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UNIVERSIDADE DE BRASÍLIA

DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA
História da Filosofia Antiga;
Professor: Grabriele Cornelli;
Aluno: Igor lago Caribé – 07/33466.

Influências do pensamento pitagórico em Platão

Introdução

Essa monografia aborda influências do pensamento pitagórico, nas


doutrinas e idéias propostas por Platão.
Dentre os tópicos abordados destacam-se, Pitágoras e os pitagóricos,
Platão, A Influência de Orfeu, e Influência pitagórica em Platão.
Pitágoras e Platão não são contemporâneos; de fato, Pitágoras nasceu
por volta de 580 a.C.na cidade de Samos, tendo seu apogeu em torno de 530
1
a.C. enquanto que Platão, nasceu em 428 ou 427 a.C. em Atenas, ambas
cidades gregas. Portanto cerca de 150 anos separam seus nascimentos. “O
criador do termo filosofia foi Pitágoras (...) amor pela sabedoria”2, e é inegável a
influência do filósofo matemático sob o principal discípulo de Sócrates. Pitágoras
e Platão tinham uma ligação muito forte com a matemática, como nos mostra
Aristóteles “Os chamados pitagóricos, dedicaram-se às matemáticas e foram os
primeiros a desenvolver essas ciências;”3.
Outra ligação importante é o fato de que Pitágoras tinha uma provável
veneração por Sólon (poeta e político de sua época), e esse é ascendente da
mãe de Platão, o que aparentemente liga as idéias políticas filosóficas de um ao
outro.

1
Giovanni Reale e Dario Antiseri
História da Filosofia – Filosofia Pagã Antiga vol1 ed. Paulus 2ª ed, 2004, p.25.
2
Giovanni Reale e Dario Antiseri
História da Filosofia – Filosofia Pagã Antiga vol1 ed. Paulus 2ª ed, 2004, p.11.
3
Aristóteles - Metafísica. I, 5, 985b
Fora do âmbito político, tanto Platão como Pitágoras acreditavam e
defendiam a transmigração das almas, ambos influenciados pela doutrina de
Orfeu. Os pitagóricos se aprofundaram sobre o assunto e contribuíram para a
disseminação de tais idéias, o que no futuro faria com que Platão desenvolvesse
a teoria Metafísica, dando uma explicação da ligação com um mundo supra-
sensível, e justificando a possível metempsicose (doutrina que explica a
transmigração da alma).
Muitas outras foram as relações de um com o outro. e será com os olhos
voltados principalmente para essas relações, que essa monografia terá sua base
e desenvolvimento.

Desenvolvimento

Pitágoras e os pitagóricos.

Para compreendermos a escola pitagórica, devemos conhecer a trajetória


de Pitágoras e dessa forma entender sua influência em nossa sociedade atual.
É certo que Pitágoras nasceu na cidade de Samos, mas não se consegue
precisar a data. Erastótenes diz que teria nascido em 606 a.C, já Jâmblico supõe
ser em 590 a.C, ou 558 a.C; Porém, a data que prevalece hoje como a mais
provável é a proposta por Porfírio: 580 a.C.
Pitágoras provavelmente era um homem rico, já que seu pai Mnesarco
era joalheiro. Essa condição permitiu que Pitágoras fizesse dezenas de viagens,
aprimorando sua filosofia e matemática. Nesse contexto possivelmente foi ao
Egito e a Babilônia.
A maioria dos autores concorda em afirmar que se casou com Teano,
cretense, filha de Brontino, a qual viria a ter papel importante tanto na vida de
Pitágoras (com ele teve um filho, e talvez uma filha [Telaugés e Myia]), como na
própria doutrina pitagórica.
Numa de suas viagens, decidira sair de Samos, e ir fundar uma Escola
em Crotona, cidade vizinha à Síbaris. Recém chegado em Crotona, Pitágoras foi
recebido com muita admiração pelos cidadãos de lá, pois já eram relativamente
famosas suas capacidades, comparadas as de Orfeu, como conquistar os
animais apenas com o dom da palavra (havia quem julgasse que Pitágoras
fosse filho de Deus), e por suas doutrinas, que já encantara a muitos por onde
passava. Em Crotona, fez um discurso fervoroso para toda a cidade,
demonstrando sua sabedoria: “Bela é a visão da totalidade do céu em que se
deslocam os astros. A ordem que ali reina só pode ser compreendida por
intermédio dos números e pelas relações que esses números estabelecem entre
todas as coisas.” 4.
Não foram necessários anos, para que de dezenas tivessem centenas de
discípulos que iam ouvi-lo ensinar. As reuniões aconteciam em uma construção
mais afastada, onde o mestre ensinava o que julgava importante. 5
O processo de admissão na escola pitagórica não parece ter sido algo
muito simplório. Cada um que desejasse ingressar na doutrina deveria passar
por uma análise feita pelo próprio Pitágoras, uma análise tanto física (atributos
do corpo, como a voz), quanto questionamentos diversos. Para se tornar
efetivamente um discípulo, passando da etapa de ouvinte (que durava oito
anos), para um esotérico, deveria permanecer em silêncio sobre o que se fala na
escola durante todo esse período de tempo, e ainda aprender a ter o domínio de
si; nesse caso, se não fosse possível sozinho, o mestre ajudaria pelo processo
da catarse, que funcionava como uma purificação, onde Pitágoras nada mais
fazia do que pedir que seus ouvintes fossem sinceros com ele, e acima de tudo,
com sigo mesmos, para assim poderem realmente se auto-conhecerem (gnoti
seauton – “conheça-te a ti mesmo”).
Como foi dito, ponto de fundamental importância na escola era o silêncio
absoluto, o SEGREDO. Não era permitido que um iniciado falasse nem com
iniciados, nem com não iniciados a respeito do que acontecia no interior da
escola. Alguns outros pontos da doutrina, que mais podia ser considerada
religiosa do que propriamente filosófica, eram que: 1) usavam de enigmas, tanto
dentro quanto fora da escola, que servia de uso moral, e às vezes somente para

4
Simonne Jacquemard
Pitágoras e a harmonia das esferas ed. DIFEL 2007, p. 64.
5
Simonne Jacquemard
Pitágoras e a harmonia das esferas ed. DIFEL 2007, p. 65
distinguir um pitagórico de um não-pitagórico. Frases como “Calçar o sapato
direito em primeiro lugar”, “Abster-se de ingerir vagens”, “Não enxugue uma
cadeira com uma tocha”, “Não urine virado para o sol”, dentre outras; 2)
Tradicional respeito aos mais velhos; 3) Não comer nenhum ser animal; 4) Não
comer vagens6, crime considerado da mesma ordem que comer a cabeça dos
pais.
Muitas foram as influências dos pitagóricos no mundo, razão pela qual
tornáram-se famosos, e Crotona tornou-se a mais erudita cidade da Grécia
antiga. Alguns dos principais pitagóricos foram Brontino (que se supõe ter
casado com a filha de Pitágoras), Hípaso de Metaponto (o qual ficou famoso por
revelar um dos segredos pitagóricos7), Teano, Filolau, Alcmeão de Crotona e
Árquitas de Tarento.
Algumas das idéias principais derivadas desse célebre grupo foram: 1)
definirem ser o elemento dos números o princípio de todas as coisas; 2)
estabelecerem verdades matemáticas, das quais a mais famosa é o Teorema de
Pitágoras8, e 3) reformularam a doutrina órfica, popularizando-a entre os gregos.

Platão

Nascido em 428 ou 427 a.C., em Atenas, Platão (do grego, platos =


“amplitude” [provavelmente em função de seus ombros ou testa larga]) foi
discípulo inicialmente de Crátilo, e logo em seguida de Sócrates, o divisor de
águas da Filosofia.
Platão escreveu 36 livros, elaborou os Diálogos Socráticos, formulou o
que chamou de Mundo das Idéias (ou Hiperurânio), e sintetizou seus ideais
políticos na famosa cidade ideal de Platão.

6
De acordo com Diógenes Laércio, Aristóteles disse que os pitagóricos não comiam vagens “(...) porque
possuem a forma de testículos (...)”, representando a fertilidade. Já Plínio [História Natural] (Livro XVIII,
30) diz que era pelo fato da vagem não ter nenhum nó entre sua raiz e a vagem em si, o que representava
uma forma de ligação direta ente os mortos do Hades, e os vivos, e que nelas era feita a Metempsicose.
7
Violou o segredo que envolvia “a inscrição dos doze pentágonos no interior da esfera”.
8
Gerd A. Bornheim
Os Filósofos pré-socráticos ed. Cultrix, p. 47/48.
Tendo parentesco com Sólon e com o Rei Codros, Aristócles (seu
verdadeiro nome) tinha uma predisposição para as questões ligadas à política,
que, como revelaria posteriormente, era uma de suas paixões. Porém, não foi
muito bem sucedido nessa área, tendo desilusões, sendo preso, exilado, e até
mantido como escravo durante certa época. Tentou diversas vezes concretizar
sua cidade perfeita, mas nunca obteve sucesso.
De Sócrates, Platão teve suas maiores influências, a ponto de que
quando criou sua Academia em Atenas, lecionava matérias ligadas aos
pensamentos do mestre. Na maturidade, Platão começaria a escrever sobre
assuntos de seu próprio desenvolvimento: “a maioria dos outros diálogos,
especialmente os breves, constituem certamente escritos de juventude, o que,
de resto, se confirma pela temática acentuadamente socrática que neles se
discute”.9
Na Academia, estudaram alunos voltados a renovar o estado, pois
aqueles que melhor governam são os que Platão denominava de Reis-Filósofos.
Só quem pode governar com maestria e capacidade de julgamento correto, é
aquele que conhece a verdade, ou que pelo menos a almeje. Para tanto, Platão
tratou de convidar matemáticos, astrônomos, médicos, dentre outros, para assim
melhor formar os ali presentes.
Estudaram na academia, Filósofos famosos, como Xenócrates e Crates.
Porém, o aluno de maior destaque, sem dúvida, foi Aristóteles, o qual
permaneceu na Academia durante 20 anos, e foi o principal desenvolvedor de
críticas e melhorias nas teorias socráticas e platônicas, como, por exemplo, na
Metafísica.
De Platão temos aparentemente seu legado escrito completo, pois
chegaram para nós todos os trinta e seis trabalhos, divididos hoje em nove
tetralogias cronológicas, tendo “A República” como livro principal. No entanto
não podemos dizer o mesmo de seu pensamento. Muitas de suas idéias ficaram
em seus discursos, suas aulas, onde desenvolvia temas sobre os quais não

9
Giovanni Reale e Dario Antiseri
História da Filosofia – Filosofia Pagã Antiga vol1 ed. Paulus 2ª ed, 2004, p.134.
escreveu, apenas dissertou, como fez Sócrates durante toda vida, como as
temáticas sobre o Bem (o Belo-em-si).
“A República” foi escrita por Platão, tendo Sócrates como protagonista,
gerando um interessante dilema: ou Platão criou um personagem “Sócrates”, em
homenagem ao mestre, para através dele expor suas idéias, ou Platão exerceu
nesse contexto para a filosofia socrática um papel semelhante ao de Euclides
para a Geometria Plana em “Os Elementos”: Não tendo Sócrates deixado obra
escrita, teria se encarregado Platão de nos trazer seu legado na forma de
diálogos, eternizando o mestre.

A Influência do Orfismo

Na Grécia antiga, antes da existência da Filosofia, a sociedade dividia


suas crenças religiosas de duas maneiras: 1) baseada em deuses imortais, dos
quais tudo deriva e tudo acontece, e num homem mortal, a eles subserviente. 2)
também baseada em deuses, mas complementada por mitos, onde a alma dos
humanos seria imortal, podendo viver eternamente ao lado dos deuses, ou
pagar expiação sem eles.
Para explicar a Filosofia de uma maneira mais ampla, o segundo
movimento religioso tem uma importância significativamente maior e foi
chamado de orfismo, nome derivado de Orfeu, poeta trácio que teria escrito tais
doutrinas em seus poemas.
Para Orfeu e seus seguidores, os órficos, a alma está num processo de
purificação, onde seu descanso eterno ao lado dos deuses só se dará quando a
alma for completamente purificada, e para isso, a alma deve reencarnar em
corpos humanos quantas vezes se mostrarem necessárias, num processo
automático, onde se você ainda não está purificado, imediatamente ao morrer
sua alma volta-se para um novo corpo.
O corpo é como um cárcere da alma, como diria Platão futuramente;
inicialmente, uma alma demoníaca nasce naquele corpo, em função de uma
culpa inicial, que toda alma tem ao nascer. Quando morre, aquele demônio
transmigra para outro corpo, pois o demônio nunca morre. Porém, é possível
desligar-se deste demônio, desde que sejam feitos os rituais órficos durante a
vida, purificando os pecados corpóreos. Se purificada em tempo; ao morrer, e
livrar-se do corpo em que estava presa, a alma recebe gratificações ao chegar
ao Hades10, e o inverso acontece àqueles que não realizam tais ritos. 11
A doutrina órfica foi muito difundida na Grécia antiga, embora nem todos
fossem adeptos. Com essa doutrina, o homem grego passou a ter outra
possibilidade de visão a respeito de sua vida, principalmente sobre o que
aconteceria após a morte.
Muitos foram os influenciados por tais pensamentos; Pitágoras foi um
deles, e repassou seu aprendizado para seus discípulos. Muito do orfismo, está
na escola pitagórica, embora ela tenha se diferenciando em outros pontos.
Assim como Orfeu, Pitágoras recusa-se a assassinar animais, seja para
alimentação, seja para os cultos. Ambos acreditavam que “a animalidade serve
de morada aos deuses, uma noção egípcia”12. A purificação também continua
sendo o ponto principal; porém, a maneira como se realizaria tal purificação é
que iria mudar definitivamente, tanto para os pitagóricos, como para Platão.
Para os órficos, livrar a alma de suas impurezas era um papel dos rituais
e práticas sagradas. Já para Pitágoras, uma alma livre só seria possível
mediante ao conhecimento pleno. A busca pelas verdades supremas da
realidade, é que faria um homem livre, é a “vida contemplativa”, ou mais ainda, é
ser Filósofo (termo sugerido por Pitágoras para aqueles que buscam o saber).
“Pitágoras parece ter sido o primeiro filósofo a sustentar a doutrina da
metempsicose, ou seja, doutrina segundo a qual a alma, devido a uma culpa
originária, é obrigada a reencarnar-se em sucessivas existências corpóreas (e

10
Palavra de significação imprecisa. No Crátilo, Platão escreve o seguinte discurso proferido por Sócrates:
“Quanto ao ‘Hades’, parece-me que a maioria dos homens admite que este significa ‘o invisível’...”, o que
concorda com o que está escrito no Górgias, no qual essa palara designa o ‘mundo invisível’. Porém o
mesmo Sócrates afirma em outra parte do Crátilo: “... este deus [Hades] é um sofista perfeito e grande
benfeitor dos que habitam com ele, o qual... tem abundantes riquezas lá em baixo, pelo que é denominado
‘Plutão’... Longe de ser derivada de invisível, a palavra ‘Hades’ indica antes o conhecimento de todas as
coisas belas; e daqui é que provém a derivação do ‘Hades’”. – Explicação transcrita do livro Fédon, de
Platão, ed. Rideel, 1ª ed. 2005, p. 11.
11
Giovanni Reale e Dario Antiseri
História da Filosofia – Filosofia Pagã Antiga vol1 ed. Paulus 2ª ed, 2004, p. 6 e 7 e 8.
12
Simonne Jacquemard
Pitágoras e a harmonia das esferas, ed. DIFEL 2007, p. 57.
não apenas em forma humana, mas também em formas animais) para expiar
aquela culpa.” 13.
Platão, influenciado pelas doutrinas de Orfeu e Pitágoras desenvolveu a
Teoria Metafísica, que buscava uma justificativa para a possível existência
desse Hades, um mundo não visível, um mundo supra-sensível (acima do
sensível). Para Platão, esse mundo era composto pela essência do que são as
coisas, e é um dever do filósofo buscar enxergar essas essências, que só
seriam captáveis pela parte mais elevada da alma, a inteligência.
Platão também acreditava que a alma fosse imortal, e que renasceria
muitas vezes, até se purificar, e acreditava que o corpo era a raiz de todo o mal,
oposto ao que dizia Orfeu, que o mal já era preexistente no homem, pois ao
nascer, um espírito diabólico encarnava nele. O filósofo deveria fugir do corpo,
dar valor à alma, e viver em função de se libertar, tal como pensava Orfeu.
Platão também dava muito valor aos mitos, porém, não como órficamente
era feito, ou seja, num sentido religioso. O mito em Platão era um complemento
do logos (que pode ser compreendido como inteligência). Aquilo que não fosse
possível de ser captado pelo uso do logos, poder-lho-ia ser abstraído pelos
mitos, como, influenciado por Orfeu, fez o mito do Er (presente na República) e
do carro alado: mitos que explicavam a maneira como a alma faria seu percurso
de ida e volta, e quais almas passariam a eternidade sob a companhia dos
deuses, e qual seria castigada. O mito era uma maneira de melhor compreender
aquilo que parece inaceitável, incompreensível para a racionalidade humana.

Influências pitagóricas em Platão.

Muito, do que foi desenvolvido por Platão, provem de sua admiração


pelas doutrinas pitagóricas. A própria Academia de Platão, fundada em Atenas,
tinha em seu pórtico, a inscrição: “Não entre aqui quem não souber geometria”.
A importância que Platão atribuía à matemática, sua concepção de justiça e de
cidade ideal baseadas na harmonia, reafirmam conceito frisados por Pitágoras.

13
Giovanni Reale e Dario Antiseri
História da Filosofia – Filosofia Pagã Antiga vol1 ed. Paulus 2ª ed, 2004, p. 29.
Um melhor entendimento destes tópicos será possível, se pudermos
compreender as bases da escola de Pitágoras, suas teses e argumentos.
Conhecemos algumas dessas peculiaridades graças a doxografias de não-
pitagóricos, e de fragmentos de discípulos do mestre Pitágoras. A exemplo: “(...)
Assim, a enorme velocidade do sol e da lua e dos astros em tão grande número
e tamanho, deve necessariamente produzir sons prodigiosos. Admitem isto e
também que a (diversa) distância (dos astros de seu ponto central) corresponde
às relações numéricas da harmonia musical. E como resultasse absurdo que
não ouvimos este som, explica que o ouvimos desde o nascimento, e em
conseqüência falta o contraste com o silêncio necessário para que o possamos
perceber.”14.
Tal doxografia evidencia o que pensavam os pitagóricos, a respeito da
harmonia das coisas, baseada nos números, pois, por via deles, tudo se
expressa possível de ser harmônico. O Elemento que compunha os números era
o elemento formador de tudo, “toda a natureza modelada segundo os números,
(...) todo o universo é harmonia e número.”15. A comunidade pitagórica foi
considerada modelo ideal, e muitas vezes imitada. A Academia de Platão
manteve tradições pitagóricas.
No diálogo-socrático Fédon, onde Platão relata a morte de Sócrates, são
citados com freqüência Cebes e Símias, discípulos de Sócrates, que
anteriormente haviam sido discípulos de Filolau, que foi um dos mais
importantes seguidores de Pitágoras. Torna-se evidente o fato de que Platão
teria sido iniciado na doutrina pitagórica por meio desses dois.
A respeito da alma, muito do que Platão relata também é influência das
formulações itálicas. Como foi dito no tópico anterior, a metempsicose é
reformulada, e a imortalidade da alma seria “provada”, pela Metafísica, pois a
alma humana seria capaz de conhecer aquilo que é imutável (Forma, Eidos).
Para isso, a alma tem de possuir uma natureza dotada de afinidade com tais

14
Aristóteles, De Coelo II, 9, 290b
15
Aristóteles, Metaph. I, 5, 985b
idéias, concluindo que como a alma só conhece o que é imutável e eterno, ela
também deve ter as mesmas propriedades.
Ainda sobre a alma, Platão escreve sobre a maneira como a alma teria
acesso ao conhecimento que ela já viveu, o que é chamado de anamnese, que é
o recordar-se do que a alma já sabe. No livro “Pitágoras e a harmonia das
esferas”, torna-se evidente que Pitágoras já sabia deste suposto conhecimento
prévio da alma perante as coisas, “trata-se de estimular a intensa busca interior
de algo que a alma guarda em seu recanto mais secreto, a chama da alegria.”
(p. 61).
Somente desta maneira a alma se liga ao inteligível, e se torna mais
bela, sabedoura não da realidade sensível, aparente aos olhos e ouvidos
(sentidos em geral), mais daquilo que é a realidade-em-si, presente apenas no
mundo das idéias (também chamado Hiperurânio), que é onde vivem as almas
que não estão em nenhum corpo. Todos esses postulados platônicos são
originários das crenças pitagóricas, que diziam ser o número o princípio
fundamental, e que assim como as idéias, seria a forma das coisas, mudando
apenas de nomenclatura. 16
Uma outra ligação relevante entre Pitágoras e Platão, é que Pitágoras,
tinha um respeito e admiração por Sólon, poeta e governante de Atenas. Sólon
foi sábio em suas análises e condutas de governo, tendo realizado atos que até
hoje parecem necessários de serem feitos pelos governantes atuais. Sólon
decretou que estava proibido a mendigagem, e mais, o pai que não ensinasse
ao filho alguma profissão, não teria direito a benefícios do governo. Fundou uma
policia rural, destinada a fazer patrulhas para que não fossem realizadas más
ações com os animais, dentre outras atitudes que o eternizaram dentre aqueles
que governaram cidades gregas. 17

16
“(…) chamou essas entidades de Idéias e sustentou que todas as coisas sensíveis são nomeadas segundo
elas e em função de sua relação com elas, uma vez que a pluralidade das coisas que têm o mesmo nom e
que as Formas existem por participação nelas. (No que toca à participação, foi apenas a palavra que ele
(Platão) mudou, pois enquanto os pitagóricos afirmam que as coisas existem por imitação dos números,
Platão afirma que existem por participação (...)).” (Aristóteles – Metafísica ed. Edipro, 1ª ed. 2006, p. 60.).
17
Simonne Jacquemard
Pitágoras e a harmonia das esferas, ed. DIFEL 2007, p. 49.
Pois o venerado Sólon, foi parente de Platão, onde este também se
espelhou, não só para a entrada na vida política, como nos modelos de conduta
a serem seguidos.
Outra relação entre o filósofo de Samos e o Ateniense, é o gosto de
ambos pela música e a ginástica. Na República, Platão defende o uso destas
duas artes para formar os melhores guardiões para a cidade ideal, e de um
modo geral para um cidadão realmente justo, pois só a música, através de seu
ritmo e harmonia, seria capaz de formar pessoas boas e tendenciosas a serem
justas. O mesmo para com o corpo, sendo esse vinculado em segundo plano,
mas em igual proporção (no caso dos guardiões principalmente), onde a
ginástica deveria ser simples e harmônica, tal qual a música. “(...) a simplicidade
na música gera a temperança na alma, e a ginástica a saúde do corpo (...)”
(404e)
Na comunidade pitagórica, o grupo dos exotéricos tinham procedimentos
parecidos. Pela manha, os discípulos acordavam e saiam individualmente para
uma caminhada de contemplação e reflexão. Ao voltarem, antes de irem para
suas refeições, dedicavam-se à ginástica, e aqueles que estavam em condições
físicas, ao atletismo. Assim, garantiriam prazer e funcionamento satisfatório ao
corpo. Tinham aulas de música pela tarde, assim como outras atividades em
grupo. A música era considerada matemática pura, e essência de toda a
harmonia e ordem (em grego = kosmos). A importância dessa ordem
matemática, numérica, era tão expressiva, que consideravam que o que era
harmônico e ordenado era belo, conceito fundamental para quase totalidade da
doutrina platônica, donde o Belo-em-si é a Idéia superior na hierarquia do mundo
supra-sensível, donde tudo se origina. 18
A valorização do guardião, feita por Platão em seu livro A República,
também pode ser vista em Pitágoras, que dizia que o fundamento de sua
démarche é formar homens resolutamente pacíficos, mas que possuam a
intrepidez dos guerreiros.

18
Analogia seja permitida, à palavra cosméticos, que hoje em dia esta relacionada com produtos de beleza.
Por fim, vale a pena ressaltar que anos depois, Plotino (203-269 a.C)
fundaria em Alexandria a chamada Escola Neo-Platônica.
Os neo-platônicos se dedicavam ao estudo dos Diálogos de Platão, seus
pensamentos, e as doutrinas pitagóricas, se considerando herdeiros de
Pitágoras e de Orfeu, deixando claro que Pitágoras teve influência significativa
em Platão.

Conclusão

Por meio desta monografia, foi possível a realização de uma analogia da


origem do pensamento de dois grandes filósofos da Grécia antiga: Pitágoras e
Platão. De uma maneira sintética, foi estudado quem foram, e relacionadas as
principais influências.
Pitágoras foi um filósofo ligado à religiosidade, o que fez com que
desenvolvesse uma doutrina que, embora tenha sido baseada no orfismo, serviu
de base para a teoria da Metafísica, proposta por Platão.
Das relações entre eles, destacam-se a maneira como encaravam a vida
após a morte, a admiração pelos números, a valorização pelo que é belo e
harmônico.

Bibliografia

ARISTÓTELES – Metafísica
São Paulo: Edipro, 2006;
BORNHEIM, Gerd A. (org.) – Os filósofos pré-socráticos
São Paulo: Cultrix, 13a edição, 2005;
JACQUEMARD, Simonne - Pitágoras e a harmonia das esferas
Rio de janeiro: Difel, 2007;
PLATÃO - A República
São Paulo: Martin Claret, 2006;
PLATÃO – Fédon
São Paulo: Rideel, 2005;
REALE, Giovanni - História da filosofia: filosofia pagã antiga, v.1
São Paulo: Paulus, 2ª edição, 2004.

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