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‘ria Fernander Sumario Introdugio Pari 1 = A MEMORIA DA VIOLENCIA NA ORALIDADE F NA BSCRITA 1. Mussol lugar da meméria fnina ¢ violéncia politica Panre 2 - GENEROS & SUBJETIVIDADE 3. Género ainda é uma categoria dul para a hist6ria oral? 4, Género, subjetividade, Europa: Uma constelagio para o futuro Parti 3 - © AMOR E A EUROPA 5, “Te amo mais que a minha nacionalidade” 6. “Notre mére l'Europe”: Giorgina Levi e Heinz Arian Referéncias 107 137 173 21 Parte 2 GENEROS E SUBJETIVIDADE 3 Género ainda é uma categoria til para a hist6ria oral? (asi tie colocando em questio a equivaléncia entre a storia de género e a historia das mulheres. Para algumas toriadoras nfo hi muita di centre as duass para outras, porém, a diferenga é bem grand meio termo, Lynn Hunt observou que a historia de gnero nio teria se desenvol- vido sem 0 florescimento da histéria das mulheres nos anos 1970 © 1980. Ainda que se} que “género” & uma categ relacional que “mulheres”, foi a historia das mulheres que levantou a questio da natureza relacional das identidades (obviamente no inventou tal conceito, que jé era crucial para o marxismo). Nio obs- storia de género esteja aqui para ficar”, "que produziu mas também pela relevancia das suas discusses a respeito do futuro da profissio histérica como um todo, “o gene- ro como categoria deve ser constantemente desconstrufdo” (Hunt, 1998, p. 59). ‘O titulo deste artigo retoma o conhecido ensaio de Joan Scott, Gender: A usefiel eategory of historical analysis, que foi traduzido para ‘muitas linguas e influenciou profundamente os estudos de género mais cante a tem muitos paises. Ele foi originalmente apresentado no congresso Aion 8 Ica EAMoGho nens. A de- finig a as conexdes expl implicitas tre género e poder, que se constroem mutuamente: “o género é Jagdes sociais bascadas em diferengas por Scott acentuav. ficar as relagdes de poder” (1988, p. 42). Isso implicava estudar no ident nnomia guerra e, ainda m: como o valor Quando 0 ensaio de Scott foi de dos anos 1980, a historia oral de mulheres estava se desenvolven- do em paises europeus como a Franga, a Alemanha, a Trélia, os Paises Baixos, a Escandindvia e a Gri-Bretanha. No decénio entre meados dos anos 1970 e os anos 1980, muitas pesquisadoras coleraram ¢ in- terpretaram entrevistas orais nesses paises, com mulheres do campo, artesis, operatias, ¢ da classe média. O ensaio de Scott chegou no ‘momento certo: confirmava ¢ estimulava nossos esforcos de regis- tar as expressdes da identidade de género do sujeito. Reconheco ess a minha posigio na sua objecao A “tendéncia a reificar, ‘como a dimensio principal do género, o antagonismo subjetivamen- te produzido entre homens e mulheres”. Isso explica por que na mi nha primeira pesquisa baseaca em fontes orais (Passerini, 1984) eu mulheres € ramente eta homens pertencentes 3 classe opersria. Todavia, a categoria de género de forma “separatista”, no sentido de que tra- tei separadamente os relatos das mulheres e os dos homens quando abordei o problema da auroapresentagio € da identidade, colocan- T,Jodih Barker (2004 de Poguim, denuaciow 0 u 96 {Génexo AINDA E UM caTECORIA OTL PARA A STORK ORAL? nbrar ¢ de comunicar as préprias que a minha in dos conforme género se contrapse entre “espacos dis- do em questio seus modos de . ereio poder a a difereng: espacos fisicos reservados parcialmente para elas, como ocorria com 08 diélogos nos mercados e quintais. Na Teélia da primeira metade do século XX, tais espacos correspondiam por vezes a esferas publicas separadas, que induziam a uma diferenciagio das formas expressivas. ‘A troca intra e entregéneros dava origem a temas recorrentes que eres e constituiam u estruturavam as memérias orais das mi me- xursivo, Algo parecido foi observado em entre as mulheres bascas entrevis- meéria coletiva de carster di outras situagdes — por exempl tadas muitos anos depois por Carrie Hamilzon (2003). Além narragées, havia relatos d es baseados na esfera privada e in- tima, como os que diziam respeito aos modos de controle da Fertil fo que tinha uma forte ressonancia de género. “Expe ‘outra categoria contra a qual Scott (1992) nos alertou, advert nos para que nfo a ui fi e autenticidade. Uma contribuicio da historia oral de mulheres ~ 20 ‘menos em algumas das suas melhores partes - foi precisamente a de mostrar como a experiéneia é construida culturalmente. Fui levada a esta retrospectiva ~ que nao pretende ser uma re- visio, mas uma reflexio sobre a experiencia da hist6ria oral com 0 conceito de género — nao apenas pelo convite para participar desta escola de verio.’ Antes disso eu jé havia tomado esse rumo de pes- {quisa com base em dois conjuntos de reflexes: em fungio da pritica da hist6ria oral em projetos recentes, individuais e coletivos, que se referem ao género; e de uma nova intervengio de Joan Scott, Mille- sal fantasies. The future of “gender” in the 210b century (2001), que a ouvi apresentar em um encontro em Berna, Este novo ensaio ainda esti sendo discutido pelas feministas na Europa como um desafio importante para os Estudos da Mulher. Comecarei pelo segundo objeto de reflexio e depois passa- le juno de 2006 no Oral History ova York rei a0 primeiro. Scott argumenta com determinacio que “o termo ‘género’ era extremamente stil num dado momento” (p. 29), mas foi submetido a “corrupgées", nao apenas em conversas cotidianas como também em certo nimero de dos. Essa corrupcio inclu o fato de que ~ contra as melhores intengbes 0 usados como rniuitas vezes mal sucedida; que o género se tornou routine, e reforsa, lidade da oposigio homem/mulher. “Nos anos 1970 ¢ 1980 ~ 0 dpice do uso feminista do conceito de ‘género’ =o conceito teve um papel importante de um ponto de vista te6rico ico. Permitiu-nos separar a biologia da cultura (0 que pode tivo a longo prazo, mas era muito ttil naquele momento), descobrir qu ier” (Simone de Beauvoir), ¢ com- preender a mudanga nas relagdes entre 08 Sexos como um aspecto importante do processo hist6rico. Mas nos anos seguintes a ficgio despeito de diferentes contextos, ganhou espaco c 0 uso do “género” nio é mais acompanhado pela premissa de que “homem” “mulher” sio categorias que variam his- toricamente. Nos Estados Unides o género se tornou de uso corren- te, passando cotidianamente por sindnimo de mulher, de diferenga sexual, de sexo” (p. 34). Scott propée, entao, utilizar outras catego- rias, como “diferenca sexual” e “feminismo”, que em sua visio ainda jam um valor opos Embora Scott admita que possa haver diferencas em outros patses, eu reconhego que algo s proporgoes reduzidas dada a menor institucionalizagio, aconteceu em alguns paises europeus. Minha posigio, contu de restituir a0 genero o papel inovador que ele teve no passado, ov de reinventé-lo enquanto ele se “desfaz”', mais do que abandonar a palavra e 0 conceito, pois em muitas situagdes ele t te. Isso acontece nte, uma vex que eu gostari tun efeito m determinadas condig6es, {que tentareilustrar a partir daguilo que ocorteu no uso das fontes orais, Minha primeira observacio € que nos diltimos 15 anos teve lugar um processo de integragio entre a histéria oral ¢ a histéria de gender, que ten 0 sensi Berl Gésas0 nnn EU istoria oral den género. Segundo Sherna Gluck (2006), a heres influenciou profundamente a pritica da hist6ria oral como um todo. Escolhi propositalmente tomar as pesquisas que usam a oralidade m vez daquelas que 2 privilegiam en- demais. Quero lembrar que na Europa no apareceram ‘tulo como declaragio da escolha do método e das fontes utilizadas. Um dos poucos exemplos €o livro de Miren Llona (2002), Entre seforita y garconne. Historia onal de las majeresbilbainas de clase media (1919-1939) , um interes- sante trabalho baseado em cerca de 50 entrevistas, assim como em fontes de outra nature: ‘No processo de integracio entre a Histéria ¢ a histéria oral, 0 ‘g@nero teve uma funcio, mas niio como categoria central e dominan~ te. Seu papel foi aparentemente mais modesto, no sentido de que foi ‘usado em sua forma verbal, gendering, que se poderia traduzir como Sgenderizar’ ito 6, como uma operagio para modificar ou redefinit as abordagens historicas existentes. Assim, em muitos casos, a his- toria oral contribuiu fortemente com os esforgos de “genderizar” a Histéria. Darei alguns exemplos, dentre as pesquisas com que tive contato, considerando um amplo leque tematico. Francoise Picq (1993), na reconstrugto da histéria do feminismo francés dos anos 1970, baseou-se nas respostas & sua investigagio oral ¢ nas lembran- cas informais das protagonistas, partic ciar conflitos entre os grupos. Ritu Menon ¢ Kamla Bhasin (1998) niio conseguiriam escrever a trigi eres durante 2 separacio entre a india e o Paqu sequéncias que elas sofreram em fungio do conflito entre hindus fe muculmanos, sem as rentes, Andr etd (2003), estud: periodo 1945-1951, recorreu aos relatos de vi itos, para idade politica das mulheres no movimento 6 sucesso de Tina Campt (2004) na ‘cidas dos alemies negros durantes 0 no as suas entrevistas com os sobrev ade redescoberta das histérias es ‘Terceiro Reich, deve mui ventes. Em todos esses exemplos, ¢ em tantos outros, a hist ganero ¢ a hist6ria oral caminharam de mios dadas na ampliagio do territrio da Historia e na renovacio de seus objetos ¢ métodos de estudo. 99 Estas narragdes histéricas ndo apenas colocam em evidén- cia problemas e aspectos que outras fontes nio evidenciam, como © papel das emocdes no crazamento entte piblico e privado, mas também contém siléncios problemiticos, que indicam as tensoes centre a subje ssquisa histérica. Minha objecio aos tos citados e a outros parecidos ~ excecio feita ao trabalho de Tina Campt - diz respeito & falta de acuricia ¢ de atengio filolégica no que quase sempre sio simplesmente fundidas jo, sem citages precisas, sem indicacSes dos arquivos onde estejam acessiveis, sem referéncias claras aos narradores, cujos no- mes sio geralmente encobertos por pseudénimos - algo totalmente ‘mas que se torna pouco significativo sem o acrésci- formagées sobre suas vidas. Em outras palavras, 0 processo de integragio entre a hist6ria oral ¢ a histéria de género nao levou em oral. ‘O esforco de genderizar campos de pesquisa inteiros, ao qual historia oral deu contribuigdes notaveis, € particularmente relevante hho que concerne aos estudos sobre migragoes, Tendo eu mesma me envolvido recentemente neste campo, sou grata as estudiosas que foram pioneiras 20 se perguntar de que modo as mulheres poderiam ser consideradas sujeitos de migracio plenos, e ndo simplesmente se~ guidoras ou recipientes. Refiro-me a estudiosas como Ann Phoenix (1995), Anne-Maria Fortier (2000) € Ruba Salih (2003), que entre- yistaram mulheres mig segunda geragio) e base- fram novas conceituagdes de formas de pertencimento hibrido nas narragées, respectivamente, de jovens londrinos negros, brancos ¢ ‘anos na Gra-Betanha; e de mulheres mar- ‘roquinas em Emilia Romagna, Dessas pesquisas emerge claramente a ambi: seca da categoria de género; a mesmo tempo © género se confirma como uma via crucial para as hibridagdes que tornam a integragio possivel ¢ transformam as culturas. Ann Phoe- nix descobriu que, de um lado, havia relativamente poucas diferengas agio por parte dos joven: testemunhos das mulheres jovens confirmavam vas de raca e seu papel de “g de duplo pertencimento através da anélise dos relatos das mulheres 0 da cu uma técnica originariamente antropol6gica. E impre: lidade dessa aproximagao, seja em modificar 4 subjetividade de quem pesquisa, seja em produzir novos conceitos. Fortier escreve sobre 0 processo de “sexualizar o pertencimento ét- nico” e sustenta que 0 “proceso duplo de sexualizagao/etnicizagio ide mim mesma entrou na pesquisa geacas d intersecgio de géncro & einicidade”. E continua: “atravessando o limiar entre identidade ¢ nga, precisel negociar permanentemente uma posicdo interme ‘em relacio as pessoas com quem eu interagia”, de modo que, lade de mulher solteira nativa do Quebec, experimentava na qu tanto o pertencimento quanto o nfo pertencimento, O que nos in- teressa especialmente é que, com base em sua coleta de entrevistas, Fortier problematiza o papel do género na cultura dos emigrados jtalianos, que “resulta da construcio de pertencimentos a0 mesmo tempo éinicos, raciais e sexuais, na qual 0 género age como prin- ante”. Ainda que a presenca italiana na Gra-Bretanha deva ser lida em parte como um desafio as concepgdes toralizantes de whiteness (branguitude), cla tende a restabelecer a equagio entre b italiano, 0 curopeu ¢ o branco. A integridade cultural se configura tem narragdes sobre os papéis de género e sobre os corpos de homens te mulheres, que sio “separados e ligados”, para citar Maria de Mat- co Torgovnilk, uma das mulheres entrevistadas por Fortier (2000, p. 170). Nesse caso, as fontes orais expressam plenamente a ambi Iéncia do papel de género em um sistema complexo de opressio, no qual o género, longe de ser simplesmente uma categoria que regula ‘beragio, parece muito mais a base tanto de ser oprimido como de ~ contribuir para a opressio dos outros. Em outras palavras, © proces so de hibridagio (em curso no mundo, em ni ‘pode ser expresso por uma Ginica categoria privil Se esta for ampla como 0 genero, mas apenas por combinagées de categorias da diferenca tais como género, geracio, corpo ¢ cor do corpo, pertencimento cultural religioso. © estimulante esforgo de Fortier em questionar o papel do gé- nero, mais do que em dar respostas wa i minha segunda observacio. Outra mudanga para a qual a histéria oral contribuiv foi I ¢ local) nio nem mesmo mudangas no decénio entre 1996 e 2005, em sua nova i reedigio da coletinea que ela, Paul ‘Thompson ¢ eu orga sobre Gender and memory: “Hoje em dia, muitos historiadores orais cestio mais fascinados pela relagio de género com outras catego ‘como a classe, a raga, o nacional co transnacional, do que pelo género separadamente” (Leydesdorti, 2005, p. VII). Na nossa introdugio de 1996 (Leydesdorif, Passerini & Thompson, 1996), haviamos res- apenas a importincia da interdependéncia de género ou teragio entre mulheres e homens (por exemplo, nos ensaios de sobre as mulheres chinesas, de Judith Modell e John mbrangas de mulheres australianas sobre a Se- gunda Guerra Mundial, e de Gwyn Daniel e Paul Thompson sobre as embrangas dos enteados), mas também a importincia de combinar ginero e geragio, como fez. Adriana Piscitelli a respeito dos traba- thadores das plantagdes de café brasileiras. Aquela altura, contudo, ainda prevalecia a novidade do uso do género como categoria. Estée vamos cientes do perigo de essencializar a meméria de género, mas ainda nfo nos era clara a complexidade necessdria para evitar tal es- izacio. Também partilhivamos de algum modo 0 “pressupos- to ingénuo de que o género unia as mulheres com mais forca do que a raga ea classe tinham para dividi-las” (Gluck & Patai, 1991, p.2). ‘Nos dez anos seguintes nao se passou simplesmente de um mais baixo a um mais alto, mas mudaram, princip. assunto de vanguarda: outros assuintos, como o transnacion: ¢ outras fontes, como o cinema ¢ as m{dias, tomaram seus lugares, sendo a0 mesmo tempo mais problemiticas e sugestivas, O desen- volvimento dos Estudos Culturais, p6s-coloniais e da didspora~ em conexio com um deslocamento da ordem do mundo e com a emer- géncia de novos movimentos globais — foi crucial nesta mudanca. Muitas outras novidades apareceram, eas coisas que erm nov passado recente tiveram que lidar com tais novidades. ‘A década seguinte trouxe nio apenas atengio as categorias mencionadas por Leydes pum ais a outra categoria: a idade, Nao s6 a geracio: a idade e 0 envelhecimento. Até para mim & surpreendente que eu mesma, assim como muitos outros historiado~ res orais, que nunca, nas centenas de entrevistas com pessoas idosas, 102 em situagdes muito diferentes (classes trabalhacloras, camponeses ¢ intelectuais), tenhamos tematizado 0 envelhecimento, ¢ que nunca tenhamos buscado compreender plenamente o impacto de ser velho nas formas expressivas da lembranga. Dado que a entrevista of 6 ‘uma construgio intersubjet ncia de quem entrevista ¢ respeito da propria diferenca — isto é, seu pertencimento de genetos jdade, raga ¢ cultura ~é crucial, pois contribu com tal construcio. Nio € que os dois sujeitos devam convergir sobre as mesmas po- + estabelecer uma cumplicidade. Ao contririo, Creio que esta correto o que Nuto Revelli cbservou a pro- pésito das mulheres camponesas entrevistadas por cle: que falavatn com ele de uma maneira mais sincera ¢ aberta, como nao teriam feito com outras mulheres, pois o consideravam um homem sabio ¢ digno de confianca. Trata-se muito mais de uma questio de uma escolha inconsciente de temas pata entrevistar ¢ interpretar, No caso das entrevistas coletadas para Torino operaia ¢ fascis- mo, eu tinha consciéncia do fato de que minha idade era diferente da dos entrevistados, assim como a classe e, algumas vezes, 0 genero ¢ 2 posicéo politica. Mas eu no havia tematizado a especifcidade dos vinculos entre a meméria ¢ o processo de envelhecimento ¢ @ consciéncia da idade; e, consequentemente, mesmo se os entrevista a consi dos tivessem dado sinais nesta directo, eu nio saberia ter aproveita~ dio, Agora que inicici wm novo projeto sobre o envelhecimento em Pismente, vejo que posso aproveitar na pesquisa muito pouco do do anteriormente, salvo para buscar 0 que esti total- mente implicito. Gostaria de mencionar apenas dois exemplos de hos interessantes feitos na Ttélia: a pesquisa de Isabella Paolet~ ti (1998), que contribuin para o duplo esforgo de genderizar a idade dar uma dimensio de idade a0 género (gendering age and aging gender) entrevistando tanto mulheres idosas como seus cuidadores, sando o8 efeitos da relacio entre cles; e uma extraordinéria fs de mulheres idosas que vivem so- e anal reunidio de 142 Fie projetm prod 1 290 anos, vindos de eeadas, de migeagbes ds 103 Awes me rotten EEstoG40 zinhas na pobreza, coletadas em Milio com o patrocinio do servigo (Buzzi-Donato, 1992). ma observagio sobre o uso do oral — e na Histéri enero na histéria ~ exige uma comp! . Sabemos que a histéria oral de homens ¢ da masculinidade pode nos ajudar muito nessa direcio. Além do estudo Jembro-me de um ourro sobre 18), que se ocupa dos homens exatamente sob esse ponto de vista (Hagstrém, 1996). Mas nao me parece que cairean mu tos trabalhos sobre a mascul Por outro cas, também com fontes o histéria oral uma falea de integragio entre as catego como se fosse mais fécil estudar o “desvio” ou a diferenga do que heterossexualidade foi hi historiadores da homossexualidad it jossex' lade, ¢ que as histrias da branquitu- de, da masculinidade e da heverossexualidade se darinfolwron te paradamente, de modo que os historiadores da whiteness prestaram pouca atengio ist6ria da masculinidade ‘Nos tiltimos anos, por estar envolvida em um projeto com esta idade, me dei conta pessoalmente da dificuldade de construir tama parte importante da hist6ria de género na Idlia—a bistéria das Lésbicas - usando fontes orais, Uma reuniio muito interessante de entrevistas de vida, que a entrevistadora-autora me enviow para um parecer hi alguns anos, aunes foi publicada, nfo obstante meus es~ timulos e o interesse do editor, porque as mulheres entrevistadas se n a conceder suas autorizagées. Um outro projeto acabou de organizada por Nerina Millesti e por mim (2007). Ga- briella Romano entrevistow algumas lésbicas a oe rape: de repressao sob o regime fascista e utiizou material oral para realizar zanto um documentirio quanto o ensaio inclufdo na coletinea. Elena Bingni entrevistou outras lésbicas sobre suas experiéncias no mesmo periodo e nos anos 1940, durante a guerra e o pés-guerta, com es- pecial atenefo aos ambiente rurais. O trabalho delas mostra que 0 vvinculo entre experimentar relagdes amorosas entre mulheres, de um 104 Gaxeno anon & usa cot lado, € identidade Iésbica, do outro, especialmente no ambiente ru- ral nio pode ser dado como certo. Trara-se sobrerudo de uma ques res com alto nivel de consci- tio de linguagem; até mesmo as r nea declaram nunea terem ouvido os termos usados normalmente para defini as rlagbes lsbicas, Essa aritude pode ter sido ums > rare de mentite resisti 3 inguisigio fascista, mas também um modo diferente de encarar a si mesmas. Além disso, ruldade na coleta deste tipo de testemunho com mulheres da Re sjsténcia antifascista (o pertencimento ao comunismo ¢, em geral, & tesquerda tradicional, tom um papel determinante nesse preconceito). E ug entrevistas parecem confirmar a afirmacio feita por estudiosas \ésbieas italianas, de que a categoria “mulher” nfo é suficiente como descrigio de género da identidade ¢ da experiéncia delas Uma dltima consideragio nesse ambito. Fui tocada recente- mente pelas esti histéria oral pode tra~ zer ao estudo dos m M (2004), pesquisador na London Scholl of Economies, entrevistoua baneses erabalhadores do sexo na Gréci sobre a ideia que cles tam de masculinidade e sobre suas estraté : Ds pesquisa emergiu uma forte problematizagio do conceito de sé nero, embora nio sejam tratadas todas as suas possfveis implicagdes. De acordo com 0s res insisténcia no conceito tradi- ‘onal de masculinidade respeitével inclui contfmuas negociagoes ma ‘dre nos comportamentos dos homens entrevistados, incluindo-se i tciate de explorar jovens prostivuras de seu pats de origem ¢ do pais hospedeiro. © resultado & uma mescla de diversas idencidades qe genero no individuo e no casil que se combinam com diversos graus de agenciamento e de instrumentalizagio reciproca; as rela- foes de genero, nesse c3s0, incluem a eroca de papéls, o abuso, 2 Sependéncia e 6 romantismo, Para usar os termos de Judith Butls, ee como certo que “género” signifique exclusivamente a matriz do feminino” e do “masculino” equivale a perder de vista exatamente o ponto eritico: de que existem aspectos importantes das relagdes de género e de suas dindmicas que nio cabem na dicoromia femining- aeracculino, a instancia mais normativa do género na sociedad Te spectos também contribuem para a consolidagio das relagbes de poder e, pr isso, devem ser levados em considerasio (2004p. #2)- Pare eoncluir, ainda estou convencida de que existem formas fencontrovese grande 105 expressivas marcadas pelo género, bem como aquisigSes feminists que podem ser utilizadas na entrevista, tanto por mulheres quanto por homens, como as evidenciadas por Ely & McCabe (2005), por ‘Anderson & Jack (1991), ou por Pristina Minister (1991). Mas, ho} devemos ir além. Entio, eu gostaria de dar 3 questio colocada em meu titulo as seguintes respostas. Sim, o género ainda pode ser uma caso, juntamente com a conscincia de seus usos corrompidos (no sentido da reificagio e separagio da categoria stil para a hist ia oF jicados por Scott, adotemos um: c “ses”: ~ seo género for tr: que per mite desvendar formas de relagdes entre mulheres, entre homens, € ‘entre mulheres e homens; seo como classe, idade, cultura ¢ religiio, mas tendo em mente que a simultaneidade de ais eategorias n sistema de equivaléncias; = se 0 proprio género for pluralizado, abrigando a multiplicida- de das opgbes sexuais identitarias em todo © leque hetero e homos- incluindo-se as definicoes GLBT. Estes “ses” devem ser colocados em pritica no interior da es- pecificidade do Ambito disciplinar. No caso da hist6ria oral, pode-se fazer a historia de um pequeno grupo de mulheres ow até mesmo de ma ti 1er, se ela for inserida nos contextos definidos pe- las condigées enunciadas, A natureza intersubjetiva da hist6ria oral equer que estas condig6es sejam levadas em conta por aquele que devidamente traduzidas na lingua partilhada pelos en- trevistados, levando em conta que o pertencimento de género pode car coisas completamente diferentes para dois sujeitos envol- idos na entrevista, mesmo se tratando de duas mulheres. Isso per- je eseapar tanto a postura exotizante como 3 de cumplicidade em Jago a quem esti sendo entrevistado. nero for combinado a outras categorias de diferenca, deve ser interpretada como um on sgenere €anco- a una categoria utile per a storia orale?”. Quaderno di storia contemporanea, n. 40, 2006. p. 9-24. _ Botia stimttesporanen, m0 2 Pe Genero, subjetividade, Europa: Uma constelacao para o futuro “Atos de intersubjetividade [A pesquisa que deu otigem 20 liveo Women migrants from East to West: Gender, mobility and belonging in contemporary Europe (Mu- Theres migrantes do Leste para 0 Oeste: Genero, mobilidade ¢ per teacimento na Europa contemporinea) baseia-se na conviegio de que novas formas de subjetvidade europein se rormaram pos sgragas aos movimentos de povos migrantes € 3s suas conexdes com povos nativos, termos que rentado problematizar, Em uma perspectiva de género, a pesquisa focaizou as mulheres come sty Como essas formas de relacionamento so jeitos de tais relagdes. entes, engajei-me no esforgo de explicitar aqui- muitas vezes ambi To que pode ser promissor para o futuro da Europa nas trosas entre norar seus lados negativos ou obscures, nuas entre “nds” e “eles” ¢ diversos migrantes ¢ nativos, sem aque incluem contraposicd graus de xenofobia, Em uma pe entarei encontrar NOs NOSsOS £es dos caminhos que levam para o futuro, especialmente os €2 rersubjetividade ea interco- pectiva conscientemente ut6pica', dos as antecipagées de alguns inhos transformadores, através dos quais a eapaosi de forma met al (2004) Pas neet idade estio florescendo? Ao mesmo tempo, seria ingénuo & ilus6rio ter a expectativa de descobrir novas formas de sable xem projetadas sobre o futuro; qualquer forma jrustada pelos tracos FN ae ere eae is sn iecoton as novas formas de identificagio e pertencimento, com base néo na oposigfo entre ees, mas sim na abertura, na colaboragio métua e306 mesmo, na atracio. Nossa pesquisa comega de um ato de intersubjetividade direta, que gerou outros atos, assim, indiretos. O primeiro consist na de- cisio de entrevistar mulheres que foram € que séo sujeitos, no sen- fidb duplo de estarem sujetas a0s provessos econdmicos, legais e exits, como as varias formas de migragdo do Leste para o Oeste a Buropa, e de se tornarem agentes plenamente conscientes de tais processos. Tomamios essa decisio como pesquisadoras preocupadas tanto com os Estudos da Mulher como com a anilise de novas for- mas de europeidade, sendo nés mesmas provenientes de diferentes partes da Europa, Este primeiro ato intersubjetivo (que pressupunha mulheres das varias partes do continente) tem sido incorporado as entrevistas, que so em si mesmas o resultado das rlagées intersub- jetvas, Subsequentements, formas indiretas de inersubj tém sido estabelecidas através do discurso: a0 entrevistar nio ape- tiv deenaetor ull futaoe x parti do preseatee SrJo a stems de poder avrcec nova formas demain Foran e Kurs esd etre no neem ‘estado atual de } } | icamente entre esses mesmos individuos, mas 1a verdade, as mulheres que fo~ imaior parte das vezes nfo acontecem empit aque sfo reais em planos culturais, tam chamadas a representarem os ‘nativos’, na mnunea se encontraram com aquelas que representam oS ‘migrates’, so encontro cultural entre mulheres semelhantes clas conte jos os dias na Europa. Tado isso cepresenta tanto 2 forge come ® fen da pesquisa, seu carer de separagio,o que implica cla nf0 poder ser confundida com a experié De fato, um dos aspectos que consideramos da maior impor sancia nesta pesquisa €2 insisténcia nas relagdes intersubjetivas entre aetheres dos quatro paises em andlise, especialmente entre 25 dt aaeanereladas como “migrantes” eas que sfo chamadss de. “navivas? sae primeinas tendo se deslocado em um sentido literal as 68% ao Piano na tea ena Holanda, mas se envolvendo nos amplos processos de mobiidade cvlrura que reeentemente rém ocorrido na Frevopa: A intersubjedvidade, dentro de um horizonte europe, o- ier no nivel ciensifico e analitice ~ as mulheres que nasrarsy "que empreendemos esta pesquist "aire outras coisas, novas formas de jetivo de reconhecer, subjetividade de mulheres europeias. Essas novas formas devem ser vistas no contexto da corroida ito « objeto.’ Apesar de reconhecer o sentido desta corrosio, a razio de manter a distingio analitiea ent sujeito t objeto reside no fato de que els permie uma compreensso deindi- ste ade em progresso, como uma criagto continua de subjet “ade a pati da objetividade. Tss0 pode sigifiar a individuasto de som — € as vezes contra ~ Um coletivo, ou a wulos em uma nova forma de compreens casos, a objetividade é entendida ar ng forma de intersubjetividade, da qual derivam a individuacto ¢ a subj ‘Nessa perspectiva, as areas designadas como perten~ asavces ao tanto” € a0 “objet0” estio conectadas osmoricamerte go longo de um continrsums © posicionamento em um dos dois campos pode ser transmutado pa jonamento no outro, fronteira entre su uma pessoa em contato 6! sransformacio dos of do mundo e de si mesma. Nos iwaci em contato com as narragdes das a. Mas agora, antes as vozes do presente, queremos nos voltar idade, com mulheres do passado nasi S como curo~ de ouvirmos com atei fa forma de intersubj “Mies da Europa” Este titulo tem duas rafzes: a polémica contra a énfase exclusiva nos “pais da Europa” (isto é, os homens que vislumbraram uma Eu- ropa unida no passado c/ou empreenderam a criagio da comunidade ‘europeia apés a Segunda Guerra Mundial), e um sentido mais geral de defesa, que vem A tona mesmo em nossas entrevistas. Depois de Poly ~a mulher bilgara que & perguna “E voeé se sente europeta? respondeu “Eu sinto, sim, que sou uma ancestral feminina da pri ra civilizagZo europeia” ~ perguntamos a nés mesmos quem nossas ancestrais femininas so. Ainda hé muita pesquisa a ser feita sobre as ‘muitas mulheres que prefiguraram uma Europa unida, lutando como feministas e pacifistas deste a década de 1860.* Ao mesmo tempo, {0 queremos simplesmente aceitar qualquer Europa unida e nem mesmo a Europa unida cm sua forma atual, mas sim criticar ¢ in- fluenciar 0 processo de construcio da Europa em terrenos culeuras. ‘os exemplos de mulheres que acrescentaram suas préprias di- mensdes culturais a um entendimento de si mesmas como europcias pode ser particularmente valioso, ‘A. dimensio histérica oferece mais significado a0 conecito de constelacio", que é central para minha abordagem, isto é para pacifstas eeuropel jeme, Bite as publiagbesrecentes, ver Psa (2003) ssclarecim ividade gendevinads is ee tem avant ‘Europa ata no © ageupamento de urés conceitos: género, subj ‘Adotei 0 termo “constelacio” porque creio que esta conexo trian lectual, entre conceitos ¢ ideias, mas ca ¢ emocional, e portanto parcial inconsciente ¢ semiconsciente ~ uma caracterfstica coerente com 2 ‘A constelagio é caracterizada pela de modo que seus tr€s elementos precisam ser consi sum dos trés ppossa agir como motor (o qe hoje em dia pode muito bem ser 0 caso do género). A ideia de constelagio traduz.a simples frase “ser mulher/homem na Europa” ¢ sua designagio de um estado de mu- danga, A constelagio sempre esteve ativa, mas agora encontracse em ento acelerado, embora nem sempre imediatamente vish O significado de “mulher” est mudando, o significado de “Europa” est mudando, 0 significado de “ser” ou de se tornar sujeito também esté mudando, Existe um movimento em cada um desses trés er- ‘mos, mas existe também uma mudanga concomitante de todos les, za qual os termos se move da mesma forma, como a configura- gio das estrelas a0 longo das eras: mudando seus lugares em relaci uumas 4s outras, mudando sua localizagio no espago mais amplo. As mudangas da constelacio, no passado, langaram luzes sobre as mu- dangas no presente e Ihes deram significado. E por isso que optamos por estudar um grupo particular de mu- theres europeias e europeistas, Femmes pour l’Exrope’, que foi crindo ‘ementor: 0 aspecto emocioaal (fi que © a tutopesnio sedi sem 38 emog6es) C0 carer reuropeus” de que sent pensar ow declan ose bens ma Europa mais do que em qualqeer outro rau de interconectsidad, amo 27. Este capitulo antcipa rest TEnrope e de Ursula Hirsch fem Broxeis © nos aa aadas ox documento fede entrevistas que Dawa fez com 19 de abil de 2003, em Roma) e Jacqueline de Gi bem como den ‘Edoaedo Paol minha pro a, pos eolabora om, Frusta Deshormes ‘Se dezombro de 202: ‘em Bruselas, em 1975, por Ursula Hischmann’, reunindo um con- junto de mutheres que partilhavam a mesma intuigio de que a mu- ther era digna de interesse na Europa. O grupo foi composto majo~ ritariamente pelas esposas de burocratas europeus, ¢ a como-a propria Hirschmann, se sentiam infelizes ou desconfortiv no papel d fora militante, enquanto ‘ouutras estiveram engajadas na politica em diferentes niveis, Assim, tum dos estimulos para a criagio do grupo foi a percepgio de uma tensio entre 0 privado e o piiblico. Em 1976, o grupo organizou uma reuniio sobre a construgio da Europa e sua rel com as mulheres, ¢ uma das integrantes, Gausta Deshormes, passou a supervisionar a produgio de um jornal, Ferimes d’Europe, com a Comissio Euro- pela. Uma premiagio também foi criada e destinada a reconhecer as vies da Europa”, em vez de destinar todo o destaque ~ como ainda hhoje muitas vezes se faz ~ aos “pais” fundadores. O que parece m: interessante em nossa perspectiva é que algumas das mulheres que participaram deste grupo definiam a si mesmas como “fertmes”, no sentide lente que o termo tem em francés, indicando nio ape~ nas mulheres mas também esposas. Foi com base nas suas condigdes = como esposas de homens engajados politicamente nas relagbes eu- ropeias ~ que algumas delas decidiram explicitar seus pontos de vista enquanto mulheres europeias. Em outras palavras, elas agiram clara~ ‘mente com base no género, fazendo da propria condigio de género 0 ponto de partida de suas reflexes (Des européennes, 1979). ‘As Femmes pour Europe se aliaram a grupos femininos con- servadores ¢ nio a grupos feministas radicais porque os primeiros estavam mais interessados na Europa do que 0s diltimos, de modo {que suas relagdes eram ou institucionais ou com grupos ¢ individu 6s situados nas franjas moderadas da nova onda feminista dos anos 1970. Em uma publicacéo dedicada a Ursula Hirschmann por suas amigas ¢ colegas, encontramos alusdes a0 eurocentrismo, o que & totalmente consistente com a época e certamente presente também no feminismo radical. A despeito de declaragbes em favor das ‘fem .0sa ~ ela que anteriorment: Gasex0, sapertupaoe, Euro mes immigrées” (roulheres imigrantes] ou das “femmes div quacrié- ‘ne monde” [mulheres do quarto mundo] ¢ da autodefinigio como “European sisters of migrant woren” [irmas europeias das mulheres smigrantes), a atitude ainda era a de dar voz. a, ou de fazer justige para, os necessitados (Des curopéennes, 1979). De qualquer forma, Essa woz que combinava europeidade e solidariedade feminina era, no ada, ¢ sua ressonsincia nos é muito 0 como mulheres hheranga das Femmes, da criticamemte. , nio e passaram a se identifiear com a Europa nas condigdes mais df Sutras agiram conscientemente como europefstas, Todas elas de Senvolveram uma identifieagio com 2 Europa fundada numa paixio profunda, que conectava 0 pessoal ¢ o politico e que sempre envolvia algum tipo de afeigio. Suas contribuigdes salientam explicitamente fo cariter genderizado de suas subje mento de subordinacio nessa questio de género, mas a natu tersubjetiva da iniciativa dessas mulheres contém aspectos p' para se resgatar ¢ aperfeicoar. Expressando a europeidade ‘Ao longo de nossas entrevistas, um sentimento de pertenga 3 Europa emergiu poucas vezes de forma espontinea, de modo que algumas vezes foi necessério revornar 3s entrevistadas a fim de obter reagdes ao assunto, Perguntas diretas, porém, trazem & tona hesita- ges ¢, até mesmo, resistencias. Como é comum em encontros orsis, ficado, pois chamam atencio nda nfo esta completamente arti- as hesitacdes ¢ resisténcias v8 para o nio dito ou para o que culado, Em primeiro lugar, elas refletem provavelmente nossa pro- incerteza na busca pelas palavras certas para expressar nossas como se nds mesmas nio estivéssemos certas do que “ser europeu” significa hoje em dia e por que razio éalgo relevante, dada quer forma, a oposto, isto certeza prontos para serem expressos. A mesma mulher bilgara que, num imeiro momento, pareceu perplexa (dizendo “Ai, meu Deus! Bom, ), quando perguntada “Voce [. ébvio que eu me sinto europeia. ). Uma outra reagiu a questo “O que indo: “Ah, voce tf me matando com essa ma vez, emergiu de sua resposts seguinte jento de pertenca a Europa (Ana, Bulgétia) imilares tiveram as mulheres hiingaras, Entretanto, respeito, devemos lembrar que nossas questdes fo~ preparagio para a adesio da Hung) tivo, inchufa-se uma pergunta sobre o ha para as entrevistadas, Apesar des- ngaras forneceram poucas respostas. Uma explicagao poss para isso € que a narrativa-matriz hiingara exalta 0 pais como um bastido da Europa contra os turcos, de modo que os hiingaros cor s de fato, Colocar esta ques pode ter eriado um curto-circuito no momento em que as narrado- tas estavam tentando compreender como lidar com a interlocutora e se a pergunta consistia em uma provocagio. Em outras palavras, uma hipétese pode ser que, precisamente em fungio de um contexto iuito carregado, sobredeterminado, as respostas nio poderiam ser faci ladas. [As entrevistas italianas’ mostram, em alguns momentos, uma incerteza ainda mais profunda: “Eu espero que exista uma Europa”, diz. Anna, que em seguida ressalta a tendéncia & em primeiro nas, ¢ também de modo mai co que emerge a partir do questiona- ugar entre diferentes regide Alfecentes, na na Gistso.s ma aceitagio de ser europ. ¢ estercotipado, como veremos. E possivel levantar a hipétese de a cautela na fala ser ditada pelo medo de dizer algo errado em relagio aos ntes ao se considerar certos europeus como pertencentes 2 categorias distintas ~ medo baseado ‘em uma espécie de consciéncia parcial a respeito do cultural e p camente correto. ‘A fala de algumas mulheres holandesas demonstra um grau mais alto de claboracio ao responder a quest6es sobre Europa europei- de. A diferenca de consciéncia entre holandesas eitalianas reflete o nivel de debates politicos e medisticos em seus respectivos paises: nna Holanda, os partidos, a imprensa ¢ a TV levantaram a questo da Europa e dos migrantes com muito mais énfase e seriedade do que na Ikélia. Mas a diferenca também pode se dever a disparidades de longo prazo, como por exemplo a diferenca entre as herangas culturais nax jonais — possivelmente tefletidas também nos sistemas educacionais =; isto é uma maior possibilidade de conjugar ser holandés com ser europe do que ocorre no caso italiano, dada a tradigio de fraque- za da identidade e da demoer ianas.!° Assim, as respostas das ‘mulheres holandesas sfo particularmente significativas quando mos- tram que elas compartitham os problemas em expressar a europelda- de: “Ev nfo digo que ‘eu sou europeia’. Eu quase nunca digo: ‘bom, feu vim da Europ’, eu digo primeiramente ‘da Holanda’, mas nfo eu- ropeia (..). Eu nio vejo ninguém 20 meu redor dizendo ‘Eu sou eu- ropeia’””. Através dessas palavras, Petra (Holanda) esti verbalizando claramente o inusual é esse tipo de verbalizagio. A dificuldade pode depender do contexto, explica Ida (Holanda), sublinhande o «: “Quando eu estive em Marrocos feu me sent uma europeia, ¢ quando cu estive na Turquia eu também me senti europeia. Mas quando estou na Espanha, me sinto norte~ -europeia; e quando estou na Bél acontece na Franga ou na Alemanha Essa pressuposigio é um dos ob: um sentido determinado mento é irocentrismo intrinseco e pel situacional e relative da quest: 2 eu sequer penso nisso, como Aeacona enrne poutrca #8t0¢K0 inclusive por se acoplar ao alicer- ce oposicional da e c, como mostra claramente esta tltima aagio e como veremos em outras situacbes. Algu mulheres ho- 4 si mesmas como “cidadis do mundo” (Norine, Holanda). " nto de pertenga transatlintico, definindo a si mesmas como “ocidentais” (Petra, Holanda). Este ultimo exem- plo resulta de um sentimento de pertenca mais amplo, enquanto em cidental” sio termos usados de forma a (Italia), Tais reagbes apontam para a natureza implicita de ser europeia, mente circulando ¢ trocando ideias na Europa muito mais do gue em qualquer outro lugar, mas sem expressar uma consciénei plena disso. A hipétese da implicicude é confirmada pela presenca simultanea da hesitagio ¢ da verbalizagio. As razées para tal impli- citude podem ser discrepantes: suspeita e vergonha (possivelmente semiconscientes) pelo que a Europa foi no passado, com sua hist de colonialismo, imperialismo, genocidio de varios tipos; mas tam- bbém diivida em relagéo 4 burocracia da Unio Europeia. E por fim, mas nio menos importante, a conf A flutuag: i € bastante difundida no d a adesio de dez paises & UE em 1° de maio de 2004, 0 presidente Ro- mano Prodi disse, durante a celebragao eslovena: “Bem vindos 4 Eu- ropa!", Nao podemos deixar de pensar que teria sido mais apropria- do dizer: “Bem vindos & Uniio Europeia”, ji que muitas das pessoas tadas nos “novos ingressando na Europa”, corrente esti presente em nossas entrev icativa conforme paises de origem Isto nao quer dizer que as narradoras nao entendama diferenga, uando a Europa é apresentada como em favor de um sentim entrea Europa ea Unio. ntrey res oportunidades para a realizagio profiss. ca claro que a referencia é 4 Unido Europeia e & possivel adesio a (Victoria, Bulgaric forme se observou em ourtas situag6es", algumas mulheres ~ espe cialmente aquelas vindas de uma longa histéria de bem estar, como es escandinavos ou de uma cradigdo socialista ~ hesitam acio que pode nio garantir suas conquistas em termos de emancipacio, Victoria (Bulgéria), por exemplo, di Jeuagio das mulheres, eu afirmei, ¢ ainda o faco, que no seu passado recente as mulheres biilgars im melhores opor- tunidades de realizagio profi légios sociais, 0 que elas se desenvolvessem profissionalmente, apesar de 0 padrio de vida geral ser m ‘como um fator de desenvolvimento muito positivo, que v xvas oportunidades adiant Jsto também pode set colocado em termos de uma desconfian-

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