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A VISITA MUSICAL COMO ESTRATÉGIA TERAPÊUTICA NO CONTEXTO HOSPITALAR E SEUS NEXOS COM A ENFERMAGEM FUNDAMENTAL LeilaBritoBergold Tese
A VISITA MUSICAL COMO ESTRATÉGIA TERAPÊUTICA NO CONTEXTO HOSPITALAR E SEUS NEXOS COM A ENFERMAGEM FUNDAMENTAL LeilaBritoBergold Tese
Rio de Janeiro
2005
Leila Brito Bergold
Rio de Janeiro
Novembro de 2005
Aprovada por:
.................................................................................
Presidente, Profª. Drª. Neide Aparecida Titonelli Alvim
....................................................................
Prof. Dr. Enéas Rangel Teixeira
1º Examinador
.........................................................................
Profª Drª Márcia Assunção Ferreira
2ª Examinadora
........................................................................
Profª. Drª Lina Márcia Migues Berardinelli
Suplente
.......................................................................
Profª Drª Marléa Chagas Moreira
Suplente
Rio de Janeiro
Novembro, 2005
Orientadora:
(Paulo Freire)
DEDICATÓRIA
que apoiaram essa pesquisa ou que vêm partilhando esses momentos especiais de encontro
pesquisa.
Há canções e há momentos
Eu não sei como explicar
Em que a voz é um instrumento
Que eu não posso controlar
Ela vai ao infinito
Ela amarra a todos nós
E é um só sentimento
Na platéia e na voz
Há canções e há momentos
Em que a voz vem da raiz
Eu não sei se quando triste
Ou se quando sou feliz
Eu só sei que há momentos
Que se casam com canção
De fazer tal casamento
Vive a minha profissão
ABSTRACT
This study discussed the musical visitations from the optics of the hospitalized
client and its implications as therapeutic strategy for the fundamental nursing. The
questions are: What were the hospitalized client’s conceptions of musical visitations? How
important musical visitations are in the context of hospital care? What are the implications
of musical visitations for the fundamental nursing? The aims: to describe hospitalized
client’s conceptions on musical visitations shared with the group; to analyze the
importance of these visitations as a therapeutic strategy in the hospital care context; to
discuss the implication of the visitations for fundamental nursing. The theoretical basis
used on this study was Jean Watson’s humanistic theory of nursing care. It is a study of
qualitative nature. Methodology: Creative and Sensitive Method. In order to produce data
three types of “Body-Musical” dynamics were performed. The subjects were clients
admitted in an Orthopedic Medical Clinic at a military hospital in Rio de Janeiro. The
subjects discussed the positive influence of musical visitations on promote comfort, well-
being and expression of emotions that promoted their integrity and also the rescue of their
autonomy through respect for their personal musical style and stimulus for the creation of
self resources. The subjects also pointed the quality of integration of the visitations when
stimulating communication and interaction between the participants and between those and
the nursing staff enhancing the discussion on its implications for what is proper and
interesting for the fundamental nursing.
Rio de Janeiro
Novembro, 2005
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO .............................................................................................................. 01
A problemática do estudo e a construção do objeto ......................................................... 01
A justificativa e a Importância do Estudo ........................................................................ 11
Questões Norteadoras ...................................................................................................... 15
Objetivos .......................................................................................................................... 15
Grau, mas, à época, não estava interessada em trabalhar na área de ensino. No final da
em detrimento, muitas vezes, do contato mais estreito e direto com os clientes. Mesmo o
cuidado junto ao cliente nem sempre priorizava outras dimensões, restringindo-se àquelas
médica medicamentosa e na atenção somente ao corpo biológico do ser humano, visão esta
concentra em partes cada vez menores do corpo físico do doente e perde a visão do ser
objeto de meu interesse, deve valorizar justamente os aspectos que se relacionam com a
Sob o ponto de vista de Watson (op. cit. 1996), o cliente é o sujeito do cuidado de
enfermagem. Como tal deve ser considerada sua capacidade de questionar, de refletir, de
reivindicar seus direitos e suas necessidades. Assim, no espaço do cuidar, existe uma
transação de cuidado pessoa a pessoa, o que implica numa interação entre quem cuida e
quem participa do cuidado, partindo da premissa de que o enfermeiro não atua ‘no’ cliente,
mas ‘com’ o cliente. Por isso, a autora defende que o cuidado é relacional e recíproco. Vale
subjetivos no cuidado.
Brasileiro de Música (RJ). Meu propósito era ampliar conhecimentos em uma área na qual
também tinha inclinação como profissional e que, julgava, poderia permitir um outro tipo
Hospital Central do Exército (HCE) durante o dia, e, como enfermeira plantonista no turno
3
sobre a evolução do estado de saúde das crianças e tentando resolver os problemas que
estabelecer uma ligação entre as duas. Receava que o emprego da música junto ao cliente
no cuidado de enfermagem hospitalar pudesse ser considerado como de menor valor, tendo
em vista todo o aparato tecnológico que envolve as ações de cuidar neste cenário. Depois
de alguns anos, afastei-me das atividades como enfermeira; dentre outras razões, por julgar
que não vinha usando de forma criativa o meu potencial para cuidar.
Hoje, vejo essa dificuldade como fruto da insegurança de uma profissional jovem
que não conseguia avaliar todo o potencial que a música poderia ter para a enfermagem.
Atualmente, concordo com Santos (1998, p.11) ao afirmar que cabe ao musicoterapeuta
enfermagem cujo objeto, segundo a orientação teórica que adoto neste estudo, é o cuidado.
Comecei a questionar se a música poderia ser um recurso terapêutico que pode ser
utilizado pelos profissionais de saúde. Não como musicoterapia, por tratar-se de uma
atividade profissional que necessita de uma formação específica, mas como música
terapêutica (BRUSCIA, 2000), recurso que, ao meu ver, poderia ser empregado por
saudável, numa perspectiva transdisciplinar. A música, neste entendimento, não seria vista
Para que fique clara a diferença entre musicoterapia e música terapêutica, busquei a
principalmente por portadores de: doença mental, deficiência física, deficiência sensorial,
déficit de memória e atenção, e outros nos quais estejam presentes basicamente distúrbios
música para manutenção da saúde, prevenção de doenças e/ou reforço da resistência contra
ameaças à saúde física de diversos tipos. Assim, pode ser empregada com finalidades
variadas como para relaxar, reduzir o estresse e manejar a dor, em diferentes contextos,
musicoterapeuta, um atendimento integral junto ao cliente, sentia que o meu trabalho ainda
era isolado de grande parte da clientela da instituição, ou seja, daqueles que não tinham
Apesar de a triagem ser necessária, devido à escassez de mão de obra, esse fato me
trazia inquietação, pois acreditava que muitas pessoas poderiam ser beneficiadas pela
inconformada, não conseguia encontrar uma solução para o impasse. Nessa perspectiva,
lembro Crema (1989, pág.18) que, ao conceituar paradigma como um modelo para a
“por sua vez, gera uma crise cujo maior significado é assinalar ter chegado o momento da
Assim, comecei a buscar outros caminhos para o meu trabalho como profissional de
saúde. Pensava no benefício que outras pessoas poderiam obter no contato com a música,
mesmo não estando vinculados a um processo terapêutico formal. Não era suficiente
sala destinada a esse fim. Busquei então uma forma mais abrangente de levar a música aos
clientes internados. Iniciei o que optei chamar de ‘visitas musicais’ a alguns clientes
restritos ao leito, com a intenção de tocar ou cantar músicas escolhidas por eles e que
emocionais e sociais ao cliente, devido ao afastamento de sua vida cotidiana e também pela
convivência com um ambiente estranho que o torna inseguro e ansioso. A rotina hospitalar
que teria por objetivo organizar as atividades da equipe de saúde de modo a aumentar a
eficácia do tratamento, trazendo conforto e segurança para o cliente, muitas vezes, mostra-
formação do hospital, que, à época, era local de assistência aos pobres, de separação e
exclusão, “um lugar para morrer” e não para curar (op. cit. p.102).
séc. XIX “surge com a finalidade principal de disciplinar a conduta do pessoal que
trabalhava nos hospitais” e assim “legitimar o poder através da hierarquia hospitalar” (op.
pessoal auxiliar de enfermagem para dar conta da grande demanda destes cuidados,
realizadas pelo pessoal auxiliar, baseadas na execução dessas técnicas, o que resultou em
um trabalho “do tipo produção de massa, sendo que a identidade do paciente se perde na
No que tange aos procedimentos de enfermagem, os autores (op. cit. p. 33) relatam,
por exemplo, os horários padronizados de verificação dos sinais vitais “que não tem razão
de ser, pois cada paciente apresenta a sua individualidade” . Em muitos casos, os cuidados
forma ideal devido às condições de um ambiente que não oferece recursos, suporte ou
mecânico, ritualístico e impessoal”. A autora, ao citar Carper, refere-se a dois fatores que
instituições. Segundo Waldow (op. cit) poucas pessoas vivenciam uma experiência
cuidam e os cuidados no espaço hospitalar foi estudado por Pitta (2003). Para a autora a
ansiedade que os clientes sentem ao se internarem é projetada na equipe de saúde que, para
importância do indivíduo que é pasteurizado entre os outros, não tendo registro afetivo
cenário hospitalar. Barcelos (2003, p.97), em sua dissertação de mestrado constatou que a
hierarquizado do hospital é um processo difícil” não só porque está fora do seu espaço
autonomia.
impacto que essa despersonalização pode ter sobre o cliente, implementei o projeto das
visitas musicais, tendo em vista que estas visitas podem proporcionar uma série de
outras pessoas (BRUSCIA, 2000). Ou seja, ela pode ser terapêutica sem ser terapia, como
Com isso em mente, criei uma equipe formada por funcionários do hospital,
músicos que tinham interesse nesse tipo de experiência, treinando-os para acompanhar-me
Um dos enfoques principais desse trabalho é que o cliente pode expressar o seu
desejo: ele escolhe se quer escutar e também qual a música. Com isso nos aproximamos
do seu universo musical na tentativa de reafirmar sua identidade como sujeito social, dando
ampliando-se mais tarde para outros setores e, atualmente, cobrem diversas unidades de
internação que incluem: Clínica Médica, Cirúrgica, Unidade Renal, Reabilitação, Unidade
(UPC). As reações positivas a esse trabalho me surpreenderam, não somente aquelas por
parte dos clientes e familiares, mas também pelo interesse da equipe de saúde,
especialmente, da enfermagem.
ambiente. Segundo a autora, este ambiente seria aquele capaz de manter o organismo em
condições para não adoecer ou para se recuperar de doenças. Além de todo o empenho que
o conceito de saúde, afirmando que curar não é a mesma coisa que reconstituir, pois o
cliente pode estar curado, mas não reconstituído e vice-versa. Ela reitera: o que distingue a
enfermagem dos outros profissionais é o cuidar, mas este não deve ser somente uma série
Na mesma época, a autora destacou também que a enfermagem não faz apenas
parte do ambiente, ela é o próprio ‘ambiente’, pois tem controle sobre o mesmo. Deste
modo, reforçou que se, somos parte do ambiente temos que nos focalizar junto ao
problema, assumindo que nossa atitude pode fazer diferença e buscando assim alternativas
1
Curso “Cuidar em Enfermagem além da Pós-Modernidade” ministrado durante o Intercâmbio Internacional
Bases Teórico-Filosóficas da Prática do Cuidar em Enfermagem ocorrido no Instituto Nacional do Câncer,
promovido em parceria pela UFRJ, UERJ, UNI-RIO, em 16 de novembro de 2003.
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cliente.
ato de confortar oferece tanto ao profissional que cuida quanto ao sujeito do cuidado,
também afirma que o processo de cuidar envolve transformação de ambos, ser cuidado e
cuidadores.
não conhece, uma vez que este ambiente pode mostrar-se ameaçador aos sentidos de
doentes, entre outros. Assim, se a música tocada durante a visita musical fizer parte de seu
Talento apud Watson (2000, p.54) reitera que o foco principal da enfermagem deve
ser o cuidado partindo de uma perspectiva humanista aliada a uma base de conhecimentos
crítico são necessárias à ciência do cuidado que tem seu foco na promoção da saúde e não
na cura da doença”. Em relação à perspectiva humanista, Neves (2002, p. 86) refere que a
o potencial humano”.
A autora (op. cit., p. 83) ressalta que para Watson, a arte da enfermagem, ou
autora, a concepção acerca do cuidar abrange estar presente por inteiro no momento,
internado fez-me refletir sobre formas ao mesmo tempo efetivas e afetivas de cuidar. As
visitas musicais podem ser uma dessas formas, visto que a nossa cultura é fortemente
musical, o que, por um lado, auxilia a aproximação com o cliente e, por outro, facilita sua
Tenho observado que ao realizar as visitas musicais a equipe de saúde (tanto quem
toca os instrumentos quanto quem escuta) demonstra satisfação, relatando sentir-se bem e,
hospitalar através da música vêm sendo realizados, com êxito, em diversas instituições no
Brasil, voltados tanto para os clientes quanto para os profissionais, alguns destes
atendimento aos usuários nas organizações de saúde, pautada pelo mais amplo respeito à
destas experiências. É importante ressaltar que essas experiências vem sendo realizadas por
Para Nicolescu (2001, p. 51), a transdisciplinaridade diz respeito “àquilo que está
ao mesmo tempo entre as disciplinas, através das diferentes disciplinas e além de qualquer
Devido aos problemas financeiros enfrentados pela maior parte das instituições de
saúde, a utilização da música pode ser um recurso pouco dispendioso e de grande retorno,
pois atenderia às necessidades de cuidado, não somente do cliente e sua família, mas
É mister ressaltar que a melhora relacionada ao estado de saúde não está ligada
saúde não é somente ausência de doença, mas um estado de espírito que procura a
integração criativa com seu meio. Nesse sentido, Boff (1999) aborda os conceitos de saúde
A própria visão do que é doença ou de como a pessoa se sente quando está doente
pode influenciar sua melhora. Diversas vezes, durante as visitas musicais, observo a
perplexidade das pessoas ao serem abordadas sobre o seu desejo de escutar música. Para
umas, se revela como uma oportunidade de ter prazer, diminuindo o sofrimento inerente à
doença e à internação. Para outras, o hospital é visto como um lugar de doença, onde há
sofrimento, dor e tristeza, e a música parece ‘destoar’ deste ambiente, conforme percebo na
expressão facial daqueles clientes. Assim, algumas vezes, só conseguem apreciar a música
quando percebem que outras pessoas também o estão fazendo, criando uma nova
encontrar um novo sentido ou uma nova visão sobre o que é estar hospitalizado e “reforçar
à atenção, à consideração para com o cliente, como ouvi-lo, atitude que pertence ao âmbito
do cuidado expressivo. Penso também que a prática do cuidar não envolve somente o tocar
14
com as mãos, mas também com o cheiro, com o olhar e com o som (FIGUEIREDO et al,
1998).
Nesse sentido, é importante estarmos atentos até mesmo à música utilizada durante
as visitas musicais, porque se esta não for adequada ao ambiente seja pelo ritmo, estilo,
altura, ou mesmo pela execução ininterrupta e/ou sem variações, pode se tornar mais um
fator desencadeante de estresse deixando de ser terapêutica. Schafer (1991), por exemplo,
refere-se à música de fundo como tendo sido inventada para homens sem ouvidos,
queremos ouvir”. Assim, o que pode soar agradável para alguns, pode ser ruído para
outros. Portanto, avaliar o som que cerca o ambiente de cuidado também é uma maneira de
cuidar.
ambiente que pode causar resultados danosos se for usada de forma inadequada, pois
somos sensíveis a determinados sons mesmo que não estejamos conscientes dos mesmos.
Os sintomas observados a partir do mau uso da música vão desde a dilatação da pupila,
cardíaco e aumento da pressão arterial. É mister ressaltar também que a música pode trazer
Por esses motivos, é importante respeitar a escolha musical do cliente, pois permite
a sua participação ativa na opção por aceitar ou recusar a música, ao escolher o tipo de
música que goste ou deseja ouvir, ao resolver se canta junto ou não, ou mesmo se faz
movimentos acompanhando o ritmo. Todos esses aspectos merecem consideração por parte
da enfermeira que entende o cliente como sujeito do cuidado, logo, possuidor de desejos,
Frente às reflexões ora apresentadas, o objeto deste estudo é “as visitas musicais
Questões norteadoras:
Objetivos:
cuidado hospitalar.
CAPÍTULO I
MÚSICA E SAÚDE
afirma que ela pode ser encontrada em todas as culturas, mesmo as mais primitivas, o que
indica que a música guarda uma estreita relação com o homem, perpassando diferentes
mais ressonantes, sugerindo que essas cavernas eram locais de cerimônias religiosas que
para assim estabelecer relações com outros seres humanos (op. cit.).
A importância do som para o ser humano pode ser constatada a partir de sua
Benenzon (1985, p. 165), “o homem acreditou que o som era uma força cósmica presente
no começo do mundo”. São João (in Benenzon, op.cit.) inicia seu evangelho com estas
palavras: “No começo foi o verbo e a palavra estava com Deus e o verbo era Deus”.
Segundo o autor (op.cit., pág. 166), os egípcios acreditavam que o deus Toth criou
o mundo somente com sua voz. Para os hindus e persas, o universo foi criado por um som
transformou em matéria, mas cada matéria continua retendo parte do som original. O autor
relata que essa idéia talvez permanecesse em algumas culturas primitivas por acreditarem
que cada ser vivo ou morto tinha seu próprio som ou canção secreta à qual devia
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responder. Nos ritos mágicos de cura os médicos bruxos tentavam descobrir o “som ou
época, sendo considerados como verdades absolutas de acordo com a visão vigente; mas o
registro histórico nos mostra uma transformação desses conceitos ao longo dos tempos.
Os povos primitivos acreditavam que as doenças eram provocadas por espíritos ou deuses
e criavam procedimentos especiais para atrair suas bênçãos e afastar sua ira. Costa (1989)
relata que entre esses procedimentos se incluíam as danças e músicas cerimoniais, sendo
que ainda podem ser encontradas “músicas de cura” nas pajelanças dos índios brasileiros.
Segundo a autora, como a doença não era atribuída a um transtorno do organismo, e sim ao
espírito maligno, a música era usada somente como meio de comunicação e domínio desse
espírito.
música citada na Bíblia, quando o jovem Davi apaziguava Saul com o som da sua harpa,
Ainda acerca dessa função ‘mágica’, Sekeff (2002) relata que em 1500 a.C.
Somente na Grécia antiga surge uma medicina racional relacionada com a evolução
essência de todas as coisas através do saber racional e reflexivo. Nessa época, há uma
Recomendava também um rigoroso controle desta pelo Estado, visto que os efeitos
Ainda Sekeff (op.cit.) relata que Pitágoras e seus seguidores concebiam a música
como uma redução (em freqüências) da “música das esferas”, caracterizada pelo chamado
som cósmico que possibilitava ao indivíduo sintonia com o rimo da vida e com a harmonia
Para Costa (1989, p. 19), Hipócrates e seus diversos seguidores acreditavam ser a
humana. A música podia restabelecer o equilíbrio perdido por ser ordem e harmonia dos
êxtase”.
notas com um sentido matemático específico a cada um. No uso terapêutico da música os
gregos combinavam os ritmos com os modos para produzir determinados resultados nos
racional da doença desenvolvida pelos gregos até próximo à sua decadência quando retorna
que já no séc. XIII “faziam uso de salas de música em seus hospitais, na busca da saúde de
seus internos”.
tentativa de evitar superstições, sufocou não somente as práticas anteriores como também o
o seu emprego religioso. O tratamento dos doentes passa a ser realizado em conventos,
sendo o interesse maior dos sacerdotes “a salvação da alma em detrimento dos corpos dos
com o sentimento religioso da época; a música fazia parte do currículo por sua ligação com
a teologia. Nesse período, a Igreja determina a forma de se usar a música para evitar
influências perniciosas sobre a alma dos mortais, reconhecendo o poder desta sobre o
comportamento e as emoções. Em contrapartida, Tame (1999) cita o seu uso para fins não
religiosos, relatando que os médicos utilizavam menestréis para tocar para pacientes
hoje podem ser encaradas como manifestação de histeria coletiva. O tratamento consistia
em acelerar o ritmo da dança dos doentes através de flautas, oboés e tambores causando
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um cansaço prematuro nos mesmos. Referente a essa época também foram encontrados os
(tratamento de certas doenças com música durante os séc. XII e XIII) que fora integrada à
medicina de tendência metafísica da época, que unia filosofia, magia e astrologia. A partir
do séc. XVI os conceitos médicos começam a ser separados da magia e há os que atribuem
Nesta época, surge Paracelso, médico, músico e astrólogo que acreditava que os
música se integrava a esses tratamentos. Segundo Paracelso (in COSTA, op. cit. p. 24), “as
doenças são entidades mórbidas que penetram o ser humano, e não mudanças no próprio
organismo”. Essas idéias levaram a busca dos agentes que provocavam as doenças,
apressar a convalescença.
No séc. XVII a música passa a ser recomendada quase que exclusivamente para os
combinada com a “teoria do afeto”, que tinha como princípio básico a idéia de que a
música reproduz emoções, estabeleceram uma teoria da musicoterapia. Esta afirmava que
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tratamentos psiquiátricos. Segundo Sekeff (2002), Pinel, psiquiatra francês, usava a música
moderna, recomendava-a, alertando que a mesma não cura, mas distrai e assim alivia.
Costa (1989) aponta o surgimento das primeiras obras sobre musicoterapia relacionadas a
pacientes psiquiátricos: Brocklesby (1749), Tissot (1798), Brown (1729) e Buchoz (1769).
com o recurso auxiliar da música, relatando sua eficácia, mas alertando que a mesma deve
ser escolhida de acordo com o paciente, sua história, caráter, temperamento, hábitos e
desejos (Sekeff, 2002). No início deste século, Pinel inicia sua revolução quanto à doença
mental, “advogando um tratamento mais humano para os insanos” (Costa, op. cit. p. 27). A
partir desse evento, segundo a autora, o interesse pelo uso da música se difundiu entre os
Segundo Ruud (1990), no séc. XIX a música perdeu muito de sua influência como
criar uma farmacopéia musical baseadas nas descrições das propriedades da música e seus
com a música, não sendo mais necessário que o ouvinte esteja na presença do executante.
A música faz parte do cotidiano de cada um, se tornando até em muitos casos, invasiva,
com o uso exagerado da música ambiental e do uso desta em propaganda, cinema, novela,
como “ajuda musical” (BENENZON, 1985). Neste período, englobando as duas grandes
guerras, com o elevado número de veteranos em recuperação nos hospitais dos Estados
música vem sendo utilizada como um recurso terapêutico de acordo com o conhecimento
sobre o que é saúde, doença e cura. Deste modo, os feiticeiros ou magos eram inicialmente
especialização na área da saúde no século XX, surgiram várias profissões para suprir a
Nesse ínterim, vale ressaltar que houve uma interseção nesse início da
musicoterapia como profissão e a enfermagem, uma vez que duas enfermeiras norte-
referia aos seus efeitos benéficos. Apesar de não identificar esses efeitos, ela citava a voz e
os instrumentos de sopro e cordas como benéficos pelo seu som contínuo, enquanto o
piano teria o efeito contrário por não ter continuidade sonora. Citava também o órgão
apesar de não ter comprovação científica, já demonstravam uma percepção intuitiva das
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possibilidades da utilização terapêutica da música à sua época. Contudo, ela concluiu que o
seu uso generalizado estaria fora de questão devido ao alto custo que isso acarretaria.
período compreendido entre as duas guerras mundiais. Dobbro e Silva (1999) se referem a
Davis, Gfeller e Thaut, que em seu livro sobre musicoterapia citam que, àquela época, a
música era considerada um caminho para aliviar a dor dos pacientes, em sua maioria,
veteranos de guerra. Citam também o nome de Isa Maud Ilsen, que era musicista e
enfermeira e foi responsável pela criação da Associação Nacional de Música nos Hospitais,
de doentes nos hospitais de Nova York. Abriu uma escola de preparação de musicistas para
tocar para os doentes. Em 1941, criou a Fundação Nacional de Terapêutica Musical com o
que diversos estudos têm sido realizados por enfermeiras norte-americanas nos últimos
vinte anos, com enfoque na música como método de tratamento para alívio da dor. Citam
conduta desejada.
adequado; evitar deixar a música durante longos períodos para prevenindo a fadiga ou o
iatrogênico: evitar música estimulante depois de uma lesão aguda na cabeça. É importante
enfermagem na última década mostram um interesse cada vez maior por essa prática como
Rogers. Esta teórica de enfermagem concebe o cliente como um ser unitário possuidor de
considerada como parte desse ambiente e a interação com o cliente pode se dar através do
energia que se situam na superfície do campo de energia do ser humano e que funcionam
como pontos de conexão através dos quais se dão as trocas de energia. Segundo a autora, a
música se constitui como um importante recurso para a repadronização dos ritmos dos
Ao realizar busca bibliográfica para esse estudo a autora cita 20 artigos sobre
música e enfermagem entre os anos de 1979 e 1997 publicados em língua inglesa. Desses
artigos, oito se referem à utilização da música para pacientes com dor; oito relatam
A autora concluiu que apesar de a música erudita não ser o estilo musical
predominante na preferência das pacientes não constituiu como fator impeditivo para sua
influência positiva sobre estas. Mas ressalta que as pacientes que não estavam em
27
alívio da dor. Também constatou que a música não deve ser inserida indiscriminadamente
Partindo da premissa que a comunicação pode ser um recurso terapêutico a ser utilizado
paciente, a autora realizou dois encontros individuais com cada participante da pesquisa
(10 sujeitos no total), nos quais ela fazia um relaxamento induzido com música e técnica
verbal de relaxamento.
a música a ser utilizada - Concerto para Oboé de Vivaldi - baseada em um estudo que a
indicava para relaxamento físico e mental. A autora encontrou evidências de que a música
distração, alívio da dor corporal, calma, relaxamento, sono e sonho. Outra categoria
utilizado pela enfermagem, sugerindo ser estimulada sua aplicação nos cursos de formação
Alves (2001) realizou um trabalho com grupos em que a música era utilizada como
incluíram outros profissionais da área da saúde, foi formado um coral, sendo que os
musical para que eles próprios pudessem avaliar seu desempenho. O repertório era
Para Alves (op. cit.) a música comprovou ser um elemento importante para a
cada sujeito apreendeu o trabalho do outro e o seu próprio como um todo indivisível.
objetivo de investigar se a música poderia ser utilizada como forma de recreação para
esperança. O uso dos instrumentos musicais facilitou a participação das crianças que
Perceberam também que foi importante cantar, tocar e se divertir junto ao paciente,
como instrumentos para humanizar o setor, estendendo essa proposta, em seguida, aos
constatando a partir do relato dos pacientes que estes se sentiram mais relaxados e
processo de humanização, mas também como uma alternativa criativa e eficaz no alívio da
crônica. Basearam esse estudo nas diferenças de percepção musical que poderiam
influenciar a analgesia através do uso de dois estilos musicais distintos: New Age3 e Jazz4.
Cada indivíduo participava de duas sessões individuais de trinta minutos cada para a
análise comparativa das reações às músicas que eram as mesmas para todos.
As autoras constataram que o estilo New Age reduziu a dor em 100% dos
entrevistados, enquanto o estilo jazz reduziu em apenas 37,5%. Ressaltaram que este
suave, assim como ritmo adequado (65 a 70 batimentos por minuto) na música New Age,
enquanto a música escolhida para o estilo Jazz possuía um ritmo de 120 batimentos por
minuto. Não houve questionamento por parte das autoras sobre a influência de músicas que
3
New age, segundo Gianotti e Pizzoli, tem suas raízes em rock cósmico, ‘ragas’ hindus, música folk para
meditação e jaz contemporâneo mais suave e melodioso. Baseia-se na idéia de que a música pode alterar
estados de consciência. A música, Caminhos de Santiago, pode ser usada para relaxamento e meditação.
4
Jazz segundo as autoras é uma síntese da música ocidental com o ritmo e as reflexões melódicas da áfrica.
A peça de escolha, “All that jazz” caracteriza-se, segundo estas pela irregularidade rítmica e fraseado rápido.
31
Paulo. Nesses Programas, a música já é utilizada para diminuir os quadros álgicos, mas,
além disso, foi observado que após a audição musical, os clientes tinham experiências
significativa da dor para a maior parte dos participantes, corroborando outras pesquisas
realizadas com esse objetivo. Os mecanismos relacionados ao alívio da dor descritos pelas
músicas com estruturas formais bem definidas apresentam maior potencial para evocar
imagens, e a música formada por trechos desconexos de outras músicas, montada para a
cuidar utilizando a música como recurso terapêutico para promover a interação enfermeira-
Vale ressaltar que dessas pesquisas citadas, somente as de Silva (1993) e a de Leão
ser utilizados para atingir diferentes objetivos no cuidado ao cliente. É importante que os
criatividade e a interação social. É uma ‘linguagem’ que fala diretamente à nossa emoção
psicológicos. Isto vem confirmar algumas das pesquisas citadas que focalizavam algum
tipo de efeito e perceberam que a influência musical era mais abrangente (DOBBRO,
Jourdain (1996) afirma que somos capazes de perceber somente as relações sonoras que
nossa cultura musical particular instilou. Sendo assim, a beleza permanece em grande parte
no ‘ouvido do expectador`, o que explica o seu caráter subjetivo. Mas a música não é
importante somente pelo valor estético, ligado às nossas preferências. Ruud (1998) amplia
a percepção da influência da música em nossas vidas, pois aborda não somente a relação
existente entre música e cultura, mas principalmente entre música e identidade. Para o
autor, a ‘nossa’ música não é somente um reflexo da identidade, mas uma maneira de
com a realidade social em que se inscrevem, partindo da cultura como base para estudar a
como ocorreu no séc. XIX, quando tentaram criar uma farmacopéia musical. Platão já
alertava que os efeitos da música nem sempre são os desejados e isso está relacionado aos
seus aspectos subjetivos e à sua complexidade, pois são tantos os efeitos que ela produz
34
que não se pode reduzi-los a um aspecto somente. Atualmente, sua utilização terapêutica
deve ser vista de forma holística de modo a atender o ser humano como um todo,
respeitando o seu potencial e a sua forma de ser. Esta concepção está em consonância com
referir-se à música como recurso terapêutico: sessão musical, sessão de audição musical,
vivências interativas musicais, encontro para relaxamento musical e canto coral. Essa
variedade reflete não só os diferentes objetivos buscados por esses profissionais em cada
enfermagem, ainda se constitui como prática recente que requer estudos para sua
consolidação.
que ela está ligada intrinsecamente ao ser humano, às suas necessidades e à sua visão de
mundo. Sua função original de mobilizadora das emoções e facilitadora das relações
da despersonalização, por vezes, sofrida pelos clientes neste espaço, reafirmando sua
bem-estar; ainda mais, melhorar a interação dos clientes entre si e com a equipe de saúde.
35
CAPÍTULO II
OS CAMINHOS METODOLÓGICOS
- Tipo de Pesquisa
suas implicações para o cuidado de enfermagem”, escolhi a abordagem qualitativa por esta
mais profunda destes fenômenos. Esta abordagem é a que permite uma melhor avaliação
pesquisa qualitativa se preocupa com um nível de realidade que não pode ser quantificado,
relacionado a um “espaço mais profundo das relações, processos e fenômenos que não
ligados à subjetividade de cada um. Assim, tornou-se mais importante para mim, nesse
momento, a análise aprofundada desses aspectos já que a minha intenção era trabalhar a
minha experiência sobre o tema a ser pesquisado e descrever, com a maior precisão
tornou necessário porque, tanto o objeto do estudo quanto a sua relação com o problema
ainda são pouco conhecidos pela enfermagem, sendo importante a descrição detalhada de
O enfoque dialético tem por objetivo transformar a realidade que se estuda. Este
enfoque penetra na estrutura íntima ou latente do fenômeno, inclusive o que não é visível
36
responsáveis por seu desenrolar característico. Procura explicar “sua origem, suas relações,
suas mudanças e se esforça por intuir as conseqüências que terão para a vida humana”
mundo natural e social, entre o pensamento e a base material. Concordo com Minayo
(2003) que o fenômeno ou processo social tem que ser entendido pelas determinações ou
transformações dadas pelos sujeitos. Assim, a validação das expectativas do sujeito por
meio do respeito pelas suas escolhas, iniciado na prática profissional, foi estendida aos
- O Método de Pesquisa
Constatei que este método foi coerente com a temática tratada e com minha visão de
importante porque evita a dicotomia entre razão e emoção. Cabral (1998) afirma que o
sujeito é ao mesmo tempo um ser pessoal e social e, assim, sua subjetividade se manifesta
no coletivo, na intersubjetividade.
Para Alvim (1999) o MCS aglutina sensibilidade com o discurso teórico através de
método.
37
Essas dinâmicas têm por objetivo aguçar a expressão da subjetividade dos sujeitos
utilizados materiais e atividades que permitem a criação dos sujeitos da pesquisa através da
(CABRAL, 1998). Ou seja, no âmbito das DCS a pesquisadora não tem a função de
Este método também permite a validação dos resultados da pesquisa no âmbito das
incomum” (CABRAL, 1998, p.178). Por isso a sua vinculação à abordagem dialética, uma
vez que o sujeito, na concepção lato da palavra, entendido como histórico-social, vive a
realidade e reflete sobre ela. No espaço de as DCS é possível, através do diálogo, levar o
(ALVIM, 1999). Elas estimulam as pessoas a interagirem nos grupos cujo espaço podem
partilhar um passado ou ter um projeto futuro comum. Gaskell (2003, p. 76) salienta que
“em um grupo pode existir um nível de envolvimento emocional que raramente é visto em
uma entrevista a dois”. Concordo com o autor quando diz que o grupo é mais do que a
38
soma das partes: ele se torna uma entidade em si mesma, tem o sentido de um destino
comum compartilhado.
A pesquisa foi realizada no Hospital Central do Exército (HCE) por ser o local em
país, pois o HCE é referência para alguns tratamentos especializados que não são
realizados em outros hospitais do Exército. Este fato acarreta uma internação prolongada
que, às vezes, traz como conseqüência um estado depressivo nos clientes, por ficarem
muito tempo afastados do seu convívio familiar e social. Este fator, como já mencionei
anteriormente, foi um dos motivos que originou a criação das visitas musicais, que vêm
paciente com o ambiente hospitalar além de promover seu resgate como sujeito social no
Um outro fator que diferencia o HCE de outros hospitais de grande porte é a sua
relacionadas com a hierarquia militar que implica sempre na obediência ao que está acima
na cadeia de comando. Isso se reflete numa postura de acentuada submissão por grande
militares da ativa em sua maioria, estão sujeitos a regras e códigos próprios e, muitas
vezes, estão internados por decisões de justiça ou motivados por questões administrativas
militares que objetivam interesses pecuniários. Como exemplo, podemos citar o fato de um
militar só poder ser desligado da corporação se ele estiver em perfeitas condições de saúde
física e mental. Para que isso se constate, muitas vezes é necessário que ele se interne para
reside em outra cidade ou Estado. Se, além disso, apresenta por exemplo, um ferimento ou
doença que possam deixar seqüelas permanentes, uma junta médica deve decidir sobre seu
Ou seja, essa clientela está cercada de muitas questões que não se limitam a seu
estado clínico, mas que envolvem aspectos também relacionados à sua vida financeira e,
conseqüentemente, social. Tudo se agrava se o cliente além de militar for soldado da ativa.
Este, pelo código do Exército, não tem direito à licença médica. Sendo assim, se não está
vista clínico não haja indicação para tal. Sem dúvida, essas são questões que prolongam
em seu estado emocional e conseqüências muitas vezes desastrosas no âmbito social. Esses
em sua grande maioria é bastante semelhante, tendo como exceção somente uma
40
sem distinção. Mas, como a pesquisa foi realizada com clientes hospitalizados e o MCS
necessita de um grupo para a produção de dados, tornou-se muito difícil reunir esse grupo,
comunicar-se com clareza e deslocar-se para o local determinado, eles recebiam alta
hospitalar.
Internação de Ortopedia que tem período de internação mais prolongado devido ao quadro
clínico e/ou às questões abordadas anteriormente. Nestas unidades, a maioria dos clientes é
horário marcado alguns participantes da pesquisa, às vezes, tinham que realizar exames,
sentiam bem o suficiente para sair do leito, ocasionando o adiamento da produção de dados
É importante ressaltar que o grupo que realiza as visitas musicais reiniciou suas
terapêuticas das visitas musicais, pois já havia ocorrido uma experiência anterior nesse
mesmo local. Elas expressaram a importância das visitas musicais nessas unidades, devido
ao longo período de internação a que alguns clientes ficavam submetidos, o que gerava
muita inatividade e insatisfação por parte dos mesmos. Uma destas enfermeiras solicitou
41
atenção especial para um dos clientes internados, que devido à longa internação
acidentes, em sua grande maioria, de moto, o que explica que a faixa etária destes tenham
girado em torno de vinte anos, a minoria tendo mais de 30 ou 40 anos. Explica também
muito menor, já que elas mulheres estão menos sujeitas ao tipo de acidente relatado com
duração das internações femininas também é reduzido, pois sendo geralmente civis, não
visita musical e aquiescência em colaborar com a pesquisa. Era imprescindível que eles
verbalmente para participar das DCS; e condições físicas, uma vez que sua participação
Vale ressaltar que foram desenvolvidas três dinâmicas com um total de catorze
suficiente para sustentar o objeto de estudo e o alcance dos objetivos. Os sujeitos foram
desenvolvida nestas dinâmicas foi: “Que efeitos a visita musical causou no seu corpo? O
facilitada pelo enfoque no corpo físico representado pela silhueta desenhada, pois
existência e corpo são uma só realidade, segundo Almeida (2004). Não há vida
corpo, ou seja, segundo Rodrigues (1999, p. 191) “é a própria realidade da pessoa”. Para o
formado pelas inscrições históricas, culturais, pelas experiências vividas”. Vale ressaltar
que foram as experiências vividas dentro de um contexto histórico e cultural que busquei
estimulou o resgate dessas experiências. Segundo Almeida (op. cit.), é necessário levar o
corpo a experimentações para que vá se constituindo, visto que ele não é somente um
promoveu o fazer, que é constituidor de novos saberes, novas percepções, novos desejos e
novas subjetividades.
5
A dinâmica Corpo-Saber foi inspirada na dinâmica “Corpo-Cidadania” descrita por E. M. Oliveira no
capítulo “Corpo-Cidadania: a conquista da mulher” do livro “Como trabalhar com Mulheres” em 1988.
43
esta estimulou a discussão dos participantes sobre como se sentiram após as visitas
humano desenhada em uma folha grande de papel para que os participantes pudessem
refletir sobre como se sentiram durante as visitas musicais, colando em seguida suas
- As dinâmicas desenvolvidas
Foram desenvolvidas três dinâmicas, descritas a seguir:
. Dinâmica ‘Corpo-Musical nº 1’
A dinâmica ‘Corpo-Musical’ nº 01 ocorreu no dia 23 de março de 2005, com início
às 13:45h e término às 15:15h. A equipe de pesquisa foi composta por mim, coordenadora
por objetivo registrar gestos e comportamentos dos sujeitos participantes, assim como
dados relatados durante a apresentação inicial e a discussão grupal que pudessem auxiliar a
superiores ou inferiores.
44
deslocamento dos participantes. Essa sala se mostrou adequada por possuir condições de
cadeiras de roda, mesa grande para escrever, cadeiras em número suficiente para os
clientes que podiam deambular, além de ar condicionado e tomadas elétricas para gravador
e aparelho de som.
1) Apresentação
participarmos das Visitas Musicais, mas nos apresentamos novamente junto com a
que iríamos realizar naquele encontro. Li com eles o termo de consentimento livre e
participação e que eu estaria sempre disponível para esclarecer qualquer dúvida que
dinâmica.
45
Expliquei aos sujeitos que iria colocar uma música para que eles ficassem mais
relaxados e assim pudessem se concentrar melhor no tema a ser abordado. Cabe esclarecer
que nesse momento não foi sugerido que os participantes escolhessem a música porque o
objetivo desta era estimular o relaxamento e focalização no tema, e não realizar atividade
terapêutica. Assim que a música iniciou, solicitei que eles procurassem recordar o que
A música ‘Canon de Pachelbel’ foi escolhida por ser somente instrumental, lenta e
Após a audição da música, chamei a atenção para a silhueta de um corpo que havia
sido desenhada anteriormente em um papel pardo. Essa silhueta já estava pronta, para
evitar constrangimentos por parte dos sujeitos que apresentassem limitações físicas no
momento e não pudessem participar da sua confecção. A silhueta estava apoiada em uma
mesa, no centro da sala, ficando perto para os participantes que estavam sentados em
escrevesse o que sentiu durante as visitas musicais, colando em alguma parte do corpo
desenhado. A questão geradora de debate foi enunciada em seguida: “Que efeitos a visita
4) Produção individual
sobre a mesa ou sobre pastas. Os outros foram auxiliados por mim e pelo apoiador
no corpo para colá-lo, mesmo tendo sido esclarecido que poderiam utilizar mais de um
papel e colar em outras partes da silhueta desenhada. A produção artística das Dinâmica
maioria já conviver na mesma enfermaria. Alguns participantes estavam ansiosos para falar
Musicoterapia. Nesse encontro a equipe de pesquisa foi composta por mim, como
coordenadora, sendo auxiliada por dois dos músicos que realizam as visitas musicais; um
como observador e o outro como encarregado do apoio logístico, ambos com as mesmas
duas das Unidades de Internação de Ortopedia. Esta dinâmica seguiu as mesmas etapas
“Alegria. Felicidade”.
(Vilmar)
. Dinâmica ‘Corpo-Musical nº 3’
encontro foi mantida a mesma equipe de pesquisa da dinâmica anterior. Esta dinâmica
Outros não quiseram opinar sobre a identificação. Ao final, para padronizar a identificação
dos participantes, sem apelidos que pudessem sugerir brincadeiras e letras que pareceriam
49
muito impessoais, optei por nomes fictícios seguidos do número referente à dinâmica da
qual participou. Outro cuidado foi conduzir a caracterização dos sujeitos com a devida
- Marcos (1) – Sexo masculino, 22 anos, estudou até a 7ª série do Ensino Fundamental
, é cabo. É casado, tem três filhas, sendo a menor de um ano. A esposa o acompanha na
dinâmica. Veio de outra região do país para realizar cirurgia na perna direita, apresentando
na ocasião aparelho fixador externo. Escreve com dificuldade, pois operou a mão direita há
aproximadamente 45 dias quando esteve internado por duas vezes em hospitais da sua
região. Participou de duas visitas musicais e tem preferência por música romântica.
outros participantes.
- Jader (1) – Sexo Masculino, 20 anos, estudou até a 1ª série do Ensino Médio. É
soldado. Solteiro, não tem filhos. Não relatou internações anteriores. Não especificou
pertencer a nenhuma religião. Há oito meses no hospital, já fez três cirurgias na mão direita
e aguarda a quarta. Seu estilo musical preferido é o pagode, mas durante a única visita
musical da qual participou anterior à dinâmica escolheu músicas religiosas. Não consegue
escrever e necessitou de ajuda durante a dinâmica. Menos comunicativo, seu discurso era
defendendo com clareza seus pontos de vista. Mostrou-se bastante atento durante todo o
encontro.
50
- Fernando (1) – Sexo Masculino, 23 anos, cabo. É casado e tem duas filhas. Já
participou de igreja evangélica, mas no momento está afastado. Cursa o 2º Grau. Realizou
cirurgia anterior, ficando internado à época por dois meses. A internação atual já dura um
mês, durante a qual retirou os fixadores da perna, aguardando nova cirurgia. Desloca-se
com ajuda de uma bengala. Participou somente de uma visita musical, dando preferências a
músicas do grupo de rock Legião Urbana que ele mesmo executou no violão. Prolixo e
com a internação.
tem dois filhos. Dependente de Sargento. Não relatou ser praticante de alguma religião.
Está internada há dois dias para operar a mão direita. Não consegue escrever, foi auxiliada
durante a dinâmica. Já esteve internada anteriormente por ocasião dos partos. Participou de
uma visita musical durante a qual escolheu a música sertaneja “Estou Apaixonado” cantada
pela dupla João Paulo e Daniel. Ansiosa, chorou ao falar sobre os filhos, mas participou
- Renato (1) – Sexo Masculino, 20 anos, soldado, está cursando a 8ª série do Ensino
Fundamental. Solteiro, não tem filhos. Participou de igreja evangélica, mas no momento
está afastado. Primeira internação hospitalar. Internado há 7 dias, aguarda cirurgia na perna
esquerda. Estilo musical preferido: pagode. Consegue andar com o auxílio de uma bengala.
religiosas. Durante as visitas musicais havia se mostrado mais comunicativo, mas durante a
dinâmica mostrou-se retraído. Falou pouco apesar de manter constante atenção. Discurso
pouco claro.
51
Participação em
Vis. Mus. 2 1 1 1 2
Preferência Música Pagode Rock Música Pagode
Musical Romântica Sertaneja
6
Única participante do Sexo Feminino
52
- Zito (2) – 36 anos, cabo, casado, pai de duas filhas, com 7 e 3 anos. Interrompeu os
Está internado há quase um mês para realizar cirurgia ortopédica na perna direita. Não
havia sido internado anteriormente. Participou de duas visitas musicais. Seu estilo musical
predileto é música sertaneja, mas relata não escutar música em casa. Durante as visitas
pelo coral do HCE, demonstrando interesse por já ter participado de um coral em sua
- Charles (2) – 20 anos, soldado, solteiro, cursou até o lº ano do Ensino Médio. Internou-
evangélica, mas no momento está afastado. Seu estilo musical preferido é MPB e pagode.
Participou de 3 visitas musicais, nas quais escolheu músicas variadas da MPB e rock
mostrando-se sempre muito expansivo. A partir das visitas musicais demonstrou interesse
defendendo com firmeza seus pontos de vista, em alguns momentos demonstrando revolta
Separado, tem 3 filhos de 11, 9 e 4 anos. É católico praticante. Internou-se há 21 dias para
53
realizar cirurgia ortopédica na perna esquerda. Não havia sido internado anteriormente.
Relata gostar de todo o tipo de música, possui vários CDs, e escuta muita música em casa.
Participou de uma visita musical escolhendo samba e MPB. Nesta, surpreendeu-se com a
além dos músicos. Deambula com o auxílio de uma bengala. No início da dinâmica
mostrou-se um pouco desconfiado na forma de olhar para mim e para o observador, mas ao
final estava mais sorridente. Expressou com clareza seus pontos de vista.
- Joaquim (2) – 45 anos, sargento, casado, concluiu o Ensino Médio. É casado e pai de
uma filha de 21 anos. É católico. Está internado há mais de 8 meses, para se recuperar de
e está fazendo fisioterapia, aguardando outra cirurgia. Seu estilo musical predileto é MPB,
possui CDs variados em seu quarto. Participou de cinco visitas musicais, sempre com
muito interesse. Em algumas delas esteve acompanhado pela esposa que também tinha
afirmou que fala pouco, mas durante a discussão mobilizou-se com o assunto, falando com
desenvoltura a ponto de interromper diversas vezes os outros. Gesticula muito. Tem senso
falar sobre suas experiências. Solidário com os outros participantes, fez diversas sugestões
Participação em
Vis. Mus. 2 3 1 5
- Leandro (3) – 20 anos, solteiro, estudou até o 2º ano do Ensino Médio. Soldado.
um dias e pela primeira vez. Durante as quatro visitas musicais das quais participou,
visita musical pediu mais músicas do Legião Urbana, entremeadas por MPB e uma música
participativo durante a discussão grupal, tentando expressar seus pontos de vista com
clareza.
- Paulo (3) – 22 anos, solteiro, cabo. Cursou até o lº ano do Ensino Médio. Católico.
Proveniente da Região dos Lagos, reside no quartel onde trabalha, indo somente aos finais
de semana para casa. Realizou cirurgia no braço direito. Internado há 10 dias, não esteve
internado anteriormente. Divide o quarto com Leandro. Sua preferência musical é pelo
pagode, mas nas duas visitas musicais das quais participou, escolheu também MPB e rock.
distraído, levantando-se inclusive para atender o celular. Manteve-se calado a maior parte
do tempo, falou muito baixo e somente ao ser solicitado. Necessitou de ajuda para escrever
- Denis (3) - 20 anos, solteiro, terminou o Ensino Médio. Soldado. Católico. Veio ao
hospital para realizar cirurgia no joelho esquerdo. Está internado há 2 meses, não tendo
internações anteriores. Deambula sem ajuda. Tem preferência por rock brasileiro.
outros participantes
Internado há três meses para realizar cirurgia no braço direito. Já havia sido internado no
ano anterior pelo mesmo motivo. No momento, divide o quarto com Denis. Apresenta
tocar violão, mas não estava praticando por ter vendido o seu. Voltou a tocar violão
durante as visitas musicais, demonstrando preferência por samba por haver tocado em um
Violão, mas afirmou que irá comprar outro violão para ele. Durante as visitas musicais
mostrava-se mais expansivo, mas durante a dinâmica ficou mais reservado, apesar de
atento. Um pouco inquieto, às vezes ficava mexendo com os chinelos. Discurso claro e
conciso.
- Geraldo (3) – 38 anos, casado e pai de 3 filhos com 10, 8 e 1 ano. Terminou o Ensino
ser avaliado com vistas à realizar outra cirurgia na perna direita. Está internado há dois
meses. Já esteve internado anteriormente para realizar cirurgia na mesma perna em hospital
da sua região. Relatou que seu estilo preferido é música lenta e forró, mas durante a visita
musical escolheu músicas do Padre Zezinho por ser a música que a esposa escuta em casa.
Só participou de uma visita musical porque por duas vezes esteve realizando exame ou
chão, pensativo. Aparenta timidez, mas durante a dinâmica, ao ser solicitado sempre tentou
expor suas opiniões, utilizando o espaço inclusive para desabafar durante alguns
momentos. O seu discurso às vezes tornava-se difícil de compreender, devido à sua forma
57
de falar, não somente pelo sotaque, mas por intercalar diferentes entonações nos momentos
Participação em
Vis. Mus. 4 2 4 3 1
Preferência Qualquer Samba e Música lenta
Musical estilo Pagode Rock Pagode e Forró
e esclarecido (Anexo III). Deste modo, os sujeitos foram informados que sua identidade
A produção dos dados foi gravada em fita magnética, seguida de transcrição. Cada
A produção, análise, discussão e validação dos dados foram feitas com base no
existencial que, nesse caso, é expressa através das produções artísticas; enquanto a
recodificação que se refere à síntese grupal, ou seja, quando há a validação do que foi
discutido anteriormente.
relatório de produção de dados. Essa análise foi realizada a partir da forma como o sujeito
59
da pesquisa enunciou o seu discurso, enfatizando aspectos que incluía o dito e o não dito; o
dizer, e as metáforas.
foram:
CAPÍTULO III
inatividade e rompendo com a rotina imposta pelo hospital. Enfocaram ainda a influência
comunicação, por vezes, ocorrida com a equipe de saúde, e pela convivência, nem sempre
Para iniciar a discussão, como o grupo estava contido, solicitei a cada participante que
fizesse leitura do que escreveu e colasse na silhueta do corpo físico a partir da temática
61
apresentação.
A dinâmica ‘Corpo-Musical nº 03’ teve uma duração menor que as outras devido às
características do grupo. Nele, os participantes tiveram uma postura mais reservada, apesar
Durante a dinâmica não surgiu uma liderança entre os participantes, assim como
não houve uma postura reivindicativa por parte dos mesmos, relacionada à sua condição de
62
hospitalizados como nos encontros anteriores. Este fato criou a necessidade de maior
incentivo da minha parte como moderadora do grupo para que eles expressassem suas
Esta dinâmica não introduziu novos temas, mas ampliou determinados aspectos
musicais e da emoção que as mesmas despertam, assim como, os aspectos ligados ao seu
autonomia do cliente, por vezes, prejudicada pelo tipo de disciplina ou controle impostos
pela instituição hospitalar. Isto porque, nestas visitas, o cliente escolhe a música que deseja
ouvir ou mesmo cantar, estimulando sua participação ativa e sua interação com outros
clientes. Além disso, os efeitos produzidos pelas visitas agem na totalidade do corpo do
cliente hospitalizado: físico, social e espiritual - que reage expressando-se sob diferentes
emoções.
Nesse sentido as visitas musicais promovem efeitos benéficos que não estão ligados
enfermeira e o cliente definiu como ‘momento de cuidado’. Para a autora, esse momento é
um ponto focal no espaço e no tempo que envolve ação e escolha entre os sujeitos do
constitutivos das concepções dos sujeitos acerca das visitas musicais se desenharam em
Cliente Hospitalizado
que, segundo Talento (2000, p. 255), defende a importância do cuidado no auxílio à pessoa
valores humanista de Watson (op. cit.) existe uma alta consideração pela autonomia e
pressupostos básicos sobre a ciência do cuidado de Watson (op. cit., p.254). Dentre esses
pressupostos, destaco três que estão intimamente ligados com a análise feita a partir das
concepções dos participantes sobre a influência que as visitas musicais exercem no cliente
interpessoalmente”, o que se evidencia nos relatos que se referem à sensação de bem estar
não somente ligado à música, mas à presença de outros clientes e dos membros da equipe
identificação. Por isso, é mister observar as músicas que fazem parte do universo do
cliente. Um dos cuidados que se deve ter é manter uma atitude respeitosa não somente em
relação à preferência musical do cliente, mas também atentar para o fato de se ele quer ou
deseja participar dessa atividade, pois só assim ocorrerá a validação dos seus sentimentos e
transforma a sua condição de doente em paciente. Nesse momento, ele perde a autonomia
sobre o seu corpo, passando de sujeito a objeto dos cuidados, situação que pode promover
Nesse sentido, dentre outras razões que serão apresentadas ao longo deste capítulo, as
visitas musicais passam a ser uma estratégia terapêutica pelo fato de estimularem o projeto
criação de recursos próprios. Nesse contexto, o primeiro subtema descodificado foi: “as
social
Ruud (1998) afirma que em função de a música estar sempre presente no nosso
cotidiano ela estrutura e ancora muita das situações utilizadas como material bruto no
educação, no trabalho, em atividades terapêuticas, sendo rara a situação em que esta não se
encontre presente. Essas vivências criam memórias de sentimentos que têm um papel
significativamente, criando uma trilha sonora ou biografia musical que está intimamente
(2002), filósofo social inglês. Este aponta novos mecanismos da identidade constituídos
por ele de auto-identidade, não é uma entidade passiva, mas que o indivíduo ao forjá-la
revisadas. Essas revisões são partes importantes do que o autor denomina como alta-
modernidade, visto que a produção do conhecimento, assim como a sua atualização através
da revisão é difundida pela mídia, o que pode influenciar as escolhas de cada um.
67
discussão grupal no âmbito das DCS citaram conhecimentos prévios sobre o efeito
terapêutico da música. Fernando (1) se referiu a um local em que trabalhou e que oferecia
aos funcionários uma sala de relaxamento na qual você podia escolher uma música e
recostar-se em uma cadeira para ouvir no período do almoço e que tinha como objetivo
diminuir o stress. Zito (2) relatou ter assistido uma entrevista em que uma pessoa utilizou a
música com vistas a diminuir a pressão arterial. Charles (2) também se referiu à leitura de
sujeitos, tanto na escolha das músicas durante as visitas musicais, quanto na sua
entre o local e o global e a escolha, entre tantas opções diferentes de vida, passa a ter um
possíveis modos de vida”. A pergunta ‘como devo viver’ deve ser respondida em decisões
cotidianas relacionadas ao comportamento que inclui o que comer, o que vestir, que
música ouvir, além de outras coisas. Ouvir ou se expressar através da música passa a ser
A música como representação desse sentido de nós mesmos foi abordada por
Wazlawick (2004) ao desenvolver uma pesquisa sobre a relação entre o sujeito e a música. A
autora concebe o sujeito como fazendo parte de um contexto cultural e social mais amplo,
68
onde a música, como atividade artística e criadora, está inserida, é parte integrante, se
sonora desse sujeito, a autora refere ser esta produto da configuração cultural da qual a
pessoa e seu grupo fazem parte e estas relações e conexões múltiplas criam uma
identidade sonoro-musical.
pensamento e sentimento de uma determinada época, pois além de proporcionar prazer, ela
pois é a visão de uma pessoa agente de sua realidade, que a constrói e constrói a si mesma
forma, o estilo de vida e as escolhas realizadas cotidianamente que são reflexos da auto-
identidade também são reflexo da inserção social e cultural do indivíduo. Nesse sentido, o
seu estilo musical contribui para formar e é formado por sua auto-identidade.
realizada por São Mateus (1998). Ao categorizar sentimentos associados a este tema
percebeu que alguns clientes gostaram do estilo da música selecionado pela pesquisadora,
enquanto outros não o apreciaram, o que a levou a refletir sobre o fato de que o enfermeiro
Como a expressão da subjetividade dos clientes é facilitada por uma abordagem que
neste espaço. E isso foi reiterado pelos participantes da pesquisa ao conceberem as visitas
musicais como mantenedora da autonomia dos clientes, uma vez que partem de sua escolha
cada um. Marcos (1) foi um dos participantes que defendeu com veemência a existência
desse respeito. Por ser proveniente de outra região do país, teve acesso a estilos bastante
discussão: _ “Eu respeito a música que eles ouvem aqui... Posso achar ruim, mas respeito
porque eles gostam, né ?” Para Marcos, o importante não era a diferença entre o gosto
musical dele e dos outros, e sim que esse fosse considerado, apesar de diferente,
vezes... a pessoa não tem que ser egoísta, por exemplo, se... ela só gosta daquela música,
sabe, aí coloca a minha também, coloca a dele, tal... Aí se ele for falar alguma coisa: _
Olha, colocou a sua música e eu escutei... então tem que me aceitar também! Pra defender
Marcos (1): _ “Queria falar sobre o pagode. Tem pagode que é bonito, como, por
exemplo, aquele do SPC, né? Que o cara ta sozinho, tal, sem companheira. Aí canta uma
coisa assim: _ “O que é que eu vou fazer com essa tal liberdade, se estou na solidão
pensando em você”7...
Fernando (1) interrompeu: _ “Eu gosto de MPB, mas não gosto de pagode...
Escutar algumas músicas de pagode, se tocar, eu até vou gostar, mas têm algumas que eu
vou ficar é calado esperando ela acabar logo, entendeu ?” (Alguns participantes riram).
7
O título da música é “Tal Liberdade” , composta e interpretada pelo grupo de pagode ‘Só Para Contrariar’.
70
Fernando (1) respondeu: _ “Não, insuportável não... Apenas não vai me alegrar
mais... Não vou participar, vou esperar a próxima [...] Mas se for MPB eu gosto à beça,
_ “Você gosta de rock, eu não gosto de rock! Mas eu não me incomodo, vou tranqüilo, não
tem nada... Mas é legal continuar com a pessoa... Eu não vou mudar porque tá tocando
rock! Vou continuar com a pessoa, por mais que eu não goste! Tipo assim, toca a sua
música, aí você fica alegre... e eu fico alegre contigo... Depois vai pôr uma música que eu
gosto, aí você vai... muda... Aí a minha música você não vai escutar?”
podemos expressar quem somos através das nossas escolhas musicais, há uma conexão
discussão relatada.
sua esposa estar regressando à terra natal. Ele apresentou um gosto musical eclético, pois
além de conhecer músicas de sua região aprecia também outros estilos musicais, dando
preferência ao que ele definiu como ‘música romântica’, que por se referir a relações
Já Fernando (1), que havia ressaltado inicialmente ter preferência por rock, relatou
durante a discussão gostar também de MPB, o que se relaciona com outros indicadores do
lugar social que ocupa. Uma das características presentes na fala de Fernando (1) é a
‘revolta’ ou ‘rebeldia’ indiscriminada, que encontra ressonância com o rock, estilo musical
71
surgido como “expressão livre e sem precedentes da energia sexual e da agressividade dos
tocadas ao violão pelo próprio Fernando (1) durante as visitas musicais, encontra-se ‘Que
país é esse?’8, interpretada pelo grupo de rock Legião Urbana que reflete essa revolta: “Nas
favelas, no senado/ Sujeira pra todo lado/ Ninguém respeita a Constituição/ Mas todos
Jader (1), durante as visitas musicais, escolheu músicas religiosas, apesar de afirmar
que seu estilo preferido era o pagode, o que pode ser explicado pela situação de fragilidade
relatou. Mesmo assim, ele fez uma defesa veemente ao pagode e também ressaltou, como
Marcos (1), que o importante é o respeito pelo outro; ainda mais, afirmou sentir-se feliz
pela felicidade do outro ao escutar uma música do seu agrado, mesmo que ele próprio não
espaços compartilhados, como é o caso da internação hospitalar, porque, sem esse respeito,
A MPB e o pagode, que é ligado ao samba, foram os estilos musicais mais citados
Moura (2004, p.55) se refere a essa resistência ao citar Muniz Sodré que afirma: “samba é
8
Música composta por Renato Russo.
72
Um dos pagodes pedidos pelos participantes das visitas musicais, ‘Coisa de Pele’9,
interpretada por Jorge Aragão, refere-se a essa identidade popular do samba: “Resiste
quem pode, à força dos nossos pagodes.../Arte popular do nosso chão/É o povo que produz
A MPB, que atualmente abrange diferentes formas de expressão musical, tem sua
origem calcada na canção pós-bossa nova com influências do samba e foi bandeira de luta
Vianna (2004) faz uma interessante afirmação sobre o rock brasileiro dos anos 80,
afirmando que o mesmo não podia ser considerado nacionalista ou patriota, pois suas letras
refletiam ironia e desencanto com a realidade brasileira, que como já foi apontado, tem
por grupos sociais diferentes que buscavam uma unidade. Tornou-se um símbolo nacional
assim como a mulata, sendo o estilo musical mais próximo da realidade brasileira ao
A preferência da maioria dos participantes por estes dois estilos musicais, MPB e
determinado contexto. Wazlawick (2004) afirma que a música é vivida no contexto social e
complexa, sendo influenciada pelo momento, conforme relatou Charles (2): _ “[...] A
música é muito estranha... A música tem seus momentos... Tem momento que eu quero
9
Música composta por Jorge Aragão e Acyr Marques
73
ouvir forró... Tem momento que eu quero ouvir pagode, tem momento que eu quero ouvir
MPB... Não tem dia certo, entendeu? Tem momento que eu escuto música evangélica...
Não é assim: _ “Ah, eu gosto de pagode”... Não, tem dias que eu quero ouvir outra coisa...
A música é muito...”.
A partir do seu discurso, penso que seja importante enfatizar a observação atenta
do profissional de saúde sobre o momento vivido pelo cliente. Ou seja, mesmo que seja de
sua preferência, determinado estilo musical pode não ser o mais adequado em algumas
circunstâncias. Assim, não basta conhecer o seu gosto musical, é importante estimular a
hospitalar, que pode ser responsável, por vezes, pela escolha das músicas, a exemplo
daquelas de natureza religiosa, na busca de conforto para seus temores, como ocorreu com
Algumas vezes a escolha pode recair sobre outro estilo musical que pode expressar
melhor os sentimentos dos clientes naquele momento, como no caso de Charles (2) que
disse não gostar de rock, mas escolheu a música ‘Será’10 interpretada pelo grupo Legião
Urbana. Em outro trecho, esta música diz: “Nos perderemos entre monstros da nossa
própria criação/ Serão noites inteiras com medo da escuridão/ Ficaremos acordados
pensando em alguma solução/ Prá que esse nosso egoísmo não destrua nossos corações/
Será só imaginação...”. É provável que essa música expressasse melhor a sua angústia,
provocada pela longa internação e por suas dúvidas em relação ao seu diagnóstico.
musical com outros companheiros internados, como ocorreu com Renato (1), que na
10
Música composta por: Renato Russo, Marcelo Bonfá, Renato Rocha e Dado Villa Lobos.
74
primeira visita estava sozinho no quarto e escolheu pagode, estilo ao qual se referiu como
Paulo (3) e Denis (3) também escolheram músicas diferentes do estilo que haviam
declarado inicialmente por influência dos companheiros de quarto que tinham um gosto
musical diverso. A influência externa pode estimular o desejo por músicas que não seriam
a sua escolha preferencial, mas que podem fazer parte do universo sonoro do cliente, sendo
mais adequadas à sua situação no momento da escolha, por motivos pessoais, ou somente
Nesse ínterim, o que quero destacar é o fato de que as visitas musicais, além de
utilizarem a música como recurso terapêutico, reúnem também outros elementos que as
qualificam como uma estratégia eficaz e eficiente de cuidado. Isto porque, além de
foi construído pela pessoa ao longo da vida. Esse significado pode ter se constituído a
partir de uma construção pessoal ou social e possui estreita ligação com o estilo de vida de
cada um, nos diversos contextos em que convive. Para Wazlawick (2004), esses
significados atribuídos à música não são únicos nem rígidos, mas têm a possibilidade de se
com o mesmo. Como a música está inserida em várias atividades que envolvem o sujeito,
Assim, é importante destacar que as biografias musicais não são estáticas, mas
evoluem de acordo com as mudanças que ocorrem no cotidiano de cada um. Esse fato é
75
exemplificado por Charles (2) ao justificar sua opção nas visitas musicais: _ “[...] Eu era
funkeiro, era só funkeiro... Aí eu comecei a fazer teatro, e no teatro escuta muita MPB...
Lenine, Cássia Eller.... Aí eu comecei a gostar de Lenine, Cássia Eller e MPB [...]”.
Para Charles (2) as próprias visitas musicais podem despertar mudanças no gosto
musical pelo contato com estilos diferentes, o que pode ser observado no seguinte trecho
Charles: _ “[...] O Ricardo (3), lembra do Ricardo? Ele tem um gosto de música
completamente diferente da gente, e a gente fica zoando chamando ele de careta... Aí,
depois que você começou a tocar, eu comecei a reparar que as músicas não são tão
caretas... A letra, da música dele, que tava ouvindo... Qual foi a música?
entendeu? De certa forma, na Ortopedia é um quarto para duas pessoas, então às vezes a
pessoa curte tipo... Eu curto pagode, eu curto de tudo, entendeu? Mas vamos dar um
exemplo, eu curto pagode e o cara não gosta de pagode, porque ele não teve oportunidade
realmente de ouvir pagode, entendeu? [...] Aí vai, ele escuta e tem a oportunidade de
partir das visitas musicais também refletiu sobre a possibilidade de ampliar seu gosto
musical: _ “Curto tudo, gosto de pagode, samba, mas não tenho nada contra outro estilo,
eu escuto também... Apesar de que a gente devia ouvir tudo, né? O que eu errei foi que eu
só busquei um estilo musical, imagino que a gente tem que tocar tudo, né? Para não ficar
11
Música composta por Renato Correa, Dalto e Cláudio Rabelo e interpretada pelo grupo ‘Roupa Nova’.
76
Esses relatos nos apontam outra influência da modernidade alta sobre a auto-
identidade, que segundo Giddens (2002, p.25), é a reflexividade. Para ele, a reflexividade
Eu se torna um projeto reflexivo e tem que ser explorado e construído como parte de um
processo de conexão entre mudança pessoal e social. Assim, como apontam Charles (2) e
Ricardo (3), a própria visita musical proporcionou a oportunidade para descobrir o novo e
acerca de quem queremos ser e a qual meio queremos pertencer. Concordo com Ruud
(1998) quando afirma que para criar esse modelo é necessário o contato com outras
pessoas que vão “espelhar” as estruturas e significados que compõem o nosso Eu. Nossos
Mesmo que uma parte dessa identidade seja diferenciada, é ao mesmo tempo uma
mudança.
Giddens (op.cit, p.207) afirma que como o Eu, o corpo não pode ser mais tomado
como uma entidade fisiológica fixa, mas está profundamente envolvido na reflexividade da
corpo tornam-se os lugares de uma variedade de novas opções de estilo de vida”. Questões
importantes da vida estão centradas nos direitos da pessoa que, por sua vez, se ligam às
dimensões da auto-identidade.
direito da escolha musical pelos clientes nas visitas musicais e a importância dessa escolha
77
para o resgate de lembranças relacionadas à sua narrativa biográfica pode ser evidenciado
que me fez mal... eu não vou me sentir bem... Agora, se eu ouvir uma música que eu na
Elisa (1): _ Eu concordo com ele! Se você já está aqui nesse lugar, é muito difícil
muita coisa, né? Aí você tá aqui e vai pedir uma música que te lembrou uma tristeza... Aí
A escolha da música pelo cliente nas visitas musicais estimula que ele expresse a
sua subjetividade, garantindo sua autonomia e sua participação ativa nessa estratégia de
cuidado. Jader (1) ampliou essa questão nesse trecho, quando afirmou: _ “No meu caso
assim, por exemplo, se vocês vão lá, eu prefiro escolher uma música de uma coisa que eu
passei de alegria, que eu me senti feliz naquela música... Eu prefiro assim uma coisa mais
produtiva”.
A palavra ‘produtiva’ utilizada por Jader (1) pode trazer um sentido que abrange as
finalidades para as quais as visitas musicais são empregadas junto ao cliente. Nesse
sonoro, e não do nosso, profissionais, pois somente o cliente sabe qual música naquele
momento vai lhe trazer lembranças agradáveis ou significativas, ou seja, vai ser
‘produtiva’, a partir do seu referencial de vida e de suas necessidades. Nesse momento, ele
respeito que possibilita o crescimento e a mudança dos seres humanos, garantindo sua
autonomia e sua liberdade de escolha. Para a autora, esses valores buscam preservar a
promove a criação de recursos próprios pelos clientes internados que buscam assim alterar
Na dinâmica corpo-musical nº 1, Elisa relatou que a visita musical lhe fez tão bem
que ela gravou a música escolhida ‘Estou apaixonado’12 no próprio celular e escutou à
noite, embalando-se para dormir. O refrão dessa música se refere à saudade, que era o
sentimento recorrente de Elisa durante a internação: “Estou apaixonado / este amor é tão
grande/ Estou apaixonado/ e só penso em você a todo instante”. Essa ação trouxe-lhe
desconhecido.
visitas musicais: _ “[...] E essa música, você vê o Fernando (1), já trouxe violão, aí a
gente fica tocando lá, fica parecendo até um luau, parece que a gente está na praia!
(Falou com muito prazer)[...] Então foi uma coisa que não foi só... A gente não espera só a
presença de vocês, a gente já está começando a se virar com a gente mesmo, porque é tão
pouco tempo, então a gente começa a se virar com as nossas próprias mãos.
participação nas visitas musicais, conforme foi relatado pelo seu companheiro de
enfermaria, Denis (3): _ “É tipo assim... A primeira vez que vocês foram lá no quarto, eu e
12
Versão musical da dupla sertaneja João Paulo e Daniel interpretada por eles próprios.
79
O Ricardo já está tocando, dá prazer... No primeiro dia ele: _ “Pôxa, tocar não sei o quê
ao final ele relatou ter tocado em um grupo de pagode, porém abandonou o violão em
função do acidente que havia prejudicado seu braço. Na segunda visita, sugeri que ele
tocasse o violão, e após alguma insistência ele acompanhou o grupo tocando os pagodes
que estavam na nossa pasta de música. Na terceira visita, ele prescindiu da pasta e tocou
músicas que ele aprendera no tempo em que acompanhava o grupo de pagode, mostrando-
seu potencial. Para Denis (3) foi a chance de cantar com prazer e repensar na possibilidade
de aprender a tocar violão. Para Ricardo (3), foi refletir acerca de voltar a tocar violão e
que prefere, o pagode. Isso ficou evidenciado a partir do diálogo iniciado por mim: _
assim... à minha família, os problemas de casa... entendeu? Alguma coisa assim que já
aconteceu... Eu sempre gostei de pagode, uma música que sempre mexeu comigo, uma
no resgate dessas lembranças estimuladas no contato com a música. Ruud (1998) aborda a
80
informação sobre como a pessoa se sente no mundo e como o corpo se adapta à situação, é
desperta lembranças afetivas. Aquilo que lembramos está ligado à emoção; quando
falamos sobre a música que apreciamos, falamos sobre nossos valores, o que é importante
fazem parte de sua narrativa de vida, e ao relembrar esses fatos, sente-se fortalecido.
subtema trazido pelos clientes, participantes das dinâmicas: “lembrar e esquecer: processos
Durante o processo de codificação temática, Renato (1) e Paulo (3) referiram que as
mãe preocupada. Já Leandro (3) reportou-se ao falecimento recente de sua avó, lembrança
que foi estimulada a partir da música clássica utilizada para induzir o relaxamento durante
grupal, também se referiram ao resgate de memórias latentes a partir das visitas musicais. _
“Vem na lembrança... que a gente tá pensando. São coisas assim... coisas que passaram
que pôxa mexeu muito com a gente... Um lado bom, assim, na nossa convivência... Foi
81
bom o que passou, e agora que a gente passa por momentos difíceis assim... queria
Em seguida, perguntei a Marcos (1), se lembrar lhe fazia bem. Ele respondeu: _ “É
lembrar do que passou... No caso se a gente estiver... num momento assim, se você está
passando por um momento muito difícil, aí a lembrança do que a gente passou, do que foi
bom pra gente... A gente pensa aquilo, naquele tempo era assim, eu não tinha isso...
adversidades. Assim, os fatos da vida cotidiana podem ser ativados por canções que trarão
especiais podem ser um “objeto do Eu” (Ruud, 2003), uma construção subjetiva que nutre
Esse sentimento de vitalidade pode ser ilustrado na escolha musical de Marcos (1)
na visita musical: ‘Azul da Cor do Mar’, composta e interpretada por Tim Maia, que diz
em um trecho: “Mas, quem sofre sempre tem que procurar/ pelo menos viajar,/ razão para
viver./ Ver na vida algum motivo pra sonhar,/ ter um sonho todo azul,/ azul da cor do
mar”.
Para Marcos (1) lembrar de momentos bons que, segundo ele, “mexeram”,
hospitalar. Leandro (3) reforçou que as visitas musicais lhes trouxeram lembranças
agradáveis: _ “Esse tipo de música que o pessoal pede prá cantar, na hora que ouve assim,
Encontro ressonância desses aspectos com a pesquisa realizada por São Mateus
sensibilidade, Paulo (3) também se referiu à lembrança de sua mãe e solicitou que sua
naquele mesmo dia, que foi relatado por Leandro (3), companheiro de enfermaria de Paulo
(3): _ “No caso dele (referindo-se à Paulo) o lance dele é o pai dele, a mãe dele também
hoje andou chorando e tal... Afastado da família por um tempo por problemas também em
casa...” (refere-se ao fato de ele morar no quartel porque a família é da Região dos Lagos).
O choro da mãe de Paulo (3), aliado à sua preocupação com o braço podem te-lo
mobilizado de tal forma que parece justificar o seu retraimento durante a dinâmica e o
trazer o foco para o tema a ser discutido na dinâmica, a relacionou à perda de sua avó,
música me fez lembrar da minha vó, que faleceu no ano passado. Minha avó não gostava
de nenhum estilo de música, ela só gostava do estilo clássico. Me fez lembrar de tudo o
comunicativo na dinâmica do que durante a sua participação nas visitas musicais. E a partir
83
perda, reafirmando a importância dessa lembrança na sua vida atual: _ “[...] eles nunca
tiveram um sofrimento na vida, como perder um parente... E a minha avó para mim, prá
mim eu conto como se ela fosse uma mãe, ela me criou, minha mãe trabalhava... E me
criava também... Mas para mim, eu sentia minha avó como se fosse a minha mãe, uma
segunda mãe, no caso... Então quando toca essas músicas, qualquer coisa que me faça
lembrar dela, me toca o coração, me dá saudade... Relembro muito dela e o que ela fazia
por mim...”
começam a formar sua bagagem musical com suas vivências musicais no ambiente
familiar, apropriando-se delas como constitutivas de sua subjetividade. Para Denis (3), a
música clássica está ligada à lembrança de sua avó e ele pôde expressar sua subjetividade,
por Dobbro (1998) que ao pesquisar a influência da música sobre a dor observou outros
aspectos que também sofrem sua influência, sendo inclusive quantitativamente superiores à
diminuição da dor. Entre os aspectos mais citados estavam o estado de ânimo e bem estar,
levou a autora a refletir sobre a utilização da música não somente em indivíduos com dor
Charles (2) se referiu a lembranças boas que a visita musical evoca: _“[...] Às vezes
tem música que também que... que vocês tocaram, que eu lembrei de momentos de quando
“o tempo passa mais rápido”. Nestes termos, a visita musical possibilita não somente o
Paulo (3): _ “[...] É bom porque dá uma relaxada, a gente consegue esquecer um
pouquinho...”.
Poxa, será que eles vão vir hoje, vão vir amanhã... Porque distrai a mente, foge da
realidade de estar no hospital, viu? Está ali naquele momento, todo o mundo brincando,
rindo, nem penso que eu estou... Que aconteceu esse acidente comigo nem nada...
Geraldo (3) entra no diálogo e conta sua experiência: _ [...] “Isso aconteceu
comigo, naquele dia, eu estava sentindo dores na perna... Eu sinto muita dor, né? Naquele
dia que a senhora chegou, cantando, a minha dor sumiu! Esqueci a dor naquela hora...
Fiquei emocionado[...]. E aí nessa hora vocês chegaram cantando... Aquela dor que eu
dor, a sua angústia também diminuiu quando, durante a visita musical, ele pôde escutar
músicas religiosas que o fizeram, por um lado, recordar-se de sua casa e, por outro,
apontado a mudança de foco a partir das visitas musicais: _ “ [...] Faz você não pensar só
naquilo, a preocupação de você querer operar, de querer ficar bom logo... A música
A relação entre o lembrar e o esquecer estimulados pela visita musical pode auxiliar
de Zito (2): _ “É, faz esquecer os problemas, as coisas negativas, né? Mas nos faz lembrar
de coisas assim... Que nos alegra, né? Às vezes, são problemas que passa na mente... Tudo
bem, depois passa ali aquele momento (referindo-se à visita musical), é como se
A mudança de foco promovida pela visita musical também foi apontada numa
pesquisa realizada em um Hospital Oncológico da cidade do Rio de Janeiro que tinha por
Esse projeto foi iniciado com o objetivo de promover a humanização hospitalar a partir da
pesquisa foi realizada com enfermeiros e assistentes sociais que estiveram presentes
durante a audição musical, e estes constataram que, além de relaxar, a música oferece uma
estabelecer uma lógica de cuidados inserida na saúde e não na doença. Assim, ao resgatar
suas lembranças, os clientes não as situam no âmbito do hospital, mas no seu cotidiano.
diminuição da dor, aponta que o alívio também estava relacionado à distração e alteração
86
medida que a música desvia a atenção do que incomoda, seja dor, ansiedade, medo ou
outro problema, ela pode proporcionar alívio e relaxamento que afeta o corpo de um modo
geral.
Assim, cabe esclarecer que este estudo não tem a intenção de analisar os efeitos da
música sobre a dor, até porque, teríamos que possuir outros parâmetros de análise que não
foram previstos nos objetivos desta pesquisa. Nesse sentido, o que cabe aqui considerar é o
mudança no foco de atenção, seja relacionado à dor no seu corpo físico ou emocional, ao
tenho observado que os efeitos positivos da música se potencializam nas visitas musicais,
abrindo espaço para que o cliente compartilhe seus sentimentos e reações em relação à
experiência vivenciada.
Charles (2) também se referiu a esse processo de desviar a atenção do que traz
sofrimento através da visita musical: _ “[...] Só que quando chega a música, ela dá uma
um mecanismo de ‘fuga’ ou uma ‘pausa’ no sofrimento, a que se referiu Charles (2). Ela
pode ser um momento de contato do cliente com sua subjetividade e/ou um momento de
reflexão sobre os acontecimentos que influenciam sua vida nesse momento, conforme
enunciado por Zito (2), durante a discussão grupal refletindo sobre o dito por Charles (2).
Para ele, esse processo reflexivo proporcionado pela visita musical perdura mesmo após o
seu término: _ “[...] Às vezes, a música assim, talvez eu não concorde muito com o
Charles: _“Acabou, vai embora!”. Não, ainda fica um tempo, fico meditando...”.
87
por Jader (1) que, inicialmente salientou o efeito da visita localizando-a na região da
cabeça: _ “boa para a cabeça, prá parar e pensar mais’. Posteriormente, durante a
problemas: _ “Eu acho que é boa para esquecer assim... muitas coisas, muitos problemas
Na sua produção, Ricardo (3) também se referiu à influência que a visita musical
produziu em sua forma de pensar:_ “Foi uma forma relaxante, em que a mente esvazia
melhores”. Nesse discurso, Ricardo cria uma metáfora relacionando o ‘esvaziamento das
jovens em suas histórias de relação com a música, que as canções que sublinham e
provenientes de suas vivências, dando nome e significado às mesmas, sendo possível por
deste vivido.
‘viajar’:
_ “[...] Estranho, né? Você entra naquele ritmo ali, eu fico viajando aqui, daqui a pouco
vocês vão embora, mas eu fico pensando, fica na mente...” Leandro (3).
_ “[...] E aí vocês vão lá no quarto e eu fico viajando com vocês tocando... A música... E
pensamentos e as emoções. A viagem a que se refere Denis (3), é uma viagem para dentro
de si, um movimento de busca interna que surge a partir da mobilização da emoção e que
do sujeito
escolheram a região do peito para colar os seus adesivos. Ambos se mostraram bastante
enfática e algumas vezes até expressando sentimento de raiva nos momentos em que
criticava a atuação da equipe de saúde. Já Elisa chorou mais de uma vez quando se referiu
aos filhos. O peito, localizado na região do tórax, onde reside o coração, é o centro das
emoções (WEIL; TOMPAKOW, 2004). Nesse sentido, Fernando (1) e Elisa (1) ao
localizarem sua produção nessa região, evidenciaram nessa escolha a forma como foram
Fernando (1): “_ [...] a música alivia um pouco a tensão e a agonia de estar apenas
deitado. A saudade dos meus filhos, e... Resumindo, a dor no peito de estar enfermo. Te
expressou o que sentiu durante a visita musical: “_ Estava horrível, triste, chorei. Depois
fundamental no ser humano. Segundo ele, toda ação humana se dá a partir de uma emoção;
nada ocorre deslocado dela. Para o autor (2001, p.129), “as emoções são disposições
corporais dinâmicas que especificam os domínios de ações nos quais os animais, em geral,
relata que a música comporta-se de forma tão semelhante às nossas emoções, que
Fernando (1) e Elisa (1) com a música pode estar ligada às suas características emotivas.
Sobre a relação entre música, emoção e corpo, Milleco Fillho, Brandão e Milleco
13
Segundo o vernáculo (FERREIRA, 1999) a definição (Psicol.) de emoção é: reação intensa e breve do
organismo a um lance inesperado, a qual se acompanha dum estado afetivo de conotação penosa ou
agradável.
90
Denis (3): _ “A minha avó, que faleceu o ano passado... Quando eu estava
angustiado com tudo... Toda vez antes de dormir ela botava uma música, sempre a música
clássica... Sempre a música... Ópera... essas coisas que acho que tem na rádio 98, coisa
assim... E ela veio a falecer o ano passado e isso me fez lembrar dela...” (referindo-se à
Paulo (3): _ “[...] Eu estou pensando na minha mãe que também fica preocupada
Para Paulo, a música o fez recordar a ansiedade da mãe e, por conseqüência, a sua
própria ansiedade em sair logo do hospital, mas, em seguida, ele se referiu ao seu dito
Geraldo (3): _ “Eu felizmente, no dia em que a senhora chegou lá, com o cabo,
cantando e animando, me senti emocionado... Sempre ouvi essas músicas que a senhora
cantou lá, emocionado, longe da família [...]. Tenho muita dificuldade e a gente pensa,
né? O pessoal me diz aqui, mas tenho muita coisa no coração, muita dificuldade, né?
estimular lembranças dolorosas que pudessem trazer desconforto ou tristeza aos clientes
91
Denis (3): _ “[...] É uma saudade gostosa de sentir [...]”. É a única coisa que eu
posso sentir, depois que a minha avó faleceu”. A partir do discurso metafórico de Denis
(3), pode-se observar que, para ele, a saudade despertada pelo som da música clássica
aproximava-o da figura da avó. Poder falar sobre isso durante as visitas musicais lhe
Geraldo (3) reiterou sua fala anterior confirmando o caráter integrador das visitas,
ficava só, em tristeza, aí vocês chegaram, começaram a tocar... Aí veio a emoção, alivia o
visitas musicais serem os mais enfatizados nos seus discursos, Denis (3), em um discurso
também expressou sentimento de frustração que surgiu a partir dessas visitas: _ “Bom,
deixa eu falar... É um tipo de frustração porque eu sempre quis muito aprender a tocar
violão... Queria aprender a tocar qualquer coisa, qualquer estilo de som... Só que eu
nunca tive oportunidade! [...] E aí vocês vão lá no quarto e eu fico viajando com vocês
de recodificação, reconheceu que fez outras escolhas: _ “É, não que eu tenha tentado
correr atrás prá aprender violão, mas aí eu preferi fazer outras coisas do que gastar
Apesar da frustração, Denis (3) revelou sentir prazer na sua participação nas visitas
dignidade a experiências que freqüentemente estão longe de serem dignas. Para o autor, o
significado que atribuímos à música não está nela, mas em nossas próprias reações ao
para ‘justificar’ sofrimentos, assegurando que estes não foram em vão. Assim, “a música
Assim, sentimentos como medo, raiva e tristeza diminuíram a partir das visitas
musicais. Acerca do medo, Elisa (1) relatou: _ “[...] Eu estava com medo... Eles chegaram,
começaram a cantar, eu fiquei outra pessoa, fiquei outra pessoa! Já estava melhor, tava
Para Fernando (1) o sentimento mais evidente durante o seu discurso foi a raiva e
neste trecho ele ressaltou a importância da música sobre esta: _“Se isso já tivesse
acontecido (referindo-se às visitas musicais), agora, tipo de manhã nos nossos quartos...
Tivesse feito uma musicoterapia conosco, entendeu ? Ficaria uma coisa melhor do que tá,
porque a gente fica naquele negócio de raiva! Já tá internado aqui, quer descontar!”
Para Charles (2), a visita musical influenciou mais sobre a tristeza que ele
negativos, é considerada por Watson (1996) como um fator de cuidado. Para a autora tal
enfermagem.
mais afetadas pela música. Os participantes das dinâmicas que inicialmente apontaram a
região do peito ou do coração como a mais afetada, em sua grande maioria foram os que se
pela música ao reviver momentos do passado, ligados a músicas católicas que ouvia com a
diminuíssem a sua insegurança. Esse sentimento de insegurança foi reforçado pela demora
também alívio, que se manifestou fisicamente, de forma perceptível para ele: _ “[...] Eu
respirei, senti forte a respiração [...]”. Em seguida, relatou diminuição da dor na perna e
trazido pela música, Geraldo não se referiu somente à dor física, conforme ficou
evidenciado nesse trecho dialógico: _ “Da angústia também... É uma emoção muito
grande...”. Logo após, no movimento próprio do diálogo, outro participante, Ricardo (3),
Charles (2) também destacou essa sensação de alívio que a música promove, re-
significada por ele como desabafo: _ “Eu acho que... Eu acho que a música... Ela é um
pessoas ficam meio com vergonha de cantar e participar; e a questão da música é boa, ela
se torna um desabafo porque você canta também, entendeu? Não pra você só ouvir...
Agora quando você só escuta, dá efeito também, mas não dá o mesmo efeito que você
cantar [...]”.
considerando o seu gosto e escolha musicais, inclusive dando-lhe a opção de cantar, caso
equilibra, renova, permite o desabafo e que através deste facilita a articulação entre
fatos ou acontecimentos objetivos nos quais o indivíduo está envolvido. Esse ‘pensamento
entusiasmado: _ “Eu acho que a profissão da senhora... Eu queria ter, só para dar
alegria... Acho legal!”. Para Zito (2) é um momento de transformação: _ “Esse tipo de
trabalho, com música... É o que eu falei, é aquele negócio, às vezes, a pessoa está
domínio de ações em que se move um organismo. (...) Tudo que fazemos é feito a partir de
uma emoção”. Se a disposição corporal que leva à ação parte de uma emoção, torna-se
importante observar que emoções a visita musical desperta. A partir da análise das
concepções dos sujeitos da pesquisa, a alegria foi a que mais se destacou no âmbito das
visitas.
sentimentos de alegria expressos por Fernando e Elisa em relação às visitas musicais, como
já mencionado, Maico também escreveu na mesma dinâmica: _ “A música, em si, ela traz
referiram na produção artística à alegria que sentiram após participarem das visitas
musicais:
_ “[...] E uma música que eu ouvi... Aquela música vinha... Aí vai embora tristeza,
vai embora amargor! A música assim é... alegrar, alegrar! [...]” Zito (2)
Para Jourdain (1998) não existe emoção neutra, as emoções são negativas ou
música pode gerar emoção positiva a partir das previsões que cria e depois satisfaz, sendo
96
que o contrário também pode ocorrer, ou seja, a música pode criar uma emoção negativa se
ou seja, exige uma participação ativa e não passiva da audição musical. Mas a emoção
positiva só surge à medida em que a música ouvida corresponda ao seu universo sonoro
e/ou aos seus padrões estéticos, porque apenas desse modo é possível fazer a antecipação
fossem colados no centro do corpo porque para ele, a música afeta todo o corpo. _ “A
música em si, ela traz um conforto, alegria, harmonia... Enfim, a mim ela traz
tranqüilidade para o corpo todo”. Jader (1) afirma que a música é boa para o corpo
também, de um modo geral, e não somente para a cabeça como ele havia escrito
inicialmente. Fernando (1) se refere a um efeito global durante a discussão: _“[...] então é
estímulo musical, como uma saída emocional mediante a “experiência estética, musical,
experiência que integra a totalidade do sujeito, envolvendo seu corpo, mente e emoções”.
A música promove diversas reações e os seus efeitos não podem ser separados, mas devem
ser vistos de forma global e complexa (DOBBRO, 1998; SÃO MATEUS, 1998; BACKES
et al, 2000).
holismo, que “é um ideal de plenitude que pode nunca ser alcançado, mas que está sempre
presente” (BRUSCIA, 2000, p. 93). A integridade pode ser vista como o impulso
Assim, a audição musical produz relaxamento físico e mental, pois reduz o stress, a
contato com a realidade ou com o ambiente, aumenta o nível de energia, estimula atividade
Bruscia (op. cit.) afirma que tanto o relaxamento como a estimulação pode
melhorar o estado de saúde de duas formas: preventiva (ao reduzir riscos ou aumentar a
quem enfrenta uma condição de doença). Assim, a música é um recurso terapêutico através
do qual se pode promover a melhora na condição de saúde do cliente tendo em vista sua
natureza holística.
Concordo com Jourdain (1998, p.410) quando se refere à música não só como uma
‘linguagem’ das emoções, mas também como uma ‘linguagem’ do movimento físico. Ele
afirma que nossas musculaturas são usadas para representar a música, modelando as
nos tornamos nós próprios um instrumento musical, deixando-nos tocar pela música.
perspectiva, ressalta Jourdain (op. cit., p. 410), “a música é capaz de causar prazer em
Essa sensação de prazer que envolve corpo, emoção, mente e espírito, resultando
em bem-estar ficou bastante evidenciada nos relatos dos participantes. Apesar de somente
discursos dos sujeitos da pesquisa com aqueles analisados por Arruda e Nunes (1998):
Vejamos: 1) ‘liberdade’ para fazer coisas que deseja; 2) ‘integração’ como estado de
harmonia entre corpo, mente e espírito; 3) ‘melhora’ percebida como a sensação de sentir-
redor, sentir que tem condições de sobreviver; 5) ‘cuidado’ inclui poder contar com
alguém, gostar dos profissionais de saúde, ser bem tratado; 6) ‘comodidade’ relaciona-se
Relacionando esses elementos de conforto sinalizados pelas autoras (op. cit.) com a
discussão ocorrida no âmbito das DCS, fica evidenciado que as visitas musicais
proporcionam conforto aos clientes internados, pois guarda relação com um ambiente
proteção e bem-estar. Em sua produção durante a dinâmica, Marcos (1) utilizou uma
significativo que Marcos tenha usado essa palavra, por analogia, para definir a sensação
que a visita musical lhe trouxe, pois ela reúne ao mesmo tempo o sentido de organização,
totalidade e música, o que, segundo o mesmo, lhe trouxe alegria, conforto e tranqüilidade.
Nesse sentido, relaciono a visita musical como estratégia de cuidado que traz a
sensação de integridade e que pode ser utilizada como um fator de bem-estar para o cliente
internado. Leandro (3) se referiu durante a produção a uma grande sensação de bem-estar
após a audição musical: _ “Senti um grande alívio, como se todos os meus problemas
Por ocasião da visita musical Leandro encontrava-se muito abalado com o seu
acidente e com a decorrente reação familiar. Esse sentimento foi aliviado a partir de uma
seu discurso durante a descodificação. Essa música religiosa chamada ‘Deus Forte’14, tem
entre seus versos: “ [...] Jeovah Rafa, meu Senhor, que cura toda dor/ Tsekenu Yaveh,
minha justiça é / Elohim, Deus no controle está/ meu Deus tudo governa”.
Estes versos trouxeram alívio a Leandro (3), que relatou ser evangélico: _ “Eu
sinto assim um alívio total, que os meus problemas todos estão resolvendo, que vai dar
tudo certo... Devido ao meu problema, lá no meu quartel ninguém quer me ajudar, quer só
me prejudicar mesmo, já falaram... Ouvindo aquela música ali prá mim, tudo vai dar
Ao afirmar que tudo vai dar certo, possivelmente Leandro estava projetando um
pode remeter-nos ao futuro, a algo que ainda esperamos viver. Dessa forma, “estaremos
(1996), a enfermeira deve se esforçar para estar dentro da estrutura de referência do outro,
numa busca mútua pelo sentido e totalidade do ser. Para a autora, essa busca inclui
O lugar social de Zito (2) como evangélico ficou implícito na palavra ‘alma’,
utilizada por ele na produção artística, termo usual em discursos religiosos: _ “Algo que
14
Música Gospel composta e interpretada por Kleber Lucas.
100
nos faz esquecer de tudo. Como fosse lá do fundo da alma”. Posteriormente, no processo
de descodificação, ele explicou o significado metafórico por ele atribuído à palavra ‘alma’
Durante as visitas musicais Zito (2) deu preferência a músicas religiosas antigas,
demonstrando prazer não só em escutar, mas também em cantar junto, situação que talvez
o tenha feito lembrar, durante a discussão, de sua participação nos cantos litúrgicos e no
coral da igreja. Para Milleco Filho, Brandão e Milleco (2001, p.50), a “utilização litúrgica
da música e do canto se faz presente, enfim, em todos os povos e civilizações, sendo esta
Todo”.
que a música pode trazer relaxamento e conforto espiritual, sendo um importante subsídio
partir do relato dos pacientes que estes se sentiram mais relaxados e confortados sobre os
Musical nº 03 quando Leandro se referiu à música ‘Deus Forte’ como renovadora de sua
confiança no futuro: _ “Tem... Tem sim, eu peço sempre para o A. (um dos músicos) tocar
“Deus é Forte”, né? [...] Marcou... a mente... Não sou nem de ouvir música assim
evangélica, não sou nem de ouvir... Mas marcou essa aí... [...] Eu sinto assim um alívio
total, que os meus problemas todos estão resolvendo, que vai dar tudo certo... Devido ao
101
meu problema, lá no meu quartel ninguém quer me ajudar, quer só me prejudicar mesmo,
já falaram... Ouvindo aquela música ali prá mim, tudo vai dar certo... Tenho fé e vai dar".
como se eu tivesse essa música sei lá, em outra vida, em algum momento assim... Marcou,
né?”. Essa dimensão religiosa, para Ruud (1998), inclui experiências de ‘significado’
quando a vida pode ser percebida como parte de alguma ordem maior. Segundo o autor,
essa experiência é muitas vezes descrita como um movimento para fora de nós mesmos,
vivenciam fortes reações corporais como se seus corpos e mentes estivessem cheios de
energia e poder, podendo ter um efeito terapêutico em situações em que a pessoa se sente
‘fragilizada’.
Em relação a essa mesma música ‘Deus Forte’, Paulo (3) disse: _ “Inclusive essa
aí, ‘Deus é Forte’, eu nunca tinha ouvido não, e eu gostei bastante também... É bastante
alegre, né? Parece que limpa a nossa alma assim... Alivia a nossa vida aqui no hospital”.
Essa metáfora criada por ele, ‘limpar a alma’, indica uma mudança em seu estado, em que
as sensações ruins são dissolvidas e assim, de ansioso ele passou a se sentir aliviado.
O relato de Paulo nos remete à angústia que a própria situação de internação traz ao
Charles (2): _ “Eu lembro que no primeiro dia foi só eu e Z, meu ex-parceiro de
quarto. Aí foi uma coisa... Nos outros dias que a gente se juntou com Ricardo (3) e Denis
o sujeito social ao estimular a sua participação através da escolha musical. Contudo, como
venho defendendo neste estudo, as visitas musicais vão além da escuta sonora de uma
música; elas potencializam seus efeitos e ampliam seus objetivos, na medida em que
seu gosto musical e a sua forma de participação nesses encontros. Também ficou
Afora esses aspectos já abordados que denotam a importância das visitas musicais
processo de recodificação, os sujeitos revelaram que essas visitas vão além das influências
positivas sobre o corpo do cliente; elas favorecem a integração entre os clientes e destes
sua experiência de forma emocionada. Por ser um ambiente que causa ansiedade, tanto
pela ruptura do cotidiano do cliente como pela imposição das rotinas hospitalares,
estranhas a ele, a ação dos profissionais de saúde pode ser importante no sentido de
vez que são as percepções da pessoa que tornam o ambiente ameaçador ou não”.
cliente. Essa ação conjugada pode melhorar o estado emocional e facilitar a interação do
mostrando que além do aspecto do sofrimento do doente decorrente da crise orgânica, dos
cliente neste meio e à alteração de seus papéis sociais. Contudo, durante a discussão
as visitas musicais como uma estratégia eficaz no sentido de minimizar essa inatividade,
musical nesse contexto foi revelada na discussão grupal ocorrida na ‘dinâmica Corpo-
Musical nº 1’ quando Fernando diz: _ “[...] Porque, às vezes, a gente fica no quarto
deitado, a gente fica muito deitado o tempo inteiro na cama, não tem nada prá fazer aqui
dentro... A gente é uma pessoa que tem sua atividade na rua, todo mundo é ativo... E aí
então vem prá cá e a gente fica aí... praticamente nada... A gente tem que criar! [...]
Quer dizer, então a gente fica nessa, uma agonia aqui dentro, viu? Fica se levantando e aí
não tem nada prá fazer, aí vai prá lá, vai prá cá... não tem o que conversar. E com a
música a gente... relaxa, viu, relaxa, tem o que fazer, entendeu? Se diverte...”.
inatividade que lhe foi imposta após o acidente e às internações hospitalares prolongadas,
fato que o leva a relatar o sofrimento psíquico que advém desta situação, relacionando
analogamente a inatividade com a ‘loucura’: _ “[...] Isso deixa a gente meio louco
também! Ficar muito tempo internado aí né, fica até meio perturbado, não sabe que dia é
hoje, não sabe de nada, não tem nada prá fazer, não faz nada! [...]”
vida e dos projetos que estabeleceu para si”. Essa perturbação a que se refere Fernando (1)
ruptura com a essência singular característica de sua identidade, que também está
Joaquim (2), da mesma forma que Fernando (1), passa por longo período de
internação com a sensação de aprisionamento: _ “[...] Mas a nossa vida é tudo preso, né,?
Tá ali, vai ficar ali, ocioso[...]”. Durante a discussão grupal ele reiterou essa sensação: _
“[...] É, e passa o dia, vai passando, passando, não sente! Agora imagina, você oito meses
Sobre isso, Vilmar (2) se referiu à desestruturação dos papéis sociais, quando de
pessoa ativa, ele passa a viver outro papel, o de uma pessoa reclusa e inativa: _ “[...] A
gente está acostumado a trabalhar, a ter nossa vida lá fora... Realmente é difícil aqui
complicado...”.
internação prolongada como um fator que pode levar o cliente a uma depressão: _ “[...] E
é isso que ele falou... (referindo-se a Joaquim). A gente fica aqui, esperando operar... Ele
já está há bastante tempo e você... (apontando para Joaquim e Charles) Eu acho que a
demora... Acho que a gente cria assim uma... cria uma depressão...”
Dentre os participantes das DCS, Vilmar (2) foi o que mais se mostrou atingido
com a inatividade, o que é perfeitamente compreensível, pois seu quadro clínico impedia a
referir aos outros companheiros de dinâmica, o não dito do seu discurso aponta para a
problemática vivida por ele próprio. Chaves e Ides (1995) se referem à situação semelhante
Fernando (1): _ “[...] Porque a gente fica numa rotina, todo o dia a mesma coisa... Todo o
dia a mesma coisa [...] Não tem nada pra fazer! [...] não sabe de nada, não tem nada pra
fazer, não faz nada[...]”. Seu discurso mostra a dimensão de sua ansiedade e revolta. Uma
das músicas que ele escolheu reflete não só os seus sentimentos, mas também os de outros
participantes da visita musical, sendo uma das mais pedidas por eles: ‘Tempo Perdido’15
que diz em um trecho: “Todos os dias quando acordo/ Não tenho mais o tempo que passou/
Charles (2) também expressou sentimento de revolta pela inatividade usando uma
metáfora: _ “[...] Lá em cima não tem nada, e a gente reúne, se encontra, joga baralho,
então é importante todo mundo se conhecer, entendeu? Porque tá todo mundo na mesma
situação, tá todo mundo na mesma furada, né? De certa forma é uma furada no que a
Após longo período de internação, Charles (2) certamente teria justificativas para a
revolta que sente com o estado de inatividade, mas o seu discurso metafórico apontou outra
direção, relacionada à sua situação profissional. Ele foi voluntário no alistamento militar,
procurando atender expectativas pessoais que, após a sua doença, não se concretizaram, o
que se revelou no seu entender como ‘uma furada’. A impossibilidade de decidir o seu
futuro, devido às implicações militares, acrescidas da ruptura radical com o seu cotidiano e
desestruturação dos seus antigos papéis sociais acarretou o que Chaves e Ide (1995)
poderiam ser consideradas como ‘diversão’, passam a ser rotina, conforme relatou Joaquim
15
Música composta por Renato Russo e interpretada pelo grupo de rock ‘Legião Urbana’.
107
(2): _ “Ah, então você não está vendo a cara da Ana Maria Braga, o Sítio do Picapau
Amarelo... Eu já sei tudo de cor! O dia que eu sair daqui eu não vejo mais televisão!”.
Isso se explica pela necessidade que o ser humano possui de variar as atividades
processo de hospitalização justamente pela ociosidade que forçosamente invade suas vidas.
afirmava que as cores, formas e luz não afetam somente a mente, mas têm um efeito real
afirmar que a ansiedade é intensificada nas pessoas que não podem variar de atividades.
diminuir o sofrimento dos pacientes, o que, como vimos, pode ser alcançado através da
visita musical que auxilia o ‘esquecimento dos problemas’, segundo relato dos
ocioso sugerindo que devessem ocorrer com mais freqüência para minimizar a monotonia e
a inatividade: _ “[...] Sabe, tem que ficar aqui a semana toda... Se isso fosse todo o dia
seria ótimo! De segunda à quinta, segunda à sexta... É até uma forma do pessoal passar
um pouco mais o tempo porque não tem nada prá fazer! Fica o dia inteiro sem fazer nada,
uma diversificação sobre a mente, conforme defendia Nightingale (op. cit.). Ele disse: _
108
“Você pode mudar aquela rotina e entrar em uma coisa completamente diferente! Vocês
largam as suas preocupações, o que você tem que fazer e só foca aquilo ali... O que você
tá ouvindo, você põe pensamentos melhores. [...] A gente sai daquela rotina da vida,
aquela coisa monótona, sempre aquilo e vai para uma coisa totalmente diferente [...]”.
As mudanças que alteram nosso foco de atenção e que nos dão prazer podem estar
Nightingale, citam fatores como música, cores, sons agradáveis, mudança de ambiente,
flores, e leitura de livros e afirmam que estes estão ligados a formas expressivas de cuidado
“das quais as enfermeiras podem lançar mão para desencadear o processo de restauração
estéticos’ no contexto das atividades variadas a serem desenvolvidas junto aos clientes.
prazer, também pode ser monótona se não houver diversidade. Joaquim (2), durante a
trocar o estilo musical para não ‘cansar’, conforme se observa no trecho dialógico a seguir:
Joaquim (2) disse: _ “[...] Olha, eu não sou muito chegado, mas tem um CD lá...
Aí eu boto, da Alcione... Eu acho legal! [...] Eu acho legal, acho que canta muito, e tem
uma música ‘maneira’... Quando eu estou cansado das outras que eu gosto? Alcione!
acho que por isso... Às vezes você não tá a fim de ouvir um tipo, quer ouvir outro,
relacionada também às atividades lúdicas para que elas não se tornem também monótonas
relaciona a trabalhos manuais afirmando que os mesmos podem trazer alívio ao paciente ao
de Denis (3) que estabeleceu relação entre o fazer, o tocar e o cantar, recodificando que
cantar é divertido, como podemos observar no seguinte trecho: _ “Eu gosto... Quando
Ricardo (3) tocou o violão lá... (referiu-se a uma visita musical em que Ricardo tocou
diversas músicas ao violão). Ele ficou tocando e a gente ficou cantando... Ele falou rindo:
_ Não posso fazer nada... Cantar todo o mundo sabe! Continuou em voz baixa: _ Pode ser
resgatam no cliente sua condição de sujeito social, referem como possibilidades aqueles
encontro com outros clientes. Segundo as autoras, esses cuidados favorecem a integração
assim considerados uma forma de cuidar. Isso vem ao encontro do diálogo travado entre os
integradoras.
Beuter (2004, p.28) se refere ao lúdico como um valor que não se adapta aos
quando utiliza o seu corpo para interagir com o cliente. Para ela, o lúdico no cuidado
expressivos são sintetizados por Denis (3) em seu relato sobre a visita musical: _ “É
relaxante, é engraçado, é cativante. É...”. O não dito em seu discurso revela a dimensão do
fato é que aquela música ali é que pelo menos você descontrai um pouco a mente,
entendeu? Muita gente pensa essa oportunidade como boa. O que está tendo aqui... Nem
todos os hospitais têm isso... Então você tem um momento de estar lá no quarto, todo
mundo cantando lá, mal, mas todo mundo estava se divertindo... Eu acho que seria uma
coisa boa botarem isso nos hospitais públicos mesmo... Particulares é mais difícil, mas é
Em seu discurso, Ricardo (3) apontou que, além de sua eficácia na mudança do
musical proporciona relaxamento, o que também foi constatado na pesquisa realizada por
musicais como uma atividade importante na hospitalização:_ “[...] Está ali naquele
111
momento, todo o mundo brincando, rindo, nem penso que eu estou... Que aconteceu esse
acidente comigo nem nada... E poxa, é ótimo estar aqui e devia ter... Tomara que consiga,
Há um elemento significativo, que pode ser observado nos discursos de Denis (3),
Ricardo (3) e Leandro (3), já discutido nesta pesquisa, ou seja, a importância das visitas
musicais não está centrada somente na possibilidade do contato com a música, mas na
Denis (3) se referiu à interação entre ele e Ricardo (3) quando o mesmo tocava e ele
cantava, enquanto Ricardo (3) e Leandro (3) se referiram ao encontro grupal durante a
Charles (2) também se referiu a esse encontro durante as visitas musicais: _ “[...]
As pessoas (se referindo aos músicos) quando passam no quarto 16, neguinho tá ouvindo,
neguinho tá ouvindo no quarto 18, falam: _ “Vamos lá, pro quarto 16 ouvir”... _ Que é
por pouco tempo, entendeu? Então neguinho vai lá no quarto 16 prá acompanhar o dos
outros [...]”.
visitas musicais como um momento de encontro grupal, pois eles estavam entre os que
mais haviam participado dessas visitas. Charles (2) participara de três, enquanto Denis (3),
Leandro (3) e Ricardo (3) participaram de quatro visitas musicais. Na primeira visita
mostraram-se retraídos, mas, após a segunda, os que podiam andar passaram a acompanhar
Esses encontros, promovidos pelas visitas musicais faz com que os clientes se
conhece o outro, né?” Joaquim continua: _ “Porque de repente você tá internado aqui,
mas não conhece o outro, é complicado... [...] Porque é importante, às vezes está todo o
mundo... Lá em cima não tem nada, e a gente reune, se encontra, joga baralho, então é
importante todo o mundo se conhecer, entendeu? [...] Então a gente se unindo, aí vem um
traz DVD, vem outro traz videogame, vem outro traz baralho... No final de semana
passado eu fiquei aí, a gente... Outro dia a gente fez churrasco naquele bagulho de
Joaquim retomou: _ “Até integrar todo o mundo...” Charles completou: _ “É, para
todo o mundo se conhecer... Porque um não conhece o outro, né?” Joaquim continua: _
Porque de repente você tá internado aqui, mas não conhece o outro, é complicado...”.
Ao possibilitar conhecer outras pessoas que dividem o mesmo espaço e que passam
por situações semelhantes, as visitas musicais abrem espaço para acessar outros encontros
permitindo que houvesse prazer no convívio entre os clientes e entre eles e a equipe de
enfermagem.
das visitas musicais, ou por estarem realizando procedimentos junto aos clientes ou por se
sentirem atraídos pelas músicas ou pela alegria contagiante do ambiente. É oportuno dizer
que a maioria dos integrantes da equipe de enfermagem que atua nas unidades de
aceita bem esse trabalho, demonstrando isso através de olhares, sorrisos, do canto e de
Aguiar (2004) em que uma enfermeira entrevistada também se referiu à música como um
referiu que a equipe é resistente à mudança, sendo difícil alterar a rotina para incluir uma
Como diz Beuter (2004, p.153), o lúdico “rompe com a ordem instituída no hospital
profissional”. Essa transgressão à ordem instituída, se, por um lado, pode mostrar-se útil
dicotomiza o lúdico e o trabalho. Nessa perspectiva, o lúdico torna-se restrito apenas aos
momentos livres impondo, de acordo com essa visão, uma postura profissional rígida que
divididas entre realizar sua atividade profissional dentro das normas estabelecidas pela
Silva (2004, p.38), ao relatar o caso de uma cliente idosa em estado terminal que
gostaria de fazer, subitamente externou o desejo de cantar. Essa situação inusitada foi
levada à discussão com a equipe que decidiu manter a cabeceira da cliente elevada em
ângulo propício para que pudesse cantar sempre que desejasse, o que ela passou a fazer por
diversas vezes até a sua morte. Talvez em outra circunstância ou ao assumir a equipe uma
114
postura mais rígida, seu desejo fosse ignorado por modificar a ordem estabelecida
profissionais de saúde. Algumas destas situações foram descritas pelos sujeitos da pesquisa
que apontaram as visitas musicais como uma estratégia eficaz para diminuir esses
pouquinho, já... Porque ficar o dia todo sentado só com os pensamentos que vêm na
cabeça...”.
desconforto foi destacado na pesquisa realizada por Barcelos (2003) na qual os clientes
como sendo fundamental para o cuidado com o cliente, já que a base do seu trabalho é o
Falhas na comunicação podem trazer grande angústia aos clientes internados, como
pode ser observado a partir da fala de Vilmar (2) no processo de descodificação: _ “É, o
que eu senti quando eu entrei também foi a mesma coisa... A gente entra, fica aquela
expectativa de que ninguém passa para a gente o que vai ser feito com precisão, né? A
gente vai ficando aí... Alguém fala uma coisa, fala outra e fica aquela expectativa
informação ou informações imprecisas para o seu estado atual. A expectativa gerada pelas
de informação! O cara chega de manhã e fala [...]”. Vilmar interceptou a fala de Joaquim,
retomando seu discurso anterior: _ “A falta de informação deixa a gente pensar mil coisas
mobilização que o mesmo produzia sobre Joaquim e Vilmar. Essa falta de informação
revela ausência de diálogo que, na concepção de Barcelos (2003), se traduz como prática
gerada a partir deste fato, colocando-se mais disponível para estabelecer uma relação
pessoas que não têm nenhum vínculo entre si e se vêem obrigadas a partilhar o mesmo
ambiente com outros clientes e também seus acompanhantes, como relatou Elisa (1): _ “
[...] Estava horrível, a senhora que estava ao meu lado tinha uma acompanhante que me
Essa situação foi tão mobilizadora que Elisa (1) solicitou mudança de quarto. Ela
não especificou o que acontecera, mas demonstrou durante o relato ainda estar sob efeito
da angústia que tal lembrança lhe trazia. Este sentimento diminuiu após a visita musical,
proporcionando-lhe tamanho alívio que a motivou a gravar música para embalá-la quando
(2004), a música permite a vivência de uma realidade emocionada que integra a emoção
desencadeada pela música Elisa (1) pôde encontrar uma saída para lidar com a angústia
com pessoas da equipe ou outros pacientes. Jader (1) se referiu a isso de forma velada
Jader: _ “[...] Porque tem gente que fala: _ Faça isso... Tipo assim, coisas que a
gente nem escuta da nossa mãe, a gente escuta de pessoas que não são nada nosso... A
Jader: _ “A internação... Estamos aqui obrigados, né? A gente já não quer estar,
ainda passa por uma situação dessas, acaba deixando a gente meio maluco... Esse negócio
mas também de se proteger. Como ocorre com muitos clientes internados, Jader podia ter
receio de não ser bem tratado, caso fizesse alguma queixa contra os profissionais
responsáveis pelo seu cuidado. Joaquim (2) também se referiu a esse receio ao fazer uma
comunicação entre médico e paciente: _ “A pesquisa está indo para outro lado [...] A
Esse receio de ser discriminado pela equipe foi abordado durante a dinâmica
que foi até questão disso, que falou: _ “Você não pára no quarto!”. Eu falei: _ “Pô, eu
Em outro momento do diálogo, Charles (2) foi mais explícito sobre o seu medo de
ser tratado de forma diferente: _ “[...] Eu tinha medo de ‘X’ não levar para o lado
profissional e levar para o pessoal... Porque tem que entender que um paciente internado
nove meses fica doido! Tem uma hora que enche e extrapola! [...]”.
Silva (2003) considera que não existe comunicação objetiva, pois ela se faz entre
pessoas e cada uma é um mundo à parte com suas experiências, seus valores e suas
apreendamos o mundo de acordo com a mesma. A autora afirma que para desenvolver uma
internado e o que esta experiência afeta no seu grau de autonomia, integridade, auto-
“falta de compreensão desses aspectos pode ser mais danosa, prejudicial do que a própria
doença”.
saúde confrontam-se diariamente com situações que trazem riscos emocionais. Waldow
(op.cit) afirma que quando o estresse está presente, esses profissionais tornam-se mais
envolvidos.
no discurso de Fernando (1), quando ele se referiu a uma situação de conflito ocorrida com
outra pessoa da equipe: _ “[...] Não vou dizer que ‘Y’ não me ajudou, me ajudou também...
à enfermagem. Segundo Pitta (2003, p.65), se, por um lado, eles demonstram apreço e
normas e rotinas muitas vezes são mantidas com base em uma visão mercantilista da saúde
que leva à burocratização das instituições. Para Waldow (1999) essa situação aliada ao
acaba por dar mais valor à dimensão técnica, proporcionando cuidados ‘para’ e não ‘com’
o cliente.
minimizar essa tensão resultante do convívio hospitalar: _ “Se isso já tivesse acontecido
(referindo-se às visitas musicais), agora, tipo de manhã nos nossos quartos... Tivesse feito
120
uma musicoterapia conosco, entendeu? Ficaria uma coisa melhor do que tá, porque a
Fernando (1), em outra parte do seu discurso fez uma reflexão sobre a circularidade
do conflito, pois cada um afeta o outro numa crescente insatisfação que influencia
negativamente a todos: _ “[...] Então no caso essa pessoa lá, todo o mundo se estressa
com ela, e então geralmente é por causa disso, a gente já está estressada... Lógico que
está! O cara já desmarcou três vezes! (se referindo ao cirurgião) [...]. Então é um stress
que você tem! Aí você vai falar com uma pessoa dessas e ela te trata mal... Pronto! Com
certeza isso! A não ser que você esteja com a cabeça no lugar, e que de repente não
esteja...”.
a desenvolver um processo de estresse que acaba afetando as outras ao seu redor. Mas,
assim como a irritação e/ou a ansiedade derivada do estresse podem contagiar outras
Fernando (1): _ “E agora, se tocar a música antes, eu vou lá relaxar um pouco, conversar,
tocar uma música... Tem uma brincadeira nisso tudo, fica mais contente! [...] pode falar a
maior ignorância que for, que você vai estar mais tranquilo! Não sei se de repente eu
proporcionam relaxamento e bem estar, que segundo Fernando (1), vão deixá-los menos
propensos a criar conflitos. Essa situação foi recorrente no discurso de Fernando (1)
durante o processo de síntese grupal quando ele falou sobre o efeito benéfico da visita
musical: _ “Ajudar não só a gente, todo mundo que está enrolado naquilo ali, né? Todo
mundo... porque assim, se eu estiver mal... pôxa, a senhora também vai ficar mal! A
121
senhora está cuidando de mim também, a senhora vai lá falar comigo e eu venho com
Outra participante dessa mesma dinâmica, Elisa (1), a partir da discussão grupal
sobre o estresse que existe no ambiente hospitalar, sugeriu que a visita musical se
estendesse também à equipe de enfermagem. Essa sugestão foi reafirmada durante a sua
síntese: _ “Sim, aquela idéia de pôr a música, ou musicoterapia para o pessoal que
trabalha”.
produzido a partir da visita musical e refletindo sobre o efeito desta na equipe: _ “Eu fiquei
solto, entendeu? Leve... Eu estava com um stress assim, aquela agonia... De repente, todo
o mundo se soltou, numa boa, tá solto e pronto pra começar de novo... No caso, pronto pra
agir com os pacientes novamente! Seria bom pra eles também. (se referindo aos
profissionais)”.
A relação estabelecida por Fernando (1) e Elisa (1) entre o estresse que permeia as
constatado também por Chagas, Gazaneo e Aguiar (2004). Em pesquisa realizada com os
profissionais da área da saúde verificaram que a música para eles alivia principalmente o
estresse, sendo aguardado com alegria o dia em que eram realizadas as atividades musicais
com os clientes internados. Uma outra influência observada por esses profissionais
música tocada ao vivo por membros da equipe de enfermagem em um CTI trouxe uma
série de benefícios para a equipe: diminuição dos níveis de tensão e desgaste psicológico,
122
integração social.
musicais, percebo a satisfação com que somos recebidos pela equipe de enfermagem. Um
atendida.
de enfermagem requer, pois somente ao exercitar o próprio cuidado ele estará apto para
cuidar. Sobre isso, Silva (2000, p.86) afirma que a dimensão humana do cuidado requer
que o mesmo seja voltado para nós cuidadoras/es e que “exercitemos em nós este cuidado,
como pré-condição para gestarmos uma atitude de cuidado para com aqueles que
compartilham conosco um mesmo destino temporal e espacial”. A autora ainda afirma que
este cuidado atentivo e cotidiano é a expressão mais genuína do nosso ser, nossa
humanidade.
seja com estratégias musicais ou com outras atividades expressivas que promovam
bem-estar. Segundo Silva (2000, p.88), o cuidado de si é um cuidado ético, pois a partir
social”.
Observo, também, que nas visitas musicais em que ocorre a participação de algum
membro da equipe de enfermagem com o cliente, surge uma cumplicidade entre eles, pois
123
risadas. Nesse contexto, as visitas musicais podem promover a sintonia entre o profissional
que cuida e o ser cuidado no momento em que ocorrem, na medida em que permitem que
possuem uma série de características que as tornam úteis, eficazes e agradáveis como
quem toca e a quem é tocado, seja com gestos, palavras ou sons. Tocar para sensibilizar
utilizado por Teixeira (2004, p.362) para designar um processo contínuo de criação e
simplesmente pratica uma ação ativamente”. É importante, segundo ele, refletir sobre as
durante a internação e que fizeram parte da crítica-reflexiva dos sujeitos da pesquisa não
Uma outra situação que amplia a angústia do cliente é a ruptura do cotidiano que
Muitos se referiram à visita musical como sendo uma estratégia para diminuir o sentimento
de solidão decorrente desse afastamento, o que nos aponta para o subtema: ‘a visita
internado. Fica aquela agonia da gente estar aqui internado, né, porque nossos filhos
estão longe... Minha primeira vez, meus dois meses aqui, foi horrível porque morri de
saudade das minhas filhas, eu não via a hora de ir embora, e nessa época não tinha
Além da saudade das filhas, Fernando (1) em seguida se referiu a outro aspecto que
lhe trazia muita angústia e ansiedade - a preocupação com o bem-estar das mesmas,
refletida na região do corpo que escolheu durante a produção artística, o peito. Como
saudade: _ “É, bem na parte do coração também, né? Um pouquinho por causa das
minhas filhas, porque me vejo longe delas, porque eu tive que me separar delas... E a
minha filha está com problemas, estava brigando na creche, batendo nos outros, ficando
Em seguida, ele fez uma relação de seus sentimentos com as visitas musicais,
sugerindo que elas deveriam durar mais, buscando um paliativo para o sofrimento: _ “[...]
Acho que deve ter bastante... devia ter um pouco mais... o tempo que vocês ficam lá com a
metafórico: _ “[...] Daí ficou, daqui a pouco foi embora... Falei: _ Acabou a festa! [...]”.
125
Para ele, a modificação do ambiente ocasionada pela visita musical foi tão grande, que ele
de internação, mas também pela distância, como sugeriu Marcos (1), proveniente de região
internação:
_ “[...] Eu e a minha mulher temos três filhos, todas elas são mulheres... Estão
[...] longe pra caramba, é quase na fronteira! [...] Ela sofreu prá caramba também, ela
chorava, ficou bem angustiada! Mas, graças a Deus, ela conseguiu se recuperar e agora
ela tá melhor”.
Elisa (1), única participante do sexo feminino, também se referiu à saudade dos
filhos de forma muito emocionada. Ela esclareceu que sua angústia não estava ligada ao
medo da dor relacionada à cirurgia, mas às preocupações com o que ocorria ‘lá fora’: _
“Mas não é pelo fato de doer, não é isso... É o lá fora, qualquer coisa é o lá fora... Quer
dizer, é assim, tem que estar relaxado, tem que estar tranqüilo... Mas não tem como![...]”
Ela se preocupava ainda mais por considerar que as alterações que estariam
ocorrendo em casa poderiam decorrer da sua ausência: _ “[...] Por isso, não sei vocês, mas
a minha filha ficou hoje assim no telefone: _“Por quê?”(recomeça a chorar) Saudade?
Porque ela não ta aqui, ela não tava com nada antes... Mas eu fiquei firme, não chorei e
falei: _ Filha, toma o remedinho que vai passar... É ruim, né? Meu marido vai ver eles
tudo, depois volta e chega e conta um pouquinho de coisa... É ruim! É angustiante demais,
eu acho!”.
Sua angústia pode estar relacionada não somente ao seu afastamento do convívio
familiar, mas também, como se referem Chaves e Ide (1995), à supressão dos antigos
papéis sociais e assunção de novos processos. Naquele momento, Elisa (1) não podia
126
exercer a sua função de cuidar dos filhos, e, ainda mais, dependia do marido para obter
Geraldo (3), que se mostrava muito preocupado com sua própria situação, pois
teria vindo ao Rio de Janeiro inicialmente para fazer uma avaliação cirúrgica e acabou
hospitalizado, também abordou essa preocupação com a família. Para ele, esta era uma
situação que abalava sobremaneira o seu estado emocional, pois a sua filha caçula, de um
ano de idade, tinha diagnóstico de câncer e havia estado até recentemente internada em um
jeito que está atrasada a cirurgia... Eu fico em dúvida também... Será que vai dar certo, a
dificuldade de fazer a cirurgia... Tenho muita dificuldade e a gente pensa, né? [...] O
sofrimento que eu tive, de ficar longe da minha família, a minha filha está doente [...]
no coração, relacionando toda a sua angústia referente a seu estado de saúde ao mesmo
tempo em que se preocupava com os filhos _ “Essa angústia que brota dentro do meu
coração (falou com a voz embargada pelo choro)... Tenho vontade de ir embora... Eu
tenho dificuldades por sentir dor, mas ficar longe da família, também... Eu perguntei se dá
para mim cancelar a minha cirurgia, eu pedi para o coronel e para o major também. Eu
quero fazer o certo, mas... Eu dei a sugestão... Tenho que pensar nos meus filhos... Por
dor que sentia na perna operada, pois, como já havia relatado anteriormente, a dor física e a
angústia desapareceram quando ele entrou em contato com a música religiosa durante a
127
visita musical. Concordo com Teixeira (2004, p.365) quando afirma que o sintoma
que observamos o resultante das tensões sociais que o indivíduo transforma em saúde ou
doença”.
que sentia da família e filhos: _ “[...] A gente fica assim tipo isolado dentro de um quarto,
trancado... A gente pensa em família, pensa em filho, né? De um modo geral é muito ruim!
[...]”. Posteriormente, ele relatou o prazer que sentiu ao ter sua expectativa superada
durante a visita musical: _ [...] “Naquele dia eu fiquei até surpreso, né? A música entra
Em outro momento da discussão, Vilmar (2) abordou também a percepção que teve
da solidão a partir da experiência da internação: _ “Eu acho que é assim... No mundo que a
gente vive lá fora, a gente não tem consciência e nem noção do que é a solidão... Quando
a gente cai aqui é que a gente vê o que é que as pessoas às vezes passam aí fora, sozinho
em um lugar... A gente não sabe o que é a solidão... Isso aqui ensina muita coisa”.
grupos sociais a que pertence, além de alterar suas relações consigo mesmo, resultando em
(2), quando descreveu o que sentira na visita musical: _ “Me senti lembrado, ou seja, uma
pessoa muito importante; melhorou bastante a minha cabeça”. Durante uma das visitas
musicais, Joaquim (2), que estava internado há oito meses, se referiu a uma ocorrência
128
estima. Esse fato pode ter se refletido na seguinte fala: _ “Das pessoas que gostam de você
realmente. Das que te abandonam...” Posteriormente, durante a recodificação, ele diz que
Marcos (1) também se referiu às visitas musicais como algo que o fez sentir-se
Eu: _ “Marcos falou uma coisa, a música fez você se sentir especial, você pode
chegou: _ “Vocês gostariam que a gente cantasse uma música para vocês”? _ Pôxa, seria
ótimo ! E começa a cantar, entende ? Especial, porque aí a gente pensa: _ Pôxa, não estou
aqui abandonado, tem gente que vem alegrar a gente, fazer se sentir feliz, cantar a música
que a gente quer, dar oportunidade... uma coisa boa pela gente! Uma coisa boa... pra
Para Marcos (1) e Joaquim (2), sentir-se especial ou importante estava relacionado
sensação de abandono ocasionada pela falta de visitas, e para Marcos, além de diminuir a
sensação de abandono, afastado da sua família e seu círculo social pela distância, ainda,
musical.
Charles (2), que também estava internado há oito meses fez referências à solidão
provocada pelo afastamento familiar e pela alteração do seu cotidiano, que para ele,
129
de dormir é a pior hora... A pior hora é na hora de dormir... Você está acostumado a
dormir com a tua mulher, com a tua mãe, tua irmã e teus filhos, teu pai... Você vai dormir
entendeu?”.
Durante uma das visitas musicais Charles (2) solicitou a música ‘Sozinho’16 que diz
em um trecho: “Às vezes no silêncio da noite/ Eu fico imaginando nós dois/ E fico ali
sonhando acordado/ Juntando o antes, o agora e o depois/ Por que você me deixa tão solto?/
Porque você não cola em mim?/ To me sentindo muito sozinho...”. Esta música estava em
consonância com seus sentimentos, permitindo que ele expressasse sua angústia pela solidão
pesquisa trouxeram para o espaço das dinâmicas durante a discussão grupal, a concepção
Vilmar (2)_ “Foi isso que eu falei, nesse sentido... A partir da música, no caso, a
gente não está muito sozinho, né? Foi o que eu falei, um passa e fala, outro fala, a gente
começa a se conhecer para bater um papo e faz com que o tempo passe mais rápido e a
solidão não fique só aquilo, né? Acho que dá para disfarçar um pouco, distrair um
pouco[...]”.
por ser uma atividade compartilhada. Ou seja, para que elas ocorram é necessário a
participação de todos tocando, cantando ou escutando. Essa característica das visitas cria a
16
Música composta por Peninha e que se tornou sucesso ao ser interpretada por Caetano Veloso.
130
Charles (2), no âmbito do qual o primeiro usou a analogia entre a enfermaria e uma cela
para demonstrar a intensidade do seu isolamento. Joaquim: _ “Prá gente que está meio
jogado... Porque a gente cruza um com o outro no corredor e aí bate meia hora de papo,
ou senão é (assobia e faz um gesto de movimento, de saída) para a cela, tem que voltar
para a cela”. Charles acrescentou: _ “A gente passa mais tempo com o sujeito do que com
colegas de internação.
recorrente entre os participantes das três dinâmicas desenvolvidas e deve ser considerada
participação nas visitas musicais ocorreu a partir de uma solicitação da enfermeira. Esse
Talento apud Watson (2000) cita dois aspectos das atividades de enfermagem
percebeu que a necessidade apresentada pelo cliente não estava circunscrita somente ao
visitas musicais: _ “[...] Eu vim conhecer Fernando (1) ali, quando eu estou ali e ouvi
aquela música evangélica... E foi assim que eu o conheci... Da outra vez eu fui lá no
quarto de Marcos (1) e assim foi acontecendo, o conheci também através da visita
musical”.
Geraldo (2) também se referiu a esse momento da visita musical como algo especial
por minimizar os efeitos da solidão: _ “Traz alegria, o lugar assim fica diferente... Eu
senti assim, na hora que você chegou cantando, eu sozinho lá, você cantando e ele tocando
violão... Senti... Parece que tinha muita gente ali naquela hora [...] eu estava sozinho sem
sair, eu não saía para canto nenhum também... Eu me senti aliviado, né?”.
as visitas musicais, um outro que chega, canta e toca. Para ele, não havia somente duas
pessoas a mais, havia ‘muita gente’. Nossas vozes entraram em sintonia com ele,
dessas visitas.
sugestões se referiam aos desejos dos participantes, estimulados na vivência das visitas
mas também para o desejo de maior tempo de duração da visita musical ou de aprender
violão.
que, segundo Teixeira (2001, p.42) está baseado no afeto e conduz às transformações. “O
sujeito sai da passividade para atividade pela força do seu desejo, pois este é uma
Joaquim: _ “Deixa eu dar um exemplo simples... Isso aqui prá gente já está ótimo!
Prá mim tá ótimo! (referindo-se à dinâmica) A gente passa o tempo aqui trocando as
idéias... (Todos falam ao mesmo tempo concordando) [...] Isso aqui para a gente já é uma
uva!”
Vilmar completou: _ “Garanto que se tiver todo o dia, todo o mundo vai ter prazer
pelo comentário de Charles (2) sobre a mesma, em momento posterior da discussão grupal:
_ “Ajuda, ajuda! Esse papo aqui que a gente está tendo, tá ajudando...”.
sujeitos e entre eles e eu, conforme aconteceu com o desejo expresso pelos participantes da
Fernando: _ “É, aprender a tocar um violão, entendeu? Porque acho que muita gente tem
Jader: _ “Quando eles foram lá, eu estava só olhando assim, prestando atenção no braço
dele no violão... (se referindo ao músico) Aí, na minha mente eu pensei: _ Isso é difícil...
A partir desses relatos, informei aos participantes que havia no hospital um projeto
de Oficinas de Música para clientes e funcionários no qual eles poderiam se inserir para
aprender a tocar violão, ou, para aperfeiçoamento como no caso de Fernando que já sabia
tocar um pouco. Expliquei que essa participação dependeria somente do desejo pessoal e
das oficinas.
A partir dessas informações, Fernando falou: _“[...] Mas já que o exército favorece
isso, tem condição de fazer isso, porque não? Por que não fazer de uma coisa ruim uma
coisa boa? Igual aquele ditado: tem males que vem prá bem, né ? Esses males podem ser
Sua crítica-reflexiva apontou para uma mudança possibilitada pela sua participação
Também foi possível discutir sobre a existência do coral no âmbito do HCE. Zito
(2) mostrou-se tão interessado que foi convidado a participar dos ensaios. Ele comentou
que já cantara em coral em sua igreja, mas que no momento estava afastado dessa
atividade. Após sua participação ativa em um dos ensaios do coral, revelou o seu desejo de
Elisa falou em um tom de brincadeira: _“Ficar o dia inteiro que vocês não parem!”
desenvolvimento das visitas musicais como atividade grupal a ser realizada em um dos
Elisa (1) sugeriu: _ “Aumentar tempo de música para que esse efeito dure mais.”
Fernando (1) complementou: _ “É, ou até reunir o pessoal, prá não perder muito
tempo também, porque às vezes passa rápido... Pôxa, reunir todo mundo!”.
Elisa argumentou: _ “Mas tem alguns que não podem sair da cama, né ?”
boa! Em grupo ainda vai dar mais tempo, porque é todo o mundo junto, e ainda vai dar
mais tempo à vocês... Mais tempo para vocês se dedicarem à outras pessoas...”
Joaquim: _ “Tem um outro lado também, que não dá porque tem gente que não sai
da cama... Grupo entre aspas. [...] Podia se reunir no quarto do ‘perneta’ que não anda”.
Vilmar: _ “O que não pode andar, ir todo o mundo para lá. E também, depois que
acabasse a música acho que a gente poderia ficar mais um tempinho batendo um papo...”.
grupal em uma das enfermarias, mas alguns participantes dessa dinâmica eram de outra
sugestões nesse sentido porque eles já haviam passado por essa experiência grupal nos
quartos, ocorrida a partir das sugestões das dinâmicas anteriores. Porém, relataram a
influência positiva que essa experiência teve para a integração dos mesmos: _ “[...] O
135
interessante é que todo o mundo participa, né? É que nem, vai no quarto 16, e todo o
na rotina hospitalar, ou mesmo na organização das visitas musicais. Para Teixeira (2001,
p.43) o desejo opera em qualquer plano humano, inclusive no campo da saúde, onde aflora:
[...] ser feliz, ser respeitado, ter direito a uma saúde digna, opinar sobre sua
terapêutica e buscar novas iniciativas de cuidado, formando grupos,
participando do conselho de saúde e de novas maneiras de ver e cuidar do
corpo que se afastam da visão dominante, uniformizadora das singularidades.
Revela-se até mesmo na rebeldia contra a imposição de modelos que impedem
a expressividade do sujeito no cuidado.
que as visitas musicais atingiam o objetivo de proporcionar conforto e bem estar e, nas
modo a contribuir para maior integração entre eles. A partir de então passamos a realizar as
de modo a atender àqueles que preferiam uma atividade mais reservada, não impondo a
modo de ser, ou, ao momento particular no qual esteja passando. Além dessa, introduzimos
uma nova modalidade, sugeridas pelos clientes, reunindo quem quisesse participar da
A discussão grupal no âmbito das DCS promoveu o encontro entre eles e despertou,
um espaço para a conversa em grupo. Joaquim (2) apontou isso através desta reflexão: _
“De repente, isso já supre alguma coisa... Uma música, um bate papo tal, e a gente
levanta o astral...”.
136
em Charles (2), que trouxe para a discussão grupal a sugestão de criar um espaço novo de
Charles: _ “[...] Aí, até todo o mundo estava conversando lá que seria até melhor
que juntasse todo o mundo aqui nessa sala mesmo (se referindo à sala da musicoterapia), e
que fosse meia hora de música, entendeu? Seria melhor do que três músicas em cada
quarto, entendeu? Porque de uma certa forma está sendo assim, tudo em conjunto [...] A
minha opinião é que se tivesse um grupo, fosse grupal, seria melhor do que em cada
quarto... Tipo meia hora! Juntasse todo o mundo mesmo, ficasse uma coisa... Um coro,
Charles repete: _ “Ficasse até mais bonito... Eu acho, é uma opinião minha,
entendeu? Porque é muito pouco tempo, pedir duas músicas, depois a pessoa pede mais
duas, é muito pouco! [...] E não precisa ser música direto, aí depois faz um debatezinho...
clientes hospitalizados que, segundo eles, dentre outros aspectos, poderia minimizar o
impacto negativo da internação hospitalar. Vale dizer que este espaço já foi implementado
por iniciativa dos clientes, revelando-se como uma das contribuições deste estudo.
Devemos estar sempre atentos às alternativas que possam ampliar a busca por auto-
Estar no mundo sem fazer história, sem por ela ser feito, sem fazer cultura,
sem ‘tratar’ sua própria presença no mundo, sem sonhar, sem cantar, sem
musicar, sem pintar, sem cuidar da terra, das águas, sem usar as mãos, sem
esculpir, sem filosofar, sem pontos de vista sobre o mundo, sem fazer ciência,
ou teologia, sem assombro em face do mistério, sem aprender, sem ensinar,
sem idéias de formação, sem politizar, não é possível.
sobre as visitas musicais, revelando sua importância sob dois aspectos principais: no
sua qualidade integradora no cenário hospitalar. Além disso, foi possível estabelecer
próximo capítulo traz uma síntese dos resultados da pesquisa, apresenta suas principais
CAPÍTULO IV
AS VISITAS MUSICAIS NO CONTEXTO HOSPITALAR E SUAS
INTERFACES COM A ENFERMAGEM FUNDAMENTAL
No âmbito das dinâmicas, tendo em vista suas experiências como participantes das
visitas musicais, os sujeitos da pesquisa destacaram que elas afetaram a cada um de forma
particular, no entanto, todos relataram sentir mais de um efeito sobre o seu corpo, do ponto
influências dessas visitas, quais sejam: emocional – trouxe alegria, felicidade, alívio da
Vale destacar que estes efeitos foram produzidos a partir de um estímulo musical
decorrer deste estudo, a música provoca ações e reações na totalidade do ser humano, ainda
mais, quando aliada à possibilidade de escolha pelo cliente, como ocorre no âmbito das
visitas musicais. Esta escolha, relacionada à sua biografia musical, promove, além de bem-
pessoas, lhes impondo rotinas ‘estranhas’. Afeta-as ao separá-las de suas conexões físicas,
pode causar insegurança e angústia que desestruturam o cliente, alterando a sua auto-
uma das formas de restaurá-la é o desenvolvimento das visitas musicais como uma
escolha musical e resgatam suas lembranças, fazendo eles expressarem diferentes emoções,
cliente refere que estes se organizam em um tripé que engloba a dimensão física-biológica,
participantes da pesquisa, abrangem essas três dimensões, com destaque para a dimensão
social que são os cuidados que mantém sua identidade social, e para a subjetiva, que
Reafirmo que as contribuições das visitas musicais não estão ligadas de forma
envolve ação e escolha entre os sujeitos do cuidado, promovendo interação entre eles.
possibilidade de, por um lado, o cliente expressar seus sentimentos a partir do estímulo
140
musical, e, por outro, o profissional, ao tocar, entrar em sintonia com o cliente e juntos
aos direitos do cliente, suas necessidades, desejos e expectativas, ao estimular que expresse
o seu gosto musical e a sua participação nesses encontros. Ao serem valorizados esses
aspectos, o cliente se sente feliz, aliviado, relaxado, expressa suas emoções e eleva sua
ambos, é importante que mais estudos sejam realizados sobre esse tema, buscando assim
recíproco e relacional, conforme compartilho da concepção das autoras que orientaram este
estudo. Ou seja, não penso que toda a enfermeira necessariamente goste, tenha
mas considero que ela possa reconhecer a música, no caso, as visitas musicais, como fortes
aliadas no cuidado de enfermagem a partir do momento em que esta pode “abrir canais de
Merece também consideração o fato de que o caráter holístico das visitas musicais
reforça a dimensão saudável do cliente, o que vai ao encontro das políticas públicas de
saúde voltadas para a humanização do ambiente hospitalar. Outro conceito que tem obtido
destaque entre essas políticas públicas é o de integralidade, definida como “um conjunto
cada caso, nos níveis de complexidade do sistema”. Para Pinheiro e Luz (2004, p. 34) é
necessário assumir a integralidade como eixo norteador de novas formas do agir social em
Nesse contexto, considero que a música é transdisciplinar, por essência; ou seja, ela
cuidado, uma vez que envolve o direito de escolha pelo cliente, garantindo sua autonomia,
o que eleva sua auto-estima e abre espaço para o diálogo, possibilitando que ele expresse
hospitalização.
práticas hospitalares dentro de uma visão complexa de saúde e doença que inclui as
voltadas para promover, manter e/ou recuperar a dignidade e totalidade humanas. A autora
relacionar com os demais. Vejo nas visitas musicais uma alternativa de resgatar no sujeito
essas características essenciais, o que foi confirmado pelos participantes desta pesquisa.
cliente para permitir que aflorem os sentimentos e sensações relacionadas aos eventos
143
importantes de sua vida. Watson (2003)17 reitera essa idéia ao afirmar que a enfermagem
deve cuidar a partir do marco de referência do outro e não do seu. Nessas circunstâncias, as
os a suas experiências de vida e a seus significados. Como diz Watson (op. cit.),
com um grupo, pode ser importante para o seu bem-estar e para o seu auto-
essa atitude que pode estar voltada tanto para a participação em processos de cuidado
Penso que o cuidado deve valorizar justamente os aspectos que se relacionam com
Watson (1997), cujos atributos incluem a valorização do seu aspecto psicossocial. A autora
No bojo dessa discussão, vale dizer que as visitas musicais, em si, podem não se
cliente, adotando uma postura criativa no espaço hospitalar, de modo que a inatividade, a
17
Curso “Cuidar em Enfermagem além da Pós-Modernidade” ministrado durante o Intercâmbio Internacional
Bases Teórico-Filosóficas da Prática do Cuidar em Enfermagem conforme citado na p. 9.
144
este ambiente não acarretem em conseqüências negativas para a saúde do cliente. E isto é
participantes da pesquisa, ressalto a contribuição das visitas musicais como forma de tornar
as relações entre os clientes, seus familiares e entre estes com a equipe de saúde, mais
humanizadas. Uma vez que esta atividade abre a possibilidade de participação da família e
amigos no horário da visita, eles podem sentir-se incluídos na proposta, o que os permite
das atividades hospitalares, das relações desgastantes entre cliente/profissional, ou, entre os
precisa ser respeitado para que ele não se sinta invadido nas suas ações, o que poderia
resultar em efeito negativo que acabaria por prejudicar a ambos, profissional e cliente
internado.
Nesse sentido, eles precisam ser consultados quanto ao horário mais adequado para
as visitas, ou mesmo, a melhor forma de abordar o cliente e/ou sua família, levando em
conta que alguns podem não entender o objetivo das visitas musicais e sentirem-se
concebido como local de dor e sofrimento. Assim, a equipe pode mostrar-se resistente a
mudanças, sendo difícil fugir ao ‘padrão’ instituído para incluir uma atividade pouco
convencional neste espaço. Afinal, romper com a ordem instituída é um desafio que nem
Se, por um lado, essa transgressão à ordem posta pode mostrar-se útil para os
integração a este meio, por outro, pode incomodar alguns profissionais ‘acostumados’ ou
entre realizar sua atividade profissional dentro das normas estabelecidas pela instituição
hospitalar, e, ao mesmo tempo atender o desejo do cliente que devido à sua singularidade
existem possibilidades para a saída deste impasse que foram desveladas na crítica-reflexiva
Por um lado, é importante que o profissional seja sensível aos sinais que
demonstram se o cliente está sentindo ou não prazer em escutar a música escolhida por
outro companheiro do setor ou enfermaria. Por outro lado, vale registrar que o movimento
compartilhar o espaço terapêutico das visitas musicais, mesmo que a música escolhida não
agrade a todos ao mesmo tempo. Ou seja, há situações em que o cliente opta por priorizar a
coletivos.
pela possibilidade de promover a integração através das visitas musicais, deve ser
valorizada como um recurso expressivo que pode ser utilizado pela enfermagem com vistas
146
Assim, o profissional envolvido nesta atividade deverá dispor de parte de seu tempo
a esse projeto, assim como a instituição deverá disponibilizar verba para a compra de
instrumentos musicais e reproduções das letras das músicas. Os resultados desta pesquisa
mostraram que o investimento de tempo e recursos pode ser muito proveitoso, dadas as
enfermagem para que esta seja capaz de atender, não somente às necessidades, mas
desenvolvimento de suas potencialidades. É claro que isso implica em uma questão ética
do cuidado, inclusive na avaliação das diferentes situações do querer do sujeito que, por
vezes, pode implicar em interditos, quando o seu desejo for contra a sua vida ou contra a
vida do outro.
Para Teixeira (2001) o desejo também opera em qualquer plano humano, o que
pode ser evidenciado pelas sugestões feitas pelos sujeitos relacionados a mudanças na
rotina hospitalar e/ou mesmo na organização das visitas musicais. No campo da saúde, o
cliente deseja ser respeitado, opinar sobre sua terapêutica e buscar formas alternativas de
cuidado. Para o autor, o desejo revela-se até mesmo na rebeldia contra a imposição de
reivindicatória por parte dos mesmos, relacionada à criação de um espaço que viabilizasse
Como já foi citado anteriormente, tais reivindicações suscitaram mudanças que foram
(TEIXEIRA, 2001) promovido pelas visitas musicais através do resgate das lembranças, da
como autores de sua história, extraindo de suas narrativas o fio condutor da mudança
Assim, mantive as visitas musicais e criei um outro espaço que conta também, além
Esses encontros grupais vêm sendo realizados na sala de musicoterapia, também por
sugestão dos clientes. Iniciam-se com uma conversa informal em que falam sobre assuntos
Essa atividade tem-se revelado produtiva tanto para os clientes internados como
âmbito do cuidado de enfermagem, pois para Watson (in Talento, 2000, p.261), a meta da
148
enfermagem é auxiliar as pessoas a obter um alto grau de harmonia para que possam
O convite para participar desses encontros passou a fazer parte das visitas musicais.
Marcos (1), Charles (2), Ricardo (3) e Denis (3) já tiveram a oportunidade de participar dos
mesmos. Alguns outros sujeitos da pesquisa já haviam recebido alta hospitalar quando
estes encontros se iniciaram. Outros, porém, que expressaram o desejo inicial de participar
dos encontros, ainda não tiveram essa oportunidade, pois esbarraram na rotina diária de
internação, como aguardar a visita médica, realizar curativos, fazer exames, ou, ainda, por
individual, quanto à integração grupal. Esta constatação tem sido evidenciada não somente
pelas avaliações dos participantes ao final de cada encontro, mas também pelo retorno dos
desejos e vivências no hospital, suas angústias e incertezas geradas pela ruptura com o
Diz Freire (1980) que o homem, integrado em seu contexto reflete sobre ele e se
compromete, constrói a si mesmo e chega a ser sujeito, e o faz por reconhecer que há uma
realidade que é exterior e que o desafia. O desafio dos participantes foi, a partir da reflexão
visita musical pode ser vista como uma estratégia criativa à humanização do ambiente
enfermagem.
música com a enfermagem precisa ser ampliado, de modo a melhor fundamentar sua
lhes que é possível unir ciência e arte, mente e coração, reforçando, dentre outras
inerente à nossa cultura, as visitas musicais podem ser uma importante estratégia a ser
enfermagem fundamental conforme procurei discutir neste capítulo, penso que esta
pesquisa contribui de forma efetiva para ampliar a discussão de conceitos que o Núcleo de
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ANEXO I
Carta de Autorização
Cordialmente,
_______________________________________________
Profª Drª Neide Aparecida Titonelli Alvim
________________________________________________
Enf. e Mt. Mestranda Leila Brito Bergold
159
ANEXO II
160
ANEXO III
161
ANEXO IV
Venho por meio deste consultá-lo (a) a respeito da sua participação na pesquisa que
pretendo desenvolver nesta instituição. Para tanto, cabe esclarecer os seguintes pontos:
respeitado, ou seja, não divulgaremos os nomes dos sujeitos que participarem da pesquisa.
De acordo com o nosso projeto, utilizaremos siglas de identificação. Somente os resultados
da pesquisa serão divulgados em eventos e publicações cientificas.
Muito obrigado pela atenção.
_______________________________________
Sujeito da pesquisa
_________________________________________
Pesquisadora