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LINGUAGENS EM DEBATE

DISCURSO, LÉXICO, SOCIOLÍNGUÍSTICA,


LÍNGUÍSTICAS COGNITIVA E APLICADA
Editora Appris Ltda.
1.ª Edição - Copyright© 2021 dos autores
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Catalogação na Fonte
Elaborado por: Josefina A. S. Guedes
Bibliotecária CRB 9/870

L755l Linguagens em debate : discurso, léxico, sociolínguística,


2021 línguísticas cognitiva e aplicada / Gilberto Nazareno Telles Sobral,
Maria da Conceição Reis Teixeira, Valquíria Claudete Machado
Borba (orgs.). - 1. ed. - Curitiba : Appris, 2021.
211 p. ; 23 cm. – (Linguagem e literatura).

Inclui bibliografia.
ISBN 978-65-250-1472-2

1. Linguística. 2. Análise de discurso. 3. Lexicografia. 4. Sociolinguística.


I. Sobral, Gilberto Nazareno Telles. II. Teixeira, Maria da Conceição Reis.
III. Borba, Valquíria Claudete Machado. IV. Título. V. Série.

CDD – 410

Livro de acordo com a normalização técnica da ABNT

Os custos deste livro foram financiados pelo Propós/Uneb/PPG

Editora e Livraria Appris Ltda.


Av. Manoel Ribas, 2265 – Mercês
Curitiba/PR – CEP: 80810-002
Tel. (41) 3156 - 4731
www.editoraappris.com.br

Printed in Brazil
Impresso no Brasil
Gilberto Nazareno Telles Sobral
Maria da Conceição Reis Teixeira
Valquíria Claudete Machado Borba
(org.)

LINGUAGENS EM DEBATE
DISCURSO, LÉXICO, SOCIOLÍNGUÍSTICA,
LÍNGUÍSTICAS COGNITIVA E APLICADA
FICHA TÉCNICA
EDITORIAL Augusto V. de A. Coelho
Marli Caetano
Sara C. de Andrade Coelho
COMITÊ EDITORIAL Andréa Barbosa Gouveia - UFPR
Edmeire C. Pereira - UFPR
Iraneide da Silva - UFC
Jacques de Lima Ferreira - UP
ASSESSORIA EDITORIAL Cibele Bastos
REVISÃO Josiana Araujo
PRODUÇÃO EDITORIAL Romão Matheus
DIAGRAMAÇÃO Fernando Nishijima
CAPA Sheila Alves
COMUNICAÇÃO Carlos Eduardo Pereira
Karla Pipolo Olegário
LIVRARIAS E EVENTOS Estevão Misael
GERÊNCIA DE FINANÇAS Selma Maria Fernandes do Valle

COMITÊ CIENTÍFICO DA COLEÇÃO LINGUAGEM E LITERATURA


DIREÇÃO CIENTÍFICA Erineu Foerste (UFES)

CONSULTORES Alessandra Paola Caramori (UFBA) Leda Cecília Szabo (Univ. Metodista)
Alice Maria Ferreira de Araújo (UnB) Letícia Queiroz de Carvalho (IFES)
Célia Maria Barbosa da Silva (UnP) Lidia Almeida Barros (UNESP-Rio Preto)
Cleo A. Altenhofen (UFRGS) Maria Margarida de Andrade (UMACK)
Darcília Marindir Pinto Simões (UERJ) Maria Luisa Ortiz Alvares (UnB)
Edenize Ponzo Peres (UFES) Maria do Socorro Silva de Aragão (UFPB)
Eliana Meneses de Melo (UBC/UMC) Maria de Fátima Mesquita Batista (UFPB)
Gerda Margit Schütz-Foerste (UFES) Maurizio Babini (UNESP-Rio Preto)
Guiomar Fanganiello Calçada (USP) Mônica Maria Guimarães Savedra (UFF)
Ieda Maria Alves (USP) Nelly Carvalho (UFPE)
Ismael Tressmann (Povo Tradicional Rainer Enrique Hamel (Universidad do
Pomerano) México)
Joachim Born (Universidade de Giessen/
Alemanha)
APRESENTAÇÃO

Este livro reúne textos que apresentam estudos e resultados de pes-


quisas de discentes e docentes de programas de pós-graduação de univer-
sidades brasileiras que têm como foco o estudo de linguagens. Os estudos
aqui reunidos contribuem para o diálogo sobre questões que envolvem
linguagem, discurso e sociedade. A obra reúne 12 capítulos, além desta
apresentação, descritos a seguir.
No texto intitulado DISCURSO, RISO E HOMOFOBIA:
CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO E EFEITOS DE SENTIDO EM PIADAS
DE RENATO PIABA, os autores Ademario Jesus de Carvalho e Gilberto
Nazareno Telles Sobral buscam compreender como se dá o funcionamento das
condições de produção para a representação dos homossexuais masculinos,
em cinco recortes discursivos, e investigar como ocorre a constituição dos
efeitos de sentido homofóbicos emanados das piadas enunciadas no show
humorístico Loucuras de Verão (2007), em formato de stand up comedy de
Renato Piaba, extraído da plataforma YouTube, cuja temática central trata-se
da homossexualidade masculina, sob a perspectiva da Análise do Discurso
(AD) francesa filiada a Pêcheux, e às formulações de Bergson (2018), Freud
(1969) e Propp (1992) sobre a função social do humor e do riso. O estudo
pretende alcançar resultados que contribuam para a amplidão dos estudos
discursivos, os quais promovam uma reflexão acerca de como o discurso
humorístico corrobora para a propagação do preconceito por meio da
violência simbólica, verbal e física, que vitimiza muitos homossexuais em
nosso País.
Em O QUE QUEREM DE NOSSOS CORPOS?: DISCURSO,
COACHING E NEOLIBERALISMO, Rodrigo Barbosa Nascimento e Nilton
Milanez demonstram por meio do estabelecimento de séries discursivas
as regularidades que se depreendem da análise de 10 vídeos, veiculados
no youtube pelo coach brasileiro Wendell Carvalho, durante o período de
2020. Sendo assim, a fim de investigar o encadeamento discursivo entre
sujeito neoliberal e suas materialidades corporais, procedem com a teori-
zação, descrição e análise da seriação de audiovisualidades tais como os
cabelos, os pelos, as mãos, além da decifração do sistema de edição dos
vídeos. Verificam, portanto, ao final, de que maneira o estabelecimento de
séries enquanto método colabora para o entendimento do modo como o
coaching se configura e atravessa o corpus oeconomica enquanto figura
histórica, respondendo a uma ordem capitalista do mercado e da economia,
que submete o corpo a procedimentos de controle mascarados sob o nome
de liberdade.
Já em A CONSTRUÇÃO DO ETHOS FEMININO EM QUARTO DE
DESPEJO DE CAROLINA MARIA DE JESUS, Genilma Dantas Andrade
e Maria Leônia Garcia Costa Carvalho investigam como são construídos
os ethos femininos no livro Quarto de Despejo: diário de uma favelada, de
Carolina Maria de Jesus (2001). Tal proposta teve o objetivo de evidenciar
a distinção feita, pela própria autora, entre sua imagem e a das personagens
secundárias da obra. Por tratar-se o diário de um tipo de narrativa-depoi-
mento, ao tempo em que narra sua história, Carolina dá o testemunho da
vida da comunidade em que vivia com seus filhos utilizando-se, para tanto,
de uma linguagem em que prevalecem a oralidade e a subjetividade. Esta
pesquisa se fundamenta em autores que se voltam ao estudo do ethos, tais
como Maingueneau (1997; 2008), Aristóteles (2005), Amossy (2008) e Meyer
(2007), esses dois últimos pertencentes, respectivamente, à retórica e à nova
retórica. De acordo com Andrade e Carvalho, a autora constrói para si o
ethos de mulher inteligente, resistente, preocupada com sua dignidade e
consciente da sua realidade social.
Em OS FITOTOPÔNIMOS DO TERRITÓRIO DE IDENTIDADE
15: A FLORA NA TOPONÍMIA BAIANA, Caroline Pereira Bomfim e Celina
Márcia de Souza Abbade, tendo em vista que a nominação do espaço físico
engloba diferentes aspectos a partir da intencionalidade do sujeito, sejam
eles relacionados aos elementos presentes no ambiente ou não, e que o
estudo toponomástico de um lugar, nesse sentido, pode evidenciar as par-
ticularidades que compõem esses topônimos como a flora, por exemplo,
que, além de atribuir nomes aos vegetais, também serve como fonte de ins-
piração no batismo dos mais variados topônimos da região, compreendem
a relevância desse recurso na seleção de um nome, e revelam a análise dos
fitotopônimos – topônimos de índole vegetal – encontrados na hidronímia
do Território de Identidade 15, Bacia do Jacuípe, que aparece como uma
das taxes mais recorrentes de natureza física. Os pressupostos que nor-
teiam a referida análise são os da Toponomástica, subárea da Onomástica,
campo dos Estudos Lexicais responsável pelo estudo dos nomes próprios
de lugares. O corpus desse trabalho foi retirado dos mapas hidrográficos da
Superintendência de Estudos Econômicos e Sociais da Bahia – SEI, autarquia da
Secretaria do Planejamento (Seplan).
No texto LEXICULTURA: DIÁLOGOS PARA O ENSINO
DA LÍNGUA MATERNA, as pesquisadoras Jane Guimarães Sousa,
Karylleila dos Santos Andrade e Celina Márcia de Souza Abbade apre-
sentam uma discussão do vínculo existente entre léxico e cultura e suas
interfaces no ensino de língua materna, mais precisamente o ensino
com foco nas escolas das comunidades quilombolas e/ou indígenas. O
léxico vem como elemento primário, o qual aborda aspectos importantes
da língua/agem, contemplando discussões teóricas que visam analisar
a palavra em seus diferentes aspectos linguísticos, sócio-histórico e
cultural. Neste estudo, as autoras assumem que o léxico é indissociável
da cultura, a qual é concebida como um conjunto de práticas adquiridas
na sociedade, transmitida de gerações em gerações, e que essa relação
pode contribuir para o ensino de língua materna, isso porque o léxico
e a cultura são elementos teóricos capazes de refletir acerca da cosmo-
visão, identidade e particularidades linguísticas e extralinguísticas que
envolvem uma comunidade.
Em O ESTATUTO SINTÁTICO DE ORAÇÕES CAUSAIS:
CONSIDERAÇÕES FUNCIONALISTAS, Fabrício da Silva Amorim,
assumindo a perspectiva funcionalista que reconhece a gradualidade dos
processos de articulação de orações e a sua relação com a gramaticaliza-
ção, aborda a dimensão sintática da relação de causalidade, com vistas a
definir os critérios mais básicos e adequados para a descrição do estatuto
sintático de orações causais. Para tanto, considera que as estratégias de
articulação de orações distribuem-se em um continuum no qual cada
uma tem a sua posição definida pelo grau de integração sintática e de
(inter)dependência semântico-discursiva, conforme proposta de Hopper
e Traugott (1993): parataxe > hipotaxe > subordinação. Na investigação
apresentada pelo autor foram empreendidas análises que revelam quatro
critérios – considerados como propriedades sintático-discursivas – como
os mais basilares para a descrição do estatuto sintático de orações causais,
a saber: i) flexibilidade posicional da oração causal; ii) co-ocorrência de
conector causal e coordenativo; iii) clivagem e iv) segmentação prosódica
entre a oração causal e a oração nuclear.
Já em INTERFACE VARIAÇÃO-GRAMATICALIZAÇÃO: OS
USOS DE VOCÊ/CÊ E ESTÁ/TÁ NA FALA SOTEROPOLITANA,
Cristina dos Santos Carvalho, Rosane Bispo dos Santos e Viviane Marcelina
da Silva tratam da relação entre os processos de variação linguística e
mudança via gramaticalização a partir da análise de dois fenômenos
linguísticos: emprego das formas de expressão da segunda pessoa do
singular você e cê e realização do verbo estar no contexto do presente
do indicativo, nas suas formas fonológicas plena (está) e reduzida (tá).
Em consonância com Görski e Tavares (2017, p. 35), assumem o pressu-
posto de que “o tratamento da variação linguística pode ser aprimorado
com subsídios vindos de estudos sobre gramaticalização, assim como
a análise do processo de gramaticalização pode ser enriquecida com
informações provenientes de análises variacionistas”. Como corpus,
as autoras utilizaram dados empíricos de fala soteropolitana analisados
por Santos e Carvalho (2020) e Silva e Carvalho (2020), extraídos de
dezesseis inquéritos do banco de dados do Programa de Estudos sobre
o Português Popular de Salvador (PEPP).
Em A VARIAÇÃO DA REGÊNCIA DO VERBO IR (DE
MOVIMENTO) NO PORTUGUÊS POPULAR DE SALVADOR,
Marli Pereira Batista e Norma da Silva Lopes estudam a variação da
regência do verbo ir (de movimento), um fenômeno que apresenta três
variantes diferentes, as preposições a, para e em e identificam condicio-
namentos para a escolha que os falantes fazem na regência desse verbo
no português popular de Salvador. As autoras analisam a fala popular
soteropolitana, a partir das entrevistas do acervo Programa de Estudos
sobre o Português Popular Falado de Salvador (PEPP), composto por 48
inquéritos, gravados entre 1999 e 2000, tendo como suporte teórico-me-
todológico a Sociolinguística Variacionista e utilizando como programa
de análise estatística da variação linguística o Goldvarb X, para definir a
frequência e os pesos relativos das variantes e fatores das variáveis que
possibilitam observar os condicionamentos que se busca identificar, no
entendimento da escolha do falante.
Em REFLEXÕES SOBRE AS RELAÇÕES ENTRE LÍNGUA,
TEXTO E SOCIEDADE: CONTRIBUIÇÕES PARAA EDUCAÇÃO
LINGUÍSTICA NO BRASIL, Anna Christina Bentes visa contribuir
para as discussões sobre as relações inter/transdisciplinares quando se
trata de tematizar os múltiplos letramentos. Especificamente, busca dis-
cutir em que medida é possível postular, dentre os múltiplos letramentos
possíveis (ROJO, 2009), práticas de leitura e de escrita que impliquem
uma compreensão sociolinguística dessas mesmas práticas.
No texto VARIAÇÃO LINGUÍSTICA E AFINS EM PROJETO
PARA O ENSINO MÉDIO, Sandra Carneiro de Oliveira discute
contribuições da Sociolinguística para o ensino de língua portuguesa,
principalmente na compreensão da diversidade linguística, e apresenta
e discute resultados de um projeto didático realizado para duas turmas
do 1o ano do curso Integrado de Edificações (Ensino Médio Técnico)
no Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia - IFBA, campus
Salvador, Bahia, no ano de 2014, envolvendo a diversidade da língua por-
tuguesa e a variação linguística, que é parte, além de temas relacionados,
tratados pela Sociolinguística. Para a autora, relatar a proposição prática
visa contribuir para um campo necessário e ainda em desenvolvimento,
que é a adequação de teorias à prática pedagógica. Como metodologia
do projeto, Oliveira buscou preparar os estudantes com o estudo de
dois livros (leitura) para dar conta de tocar numa diversidade de temas
interrelacionados com a variação linguística, a fim de prepará-los para
a etapa seguinte, que foi empregar conceitos e entendimentos sobre a
língua portuguesa, especificamente sobre a compreensão de fatores sociais
e culturais na elaboração de um artigo em grupo com análise (escrita)
de um texto escolhido por eles que representasse a língua viva em uso,
preferencialmente na própria comunidade ou em redes sociais.
Em VARIAÇÃO LINGUÍSTICA E ENSINO, Jaqueline Pereira
Bittencourt e Valquíria Claudete Machado Borba, buscando contribuir
para um ensino de língua sensível às diferenças socioculturais em que
se possa superar mitos e consensos equivocados acerca dos fenômenos
linguísticos, propõem discutir o ensino de língua materna e o que diz a
BNCC sobre o ensino da variação linguística, trazendo reflexões sobre o
lugar da variação linguística nas aulas de língua portuguesa. As autoras
apresentam uma análise da abordagem do tratamento da variação linguís-
tica em um módulo didático de língua portuguesa de 6º. Ano do Ensino
Fundamental disponibilizados pela Rede UNOi Educação.
No texto O FRAME SEMÂNTICO COMO FERRAMENTA
PARA O ESTUDO SOCIOCOGNITIVO SOBRE AS
CONCEPTUALIZAÇÕES DE ESCRAVO E ESCRAVA EM
ANÚNCIOS DO ESTADÃO, NO SÉCULO XIX, Luciel Pereira de
Jesus e Elisângela de Santana Santos discutem o aparato teórico que
emoldura a compreensão acerca das conceptualizações em anúncios de
compra, venda, aluguel e captura de homens e mulheres escravizados.
Trata-se de uma abordagem conhecida como Semântica de Frames,
uma teoria proposta por Fillmore em 1977 que considera os fatores cul-
turais e o contexto em que os fatos ocorrem para a materialização das
estruturas cognitivas, como as metáforas e metonímias conceptuais. O
trabalho está sustentado pelo paradigma epistemológico da Linguística
Cognitiva e um de seus modelos, a Semântica de Frames. Os autores
buscam mapear os domínios conceptuais, bem como os fatores culturais
e o contexto subjacentes às manifestações metafóricas e metonímicas
e as suas inter-relações nas concepções de escravo em cinco anúncios
de comercialização e negociação de negros escravizados, no jornal O
Estadão, do século XIX. Para isso, averiguam, através da Semântica de
Frames, em que medida o contexto sociocultural em que esses anúncios
foram produzidos interfere nas conceptualizações encontradas.

Gilberto Nazareno Telles Sobral


Maria da Conceição Reis Teixeira
Valquíria Claudete Machado Borba
SUMÁRIO

DISCURSO, RISO E HOMOFOBIA: CONDIÇÕES DE PRODUÇÃO


E EFEITOS DE SENTIDO EM PIADAS DE RENATO PIABA . . . . . . . . . . . . . . 13
Ademario Jesus de Carvalho, Gilberto Nazareno Telles Sobral

O QUE QUEREM DE NOSSOS CORPOS? DISCURSO, COACHING


E NEOLIBERALISMO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 29
Rodrigo Barbosa Nascimento , Nilton Milanez

A CONSTRUÇÃO DO ETHOS FEMININO EM QUARTO DE DESPEJO


DE CAROLINA MARIA DE JESUS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 47
Genilma Dantas Andrade, Maria Leônia Garcia Costa Carvalho

OS FITOTOPÔNIMOS DO TERRITÓRIO DE IDENTIDADE 15:


A FLORA NA TOPONÍMIA BAIANA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 63
Caroline Pereira Bomfim, Celina Márcia de Souza Abbade

LEXICULTURA:
DIÁLOGOS PARA O ENSINO DA LÍNGUA MATERNA . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 81
Jane Guimarães Sousa, Karylleila dos Santos Andrade, Celina Márcia de Souza Abbade

O ESTATUTO SINTÁTICO DE ORAÇÕES CAUSAIS:


CONSIDERAÇÕES FUNCIONALISTAS . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 95
Fabrício da Silva Amorim

INTERFACE VARIAÇÃO-GRAMATICALIZAÇÃO: OS USOS


DE VOCÊ/CÊ E ESTÁ/TÁ NA FALA SOTEROPOLITANA . . . . . . . . . . . . . . . . . 111
Cristina dos Santos Carvalho, Rosane Bispo dos Santos, Viviane Marcelina da Silva

A VARIAÇÃO DA REGÊNCIA DO VERBO IR (DE MOVIMENTO)


NO PORTUGUÊS POPULAR DE SALVADOR . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 129
Marli Pereira Batista, Norma da Silva Lopes

REFLEXÕES SOBRE AS RELAÇÕES ENTRE LÍNGUA, TEXTO


E SOCIEDADE: CONTRIBUIÇÕES PARA A EDUCAÇÃO LINGUÍSTICA
NO BRASIL. . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 147
Anna Christina Bentes

VARIAÇÃO LINGUÍSTICA E AFINS EM PROJETO


PARA O ENSINO MÉDIO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 163
Sandra Carneiro de Oliveira
VARIAÇÃO LINGUÍSTICA E ENSINO . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 181
Jaqueline Pereira Bittencourt, Valquíria Claudete Machado Borba

O FRAME SEMÂNTICO COMO FERRAMENTA PARA O ESTUDO


SOCIOCOGNITIVO SOBRE AS CONCEPTUALIZAÇÕES DE ESCRAVO
E ESCRAVA EM ANÚNCIOS DO ESTADÃO, NO SÉCULO XIX . . . . . . . . . . 199
Luciel Pereira de Jesus, Elisângela de Santana Santos

SOBRE OS AUTORES . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 215


VARIAÇÃO LINGUÍSTICA E AFINS EM PROJETO
PARA O ENSINO MÉDIO
Sandra Carneiro de Oliveira

1 INTRODUÇÃO

Tornar o ensino de língua portuguesa mais eficiente e antenado com


os estudos da linguística é uma tarefa em curso há décadas. Não se trata
de um trabalho simples, pois é necessário a adequação dos resultados de
pesquisas sobre a língua para os níveis de ensino, considerando questões
pedagógicas diversas. O ensino, necessariamente, abarca conhecimentos
de diferentes campos da linguística e da literatura, o que se configura num
enorme desafio não só para o professor da educação básica, mas para todos
que lidam com o ensino. Desse modo, as mudanças necessárias são lentas
e dependem diretamente da formação oferecida nos cursos de licenciatura
em Letras e da formação continuada, por meio de cursos de pós-graduação,
da extensão universitária e de modalidades oferecidas pelas redes de ensino
do país. Podemos dizer que a realidade do ensino está para a da língua: é
heterogênea, variável, há mudanças em curso e reflete o conjunto de seus
profissionais.
Adequar as contribuições da linguística para o ensino se constitui
num campo aberto ou em formação. Trabalhos que se proponham a pensar
metodologias e estratégias pedagógicas são necessários e não se trata de
criar receitas, mas funcionam, sobretudo, como exemplo, inspiração, troca e
reflexão. Nesse sentido, a apresentação/discussão da proposta busca fomen-
tar o diálogo com professores de língua portuguesa atuantes na educação
básica e com estudantes dos cursos de licenciatura em Letras.
São dois os objetivos propostos nesse texto: a) discutir contribuições
da Sociolinguística para o ensino de língua portuguesa, principalmente na
compreensão da diversidade linguística, e b) apresentar e discutir resul-
tados de projeto didático realizado para duas turmas do 1o ano do curso
Integrado de Edificações (Ensino Médio Técnico) no Instituto Federal de
Educação, Ciência e Tecnologia - IFBA, campus Salvador, Bahia, no ano de
2014, envolvendo a diversidade da língua portuguesa e a variação linguís-
tica, que é parte, além de temas relacionados, tratados pela Sociolinguística.
163
GILBERTO NAZARENO TELLES SOBRAL,
MARIA DA CONCEIÇÃO REIS TEIXEIRA & VALQUÍRIA CLAUDETE MACHADO BORBA (ORG.)

Neste trabalho, pelo seu teor sintético, algumas contribuições da


Sociolinguística para o ensino estão após a introdução e ao longo do texto.
Em seguida, passa-se à proposição prática, mostrando as etapas de planeja-
mento, o desenvolvimento da sequência didática realizada com as turmas,
uma análise dos seus resultados (com uma amostra das produções escritas
dos estudantes) e a avaliação do projeto. Na sequência, estão as conside-
rações finais.

2 SOCIOLINGUÍSTICA E ENSINO

A sociolinguística estuda a língua considerando sua estreita ligação


com a sociedade em que seus falantes estão inseridos. Mas não trata apenas
das relações entre língua e sociedade (BRIGHT, 1974; CAMACHO, 2003),
pois considera tanto uma quanto outra como sendo uma estrutura. Sua
maior contribuição inicial foi a percepção de que as línguas não podem
ser tratadas como sendo uniformes, heterogêneas em sua estrutura. Deste
modo, seu objeto de estudo é a diversidade linguística, a língua em uso, a
variação e a mudança linguística, a partir de dois pontos de vista: o diacrô-
nico (histórico) e o sincrônico (temporal). Através do estudo diacrônico, o
pesquisador estabelece comparações, podendo perceber a mudança. Já do
ponto de vista sincrônico, é possível observar a variação. Nas palavras de
Bright (1974, p. 17), “a tarefa da sociolinguística é, portanto, demonstrar a
covariação sistemática das variações linguística e social, e, talvez, até mesmo
demonstrar uma relação causal em uma ou outra direção”.
A teoria da variação e da mudança é a base da metodologia variacio-
nista (LABOV, 2008 [1972]; TARALLO, 1985). O método estatístico para o
estudo de regras variáveis (SANKOFF, 1988) veio contribuir para esta teoria
permitindo análises que dão apoio aos estudiosos da área no trabalho de
investigar e conhecer a língua tal como ela é utilizada pelos seus usuários.
Contrário ao estruturalismo saussureano, que separava drasticamente
sincronia e diacronia, a sociolinguística representou um novo olhar para
o fato linguístico, mostrando, dentre outros aspectos, que todas as línguas
variam e que a variação é possível de ser sistematizada.
Embora a Sociolinguística seja uma disciplina nova, fundada na década
de 1960, nos Estados Unidos, e seus trabalhos só tenham sido iniciados,
no Brasil, uma década depois (FIAD, 2004), é importante notar que com o
interesse, o empenho e a qualidade dos trabalhos de inúmeros pesquisadores
brasileiros nesta área, dispomos de uma produção acadêmica significativa.
164
LINGUAGENS EM DEBATE: DISCURSO, LÉXICO, SOCIOLÍNGUÍSTICA,
LÍNGUÍSTICAS COGNITIVA E APLICADA

A área de ensino de Sociolinguística e Ensino é mais recentemente e surgiu


da incorporação de temas voltados para o ensino de língua portuguesa como
língua materna, como a diversidade linguística, as variedades linguísticas,
a necessidade de combater o preconceito linguístico e a compreensão da
variação linguística. A inserção das temáticas citadas nos Parâmetros Curri-
culares Nacionais (BRASIL, 1998) e nos livros didáticos fez clarear a tarefa
de repensar as concepções de língua que circulam nas escolas. Nessa área,
destacam-se Bortoni-Ricardo (2004; 2005) e Bagno (2007 [1999]), com publi-
cações que unem sociolinguística e ensino, a Sociolinguística Educacional,
para Bortoni-Ricardo, mas também há contribuições diversas espalhadas
de muitos linguistas. Reunir as contribuições da Sociolinguística para a
área de ensino é um trabalho importante que ainda precisa ser realizado.
Faraco (2020) apresenta passos para incluir no ensino de língua
portuguesa a pedagogia da variação, começando por apresentar aos alunos
a realidade heterogênea da língua e mostrar que esta é espelho da hetero-
geneidade da sociedade.
Nesse sentido, entender a heterogeneidade da língua que
falamos é também, por consequência, entender a sociedade
em que vivemos: a sua história, a sua cara socioeconômica
e sociocultural e entendê-la criticamente, desenvolvendo a
concepção de que os estigmas que recaem sobre algumas
variedades se assentam num conjunto de valores sociocul-
turais constituídos historicamente. (FARACO, 2020, s. p.).
Para isso, o autor sugere o ensino através de projetos didáticos trans-
disciplinares, envolvendo língua, história e sociologia, para o que há vasto
material. O trabalho que aqui apresentamos buscou contemplar a compreen-
são da língua enquanto reflexo da sociedade, da cultura e da história.

3 PROPOSTA DIDÁTICA

Como o ensino de língua materna visa aperfeiçoar o idioma, adequan-


do-o às necessidades interacionais, o exercício de reflexão é base necessária
do trabalho. Como nos diz Castilho (2013),
[...] a língua é para a reflexão, não para a estéril decoração
de regras, é para a viagem ao interior de nossas mentes, não
para a realização de exercícios gramaticais burocráticos. A
língua é sobretudo para o percurso pessoal, não apenas para
o curso escolarizado. Língua é liberdade, não é submissão.

165
GILBERTO NAZARENO TELLES SOBRAL,
MARIA DA CONCEIÇÃO REIS TEIXEIRA & VALQUÍRIA CLAUDETE MACHADO BORBA (ORG.)

Refletir sobre a língua materna é o primeiro passo para a


formação da mentalidade científica. É também um grande
passo para a formação de uma cidadania ativa, participadora,
indispensável às sociedades democráticas. (CASTILHO, 2013,
p. 14-15, grifos do autor).
Como metodologia do projeto, buscou-se instrumentalizar os estu-
dantes com o estudo de dois livros (leitura) para dar conta de tocar numa
diversidade de temas interrelacionados com a variação linguística, a fim de
prepará-los para a etapa seguinte, que foi empregar conceitos e entendi-
mentos sobre a língua portuguesa, especificamente sobre a compreensão de
fatores sociais e culturais na elaboração de um artigo em grupo com análise
(escrita) de um texto escolhido por eles, que representasse a língua viva em
uso, preferencialmente, na própria comunidade ou em redes sociais.
O projeto em questão foi pensado para tratar de temas previstos na
I unidade letiva do programa do 1o ano do curso Integrado de Edificações
(Ensino Médio Técnico) do IFBA, definidos por uma comissão de profes-
sores da área de língua portuguesa, tais como: leitura e interpretação de
texto, texto literário e não literário, linguagem, discurso e texto, língua e
linguagem: fala e escrita, língua como conhecimento sociocultural, unidade
e variedade da língua: os vários usos, formação do português brasileiro:
influências europeias, africanas e indígenas e características do português
brasileiro.
As turmas do 1o ano do Integrado são formadas, majoritariamente,
por alunos residentes na capital, mas também por moradores de cidades
da região metropolitana, que concluíram o 9o ano em diferentes escolas, e
por alunos que estão repetindo a série no IFBA. A carga horária de Língua
Portuguesa é de 4 horas/aulas semanais, divididas em dois dias da semana.
Com o desenvolvimento do projeto, espera-se que os estudantes
possam: a) perceber a indissociabilidade entre língua e realidade social; b)
refletir sobre a concepção de língua para a Sociolinguística (é heterogênea,
variável, mutável e reflete aspectos sociais, históricos e culturais das comu-
nidades de fala e de seus falantes); c) compreender o português brasileiro
como um conjunto de variedades que reflete a pluralidade social, histórica e
cultural do país; d) estudar a língua viva, por meio de textos que circulam na
comunidade, pela análise de fotografias de placas, muros, prints de interação
em redes sociais, áudios, vídeos, dentre outros. “Temos de fazer um grande
esforço para não incorrer no erro milenar dos gramáticos tradicionalistas
de estudar a língua como uma coisa morta, sem levar em consideração as
166
LINGUAGENS EM DEBATE: DISCURSO, LÉXICO, SOCIOLÍNGUÍSTICA,
LÍNGUÍSTICAS COGNITIVA E APLICADA

pessoas vivas que a falam” (BAGNO, 2007 [1999], p. 9); e) compreender


que estudar língua materna tem duas vertentes importantes: 1) aprender as
variedades de prestígio é importante para acessar espaços que são requisita-
das; 2) compreender que as variedades desprestigiadas socialmente devem
ser respeitadas e valorizadas, uma vez que, ao desrespeitar uma língua ou
uma variedade linguística, se desrespeita os sujeitos que a utiliza; f) refletir
com a leitura de textos teóricos da Sociolinguística para adquirir conheci-
mentos, realizar discussões e análises críticas; g) realizar a produção, oral e
escrita, contextualizada e situada nas formas dos gêneros artigo científico
e exposição oral; h) saber que “[…] não existe falante de estilo único: todo e
qualquer indivíduo varia a sua maneira de falar, monitora mais ou menos
o seu comportamento verbal, independentemente de seu grau de instrução,
classe social, faixa etária etc. (BAGNO, 2007, p. 45-46, destaques do autor)”
e que o monitoramento da escrita vai depender do grau de letramento do
indivíduo; i) reconhecer a importância do monitoramento linguístico e da
consciência linguística e discursiva. Na sala de aula, o monitoramento lin-
guístico contribui para a melhoria da produção textual, para o planejamento
da fala e da articulação do discurso, o que é alcançado, em alguma medida,
por quem reflete sobre a língua e sobre as ações do homem no mundo, mas
que depende da condição do falante com relação ao nível de letramento.
Como diz Bortoni-Ricardo (2008, p. 62), “às vezes uma pessoa reconhece
que a situação é formal, dispõe-se a monitorar-se, mas lhe faltam recursos
comunicativos próprios da fala monitorada”; j) assumir a produção textual
como necessidade social, como lugar de fala e de direito; k) conceber a
literatura como arte, estética, representação cultural, social, histórica e
sua produção deve, inclusive, ser experimentada, estimulada, orientada
e desenvolvida na escola.

4 A ESCOLHA DOS TEXTOS

O texto “Quem num tem emelho, ximba” foi dado como de autoria
desconhecida24 e circulou em inúmeros meios na internet. É uma espécie de
conto em formato de e-mail e foi escolhido por algumas razões, dentre elas:
a) apresenta muitos traços da variedade linguística dos soteropolitanos das
periferias e traz descrições desse contexto; b) a situação descrita no texto é
24
No blog http://fafo1975.blogspot.com/2009/, o autor Fafo declara a autoria do texto: “É um texto meu, com
a colaboração do meu amigo Fábio Bastos. Fora, de fato, escrito aos 03 de Novembro de 2000 na então ‘Sala de
Iniciação Científica’ dos estudantes de graduação em Geofísica, no Instituto de Geociências da UFBA, cidade
do São Salvador da Bahia.”

167
GILBERTO NAZARENO TELLES SOBRAL,
MARIA DA CONCEIÇÃO REIS TEIXEIRA & VALQUÍRIA CLAUDETE MACHADO BORBA (ORG.)

bastante inusitada; c) por ser um bom exemplo de texto literário; d) o humor


presente no texto funciona como um convite aos estudantes, motivando
o interesse pela leitura; e) embora não seja uma amostra da interação real,
permite relacionar aspectos sociais que interferem no língua.
A leitura de artigos e de capítulos da Sociolinguística fará com que
os estudantes se apropriem de conhecimentos básicos e, adiante, possam
interpretar situações sociais envolvendo questões linguísticas. Foram sele-
cionados dois livros para este projeto: O livro Preconceito linguístico: o que
é, como se faz, de Marcos Bagno (1999) e o livro Português: um nome, muitas
línguas, organizado pela Secretaria de Educação a Distância do Ministério
da Educação para o Programa Salto para o Futuro, da TV Escola, com
consultoria especial do linguista Carlos Alberto Faraco (BRASIL, 2008),
os quais foram lidos e debatidos pelos/com os estudantes. O primeiro, por
ser um livro-chave, um autor que há muito tem combatido o preconceito
linguístico, desmistificando questões como a confusão que se faz entre
gramática normativa e língua portuguesa, desconstruindo mitos em torno
da língua e dos falares e discutindo sobre posturas da sociedade e da escola
perante o ensino de língua portuguesa, ao passo que vai mostrando a visão
da ciência que estuda a linguagem humana, a linguística. O segundo, por
agrupar uma coletânea (BRASIL, 2008) de artigos de diferentes linguistas:
Carlos Alberto Faraco, Silvio Renato Jorge, Dante Lucchesi, Ana Maria Stahl
Zilles e Stella Maris Bortoni-Ricardo e apresentar temáticas variadas em
linguagem simples, clara e direta, tais como português, normas, multilin-
guismo, variabilidade, cultura, diversidade, desigualdade linguística, histó-
ria, hegemonia, línguas faladas no Brasil, identidade linguística, português
popular, intolerância, escola, variedades faladas e escritas, dentre outros.

5 A SEQUÊNCIA DIDÁTICA

Na sequência didática planejada, buscou-se aproveitar o tempo das


aulas para os alunos realizarem parte da leitura e da escrita. Já a correção
dos trabalhos em grupo pela professora aconteceu em sala, o que funcionou
bem, permitindo trabalhar problemas de níveis diferentes (DOLZ, NOVER-
RAZ, SCHNEWULY, 2004). Cada turma contava com cerca de 40 alunos.
O planejamento foi organizado em torno de 14 encontros de 2 h/a
e as seguintes etapas:
1: Leitura, interpretação e produção textual (análise textual). Apre-
sentação do projeto aos estudantes; Leitura silenciosa do texto “Quem num
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LINGUAGENS EM DEBATE: DISCURSO, LÉXICO, SOCIOLÍNGUÍSTICA,
LÍNGUÍSTICAS COGNITIVA E APLICADA

tem emelho, ximba”; Leitura dramatizada em voz alta, pela professora (ou
algum aluno que se voluntarie); Discussão do texto (Interpretação partindo
do mais geral para o mais específico: solicitar impressões gerais, comentários
e chegar aos detalhes da linguagem);
2: Orientações para produção escrita de análise textual; Escrita da
análise, em sala. Entrega da análise pelos estudantes. Divisão da turma para
leitura do conteúdo do livro “Preconceito linguístico: o que é, como se faz”
(BAGNO, 2007 [1999], p. 1-67) e grifar pontos principais; Apresentações.
Discussão após cada apresentação, mediada pela professora.
3: Devolução de análises corrigidas pela professora e apresentação
de proposta de produção de um pequeno artigo em grupos, com análise.
Orientar os estudantes a selecionarem um texto (vídeo, imagem, print de
postagem, fala etc.) por grupo, para a produção do artigo com os temas
que estão sendo estudados; Divisão do livro Português: um nome, muitas
línguas (BRASIL, 2008) pelos membros da equipe, de modo que cada estu-
dante leia um artigo a fim de compreender o tema da variação linguística
e outros relacionados e possa utilizar em citação direta e indireta ao longo
da produção textual.
4: Orientações. Artigo, citação e referência; Entrega de cópias: Livro
de Bagno e do MEC (BRASIL, 2008), normas de citação (NBR 1052025) e
de referência (NBR 602326); Conversa sobre importância da organização
dos trabalhos acadêmicos, autoria, plágio e cuidados com textos selecio-
nados, como não mostrar imagens de pessoas ou dados que permitam a
identificação pessoal; Explicação dos formatos de citação direta e indireta,
conforme a NBR 10520: número de linhas, uso de aspas, paráfrase, margens
etc.; Construção da referência do livro e de um capítulo de livro, conforme
normas; Início da produção do artigo em sala.
5: Correção e orientações para reescrita. Primeira leitura e correção
de artigo de grupos pela professora em sala; Anotações pela professora
do andamento do trabalho de cada grupo e das orientações dadas para a
melhoria do texto; Atendimento para metade dos grupos por dia;
6: Última correção e orientações para apresentações orais. Segunda
leitura e correção de artigo de grupos pela professora em sala, apenas do
que foi alterado; Últimos ajustes; Orientações para apresentação oral dos
trabalhos, a acontecer nas próximas aulas.
25
ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 6023. Informação e documentação - Referências -
Elaboração. Rio de Janeiro, 2018. [A norma válida e utilizada no período foi a NBR 6023 de 2002].
26
ABNT - Associação Brasileira de Normas Técnicas. NBR 10520. Informação e documentação - Citações em
documentos - Apresentação. Rio de Janeiro, 2002.

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GILBERTO NAZARENO TELLES SOBRAL,
MARIA DA CONCEIÇÃO REIS TEIXEIRA & VALQUÍRIA CLAUDETE MACHADO BORBA (ORG.)

7: Apresentações, discussões e avaliação do projeto. Apresentação


de trabalhos; Discussões sobre os trabalhos; Entrega de versão final dos
artigos; Avaliação do projeto.

6 UMA AMOSTRA DAS ANÁLISES

Apresentamos, a seguir, o texto escolhido para iniciar o projeto e


utilizado para a primeira atividade de análise, realizada por toda a turma.

Figura 1 – Texto Quem nu tem emelho ximba


---------- Forwarded message ----------
Date: Fri, 3 Nov 2000 12:34:25 -0200
Subject: Quem nu tem emelho ximba

Aí galera,
Esse emelho é de Claudinei, mas aqui é Jonilson que tá falando. É porque eu não
tenho emelho aí ele me liberô pra escrevê no dele. E eu quero falá é sobre isso
mermo: emelho. A parada é o seguinte. Ôto dia eu tava procurando um serviço
no jornal aí eu vi lá uma vaga na loja de computadô, aí eu fui vê lá, colé de mermo.
Botei uma rôpa sacanage que eu tenho, joguei meu Mizuno e fui lá, a porra. Aí eu
cheguei lá, fiz a ficha que a mulé me deu e fiquei lá esperando. Nêgo de gravata
e as porra eu só “nada... tô cumeno nada!’’. Aí, eu tô lá sentado, pá, aí a mulé me
chama pa entrevista, lá na sala dela. Mulé boa da porra! Entrei na sala dela, sentei,
pá, aí ela começô: a mulé perguntano coisa como a porra, seu sabia fazê coisa como
a porra e eu só...’’sim sinhora, que eu já trabalhei nisso já”, jogano 171 da porra
na mulé e ela cumeno, a porra! Aí ela parô assim, olhô pra ficha e mim perguntô
mermo assim: “você mora aí, é ?’’, aí eu disse “é’’. Só que eu nun sô minino, botei o
endereço de um camarado meu e o telefone, que eu já tinha dado a idéa já pra ele
se ela ligasse pá ele dizê que eu sô irmão dele e que eu tinha saído, pra ela deixá
recado, que aí era o tempo dele ligá pro orelhão do bar lá da rua e falá comigo
ou deixá o recado que a galera lá dá. Eu nun vô dá meu enedreço que eu moro ni
uma bocada da porra! Aí a mulé vai pensá o que? Vai pensá que eu sô vagabundo
tomém, né pai... Nada! Aí, tá, a mulé só perguntano e eu jogando um “h’’ da porra
na mulé, e ela gostano vú... se abrindo toda... mulé boa da porra! Aí ela mim disse
mermo assim: “ói, mim dê seu emelho que aí quando fô pra lhe chamá...- a mulé já
ía me chamá já - ... quando fô pra lhe chamá, eu lhe mando um emelho.’’Aí eu digo

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LÍNGUÍSTICAS COGNITIVA E APLICADA

‘porra... e agora’ ?’’. Aí eu disse a ela mermo assim “ói, eu vou lhe dá o emelho de
um vizinho meu pra sinhora, que ele tem computadô, aí ele mim avisa’’. Mintira
da porra, que o cara mora longe como a porra e o computadô é lá do trabalho
dele, aí ele ía tê que mim avisá pelo telefone lá da rua. Aí, depois quando eu disse
isso, a mulé empenô. Sem mintira niua, ela me disse mermo assim: “aí, não: como
é que você qué trabalhá ne loja de computadô e não tem emelho?” . Aí ela bateu
no meu ombro assim e disse “Ói, hoje em dia, quem num tem emelho, ximba!’’,
falô mermo assim, véi, a miserave da mulé. Miserave! Mas aí, eu ía fazê o que, véi?
Aí uns dias depois eu acabei conseguindo um seviço de ajudante de predero: um
pau da porra! Eu pego 7 hora da manhã e leva direto, a porra, de 7 a 7, aí meio dia
para pra almuçá, comida fêa da porra, e acabô o almoço nun discansa não, volta pro
seviço. É pau, vú véi... é pau viola mermo. É por isso que eu digo, é como a mulé
disse: “quem nun tem emelho, ximba!’’. É isso aí. Os cara que nun recebero esse
emelho vai ximbá, na moral, dá um pau da porra, quando chgá fim de mês,recebê
uma merreca. Agora pra você que recebeu esse emelho, eu vô lhe dá a idéa, ói,
vá lá na loja que ainda tem a vaga! Já fui! Esse emelho é de Claudinei, mas aqui é
Jonilso que tá falando. Valeu!
Jonilso.
Fonte: http://fafo1975.blogspot.com/2009/

Para orientar a interpretação em sala e a produção escrita da análise


posteriormente, foi elaborada uma lista de questões a serem consideradas:
1. Construa uma análise do texto “Quem nu tem emelho ximba!” (fazer
texto único) que contemple os seguintes tópicos: a) Resuma a situação:
O que é o texto, de que se trata... Comente a situação que o personagem
descreve no suposto e-mail; b) Quem seria o personagem Joniso? Qual
sua realidade social? (Onde mora? Qual o nível de escolaridade aparente?
Como se comporta? Como se veste?); c) Quais são os outros personagens
presentes no texto? (O que eles fazem? Como se comportam?); d) Jonilso
tinha os requisitos necessários para conseguir o emprego? Justifique; e)
A linguagem empregada é adequada ao gênero (e-mail)? O autor do texto
empregou um estilo de linguagem adequado à situação de comunicação
descrita (a entrevista de emprego)? A linguagem empregada pelo autor no
“e-mail” atende a sua necessidade de comunicação?
A figura a seguir é uma primeira versão da análise realizada por uma
estudante.
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Figura 2 – Amostra de análise

Fonte: Arquivo pessoal

Pelo texto apresentado, produzido após discussão orientada em sala,


podemos perceber algumas noções: sobre a relação entre língua e realidade
social (escolaridade, história de vida, redes sociais, papéis sociais), necessidade
de adequação linguística aos contextos de interação, língua como meio de
interação e comunicação e língua e avaliação social. Outros aspectos desta-
cados, em outras análises, foram erros ortográficos, o falar soteropolitano,
uso de gírias, escrita igual à fala informal. O texto é muito propício para a
reflexão sobre variação linguística e temas que se relacionam e a escolha
de iniciar a sua análise antes de leituras de teóricos se deu como estratégia
para motivar a introdução do tema.
Na etapa posterior, os estudantes realizaram a leitura dos dois livros
selecionados, escolheram um texto e produziram um pequeno artigo em
grupo, com uma análise fundamentada na Sociolinguística. A seguir, pas-
samos à apresentação de trechos de dois artigos dos estudantes, escolhidos
entre os mais detalhados. Cada turma formou sete grupos, totalizando
quatorze textos.
O primeiro artigo, produzido por cinco estudantes, analisou uma
postagem do Twitter, com o devido cuidado de omitir qualquer dado que
pudesse identificar a autoria, no caso, uma adolescente conhecida de um
dos membros.

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LINGUAGENS EM DEBATE: DISCURSO, LÉXICO, SOCIOLÍNGUÍSTICA,
LÍNGUÍSTICAS COGNITIVA E APLICADA

Figura 3 –Texto do Twitter

Fonte: Arquivo pessoal

No texto, tocaram em temas como a origem do português, a coloniza-


ção portuguesa no mundo e no Brasil, o contato entre indígenas e africanos,
o caráter heterogêneo da língua portuguesa e diferenças entre os idiomas
dos oito países em que é língua oficial, o português como língua majoritária
no nosso país multilíngue, escolas e educação linguística, diversidade, fala
e escrita, história social do Brasil, desigualdade, norma culta e popular e
variação linguística. Além dos traços da escrita, o tema pré-adolescente,
colocado com bom humor, certamente propiciou a escolha do texto pelos
estudantes.
Eis a análise apresentada no artigo:
Pela linguagem/escrita utilizada pela “personagem” do nosso
objeto de estudo é possível afirmar que, pelo menos, ela cursou
até a quinta serie e que, teoricamente, deveria saber escrever
conforme a norma culta. Sabe-se que hoje em dia, principal-
mente, os jovens utilizam uma linguagem mais informal para
que possa assim se “enturmar” em um mundo social onde a
maior parte das pessoas escrevem dessa forma informal por
ser mais fácil e porque nem todos tem uma condição que
lhes permite ter uma educação, tanto na escola quanto em
casa, de qualidade. Como conhecemos quem escreveu esse
status podemos afirmar que ela provém de uma condição
social e econômica não privilegiada. Sendo assim é mais fácil
entender o porque de tantos erros ortográficos (GRUPO 5,
TURMA 1811, grifos nossos).

173
GILBERTO NAZARENO TELLES SOBRAL,
MARIA DA CONCEIÇÃO REIS TEIXEIRA & VALQUÍRIA CLAUDETE MACHADO BORBA (ORG.)

Na interpretação dos estudantes (sem alteração da escrita), podemos


perceber: a) a tentativa de refletir sobre o nível de escolaridade da autora do
texto; b) a compreensão da relação entre língua e identidade, identificando a
preferência dos jovens por uma linguagem informal, o que atribuem à faci-
lidade e a falta de acesso à educação de qualidade, tanto doméstica quanto
escolar da maior parte da população brasileira. Neste último aspecto, con-
sideram a relação entre domínio das variedades desprestigiadas e condição
socioeconômica não prestigiada da autora.
Foi possível observar que os estudantes entenderam parcialmente a
complexidade que envolve a aquisição da norma culta, e que o tempo de
estudos não foi suficiente para compreenderem a distinção entre os con-
ceitos de norma culta e norma padrão, o que é aceitável, pois o domínio
da temática exige tempo maior de estudo, inclusive entre graduandos e
graduados. Há uma contradição na análise: iniciam afirmando que uma
estudante do 6° ano deveria escrever conforme a norma culta e finalizam
compreendendo que os erros ortográficos têm relação com a condição
socioeconômica da autora do texto.
Na análise mostrada, podemos perceber que a escrita dos estudantes
também apresenta desvios da norma padrão: faltou acentuar série, falta a
marca de plural em possam, falta de acento em têm, falta de acento em o
porquê e ausência de vírgulas. Observamos, assim, duas situações distintas:
a compreensão que o grupo apresenta do assunto e o próprio processo de
aquisição da variedade padrão (ou norma de referência), conforme Faraco
(2020). A norma de referência foi objeto de ensino, considerado na correção
de cada texto, mas sua aprendizagem é um processo contínuo, que perma-
nece durante todo o percurso escolar. Os estudantes não irão modificar
seu modo de escrever só por conhecerem e estudarem variantes-padrão. A
escrita dos jovens estudantes constitui um registro da variedade linguística
do seu tempo, com traços da sintaxe e do léxico, por exemplo, marcados
pela história pessoal e social.
O segundo artigo, de um grupo de seis estudantes, analisou a placa
de um restaurante popular em Salvador, Bahia.

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LINGUAGENS EM DEBATE: DISCURSO, LÉXICO, SOCIOLÍNGUÍSTICA,
LÍNGUÍSTICAS COGNITIVA E APLICADA

Figura 4 – Placa/cardápio

Fonte: Arquivo pessoal

Na análise produzida, refletiram sobre a plurilinguismo e a diver-


sidade linguística do português, sobre tolerância, preconceito linguístico,
português como língua internacional, aspectos históricos que influenciaram
a formação do português brasileiro, competência comunicativa, escola,
diferenças entre norma culta e norma popular, dentre outros, através de
citações diretas e indiretas dos livros destinados para o projeto.
A análise do texto escolhido deu conta de explicar - de modo simples,
delicado e em estilo original, próprio dos aprendentes do ensino médio - que
a ausência de marcas de concordância é uma das características do português
popular, o das pessoas que trabalham duro, têm poucas oportunidades e
merecem todo respeito.

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GILBERTO NAZARENO TELLES SOBRAL,
MARIA DA CONCEIÇÃO REIS TEIXEIRA & VALQUÍRIA CLAUDETE MACHADO BORBA (ORG.)

Na imagem escolhida pela equipe, temos um exemplo básico


de como a maneira de falar pode interferir, negativamente, no
modo de escrever. A imagem é a placa de um restaurante para
classes populares, que está localizado no bairro do Politeama.
Analisando-a, podemos perceber que a expressão a partir, está
escrita “apartir” e que há um erro de concordância na frase
“churrasco para duas pessoa”. O “Apartir” foi escrito dessa
maneira (aglutinada), pois quando falamos essa expressão,
não percebemos a separação das palavras, e para pessoas
mais humildes, com um baixo nível de escolaridade, é dessa
maneira que se deve escrever. Já na frase “churrasco para duas
pessoa”, ocorre um caso muito comum de variação diastrática,
pois a maioria das pessoas simples, têm dificuldade para fazer
a concordância singular-plural nas frases e por isso situações
como essa ocorrem. (GRUPO 1, TURMA 1812)
Neste último artigo, além da análise em si, os estudantes aprenderam
a construir síntese, citação direta e indireta, apresentando um panorama
dos principais temas estudados, mostrando seus entendimentos do tema
da variação e de outros que a explicam.

7 A AVALIAÇÃO DO PROJETO

Na etapa final, após a leitura dos artigos produzidos pelos alunos, a


apresentação dos trabalhos dos grupos em sala buscou garantir que todos
tomassem conhecimento das produções dos outros e avaliassem os conhe-
cimentos adquiridos ao longo do projeto. Notas foram atribuídas à versão
final, após o período de reescrita e reelaboração anterior.
Após cada apresentação, os estudantes eram convidados a comentar e
lançar perguntas aos colegas do grupo sobre a escolha do texto ou qualquer
questão da temática. A professora manteve-se como mediadora para escla-
recer dúvidas, complementar respostas e corrigir o que fosse necessário.
Os estudantes comentaram as escolhas dos colegas, tiveram curiosi-
dade sobre os locais retratados em fotografias, por exemplo, e demonstraram
interesse na linguagem e nas análises produzidas. Ao longo do projeto e
após cada apresentação de trabalho final, fizeram parte da rotina novas
observações e interpretações dos fenômenos analisados. Além disso, trou-
xeram relatos de experiências domésticas e pessoais (comentários a termos
utilizados pelos pais e avós, hábito próprio de corrigir a fala de colegas,
temas que começaram a ver de maneira diferente).
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O envolvimento dos estudantes mostrou o quanto eles aprenderam


sobre os temas, passando a observar as falas dos outros e a própria, a moni-
torar a própria escrita, a observar o cuidado estético com o texto, consi-
derando a finalidade e o gênero. Adicionalmente, o trabalho desenvolvido
proporcionou maturidade aos estudantes, ampliou as oportunidades de
conhecer o outro, o que promoveu a união da turma, enquanto acontecia
a imersão nos estudos.

8 CONSIDERAÇÕES FINAIS

É importante que o tema da variação linguística não seja tratado na


escola de modo isolado, pois, para chegar ao seu entendimento, é necessário
entendê-lo como parte da diversidade linguística, tema maior, que precisa
ser entendido na sua amplitude da relação com os aspectos sociais, históri-
cos, políticos e culturais, inclusive percebendo que seu alcance extrapola os
limites da linguística, ciência que apresenta interseções com a antropologia,
a sociologia, a geografia, a psicologia e a história.
O ensino por meio de projetos didáticos possibilita o trabalho com
as unidades de ensino da língua portuguesa - leitura/escuta, produção
oral/escrita/multimodal e análise linguística (a serviço das primeiras) - de
modo integrado e contínuo (sem fracionamento desnecessário e sem aulas
desconexas), tendo como princípio a centralidade do texto como objeto de
ensino-aprendizagem. Dois provérbios nos ensinam sobre aprender-fazendo
e sobre a importância da escrita, respectivamente: “Se decoro, esqueço; se
vejo, lembro-me; se faço, aprendo” (PROVÉRBIO CHINÊS - 4.000 a. C.) e
“Palavras voam, escritos ficam” (PROVÉRBIO LATINO).
Na metodologia de projetos, destaca-se a ampliação do tempo de
estudo de temas e/ou conteúdos, o que possibilita melhor compreensão,
mais tempo para observar as necessidades de aprendizagens dos alunos,
o aprofundamento de reflexões e análises, evitando a fragmentação no
processo de ensino-aprendizagem. Tais ganhos propiciam aos discentes
experiências significativas na construção de conhecimentos, enquanto os
docentes poderão verificar maior engajamento dos estudantes, melhor
compreensão do que estudam, maior estímulo, autonomia e envolvimento
com a pesquisa. O trabalho com projetos possibilita, inclusive, romper as
fronteiras disciplinares.
A começar pela concepção de língua da Sociolinguística, sua compreen-
são por parte do professor de língua portuguesa já implica uma possibilidade
177
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MARIA DA CONCEIÇÃO REIS TEIXEIRA & VALQUÍRIA CLAUDETE MACHADO BORBA (ORG.)

de ensino mais condizente com a realidade linguística e com os objetivos


do ensino de português como língua materna, dentre eles “Compreender
e usar a Língua Portuguesa como língua materna, geradora de significação
e integradora da organização de mundo e da própria identidade” (BRASIL,
2000). Os pressupostos da Sociolinguística estão em perfeita harmonia com
o pensamento freireano, quando afirma: “Enquanto prática desveladora,
gnosiológica, a educação sozinha, porém, não faz a transformação do mundo,
mas esta a implica” (FREIRE, 1997, p. 16).

REFERÊNCIAS

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Edições Loyola, 2007 [1999].
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BRASIL. Ministério da Educação. Português: um nome, muitas línguas. Salto para
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CAMACHO, Roberto Gomes. Sociolinguística: Parte II. In: MUSSALIN, Fernanda;


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