Você está na página 1de 146

COPYRIGHT 2019 © ALINE PÁDUA

1° edição – agosto 2019

TODO O ENREDO É DE TOTAL DOMÍNIO DA AUTORA,


SENDO TODOS OS DIREITOS RESERVADOS. PROIBIDA
QUALQUER FORMA DE REPRODUÇÃO TOTAL OU PARCIAL DA
OBRA, SEM AUTORIZAÇÃO PRÉVIA E EXPRESSA DA AUTORA.

QUALQUER SEMELHANÇA COM A REALIDADE É


MERA COINCIDÊNCIA.

ILUSTRADORA: Mari Sales

REVISÃO: Gabriela Ferraz


Sumário
Sinopse

Prefácio

Prólogo

Parte I

01

02

03

04

05

06

Parte II

07

08

09

10

11

12

Epílogo

Contatos da autora
Sinopse

Quem em sã consciência nega o pedido de casamento do homem


que ama? Nina Moreira o fez, em seu momento de maior lucidez. Ela sabia

que sua escolha, naquele exato instante, influenciaria no destino de ambos.


Deixaria para trás Pablo Marini. Entretanto, a vida pode dar seu jeitinho e
eles permaneceram entrelaçados, mas não da forma que realmente
gostariam. Mágoa e o passado são as duas únicas coisas que realmente
prevaleceram. A notícia do noivado de Pablo com outra mulher, fez o
mundo de Nina sair do eixo. Mais uma vez. Ela odiava a palavra
casamento. Primeiro: porque já teve que negar tal pedido. Segundo: porque
estava prestes a tentar impedir um. Entre as escolhas do passado, poderia

um amor sobreviver?
Importante

Esse livro é um SPIN OFF dos livros Rejeitada pelo CEO e Amada

pelo CEO. Pablo Marini e Nina Moreira são personagens secundárias das
tramas anteriores, portanto, aparecem nos mesmos. Assim, torna-se
necessária a leitura dos livros anteriores para o melhor entendimento
deste.

Caso ainda não os tenha adquirido, aqui estão os links:

Rejeitada pelo CEO

Amada pelo CEO


Prefácio

“Um fio invisível conecta os que estão destinados a conhecer-se…

Independentemente do tempo, lugar ou circunstância…

O fio pode esticar ou emaranhar-se,

mas nunca irá partir.”


Akai Ito
Prólogo
minha maior ficção de amor[1]

No passado...

Existia algo especial em São Paulo, que nunca entenderia de fato.

Chiara, minha irmã mais nova estava em êxtase desde que soube que
passei em Administração em uma das universidades públicas da cidade.
Ela era apaixonada e completamente louca para conhecer o lugar.
Enquanto eu, odiava ficar longe de casa. Contudo, era a melhor opção e
não teria prestado a prova se não tivesse coragem de me mudar de fato.
São apenas quatro anos, tornou-se meu mantra nos últimos meses, além de
tudo, naquela primeira semana de aulas.
Suspirei fundo, andando pelo campus e procurado um lugar para
prender minha bicicleta. Parei perto de uma sombra, e agradeci ao meu

anjo da guarda por me proporcionar momentos de glória. Encostei a


bicicleta e passei o cadeado, assim que me agachei para prendê-la,
desequilibrei-me. Poderia até ver minha mãe com o dedo apontado em
minha direção e chamando atenção: isso que dá não se exercitar!

Assim que meu corpo foi para frente, preparei-me para sentir o
baque da bicicleta sobre o mesmo. Fechei os olhos e tentei proteger meu
rosto. A cena seria cômica, se não fosse trágica. Porém, senti a presença de
mais alguém, e felizmente, a bicicleta permanecera em pé. Busquei a
pessoa com os olhos, e tive que fazer sombra com as mãos no momento
que a luz solar incidiu diretamente em nós. Parece que meu anjo da guarda
tirara a sombra de questão, talvez sendo substituído por outro alguém
físico. Assim que consegui vencer os raios solares, fui presentada por

olhos negros.

Era um homem, e chutaria uns vinte e cinco anos. Seus cabelos


eram cumpridos e negros, assim como os olhos. Uma leve barba da mesma
cor, contrastava contra a pele branca. De repente, ele abriu um leve sorriso,
e prendi a respiração, sem saber definir o que sentia.

— Aqui, eu te ajudo. — ofereceu-me a mão livre, enquanto


segurava com a outra a bicicleta.
Não fale com estranhos! Minha mente acusou, como se ainda
tivesse cinco anos de idade. Porém, eu já tinha dezenove, e era caloura

naquele lugar. Conhecer alguém não era algo ruim, no fim das contas.

Neguei sua mão, e me levantei, sorrindo de lado. Sentia-me exposta


sobre seu olhar, e não sabia explicar porque meu corpo parecia reconhecer
o dele. Não era uma pessoa que gostava facilmente de alguém no primeiro

momento. Era até mesmo metódica para fazer amizades. Porém, o cara que
sequer sabia o nome e me inspecionava por completo, parecia agradável
demais.

Balancei a cabeça, tentando sair de meus devaneios.

— Desculpe o trabalho. — argumentei, finalmente encontrando


minha voz. — Não acredito que passei essa vergonha.

Ele gargalhou baixo, e de repente, percebi o quanto seu timbre era


rouco. Por Deus do céu! Nunca tinha reagido de tal forma para com

alguém.

— Acontece nos melhores primeiros dias da faculdade. — caçoou e


eu levantei as mãos em sinal de rendição. — Mas princesas precisam ser
salvas.

Arqueei a sobrancelha e bufei. Analisei suas roupas, e estava óbvio


que ele não era alguém que dependia de auxílios estudantis para estar ali.
Não como eu. Ele vestia roupas de marca, assim como, um relógio que

deveria custar uns três alugueis da kitnet que conseguira.

— Não pensei que seria salva por um playboy. — ele pareceu


chocado e continuei sorrindo de lado. — Mas agradeço mesmo assim,
aliás, é bom que saiba que não sou nenhuma princesa e nem espero contos
de fadas. — dei um passo à frente, e segurei a bicicleta. Ele se afastou e

logo um sorriso emoldurou o belo rosto.

— É realmente nova por aqui, não é? — indagou, e dei de ombros.

Ao menos, era boa em lidar com o caos. Muitas vezes, minha mãe
me denominava como o próprio.

— Depois dessa vergonha toda, não tenho a chance de negar.

Ele assentiu e esticou a mão.

— Sou Pablo, segundo ano de direito.

Olhei para sua mão esticada e achei estranho tal movimento.

Geralmente, as pessoas não faziam tal coisa. Ao menos, não de onde eu


vinha. No caso de lá, eles faltavam te abraçar e não soltar mais. Sem
conseguir acreditar em minha própria confiança, apertei sua mão. Seu
toque era bom e não me lembrava de algum momento que sentira o
mesmo. Seu sorriso se fechou, e de repente, senti a intensidade dos olhos
negros sobre mim. Assim como, encarei nossas mãos unidas. Era estranho
sentir tal coisa, ainda mais, com um desconhecido, mas era bom. Incrível e
supreendentemente bom.

— Nina, caloura de administração.

Ele deu um leve aperto em minha mão e logo a soltou.

— Precisa de ajuda com algo? — indagou e suspirei fundo.

Aquilo ficava cada vez mais esquisito, porém, não conhecia


ninguém no lugar. De toda forma, era bom dar a chance a alguém para
começar.

— Se souber me dizer onde ficam as salas, agradeceria.

Ele assentiu e fez um gesto com o corpo, como se indicando o


caminho. Abaixei-me e prendi a bicicleta, felizmente, sem mais nenhum
momento embaraçoso. Assim que me prostrei, Pablo ainda permanecia
parado, aguardando-me. Prendi a mochila mais ao corpo, e dei um passo
em sua direção. Mal sabia eu, que naquele momento, dava o primeiro de

muitos até ele.


Meus passos até ele me levaram até aquele momento. Quatro anos
se passaram e finalmente um ciclo se fechava em minha vida. Estava

formada, assim como Pablo. Sabia que aquele era um momento crucial
para ambos. Longe de todas as comemorações, estávamos nós na kitnet
que continuaria como minha por apenas mais uma semana.

— Acabou e eu nem consigo acreditar. — falei, assim que cheguei

ao quarto e estaquei no lugar quando notei Pablo com um buquê de rosas


em mãos. Sorri para ele, e aceitei o presente, dando-lhe um leve beijo. —
Obrigada, playboy.

— E agora, Nina? —indagou de repente, e o encarei sem entender.

— Como assim?

— Não falamos sobre, mas... Sabe que tenho a pós fora do país. —
comentou e assenti. Seria difícil, e imaginava que ambos sofreríamos com
a distância. Mas ainda assim, acreditava que estávamos destinados. Ao

menos, me agarrava aquela ideia.

— Lembra da lenda do fio vermelho que te disse, não é? —


perguntei e depositei as rosas sobre o que ainda era minha cama. — A
gente vai conseguir achar o caminho um para o outro, tenho certeza.

— Eu quero saber se quer começar agora. — franzi o cenho, ao


mesmo tempo que Pablo caiu sobre um joelho.
Meu coração disparou e senti minha garganta secar.

— Levanta. — pedi, e ele franziu o cenho, como se não esperasse

tal reação. — O que está fazendo? — indaguei, perdida no momento que


jamais imaginei entre nós.

— Tentando te pedir em casamento. — sorriu de lado, e o vi pegar


uma caixinha de veludo do bolso da blusa que usava.

— Não. — falei de uma vez, e me ajoelhei a sua frente, não o


deixando abrir a caixinha. — Não, Pablo. Não faz isso com a gente.

Levantei-me e levei a mão aos cabelos. Tudo se desestruturava.


Não estava preparada para aquilo. Eu tinha uma vida a seguir. Formatura,
voltar para o interior, custear os estudos de minha irmã... Aquilo me tirou
dos eixos. Não acreditava em casamentos. Não mesmo. Nem imaginava
que aquela ideia pairava sobre Pablo.

— Casa comigo, Nina. — insistiu e fiquei apenas parada, de costas.

— Vem comigo para o Canadá, vamos...

— Eu não quero. — soltei de repente, sem ao menos ponderar o


peso de minhas palavras. Virei-me e tentei lhe dizer a realidade. — Eu não
posso, Pablo.

— Preciso da gente. — olhei-o e notei seus olhos marejados, e


sabia que me encontrava da mesma forma.
— Pablo, eu não posso. — minha voz saiu fraca, mas não podia
fugir do que acreditava, do que realmente queria. — Há coisas maiores do

que nós.

Ele não se deu por vencido. Logo se levantou e senti suas mãos
segurarem os dois lados de meu rosto, e conseguia enxergar o pedido
silencioso de que mudasse minha resposta – que mudasse de ideia.

Eu não podia.

— Preciso de você, Nina. — seus olhos negros como a noite,


deixavam-me ainda mais perdida. Queria poder me perder completamente
neles. Mas não daquela forma. — Não quero deixar o que vivemos para
trás.

Nem eu poderia fazer tal coisa. Não seria capaz. Entretanto, dar-lhe
meu sim desestruturaria nossas vidas. E de outros mais. Por ele, valia a
pena o risco de esperar. O risco de um dia, ser a mulher certa no momento

certo. Ou se o fio vermelho se desfizesse – de alguma maneira ilógica


sabia que ele era o meu – eu daria um jeito de o refazer. Acreditava de fato
naquilo e pensei que ele fazia o mesmo. De repente, vi que não estávamos
com a mesma ideia de futuro.

— O momento não é agora. — beijei levemente sua mão, e retirei-a


de meu rosto.
— Nunca será... — constatou e me calei, sem lhe entregar o que
queria. Ele tentaria mudar minha ideia ou até mesmo, desfazer seus planos.

Então, entreguei-lhe a parte que o deixaria com a dúvida. Porém,


Pablo entendeu como constante e certeira. Ele escolheu seguir o padrão de
que “quem cala consente”.

De algum modo torto, eu consentia.

Suas mãos se afastaram, assim como, seu corpo. Ele não disse
nada, enquanto eu partia nossos corações. Deu-me suas costas como adeus
e em seguida apenas me virei, para não ter que vê-lo partir. De algum
modo, soara como a confirmação que ele necessitava para me deixar.
Parte I

“Aos caminhos, entrego o nosso encontro e se tiver que ser, como


tem que ser, do jeito que tiver que ser, a gente volta um dia.”

Caio Fernando Abreu


01
eu te imagino, eu te conserto[2]

No presente... (dez anos depois)

Um: tudo o que queria era socar a cara do babaca do chefe de


minha irmã.

Dois: queria socar a cara da minha irmã por se apaixonar por um


babaca completo.

Onde foi que ela arrumou aquele dedo podre?

Encarei o celular por alguns instantes e ponderei sobre o que fazer.


Sabia bem que ela precisava de minha ajuda, e conhecer um bom
advogado era necessário. Em todo caso, conhecia um que era o melhor,
ainda mais, no meio trabalhista. Suspirei e abri seu contato, encarando a

foto que salvei. Olhar para aquele momento congelado, era como ser

teletransportada para quando a tirei.

Fora a primeira foto que tive dele, e nunca consegui apagá-la,


mesmo que tenha mudado de aparelho ao longo dos anos. Sempre a
salvava e trazia de volta para perto. Era como querer reviver o que sequer

tivemos, ou me agarrar aquilo que sempre seria meu – as lembranças do


que fomos. Pablo Marini estava enraizado em minha alma, e mesmo sem
notar, em meu coração.

O destino era esquisito e agia de maneiras que nunca entenderia.


Talvez eu fosse uma adoradora de caminhos que acreditava serem
previamente traçados. Acreditava que o meu caminho ainda se esbarraria
com o dele mais uma vez. Já tinham se completado mais de uma década, e
tirando encontros esporádicos nesse meio tempo, devido à minhas idas a

São Paulo para visitar minha irmã, ou até mesmo a trabalho, nada de fato
se desenrolou.

Por vários momentos, vi-me acreditando que inventei a parte de


nós que parecia tão conectada. As poucas vezes que revi Pablo nos últimos
anos, não fora nada além do normal. O que me assustava além do normal.
Porque ele parecia o mesmo, só que mais maduro. E eu, parecia ainda
agarrada a um sentimento que nos levara para cama em alguns momentos e
arrependimentos de sua parte.

— Já vai? — indaguei, no momento que a lanterna de seu celular

foi ligada.

Talvez ele pensasse que eu estava dormindo, ou queria mostrar que


de fato já ia. Suspirei fundo, levantando-me nua da cama e seguindo até o
rastro de roupas deixadas pelo caminho. Sequer sabia como de fato

chegamos ali. Mas vir para São Paulo e encontrar fornecedores para a
padaria que administrava para minha mãe, sempre resultava na mesma
coisa. Eu, Pablo e uma cama. O que nunca era o bastante para mim. Ao
menos, não mais. Não depois de seis anos nos limitando àquilo. Sabia que
ele não daria um passo à frente, e as suas atitudes, eram claras.

Coloquei a camisa, enquanto o ambiente ainda era iluminado


apenas pela luz de seu celular. Fui até o interruptor e o quarto todo se
iluminou. Pablo vestia apenas uma cueca, mas não era apenas por aquilo

que ele parecia nu a minha frente. Era como se acabasse de expô-lo.

— Tenho que ir, Nina.

— Por que a gente ainda faz isso? — indaguei de repente, e seus


olhos me encararam profundamente. — Não precisamos ser apenas sexo,
Pablo. Já faz anos que evitamos falar sobre, mas... Não quero nos resumir
a isso.
— Somos amigos, acima de tudo.

Suas palavras pareciam perdidas.

— Somos imbecis. — balancei a cabeça, sabendo que éramos


muito além. Ao menos, para mim. — Tem certeza de que não quer dar uma
chance a nós? — indaguei e ele suspirou profundamente.

Logo seu corpo estava a minha frente, e me vi puxada para seu

abraço.

— Não consigo, Nina. — confessou. — Não consigo ser a gente de


novo, sem pensar que podemos estragar tudo mais uma vez.

— Se não consegue ver que já estragamos, então somos realmente


opostos sobre o que sentimos. — afastei-me e coloquei minha mão sobre
seu peito, impondo espaço. — Não vou mais fazer isso. — declarei. — Não
gosto do que viramos e não quero continuar assim. Se quer que sejamos
amigos, vamos ser. Mas só isso.

— Nina... Eu... — pareceu querer falar mais, entretanto, se calou.

— Não te culpo por ter medo de investir em nós. Mas acredito que
merecemos mais do que apenas isso. — cruzei os braços sob os seios. —
Só quero que saiba que me importo contigo e que não é fácil encarar essa
situação.

— Acho que está certa.


Ali, sabia que findava o que tanto já parecia se perder.

Lembrava claramente daquela noite, a cerca de um mês. Por aquele

e outros motivos que o melhor era evitar estar onde sabia que ele estaria.
Esquentar a cama do homem que amei, e ainda estava enraizado em mim,
não era meu objetivo de vida. Olhei mais uma vez para o visor e pensei em
quanto tempo fazia que não conversávamos. De repente, tudo ficou ainda

mais estranho entre nós. Nem eu mesma nos entendia, apenas tentava
fingir que o fazia.

Pablo não me perdoava pelo passado, e eu, não insistia em algo que
parecia fadado ao fracasso. Talvez fosse uma boa covarde. Culparia meu
signo ou até mesmo a parte podre do que deveria ser meu pai. Como ele,
me parecia em alguns aspectos – sabia sumir como ninguém.

Contudo aquela ligação era por algo além. Não para fingir que
ainda éramos os mesmos ou simplesmente ouvir sua voz. Chiara precisava

de conselhos de alguém de confiança. O problema era que minha irmã


mais nova não tinha ideia de que o tal advogado de minha confiança era
justamente o primo de seu chefe. Ainda mais, que ele com certeza já estava
a par da situação toda.

Sem querer mais pensar, apenas toquei em ligar, e coloquei no


viva-voz. Depositei o celular sobre meu peito e aguardei. Não era um bom
dia, com certeza. E poderia ter sido ainda pior para ele. Nunca saberia
explicar a ansiedade que me dominava antes de ouvir sua voz. O que não

acontecera no passado e se tornara recorrente nos últimos anos.

— Pablo.

A voz curta e grossa me surpreendera. Entretanto, senti meu


coração disparar no mesmo instante. Revirei os olhos, sem conseguir
evitar.

— Nina. — respondi, passando as mãos pelos cabelos bagunçados.


— É um mau momento?

— Não, quer dizer... Cael fez merda com sua irmã. — comentou,
sem mais delongas, e tive que rir.

De repente, os dias sem ouvi-lo ou vê-lo pareceram desaparecer.


Queria lhe indagar sobre tudo que pensei naquele tempo e se ele também
sentia minha falta como o fazia. Porém, não me vi tão corajosa naquele
instante.

— Falei com ela há alguns segundos. — contei rapidamente. —


Enfim, antes de encomendar a morte do seu primo babaca, o que pode me
dizer sobre ela não cumprir o aviso prévio?

Ele suspirou fundo e poderia ouvir o barulho de água ao fundo.


Onde diabos Pablo estava?

— Por acaso, só por acaso... Está tomando banho e falando


comigo? — indaguei, sem conseguir entender como alguém fazia aquilo.

O máximo que um aparelho eletrônico meu chegava era até a pia

do banheiro, para ficar cantando músicas durante o banho. Tudo porque


ainda não tomara vergonha na cara de comprar algo específico.

— Pensei que fosse Cael. Então... — o barulho de água cessou. —


Corri para atender e não desliguei o registro.

— Sempre explicativo. — não pude evitar e ouvi sua risada do


outro lado da linha.

Sentia falta daquilo e era o complemento que faltara. Preferi me


calar, pois sabia que não era mais parte daquele contexto, a menos, a cerca
de um mês colocara um basta.

— Mas o que pode me dizer sobre o aviso prévio?

— Vou falar com Anne Liv amanhã cedo, e com certeza, se não
tiver encomendado a morte de Cael, ela quebrará a cara dele, e resolverá

tudo com Chiara. — sorri mais aliviada.

— Fico mais tranquila ao saber disso, mas... Poderia me mandar


algo escrito sobre ou enfim, da sua área. Não posso falar com Chiara sem
ter algo concreto.

— Vai esconder que nos conhecemos até quando? — indagou de


repente, o que me pegou surpresa, mas com toda certeza, não
desprevenida.

— Até que você tenha coragem de falar sobre nós. — falei sem

conseguir me controlar. — Então, pode durar uma ou duas vidas.

— Engraçadinha como sempre, Nina. — comentou, mas não senti


vontade de rir, assim como, ele não o fez.

Era aquele momento de silêncio que tentava evitar. Quando tudo

parecia pesar demais sobre nós. Por isso não liguei durante os dias que se
passaram. Temia que nos encontrássemos sem ter o que dizer. Eu tinha e
muito, mas a coragem ainda faltava. Sequer entendia como chegamos ali.

— Eu aguardo um e-mail ou como prefira enviar. — comentei por


fim. — Obrigada, Pablo.

— Nina, eu...

Continuei focada no teto e pensei em como gostaria de vê-lo


naquele exato segundo.

— O que? — indaguei. — Algo novo em sua vida?

Não era boa em fingir desinteresse, e com toda certeza, mas ainda
assim, me doía imaginar que algo mudara naqueles dias. Esperava meu
momento de tê-lo de volta. Mesmo que parecesse demorar demais. Talvez
ele percebesse que queria tentar, assim como eu.

— Só queria dizer que é importante para mim e sei que as coisas


entre nós ficaram estranhas ao longo dos anos.

Estranhei por completo aquelas palavras, mas de toda forma,

imaginei que existia uma boa explicação.

— Não teria como não ficarem. — interrompi-o. — Eu neguei seu


pedido de casamento, e transamos em alguns momentos não muito
oportunos para ambos durante os últimos anos, e tudo pareceu acabar há

um mês... Prefiro que fiquemos na amizade, enquanto não conseguirmos


superar o que passou.

— Eu estou noivo.

Aquelas três palavras mudavam o aspecto da coisa toda. De tudo


que esperava ouvir, saber que ele entrara em um relacionamento sério
como aquele, era como levar um soco na cara. Ainda mais depois do que
conversamos. Pablo sabia que eu o queria. Ao menos, esperava ter deixado
bem claro que queria a gente de volta. Demorei anos para dar tal passo, por

medo do momento ou da negativa. Mas o fizera. Talvez tivesse esperado


demais pela minha vez e respeitasse demais o espaço que Pablo queria.

— Não me peça para te dar parabéns. — falei sem vontade. — Mas


posso ser irônica e lhe mandar um áudio fazendo isso.

— Só queria que soubesse para...

— Não precisa pisar em ovos comigo, Pablo. Fazemos isso nos


últimos anos e olhe só onde chegamos. Em um mês fosse ficou noivo! —
ri sem vontade. — O que vai me dizer? Que já estava com ela? Ou... —

acabei me calando, sem querer de fato saber.

— Nos apegamos a um passado que não volta, e confesso que


tentei, mas...

— Há coisas maiores do que nós. — complementei ácida e ouvi

seu suspirar fundo. — Como sempre, não me arrependo de minha escolha


no passado e posso afirmar que você deve compreender melhor do que
ninguém hoje. Não éramos para ser, e que bom, que não teve que trabalhar
em papéis do nosso divórcio.

— Nina...

— Meu nome. — falei com escárnio, e era como se um filme se


passasse por minha mente.

Talvez o destino apenas não seja ele. Sem esbarrão. Sem nada.

Casamento era algo importante para ele. Sabia que Pablo não o faria por
nada.

— Tenho que desligar.

— Certo. — peguei o celular e me levantei, caminhando em


direção a cozinha. — Apenas se lembre que me ama.

Deixei o celular sobre o balcão e antes que Pablo começasse um


discurso, desfiz a ligação. Peguei o uísque que comprei durante a semana,
para momentos de tensão. Aquele com certeza, era o correto. E com

certeza, o destino me dera uma boa dica quando senti vontade de comprar
aquela garrafa.

Abri-a e sem me importar, levei até a boca. Um gole de Jack


Daniels e dei uma voltinha. Era sexta-feira e nada melhor do que terminar

a semana me divertindo e esquecendo os problemas. Saí de minha casa e


gritei o nome de Lúcio, meu vizinho e amigo. Ele sempre topava entrar em
furadas comigo, assim como, uma boa bebedeira.

— O que diabos faz com um uísque na mão? — ele perguntou,


cerca de um minuto depois que saiu de sua casa, colocando uma camiseta,
e parou a frente do baixo cercado que dividia nossas residências. —
Tigresa, o que diabos te deixou maluca a esse ponto?

— O que faria se a pessoa que ama te desse praticamente um pé na

bunda e aparecesse noiva um mês depois? — indaguei, e Lúcio não sabia


da história que carregava com Pablo, mas com certeza, entendia de
desmanches.

— Melhor beber, porque amar tá uma merda mesmo. — confessou


e lhe estendi a garrafa.

Ele bebeu um longo gole e fez uma careta no fim. Nada melhor
do que o amargo da bebida para superar o amargo daquele amor que sentia.

E principalmente, o amargo de ter sido deixada para trás como se

significasse nada. Talvez aquela fosse a verdade pura e simples.


02
o nosso amor e ódio eterno[3]

— Apenas se lembre que me ama.

Sequer podia me lembrar. Era como viajar no tempo e me sentir


preso na última vez que nos vimos. E que não fazia tanto tempo, mas que

infelizmente, acontecera em um momento que não podia simplesmente nos


escolher. Nina deu um basta em tudo, ou melhor, no quase nada que nos
tornamos. Ela não queria mais apenas o que tínhamos nos resumido – sexo.

Olhei para o celular e sabia que ela tinha desligado. Passei uma
mão pelo cabelo e a outra, apertei com força o aparelho. Queria era poder
ir até ela e lhe dizer que não queria machucá-la. Sentia-me em seu lugar,
mais uma vez. Ela já tinha quebrado meu coração, entretanto, eu o fazia

daquela vez. Suspirei fundo, e toquei seu nome na tela.

Sua chamada está sendo encaminhada para a caixa-postal...

Tão típico de Nina, que sequer poderia esperar algo contrário. Ela
se escondia quando se sentia acuada. Por mais que tivesse tentado me
convencer de que ela não sentiria nada quando soltasse tal informação, e

repensado se deveria ou não lhe contar, sua reação não era inesperada.
Colocava-me em seu lugar. Por tal coisa, tinha contado a ela. Não gostaria
de descobrir por outro alguém que a mulher que marcara minha vida, e que
estava junto a mim a um mês atrás, estava noiva de outra pessoa.

Precisava pensar em Bruna. Precisava focar no que acontecia


entre nós.

Minha mente sabia daquilo e todos os dias, desde o momento em


que Bruna aparecera em meu apartamento, tentava me convencer de tal

coisa. Não fora nada planejado, e de repente, teria um filho com aquela
mulher e tentava me convencer de que ela era uma ótima companhia.
Suspirei fundo, e tentei focar no lado bom daquilo tudo. Nina e eu não
tínhamos chance de dar certo. Tínhamos uma percepção diferente de
objetivos, e infelizmente, nunca nos encontrávamos no momento que as
coisas se encaixavam.
Mais uma vez, era em meio ao caos que tudo parecia se ajeitar.

Quando saí daquele quarto de motel e ela findara o que tínhamos,

levava em mente os prós e contras de tentarmos algo além do prazer. Sabia


que funcionaríamos e aquele era meu maior temor. Porque depois de ter
uma negativa a respeito da pessoa amada, tudo parece correr para o mesmo
lado. Não estava preparado, mesmo após anos, para ser deixado por ela.

Porém, considerava que era hora de tentar.

Foi aí que Bruna Monteiro surgiu novamente em minha vida.


Tínhamos nos envolvido semanas antes de Nina aparecer, e como sempre,
tirar toda minha sanidade. Conhecia Bruna há muito tempo, e tínhamos
dividido mais que uma noite juntos, mas nunca passara do sexo. Contudo,
a notícia da sua gravidez, fez com que tudo mudasse. Não estava preparado
para aquilo e nem mesmo imaginava que seria daquela forma que me
tornaria pai. Mas acontecera, e de repente, fui pego com um pedido de

casamento. Tudo ficara ainda mais difícil a partir dali. A confissão de


Bruna que queria dar uma família para ao filho que esperava, e também era
meu. Aquilo me acertara em cheio.

Viera de uma família de um pai ausente e que nunca dera o mínimo


de carinho ou atenção. Sabia o quanto era importante estar na vida de meu
filho. E mesmo não entendendo meus próprios porquês, acabei aceitando
tal pedido. Simplesmente porque enxerguei aquilo como o certo a se fazer.
Naquele momento deixara de fato Nina para trás, e tentava me convencer

de que simplesmente, não éramos para acontecer.

Andei até minha cama, e deixei o telefone de lado por um instante.


Lembranças de nós me atormentavam, e alguns momentos, eram meu
acalento. Por mais que me negasse a admitir, por mais mulheres que
tenham entrado e saído de minha vida, Nina fora a única que realmente

permaneceu em minha mente. E até o momento, a única que chegara de


fato ao meu coração.

— Sabe que somos amigos, não é? — indagou de repente,


enquanto estávamos deitados no chão de sua kitnet.

Conhecia Nina há cerca de dois anos, bem na época em que ela


ingressou no curso de administração. Eu tinha finalmente encontrado meu
curso – direito, após muito tempo me dedicando a aprender o ramo nos
negócios da família e viajado o mundo. Mas nem com toda a bagagem

daquela experiência, equiparava-se ao que senti quando meus olhos


recaíram nos dela. Um esbarrão bastou para que nos encontrássemos e
não mais nos largássemos. Ela se tornara minha melhor amiga e sabia de
tudo sobre minha vida, assim como, a incluía na mesma. O problema
consistia na atração que sentia pelos olhos castanhos claros, cabelos
loiros sempre desordenados e o sorriso pretensioso. Nina era uma mulher
bonita, mas nunca se tratara apenas do seu físico. Ao menos, não depois
de tanto tempo.

Os seus trejeitos, e a forma como nos entendíamos, até mesmo no

silêncio. Como naquele exato minuto. Sentia seus olhos sobre mim, e sabia
que já estava impaciente com minha demora para responder. Nina se
intitulava o próprio caos, mas mal sabia, que era o que mais amava nela.
O que era completamente raro, já que quase ninguém despertava tal

sentimento em mim. E ela conseguira da forma mais simples.

— Anda logo, playboy. — insistiu, fazendo-me virar o corpo e


encará-la.

— Claro que somos. — respondi tranquilo, e pensei internamente o


peso de tais palavras.

Concordava com o que ela podia me dar, e tudo bem. A atração


que sentia sempre estava ali, como uma leve lembrança de tudo que ela
era capaz de despertar. Mas nunca ultrapassaria uma barreira entre nós.

Confiança era tudo que tínhamos e mais prezávamos.

— Então... — falou e sorriu levemente, claramente nervosa. A mão


que estava em sua cabeça, foi parar em minha barba já espessa, e ela
alisou levemente. — Essas férias me deram ideias diferentes, ou até
mesmo, pensamentos. — confessou e fiquei atento a forma como sua mão
foi até meu cabelo, acariciando-o de leve.
Nina sempre fazia tal gesto, porém, de repente, ficara difícil
respirar. Era como se estivesse preso a seus lábios e nada ao redor fizesse

sentido. Sempre evitei me sentir assim, tão exposto. Entretanto, era difícil
manter-me alheio, quando a mulher que eu amava, olhava-me de forma
tão intensa.

— Compartilhamos músicas e... Bom, isso é algo importante para

mim. Pode parecer boba e por Deus, até mesmo os livros clichês que
Chiara ama e vive me narrando apenas para me atazanar, ou porque ela
gosta mesmo... — se perdeu no assunto, como sempre, e tive que sorrir.
Mas ainda assim, não conseguia desviar de seus lábios. — Enfim, sem
mais enrolações... Eu ouvi só pro meu prazer e... — ela se calou e desviou
o olhar rapidamente, como se pensasse muito sobre aquilo.

— Ei, o que foi? — fora minha vez de tocar seu rosto e ela fechou
os olhos.

— Eu sinto isso... E nem sei determinar o que seja. Desde o dia que
a gente se olhou pela primeira vez, até mesmo naquele simples aperto de
mãos. — confessou e meu coração disparou no mesmo instante. Nina
Moreira me desestabilizava. — Eu ouvi só pro meu prazer, e apenas
consegui pensar em você... — seus lindos olhos se encontram com os
meus. — Na gente.

— Nina, eu...
— Sei que pode parecer repentino, mas... Eu te quero.

Não tinha palavras que expressavam o que de fato senti no

segundo que ela proferiu aquilo. Apenas puxei-a para mim, e nossos
lábios se encontraram. Um encaixe perfeito, e de repente, vi-me perdido
no que apenas ela proporcionava – caos. Nossas línguas se encontraram,
assim como nossos corpos. Nina estava sobre mim e nem saberia dizer

como chegamos até ali. Apenas me vi desfazendo o beijo quando nos


faltou ar, e confessei o que tanto necessitava.

— Eu sempre te quis.

O toque de meu celular me tirou daquela imensidão de


pensamentos, e sentimentos. Mais uma vez, sendo levado de volta para o
caos que Nina Moreira significava. Porém, nunca nada me pareceu tão
próximo do paraíso quanto estar com ela. Queria poder confiar novamente,
entregar-lhe novamente o que era apenas seu. Mas sequer tive a chance de

tentar tal coisa. Contudo, como ela mesma disse na época: haviam coisas
maiores do que nós. Naquele momento, existia de fato.
“Não fala nada

Deixa tudo assim por mim

Eu não me importo se nós não somos bem assim

É tudo real nas minhas mentiras

E assim não faz mal

E assim não me faz mal não

Noite e dia se completam no nosso amor e ódio eterno

Eu te imagino

Eu te conserto

Eu faço a cena que eu quiser

Eu tiro a roupa pra você

Minha maior ficção de amor

E eu te recriei só pro meu prazer

Só pro meu prazer”[4]


Praticamente gritei e levei a garrafa de uísque a boca. Felizmente,

minha mãe dormia feito pedra e não seria atormentada por meu showzinho
particular. Aquela música significava tanto, que de repente, vi-me perdida
na mesma. Era como se relembrasse o primeiro beijo com Pablo. Sentei-
me na cama e pedi internamente para que aquele amor fosse arrancado de

meu peito. Nunca dera certo. Nunca pareceu durar o que deveria. Éramos
errados um para o outro. Éramos perdidos um do outro. Por que diabos
ainda éramos amigos?

Nunca fomos apenas amigos. Nunca pareceu tempo suficiente


juntos. Assim como nunca imaginei que doeria tanto vê-lo seguir em
frente. Naquele momento, preferia a ignorância, do que receber tal notícia.
Ao longo dos anos não fora fácil, porém, ele ainda era uma constante. De
alguma forma, sabia que ele estava lá. Talvez por eu ter a certeza de que

nunca encontraria alguém para dividir a vida, e tudo bem com aquilo,
imaginei que Pablo seguisse o mesmo pensamento. Santa inocência!

Ele já quis ser casar comigo e sabia que não era pelo fato de ele ser
mais velho. Ele tinha me pedido para dividirmos a vida, assim como, ir
com ele para o exterior em sua pós graduação. Eu tinha outros planos, e
eles não incluíam tal coisa. Nem mesmo o casamento. Minha prioridade
era meu trabalho e minha família. Tudo era estruturado para que
terminasse a faculdade, e começasse a trabalhar para ajudar a custear os

estudos de minha irmã, assim como, não deixar minha mãe sozinha. Minha

família era minha prioridade.

Pablo e eu éramos complexos e só aquilo explicava o que nos


distanciou por tanto tempo. Quebramos a confiança um do outro e era
como se perder por completo a cada vez que nos revíamos.

Eu queria lutar por aquilo.

Queria lutar pela gente.

Mais uma vez, nossos pensamentos divergiam. Suspirei,

cansada, e desligando a música. Nem mesmo o álcool me deixava esquecê-

lo. Nada me permitia tal coisa. No fundo, torcia para apenas ser maluca. E

não por um homem chamado Pablo Marini.


03
é tudo real nas minhas mentiras[5]

Eu não devia estar na festa de aniversário de Anne Liv Marini,


prima mais nova de Pablo, e irmã do cara que quebrou o coração de minha
irmã. O mundo parecia pequeno demais de repente, e talvez fora um dos
motivos que me levaram a acreditar que estávamos conectados de alguma

forma.

— Vou circular, mas qualquer coisa me liga. — falei, encarando


minha irmã que parecia claramente nervosa.

Chiara era um poço de sinceridade, e sabia que não estava


preparada para rever Cael, mas era inevitável ao vir àquela festa. A decisão
era dela, e, portanto, eu não passava de companhia. Por mais que ela já
soubesse que estava ali por outro motivo. Depois de anos, finalmente,

confessara a ela que o cara que me marcou tanto no passado, estava mais

perto do que ela imaginava.

Descemos do carro e a encarei, vendo um sorriso divertido em seu


rosto.

— Tenho dó de Pablo nesse momento. — comentou, e tive que

sorrir e piscar um olho em sua direção.

Virei-me e adentrei os portões. Chiara gritara algo, mas sabia que


era alguma provocação. Porém, assim que encarei o grande número de
pessoas espalhadas pelo imenso jardim da frente, percebi que nem mesmo
toda minha maquiagem conseguiria suportar. Contudo, era o jeito que
encontrei de olhar para Pablo e dizer-lhe o que tem me atormentado há
semanas. Desde o momento em que contou que estava noivo e fora como
dar um soco em todo meu sistema emocional. Era como se já tivesse me

acostumado a ter ele ali, em algum momento. De repente, entendi que


apenas eu pensava daquela forma.

Repensando todos os anos que se passaram, e principalmente, no


reencontro durante a festa da empresa Marini, há seis anos, sabia que no
fim, Pablo também desistira de nós. Apeguei-me a algo que sequer existia,
imaginando que não era apenas o momento certo.
Chiara queria companhia e sabia que não podia simplesmente
jogar em seu colo que conhecia os Marini. Pelo menos, não conhecia

pessoalmente Anne Liv, sua chefe. Ela era a prima mais nova de Pablo, e
tinha uma vaga ideia de que ele não falara de mim para ela. Sorri sem
vontade, assim que Chiara me encarou pelo ombro, andando à frente da
ampla sacada. Nunca estivera naquele lugar, ao menos. O que não traria

lembranças inexistentes. Mantive-me firme e dei alguns passos, pensando


qual a probabilidade de reencontrar o homem que perdera há quatro
anos? Balancei a cabeça, sabendo que ela era 100%.

— Vem, quero que conheça uma pessoa. — Chiara praticamente


me rebocou até onde queria. Sequer tinha notado que ela encontrara
alguém, muito menos, que daria atenção a tal pessoa.

Coloquei o melhor sorriso no rosto, porque além de tudo, era


importante para minha irmã. Estava orgulhosa e sabia o quanto Chiara se

esforçou para conseguir tal emprego. Eu não era a melhor companhia,


ainda mais, em uma festa que Pablo Marini poderia ser colocado à minha
frente a qualquer momento.

Pisquei consternada, assim que Chiara me soltou.

— Ok, maluca. Cadê a pessoa? Anne Liv? — indaguei, procurando


com os olhos.
Chiara sorriu e negou com a cabeça, indicando com a mesma
sobre meu ombro. No mesmo instante, senti como se me algo me

queimasse. Fechei os olhos por um segundo e respirei fundo, tentando


disfarçar a frente de Chiara. No segundo seguinte, virei apenas a cabeça,
aos poucos, trazendo meu corpo todo para reconhecer o dele mais uma
vez. Pablo Marini continuava da forma como me lembrava. De repente,

entendi porque não consegui a mesma conexão com mais ninguém ao


decorrer dos anos. Porque era algo só nosso. Algo que realmente queria
voltar a sentir.

Sua presença me entregava aquilo. Mal sabia, que era apenas


aquilo que receberia.

Adentrei a mansão dos Marini e sorri ao me lembrar de quantas


vezes visitara aquele lugar. Pablo costumava passar grande parte do tempo

ali, e em alguns momentos, me trouxera também. Fora quando conheci


seus tios, assim como, adentrei seu mundo. Éramos apenas amigos, mas já
dividíamos o quarto dele na casa. Entretanto, depois de um tempo,
dividíamos de fato uma cama.

Sorri pelas lembranças boas e entendi o que de fato faria ali. Lutara
por Pablo e sabia daquilo. Porém, nunca fora firme o suficiente ou
demonstrei de fato o que queria. Se eu estava certa ou ele errado, não era
algo que pesava em minha balança. Sentia que de todas as pessoas que

passaram em minha vida, ele era uma das quais nunca quis magoar, mas o

fiz. Portanto, pedir perdão nunca foi em vão, mesmo não me arrependendo
de minha escolha.

Já parei algumas vezes para pensar sobre. De como minha vida


estaria caso tivesse dito sim. Nunca me encontrei em um casamento como

ponto alto de felicidade, ainda mais que, duvidava que teria maturidade
suficiente para dividir a vida daquela forma com alguém. Ao menos, a dez
anos atrás.

Assim chegamos ao ciclo vicioso: reencontro há seis anos, uma


transa inesquecível de reconciliação – que pensei ser na época,
arrependimento no dia seguinte e se repetiu mais algumas vezes. Sequer
contara quantas foram, porque em todas elas, resultara no mesmo. Até o
momento que cansei.

Pablo não acreditava que o queria.

E eu respeitei tal escolha.

Porém, não conseguia aceitar. Não depois do que jogava em meu


colo. Era difícil imaginar que ele encontrara alguém com tanta sintonia a
ponto de subir ao altar. Para mim, casamento nunca fora o ápice de um
relacionamento, mas sabia o quanto era importante para ele. Ambos,
éramos divergentes sobre, por completo. Paralisei, quando me vi dentro do
escritório. Senti meu coração disparar com a cena que me aguardava.

Simplesmente, doeu mais do que deveria.

Pablo tinha uma mulher encostada em seu peito. Ele acariciava


seus cabelos escuros e depositou um leve beijo em sua testa. A cena era
linda, caso não tivesse vontade de simplesmente me jogar sobre eles e os

separar a unhadas. Mas era velha o bastante para usar a frase que mamãe
tanto espalhava pela casa “o que não te mata, te fortalece”. No meu caso,
era direcionado para o sarcasmo, ironia e deboche. Sempre pronta para um
enfretamento.

— Boa noite. — falei, e devagar os olhos de Pablo se encontraram


com os meus.

O choque no mesmo era claro, assim como, não se afastou um


milímetro da mulher que estava ao seu lado. Devia ser a tal noiva. Suspirei,

lembrando que brigamos pelo telefone, uma discussão sem muito proveito,
já que estava bêbada demais para lhe odiar, e ele, fez questão de deixar
claro que realmente queria o casamento.

Ali estava, com um sorriso falso, encarando os dois. Por mais que
ela parecesse se encaixar perfeitamente nele, e ficariam lindos em uma
moldura, sabia que não era o suficiente para simplesmente virar as costas e
sair.
Eu era diferente de muitas pessoas, e principalmente, de Pablo.
Gostava daquilo, até mesmo, porque no final a gente se completava. Se

não fosse real, não teríamos nos amado tanto quando mais novos, e muito
menos, nos entregado um ao outro nos últimos seis anos. Por mais que
outras pessoas passassem em nossas vidas, algo ficou claro durante aquele
tempo – éramos importantes demais um para o outro. Era a única certeza

que me trouxera até ali.

— Estávamos de saída. — Pablo se adiantou e a mulher assentiu,


como se em automático.

Aquele era o jogo que ele queria jogar? Pois então, voltávamos de
fato a seis ano atrás. Fazendo-nos de desconhecidos. Quem começara
aquilo poderia ter sido eu, quando não me adiantei no momento que Chiara
nos apresentou, entretanto, Pablo coibiu por completo. Eu queria evitar
abrir feridas para minha irmã e envolvê-la naquela bagunça que existia.

Ele, nunca de fato entendi o motivo. Talvez por respeitar minha decisão,
sem ao menos, entendê-la.

— Mas já? — indaguei, encarando-o profundamente. — Não vai


me apresentar a sua noiva?

— Desculpe o mau jeito. — fora ela quem se adiantou, e por um


segundo, torci para que fosse uma pessoa ruim. Entretanto, ela parecia
doce e simpática. — Sou Bruna Monteiro. — ela se afastou e me estendeu
a mão. Aceitei o cumprimento, e não dei um passo à frente.

— Sou Nina Moreira. Acho que nunca ouviu falar de mim, mas...

Seu noivo com certeza. Só queria um minuto para conversarmos.

— Ah, claro. — ela se antecipou, e Pablo a puxou para seu corpo.

Naquele momento, queria de fato era tirar meu salto quinze e enfiar
na cara bonita dele. Enquanto a noiva era simplesmente uma pessoa

cordial, ele parecia não querer passar um segundo a sós comigo. Bom,
aquilo contava em algo. Ou ele me odiava por completo, ou me ter por
perto lhe trazia o mesmo que eu sentia – saudade.

Dentre as opções, arriscaria na segunda.

— Precisamos mesmo ir. Conversamos em outro momento, Nina. É


um prazer, revê-la.

Ele então a levou pela cintura, a qual me destinou um sorriso sem


graça. Coitada! Se ela soubesse o quanto estava se metendo em uma

bagunça. Pensei e repensei meus atos, e sabia que não existiria abertura
com Pablo. Portanto, o melhor era arriscar alto. Mesmo que depois, aquilo
me custasse mais alto ainda. Andei até a cadeira ao lado da grande mesa de
madeira, e não perdi mais nenhum segundo.
04
será que você não é nada que eu penso?[6]

— To grávida.

Paralisei ao mesmo tempo que o corpo de Bruna tensionou ao meu


lado. Minha mão saiu automaticamente de sua cintura e a levei ao cabelo,
completamente incrédulo.

Nina cruzou as pernas, da forma decidida e sexy que tanto


conhecia, assim como, o sorriso cínico no rosto. Suspirei profundamente e
passei as mãos pelos cabelos.

— O que disse? — indaguei, acreditando na possibilidade de ter


enlouquecido.

— Cego eu já percebi que é. — debochou e me encarou


profundamente. Sabia que falava sobre fingir que ela não estava ali, mas

não conseguia sequer raciocinar. — Agora ficou surdo, playboy?

Passei a mão pelo rosto, ignorando o apelido tão antigo quanto


nosso caso. Ela permaneceu com o sorriso, e levou as mãos a barriga,
fazendo um leve carinho. Meu coração disparou.

— Acho que precisam de um minuto. — senti um leve beijo de

Bruna em minha bochecha e sequer reagi.

Eu não precisava de um minuto, não mesmo. Assim que ela saiu do


ambiente, o semblante de Nina mudou. Precisávamos colocar os anos
passados na mesa, assim como, o que ela acabara de dizer.

— Pode parar de mentir agora. — pedi, sentindo meu coração se


acalmar, ao mesmo tempo, que seria um sonho realizado. Não podia me
enganar, sabia que não era possível. — Sei que não pode ter filhos.

Ao menos, fora o que ela contou há alguns anos.

— Por que mentiria? — indagou irônica e se levantou, dando de


ombros. — Por que foi o que restou para ter um minuto do digníssimo
doutor Marini? — debochou e parou a um passo de mim.

— Drama mexicano não combina com você, Nina. — soltei de uma


vez e ela sorriu de lado, claramente, não se importando.

— Acredite, meu querido. Eu sou o drama mexicano por inteiro.


— O que quer? — indaguei, sentindo-me intimidado e enlaçado
pela forma como ela me encarava.

Nunca conseguira perder tal ligação com ela. Não depois do que
vivemos durante a faculdade. Nina fora de longe o melhor relacionamento
que já tive, ao mesmo tempo que, mais sincero e intenso. O problema, era
que na mesma proporção que nos amávamos, nos perdemos. Nina e eu

tínhamos visões completamente diferentes sobre o que queríamos. E eu


sabia, que apesar de tudo, era impossível esquecer aquilo. Amor e dor
andavam lado a lado, e com ela, conheci ambos.

— Entender sua mente, talvez? — abaixou o olhar, e respirou


fundo. — Não quero brigar, Pablo. Muito menos vim causar algum mal-
entendido.

— Apenas disse que estava grávida na frente da minha noiva. —


não pude evitar e Nina acabou sorrindo abertamente.

— Bom, funcionou... Às vezes é preciso passar dos limites, só um


pouquinho. — piscou um olho e deu um passo atrás. — Mas claramente,
grávida não estou. — deu de ombros, como se respondendo minha
pergunta silenciosa. Soltei o ar que sequer sabia que segurava. —
Precisamos conversar, e se quiser, esclareço para ela que estava apenas
brincando. Mas tem que me ouvir, ao menos, um pouco.
O barulho da porta do escritório nos chamou atenção, e notei
algumas pessoas circulando por ali. Não queria público, tampouco, Nina

parecia querer.

— Vamos ao jardim de trás, tudo bem?

Ela apenas assentiu e passou por mim. Senti como se parte de meu
ser fosse junto a ela. Ao mesmo tempo que sabia que as coisas não

mudariam, independente do que ela queria. Assim que chegamos na parte


de trás da casa, no jardim que ficara mais escuro, devido as árvores e a
pouca iluminação que espalharam por ali, Nina parou. Ela olhou ao redor e
sorriu levemente. Aqueles pequenos gestos dela, me deixavam sem chão.

— Não pode se casar com ela. — falou de uma vez, ainda de


costas. Não me surpreendia por completo o que ela dizia, mas sim, o seu
tom. Nina parecia realmente séria. Quando nossos olhos se reconectaram,
percebi que não existia nenhum traço habitual de seu cinismo ou sarcasmo.

— Sei que costumo resolver tudo tarde demais... Mas já venho tentando há
anos, Pablo. Anos esperando uma chance. Percebi que esperei demais e
respeitei demais o que disse que queria. Sexo por sexo, nunca fomos
apenas isso. Deixei claro há um mês, e de repente, você apareceu noivo.
Não sei seus motivos, mas sei os meus para não querer que se case... Quero
a gente de volta.

Levei a mão aos cabelos, sem conseguir acreditar no que ouvia.


Nina só podia ter perdido sua mente. Ela nunca agira de tal forma, e sabia

que era tarde demais para aquilo. Por mais que meu corpo e mente

reagissem tão fortemente aquelas palavras. Era, realmente, tarde demais.

— Não posso, Nina. — suspirei fundo e notei seu olhar mudar. —


Sei que o que a gente viveu foi forte demais, e que nunca vamos esquecer,
mas... Simplesmente, não posso.

— Pablo, por favor, eu...

— Sei o que faz aqui e o jogo que quer, mas eu não vou cair nisso.
— falei duramente, sem querer insistir. Se ficasse ali, ia ceder, e não era
algo que poderia fazer. Tinha tomado uma decisão e não voltaria atrás.
Nem por Nina. — Não sou o mesmo idiota de antes, Nina. — confessei,
porque era da forma que me lembrava de ser tratado por ela. Logo depois
que negou meu pedido de casamento. Porém, de algum jeito, sempre
éramos jogados um para o outro.

— Eu te amo, sabe disso, não é?

Eu sabia?

Se sim, nunca soube em sua totalidade. Nina não era fadada a


declarações, e ouvir aquilo, justamente no momento em que resolvi
construir uma vida com outra pessoa, apenas me provava uma coisa – não
era por amor que ela o fazia. Ao menos, tentava me convencer daquilo.
Seria mais fácil de encarar tudo e seguir em frente.

— Seu amor é egoísta e nunca foi suficiente. Por que seria

diferente agora? — perguntei sem esperança alguma e ela abriu a boca


para responder, mas não lhe dei tempo. Era o melhor, tentava me
convencer. — Está aqui porque não quer perder, Nina. Simples assim. Não
suporta o fato de que consigo ter com alguém o que um dia quis contigo.

Vamos ser honestos! Você nunca estaria nessa festa se não te contasse
sobre o noivado!

Ela me encarou, e notei seu semblante endurecer.

— Então vamos ser honestos! Sou completamente egoísta quando


se trata de você! — admitiu em um só fôlego. Queria acreditar. Queria dar
um passo à frente e trazê-la pra mim. —Vamos falar sobre hoje, sobre os
anos que se passaram... Eu te magoei e tenho completa consciência disso.
Já pedi perdão várias vezes, porque nunca, independente do momento e do

que fosse, queria ter te ferido. Mas eu sei que perdão não é o suficiente. Já
tinha acontecido e eu não voltaria atrás. A questão é que nunca me
entendeu, ou tentou ao menos... Você fugiu para sua pós fora do país, e
ficamos quatro anos sem notícias um do outro. — se aproximou e tocou
meu peito. Notei seu semblante mudar e a mágoa ali. — Acima de tudo, eu
era sua amiga. Você me deixou para trás feito nada, Pablo. Mesmo assim,
quando a gente se viu de novo, fui parar sob e sobre o seu corpo e... Você
se arrependeu e o ciclo começou. Acha que foi fácil? Acordar no outro dia

ou te ver saindo no meio da noite? — afastou sua mão e levou ao rosto,

limpando uma lágrima que descera. — Talvez se pensar um pouco,


comece a perceber que não existem vítimas entre nós. Eu fui babaca ao não
saber responder de uma forma melhor o seu pedido, mesmo que fosse
negativo. E você assumiu esse papel logo depois. Ironia do destino?

Talvez. Carma? Acredito muito nisso! Mas... Vamos ser honestos aqui,
não é? Um mês atrás estávamos fodendo e agora, está noivo! Só eu que
não vejo linearidade nisso? Ou qualquer sentido?

— A gente não soube lidar naquela época, nem depois... Por que
saberíamos hoje?

— Porque mudamos e ao menos eu, ainda te amo. — afastou-se e


tocou o cabelo, deixando-o para trás. — Nunca se deu uma segunda
chance, ou melhor, nos deu. Por que não agora?

Os olhos castanho claros pareciam perdidos e naquele momento,


sabia que Nina se expusera mais do que realmente queria. Sabia lê-la
muito bem, e, portanto, era melhor ir. Não queria magoá-la, muito menos,
contar-lhe toda a verdade. Se tornaria uma munição em suas mãos, e seria
julgado. A questão era que além de Bruna e eu, existia uma gravidez.

— Porque está se apegando ao que não existe. Ficou lá, na época


da faculdade, Nina. — queria acreditar naquelas palavras, o tanto quanto
era necessário. — Eu sinto muito, mas não posso ficar preso a isso. Não

mais.

— Você a ama. — concluiu e me encarou, como se buscando


respostas.

Mais uma vez ela deu um passo e tocou meu peito, como se
buscando algo. Meu coração acelerou ainda mais, sobre seu simples toque.

Ela então me encarou e ali, sabia que não desistiria tão fácil.

— Você ainda me ama, sei disso. — sorriu de lado, mas sabia que
não por arrogância. Porque ela realmente queria se apegar aquilo. E eu a
amava, apesar dos pesares. Contudo, por mais clichê que possa parecer,
amor nem sempre era o suficiente. No nosso caso, nunca foi ou chegaria a
ser. — Eu vou me afastar, mas... não vou desistir, Pablo.

Então depositou um leve beijo em meu rosto e sorriu, saindo

em seguida. O simples toque de seus lábios me fez relembrar porque

cedemos tanto um ao outro. Era difícil explicar, e tampouco, nos

compreender. Porém, sentia que ela fora a melhor coisa que acontecera em

minha vida, e daquela vez, era eu quem escolhia por nós. Não podíamos
ser. Não mais.
05
não fala nada, deixa tudo assim por mim[7]

Eu tentei.

Era a única frase que se passava em minha mente, e parecia capaz


de repeti-la em voz alta mais uma centena de vezes.

Já estava de volta a minha cidade, no interior de Minas, longe da

agitação e do ritmo frenético de São Paulo. Encarei minha velha casa, tão
amada. Pensei em como me habituei a estar ali. A estar com minha mãe.
Éramos companheiras de vida, e nunca conseguira deixar aquele lugar. Era
como um complemento meu. A preocupação deixada por meu pai, quando
nos abandonou e a deixou a cargo de duas filhas, diminuíra ao longo dos
anos. Quando percebi que além de minha mãe, ela era uma amiga.
Tudo o que realmente queria era deitar em seu colo e pedir algum
conselho, algo que realmente funcionasse. Porém, nunca fora aquele tipo

de pessoa. Sempre guardara tudo, era acostumada a ser fechada. Por mais
que ela fosse a pessoa em que mais confiava no mundo.

Suspirei fundo, e me sentei nos degraus da varanda. Olhei para


minhas mãos e sorri sem vontade alguma. A falta de vontade de Pablo em

me escutar. A forma como estava decidido. Não tinha direito de interferir


em sua vida, não daquela maneira. Por mais que sentisse aquele amor vivo,
talvez fosse hora de enxergar a realidade. Os anos passaram e realmente
mudamos. Além do que um dia pensei que chegaríamos.

Nunca chegamos juntos a lugar algum.

Levei as mãos ao rosto e encostei os cotovelos nos joelhos. Fechei


os olhos e me senti imersa sobre meus próprios porquês. Era uma pessoa
impulsiva e confusa na maioria do tempo. E até aquele exato momento,

tinha certeza da imensidão que ele representava. Havia muito mais do que
o passado que nos separava, e infelizmente, tinha plena noção.

O problema não era pensar nos prós e contras, mas sim, por agir
como egoísta. Pablo estava certo sobre aquilo. Esperei a ponta se romper
entre nós, ou ao menos, apenas um fio delicado se manter. Um fio que não
poderia mais segurar o que tanto tivemos e principalmente, o que
perdemos. Talvez ele fora meu amor de verão, como um romance ou
novela. O problema era que nunca chegara a acreditar fielmente em tais

histórias.

Ou acreditava demais, principalmente, que uma hora tudo se


ajeitaria. Entre nós, parecia não ter mais. Talvez fosse a melhor coisa, e na
realidade, fosse uma péssima desistente. Eram tantos talvez, que sequer
saberia enumerá-los. Olhei ao redor do jardim, e fiquei tentando focar nas

partes boas que ficaram. Em tudo que vivemos e ainda era gostoso de
lembrar.

Talvez o destino o levava para o caminho certo. Para alguém que o


faria feliz dentro daquilo que ele tanto desejara. E eu? Bom, tinha que
entender, que em algum momento iria esquecê-lo. Ao menos, de fato
tentaria.

Era feliz solteira e nunca quis outro homem como o quis para mim.
Mesmo que não da maneira que o mesmo sonhava. Eu o amava e o

respeitava. Estava mais do que na hora de provar aquilo. Deixando com


que ele fosse feliz, ao lado de quem quisesse, ou simplesmente, longe.

— Muito pra baixo, tigresa. — a voz de meu amigo e vizinho, fez


com que finalmente parasse de olhar para o chão.

Lúcio me encarou intrigado. Os olhos amendoados me conheciam


bem, mesmo que soubesse me blindar de todas as formas. Nos
conhecíamos desde sempre, e mantínhamos uma amizade sólida. Por cima,
Lúcio soubera sobre um cara do meu passado, que ainda era parte do

presente. E ele me entendia, assim como, compreendia que ele era a pessoa
mais transparente que conhecera.

Em algum momento da vida, imaginei até que se tornaria meu


cunhado. Entretanto, o destino tinha outra ideia sobre. Minha irmã

escolheu São Paulo e infelizmente, se apaixonou pelo seu chefe. Não que
pensasse nele como a pior pessoa do mundo, porém, depois de magoá-la,
se tornou o primeiro da lista que chutaria a bolas sem pensar duas vezes.

— Levando a vida. — forcei um sorriso e bati com a mão ao lado


do degrau que me sentara.

Lúcio entendeu o convite, e logo se colocou ali. Senti um de seus


braços sobre meus ombros, e ele me puxou para perto. Suspirei fundo e
encostei minha cabeça em seu ombro.

— Faz tempo que não me vê assim, não é? — debochei e ele sorriu


baixinho.

— Todos temos nossos dias difíceis, por mais que os leve da


melhor maneira possível. — comentou e entendi que com ele, não
precisava entrar em detalhes. Lúcio não era do tipo insistente, e muito
menos, invadia espaços. — Aliás, levei um pé na bunda.
Levantei a cabeça, desencostando-me dele. O qual deu de ombros e
não pareceu muito preocupado.

— O que tinha de errado? — indaguei, pois sabia que Lúcio saíra


completamente de sua zona de conforto ao convidar uma mulher recém-
chegada na cidade para sair.

Segundo ele, fora atração à primeira vista, mas ele nunca fora o

tipo de cara faz sexo por uma noite. Ele estava mais para o tipo que
gostava de todo o processo antes e depois. Muitas vezes, o depois não
chegava. Ainda mais, com pessoas que estavam de passagem. Porém, meu
amigo era cabeça dura demais para desistir do que desejava.

— Acho que nada. — encarou-me e piscou um olho. — Somos


incompatíveis, mesmo com toda tensão sexual.

Sua frase me pegou desprevenida, e fora como levar um soco


diretamente na boca do estômago. Era como se ele me definisse por

completo naquela simples frase.

— Não estou muito diferente disso. — falei com amargura.

Ele assentiu e seu semblante mudou. Algo que sempre era nítido
em seus olhos para comigo, ou com qualquer um que realmente gostava,
era preocupação. Lúcio cuidava de quem amava, e os protegia do que
podia. Infelizmente, ele não podia sequer traçar um plano para me proteger
de mim mesma, e os sentimentos que não abandonava. Como o ditado

popular dizia: eu não largava o osso.

— O cara ainda está noivo. — as palavras saíram um pouco


interruptas, e percebi que finalmente começara a processar tal informação.
Eu a vi nos braços dele. Eu senti que era aquilo que ele desejava, por mais
que seu coração disparasse por mim. Eu ouvi que ele não voltaria atrás. —

E bom, é isso. — suspirei fundo e Lúcio tocou meu rosto, fazendo um leve
carinho.

— Não sei de toda história, porque a senhora gosta de manter


mistério. — provocou, e sabia que era sua maneira de tentar me tirar da
fossa. — Mas sempre achei esse cara um babaca, e nem sei o nome dele.
Pode ser porque só sei sua versão, ainda bem resumida e perdida, sobre
tudo. Mas vamos combinar, Nina... Quem ama e não luta pelo que quer?

— Tem o exemplo a sua frente. — falei com desgosto, e Lúcio

negou com a cabeça. — É a verdade! Acho que nunca consegui me abrir


de fato sobre como me sinto.

— É o seu jeito de ser. Se for para te amar, tem que ser com todo
pacote de defeitos incluso. — deu um leve beijo em minha testa. — Mas
sei que logo vai fugir do assunto, então... Que tal uma noitada daquelas?

Sorri, porque apenas quem me conhecia bem, entenderia tal lado.


Eu queria beber, assim como fiz quando Pablo contou do noivado. Era o
meu jeito de levar as coisas, do momento mais triste até o que me fazia

surtar de felicidade.

— Acho que preciso disso. — confessei e notei seu sorriso


aumentar. Claramente, precisava do mesmo. — Vamos logo! E não me
olhe como se fosse quebrar, porque senão, a próxima coisa que vai ter que

consertar será sua cara.

— A tigresa voltou! — apertou meu ombro e tive que sorrir.

Era bom estar de volta em casa. Mesmo que meus pensamentos


estivessem perdidos e confusos. Ali, eu me reencontrava. O que me
trouxera mais uma indagação: Pablo realmente me amara em algum
momento? Tudo o que eu era?

— Obrigada. — falei e abracei Lúcio com toda minha força. —


Vou entrar e já volto. Que tal um karaokê?

— Um sertanejo de arrastar chifre? — indagou provocativo, e bati


em seu ombro.

— Chiara está com minha mãe, em algum lugar da cidade... Vou


aproveitar o momento. — pisquei e me levantei em seguida. Lúcio fez o
mesmo. — Aliás, ela vai junto, mesmo que acredite que esteja se
entendendo com o chefe babaca.
— Essa família tem o dedo podre demais. — balançou a cabeça e
pareceu se lembrar de algo. — Tirando claro, o tempo que Chia e eu

ficamos juntos.

— Tão egocêntrico... Depois não sabe por que é solteiro. —


provoquei, e ele deu de ombros.

— Sou sincero.

— Tem alguém precisando procurar a palavra arrogância no


dicionário. — debochei e acabei revirando os olhos.

Quando parei, notei que a vizinha da frente, estava mais uma vez
em sua cadeira, com um aparelho eletrônico na mão. Parecia o tal Kindle
que Chiara comprara e se esbaldara de ler por horas, até mesmo dias.

— Quando vai falar com ela? — indaguei, e Lúcio olhou na


direção que encarava.

Seu olhar voltou ao meu, e ele pareceu ainda mais despreocupado.

— Quando ela me olhar nos olhos. — fora impossível não revirar


os meus, mais uma vez.

— Ela é tímida, já sabemos disso. — constatei o óbvio. — Não me


faça colocar Helena na porta da sua casa para pedir açúcar.

Lúcio gargalhou e podia ver todas as engrenagens de sua mente


formando a cena.
— Essa eu pago para ver! — desafiou-me e o encarei decidida.

— Vai perder a aposta. — tentei fazê-lo recuar. — Mas, eu prefiro

correr disso. Helena, com certeza não merece um joguinho desses. Então,
por favor, pare de sair com gente que não combina contigo, e tenta, ao
menos, valorizar alguém que praticamente baba por onde você anda.

— Não exagera. — respirei fundo, sem querer insistir na burrice de

Lúcio. A minha já era o suficiente.

— Depois não vai ficar se arrependendo. — bati em seu ombro e


subi um degrau. — Vamos nos entupir de vodca, ou o que tiver no bar!

— A suas ordens, madame. — fez uma reverência ridícula e olhei-


o com ironia.

— Para de me irritar! — enfoquei e ele deu de ombros.

— Até já.

Balancei a cabeça em sua direção e ele logo se afastou, indo em

direção a casa que ficava ao lado da minha. Antes de entrar, dei um leve
aceno para Helena, que demorou alguns segundos para me notar. Seus
olhos estavam presos no espécime masculino que passava pela calçada. Ela
devolveu o cumprimento com um sorriso, e fiz o mesmo.

Adentrei minha casa e fui direto para o quarto. Liguei a caixinha de


som, assim como, sintonizei meu celular na mesma. Uma música
estourando para todos os lados, já para me acostumar com a desafinação de
Lúcio. Enquanto escolhia uma roupa, soltei a voz. Era como colocar as

aflições para fora. Sorri, deixando uma lágrima descer, sem ao menos notar
o quanto me abalava. Aqueles momentos me lembravam Pablo. Fazíamos
aquilo, juntos, na época da faculdade. Um sertanejo ou qualquer outra
música, e nós dois correndo de um lado para o outro nos arrumando.

Era bom lembrar.

“Já me perdi tentando me encontrar

Já fui embora querendo nem voltar

Penso duas vezes antes de falar

Porque a vida é louca, mano, a vida é louca

Sempre fiquei quieta, agora vou falar

Se você tem boca, aprende a usar

Sei do meu valor, e a cotação é dólar

Porque a vida é louca, mano, a vida é louca

Me perdi pelo caminho


Mas não paro, não

Já chorei mares e rios

Mas não afogo, não

Sempre dou o meu jeitinho

É bruto, mas é com carinho

Porque Deus me fez assim

Dona de mim

Deixo a minha fé guiar

Sei que um dia chego lá

Porque Deus me fez assim

Dona de mim.”[8]

A música me refletia, e acho que aquilo me fizera escolhê-la. Era


dona de mim, assim como, de minhas escolhas. Sabia que elas me levaram
até tal momento e não tinha porque chorar. Limpei mais uma lágrima e
resolvi que precisava extravasar. No meu conceito, não se sofria por amor
trancado em casa e chorando amargamente. Eu preferia sofrer dançando, e
em algum momento, a minha dança acabaria à frente de Pablo.

Por mais que não fizéssemos sentido algum, eu não desistiria. Aos

vinte e nove, não era difícil encarar tal coisa. Aos menos, não tanto. No fim,
além de uma novela mexicana, poderia ser um romance da Sessão da Tarde.
Bastava escolher corretamente, e quem sabe, conseguir o homem que amava
de volta.
06
eu te recriei só pro meu prazer[9]

— Para com essa palhaçada, Lúcio! — gritei, e meu amigo apenas


deu de ombros, rebolando com a música e jogando água sobre o tanquinho
que qualquer um teria orgulho de ostentar.

Bati com a mão na testa e acabei sorrindo. Pedir para ele o lavar o
carro não fora a ideia mais inteligente do dia estando de ressaca. Mas com

certeza, a que conseguira me colocar um pouco para cima. Enquanto Lúcio


rebolava e deixava todas as pessoas que andavam tranquilamente pela
vizinhança embasbacadas. Eu ignorava – ou ao menos tentava – a
sofrência que explodia na caixa de som que ele me obrigou a colocar no
máximo.
“Já doeu

Mas hoje não dói mais

Tanto fiz

Que agora tanto faz

O nosso amor calejou

Apanhou, apanhou que cansou

Na minha cama cê fez tanta falta

Que o meu coração te expulsou

Não tem mais eu e você

Tá facin de entender

Você me deu aula de como aprender te esquecer

Foi, mas não é mais a minha notificação preferida

Já foi, mas não é mais a número um da minha vida

Sinto em te dizer

Mas eu já superei você”[10]


— Ê modão! — gritei, e Lúcio gargalhou.

Fiz o mesmo, ao mesmo tempo que minha mente se perdeu e

quando vi, já pensava nos olhos negros que não deveriam estar pairando
sobre mim. Querendo ou não, qualquer música me lembrava Pablo. Fora o
que mais dividimos nos quatro anos da faculdade. Como amigos. Como
amantes. Perdi praticamente todas minhas playlists favoritas,

simplesmente, porque eram compartilhadas com ele.

Eu o deixei. Eu nos permiti acabar.

Agora ele me deixava. Ele nos permitia acabar.

Suspirei fundo, e a voz desafinada de Lúcio me chamou atenção,


assim como sobressaiu a batida ensurdecente de algum funk que começara.
Sorri, encarando meu amigo, que parecia me entender melhor do que
ninguém.

— Vem, tigresa! — falou, e me puxou com tudo, fazendo com que

nossos corpos se colassem e franzi o cenho, para entender no segundo


seguinte o que ele tanto queria.

A água gelada atingiu meu corpo por completo, e tentei a todo


custo me soltar do brutamontes, mas seu tamanho não facilitava. Se
estivesse de salto, com certeza, tiraria e o socaria em sua cabeça.

— Seu merdinha! — gritei e consegui pegar a mangueira em mãos.


Que os biólogos e o planeta me perdoassem! Mas naquele
momento, apenas pensei em me vingar do pior amigo que poderia ter em

toda vida, e que amava como um irmão. Lúcio sequer fingiu estar
incomodado, começou a dançar segundo a música que escolhera, o que me
fez gargalhar e ir desligar a água. Naquele momento, conseguira perdão
pelo lapso de minutos em uma guerra desnecessária de desperdício. Louca,

mas consciente.

Passei as mãos pelos cabelos completamente molhados e sequer


ousei olhar para meu vestido vermelho que já se tornava uma segunda pele
de tão encharcado.

— Vou socar a sua cara! — falei, sem conseguir evitar e Lúcio deu
de ombros.

Ele começava a esfregar o carro com uma esponja enorme, que


sequer saberia dizer de onde tirou. Enquanto isso, rebolava ao som de

Fuleragem. De canto de olho, conseguia ver Helena, praticamente criando


raízes enquanto o olhava. Ela era certinha demais para o meu amigo errado
demais. Entretanto, mesmo com o livro próximo aos olhos, e sentada em
uma cadeira, sabia que sua atenção era no exímio – talvez ridículo –
dançador de funk.

— Esse carro está sujo, mas sei que não foi só por isso que me
chamou. Sou um bom ombro para chorar, né não?
— Vou começar a cobrar pelo seu showzinho. — ignorei seu
comentário, tentando aliviar a tensão, e Lúcio parou, encostando-se no

carro. — Desculpe, eu só... Gosto que a gente é louco e esquece de tudo.

— Eita, o que tá acontecendo aqui? Showzinho particular, Nina


Moreira?

A voz de Chiara me fez rir. Minha irmã era parte do tudo que ainda

me mantinha sã. Éramos unidas desde sempre, e não conseguia imaginar


minha vida de forma diferente. Ela tinha um sorriso no rosto, mas sabia
que assim como eu, sentia-se confusa com o amor. A diferença era que via
em seus olhos que ela daria uma chance para, ao menos, escutar Cael. E
por mais que quisesse odiar aquele cara, sabia que não era má pessoa.

Conheci-o bem rapidamente no passado, até por aquilo, acreditava


que não me associara quando conheceu Chiara. Com certeza não era uma
conversa recorrente entre ele e o primo. Suspirei fundo, levantando-me

molhada e com os braços abertos.

— Já está com saudade? — indaguei e Chiara deu um passo atrás.

— Nem pense nisso, Nina! — argumentou e continuei indo até ela.

Lúcio foi mais rápido e aproveitando o fato de que Chiara estava


tentando fugir de mim, a agarrou por trás. Quando ele a cercou, ela gritou e
acabei gargalhando. Assim como ele fizera minutos antes comigo, só
faltava a mangueira para deixar Chiara ainda mais ensopada.

— Puta merda, Lúcio!

— Minhas felinas merecem o melhor. — provocou e se afastou,


sorrindo para ela.

Olhei para os dois, e infelizmente, entrei em uma névoa de


nostalgia que não deveria. Sempre os vi como um casal e até imaginei que

de fato se tornariam um quando perderam a virgindade juntos. Porém, nada


demais aconteceu. Os dois pareciam felizes e contentes com a amizade que
construíram. Por que Pablo e eu não podíamos simplesmente
descomplicar?

Sermos amigos e simples assim.

Eu sabia da resposta, mesmo querendo evitá-la.

Pois eu o amava da forma que me matava por dentro não ser a


pessoa ao seu lado, ao mesmo tempo que, respeitava sua escolha. O

problema ainda era que não conseguir aceitar. Era como se algo sempre me
jogasse para ele. Seja na faculdade, no nosso reencontro, nos encontros que
tivemos... Seja naquele exato momento em que me sentia obrigada a fazer
algo.

O medo de perder alguém era o que me movia.

Nunca o senti tão forte como naquele exato instante.


Existia algo em Nina Moreira que sempre me intrigou. Talvez a
forma como os olhos castanhos me hipnotizara desde a primeira vez que a
vi. Ou quem sabe, a forma como meu corpo reagia ao seu simples toque.
Ou até mesmo o fato de ela ter sido meu primeiro amor, assim como,
primeira decepção.

Algo era certo em minha mente, nunca consegui esquecê-la. Porém,


sabia que por mais que quisesse tentar outra vez e tivéssemos tido a

chance, não daríamos certo. Nina e eu éramos como óleo e água, e com o
tempo, e amadurecendo toda a ideia do que nos tornamos, consegui
entender. Existiam amores que valem por uma vida, e o nosso, fora
exatamente daquela maneira.

Remexi-me na cama e olhei para a mulher deitada ao meu lado.


Não era justo com Bruna, nem mesmo comigo. Assim como, éramos
parecidos, e foi o primeiro passo para considerar seu pedido de casamento.
Ela era divertida e irreverente, mas também apresentava um jeito contido à

frente de multidões. Bruna era uma mulher amável, e torcia internamente,


para que fosse a minha, em algum momento.

Sentei-me, já vencido pelo tormento do aniversário de Anne Liv.


Era para ser apenas um aniversário, porém, a presença de Nina mudara

todo o patamar. Nunca imaginei que ela apareceria novamente, e muito


menos, que tentaria algo. O que me incomodava era o fato de saber que
não podíamos mais tentar. Eu o tinha feito, assim como ela.

Durante as várias noites perdidas que tivemos, mas nunca consegui


confiar o bastante, a ponto de imaginar que viveríamos juntos. Nina não
tinha tal desejo, e eu, prevenia meu peito de sofrer outra decepção. Nunca
a forçaria a não ser quem era, assim como, ela não o faria comigo.

De alguma forma, senti que rompíamos algo, no momento

em que lhe falei sobre o noivado. Assim como, quando ela me dera as

costas no aniversário e disse que não desistiria. Algo me dizia, que de fato,

acabara. O que adiamos durante todos os anos que se passaram – o nosso


fim.
Parte II

“Eu quis tanto ser a tua paz, quis tanto que você fosse o meu
encontro. Quis tanto dar, tanto receber. Quis precisar, sem exigências. E
sem solicitações, aceitar o que me era dado. Sem ir além, compreende?
Não queria pedir mais do que você tinha, assim como eu não daria mais do
que dispunha, por limitação humana. Mas o que tinha, era seu.”

Caio Fernando Abreu


07
eu faço a cena que eu quiser[11]

Os dias se arrastaram, assim como, se desencontraram. Pablo


assumiu o noivado e de repente, Chiara fora convidada para seu
casamento. De alguma forma, talvez pelas centenas de mensagens ou

ligações, ele tinha entendido que não aceitaria algum convite. A vida dera
um giro de 360 graus, e de repente, vi-me como tia babona de uma irmã
que carregava gêmeas.

Assim como, vi-me fazendo amizades que nunca pensei. Anne Liv
se tornou uma pessoa constante e importante em minha vida. Não sei se
pelo fato de Cael e Chiara se acertarem, ou até mesmo, a gravidez
inesperada de minha irmã. Mas em algum momento, nosso santo bateu, e
tínhamos ficado próximas.

Através de Anne Liv, eu sabia de tudo sobre Pablo. Até mesmo

sobre a própria Bruna. Pelo que Anne deixou a entender, a própria família
Marini não compactuava com o casamento. Os pais de Pablo, como
sempre, estavam em algum lugar do mundo, incomunicáveis. Os tios dele,
que eram mais próximos, apenas disseram que não imaginavam porque o

casamento acontecia tão rápido. Em quatro meses, o casamento estava


montado e os convidados certos.

E eu?

Tinha apenas um objetivo naquele dia. Assistir aquele casamento


do começo ao fim, e tentar arrancar Pablo de meu coração. Ele fizera sua
escolha, e tinha que aceitar, de uma vez por todas. Porém, assim que
cheguei à mansão dos Marini, todo o meu plano mudou. Entendi o porquê
de realmente de estar ali.

Inconscientemente, viera para tentar mais uma vez e naquele exato


instante, tive a plena noção de que poderia apenas ser enxotada para
sempre da vida do homem que amava. Estava por minha conta e risco, e
sentia meu corpo enérgico como nunca antes.

Meu coração parecia bater no céu da boca, e a qualquer momento,


não duvidaria se o sentisse cair sobre minha mão. Era um misto de
adrenalina e covardia, duas sensações que não experimentara em momento
algum da vida. Por Pablo, tudo parecia se tornar possível. Talvez fosse a

chance que tanto esperei para poder me tornar parte de nós, novamente.

Ser parte do que fomos. Daquilo que somos, e principalmente, do


que poderíamos ter sido. Pela primeira vez, em muito tempo, sentia-me
certa sobre o que sentia e o que tanto queria. Ainda mais, por estar no

exato lugar que deveria. Andei mais um pouco, e sorri para algumas
pessoas desconhecidas que passavam. Percebi o quanto era bom ser cara de
pau naquele exato momento, porque apenas fingia costume. Por dentro,
estava a ponto de explodir.

Muito menos eu.

Adentrei a casa pela cozinha, tentando ao máximo me esquivar e


não dar de cara com alguém que pudesse me denunciar. Tal como minha
própria irmã, que com toda certeza, imaginava que eu estava em qualquer

outro lugar do universo, não ali. Entretanto, nada me preparou para o


baque que senti em seguida, quando me virei em direção as escadas.

Anne Liv me encarou com uma sobrancelha arqueada, e seus olhos


logo se prenderam no vestido de cetim preto que usava. Não era algo típico
para casamento. Todavia, se meu plano repentino fosse bem-sucedido,
estava com a paleta de cores perfeita. Sorri mentalmente de meu desastre
momentâneo.
— Eu pensei que te veria no momento do “fale agora ou cale-se
para sempre”. — instigou, com um sorriso pendendo para o lado. Sorri, e

tentei amenizar as batidas de meu coração que pareciam em sintonia com


meu desespero.

— Sequer imaginei que Pablo faria esse momento. — dei de


ombros, passando as mãos nos braços, de modo que abraçava a mim

mesma. Olhar para aquela mulher, que significava tanto para ele, fazia-me
sentir ainda mais culpada. Porque estava prestes a tentar acabar com aquele
momento.

Poderia ser apenas egoísmo, por eu ser puramente egoísta. E assim,


Pablo teria toda a razão, e eu o perderia de fato.

— Ei! — ela falou e deu um passou a frente, colocando as mãos em


meus braços, em um gesto carinhoso. — Fui eu quem pediu esse momento
para o celebrante e mais... Precisa saber que Pablo sempre fez de tudo para

o melhor de alguém, e nunca pensa em si mesmo.

— Sei disso. — falei, e engoli em seco, como se uma bola se


formasse em minha garganta. — Somos opostos.

— Nasceram um para o outro. — piscou e me puxou para seus


braços. Senti-me aconchegada em um primeiro momento, e não saberia
explicar a paz que se apossou de meu corpo. Era como se Anne Liv me
transmitisse o que me faltava – coragem. — Basta fazê-lo pensar em si
mesmo pela primeira vez.

Não entendi sobre o que ela falava, mas assenti. Ela se afastou, e
sem me dar tempo para agradecer, apenas me encarou mais uma vez.

— A primeira porta a esquerda. — confidenciou rapidamente, e me


deu as costas.

— Obrigada. — soltei para o nada, e rumei na direção que ela


orientou.

Não era conhecida por meia palavras, tampouco por ser medrosa.
Inconsequente e maluca eram características atribuídas, na maioria das
vezes. Naquele instante, apenas queria que Pablo enxergasse amor. O
nosso amor. Em minha tola mente, queria acreditar que ele me esperava.
Estava mais do que na hora de parar de assistir novela mexicana na hora do
café da tarde.

Parei à frente da porta branca e não bati.

Abri a porta e não fora difícil localizá-lo. Pablo estava parado à


frente de um grande espelho, lutando contra sua gravata. Era a primeira
vez que o via de tal forma. Ele sempre fora o mestre em trançá-las. Se
aquilo fosse um romance, com toda certeza, ele estava nervoso demais por
conta de seu casamento. Tentei me convencer que estávamos dentro de
uma comédia romântica, o que combinava muito mais. Com ele. Comigo.

Com a gente.

— Eu treinei muitas coisas, confesso. — falei, antes que minha voz


fugisse de vez.

Seu corpo paralisou no primeiro instante, e no segundo, sua cabeça


girou lentamente em minha direção. Olhamo-nos e pela primeira vez

conseguia ver claramente o que aquela conexão significava – que éramos


para ser. Independentemente do tempo, do momento... de nós mesmos.

— O que faz aqui, Nina? — indagou e dei alguns passos em sua


direção, sem me deixar intimidar pelo negro de seus olhos, que pareciam
me ler por completo. Nunca mais teria medo de que ele descobrisse quem
eu era. Ele sempre o conseguiu sem ao menos ter concepção de tal coisa.

— Destruir seu casamento, talvez? — forcei um sorriso e notei que


seu semblante permaneceu fechado, como se me analisando em busca de

sensatez. — Não vou mentir sobre e não precisa se fazer de burro.


Sabemos muito bem porque estou aqui.

— Não vou cancelar o casamento. — falou de repente, no tom que


sabia, não deixava margem para discussão.

Entretanto, não era sua subordinada, muito menos, alguém que


acatava ordens. Muito menos, do homem que amava.
— Vai! — revidei, e parei a sua frente. Seus olhos encontraram os
meus mais uma vez, e ao notar o cabelo já comprido preso atrás da cabeça,

minha maior vontade era poder soltá-lo e sairmos de moto por aí. Como
antes. — Vai porque você me ama. — suspirei fundo, e seu semblante
mudou de incisivo para confuso. — Assim como, eu te amo...
perdidamente. — completei e ele desviou o olhar, como se não pudesse

acreditar.

— Há coisas maiores do que nós.

Seis palavras.

Seis malditas palavras.

Jogadas ao vento, ou como acreditava, ao universo, cerca de dez


anos atrás. As palavras que usei para nos separar e que nos trouxeram até
ali. As mesmas que naquele instante, queria poder fazê-lo engolir de volta.

— Sempre soube disso. — falei, e suspirei fundo. — Mas existe

amor entre a gente, Pablo. Como pode se submeter a um casamento sem


amor? Logo você?

— Eu posso amar, Nina. — revidou, calmo e sem entonação


alguma. Aquele era o lado de Pablo que nunca soubera lidar. Quando ele
simplesmente se escondia e deixava fluir o que tinha sobre a casca. —
Posso amar minha futura esposa.
— Só se ela for eu. — as palavras saíram em um único fôlego, e ele
balançou a cabeça negativamente, claramente incrédulo.

— Não pode simplesmente aparecer e me dizer que é a mulher


certa, Nina.

— Então é isso? — indaguei, e finalmente, as palavras de Anne Liv


fizeram sentido. Existia muito mais do que eu sabia, do que Pablo permitiu

que soubesse. — Está optando pelo certo e não pelo que quer?

Ele me encarou surpreso, e finalmente entendi. Ele estava pensando


no bem-estar de outro alguém, não no dele. Muito menos o dele.

— Por que está se casando com ela? E sem papo de descobrir


novos sentimentos! — pontuei e ele abriu a boca para dizer, mas nada saiu.
— Por que, Pablo?

Ele respirou fundo e o encarei em decisão. Sua resposta contava em


muito para o que viria a seguir.

— Bruna está grávida.

Não abaixei a cabeça, e permaneci estática por segundos que


sequer conseguiria contar. Aquelas palavras significavam muito mais do
que deveriam. Pablo sabia o impacto das mesmas sobre mim. Assim como,
eu sabia o claro porquê de ele estar se casando com ela. Tudo pareceu se
encaixar naquele exato segundo.
— Sorte, eu acho!

Foi a única coisa que saiu de minha boca. Meu coração pareceu

querer falhar em suas batidas, e se encolheu no canto mais estreito de meu


peito. Deixando-me oca. Dei-lhe as costas, e não soube mais o que pensar.
Pablo realizava um sonho que nunca me pertenceu, e muito menos,
compartilhávamos. Ele queria uma família. Eu, apenas queria ele. Éramos

incompatíveis. Finalmente, começava a entender tal questão. Entretanto,


não a aceitava. Nem sabia se um dia o faria de fato.
08
eu que falei: nem pensar[12]

Nunca pensei que chegaria aquele momento com uma mulher que
não fosse Nina, mas ali estava. Faltando apenas cinco minutos para descer
e entrar em meu casamento. Passei a mão pelos cabelos, sentindo-me ainda
mais perdido por dentro. Era a coisa certa a se fazer. Ao menos, tentava

me convencer daquilo todos os dias. Evitar ao máximo ceder à tentação e


outros sentimentos que Nina trouxera à tona.

Ela, na realidade, nunca se fora de vez de vida.

Uma escolha que nunca entendera de fato, mas poder discar seu
número de vez em quando e apenas ouvir sua voz, era como encontrar a
paz que precisava. Nina era de fato, uma parte da minha história que nunca
quis apagar. O problema consistia em que tínhamos visões muito

diferentes sobre o futuro, ou talvez, ainda estivéssemos muito presos a

nossas versões do passado. Principalmente eu.

Nunca conseguira voltar atrás e entender como de fato tudo acabou.


Mas sabia por onde o fim tinha começado. Nina me rechaçara, e nunca
mais, tocou no assunto de um relacionamento entre nós. Tampouco, fiz o

mesmo. Eu a amava loucamente, a ponto de focar nos livros de mil páginas


da pós, e tentar me esquecer que um dia, cogitei que seríamos para sempre.
Contudo, meu coração nunca pareceu compreender por completo.

Anos longes. Telefonemas perdidos. Mensagens não respondidas. E


ali estávamos. A vida nos colocara frente a frente em alguns pequenos
momentos, mas nenhum deles, tão impactantes quanto aquele. Nina viera
até mim e me pedira para ser seu de novo. O pior de tudo, era não
conseguir acreditar que era real. Que aquele mesmo sonho que tinha

quando mais novo, de que ela voltaria atrás na sua decisão e entenderia que
a pedi em casamento porque queria ficar com ela pelo resto de nossas
vidas, não precisava terminar com um sim. Ela poderia pedir um tempo
para pensar e poderíamos ao menos tentar.

Mas Nina tinha outros planos, os quais, não me incluíam.

Com o tempo, fui capaz de compreender que cada um era dono de


suas próprias escolhas. E mesmo sentindo e me agarrando aquilo, de que
Nina também me amava, o amor não era o resultado da equação de

nenhum relacionamento.

Sorri sozinho, encarando meu reflexo. Se falasse em voz alta, com


toda certeza, Nina me abraçaria da forma carinhosa e beijaria levemente
minha boca. Ela adorava o fato de relacionar os números a nós. Ainda
mais, por ela ser de exatas, e eu completamente de humanas. Um

pensamento acadêmico em meio há anos que nos perdemos, e que me


remetia à quando ainda éramos amigos demais para dar um passo adiante.

Um dia, demos, e fora naquilo que resultamos – nada mais que um


passado para deixar.

— Está pensando em Nina, não é? — a voz baixa e categórica de


Cael me pegou desprevenido.

Virei o rosto para perguntar como ele entrara sem fazer barulho,
mas era óbvio. Ficara perdido demais em minha própria mente que sequer

o notei.

— Na vida, para ser exato. — comentei, sem querer levar aquilo a


diante.

Eu entendia o que Cael fazia ali, assim como, o fizera com ele
quando se perdeu por completo por Chiara. A questão era, que naquela
equação de nós, tudo se encaixara perfeitamente. No papel era simples,
matemática resultava em exatidão. No romance, Nina e eu nunca

chegamos a um resultado diferente de lembranças.

— Eu sei que não é a melhor hora, mas... Vou perguntar pela


centésima vez no dia, tem certeza? — indagou, e o encarei.

Bruna esperava um filho meu, e não voltaria atrás com minha


decisão. A notícia fora uma surpresa, mas me deu o Norte que tanto

precisava. Sentia-me em uma fase da vida, onde nada realmente importava.


Finalmente, senti a sensação de fazer parte de algo.

Além de Nina, que aparecera minutos antes de Cael, ninguém mais,


além de Bruna, sabia sobre a gravidez. Primeiro, porque toda minha
família iria se opor aquilo. Segundo, porque não sabia por onde mais
seguir. Ela era encantadora e sempre me fez sentir bem, fato que contou
muito para aceitar o que ela me propunha. Não era fadado a
relacionamentos, mas naquela pequena mulher, parecia querer arriscar o

que tanto perdi em algum momento do caminho – minhas escolhas.

— Tenho sim. — respondi e me virei por completo. — Já está na


hora? — perguntei, e Cael assentiu, mesmo que a contragosto. —
Obrigado por se preocupar e respeitar minha decisão.

— Vi Nina saindo. — comentou, como quem não queria nada, mas


no fundo, sabia que significava muito mais. — Ela tentou, não foi? —
indagou com pesar, e sabia que ele se preocupava com ela. Nina se tornara
sua cunhada a algum tempo, e com toda certeza, era próxima dele.

— Ela não quer perder, como sempre. É o jeito Nina de ser. —


suspirei fundo, sabendo que aquela era a tal realidade que tentava evitar.
Ao menos, tinha 50% de chance de ser. — Não consigo acreditar no amor
que diz sentir.

— Mas quer acreditar, não é?

Aquela era a pergunta que valia um milhão de reais, ou até mesmo,


dez. Fui até meu primo, que era praticamente um irmão mais novo e bati
em seu ombro.

— Deixei de querer isso a muito tempo, Cael.

Dizem que uma mentira dita em voz alta várias vezes se torna
verdade. Começava ali. Uma vez e contando...

Cael abriu a boca para dizer algo, ao mesmo tempo que ouvimos

um grito vindo do quarto a frente. Olhei-o sem entender, e passei pelo


mesmo, abrindo a porta do quarto que estava. Dei de cara com a porta do
da frente, completamente escancarada, e a primeira visão que tive, deixou-
me perdido.

Bruna estava chorando, assim como, segurando o vestido branco


contra seu corpo, como se protegendo a si mesma. Adentrei o ambiente, e
paralisei ao notar que Heitor, um velho conhecido estava ali. Não havia
ninguém mais. Apenas os dois.

Olhei primeiro para ela, e toquei seu queixo, buscando alguma


resposta. Bruna desviou o olhar, e sabia que era difícil para ela. Heitor a
traíra na época em que foram quase que namorados, ao menos, fora o que
ela me contara quando conversamos abertamente sobre nossos ex. Ela

sabia por cima sobre Nina, ainda mais, depois que tive de lhe explicar
sobre a falsa gravidez da mulher que ela nem conhecia.

A lista de ex que apareciam em casamentos para destruí-los


acabava de ficar completa.

— O que faz aqui, Heitor? E por que estão gritando? — perguntei


de uma vez, e me virei para ele. Foi quando comecei a entender um pouco
do que acontecia. Heitor parecia devastado. Seus trejeitos demonstravam
raiva, mas claramente, existia mágoa em seu olhar.

— Bruna está grávida. — comentou e apenas assenti, de modo


automático. Não sabia como ele descobrira, mas não era algo que negaria
se alguém perguntasse. — Não vou me comprometer a isso. Seja adulta,
Bruna. Conte a ele!

Ele então, simplesmente saiu pela porta, e fiquei paralisado, sem


conseguir entender o que de fato acontecera ali. Porém, não era difícil
juntar um mais um. Por mais de humanas que fosse, sabia que naquele
exato instante, um mais um resultara em três.

— Vocês estavam juntos antes de nós... Antes de realmente termos


algo sério. — confirmei o fato, e encarei-a profundamente. — Diga-me a
verdade. De quanto tempo está?

Ela respirou fundo e mais uma lágrima desceu. O fato de ela não

conseguir falar, apenas me mostrou que Heitor nunca estaria ali ao acaso.
Ele tinha certeza de que era o pai, assim como, Bruna também parecia
saber.

— Ele é o pai, não é? — indaguei, e consegui notar um leve aceno

positivo de sua cabeça. Bruna parecia tão perdida, que simplesmente, não
conseguia reagir aquilo. — Eu não vou discutir sobre isso agora porque
claramente, parece tão perdida em si, que não consegue nem admitir o que
fez. Mas lembre de algo, Bruna. Não se brinca com a vida de ninguém. —

seus olhos finalmente me encararam, e pude notar sua vergonha.


Finalmente tudo se encaixava em minha mente. Mas resolvi continuar a
falar: — Sou um cara comum, com sonhos muito comuns, e não espero
nada além de honestidade quando estou com alguém. Seja quem for.
Então, esse casamento não vai acontecer. Primeiro, que agora pareço
entender porque parecia tão apaixonada por mim. Segundo, porque posso
ser comum, mas nunca mais me trate como um imbecil.
Virei-me de costas, e pude ouvir meu nome saindo de seus lábios,
mas não fui capaz de ficar para ouvir mais nada. Por mais controlado que

fosse, por dentro, sentia que o ar faltava, e ainda não conseguia assimilar o
quanto fora enganado em tudo aquilo. Sequer precisei ouvi-la dizer.

Era tão claro, que finalmente, as horas e horas que conversávamos


sobre o passado, me mostraram que ela não superara Heitor. Ele sempre

esteve lá. Assim como, Nina estivera em mim. A diferença entre nós, era
que fizera uma escolha. Escolhi estar com Bruna por querer. Por pretender
amá-la. E ela, claramente, porque queria uma tábua de salvação.

Cael estava na porta e me interceptou assim que passei para o


corredor.

— Eu dou um jeito em tudo, ok? — falou e não era capaz de me


opor.

A caminho da escada, tirei a gravata que já começara a me sufocar

e fui em direção a saída da mansão de meus tios. O tempo tinha fechado e


sorri ironicamente, nada menos do que o próprio universo conspirando
contra. Por mais que dissera a Bruna que não era imbecil, aquela era
exatamente a forma como me sentia.

Passei pelos grandes portões, e simplesmente ignorei o fato de que


Heitor estava ali na frente, encostado em um carro. Não tinha cabeça para
aquilo e muito menos lamber feridas. Queria paz, longe dali. Comecei a
andar sem rumo, e de repente, entendi – as vezes, se perder era a única

opção para se reencontrar.


09
e quando acaba a bebedeira, ele consegue nos achar[13]

— Qual o grande problema? — indaguei, e me ajoelhei sobre a


cama, tocando seus ombros largos.

Ele puxou uma de minhas mãos e levou-a até seus lábios. Sorri,
para tal intimidade que nunca sentira com outro alguém. Entretanto, era

difícil entender como conseguia estar perto dele. Como era tão fácil com
ele.

Amar Pablo Marini era tão simples quanto respirar.

Ele era diferente de todos os caras que já me envolvi, e além de


tudo, se tornara meu melhor amigo durante os primeiros anos da
faculdade. Ele era um livro aberto, enquanto eu, uma caixinha de
surpresas. Em algum lugar, diziam que pessoas como nós combinavam.
Opostos completos.

Abaixei a cabeça e beijei seu pescoço, e notei seu corpo reagir ao

meu. Nunca entenderia como ficamos tanto tempo apenas na linha tênue
da amizade. Desde o primeiro olhar era como se nos necessitássemos. E
ali, naquela cama de solteiro da minha kitnet, conseguíamos chegar ao
céu e inferno sempre que queríamos.

— Sabe que gosto do seu silêncio, mas nem tanto. — comentei e


sorri mais uma vez. Ele virou seu olhar e notei a fragilidade com que me
encarava. Pablo parecia querer contar algo mais, e apenas permaneci ali,
encarando-o também. — O que foi, playboy?

— Gosto de te olhar. — soltou de repente, e virou o corpo, ficando


a minha frente. — Gosto do que a gente tem, Nina.

— Ixiiii... — soltei de uma vez, e me afastei dele, levantando da


cama, apenas vestida com a lingerie. — Já posso até ouvir o final da frase.

— olhei-o decidida e o mesmo franziu o cenho. — O que? Tem algum,


“mas” vindo por aí, que eu sei. — instiguei-o, e cruzei os braços. —
Algum, “mas quero curtir a vida ou, mas não acho que sejamos feitos pra
isso”. Esse tipo de coisa! — falei, já me sentindo nervosa pelo fato de ele
estar tão quieto.

Éramos instáveis, mas sabia que fiéis.


Entenderia se Pablo quisesse botar um fim em nosso caso. Nunca
nos declaramos como nada, mesmo que parecesse um namoro. Eu odiava

rótulos e Pablo me respeitava naquele quesito. Afinal, de que valia


chamar o que tínhamos com um nome indicado? Gostava de paz no caos,
combinava comigo, e claro, com a gente.

— Eu só quis dizer o que disse, Nina. — falou, e sorriu levemente

em seguida. — Por que sempre faz um milhão de teorias sobre o que


alguém fala? — indagou, e dei de ombros, aproximando-me.

Subi na cama de joelhos e fui até ele, deitando seu corpo.

— Porque sempre crio teorias da conspiração para tudo. E porque,


ninguém diz tudo que realmente sente. — comentei despreocupada, mas
com ênfase em minha voz.

Uma de suas mãos subiu para meu cabelo e ele acariciou


levemente. Não era pelos gestos sutis que ele me tinha, era pelo simples

fato, de gostar tanto que ele os fizesse. Simplesmente, por ser ele.

— Eu te amo.

Era como se aquela simples frase tocasse minha alma, ao mesmo


tempo que, minha mente gritou “perigo”. Suspirei, e resolvi as coisas da
melhor forma para ambos. Calando-o com um beijo e deixando o assunto
no ar. Ele sabia que também o amava, completamente.
Acordei com o barulho alto, e pisquei um pouco perdida, encarando
o ambiente ao redor. Não reconheceria aquele lugar nem em mil anos.
Parecia branco demais para uma pessoa como eu, e com toda certeza, não
tinha amigos que decorariam de tal forma.

Olhei para minhas roupas e as chequei, encontrando-me com o


vestido que por um milagre, lembrava de ter usado para sair e... Puta
merda! Beber até cair no bar que mais frequentei durante a faculdade, para
esquecer que o homem que amava estava se casando naquele exato dia.

Dei um pulo na cama e comecei a repensar as pessoas com quem


conversei até estar tão bêbada que sequer sabia meu nome. O rosto de
Cadu, mais conhecido como o gostosão da turma de administração da
minha época, me veio em mente, e de repente, paralisei. Ele era prepotente

demais para o meu gosto, não poderia ter vindo para casa dele. Passei a
mão pelo meu corpo e tentei encontrar algum resquício de outra pessoa.

Aquele dia acabou comigo e descontar na bebida não fora uma


forma tão inteligente, ainda mais, num bar antigo, onde com toda certeza,
encontraria idiotas antigos. Entretanto, era algo que fora deixado de lado,
assim que visualizei o que deveria ser uma escultura de metal e a peguei
em mãos. Era pesada, mas ao mesmo tempo, conseguia batê-la na cabeça
de alguém.

Testei o movimento, enquanto ainda ouvia barulhos vindo de fora


do grande quarto. Branco. Branco demais para o meu gosto, e com toda
certeza, para os próprios fãs da cor. Abri a porta com cuidado, não
querendo denunciar minha saída, e trouxe o pedaço de metal a tiracolo. Era

do tipo que batia primeiro e pensava depois. Talvez fosse errado. Mas não
permitiria que seja lá quem fosse desse o primeiro passo.

O que imaginei descobrir a longos passos dali, porque atrás da


porta existia um amplo corredor, pegou-me completamente de surpresa. De
repente, vi-me paralisada com um pedaço de metal nas mãos. Porta-
retratos enfeitavam as paredes. Todos em preto e branco e claro, com
molduras brancas. Senti uma pressão no peito, e fora como um simples
estalo. Meus olhos recaíram sobre uma foto na parte superior direita, ao

mesmo tempo que, derrubava o metal no chão.

Senti que era observada, da mesma forma que encarava a foto


completamente surpresa. Virei-me e o homem que encontrei ao fim do
corredor, parecia completamente à vontade em sua própria pele. Como se
fosse rotineiro, acordar e me encontrar ali, no corredor, do que
possivelmente era seu lugar.

Nunca estivera ali.


Pablo estava apenas com um moletom e os cabelos bagunçados,
como se tivesse passado a mão por várias vezes. Ele deu alguns passos em

minha direção e pegou o objeto caído ao lado, colocando-o sobre um


aparador, que sequer tinha notado. Não consegui desviar de seu rosto,
como se imaginando em que realidade relativa eu me encontrava. Pablo
deveria estar em lua de mel. E eu...

O que diabos eu fazia a sua frente?


10
eu fui sincero como não se pode ser[14]

Ela parecia adorável quando confusa.

Sorri, sem conseguir evitar e tinha certeza que Nina pegaria o


pedaço de metal ao seu lado e acertaria em minha cabeça.

— O que diabos aconteceu? — indagou de repente. — O que eu


estou fazendo aqui? Ou melhor, onde é aqui? E você? Por que está
comigo?

Ela parecia uma metralhadora e aquilo me mostrara que mais uma


vez, a vida nos colocava frente a frente. Na dança das cadeiras, de alguma
forma, ambos sobrávamos. Apenas nós. Suspirei e fiz um gesto com a
cabeça.
— Pode começar a me esclarecer o que tá acontecendo. Porra, eu
bebi demais, não foi? Que merda eu fiz no seu casamento? — perguntou e

arregalou os olhos, como se desconfiando de si mesma. — Eu armei algum


barraco?

— Não, princesa. — usei o apelido perdido com o tempo e ela


fechou a expressão. — Eu vou te contar tudo, mas assim que se sentar na

mesa e comermos algo.

— Não vou me opor. — deu de ombros. — Mas quero até os


mínimos detalhes. Isso tá mais maluco do que um sonho! Nunca mais vou
beber. — argumentou, e comecei a andar, sorrindo de sua maluquice.

Aquela era a mulher que eu amava, e de repente, estava mais a


mostra do que nunca.

— Não faça promessas que não vai cumprir. — falei alto, e ouvi
sua risada a minhas costas.

— Não foi uma promessa, playboy. Talvez uma divagação. —


explicou, e virei meu olhar, encontrando o seu.

— Típico de Nina!

— Agora tenho algo típico? — indagou, assim que adentramos a


cozinha, e lhe indiquei a mesa já com alguns pratos com frutas cortadas.

— Você sabe que sempre teve. — confessei, já sem nenhum peso


de ser sincero.

Só de imaginar que fora enganado durante aqueles meses e que

poderia ficar preso a outra mulher por uma mentira, sentia-me ainda pior.
A mulher que eu queria estava a minha frente, assim como, quando nos
pediu uma chance meses atrás. Era hora de colocar as cartas na mesa.
Finalmente entendia tudo a nosso respeito. Sempre éramos jogados um

para o outro, mas um acabava estragando tudo.

Era hora de recomeçarmos de fato, e esperava que Nina quisesse o


mesmo.

Ela se sentou e sem cerimônia alguma, atacou o prato com


morangos. Sabia que era sua fruta favorita, assim como, a minha. Era um
dos poucos gostos que tínhamos em comum. Parei, encostando-me contra a
bancada, e apenas a observei.

— Olha, eu gosto que me olhe, mas... não posso fingir que entendo

o que faço aqui. A última coisa que me lembro claramente é de me dizer


que sua noiva esperava um filho... Então, deve ter uma boa explicação para
parecer tão relaxado a minha frente? — indagou, e desviou o olhar dos
morangos.

— Bruna mentiu sobre isso. Eu não sou o pai. — falei de uma vez e
a boca de Nina se abriu, como se espantada. — Heitor, o ex dela, apareceu
no casamento antes mesmo de descermos, e descobri tudo.

— Puta merda! — exclamou, como se incrédula. — E eu

imaginando que era o drama mexicano... — tive que rir e balançar a


cabeça. Com certeza ela não pensara antes de falar. — Desculpe, mas
como você está? — indagou, e seu semblante mudou. Ela parecia
genuinamente preocupada.

— Não quer saber como veio parar aqui primeiro? — rebati e ela
negou com a cabeça, como se certa daquilo.

— Não deve ter sido fácil isso. Você foi enganado, Pablo. Como
realmente se sente sobre?

— Sei onde quer chegar. — virei-me e fui até a geladeira, pegando


uma garrafa de água. Voltei até onde Nina estava, e me sentei ao seu lado.
Deixando a garrafa a sua frente. — Claro que foi um baque, mas eu... Não
amo Bruna, e estava certa sobre a maioria das coisas que disse. Estava

fazendo o que acho certo.

— Não me surpreendo muito com isso. Tudo fez sentido quando


me contou da gravidez ontem... — suspirou profundamente e fugiu de meu
olhar. — Parece que isso aconteceu há uma eternidade. Minha cabeça
doendo parece denunciar que entrei em coma ou algo assim. Posso estar
sonhando também. — divagou, e a entendia por completo.
Nem mesmo se meu próprio eu me contasse, que as coisas
aconteceriam daquela maneira, eu conseguiria acreditar. Era surreal

demais. Mas ainda assim, éramos nós, e era a chance que precisávamos.

— Eu estou aqui, Nina. — comentei por fim, e ela se prendeu em


meu olhar, quando levava mais um morango a boca. — E como sempre, a
gente se reencontrou.

— Onde?

— No bar que frequentávamos durante a faculdade... Fui lá para


beber e esquecer a merda que aconteceu. Ou sei lá, o fato de me sentir tão
imbecil a ponto de quase me casar com alguém que só mentia.

— Sinto muito, de verdade. Por mais que não quisesse seu


casamento, não queria que fosse machucado, Pablo. — interrompeu-me e
assenti, porque de alguma forma, entendia o que queria dizer — Pera um
instante! Você me encontrou no bar? — indagou e assenti, sorrindo de

lado. — Esse fio vermelho tá forte demais!

— Nina. — tentei pará-la e ela sorriu abertamente.

Ela amava a história de que estávamos destinados. Nina Moreira


podia não ser romântica, mas era defensora de coisas que jurava serem
reais. O tal fio era o que ela sempre bateu o pé e dizia que nos interligava.
Não tinha como não acreditar. Não depois de tudo.
— Você estava muito bêbada e disse que me odiava quando fui te
tirar de cima do balcão.

Ela gargalhou, como se imaginando a cena.

— Eu nunca passei da fase de bebedeira, sinto muito... ou não. —


confessou e sabia que era uma das partes que mais admirava nela. Nina era
um espirito livre, e não tinha medo de mostrar quem era. Se fosse para

cantar mpb ou descer até o chão com funk – era ela por completo. — E aí
me trouxe para cá? — olhou ao redor e parecia estranhar.

— Sim, e aqui é um apartamento que nunca venho para ser sincero.


— confessei, sentindo-me exposto. — Tinha comprado para nós, quando te
pedi em casamento.

— Pablo... — ela pareceu perder a voz e se levantou.

Olhou ao redor e eu apenas pude notar seus trejeitos. Ela me


encarou e de repente, senti seu corpo sobre o meu. Ao contrário do que

poderia acontecer, ela apenas me abraçou, como se para comprovar que era
real. Fiz o mesmo, porque passara a noite velando seu sono. Tudo nela me
chamava, e mesmo querendo acreditar que em meio ao caos, nos
encontrávamos. Era real. Porque ela era o meu caos.

— Eu nem sei o que dizer. — praticamente sussurrou, e afastou seu


rosto de meu ombro. Seus cabelos loiros caíam sobre o rosto, e poderia
jurar que ela nunca estivera tão linda quanto naquele exato instante.

— Apenas vamos conversar e nos entender. — pedi, e peguei suas

mãos, trazendo-as para os meus lábios. — Evitamos isso por tanto tempo e
não podemos mais. Eu te quero na minha vida, Nina.

Ela assentiu e uniu nossas testas. Fechei os olhos, sentindo a


intensidade do que éramos.

— Eu sempre te quis. — sussurrou e sabia do que se tratava.

Seus lábios desceram para os meus, levemente. Um simples


selinho, mas que marcava o momento. Ela se afastou e tocou meus
cabelos, como se aprovando o cumprimento ainda maior. Seu olhar me
inspecionava.

— Quer começar? — indagou.

— Acho que sim. — soltei os ombros. — Mas ainda não sei por
onde.

— Pode ser admitindo que te machuquei. — comentou e tocou


levemente minha barba. — Nunca falou sobre isso.

— Isso é verdade. — ela parecia me ler melhor do que ninguém. —


Bom, quando negou meu pedido, meu mundo desandou, confesso. Tudo
que pensei era em desparecer. Na minha mente, tínhamos tudo para ficar
juntos e de repente, mais nada. Doeu muito, Nina. Acho que por isso não
consegui aceitar que te queria como antes quando nos reencontramos. Era
como aceitar ser magoado de novo, mas não pude evitar.

— Por isso nunca quis falar sobre nós novamente, certo? —


indagou e assenti, sabendo que expúnhamos nossas feridas.

— Até a última vez que transamos. — confessei e Nina engoliu em


seco. — Eu considerei o que disse e queria realmente tentar.

— Foi quando Bruna apareceu com a gravidez? — cortou-me,


como se pudesse entender tudo naquele instante. — Mais que merda!

— Ela quem me pediu em casamento, acho que não contei sobre.


— soltei e Nina arqueou uma sobrancelha. — Agora faz sentido, a forma
como ela parecia apaixonada. Mesmo que não entenda porque não ficou
com o pai da criança.

— Bom, ao menos esse drama, não nos pertence. — sorri e toquei


seus lábios com os dedos.

— Quando me vi noivo, senti que a gente acabava ali. Ainda mais,


porque podíamos nem dar certo. Acho que me acostumei com o fato de
que sempre poderia deixar de me querer. Um pouco dramático, mas é o
que sentia.

Ela pareceu pensar e assentiu para o nada algumas vezes. Sabia que
não era tão simples, mesmo que parecesse. Ainda existiam algumas
interrogações entre nós.

— Ainda quer um casamento? — indagou e neguei de imediato.

Nina gargalhou, parecendo me entender.

— Duas experiências frustradas foram o suficiente. — comentei e


ela apenas assentiu, como se não quisesse aprofundar o assunto. — Mas e
você, Nina? O que você quer?

Ela tocou meu rosto com as duas mãos e pareceu admirar cada
detalhe.

— Quero recomeçar. — soara como uma certeza, ao mesmo tempo


que um pedido. Seu corpo estava tenso sobre o meu.

— Acho que é a primeira vez em anos, que concordamos em algo.


— sua tensão se foi e um sorriso se abriu no belo rosto. — Um passo de
cada vez, princesa?

Bateu em meu ombro, como se em retaliação.

— Sem princesa, querido. Apenas eu e você.

— Simples assim? — indaguei na esperança da resposta positiva, e


ela veio.

Nina sorriu e assentiu, como se também encontrasse seu ar. Mais


uma vez.
Ela me abraçou e era como estar em casa novamente. Nina

Moreira era como um lar para mim. Finalmente, estávamos ali sem

arrependimentos ou máscaras. Apenas nós.


11
teus lábios são labirintos[15]

— Posso conhecer o apartamento todo? — indaguei e me levantei


de seu colo. Pablo franziu o cenho, como se tivesse outra ideia. Neguei
com a cabeça, sorrindo. — Deixa de ser pervertido. — falei, e peguei mais

um morango sobre o prato.

— Você gosta quando sou pervertido. — acusou e acabei revirando


os olhos. Típico de Pablo Marini em seu modo cafajeste. — Mas tem
razão, estou sendo fácil demais!

— Ah por favor. — debochei e cruzei os braços em seguida. —


Demoramos dez anos, Pablo! Dez benditos anos e tá me dizendo que o
senhor é fácil?
Ele arqueou uma sobrancelha e deixou o sorriso pender para o lado
esquerdo o rosto. Aquele sorriso de menino levado, que a muito tempo não

via. Naquele momento entendia, que tínhamos que chegar até ali. De
alguma forma torta, parecia tudo mais leve e explicado. Sem mais
nenhuma dúvida entre nós. Nos queríamos e não tínhamos mais medo.

— Já me teve de joelhos para você, nada mais justo do que fazer o

mesmo. — provocou e gargalhei. Pablo era tão provocativo quanto eu. Ali,
relembrei claramente como funcionávamos e porque, nunca desistimos um
do outro. Quando juntos, éramos únicos.

— Acho bom lembrar... — dei um passo para frente, e encostei


meu joelho sobre sua perna. — Que já me teve de joelhos para você em
outros momentos... Mas quem sabe, talvez um dia, realize um fetiche que
tenho sobre isso.

— Nina. — rebateu e passou a mão de leve por minha coxa.

— O que? — fingi inocência e me afastei de seu corpo. — Agora


levanta essa bunda daí e vem me mostrar o lugar.

— Você é impossível. — comentou e se levantou, claramente


contrariado.

— Não para você. — fiquei na ponta dos pés e beijei levemente o


canto de sua boca.
Sorri, notando nossa diferença de altura. Pablo fizera o favor de ter
mais de um metro e oitenta. Eu, com meus um e cinquenta, sequer tinha

chance de alcançá-lo se não fosse daquela forma.

— Vem. — enlaçou minha cintura e me levou de volta pelo amplo


corredor, e foi quando notei que existiam outras fotos minhas, assim como,
nossas.

— Não consigo acreditar que fez mesmo isso. — confessei, e senti


um leve beijo em meu ombro.

— E nunca consegui me desfazer. — sussurrou.

Olhei ao redor, quando adentramos novamente o quarto, e mesmo


não gostando da cor, sabia que ele pensara em tudo.

— Acho que não preciso mostrar tudo, mas... Fica claro que nunca
terminei a pintura.

Encarei-o surpresa.

— Eu ia pedir sua opinião sobre as cores, por isso tudo é tão


neutro. Porque queria que fosse a nossa cara. — suspirei e finalmente
entendi porque tudo era daquela forma. — Mas vem cá, deixa eu te
mostrar a minha parte favorita.

Ele me estendeu a mão e aceitei de bom grado, indo em direção a


duas portas de vidro. Ele deslizou uma, e logo estávamos em uma incrível
sacada, que dava uma visão incrível da cidade, com a parte mais verde
exposta entre os prédios.

— É lindo aqui. — comentei e segurei-me na grade de proteção. —


Como conseguiu pensar em tudo?

— Acho que te amava demais para não pensar nisso. — assenti e o


encarei. Ele se encostara contra uma das portas de vidro e pareceu se

perder no momento. — Não te julgo mais pelo que escolheu.

— Eu sei. Mas preciso que saiba que neguei seu pedido não por
falta de amor... Casamento nunca foi sinônimo disso para mim. — fui
sincera e ele assentiu, e pela primeira vez, enxerguei compreensão em seus
olhos. — Temos ideias diferentes sobre, ou até mesmo, tínhamos... Mas eu
te amava, Pablo. Até hoje, eu te amo.

— Por isso tentou lutar por mim? — indagou, e tocou meus


cabelos, massageando-os.

— Por tudo que sempre foi para mim. — engoli em seco. — Eu


nunca quis alguém como eu te quis. Por mais homens que tenha conhecido,
nada se comparou com o que a gente teve. Você me enlaçou.

— Nina e sua teoria do fio vermelho. — revirei os olhos, pois ele


adorava me provocar com aquilo.

— Eu sei do que falo, e por mais que seja um elogio, a teoria não é
minha. E nem teoria é! É uma crença oriental e tem nome. — bradei e ele
sorriu amplamente. — Senti falta até mesmo disso. — confessei e senti

seus lábios em minha testa. — Suprir o desejo um do outro nunca foi a


mesma coisa...

— Nunca quis nos limitar a isso, eu sinto muito. — olhei-o e


naquela imensidão escura de seus olhos, entendia porque preto era minha

cor favorita. Porquê de alguma forma, significava ele.

— Eu também sinto muito, por tudo.

— Então, que tal pararmos de nos sentirmos assim e simplesmente


seguir em frente juntos? Sem mais tempo a perder, Nina. Além de tudo,
estamos ficando velhos. Já tenho trinta e sete e você bateu na porta dos
trinta. — bati em seu ombro e tive que sorrir.

— Eu continuo gata, não vem com essas besteiras. — pisquei um


olho.

— Eu que sei, princesa. — queria socá-lo, toda vez que me


chamava daquela forma. Porém, depois de tanto tempo, não a odiava mais.
Era sinal que estávamos em sintonia outra vez. — Continua a mesma
mulher que conheci.

— Com bônus, meus peitos e bunda cresceram. — provoquei e ele


me deu um leve puxão para seu corpo, segurando em minha cintura. — E
você continua a cara do Keanu Reeves.

— Nunca desistiu de me achar parecido com ele, não é?

— Não sou maluca. — dei de ombros. — Nem louca o bastante


para não aproveitar o fato de que tenho a cópia daquele homão na minha
frente.

— Nina, Nina... — balançou a cabeça e tive que sorrir. Pablo nunca

se incomodara de fato com minhas brincadeiras.

— Mas concordo com você. — lembrei-me do foco da conversa.


Conosco livres um com o outro, era fácil de perder a linha de raciocínio.
— Vamos seguir em frente... Juntos.

— Por que sinto que tem algo mais para me dizer? — indagou e dei
de ombros.

— Acho que sempre tenho... Mas no momento é simples: eu te


amo.

— E eu a você.

Puxou-me para si, e uniu nossos lábios. O primeiro beijo depois de


toda a devastação que nosso amor sofreu. Ali, senti-me novamente como
no momento que ultrapassamos a linha da amizade. Finalmente, depois de
tanto tempo, sentia-me eu mesma para com ele. A gente se entregava ali.
Na sacada do apartamento que ele comprara para nós. De algum jeito,
aquele lugar pareceu nos esperar. Gostava daquela ideia, mais do que um
dia imaginei de fato.

Suas mãos chegaram a meu vestido e senti-o sendo tirado de meu


corpo. Senti o frio bater em minhas costas, e sabia que poderíamos ser
acusados de atentado ao pudor, mas nada mais importava. Livrei-me de
sua calça moletom, assim como, toquei cada pedacinho de pele exposto de

seu corpo nu. Cada toque era único e senti-me viva novamente.

Sabia que era exatamente ali que deveríamos estar.

Senti meu corpo nu ser esmagado contra a porta de vidro e não


pude mais evitar um gemido. A boca de Pablo chegou ao meu queixo,
mordendo-o levemente, e desceu para meu pescoço.

— A gente pode ser preso. — falou, assim que prendi as pernas em


sua cintura, já pronta para tê-lo para mim.

— Ao menos nossos diplomas garantem cela especial.

Ele sorriu baixinho, e encostou nossas testas, deixando-me na


posição para estar dentro de mim. O sorriso se foi, assim que o senti em
meu corpo.

— Estou perto de pirar. Eu, você, aqui... — soltou um gemido


rouco, assim que nos unimos de fato. — Porra, Nina!

Nossos olhos se encontraram e puxei seus cabelos, devorando sua


boca em seguida.

— Nada é mais certo que isso. Nada. — falei, e ele sorriu, de um

jeito selvagem, ao mesmo tempo que apaixonado. — Acho que acabei de


me apaixonar por você, mais uma vez.

— O mesmo aqui. — ele levou uma de minhas mãos ao seu peito, e


pude sentir seu coração a ponto de saltar pela boca.

Porém, nada mais importava. Nem as palavras.

Eu, ele, ali mesmo... Prontos para recomeçar. Aquele era o


momento que sempre quis ter, desde que nos reencontramos. Estávamos,
finalmente, nus de corpo e alma. E nunca antes, nada me pareceu tão belo
e certo.
12
coração na mão como o refrão de um bolero[16]

— É disso que eu precisava. — a voz de Nina soou fraca, enquanto


estava esparramada sobre meu peito. Suspirei fundo, e beijei seus cabelos.

— Ser fodida até a exaustão? — indaguei, e sabia que ela tinha


revirado os olhos, e logo, os mesmos me encararam.

— Foder até a exaustão. — corrigiu-me, e sorriu sacana. — Não se


esqueça que tenho trabalho como você. — deu um leve beijo em meu peito
e subiu até minha boca.

Estávamos nus e exaustos. Mas nunca pareceu tão bom quanto


naquele exato instante. Nada mais me importava, e agradeci internamente
por Heitor chegar a tempo de acabar com aquele casamento. Eu nunca
conseguiria ser feliz com outra. Estava destinado a Nina, e um dia, lhe
admitira aquilo.

— Concordo. — provoquei, apertando levemente seu nariz. — O


que tanto pensa?

— Por que acha que estou pensando muito em uma única coisa? —
rebateu, sorrindo de lado. — Posso estar considerando muitas, nesse exato

momento.

— Que seriam? — instiguei-a.

— Sem pressão, mas... Sabemos que no momento o senhor não


pensa em casamento. — assenti, e ela pareceu assimilar tal gesto. — Mas
acho que devemos fazer algumas concessões.

— Do que realmente estamos falando? — indaguei, já sem


entender onde queria chegar.

— Sobre nós e o que faremos daqui por diante, e mais, sobre o

futuro.

— Então imagina um futuro comigo? — perguntei, e ela sorriu


amplamente, mordendo meu queixo de leve.

— Nunca imaginei um em que não estivesse, mas... — fiquei


embasbacado com sua fala. — Não vou usar branco, já avisando. Aliás,
vou te dar tempo para superar o trauma de casamento e aí sim, podemos
nos casar. Por enquanto, vamos namorar e é isso.

— De onde veio tudo isso? — perguntei perplexo. — Não quero te

forçar a...

— Shh. — colocou dois dedos sobre meus lábios. — Tá me


forçando a algo? Ninguém nunca fez isso, Pablo Marini. Nem mesmo
você. Mas abro essa exceção agora porque sei que é importante para você.

E hoje vejo, que o que te importa, também é importante para mim. Porém,
acho que é bom deixar claro algo.

— Sobre filhos? — indaguei, e ela assentiu. Não era difícil falar


com Nina sobre, porque ela sempre foi clara sobre aquilo.

— A biologia não me permite ter filhos, assim como, nunca


desejei. Poderíamos adotar, mas a questão é que nunca me vi como mãe e
acho que isso não vai mudar. Estou bem sendo uma tia coruja para as
gêmeas de minha irmã. Gosto do título. — sorriu levemente. — Mas

preciso saber, se de alguma forma, isso te incomoda.

— Não. — fui honesto e notei surpresa em seu olhar. — A gente


basta para mim e claro... Uns cinco cachorros e dois gatos. — ela
gargalhou e pareceu pensar a respeito.

— Posso te conceder isso. — piscou um olho. — Mas não quero


que se sinta preso a minha escolha e condição... Tem certeza que quer
mesmo investir na gente? Com tudo isso claro?

— Nada é melhor para mim, Nina. — toquei seu rosto com

carinho. — Já me vejo com você e um gato chamado Mufasa.

— Sim! Mil vezes sim! — pareceu ainda mais animada. — A


propósito, você assistiu o live action? — neguei com a cabeça e ela
pareceu ofendida. — Foi perfeito demais. Acho que vi umas dez vezes. —

sorri e sabia que ela realmente o teria feito. Rei Leão era um dos seus
filmes favoritos, se não fosse o primeiro da lista. — Mas enfim, voltando a
questões reais... Como seus pais estão?

— Pelo mundo, como sempre. — comentei sem maiores delongas.


Não existia uma forte ligação entre nós. Ainda menos, com meu pai que
poucas vezes estive perto em toda a vida. Aquilo não me feria, pois fui
praticamente criado por meus tios, que sim, considerava como pais. — E
sua mãe?

— Com certeza, vai surtar quando rever o advogado bonitão que


ajudou a processar o fornecedor babaca. — puxei-a para mais perto e logo
Nina estava com as pernas enroscadas em meu corpo. — Ela ama o Keanu,
já para deixar claro. E quando você defendeu a padaria, ela quase surtou.

— Talvez tenha investido na Moreira errada. — debochei e Nina


sorriu amplamente.
— Acho que ela prefere o Clooney de todo jeito, então... Quando
quiser, só aparecer por lá.

— Nina, o que está acontecendo com a gente? — indaguei, e ela


deu de ombros.

— A gente tá se amando, sem esperar mais.

— E gosta disso? — ela se aproximou ainda mais, ficando a um fio

de cabelo de distância de minha boca.

— Eu amo. — confessou. — Eu, você, gatos e cachorros... O que


mais posso querer?

— Beber até cair para comemorar?

— Sabe como é, só se cura uma ressaca com outra.

Aquela era a Nina que eu realmente conhecia.

— Acho que precisamos disso.

— Voltar a causar juntos? — indagou, e poderia visualizar os


pensamentos pervertidos que se passavam em sua mente.

Nina e eu nunca tivemos pudor.

— Acho que fizemos isso, minutos atrás. — beijei-a levemente. —


Mas quero muito te levar para sair, como antes...

— Podemos fazer isso, só que dessa vez, na minha cidade. —


praticamente intimou e dei de ombros.

— Em qualquer lugar, com você.

De fato, era real. Finalmente tudo se encaixava.

— Onde diabos se meteu? — a voz histérica de minha irmã, me fez


gargalhar.

Corri para desligar a caixa de som de Pablo, que estava sentado na


cama me esperando. Ele tinha que passar na empresa para pegar algo, e

depois, iríamos para o interior.

— Onde está a sua educação, Chiara Moreira? — indaguei,


fingindo estar incomodada.

Penteava meus cabelos, em frente ao amplo espelho. Pablo parecia


me analisar, e não parava de o fazer desde que terminou de se arrumar.
Nunca entenderia porque ele parecia tão imerso. Talvez entendesse, porque
me sentia da mesma forma. Era como se voltássemos a ser um do outro.
De forma simples, finalmente.

— Esqueci na casa do caralho! — Chiara berrou e olhei para


Pablo, segurando uma risada.

— Vamos parar com essa gritaria, cacete! — revidei. — Não


esquece que está esperando minhas sobrinhas amadas e perfeitas. Aliás, o

tio delas está ouvindo tudo isso daqui.

— Tio? Como assim? Quem está com você?

Arqueei uma sobrancelha para Pablo, que parecia admirando com


meu ato. Sabia que tínhamos muito o que trilhar e para ele acreditar que
tudo mudara.

— Oi, Chia.

— Puta que pariu! — Chiara berrou ainda mais. — Cael! Nina e


Pablo estão juntos!

— Aleluia! — ouvi a voz de meu cunhado e gargalhei alto.

Pablo se levantou e veio a passos certos em minha direção. A


ligação estava no viva-voz, porém, ele parecia querer ficar colado a meu
corpo. Ele pegou a escova de minhas mãos e começou a pentear meus
cabelos, levemente.

— Mas é sério isso? — Chiara indagou, como se nem ela


acreditasse. — Digo, vocês sabem que o mundo está pegando fogo, não é?

Do lado de fora. Não digo que isso importe, mas...

— Como assim? — indaguei, sem entender nada. — Faz apenas


um dia que sumimos.

— Irmã, você leu algo que Anne Liv mandou? Ou algo que eu te
mandei? — indagou. — Aposto que não, já que só agora atendeu minha

ligação. Só mamãe que parecia tranquila demais, porque segundo ela,


sabia que você pegaria o Keanu de volta.

— Dona Clarice sabe das coisas. — comentei e ouvi o bufar de


Chiara do outro lado da linha. — Mas desembucha.

— Teve um barraco, com direito a Leonardo segurando Anne Liv


para não matar Bruna.

— O que? — foi minha vez de gritar, e Pablo ficou tenso no


mesmo instante.

— O que houve? Anne Liv está bem? — ele perguntou, e soltei o


ar que nem sabia que prendera. Se ele perguntasse sobre Bruna, acho que
socaria sua bela cara.

— Bem está, mas com mais ódio ainda. Enquanto Pablo sumia por
aí e você fez o mesmo, Anne Liv pareceu ficar possessa. Ainda mais,
porque Heitor jogou a verdade para ela. Aí já viu... Nunca vi Anne tão
brava em toda minha vida. E olha que ela já foi minha chefe.

— Puta que pariu. — soltei de vez, e Pablo deu um beijo em meu

ombro, entregando-me a escova de cabelo.

— Vou ligar para Anne. — sussurrou. Apenas assenti e ele se


afastou, indo até o criado-mudo para pegar seu celular.

— Mas sério, Chia... — peguei o meu em mãos e tirei do viva-voz.

— Desculpe o sumiço, mas... Precisávamos disso.

— Não sei como se encontraram, mas a história de vocês daria um


ótimo livro.

— Vai me dizer o que? Que tem até um título, maninha? —


perguntei e ela gargalhou. Sabia que a resposta era positiva. —
Desembucha.

— O nosso fim. — comentou e paralisei, sabendo que fazia todo o


sentido. — Aliás, acho que combina muito.

— A gente chegou ao fim, mas para conseguirmos recomeçar. —


confessei e era bom poder falar abertamente com ela. Sentia-me mais leve.

— Isso sim vale a pena. Fico tão feliz por você, que poderia
explodir.

— Não fale besteiras, carinho. — a voz preocupada de Cael soou e


acabei gargalhando.
— E eu por você. Mesmo não gostando dos seus romances clichês
e os amores impossíveis, hoje eu entendo.

— Hoje você sente, Nina. Aposto que sempre sentiu.

— Culpe Pablo Marini e sua perfeição. — falei, encarando meu


reflexo. Os cabelos loiros pareciam um pouco desbotados, mesmos sendo
naturais. O que me dava uma vaga ideia do que finalmente mudar. —

Aliás, preciso da sua ajuda para algo. Um dia no salão.

— O que vai aprontar? — indagou.

— Vou mudar de um dia pro outro, assim como minha vida fez.
Sempre quis ser ruiva.

— Não! — praticamente gritou e tive que gargalhar.

— Sim, senhorita. Vou me livrar desse cabelo virgem. Vamos tacar


tinta e é isso!

— Vai ficar perfeita e a cara da viúva negra. — sorri de sua

comparação. Chiara era mais maluca do que eu naquele quesito.

— Pare de viajar! Só porque conseguiu seu Tony Stark. —


provoquei, pois aquele era o apelido que colocara em Cael. Os dois tinham
uma história e tanto. — Eu estou bem sendo apenas Nina, e com meu
Keanu.

— Nunca mais consegui olhar para Pablo de outra forma. —


gargalhou baixinho. — Vocês são perfeitos. Como nunca relacionei ele a

você?

— Porque ainda não era pra ser.

Pablo estava de costas, quando me virei. Ele falava baixo ao


telefone, e sabia que estava preocupado com Anne Liv. Naquele momento,
senti-me culpada por simplesmente termos sumido. Estávamos tão focados

em nós, que ignoramos todo o resto.

— Vou me vestir e ler suas mensagens, ok?

— Venha me ver, e sem desculpas.

— Ok mandona. Eu te amo.

— Eu também, viúva negra.

Desfiz a ligação e deixei o celular sobre a cama. Dei a volta na


mesma e parei ao lado de Pablo, que parecia ouvir um discurso de Anne
Liv.

— Ei, Anne! — ele falou de repente, como se cortando o assunto.


— Nina está aqui, e não sentimos muito pelo sumiço. Prometo que
conversamos sobre isso depois. Mas por favor, pare de entrar em brigas.

Ele ouviu mais um pouco e acabou sorrindo, seja lá do que fosse.

— Eu também te amo, pequena. Prometo te mandar mensagem. —


ficou em silêncio, e sorriu de novo. — Até mais.
Tirou o celular da orelha e jogou contra a cama.

— Muito sério? — indaguei e ele negou.

— Só que sei que Anne Liv faz artes marciais. Tenho medo de ela
perder a cabeça e fazer alguma merda.

— A tal Bruna foi uma vaca, e não tem como negar isso. Mentir
dessa forma... Aliás, preciso te perguntar algo.

— Diga. — falou despreocupado.

— Será que ela está mesmo grávida?

Pablo pareceu pensar sobre e deu de ombros.

— A barriga cresceu, mas bem pouco e ela até agora conseguiu


disfarçar com roupas. Não sei se por conta de Bruna ser muito magra e
enfim... Nas consultas que estive, a médica pareceu muito honesta. Acho
que ela não chegaria a tal ponto. — assenti, e ele deu de ombros.

— Isso não mexe com você? — indaguei por fim, finalmente


chegando aquela questão.

— De não ser o pai? — perguntou e concordei com a cabeça. —


Muitas vezes me culpei por não sentir a ligação que achava que deveria ter
com o filho que ela esperava. Que no caso, acreditava ser nosso. Hoje, eu
entendo. Talvez, uma parte de mim, se negasse a acreditar e apenas
aceitava.
— E essa parte estava certa, no fim das contas. — soltei por fim, e
ele assentiu. — Não desconfiou de nada? Desde que ela falou sobre até o

casamento? — perguntei perplexa.

— Nunca imaginei que alguém me usaria dessa forma, ainda mais,


por conhecer Bruna há muitos anos. Parece coisa de novela mexicana,
como você mesma disse.

— Pois é. — respirei profundamente. — Anne Liv deve ter


pensado isso.

— Talvez, mas melhor não causar algo contra outra pessoa. No


fim, estou com a mulher que eu amo e não me importo com mais nada.

— Ah é? — subi em seu colo, passando as mãos por seu pescoço.


— E quem seria a sortuda?

— Uma loira linda, que ouvi dizer que ficará ruiva em breve.

Sorri amplamente.

— Gostei dela, não sei porque.

— Não tanto quanto eu.

Sua boca veio em direção a minha, e não pude negar. Jamais


negaria, na realidade. O mundo poderia pegar fogo. O que importava
éramos nós. Pela primeira vez em todo aquele tempo, éramos a prioridade
um do outro. O mundo que esperasse. Nós merecíamos aquilo.
Merecíamos recomeçar.
Epílogo
somos o que há de melhor, somos o que dá pra fazer

o que não dá pra evitar e não se pode escolher[17]

Meses depois...

Era um dia de chuva. O mundo literalmente caía do lado de fora do


apartamento onde Pablo e Nina resolveram dividir seu dia a dia. Assim
como, seguiram em frente lado a lado. Tudo parecia se encaminhar e

mostrar que era o momento certo. Nina até mesmo pensou que seria
complicado ficar longe de sua mãe, depois de tantos anos juntas. Até
mesmo, cogitou a possibilidade de que ela se mudasse para o apartamento
com eles.

Pablo concordara de imediato, pois Clarice o recebera de braços


abertos e o defendia com unhas e dentes de qualquer coisa que Nina
acusasse. Porém, Clarice for irredutível em querer seguir em frente com a
ideia de abrir uma filial de sua padaria na grande cidade. Algo que ela e

Nina estudavam há um longo tempo. Ficaria na mão de sua filha mais

velha, assim como, ela teria mais um motivo para ir à cidade. Além de
claro, as gêmeas de Chiara, que enrolavam todos em seus dedinhos,

mesmo com apenas alguns meses de vida.

Ainda estavam em obras e demoraria para que tudo se

concretizasse. Contudo, Nina ainda se via dividida entre as duas cidades, e


em ambas, enxergava seu lar. Pablo a compreendia em muitas partes, e
admirava a forte relação dela com a mãe. Assim como, passou a se sentir
parte daquela família, da forma como Nina já era uma parte da sua.
Naquele exato instante, Nina sorriu para o homem à sua frente. O
apartamento antes branco, se tornava vivo com as cores que ambos
escolheram.

Estavam a cerca de cinco meses juntos, desde o dia em que

realmente voltaram a se entregar. Nina o surpreendeu por completo. Ela


tinha sido clara sobre o casamento e que faria aquilo por ser importante
para ele, contudo, Pablo nunca imaginou que encontraria a mulher que
amava de joelhos na cama onde passavam horas se amando ou
simplesmente cuidando um do outro.

Um dia comum se tornara único. A resposta dele era óbvia,


contudo, castigou Nina naquele momento. Dizendo-lhe não de primeiro.
— Não? — Nina vestia-se normalmente, como se quisesse que
aquele momento fosse único pelo pedido, não pelo glamour. Pablo

assentiu, e ela permaneceu ajoelhada, com a caixinha que guardava a


aliança aberta. — Então sim? — Ela provocara e ele não conseguiu manter
a pose.

Sabia bem porque ela fazia tal coisa. O pedido de casamento que

ele fizera, marcara ambos de uma forma sem igual. Nina ainda se culpava
pela forma como o tratara, mesmo que a resposta fosse negativa. Pablo a
perdoara, mas sabia que ela não o fizera consigo mesma. Ela não admitia,
mas ele teve aquilo claro, ao vê-la ali.

Ele pegou a caixinha de suas mãos e a colocou sobre a cama. Nina


o encarou em expectativa e sentia seu coração bater freneticamente. Ao
fundo, tocava 3x4, uma das músicas favoritas de ambos, e que os definia
por completo. Ela queria que tudo fosse perfeito, da forma que não fora há

mais de dez anos. Era algo que queria melhorar na memória dele, assim
como, diminuir sua culpa. Queria marcar aquele homem apenas com amor.

— O que vivemos faz parte de nós. — Pablo falou e tocou seu


rosto com ambas as mãos. — Doeu, mas foi necessário. Só guardo o
melhor da gente, Nina. E pode ter certeza que vou guardar esse momento
para sempre.

— Então vamos nos casar, playboy? — Ela indagara, já se sentindo


mais leve. Temia que parecesse algo forçado ou que ele não captasse o que

ela realmente queria dizer.

De repente, uma bola de pelos pulou sobre ambos e a resposta de


Pablo fora guardada. Mufasa que deveria ser um gato, mas era um
cachorro vira-lata, que Nina vira perto do prédio e se apaixonou completo.
Assim como Jade, que com toda certeza, deveria estar dormindo debaixo

de algum móvel, que era seu ponto favorito. Os dois se tornaram uma parte
da alegria do casal. Trazendo ainda mais sentido para o que faziam.

— Mufasa! — ela ralhou, e sorriu para o cachorro de cor caramelo


que lambia seu rosto. — Me deixa pedir o seu pai em casamento. Se não,
vou te usar, assim como, usam o Noctis!

Pablo gargalhou, porque Nina parecia conseguir falar com os


cachorros de forma que se acalmavam de imediato. Fora o que Mufasa
fizera, deitou-se ao lado dela e de repente, apenas ficou os encarando com

os olhos pidões.

— Atrevido. — fez um leve carinho na cabeça do cão, que parecia


muito mais contente. — Tá vendo só! Até Mufasa ficou animado com o
pedido... — deixou as palavras morrerem, assim como, a sua coragem.

Nina estava a ponto de ter uma síncope, de tanto que imaginava o


momento e de repente, tudo parecera diferente. Contudo, ela sabia que
diferente era bom. Ao menos, poderia resultar.

— Vai se vestir de preto para mim, e ficar ainda mais sexy com

esses cabelos ruivos?

Pablo indagou e ela acabou sorrindo, sem se conter. Era a forma de


ele dizer sim, e não poderia ser menos grata. Ele a aceitava como era,
assim como, ela o fazia com ele. Entre as escolhas que tiveram e fariam,

passaram a ter um consenso – necessário e saudável para qualquer casal.

— Posso ficar sexy de cabelos brancos, daqui muitos anos.

— Imagina a nossa vida a longo prazo? — ele subiu na cama, e


Nina se jogou de costas, esperando seu corpo pairar sobre o dela.

— Nunca deixei de imaginar.

— Então, saiba que o que temos me basta. Mas admiro que fez, e
tem feito por mim. — Pablo admitiu, sorrindo de leve. — E vou aproveitar
para colocar uma pedra negra, como os meus olhos no seu dedo. Assim

como, chamar quem amamos até aqui e presenciar o momento.

— Só marcar a data, playboy.

Ela provocara, emocionada com o momento. Nunca imaginou que


poderia ser de fato especial. Contudo, entendeu a imensidão que o ato do
casamento poderia significar, quando em uma noite insone, a cerca de uma
semana, escrevera seus votos. Ela sentiu, naquele instante, que queria falar
para ele, a frente de quem eles amavam. Celebrar o momento e
compartilhar o sentimento. Não saberia explicar, mas simplesmente queria.

Assim como ele.

Eles finalmente se aceitavam.

Nina sorriu, sentindo os lábios do homem que amava sobre os seus.


Mal podia esperar para lhe confessar a imensidão que os sentimentos por

ele se tornaram para ela.

“O nosso fim era inevitável.

Soube quando olhei para seus olhos negros, enquanto amaldiçoava


tudo ao redor. Soube no momento em que te deixei infiltrar onde nenhuma
outra pessoa conseguiu. Soube quando éramos apenas conhecidos, até o
instante em que se tornou parte do meu dia. Soube quando seu abraço
virou meu aconchego e teu corpo minha morada. Soube em um segundo,
quando disse oi, assim como, disse adeus. Soube no sorriso e na dor de te

deixar ir. Soube que ainda era meu, era teu, era nosso... no momento em
que te vi voar – para longe demais. Soube quando ganhei e até mesmo,
estraçalhei teu coração. Soube sem querer, sem poder, sem esperar...

O nosso fim era inevitável, assim como, nosso amor.”


Agradecimentos
Sempre acabo não sabendo o que dizer, por conta da imensidão que
me toma, no momento que finalizo um livro. Contudo, acho necessário,

dizer o meu mais sincero muito obrigado.

A Hilana Silva e Kamila Marques, por toda paciência e releituras


infinitas de capítulos mutáveis. Não sei o que seria de mim sem vocês, de
verdade. Obrigada por entenderem meu lado mais maluco, e por mais que
os personagens não fossem seus favoritos, terem me dado o Norte que
tanto precisava. De todos os livros que já estiveram comigo, esse me
marcou ainda mais. Vocês são incríveis e amadas, nunca se esqueçam.

A você que leu essa história até aqui e que de alguma forma,

conseguiu se encontrar ou se identificar com bagunça que Pablo e Nina


representam. A humanidade que eles trazem. Obrigada e espero que a
leitura tenha valido a pena.

Não se esqueça de avaliar o livro, para que possa saber o que


pensou, sentiu e o que Nina e Pablo estão passando para cada um. Isso
ajuda com que outros leitores também conheçam a história.

E caso queira conhecer algum outro romance meu, eles estão todos
disponíveis aqui: ebooks.

E a você, leitor, que me deu essa oportunidade, meu muito obrigada.

Espero que até a próxima!


Contatos da autora

E-mail - Site - Spotify

Wattpad: @AlinePadua

Instagram: @alineapadua

Facebook: Aline Pádua

Meus outros livros: aqui.


[1]Trecho da canção Só pro meu prazer do cantor brasileiro Leoni.

[2] Trecho da canção Só pro meu prazer do cantor brasileiro Leoni

[3] Trecho da canção Só pro meu prazer do cantor brasileiro Leoni

[4] Trecho da canção Só pro meu prazer do cantor brasileiro Leoni.

[5] Trecho da canção Só pro meu prazer do cantor brasileiro Leoni

[6] Trecho da canção Só pro meu prazer do cantor brasileiro Leoni

[7] Trecho da canção Só pro meu prazer do cantor brasileiro Leoni

[8] Trecho da canção Dona de Mim, da cantora brasileira Iza.

[9] Trecho da canção Só pro meu prazer do cantor brasileiro Leoni

[10] Trecho da canção Notificação preferida, da dupla sertaneja Zé Neto e


Cristiano.

[11] Trecho da canção Só pro meu prazer do cantor brasileiro Leoni

[12] Trecho da canção Refrão de bolero da banda brasileira Engenheiros do

Hawaii.

[13] Trecho da canção Refrão de bolero da banda brasileira Engenheiros do


Hawaii.

[14] Trecho da canção Refrão de bolero da banda brasileira Engenheiros do


Hawaii.
[15] Trecho da canção Refrão de bolero da banda brasileira Engenheiros do
Hawaii.

[16] Trecho da canção Refrão de bolero da banda brasileira Engenheiros do


Hawaii.

[17] Trecho da canção 3x4 da banda brasileira Engenheiros do Hawaii.

Você também pode gostar