma atribuição dos diversos corpos policiais e dos corpos de
bombeiros militares.
Sendo assim, por intermédio da leitura do dispositivo constitucional, infere-se com clareza
solar que as polícias em todos os seus ramos e os corpos de bombeiros militares são as
que têm a atribuição normal de manter a ordem pública interna e a segurança pública.
(...)
Nesses termos, é fundamental que o Estado Brasileiro dote as suas forças policiais e corpos
de bombeiros militares de capacidade, dando-lhes condições de lidar com situações graves
de perturbação da ordem, a fim de que os militares das Forças Armadas somente sejam
mobilizados para essas ações em casos episódicos e possam dedicar-se com afinco em
suas funções de defesa e soberania nacional.
(...)
O uso das Forças Armadas em GLO é previsto na Constituição Federal de 1988 e
regulamentado em legislação infraconstitucional. Ainda assim, isto deve ocorrer em
situações especiais, quando as forças policiais não conseguem garantir de modo adequado
o cumprimento da lei, restabelecer a ordem e garantir a paz social. Entretanto, esse uso
não deve ser excessivo, pois os militares não são especificamente destinados para exercer
esse papel de polícia. [8]

61. Espancando definitivamente quaisquer dúvidas, observa-se ainda que a Lei Complementar
nº 97/99 (dispõe sobre as normas gerais para a organização, o preparo e o emprego das Forças
Armadas) atribui aos militares competência para realização de prisões em flagrante delito nos crimes
comuns excepcionalmente quando do exercício de suas atribuições subsidiárias. Observe-se:

Art. 16-A. Cabe às Forças Armadas, além de outras ações pertinentes, também como
atribuições subsidiárias, preservadas as competências exclusivas das polícias
judiciárias, atuar, por meio de ações preventivas e repressivas , na faixa de fronteira
terrestre, no mar e nas águas interiores, independentemente da posse, da propriedade, da
finalidade ou de qualquer gravame que sobre ela recaia, contra delitos transfronteiriços e
ambientais, isoladamente ou em coordenação com outros órgãos do Poder Executivo,
executando, dentre outras, as ações de :

I - patrulhamento;

II - revista de pessoas, de veículos terrestres, de embarcações e de aeronaves; e

III - prisões em flagrante delito.

Parágrafo único. As Forças Armadas, ao zelar pela segurança pessoal das autoridades
nacionais e estrangeiras em missões oficiais, isoladamente ou em coordenação com outros
órgãos do Poder Executivo, poderão exercer as ações previstas nos incisos II e III deste
artigo.

(destacou-se)

62. A partir dessas considerações, portanto, o argumento de manutenção da ordem ou


segurança pública não enseja o dever legal de realização de prisão em flagrante delito em caso de
crimes comuns por parte da Marinha, o Exército ou a Aeronáutica na área de servidão militar, tendo
em vista que aquelas funções não lhes pertencem ordinariamente, nos termos do que dispõem os arts.
142 e 144 da Constituição da República.
63. Em conclusão deste tópico, temos que, nas áreas de servidão de que trata o Decreto-Lei nº
3.437/41, os militares das FFAA têm competência legal para realizar prisões em flagrante
delito relativamente a crimes militares, podendo, para o exercício dessa competência,
realizar rondas externas (motorizadas e a pé) no perímetro da OM.

3. CONCLUSÃO E ORIENTAÇÕES:

64. De tudo quanto exposto, esta CONJUR-MD apresenta as seguintes conclusões:

i) segundo as regras da Lei de Introdução às Normas do Direito Brasileiro, concluímos que


apenas a alínea "a" do art. 2º do Decreto-Lei nº 3.437/41 foi revogada tacitamente pelo
Decreto-Lei nº 9.760/46, de modo que o perímetro de 1.320 metros em torno dos
estabelecimentos militares continua a constituir área de servidão militar sobre a qual o
Estado (Forças Armadas) possui o direito real de gozo, em prol do interesse público ínsito à
função militar;

ii) é possível que as Forças Armadas promovam, na área de 1.320 metros ao redor dos
estabelecimentos militares, ações típicas de polícia administrativa, incidentes sobre bens,
direitos ou atividades, citando-se como exemplos: patrulhamento, fiscalização de trânsito
no perímetro da OM, com estabelecimento temporário de posições estáticas ao longo do
seu itinerário, junto aos limites das instalações militares, bem como o bloqueio dos acessos
ao quartel;

iii) como regra geral, é dever do Estado, por meio de suas autoridades policiais, realizar
prisões em flagrante delito quando ocorrem crimes comuns, estando tais autoridades
listadas no art. 144 da CF; por outro lado, aos militares compete efetuar prisões em
flagrante na hipótese de cometimento de crimes militares, nos termos do art. 7º e 243 do
Código de Processo Penal Militar. Logo, dentro do contexto criminal militar, é possível a
condução de rondas externas (motorizadas e a pé) no perímetro da OM;
iv) prover segurança pública à sociedade não constitui atribuição própria das Forças
Armadas, razão pela qual o argumento de manutenção da ordem pública não enseja o
dever legal de realizar prisões em flagrante nos crimes comuns, mesmo quando ocorridos
em áreas de servidão militar, exceto quando se tratar de operações de Garantia de Lei e da
Ordem ou, ainda, quando do exercício das atribuições subsidiárias de que trata a Lei
Complementar nº 97/99;

v) o instrumento cabível para a regulamentação jurídica dessas áreas seria, eventualmente,


um ato de natureza normativa, sendo oportuno lembrar que já se encontra em elaboração
projeto de decreto presidencial visando estabelecer, para fins de proteção e garantia da
soberania nacional, as áreas de interesse da defesa e segurança nacional. O citado projeto
de decreto está em trâmite nos autos do NUP 60410.000207/2018-11; e

vi) orienta-se, como consequência das conclusões anteriores, a aplicação da seguinte tese
de uniformização: "O Decreto-Lei nº 3.437/41 encontra-se válido e vigente, tendo
sido revogada tacitamente pelo Decreto-Lei 9.760/46 apenas a alínea "a" do seu
art. 2º, de modo que a área de 1.320 metros em torno dos estabelecimentos
militares continua a constituir área de servidão militar, sobre a qual o Estado
(Forças Armadas) pode promover ações típicas de polícia administrativa, não lhes
competindo, todavia, o dever de efetuar prisões em flagrante nos crimes
comuns."

65. Ademais, recomenda-se à COADM desta CONJUR-MD o seguinte:

i) a inclusão da tese uniformizada no item "vi" do parágrafo 64 deste parecer no "Quadro de


Teses Uniformizadas e Análises Relevantes", disponível na pasta da Coordenação-Geral de Direito
Administrativo e Militar - CGDAM, subpasta "Uniformização e temas relevantes", bem como o registro no
referido quadro das principais informações referentes ao presente processo. Junte-se ainda cópia deste
parecer na referida subpasta; e

ii) a abertura de tarefa via Sapiens às três Consultorias Jurídicas-Adjuntas das Forças, para
ciência deste Parecer e adoção das providências cabíveis no âmbito de sua alçada; e

iii) a abertura de tarefa via SEI para o EMCFA, a fim de que tenha ciência deste Parecer e
adote as providências cabíveis no âmbito de sua alçada, inclusive quanto à avaliação em submeter este
parecer à aprovação ministerial, para fins de lhe conferir efeito vinculante.

À consideração superior.

Brasília, 05 de julho de 2019.

LEYLA ANDRADE VERAS


ADVOGADO DA UNIÃO

[1] Decreto-Lei 9.760/46:


Art. 1º Incluem-se entre os bens imóveis da União:
i) os arsenais com todo o material de marinha, exército e aviação, as fortalezas,
fortificações e construções militares, bem como os terrenos adjacentes, reservados por ato imperial;
l) os que tenham sido a algum título, ou em virtude de lei, incorporados ao seu patrimônio.

Constituição Federal de 1988:


Art. 20. São bens da União:
I - os que atualmente lhe pertencem e os que lhe vierem a ser atribuídos;

[2] No RE 61508 EDv/BA, o STF reconhece a existência das áreas de servidão militar nos
termos do Decreto 3.437/41, ou seja, 1.320 metros ao redor dos aquartelamentos.

[3] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 29 ed., rev., atual. e ampl. Rio de
Janeiro: Forense, 2016, pág. 162/163.

[4] CARVALHO, Raquel Melo Urbano de. Curso de Direito Administrativo. Editora Podium, 2ª
ed., pág. 356/357.

[5] DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 29 ed., rev., atual. e ampl. Rio de
Janeiro: Forense, 2016, pág. 133 e 156

[6] Manual Básico da Escola Superior de Guerra. - Rio de Janeiro: A Escola, 2006, p. 18.

[7] CARVALHO, Raquel Melo Urbano de. Curso de Direito Administrativo. Editora Podium, 2ª
ed., pág. 356/357.

[8] JUGMANN, Raul. A Competência das Forças Armadas na Constituição Federal de 1988 e o
seu Papel na Segurança Interna. In: Revista do Ministério Público Militar. Ano 42, nº 27. Brasília:
Procuradoria-Geral de Justiça Militar, 2017, p. 75.

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ASSUNTOS: ASSESSORAMENTO ESPECIALIZADO À ATIVIDADE JURÍDICA

1. Aprovo o PARECER n. 00484/2019/CONJUR-MD/CGU/AGU, em anexo.

Brasília, 22 de julho de 2019.

JULIANA GOMES FALLEIROS CAVALHEIRO


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INTERESSADOS: COMANDO DE PREPARO - COMPREP
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Brasília, 23 de julho de 2019.

IDERVANIO DA SILVA COSTA


Consultor Jurídico do Ministério da Defesa

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NUP: 67280.000231/2022-17
INTERESSADOS: VI COMAR
ASSUNTOS: Consulta a respeito das atribuições, competências e limites de atuação dos
militares do Campo de Provas Brigadeiro Velloso (CPBV), por ocasião de realização de
missões patrimoniais por parte de seu efetivo.

1. Aprovo o PARECER n. 00177/2022/COJAER/CGU/AGU, da lavra do Advogado da União Dr.


VICTOR CHAVES RIBEIRO FRANÇA GUIMARÃES.

2. Trata-se de relevante consulta acerca das responsabilidades a cargo dos titulares de


organizações militares, mais especificamente acerca das atribuições, competências e limites de
atuação, em face da identificação de situações de cometimento de ilícitos, em se tratando de
ações praticadas dentro do perímetro da organização militar, extensível à circunferência de
1.320 (mil trezentos e vinte) metros de raio ao redor dos estabelecimentos militares.​​

3. Encaminhe-se ao Comandante do VI Comando Aéreo Regional.​

4. Considerando que as orientações ora expostas têm aplicação ampla, no âmbito das
organizações militares da Força Aérea Brasileira, encaminhe-se para ciência também ao Estado-Maior
da Aeronáutica e ao Comando de Preparo​, para ciência.

5. Abra-se para ciência da equipe jurídica desta COJAER. Publique-se na intranet desta
COJAER.

Brasília, 01 de junho de 2022.

TANIA PATRICIA DE LARA VAZ


Advogada da União
Consultora Jurídica Adjunta do Comando da Aeronáutica

Atenção, a consulta ao processo eletrônico está disponível em


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67280000231202217 e da chave de acesso 0ad05db4

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