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E-termos: descricao e hipétese de classificacio Mafalda Antunes Susana Correia Rita Goncalves ILTEC 1, Nota introdutéria A observagiio dos neologismos, incluindo os neologismos de especialidade, permite dar conta da lingua em evolugic. A drea do Comércio Electrénico & bastante propfcia ao aparecimento de novas unidades terminolégicas, devido ao sen grande desenvolvimento na actualidade. Justifica-se, por isso, um estudo mais aprofundado de alguns fendmenos recorrentes na sua terminologia. A AIT {Associagdo de Informag%o Terminolégica) encontra-se a colaberar no Glossdrio Pan-Latino de Comércio Electrénico, um projecto da Rede Pan-Latina de Terminologia (Realiter), participando no estabelecimento dos equivalentes em lingua portuguesa para uma lista de unidades ierminolégicas. No decorrer desta investigacio, constatou-se a existéncia, em portugués, de um conjunto de termos — 08 quais denominaremos neste trabalho de e-termos — com uma estrutura particular, ocorrendo de modo recursivo € produtivo nesta rea. Partindo da constatagao deste fendmeno, procedeu-se 4 elaboragio de um corpus representative da estrutura e conceito subjacentes a estas formas, com base em livros ¢ revistas de especialidade, jornais e Internet. Com esta comunicagio, pretende-se apresentar os resultados de uma andlise das caracteristicas ortograficas, morfo-sintacticas e scmAnticas destas construgdes, tendo em conta o seu cardcter neolégico, isto é, 0 modo como estas “novas unidades Jexicais” surgem, se formam e se integram na lingua, Discutir-se-Zo alguns aspectos tedricos que conduzam a uma hipétese de classificagdo deste tipo de elementos. Assim, num primeiro momento explorar-se-4 0 caracter neolégico dos e-termos e, num segundo momento, procurar-se-4 fazer uma descrigao morfo- -sintactica deste tipo de unidades, bem como a sua classificagao tipolégica. 2. Neoiogia 2.1 Carécter neolégico dos e-termos Os e-termos apresentam uma estrutura que os particulariza em relagio aos itens lexicais comuns. No seu seio é possivel, ainda, distinguir diferentes tipos de unidades. Actas do XVI Encontro Nacional da Associagéo Pormguesa de Linguistica, Lisboa, APL, 2002, Pp. 121-130. ACTAS DO XVIET ENCONTRO NACIONAL Da APL Dado estarmos a trabalhar com ¢-fermos de cardcter neoldégico, contituiu-se um corpus de exclusfio com base em dicionérios de lingua recentes que se conside- rou melhor representatem o vocabulério activo da lingua portuguesa (Diciondrio da Lingua Portuguesa Contemporanea, da Academia das Ciéncias, ¢ 0 Diciondrio da Lingua Portuguesa, da Porto Editora.). Os itens tratados nesta comunicagao sii, portanto, apenas 0s nao atestado nesse corpus de exctusio!. Qs e-termos aparecem com alguma frequéncia em jornais e revistas (de espe- cialidade) e ainda na Inernet, meio que, de facto, se pode considerar o seu grande centro difusor. Nesta comunicagio entende-se por e-terma cada uma das unidades que aptesenta na sua estrutura a particula ¢ com o significado de electronicielectrénico (exemplos: eCommerce - por electronic commerce ~, comércio-e ~ por comércio electrénico, etc). Como € caracteristico das unidades neoldgicas, os e-termos revelam uma grande instabilidade que se reflecte a varios niveis: ao nivel da ortografia, uma vez que os aspectos tipogrdficos apresentam alguma variedade; ao nivel morfo- -sintéctico, uma vez que apresentam alguma especificidade relativamente 20 modo como sao farmados; por fim, ao nivel semantico, devido a facilidade com que estes termos sio sujeitos a extensdes semAnticas pata outros dominios da experiéncia (exemplos: e-professor t cultura-e). Trata-se de unidades aldgenas, uma vez que provém de um sistema linguistico estruturalmente diferente, sendo, portanto, dificitmente integraveis na lingua de chegada®. ‘As importagées de palavras podem constituir um enriquecimento para a lingua, j4 que permite a denominagio de conceitos até entio no formulados na lingua alvo. Os e-termos em particular sao termos de uma area de especialidade onde os movimentos de vocabulério entre linguas acompanham a importacao da produgio cientifica e técnica. 2.2 Formas de integragdo As palavras de origem estrangeira chegam as linguas a todo o momento, por via das ciéncias, das técnicas ¢ de outras realidades que nos rodeiam. Tratando-se este trabalho de um estudo da area do e-business, espera-se a ocorréncia de um elevado mimero de termos com origem anglo-saxGnica, cuja integragdo no portu- gués se processa de uma forma assistemitica A partida, os ¢-termas recolhidos sio, como seria de prever, maioritariamente substantivos € apresentam varios niveis de adaptag4o ao nosso sistema linguistico: — Empréstimos que sdo usados na sua forma original: e-Business, e-commerce. 1 Com base no trabalho de Alain Rey (1976), pode definir-se, sumariamente, neofogismo como unidade lexical nao atestada. no vocabulario activo da [fngua em causa, no estfdio imediatamente anterior 90 momento considerado. 2 Para o desenvolvimento dest terminographie et en neographie questio cf. Pierre Lerat (1987), “Le traitement des emprunts en In Cahiers de Lexicologie, nt $0, pp. 137-144. 122 E-TERMOS: DUSCRIGAO EHIPOTESE DF CLASSIFICAGAO ~ Construgées hibridas em que © nome se mantém na forma original ¢ é modificado por um adjectivo portugués: e-marketplaces horizontais. = Criagdo de equivalentes, respeitando a sintaxe do inglés: e-formagao, e-professor — Criagiio de equivalentes respeitando a sintaxe do portugui Cultura-e. cidadania-e, Como se verifica, a partir dos exemplos acima apresentados, estas formas siio utilizadas aleatoriamente, sem que haja uma sistematizagiio formal ou contextual. Este facto mostra que a integrac&o de alguns destes termos esté ainda numa fase inicial, até porque jd se verifica, num numero significativo de casos, a adaptagio destes termos aos sistemas fonolégico, morfolégico e sintactico do portugués. 3. E-Termos: Descrigio 3.1 O fenémeno e-mail: origem dos e-fermos em portugués Sabendo a constituigdo interna dos ¢-sermas, torna-se inevitdvel remeter para 0 termo e-mail, pois considera-se que este estd na origem de todo o “e-fenémeno”. A era informatica e 0 seu desenvolvimento espoletaram o uso massivo da Internet 2, consequentemente, possibilitaram o acesso a0 corrcio electrénico por parte de um grande ndmero de utilizadores, nao s6 pela sua vertente pratica e eficaz na comuni- cagiio, mas também por se ter tornado um fendmeno de moda. Qtermo e-mail é usado com grande frequéncia pelos falantes do portugués, uma vez que € mais econdmico e polissémico, constitui factor de prest{gio e, para além disso, 0 facto de néio existir uma politica de lingua que fomente o uso corrente de equivalentes no portugués fez com que o termo originalmente importado se expan- disse com mais facilidade relativamente ao seu correspondente correia elecirénico. © termo e-mail é tio frequentemente utilizado que rapidamente perdeu o seu estatuto de neologismo e apareceu atestado no Diciondrio da Lingua Portuguesa Contempardnea, da Academia das Ciéncias (2001), como uma abreviagio do inglés electronic mail. Esta ateslagio comprova a integragao do termo no vocabulario do Portugués. Por extensdo, surgem termos relacionados com actividades e negécios que se realizam a nivel electrinico, como e-business, e-commerce, e-learning, e-marketing, que a nivel das dreas de especialidade perdem o seu caricter alégeno e se tornam Iransparentes no sistema linguistico que os acolhe. 3.2 Expansio da estrutura dos e-termos Principalmente a partir do momento em que a comunicagao electronica se expandiu ¢ “invadiu” todos os dominios, 0S grupos sociais e as empresas com ramos de actividade que se encontram directa ou indirectamente ligados & rede tém 123 ACTAS DO XVIII ENCONTRO NACIONAL DA APL criado, importade e adaptado uma mutltiplicidade de termos para servir as suas necessidades ou, tao somente, para demarcar a sua posi¢ao ¢ importancia tanto a nivel social como econémico. Sendo a forma mais globalizante de comunicar, os termos usados siio familia- res a um grande niimero de individuos e tém a capacidade de remeter imediata- mente para uma realidade definida. A estrutura dos e-termos, sendo econémica eficaz, tem sido adoptada por varias dreas de actividade, sendo a particula e- de elecirenic, substituida por outras, como ¢- em “C-leamning” (classroom-learning), b- em (blended-learning), m- em (mobile-commerce ou multi-learning), t- em (transport-conimerce ou television- -commerce) ¢ i- em (informativo). No quadro seguinte pode verificar-se que, seguindo a estrutura dos e-rermos (particula por vezes seguida de hifen, mais um nome), surge um conjunto de outras possibilidades, mostrando a produtividade dessa estrutura: E-business e-Learning e-commerce e-business. E-Learning M-commerce e-Business C-Loaming m-commerce: e-Business mulll-canal Cleaming commerce e-Business optimizado Mleaming teommerce eBusiness B-leaming eComercio W-Businoss eformar ENegscio exformacao Devido &s vantagens que apresentam, estas formas tém sido amplamente utilizadas para nomear empresas directamente ligadas & Internet ou sitios. 3.3 Tipologia dos e-termos A lingua portuguesa revela alguma instabilidade no uso destes terms, preci- samente devido ao seu cardcter neolégico ¢ A auséncia de normativizacao linguis- tica, Adoptando um critério grafico, 6 possivel distinguir no corpus quatro tipos de e-termos: Tipo t ‘Tipo 2 Tipo 3 Tipe 4 e-business eBusiness cidadania-e Enigma e-Business multi-canal ebairro. Culurae empresa e-commerce eComércio camara-e E-gioo fe: TransformagZo eCRMARM nova-e e-ditorial 6: Negécio Emarketeor esporias-e | E-gov eBay canal “6” 124 E-TERMOS: DESCRICAO P HIPOTESE DE CLASSIFICAGAO Tipo 1 No tipo | verifica-se que os termos so utizados segundo a construgao original, onde e- (de electronic) aparece como primeiro elemento do composto ¢ 0 modifica- dor surge & esquerda do nucleo. No entanto, dentro deste tipo, é posstvel encontrar uma grande variedade de construgdes, considerando-se os seguintes subtipos: Subtipo 1: Termos importados do inglés (e- + base inglesa) Exemplos: e-business, e-commerce, e-transformation, e-learning, e-Government, e-procurement, e-tailing, e-location, e-banking, e-solutions, e-deliver, e-store, e-consulting, e-finantial. Subtipo 2: Termos que apresentam estrutura inglesa, mas em que o segundo termo do composto é portugués e em que o elemento e- é estrictamente parafrasedvel por electronica, Exemplos: E-Negdcio, eComércio, e-transfarmagdo, e-formagdo, e-formar, e professor, e-democracia. Subtipo 3: Termos que, tal como o subtipo 2, apresentam a estrutura inglesa, mas com o segundo elemento do composto em portugués. Exemplos: e-pipoca, e- futebol, e-tudo, e-bola, e-palco, e-especial. No entanto, e-pipoca nao significa uma “pipoca electrénica” (como um E-Negécio significa um negdcio electrnico), mas sim, um sitio na Intemet sobre cinema; 0 termo e-bola, niio significa uma “bola electrénica”, mas sim, um sitio na Internet sobre futebol, etc, Na pritica, o que se verifica € uma extensio semantica do elemento e-, que passa a ser parafrasedvel por “na Internet”. No Tipo 1 verifica-se, ainda, a ocorréncia de termos analisdveis em que ao e-termo se junta um adjectivo que qualifica todo o composto. Exemplos: e-Business multicanal, e-Business optimizado, e-marketplaces horizontais, e-Marketplaces Privados, e-Marketplaces ptiblicos, e-Marketplaces verticais, Finalmente, um caso, ainda, em que sé verifica uma “dupla truncagao”, constituida pela truncagio de electronic + a truncagao de government, originando o termo e-goy. Trata-se de um hapax que pode indiciar que a tentativa de redugio é tao fore que mesmo o segundo elemento do composto é truncado. O mesmo acontece com expressdes como disco-pub (discoteca + public house). 02 O tipo 2 consiste noutra variante gréfica, constituida por e-termos grafados sem hifen. Exemplos: eBusiness, ebairro, eComércio, eCRMARM, Emarketeer, eBay. Tipo 3 No tipo 3 verifica-se uma construgdo de acordo com a sintaxe do portugués, como em cidadania-e (por cidadania electrénica), passando 0 modificador a apare- cer 4 direita do nome. 125 ACTAS DO XVIII ENCONTRO NACIONAL DA APL. Tipo4 Os termos pertencentes A “familia ec” servem, neste momento, uma multiplici- dade de propésitos dentro da Rede. Sendo a sua forma grafica (e-...) imediatamente conotada com a Internet, é natural que muitos sitios de empresas ¢ outras entidades encontrem vantagens em nomear o seu espago digital utilizando um e-terma. No tipo 4 verifica-se que, para além da necessidade, a criatividade tem muito a dizer no mundo da comunicagiio e muitas palavras cuja representagiio ortografica comeca pelo fonema /e/ foram recriadas, resultando em formas como E-nigma, e-mpresa, E-gloo, e-ditoriat (cf. ponto 3.5). 3.4 Classificacio morfolégica Para uma melhor descrigio dos e-termos, deve comegar por definir-se se e- s€ trata de uma sbreviatura ou truncagdo do adjectivo electronic. Independentemente de a truncagio ser uma forma de abreviagao, & necessario distinguir, por exemplo, V. Ex." de metro. ‘Uma vez que, por vezes, se confundem os dois conceitos, esta distin¢io tomna- «se pertinente para a descrig%io morfoldgica apresentada mais adiante. ‘No Ambito da Paleografia, érea do saber A qual cabe estudar a origem, a forma a evolugda de toda a escrita, a abreviatura assume um papel de grande importan- cia. Assim, segundo Anténio Cruz (1987) “entende-se por abreviatura a redugao do ndmero de letras que compdem uma palavra, sem prejuizo da sua interpretagao.”" Cunha e Cintra (1984), por exemplo, parecem inserir truncagao e abreviatura naquilo a que chamam de “abreviagdo vocabular”, definida genericamente como “tedugdo de frases ¢ palavras até limites que nfo prejudiquem a compreensiio”, ¢ dio 0 exemplo de auto por automével ou dnibus por auto-dnibus. O mesmo acontece em Correia (no prelo), que apresenta como sinGnimos “truncagio ou abreviagio vocabular", definindo-os como “processo pelo qual a forma de uma palavra se reduz, tornando essa unidade mais facilmente utilizdvel”, dando os exemplos de metro por metropolitano € otorrino por otorrinolaringologista. O Diciondrio da Lingua Portuguesa Contemporanea considera, porém, abreviatura como a “representagiio de uma palavra ou expressiio com menos letras do que as da sua grafia normal. V. Ex." a abreviamira de Vossa Exceléncia. O Diciondria de Termos Lingutsticos, por seu lado, distingue ambos os conceitos. Define abreviatura como “grafia que permite economizar o espago ou 0 tempo necessérios para a escrita de uma palavra, mediante a omissfio de certas letras; as letras omitidas podem, eventualmente, ser substitufdas por um sinal convencional”. © mesmo diciondrio define truncagdo como o “proceso de redugdo de uma palavra sem alteragdo do scu significado ou da sua categoria sintactica” e dd como exemplos de truncagées, prof (por professor/a). facho (por fascista) e metro {por metropolitano). Ora, parece-nos que, por abreviatura se entende a redugdo, com alteragiio da forma e sequéncia gréfica, de uma palavra, de que so cxemplos Ex. (por 126 E-TERMOS: DESCRIGAO E HIPGTESE DE CLASSIFICAGAO excelentissimo), $r.¢ (por senbora) ou V. Ex” (por Vossa Exceléncia). Trata-se, sobretudo, de uma convencio grafica que ndo constitui um processo de criaglio de novas unidades lexicais. Por truneagio, entendemos o processo de criago lexical através do corte de parte da palavra, 0 que também implica alterago na forma griifica, como em prof {por professor) ou fac (por faculdade). Nesta medida, entendemos que e- € um elemento de composicao que resulta da truncagao do adjectivo inglés electronic’. Esta posigdo € defendida em Vigério (2001: 268) que considera uma palavra como e-mail o resultado de truncago (“clipping”). A definigfio apresentada (“deletion of part of a word, while the meaning and the morphosyntactic properties of the original expression are maintained”) é valida para os e-termos. Considerando que e- € a truncagio de electronic, coloca-se agora a questio sobre a natureza morfoligica deste tipo de termos. Poder-se-4 argumentar que, dadas as suas caracteristicas fonoldgicas, (/e/) esté mais prdximo de set um prefixo do que um elemento de composigio. Essa posicio é defendida, por exemplo, em Canuto (2001) que propie formagdes como as de e-commerce sia “compostos a partir de elementos prefixais truncados”*, Porém, sendo a truncagio de uma palavra, no considerémos que pudesse haver qualquer tipo de prefixo, A possibilidade de electro ser um prefixo foi excluida, j4 que se trata, segundo o Diciondrio da Lingua Portuguesa Comempordnea, de um eiementa de formacao que exprime a ideia de electricidade. ¢ niv a de electrnico (“que funciona segundo as leis da electrdnica”). A ideia de que os e-termas sio palavras formadas por composi¢io é reforgada pela definig&io que Villalvas dé deste tipo de formagéio. Para a autora, composigéo é um processo “que consiste na concatenacao de duas ou mais varidveis lexicais. que podem ser radicais ou palavras”. Accitando, ent&o, que os e-termos so compostos, interessa agora esclarecer se se trata de compostos meramente morfolégicos ou morfo-sintécticos®, A passibilidade de haver, na formagio dos e-fermos, um pracesso de composi- go morfolégica & exclufda quando este “exige a presenca de uma vogal de ligagio como delimitador de fronteira entre esses radicais” (Mateus ct al. 2003: 973). De facto, seja em e-commerce, seja em comércio-e, No hé qualquer espécie de vogal de ligagao, 3 Apesar de se poder pensar que electro poderia ser a truncagdo de electronica, como em electrochogue ou eleciromagagtico, essa € uma assungSo ertdnia, uma vez que esse clemento, para além de dever ser considerada um (pseudo-)prefixa, como em Cunha e Cintra, nao remete para electrénico mas para #léctricn € pode sex parafraseado coma “relativo & electricidade” 4 traduso nossa para “.. composés & partir d’éléments préfixaux tronqués..." Sin Mateus eral, (no preiv}. Gramética da Lingua Portuguesa, Lisboa: Caminho. A distingdio de Villalva (Mateus et al. 2003) ¢ parece-uos bem mais funcionai ¢ explicativa do que a de agiutinagaajjustaposigao, onde muitas vezes, apenas a ortografia contribui para estabelecer frontciras. m7 ACTAS 20 XVIII BNCONTRO NACIONAL DA APL A composigéio morfo-sintactica, por seu lado, “um proceso hibrido de formagao de palavras, no qual se conjugam propriedades das estmturas sintécticas ¢ proprie- dades das estruturas morfolégicas” (Mateus et al. 2003: 971) {por aqui se entende, nomeadamente, relagdes de concordincia de género e ntimero). Parece-nos ser este 0 caso dos e-fermos. Se, de facto, e- for electronic (em portugués, electrénico), hd, entdo, relagdes de concordincia que se estabelecem entre os elementos do composto: temos, por exemplo, cidadania-e que, por extenso, € cidadania electronica e nunca *cidadania elecirénico ou *electro-cidadania. Temos, também esportes-e, que correspondem a eyportes electrénicos, ¢ Wao a esportes electrdnica’. Vigério (2001) considera igualmente que e-mail é€ um compost formado torfo-sintacticamente por duas palavras. 3.5 Entrada dos e-termos no portugués: produtividade / criatividade © modo como os e-termos sio integrados no portugués sio um exemplo de produtividade e criatividade. Como é referido em Correia (1999), “Lyons (...) distingue os conceitos de “produtividade’ e ‘criatividade’. postulando o seguinte: enquanto qure a produtivi- dade & uma caracteristica inerente ao sistema linguistico, a criatividade € a capaci- dade do falante de alargar o sistema lingufstico por meio de principios de abstracgio e comparaciio imprevis(veis, mas motivados (cf. Lyons 1977b*:548-549)”. Para demonstrar que a produtividade inspira a criatividade, e de acordo com os tipos observados no corpus, parece-nos pertinente propér uma sequéncia de entrada dos e-termos no portugués, a qual apresentamos € explicamos em seguida: () e-mail @) e-commerce — (3) e-democracia > (4) comércio-e > (5) e-nigma (1) e-mail: parece ter sido o primeiro elemento a entrar na lingua, sendo 0 termo percursor deste fendmeno, aos niveis grafico e conceptual. (2) e-commerce: importagiio de outros elementos ingleses nado modificados da mesma rede seméntica, (3) e-democracia: importacao da estrutura sintactica inglesa, com adaptagio do segundo elemento para portugués. (4) comércio-e: adaptagao total 2 estrutura sintactica do portugués. (5) e-nigma: reandlise de palavras do portugués, motivada pela grafia ¢ por comegarem pelo fonema /e/, atribuindo-lhes nova interpretagao. 7 Exportes & uma palavra do Portugués do Brasil, variedade também considerada ma composicio do corpus deste trabalho. 8 LYONS, John (1977), Semantics 2. Cambridge: Cambridge University Press. 128 E-TERMOS: DESCRIGAO E HIPOTESE DE CLASSIFICAGAO A partir desta descrigiio, pode constatar-se que a criatividade se exprime na reandlise ilustrada em (5), sendo os restantes passos da sequéncia exemplos de produtividade da estrutura dos e-ermos. 4. Consideragies finais Surgindo de uma drea tio propensa ao aparecimento de novas unidades como é a. Internet, os e-rermos sitio um bom exemplo de neologia no portugués. sobretudo devi- do 4 instabilidade a que esto sujeitos, a nivel ortografico, morfo-sintdctico ¢ seman- tico, A sua integrago e adaptac&o ao nosso sistema linguistico processa-se de forma Varidvel: por empréstimo da forma anglo-saxénica, através de constmiciio hibrida, em que o nome fica em inglés ¢ o adjectivo em portugués e pela criagio de equivalentes. quer respeitando a sintaxe do inglés, quer respeitando a sintaxe do portugués. De facto, a partir do termo e-mail, que se apresentou como o percursor do “e-fenémeno”, rapidamente apareceram construgdes cada vez mais proximas do sistema linguistico do portugués. Daqui, passou a utilizar-se e- para designar, nas mais variadas dreas, “electrénico, o que é relativo 4 Internet” e, com a mesma estrutura, surgiram até construgdes em que a partfcula e- foi substitufda por outras como c-, m- ov f. A mesma estrutura mostrou-se to produtiva que facilmente se constréi uma tipologia descritiva dos e-termos, baseada, por um lado, na apresentagao grifica, Por outro, no nivel de integragZo em que a unidade se insere e, por outro ainda, na estrutura sintactica que apresenta. Encontrimos 4 tipos: o primeiro obedecendo a estrutura do inglés (e-business), 0 segundo obedecendo 3 mesma estrutura mas grafado sem hifen (eBusiness), 0 terceiro obedecendo a estrutura do portugués (cidadania-e) ¢ 0 dltimo apresentando alguma eriatividade de construcao, motivada pela analogia gréfica e fonética de e fel. Tendo em conta o cardcter neoldgico dos e-termos, procurou fazer-se uma deserigio morfoldgica destas unidades lexicais. Assim, concluiu-se que e- é a truncagao do adjectivo electronic/electrénico e que os e-termos sio palavras forma- das por composigio morfo-sintéctica. A hipdtese de se considerar e- um elemento prefixal fot posta de Jado quando se assume que a particula é a truncagdo de um elemento que pode constituir um radical, © que, mais uma vez, reforca a ideia de que 08 e-fermas sio compostos. Finalmente achdmos pertinente referir a importincia da produtividade, enquanto motivadora da criatividade. Neste ponto, a0 mesmo tempo que propu- nhamos uma sequéncia para a ordem de entrada dos e-termos no portugués, Mostrémos que formas como e-nigma siio consequéncia da criatividade dos ulilizadores, criatividade esta que sé é possivel gragas & produtividade de “e-construgdes”. Gostariamos de ter analisado a realizagao fonética destes termos, mas tat nado foi posstvel devido a inexisténcia de um corpus oral. Este pode constituir, no €ntanto, a base para um trabalho futuro, 129 ACTAS DO XVIITENCONTRO NACIONAL DA APL Seria interessante encontrar respostas para esclarecer o tipo de evalugio sofrida pelos e-termos. Sendo cada vez mais frequente o surgimento de unidades ligadas A rea da Internet, podia criar-se um banca de neologismos permanente mente actualizado, para que fosse possfvel dar conta da existéncia de fenémenos linguisticos ou lexicais. 5. Referéncias bibliograficas: ALVES, 1. (1990). Nealogisme — Criagdo lexical. $0 Paulo: Ed. Atica. ALVES, |. (2002). “Nealogia técnico-centifiea andlise de corpus”. In: Terminologia. desenvolvimento e identidade nacional — Actas do VI Simpdsio Ibero-Americano de Terminologia. Lisboa: ILTEC / Colibri (no prelo) CABRE, Teresa, Judite Freixa e Isabel Solé Solé. (2000). La Neologia en el Tombant de Segle. Barcelona: Institut Universitari de Lingufstica Aplicada/TULA/Universitat Pompeu Fabra. CASTELEIRO, J. Malaca (coord.) (2001). Diciondrio da Lingua Portuguesa Contem- pordnea. Lisboa: Academia das Ciéncias de Lishoa e Editorial Verbo. CANUTO. Marie-Berthe Vittoz. 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