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16. Talmud.

Tratado do Divórcio, com comentário Na cidade de Faro existiu uma das mais importantes oficinas
de Rashi (Salomão ben Isaac, 1040-1105) tipográficas hebraicas, da segunda metade do século XV.
Impresso por Samuel Porteiro. Samuel Gacon foi o seu proprietário, tendo sido responsável
Faro, 1496. pela impressão em hebraico, do primeiro incunábulo em
1 f. Papel. Caracteres quadrados. território português que se conhece, o Pentateuco de 1487.
223x172 mm; Caixa de escrita: 200x149mm. 2 col. Seria de origem nobre, tendo exercido cargos de influência
Lisboa, Biblioteca Nacional de Portugal, INC. 1412. nesta região do Sul. No cólofon desta obra podemos ler que
foi terminada «pelo nobre Dom Samuel Porteiro», numa
clara referência ao seu impressor. Uma vez que Samuel
Gacon era o proprietário e editor da oficina tipográfica,
podemos pensar que o apelido “Porteiro” seria o seu título
oficial, ou a função que exercia dentro da comuna judaica de
Faro. Contudo, alguns investigadores aventam para a
possibilidade de Samuel Porteiro e Samuel Gacon serem
pessoas distintas, em que o primeiro seria o impressor e o
segundo o proprietário. O termo «Porteiro» estava
associado ao ordenamento jurídico das comunas judaicas,
presente na legislação que vigorou em Portugal até ao início
do século XVI.
Após a expulsão dos judeus de Portugal, Samuel Gacon
terá estado em Itália e na Turquia. Em Pesaro, Itália,
encontramos a presença de judeus portugueses com o
apelido Porteiro em vez de Gacon. Aqui continuaram a
imprimir obras talmúdicas, aplicando caracteres quadrados
de dois tamanhos, os mesmos de Faro. Em Constantinopla,
na Turquia, podemos encontrar o apelido Gacon, que estará
relacionado com o do proprietário da oficina de Faro, mas
sem registos de qualquer actividade impressória.
Este «Tratado Talmúdico do Divórcio», foi impresso a
17 de Dezembro de 1496, contendo o comentário de
Salomão ben Isaac, mais conhecido por Rashi, que foi um
importante comentador da Bíblia e do Talmud, tendo visto a
sua autoridade reconhecida por grandes pensadores judeus
como os exegetas Naḥmanides e Abraão ibn Ezra, ou
talmudistas como Zerahiah ben Isaac Ha-Levi Gerondi.

CATÁLOGO 141
Rashi nasceu em Troyes, França, em 1040, tendo morrido
na mesma localidade em 13 de Julho de 1105.
Na BNP existe apenas um fólio, mas presumimos que este
fragmento estivesse incluído num conjunto de textos mais
vasto e abrangente. O «Tratado do Divórcio», faz parte da
ordem do Talmud, designada por Nashim, que trata de
assuntos relacionados com o casamento, adultério, divórcio
e, em geral, de todas as relações entre o homem e a mulher; o
«Tratado dos Juramentos», que não existe na coleção da
BNP, pertence à ordem Nezikin, do Talmud, consagrada a
temas relacionados com a lei civil e questões de idolatria.
Este fragmento está muito danificado, não ostentando
qualquer tipo de assinaturas, iniciais, gravuras, nem marcas
tipográficas. Apresenta caracteres quadrados, típicos da
oficina de Samuel Gacon.
Tal como a Bíblia (Isaías e Jeremias), com comentário
de David Qimḥi, impressa na oficina lisboeta de Elieser
Toledano em 1492, também este tratado talmúdico foi
adquirido à Livraria Rosenthal de Munique, no princípio do
século XX (CAT. 14). Chegou à BNP apenas este fragmento,
desconhecendo-se o que terá acontecido com a obra
completa. Porém, atualmente existem diversos fragmentos
desta obra espalhados pelo mundo. Na Biblioteca da
Universidade de Leiden, na Holanda, existem dez
fragmentos; o Jewish Theological Seminary, em Nova
Iorque, possui onze; e na colecção Elkan Adler, em Londres,
estão presentes oito fragmentos.

JOÃO CASTELA OLIVEIRA

Bibliografia
Anselmo, 1981; Bloch, 1938; Dias, 2009; Haebler, 1903;
Iakerson, 2012; Martins, 1972; Pacheco, 1988; Rodrigues,
1992.

142 O LIVRO E A ILUMINURA JUDAICA EM PORTUGAL NO FINAL DA IDADE MÉDIA

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