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Apostila - Educacao Inclusiva e Especial - 2021
Apostila - Educacao Inclusiva e Especial - 2021
Pós-graduação
em Docência
Cláudia Maria Soares Rossi
Arcos
Instituto Federal de Minas Gerais
2020
© 2020 by Instituto Federal de Minas Gerais Campus Arcos
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reproduzida ou transmitida de qualquer modo ou por qualquer outro meio, eletrônico
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Instituto Federal de Minas Gerais Campus Arcos.
FICHA CATALOGRÁFICA
Dados Internacionais de Catalogação na Publicação (CIP)
Índice para catálogo sistemático:
1. Ensino: Educação Inclusiva
2020
Direitos exclusivos cedidos à
Instituto Federal de Minas Gerais Campus Arcos,
Avenida Juscelino Kubitschek, 485,
CEP 35588-000- Bairro Brasília, Arcos - MG - Brasil,
Telefone: (37) 3351-5173
Palavra do professor-autor
Abraços,
Cláudia Maria Soares Rossi.
Apresentação do curso
Este curso está dividido em 4 semanas, cujos tópicos são apresentados, sucintamente, a
seguir.
Os ícones são elementos gráficos para facilitar os estudos, fique atento quando eles
aparecem no texto. Veja aqui o seu significado:
Objetivos
Conhecer os processos históricos que deram origem ao
paradigma da educação inclusiva. Compreender os
fundamentos filosóficos que norteiam a educação inclusiva.
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Educação Inclusiva e Especial
acesso de muitas crianças na escola, principalmente das regiões mais pobres e no alto
índice de evasão e repetência.
O conceito de Educação Inclusiva está fundamentado nas práticas escolares que garantem
a qualidade de ensino educacional a todos os alunos, independente de suas condições,
tendo em vista o atendimento às potencialidades e necessidades de cada aluno, respeitando
as diversidades e subjetividades.
A meta deve ser o ensino “significativo” para cada aluno a fim de garantir o acesso dele ao
conjunto sistematizado de conhecimentos. Algumas categorias como iguais e diferentes,
normais e deficientes, inteligentes e com dificuldades devem ser extintas na proposta de
inclusão.
Existe uma distorção do conceito de inclusão voltada para o uso do vocábulo “integração”.
Essa integração tem o sentido de inserir os alunos com deficiências nas escolas regulares,
mas sem uma proposta pedagógica e estrutural diferenciada. E é justamente essa
indiferenciação entre o processo de integração e de inclusão escolar que, muitas vezes,
reforça atitudes baseadas no paradigma tradicional no interior da escola.
Há de se pensar numa escola que não olha as diferenças, sejam elas de raça, etnia, gênero,
classe social, condição física ou mental, mas promova a igualdade de oportunidades para
todos. Isso seria possível??? Há de se pensar... Comecemos pela luta da inclusão das
pessoas com deficiência.
A visão sobre a deficiência nem sempre foi a mesma e muda conforme a cultura, o tempo e
o espaço. A história da educação inclusiva associa-se à da Educação Especial. O processo
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Educação Inclusiva e Especial
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Educação Inclusiva e Especial
Mesmo com o avanço provocado por estas iniciativas, a deficiência ainda era vista como um
mal e a maioria era abandonada, o que os obrigava a viver de esmolas ou pequenos furtos.
No decorrer de século XIX e no início do século XX, o assistencialismo marcou o atendimento
às pessoas com deficiência. Essa assistência era dada em instituições construídas longe
das cidades, o que tornava os assistidos distantes da sociedade, sem poderem se comunicar
e sem liberdade.
A partir da segunda metade do século XIX, surgiu a preocupação com a necessidade de
atenção especializada às pessoas com deficiência, não unicamente em abrigos e hospitais.
Com as concepções pós-renascentistas e as transformações sociais que aconteceram na
Europa com a colaboração dos estudos de Esquirol, a diferenciação entre deficiência mental
e doença mental começa a surgir. Na mesma época, alguns médicos educadores como Itard,
Seguin e Maria Montessori desenvolveram pesquisas relevantes para a educação de
pessoas com deficiência.
Jean Marc Gaspard Itard, citado supra, elaborou um dos primeiros programas sistemáticos
de Educação Especial. Ele ficou conhecido por sua experiência de recuperação e tentativa
educabilidade do menino Vitor de Aveyron, o “menino selvagem”.
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Educação Inclusiva e Especial
surdez e deficiência mental foram esterilizadas em nome da raça ariana pura (GUGEL,
2018).
Com o fim da guerra iniciou-se uma conscientização sobre a necessidade de tomar medidas
para que as atrocidades cometidas em nome da guerra não mais acontecessem e começou-
se a discutir como a sociedade poderia se organizar para tratar e reabilitar as pessoas que
a guerra tornara deficientes.
Em 1945 é constituída a Organização das Nações Unidas – ONU, com a função de trabalhar
pela paz entre as nações e, em 1948, é criada a Declaração Universal dos Direitos Humanos
que faz menção expressa à pessoa com deficiência.
Este documento, de valor inestimável, motivou a melhor organização das pessoas com
deficiência, o que acabou resultando em um maior interesse na criação de novas instituições
e consolidação das já existentes, voltadas à busca de meios de concretização da inclusão
social desses indivíduos (DICHER; TREVISAM, 2018).
A Educação Inclusiva se caracteriza com uma política de justiça social que alcança alunos
com necessidades especiais, tomando-se aqui o seu conceito mais amplo (ROGALSKI,
2010).
Tendo em vista essa política de justiça social, várias lutas, organizações e leis favoráveis
aos deficientes e a educação inclusiva começaram a surgir depois da Declaração Universal
dos Direitos Humanos (1948).
Nos Estados Unidos, em 1975, é publicada a lei pública 94.142, como resultado da luta de
pais que reclamavam o acesso de seus filhos com necessidades educacionais especiais às
escolas de qualidades.
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Educação Inclusiva e Especial
A partir desse movimento americano, que incluiu outras leis, a luta pela inclusão ganha força
em todo o mundo. Tendo a UNICEF e a UNESCO como promotores, aconteceram várias
reuniões como a Conferência Mundial de Educação para Todos em Jomtiem, em 1990, na
Tailândia; a Conferência Mundial sobre Necessidades Educativas Especiais de Salamanca,
na Espanha, em 1994; o Fórum Consultivo para a Educação para Todos, em 2000, na cidade
de Dakar, em Senegal.
A Declaração de Salamanca foi a mais marcante no quadro histórico das políticas que
envolvem as questões de Educação Especial e Inclusiva. Traz em seu bojo a ideia de que
"[...] as escolas integradoras devem reconhecer as diferentes necessidades de seus alunos
e a elas atender", como também deve adaptar-se aos diferentes estilos e ritmos de
aprendizagem das crianças, assegurando a elas "[...] um ensino de qualidade por meio de
um adequado programa de estudos, de boa organização escolar, criteriosa utilização dos
recursos e entrosamento de sua comunidades" (UNESCO, 2018).
A reunião mais recente, a nível mundial, aconteceu em 2015, o Fórum Mundial de Educação,
na cidade de Incheon, na Coreia do Sul. A Declaração de Incheon foi acolhida pela
comunidade mundial de educação, incluindo ministros de governo de mais de 100 países,
organizações não governamentais e grupos de jovens. Ela incentiva os países a fornecerem
educação inclusiva, igualitária e de qualidade, além de oportunidades de aprendizagem ao
longo de toda a vida para todos.
No Brasil, a Constituição Federal de 1988, proclama o direito de todos à educação e a Lei
de Diretrizes e Bases da Educação n. 9.394/96 afirma que, além de ser direito, é um dever
do Estado e da família zelar pela mesma.
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Educação Inclusiva e Especial
Além dessas leis acima citadas, é preciso destacar o Estatuto da Criança e do Adolescente,
de 13 de julho de 1990, onde traz no artigo 55 a obrigatoriedade dos pais ou responsáveis
matricularem seus filhos na rede regular de ensino.
Outro destaque é a Lei Federal Nº 7.855, de 24 de outubro de 1989, que cria a
Coordenadoria Nacional para a Integração da Pessoa Portadora de Deficiência (CORDE),
órgão responsável pela política Nacional para a Integração de Pessoa Portadora de
Deficiência e ainda atribui competência ao Ministério Público para fiscalizar instituições e
apurar possíveis irregularidades na garantia do direito às pessoas com deficiência.
Várias são as leis que regem a educação inclusiva e especial no Brasil, sendo a mais recente
a Lei n. 13.146, de 06 de julho de 2015, que institui a Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa
com Deficiência (Estatuto da Pessoa com Deficiência).
O termo inclusão na escola parece novidade, mas não é. Na verdade a discussão em torno
da integração e inclusão tem gerado muitas discussões e polêmicas há um bom tempo no
campo educacional.
Integração e inclusão se diferenciam por expressar situações de inserção diferentes e se
fundamentarem em posicionamentos teóricos-metodológicos divergentes (MANTOAN,
2003).
Observando o caminhar histórico-cronológico, percebe-se que a integração sempre
precedeu à educação inclusiva no que diz respeito às políticas e às práticas.
O termo integração diz respeito ao processo de inserção de alunos com deficiência nas
escolas comuns. Porém, nem todos os alunos com deficiência cabem nas turmas de ensino
regular, pois, há uma seleção prévia dos que estão aptos à inserção (MANTOAN, 2003). Na
integração, a movimentação é feita pelo aluno que vai se inserindo no espaço, ele se adapta
ao meio. A integração acontece porque está no meio do grupo, porém, o processo de ensino
e de aprendizagem é fragmentado.
A integração se baseia na busca pela “normalização”, tendo como referência padrões,
requisitos, condições, deixando em segundo plano a questão da diferença.
O processo de integração ocorre dentro de uma estrutura organizacional na qual o aluno
tem a oportunidade de transitar no sistema escolar, podendo escolher entre o ensino regular
ou especial, porém essa inserção acaba sendo parcial porque o sistema prevê serviços
educacionais segregados.
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Educação Inclusiva e Especial
A real inclusão implica num esforço de reestruturação das condições atuais das escolas
brasileiras. Para que as condições excludentes nas escolas sejam eliminadas, é preciso
enfrentar muitos desafios, dentre eles:
- a recriação do modelo educativo escolar, tendo como meta real o ensino para todos,
o reconhecimento e a valorização das diferenças;
- a reorganização das escolas em seus aspectos pedagógicos e administrativos. Essa
reorganização exige a clara definição de ações no Projeto Político Pedagógico da escola.
Mudanças nos currículos, na formação de turma, nas práticas de ensino e nas formas de
avaliação fazem parte dessa reorganização;
- a recriação dos espaços educativos de trabalho escolar tendo como foco as
experiências de trabalho coletivo, em grupos pequenos e diversificados que possibilitem que
os alunos se apoiem mutuamente nas atividades de sala de aula;
- a modificação nas formas de condução da gestão escolar, de forma que diretores,
coordenadores, supervisores e funcionários se incumbam também da tarefa de educar e
participar ativamente e diretamente do que acontece nas salas de aula;
- a formação da consciência de que os alunos sempre sabem alguma coisa, de que
todo educando pode aprender, mas no tempo e do jeito que lhe é próprio;
- a eliminação do caráter classificatório de notas e de provas, substituindo pela visão
da avaliação como diagnóstico e instrumento de formação, aperfeiçoamento e de depuração
do ensino;
- a inserção responsável do professor de apoio nas escolas que tenha competência
para implementar e definir respostas educativas às necessidades educativas especiais e
que possa realmente apoiar o professor comum em todos os sentidos;
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Educação Inclusiva e Especial
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Semana 2 – O papel do professor diante das questões de identidade
Educação Inclusiva e Especial
Objetivos
Discutir as políticas de inclusão. Conhecer a Educação
Especial e suas especificidades. Ressaltar a importância da
reorganização escolar e o papel dos profissionais da
educação em relação à inclusão das pessoas com
deficiências, transtornos ou altas habilidades.
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Educação Inclusiva e Especial
Todos esses documentos, com poucas diferenças, trazem a definição de educação especial
como uma modalidade de ensino que perpassa todos os níveis, etapas e modalidades, tendo
como objetivos a disponibilização de recursos de acessibilidade, a formação de professores
e o oferecimento do AEE (Atendimento Educacional Especializado). Em especial nas
Diretrizes Nacionais para a Educação Especial na Educação Básica é citado que todos
esses recursos visam atender às necessidades educacionais específicas dos alunos com
deficiência, transtornos globais do desenvolvimento e altas habilidades/superdotação.
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Educação Inclusiva e Especial
O público-alvo da educação especial, tendo como base a legislação vigente, são os alunos
com deficiência que têm impedimentos de longo prazo, de natureza física, mental, intelectual
ou sensorial que, em interação com diversas barreiras, veem restringida sua participação
plena e efetiva na escola e na sociedade. As deficiências amparadas pela educação
especial são as seguintes:
a. Cegueira: Ausência total de visão até a perda da percepção luminosa;
b. Baixa Visão: Comprometimento do funcionamento visual de ambos os olhos, após
a melhor correção. Possui resíduos visuais que permitem a leitura de textos impressos
ampliados ou com o uso de recursos ópticos;
c. Surdocegueira: Trata-se de deficiência única, caracterizada pela deficiência
auditiva e visual concomitantemente;
d. Deficiência Auditiva: Consiste na perda bilateral, parcial ou total, de 41 dB até 70
dB, aferida por audiograma nas frequências de 500Hz, 1000Hz, 2000Hz e 3000Hz. O aluno
que apresenta uma perda leve ou moderada terá dificuldade de perceber igualmente todos
os fonemas das palavras. Poderá utilizar a língua oral, apresentando dificuldades na
articulação das palavras, na leitura e na escrita;
e. Surdez: Consiste na perda auditiva acima de 71 dB, aferida por audiograma nas
frequências de 500Hz, 1000Hz, 2000Hz e 3000Hz. O aluno que apresenta este nível de
perda auditiva não consegue entender a voz humana, bem como adquirir a língua oral. Em
geral, utiliza a Língua Brasileira de Sinais (Libras), como forma de comunicação. A língua
portuguesa será utilizada como segunda língua;
f. Deficiência Intelectual: Incapacidade caracterizada por limitações significativas no
funcionamento intelectual e no comportamento adaptativo, e está expressa nas habilidades
práticas, sociais e conceituais, originando-se antes dos dezoito anos de idade;
g. Deficiência Física: Consiste na alteração completa ou parcial de um ou mais
segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função física,
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Educação Inclusiva e Especial
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Educação Inclusiva e Especial
As diretrizes atuais da Educação Inclusiva, tendo como base a Constituição Federal de 1988,
no Artigo 205, determinam que a educação é um direito de todos, enfatizando o dever dos
sistemas de ensino de se adequarem para o atendimento com qualidade a todos os alunos
sem nenhum tipo de discriminação.
De acordo com a Lei de Diretrizes e Bases da Educação Nacional os sistemas de ensino
deverão fazer chamadas públicas para a efetivação do cadastro escolar a todos os
candidatos e deverão assegurar a matrícula e a permanência de todos os alunos,
independentemente de suas deficiências ou necessidades educacionais especiais,
organizando-se para oferecer, além da escolarização, o atendimento educacional
especializado aos alunos que dele necessitarem (BRASIL,1996).
A Resolução do CNE/CEB n. 2/2001, a qual define as diretrizes nacionais para a educação
especial na educação básica, determina que as escolas do ensino regular devem matricular
todos os alunos em classes comuns, com o apoio necessário. Esse apoio pode constituir
parte do atendimento educacional especializado (previsto no Art. 208 da Constituição
Federal) e pode ser realizado em parceria com o sistema público de ensino. Qualquer escola,
pública ou particular, que negar matrícula a um aluno com deficiência comete crime punível
com reclusão de 1 a 4 anos conforme Art. 8º da Lei nº 7.853/89 (BRASIL, 2001).
Porém, a efetivação da inclusão de alunos com necessidades educacionais especiais, na
rede regular de ensino, não acontece apenas pelo acesso à matrícula e pela entrada desses
alunos no mesmo espaço físico que os demais. É preciso muito mais investimentos para a
adequação à nova realidade educacional. Para o diagnóstico e análise correta dessa
realidade é importante que os sistemas de ensino criem mecanismos de informação que
possibilitem o conhecimento da demanda, a identificação, análise, divulgação e intercâmbio
de experiências educacionais inclusivas e o estabelecimento de interface com os órgãos
governamentais responsáveis pelo Censo Escolar e pelo Censo Demográfico, para atender
a todas as variáveis implícitas à qualidade do processo formativo desses alunos (BRASIL,
2001).
Na busca da construção de práticas institucionais e pedagógicas que garantam qualidade
de ensino a todos os alunos, independente de sua condição, a elaboração do Projeto Político
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Educação Inclusiva e Especial
Os serviços de apoio especializado são aqueles que têm como objetivo a eliminação das
barreiras que possam obstruir o processo de escolarização de estudantes com necessidades
educacionais especiais. Esses serviços compreendem o conjunto de atividades, recursos de
acessibilidade e pedagógicos, organizados institucional e continuamente, prestados de
forma a: (i) complementar à formação dos estudantes com deficiência e transtornos globais
do desenvolvimento e; (ii) suplementar à formação de estudantes com altas habilidades ou
superdotação.
Os serviços de apoio especializados ocorrem no espaço escolar e envolvem profissionais
da educação em diferentes funções. Alguns tipos desses serviços estão descritos nas
Diretrizes para a Educação Especial como sendo (BRASIL, 2001):
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Educação Inclusiva e Especial
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Educação Inclusiva e Especial
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Semana 3 – Questões de identidade e diferença
Objetivos
Discutir as questões de identidade e diferença. Refletir sobre
as temáticas: sexualidade, gênero, raça e etnia no trabalho
escolar. Compreender a importância do Multiculturalismo.
A escola, durante toda sua história, tem apresentado uma educação que privilegia alguns
grupos que “se enquadram” nos padrões homogeneizados da mesma. Essa exclusão dos
grupos que “não se enquadram” foi sendo legitimada nas políticas e práticas educacionais
reprodutoras da ordem social. A Constituição Federal, a Lei de Diretrizes e Bases e vários
outros documentos falam de uma escola aberta, pluralista, para a qual todos devem ter a
garantia de acesso e permanência. Porém, o que se percebe é que só existe investimento
na permanência de alguns grupos. Os demais estão fadados ao fracasso escolar, isso visto
de forma naturalizada.
A pedagogia não consegue se desvincular dessa escola conservadora, portanto,
segregações de grupos e rótulos são construídos, baseados em parâmetros como
inteligência, problemas familiares, classes sociais, talentos e “aptidões”. Assim sendo, os
que não estão dentro dos parâmetros definidos pela educação acabam sendo excluídos,
perdendo o que seria seu direito social. Eles nem reclamam porque acabam vendo isso
como um processo natural e legitimado. Afinal de contas, esses são despossuídos do capital
cultural esperado e predeterminado pela escola, acabam tornando-se presenças ausentes,
corpos marcados pela rejeição, física e simbólica, vistos como socialmente desqualificados
e, por conseguinte, inadequados às práticas escolares. Estes sujeitos não conseguem
adentrar em determinados espaços sociais, são excluídos e vivem à margem da sociedade
(BOURDIEU, 1998a).
No mundo escolar, várias são as práticas, estratégias e representações, de forma até
inconsciente, que acabam sabotando as possibilidades dos excluídos de se apropriarem dos
Depois da discussão sobre como as identidades e diferenças são construídas, tendo a visão
de como os sistemas classificatórios existem para a manutenção de “certa ordem social”,
importante se faz pensar nas questões de gênero e sexualidade em âmbito escolar.
Sabe-se que a escola, na perspectiva inclusiva, possui um papel relevante na socialização
dos saberes e das práticas relacionadas à diversidade. Porém, o que se tem percebido é
que temas como sexualidade, diversidade e relações de gênero ainda são regulados por
preceitos morais, onde o que tem prevalecido é o caráter biológico aos aspectos sociais e
culturais, e discriminação daquilo que não é “normal”.
Tendo em vista a proposta da educação inclusiva, importante ressaltar que a Conferência
Mundial sobre Necessidades Educacionais Especiais, promovida pela Unesco em 1994, de
onde originou-se a Declaração de Salamanca, afirma que crianças com necessidades
educativas especiais não são apenas as que têm deficiências, mas também as dotadas de
altas habilidades, as que trabalham, as de minorias linguísticas, étnicas e culturais, enfim,
as desfavorecidas ou marginalizadas socialmente, e que sofrem algum tipo de exclusão
educacional mesmo estando dentro da escola. Torna-se, portanto, relevante também
problematizar a diversidade sexual e as relações de gênero no contexto escolar.
Durante séculos as desigualdades e diferenças entre homens e mulheres só eram
explicadas pelas características biológicas. Com o passar do tempo surgiu o conceito de
gênero, que procurou romper com esse entendimento, argumentando sobre como essas
diferenças eram construídas culturalmente. O conceito de gênero não se restringe apenas
aos papéis assumidos por homens e mulheres na sociedade, mas diz respeito às relações
A “diferença” é um elemento central nos sistemas classificatórios por meios dos quais os
significados são produzidos. Os significados fornecem novas formas de se dar sentido à
experiência das divisões e desigualdades sociais e aos meios pelos quais alguns grupos são
excluídos e estigmatizados (WOODWARD; 2014).
Os significados e as classificações servem de ferramentas para operacionalizar o
pensamento. Assim sendo, surgiu a classificação da diversidade humana em raças, que por
causa das relações de poder, criou uma operação de hierarquização que embasou o
caminho do racismo.
No caminhar da humanidade, a escola, ao trabalhar somente com as classificações advindas
do campo científico, ajudou para que as identidades étnicas e raciais fossem vistas como
mais ou menos importantes, o que levou muitos indivíduos ou grupos serem marcados pela
diferença.
Percebe-se que na sociedade atual, ainda regida por um paradigma branco, onde a maioria
dos excluídos é constituída pelos grupos considerados como os não-brancos, as narrativas
rementem “aos outros” em um processo de construção de identidade (ou de sua negação)
(BARBOSA; GUIZZO, 2014).
Muitas vezes usando de um currículo engessado na linguagem e nas formas de manter o
poder sobre os sujeitos, a escola foi perpetuando as diferenças e legitimando as
desigualdades de forma que se estabelecesse um sistema classificatório entre os sujeitos.
No que se refere à raça e à etnia, a exclusão foi marcante durante tempos.
Relações raciais, étnicas, multiculturalismo e currículo são temas que estão conectados. Na
educação, não é possível abordar multiculturalismo e currículo sem problematizar as
relações raciais na escola, assim como não se pode falar de desigualdade racial deixando
de fora a educação. O que deve estar em debate são as formas de exclusão no interior do
espaço escolar, nas propostas curriculares ou dos discursos e textos políticos. A segregação
interna acontece por meio das relações interescolares, que envolvem a invisibilidade das
questões inter-raciais próprias de uma sociedade multicultural e pode ser vista ainda nos
materiais didáticos que reforçam estereótipos atribuídos aos afro-descendentes (OLIVEIRA;
MIRANDA, 2003).
Urgente se faz a atenção para uma ressignificação da escola e do currículo como um espaço
de que luta contra a exclusão dos que não se “enquadram” nas identidades homogêneas.
Novas formas de participação de sujeitos sociais com representação minoritária devem ser
planejadas de forma a fazer com que os currículos sejam mais inclusivos.
Neste sentido, numa perspectiva inclusiva, aponta-se a proposta do multiculturalismo na
educação. Um multiculturalismo crítico, que ao discutir a diferença, não a separa da
discussão da desigualdade social, da cultura e da relação de poder. Um multiculturalismo
que politiza a cultura, a situa nos conflitos sociais e históricos, não a vendo somente como
uma essência de identidades.
Faz-se urgente que as escolas comprometidas com a educação de qualidade se mobilizem
contra a exclusão dos sujeitos silenciados pelo pertencimento racial e/ou étnico, que
busquem estratégias que deem visibilidade aos não-brancos. A busca pela redução das
desigualdades sociais se dá não apenas com o discurso de universalização da educação,
mas a partir da mudança do olhar sobre os currículos, que devem deixar de serem
hegemônicos, para serem multiculturais incluindo metodologias explícitas para trabalharmos
aspectos da diversidade de nossa sociedade (FIGUEIREDO, 2002).
Objetivos
Descrever as diversas modalidades de ensino na perspectiva
da inclusão, contemplando suas diferenças e necessidades.
A Educação de Jovens e Adultos (EJA) tem por fundamento a busca por estratégias de
enfrentamento ao analfabetismo e a não inclusão social de pessoas de baixa escolaridade,
que vivem em zonas de vulnerabilidade. Estudos apontam que a maior parte dos que
procuram a EJA são advindos das classes populares, pertencentes a famílias que ocupam
as margens da sociedade. Portanto, como não pensar na EJA sobre a perspectiva de uma
educação inclusiva?
É importante lembrar que o surgimento dessa modalidade de ensino se dá devido ao fato da
intensa exclusão precoce da escola, um dos maiores problemas do sistema educacional
brasileiro. Muitas vezes tal exclusão tem origem na falta do olhar sobre as realidades dos
alunos de forma a atender suas necessidades, sejam elas causadas pelas deficiências
físicas, mentais ou pelo simples pertencimento a uma classe, raça, etnia, gênero etc. A
questão é que a falta da visão sobre como se faz uma verdadeira inclusão causa problemas
em todos os níveis e modalidades de ensino, comprometendo a construção de uma
educação mais justa e igualitária.
A Educação de Jovens e Adultos no Brasil tem sido um tema polêmico e controvertido, pois,
encontra descontinuidades que dificultam a constituição de sua identidade, reconhecimento
de suas especificidades e a construção de um estatuto próprio, que subsidie a formulação
de propostas teórico-metodológicas compatíveis com as vivências e os saberes daqueles
aos quais se destina (RIBEIRO, 1999).
Alfabetizar pessoas jovens e adultas não é um ato apenas de ensino – aprendizagem é a
construção de uma perspectiva de mudança, com a crença certeira de que todos podem
aprender, independente da condição em que se encontram.
Para a promoção dessa educação que atende um público especial, já vítima de tantos
processos de exclusão durante sua trajetória de escola e de vida, é importante a tomada de
novos posicionamentos. É preciso remover barreiras atitudinais tendo consciência de que
não é o aluno que deve se adaptar à escola, mas é a escola consciente de seu papel que
deverá colocar-se à disposição do aluno.
É sabido que a heterogeneidade da população atendida pela Educação de Jovens e Adultos,
devido à diversidade de idades, de níveis de escolarização, de barreiras enfrentadas durante
as trajetórias escolares e, sobretudo, de condições humanas, apresenta-se como um desafio
Para o entendimento dessa modalidade de ensino, que tem como meta o respeito às
diferenças e que mobiliza ações para o reconhecimento dos direitos subjetivos dos seus
alunos, são necessárias ações de políticas afirmativas que favoreçam a construção de
contextos sociais mais inclusivos.
Para a compreensão sobre como se constitui a Educação Rural e/ou do Campo é preciso
entender que essa modalidade de ensino foi criada pensando na população composta de
agricultores e seus familiares, extrativistas, pescadores artesanais, ribeirinhos, assentados
e acampados da reforma agrária, trabalhadores rurais assalariados, quilombolas, caiçaras,
povos da floresta, caboclos. A proposta do MEC, de acordo com as diretrizes para esse tipo
As lutas travadas pelos movimentos sociais, durante as últimas décadas, exigem reparações
e o reconhecimento social e jurídico de garantia à inserção social dos grupos e indivíduos
privados de direitos. Dentre esses grupos estão os quilombolas.
Os quilombos surgiram no período colonial como símbolo de resistência à escravidão e
discriminação. Durante muito tempo houve a crença de que os quilombos tinham acabado
com a abolição da escravatura. Porém, nos anos 70 e 80, pesquisas universitárias pautadas
na questão da etnicidade, discutiram identificações culturais de origens étnicas e raciais de
comunidades negras e comunidades rurais que apresentavam a particularidade de serem
negras e camponesas. As ciências sociais ajudaram na organização de significativos
debates voltados ao respeito às minorias, o que promoveu a ampliação das garantias e
direitos étnicos culturais.
Durante os trabalhos que chegariam à elaboração e aprovação da Constituição de 1988, as
pesquisas acadêmicas, as ações e pressões dos movimentos sociais, pastorais da terra,
movimentos negros e parlamentares foram essenciais para o reconhecimento jurídico das
terras de quilombos. O artigo 68 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da
Constituição de 1988 estabeleceu o reconhecimento do domínio das terras tradicionalmente
ocupadas pelas comunidades quilombolas.
A partir desse reconhecimento iniciaram-se discussões sobre quem seriam os
representantes legítimos desses quilombos. Começaram a surgir diferentes representações
de agrupamentos negros no campo, “remanescentes de quilombo”, “quilombolas”,
“mocambeiros”, etc., vinculadas à memória, ao parentesco, ao lugar que construíram e
outros. Então, por meio do Decreto n. 4.887, promulgado em 20 de novembro de 2003, a
Fundação Cultural Palmares continuou a ter responsabilidade por certificar tais grupos. E ao
INCRA delegou a responsabilidade por emitir relatórios e laudos periciais para identificação
dos grupos, a fim de depositar a titulação (BRASIL, 2003).
Praticamente todos os estados brasileiros têm terras de quilombos em seu território. De
acordo com a Fundação Cultural Palmares, em 2017 o país contava com 2.471 certificados
emitidos para 2.890 comunidades quilombolas. Apesar dessa soma, segundo o INCRA, em
2016 apenas 165 títulos foram emitidos em favor dessas comunidades, representando
apenas 5,7 % das comunidades certificadas.
Todo esse moroso processo de reconhecimento e garantia de direitos, sendo ainda presente
a luta por justiça, com certeza repercute na forma de pensar a educação nessas
comunidades. Algumas medidas foram tomadas para a elaboração e orientação às políticas
educacionais voltadas para o ensino de questões étnico-raciais, como por exemplo, a
criação do Departamento de Educação para a Diversidade e Cidadania (DEDC) em 2004 e
a aprovação da Resolução n. 8, de 20 de novembro de 2012, que definiu as Diretrizes
Curriculares Nacionais para a Educação Escolar Quilombola na Educação Básica (CARRIL,
2017).
Mas os desafios postos para a educação escolar destinada aos estudantes quilombolas são
amplos e antagônicos, vão desde a definição da proposta político pedagógica, o uso de
recursos didáticos apropriados e a formação docente, até a falta de estrutura física mínima
adequada.
As Diretrizes Curriculares Nacionais para a Educação Quilombola trazem algumas
referências que ajudam na formulação de uma proposta pedagógica adequada, mas
certamente ainda faltam pesquisas que envolvam aqueles saberes comunitários e um
intercâmbio de conhecimentos entre diversas áreas. Essencial se faz o trabalho
interdisciplinar entre sociologia, história, geografia, antropologia e outras ciências, na busca
da construção de um currículo que seja pertinente à realidade quilombola, que tenha como
base os contextos de uso do território, da etnicidade e da memória presentes nas narrativas
dos sujeitos, no intuito de construir metodologias que proporcionem aprendizagens tendo
como ponto de partida elementos referentes às realidades locais das comunidades. Só a
educação é capaz de romper com uma história longa de alienação e exclusão étnica e racial
que originou a formação da sociedade brasileira (CARRIL, 2017).
Para concluir nossos estudos, nesta unidade, provocaremos apenas uma reflexão sobre os
conceitos de Educação Popular, Educação Social e Comunitária que têm como base as
concepções de Paulo Freire e de Moacir Gadotti.
Encerrando essa disciplina, que trata da educação como aquela que emancipa, transforma,
liberta, cria e conduz à justiça e à promoção de condições de igualdade, recorre-se a Paulo
Freire quando afirma que “educação sozinha não transforma uma sociedade, mas sem ela
não se consegue fazer as mudanças necessárias, principalmente no que tange à inclusão
social”.
E-mail: claudia.rossi@ifmg.edu.br
Currículo Lattes: http://lattes.cnpq.br/8922744036260494