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A Política Colonial Do Estado Novo
A Política Colonial Do Estado Novo
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Só tardiamente Salazar demostrou interesse pela questão colonial, juntando-se à causa dos
defensores mais intransigentes do Império Português, da sua integridade territorial e da soberania
portuguesa sobre as suas colónias.
No início das suas funções governativas, muitos recearam que em nome do rigor orçamental que o
caraterizava, e que constituiu uma prioridade omnipresente da sua ação governativa, o ditador
pudesse sacrificar o Império. As medidas de draconiana austeridade que implementou nas finanças
metropolitanas, mas que eram extensíveis aos territórios coloniais, fizeram temer que o novo regime
abdicasse dos territórios ultramarinos que do ponto de vista económico constituíam mais um peso do
que um rendimento para o Estado português.
Por outro lado, até assumir a chefia do governo pouco sobre as colónias tinha exprimido o homem
forte do novo regime político. Para António Salazar de origens rurais, proveniente do interior mais
recôndito de Portugal, as colónias pareciam não despertar qualquer interesse ou sequer curiosidade. E
com efeito, durante toda a sua longa carreira de estadista nunca quis conhecer o Portugal de além-
mar.
O seu interesse pelas colónias parece ter aparecido tardiamente e de forma indireta. Forjou-se no
seu espírito na exaltação de um passado glorioso e mitificado de Portugal, onde os Descobrimentos do
século XV e XVI eram a marca indelével que o espírito português tinha produzido ao longo dos seus
mais de oito séculos de História. Foi a deferência para com esse passado que levou Salazar a
desenvolver um nacionalismo exacerbado que exigia aos portugueses do seu tempo a capacidade de
se mostrarem dignos dessa herança histórica recebida. Assim, como refere Yves Léonard «é permitido
avançar a hipótese que a sensibilidade (…) de Salazar em relação à realidade colonial provinha
sobretudo do sentimento nacional que o animava. Isto é, as suas “predisposições” em matéria colonial
explicar-se-iam, principalmente, pelo lento amadurecimento de um nacionalismo marcado de
continuidade histórica»1.
Era uma noção histórica alimentada pela historiografia de inícios do século que identificava a
refundação de Portugal, pretendida pelo Estado Novo, com a ideia de continuidade da «missão» que
Portugal devia continuar a cumprir na História do mundo.
1
LEONARD, Yves; História da Expansão Portuguesa, vol. V, Círculo de Leitores, pág. 12.
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O interesse pelo ultramar ter-se-á, contudo, reforçado no ditador nos inícios de 1930, quando
assumiu interinamente, em acumulação com o ministério das finanças, a pasta das «colónias» (21 de
janeiro) que o levará a exprimir, pela primeira vez, a noção de que Portugal era na sua essência a
«cabeça de um Império». Esta convicção colonialista de Salazar terá sido também motivada por
estratégia política, pois, a questão colonial continuava a ser, mais ou menos, consensual entre as elites
do novo regime político.
A sua tutela sobre o Ministério da Colónias, se bem que efémera, acabou por ser decisiva para a
definição da política colonial do Estado Novo nas décadas seguintes, marcando indelevelmente, a
orientação político-administrativa sobre o «Império Colonial Português», caracterizada pelo reforço da
presença militar no ultramar, sobretudo em Angola, e pela mitigação da autonomia administrativa das
colónias, rumo à sua administração mais centralizada. Esta nova orientação ficou plasmada na
elaboração, e posterior promulgação, do Ato Colonial de 1930, iniciativa legislativa que veio,
posteriormente, a ser incorporada na futura Constituição do Estado Novo de 1933.
No Título II, «Indígenas» - não se reconheciam direitos políticos as populações autóctones, exceto
a possibilidade, muito restritiva, de, através do cumprimento dos seus deveres de trabalho, educação
e transformação progressiva dos seus usos e costumes …e a sua integração na vida da colónia, de se
tornar assimilado e de assim obter progressivamente a cidadania portuguesa. Tal estatuto de
indigenato, altamente discriminativo, manter-se-á inalterado até 1961, (quando o ministro Adriano
Moreira o extinguiu), distinguindo entre a população das colónias os «civilizados», repartidos entre
brancos, mestiços e (raros) negros assimilados e «indígenas».
O Ato Colonial de 1930 definia-se assim a linhas mestras da nova política ultramarina da ditadura
salazarista, inaugurando uma verdadeira fase imperial, fortemente nacionalista integracionista e
centralizadora.
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Publicado o novo diploma, o novo ministro das colónias, Armindo Monteiro, um dos delfins mais
fieis do salazarismo define, tecendo considerações de típico teor fascista, a nova política colonial
assente nos seguintes princípios: subordinação política ao governo da República; possibilidade de
revogação de toda a legislação vigente nas colónias; perfeito equilíbrio do seu orçamento; coordenação
das atividades económicas metropolitanas e coloniais.
Esta nova política colonial definida por Salazar e o seu novo ministro das colónias era assim a
expressão do seu tempo, estando em sintonia com as políticas coloniais e imperiais europeias da
década de 30.
Esta nova política colonial visava complementarmente reforçar a soberania da metrópole sobre os
seus territórios africanos, na tentativa de os salvaguardar da cobiça de que eram alvo por parte de
outras potências europeias expansionistas que criticavam a frágil e pouco intensiva colonização
portuguesa, nomeadamente da Alemanha, Itália ou até da Inglaterra. Enquanto a nível diplomático
corriam rumores de planos de apropriação das colónias portuguesas por países estrangeiros, Salazar
respondia com a intensificação da presença e domínio português na África Portuguesa.
Esta estratégia passava inclusivamente pela criação de uma ação de propaganda colonialista que
baseava a grandeza da Nação Portuguesa na posse de domínios ultramarinos. Sem as colónias, aos
olhos dos dirigentes do Estado Novo, Portugal ficaria reduzido à insignificância territorial e política no
concerto das nações europeias, facto que fazia perigar a sua própria viabilidade como Nação
independente. A sustentar tal tese podem estar as conceções historiográficas que durante muito
tempo associaram a independência nacional à capacidade de expansão ultramarina dos séculos XV e
XVI.
Esta propaganda imperial valeu-se da ação do Secretariado da Propaganda Nacional e nas suas
múltiplas publicações, de inúmeras iniciativas sobre o tema colonial levadas a cabo pela recém-criada
Mocidade Portuguesa e pela introdução nos currículos escolares do ensino secundário de uma nova
disciplina denominada Organização Política e Administrativa da Nação. Em todas elas veiculava-se o
postulado da nação una e indivisível de Portugal a Timor. Esta “mística imperial” assentava na
convicção da “missão histórica de colonizar e civilizar” e assumia assim uma dimensão pedagógica de
dar a conhecer as colónias aos próprios portugueses.
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Esta ação de propaganda, na mente dos dirigentes do Estado Novo, terá também sido concebida
como fator de promoção e estímulo da colonização branca dos territórios africanos, visando
transforma-los em verdadeiras colónias de povoamento.
Esta propaganda colonial criadora de uma verdadeira “mística imperial” era a expressão evidente
da identificação do colonialismo português com a exaltação patriótica ou nacionalismo típico do Estado
Novo.
Entretanto, a Segunda Guerra Mundial e a nova conjuntura internacional que após ela se
afirmou constituiu um abalo considerável no projeto colonial português.
De facto, o fim da guerra representou o ocaso dos impérios coloniais com a irrupção de um
amplo movimento de descolonização - processo histórico‐político que marca a 2ªmetade do século
XX e que se traduziu na rápida independência de colónias asiáticas e africanas relativamente às
potências europeias.
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Nesse contexto, em agosto de 1941, Roosevelt e Churchill assinam a Carta do Atlântico, onde
EUA e Inglaterra assumem respeitar o direito de todos os povos a escolher a sua forma de governo
… e (que) desejam ver restabelecidos os direitos soberanos e de autodeterminação de quem deles foi
expropriado pela força. Esta resolução, tomada a propósito dos territórios que haviam sido
anexados pela Alemanha nazi, tornou-se rapidamente um fundamento teórico a favor da libertação
de todos os povos.
Este acordo anglo-americano terá inspirado, pouco tempo depois, a atitude da recém-criada
ONU que foi responsável pela afirmação internacional dos princípios da igualdade entre os povos e
do direito de autodeterminação. Em 1960, adota a RESOLUÇÃO Nº 1514 onde condena
veementemente o colonialismo considerando‐o como uma ação negadora dos direitos do Homem
e do espírito da Carta das Nações Unidas, exigindo a imediata e sem reservas libertação e
independência das colónias.
Por último, a descolonização foi o resultado de uma luta de libertação por parte dos povos
colonizados, visando obter a sua autonomia. Nesse contexto, destaque para o aparecimento nos
territórios asiáticos e africanos de movimentos nacionalistas que exaltam as especificidades da
cultura asiática e africana, reclamando a possibilidade de manter as suas tradições ancestrais.
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Muitos destes novos países decidiram afirmar-se politicamente no panorama internacional
afirmando a sua neutralidade face aos blocos capitalista e comunista. Esta afirmação passou pela
CONFERÊNCIA DE BANDUNG (1955) – onde 29 países afro-asiáticos, representando mais de metade
da população do Globo, adotam como princípios comuns a rejeição da política de blocos, a
condenação do colonialismo e o apelo à resolução pacífica dos conflitos internacionais. A
mensagem desta conferência foi amplamente divulgada contribuindo para afirmação política de um
punhado de países subdesenvolvidos, mas que recusavam integrar a lógica da bipolarização no
contexto da Guerra Fria.
Foi o despertar do Terceiro Mundo – designação que se generaliza e que serve para designar
estes países pobres com um passado colonial e que recusam alinhar na lógica bipolar que então
vigorava. Este despertar vincou-se com a CONFERÊNCIA DE BELGRADO (1961) – onde, sob a
liderança de Nehru (da Índia), Nasser (do Egipto) e Tito (da Jugoslávia) – a que se juntaram Sukarno
(da Indonésia) e N’Krumah (do Gana), 61 países dão origem ao Movimento dos Países Não-Alinhados
que afirmam a sua neutralidade face aos blocos políticos capitalista e comunista, a solidariedade
económica entre os países e o apoio incondicional à independência e liberdade de todos os povos.
É neste contexto internacional adverso à manutenção do Império Colonial que, no pós 2ª guerra
mundial, se tem de movimentar o Estado Novo.
Contudo, a rápida afirmação do clima de Guerra Fria acabou por funcionar a favor do Estado
Novo e Portugal passou a ser visto como um parceiro, embora algo incómodo, por parte dos EUA
que vai sancionar a sua integração como membro fundador da NATO, em 1947, devido, sobretudo,
à importância geoestratégica para os americanos da base das Lajes nos Açores. Inclusivamente,
Portugal tenta tirar partido desse facto, procurando, sem sucesso, incluir as colónias como zonas
de ocupação do Tratado de forma a salvaguarda-las de qualquer ataque exterior.
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Escudado na NATO e na antiga aliança Luso-britânica, bem como, no ambiente favorável da
Guerra Fria, o Estado Novo decidiu resistir ao processo de descolonização, mantendo inalterada no
essencial a sua política colonial.
Assim, procedeu-se, em 1945, a uma revisão do Ato Colonial que prescreveu pequenas
mudanças sobre as competências do governo central em matéria legislativa e orçamental no
sentido de aceitar uma maior delegação de poderes e uma relativa descentralização política com o
reforço das atribuições dos governadores coloniais.
22
Ibidem, pág. 34.
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Paralelamente refundava-se a visão e a mística imperial ao adotar-se oficialmente as teses do
luso-tropicalismo do sociólogo brasileiro Gilberto Freyre.
Segundo estas teses, a colonização portuguesa distingue-se das demais pela capacidade do
português em se adaptar e transformar as realidades sociais e culturais com que contactou ao longo
dos mais de cinco séculos de expansão colonial. Teria sido uma colonização baseada na faculdade
inata dos portugueses em se fundirem e misturarem com as populações locais. Nesse sentido, a
colonização portuguesa foi descrita por este sociólogo como uma colonização singular, propensa,
como nenhuma outra, à mestiçagem étnica e cultural, e por isso, uma colonização benévola,
sincrética que supostamente era particularmente evidente no Brasil, Cabo Verde ou Goa.
Trata-se de uma visão idílica da colonização portuguesa enunciada por este sociólogo
brasileiro e que, da década de 40, se adaptava oportunamente á nova conjuntura internacional para
servir de legitimação pseudocientífica e justificação ideológica para a manutenção da política
ultramarina portuguesa.
No entanto, apesar das adaptações acima descritas, nos inícios da década de 60, o regime e seu
projeto colonial são sistematicamente postos em causa, nomeadamente, pela comunidade
internacional.
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As dificuldades agravam-se de sobremaneira a partir de fevereiro de 1961 com o início da
insurgência em Angola, iniciando uma longa guerra colonial que durará mais de 14 anos. A 18 de
Dezembro do mesmo ano, Goa é invadida pela União Indiana, iniciando o desmoronamento do
Império colonial português. E na ONU é vetada, pela URSS, um projeto de resolução que exigia uma
cessação imediata das hostilidades que incluía uma retirada imediata das tropas indianas dos
territórios portugueses entretanto ocupados.
A consciência por parte de Salazar do «orgulhosamente sós» faz-se sentir, sobretudo durante
a administração Kennedy (1960-63) que não poupa críticas à postura de Portugal, recusando-se
apoiar a política africana salazarista na cena internacional. A UPA de Holden Roberto em Angola
contou mesmo com apoio da CIA, tal como a Frelimo dirigida por Eduardo Mondlane, no contexto de
uma nova política americana de apoiar nacionalismos africanos na tentativa de travar a penetração
da influência soviética em África. Em 1963, a diplomacia americana propõe o Plano Sakwa com o
qual se pretendia que Portugal aceitasse a transição para a independência dos seus territórios
africanos em troca de uma substancial ajuda financeira por parte dos americanos.
Em janeiro de 1963, coincidindo com o início da guerra colonial na Guiné Bissau, a postura
internacional contra Portugal endureceu. A URSS reclama por sanções económicas, o corte de
relações diplomáticas e até a expulsão de Portugal da ONU. O Conselho de Segurança vota, com a
abstenção dos EUA, Inglaterra e França, a resolução S/5380 onde se rejeitava liminarmente o
conceito defendido por Portugal de províncias ultramarinas, exigindo que o país reconhecesse o
direito à autodeterminação e independência dos seus territórios africanos.
Entre 1965 e 1967, face à inflexibilidade portuguesa, são votadas na ONU novas resoluções
que condenam veementemente a atitude portuguesa de resistência à descolonização e Portugal era
excluído de muitas das instituições espacializadas das Nações Unidas. Tal fato resultava da entrada
na organização de muitos novos membros africanos e asiáticos recém-independentes que se
obrigaram a não deixar a questão portuguesa cair no esquecimento. A secundar a sua posição surge,
em 1963, a OUA (organização de Unidade Africana) que adotou uma postura semelhante de boicote
a Portugal e afirmou o seu apoio declarado (apoio político, diplomático, logístico e militar) aos
movimentos de libertação das colónias portuguesas.
No plano interno, ainda que timidamente, as críticas à postura colonial de Portugal também
começavam a fazer-se sentir. Em 1953, O MUD, era a primeira organização política portuguesa a
reconhecer o direito de autodeterminação das colónias portuguesas. E em 1965, a Casa dos
Estudantes do Império, era encerrada pelas autoridades que a consideraram, com razão, um espaço
de socialização e subversão anti- salazarista e anticolonial. Tratava-se de um espaço de convívio,
tertúlia, e disseminação da ideologia anticolonial e da literatura africana, em muitos casos de teor
subversivo. Frequentada por estudantes oriundos das colónias ajudou a criar uma primeira geração
fundadora dos movimentos nacionalistas. Os seus membros deixaram-se influenciar pela ideologia
marxista e pelo movimento de negritude de origem francófona. Agostinho Neto, Lúcio Lara ou
Marcelino dos Santos, a partir da sua convivência na instituição, vão criar as primeiras organizações
de caráter conspirativo como o Centro de Estudos Africanos (1951-53), o Clube Marítimo Africano
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(1954) e o Movimento Democrático das Colónias Portuguesas (1954). Muitas das suas iniciativas
anticolonialistas irão contar com o apoio do clandestino Partido Comunista Português.
Contudo, a presença portuguesa no ultramar não foi posta em causa por muita gente. Mesmo
opositores destacados do regime não se pronunciavam favoravelmente ao abandono das colónias.
O regime salazarista procurando adaptar-se mais uma vez aos acontecimentos de 1961 – o
«ano de todos os males» -, procura dar mostras maior modernidade. Salazar decide nomear Adriano
Moreira como novo Ministro do Ultramar. Tratava-se de um dos mais fervorosos defensores das
teorias do luso-tropicalismo que serviu de pano de fundo para a sua nova reforma jurídica
relativamente às colónias. Esta passou pela revogação do Estatuto de Indigenato, pelo Decreto-Lei
43 893 de 6 de setembro, estendendo a cidadania portuguesa a todos os habitantes do império, de
forma atenuar as críticas de discriminação racial que continuava a fazer-se sentir nas Províncias do
Ultramar. A título de exemplo, em Angola até então apenas 1% dos africanos eram considerados
assimilados. Outras medidas legislativas visaram estabelecer uma autonomia crescente das
colónias, algo que descontentou alguns sectores mais conservadores adeptos da manutenção da
lógica centralizadora e de menores concessões, o que veio a ditar o fim rápido do exercício do jovem
ministro.
O resultado foi também o incremento da colonização branca dos territórios africanos, tentando
transformar Angola e Moçambique em verdadeiras colónias de povoamento. E com efeito, em 20
anos a população de origem europeia veio a quadruplicar nestes territórios.
Às críticas, sobretudo externas, Portugal respondia com a doutrina, pouco convincente, de que
não possuía colónias, mas sim províncias ultramarinas e com saídas ruidosas das suas delegações
na ONU em protesto contra as posturas que nessa organização se tomavam contra Portugal.
Tentando captar a boas graças dos aliados ocidentais, passa também a argumentar a tese de que
era vítima de uma conspiração comunista internacional. Os movimentos guerrilheiros, entretanto
surgidos nos territórios portugueses, eram descritos como pequenos grupos sem
representatividade junto da maioria das populações locais, infiltrados a partir de países vizinhos e
a soldo de países comunistas.
Apesar das fragilidades evidentes deste discurso, o que é certo é que, a partir de 1963, Portugal
vai contar com uma conjuntura internacional menos desfavorável que lhe permitiu prolongar o
impasse.
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Algumas das potências ocidentais, como a França, Inglaterra e os EUA vão adotar uma postura
abstencionista relativamente a Portugal por temerem perder a base das Lajes se assumissem uma
postura abertamente hostil. Com os EUA embrenhados na guerra do Vietname, as novas
administrações americanas secundarizaram a sua intervenção em África. Com Nixon e Kissinger a
CIA recebeu instruções para terminar com os contactos e apoios aos movimentos nacionalistas,
nomeadamente à UPA e FRELIMO. Esta administração chega mesmo a elogiar publicamente
Portugal pelo seu combate ao movimento comunista.
Por outro lado, Portugal vai reforçar a colaboração militar e policial com a África do Sul e a
Rodésia e tira proveito dos múltiplos casos de rivalidade, cisão e divergência que iam irrompendo
nos vários movimentos de guerrilha antiportugueses.
A NATO continuou a funcionar como um escudo protetor do regime e da sua politica colonial.
Apesar dos embargos e das críticas a Portugal surgidas no seio da Aliança, sobretudo por parte dos
países escandinavos, era por sua via, de forma mais ou menos velada, que o regime obtinha
financiamento militar e algum armamento. Se os EUA resistiam abertamente a fornecer apoio
militar, outros estados membros não se coibiam de vender armas ou prestar alguma assistência
militar. Foram os casos da França, Inglaterra e RFA.
A partir de setembro de 1968 Salazar é substituído por Marcelo Caetano (antigo ministro das
colónias entre 1944 e 47) na presidência do Conselho de Ministros, o qual passou a superintender a
política colonial, num período onde o desgaste com a guerra colonial, sobretudo na Guiné e
Moçambique, era já por demais evidente.
Inicialmente, Caetano terá chegado a pensar numa solução federalista para resolver a questão
colonial. Inspirando-se na Commonwealth britânica, o novo líder desejava construir uma alternativa
à independência dos territórios africanos que passaria por negociar uma autonomia progressiva,
mas implicando uma qualquer vinculação entre as províncias ultramarinas e a metrópole. Na
tentativa de cativar as próprias populações locais para o seu projeto ainda pouco definido,
protagonizou a iniciativa inédita de levar a cabo a visita oficial do chefe de governo português à
Guiné, Angola e Moçambique, onde faz alusões ao desejo de promover uma participação mais ativa
das populações locais na administração pública.
Contudo, como em muitos outros aspetos, manietado pelos inúmeros bloqueios e pressões
contraditórias que marcaram o seu mandato, rapidamente dá mostras de abdicar da sua intenção
reformista, mantendo a «continuidade» da política colonial herdada do seu antecessor. Limitou-se
apenas a promulgar uma Nova Lei Orgânica do Ultramar Português (23 de junho de 1972) que
defendia o aprofundamento da descentralização administrativa.
Pressionado pelo descontrolo da guerra na Guiné e pelo desgaste militar em Moçambique, pelo
crescimento da oposição democrática que defendia o imediato fim da guerra colonial e pelo sector
conservador que não permitia qualquer concessão, o regime marcelista imobilizou-se, limitando-se
a reforçar o esforço de guerra, chegando a afetar 45% do orçamento de Estado para as questões de
defesa e segurança e impondo uma mobilização massiva da população jovem em idade militar. O
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número de militares relativamente à população total atingiu índices só superados por Israel e
Vietname.
Este esforço a longo prazo insustentável só foi parcialmente mitigado pelo crescimento
económico verificado no início do período marcelista muito por culpa da abertura da economia
portuguesa ao exterior que permitiu o crescimento do investimento estrangeiro, tanto na
metrópole como nas colónias.
Com efeito, a realidade mostrava-se bastante adversa. Militarmente a situação era periclitante
na Guiné, desgastante em Moçambique e menos preocupante em Angola, onde as dissensões ente
a FNLA, MPLA e UNITA acabaram por beneficiar as autoridades portuguesas. Na Guiné, em 1973, o
PAIGC, recorrendo a armamento soviético (misseis terra-ar) acabava com a vantagem da aviação
portuguesa e punha seriamente em causa o controlo português da região. Em Moçambique a
«operação nó górdio» com que o General Kaúlza de Arriaga pretendeu imobilizar a Frelimo, teve
apenas o efeito adverso de dispersar geograficamente a ação da insurgência que passou a ameaçar
territórios de forte colonização branca, criando um desgaste que a longo prazo se previa
insustentável. Isto a despeito do menor enfoque mediático que a guerra colonial portuguesa teve
em virtude da maior importância atribuída pela comunidade internacional a outros conflitos
localizados no contexto da Guerra Fria.
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Preso de movimentos, incapaz de iniciativas cabais para resolver a questão colonial, (Marcelo
Caetano chegou a ponderar o reconhecimento da independência da Guiné, mas temeu o efeito
negativo que isso pudesse ter em Angola e Moçambique) o marcelismo deixou-se enredar num
imobilismo que tarde e, por isso mesmo, atabalhoadamente será desbloqueado após o 25 de Abril
de 1974 e o fim do Estado Novo.
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