Disciplina: Educação, Sociedade e Processos de Escolarização
Estudante: Rafaela Carolina Nardi
Narrativas I, II, III As 3 narrativas tinham como objetivo discorrer sobre o papel da escola e sobre a relação escola-sociedade. Irei juntar as três atividades em um único texto que contemple todas as temáticas pois acredito que os textos conversam entre si. O que me chama atenção em todos os textos é um fio condutor principal de todas as discussões: como ao longo da história brasileiras construímos pensamentos, conceitos, conhecimentos, todos pautados num ideário europeu branco universal. Ou seja, como o fruto da colonização engessou no Brasil uma ideologia que produz diversos discursos de poder, ao qual não só estão nas formas de discurso, mas se tornaram leis, instituições, crenças do povo brasileiro. Discursos esses que produzem desigualdades de raça, classe, gênero, geração e outros marcadores sociais da diferença. Esse é o panorama geral ao qual todos os textos tangenciam, porém, como o nome da nossa própria disciplina diz “educação, sociedade e processos de escolarização”, o importante para mim é entendermos como esse cenário brasileiro reverbera na escola e nos processos de escolarização. No texto de Iolanda, a autora discute sobre como as teorias racistas europeias foram apropriadas pelos intelectuais brasileiros. Esse percurso inicia na colonização e um longo processo de genocídio (e epistemicídio) dos povos originários e, após a diáspora africana e a escravização dos povos africanos, o Brasil foi sendo construído em cima de sangue negro e indígena. Em algum momento (depois da colonização do sul global em massa por países europeus), as potências mundiais olham a para o Brasil e admitem que a escravidão é algo inaceitável. Assim, sendo pressionados pelo resto do mundo, chega o fim da a escravidão em 1888. Para encobrir o genocídio histórico, um ano após, em 1889, foi proclamada a primeira república do Brasil. O Brasil agora não é mais um país colonizado, escravista, agora é uma nação. Se esqueceram que 322 anos de colonização não podem ser apagados da história. Iolanda inclusive nos lembra que o Brasil só não estava mais escravizando formalmente, mas toda ideologia que divide a humanidade em raças ainda estava presente. Tão presente que no projeto de nação de um país construído pela exploração de negros e indígenas, segue sendo coerente em apaga-los de seu projeto. Uma nação brasileira deve ser branca, já que esse é o mais elevado nível de humano. E é claro, para validar o pensamento eugenista, no século do racionalismo, precisamos de “cientistas”, “intelectuais” que comprovem essa ideologia. O texto de Smolka argumenta bem sobre a mudança do estatuto do sujeito e as novas concepções ontológicas e epistemológicas ao longo da história. A partir do século 16 e 17, há uma laicização do pensamento, a igreja perde poder e seus valores vão sendo incorporadas há uma ordem política. O que é interessante nesse processo histórico é que, apesar de tudo parecer linear, houveram diversas disputas de poder, lutas, e contradições. Assim como a autora ressalta, dois intelectuais que surgem no mesmo século e mudam o percurso da humanidade, Marx e Darwin. Eles provocam revisões na produção de uma ciência do indivíduo. Iolanda nos lembra como teoria de Darwin foi apropriada para interpretar a sociedade, como exemplo, Nina Rodrigues, um brasileiro que produziu diversos artigos apontando a superioridade da raça branca e a mestiçagem como um enfraquecimento da raça superior. A autora classifica o pensamento racial brasileiro em 4 fases e aponta esta como a primeira fase, chamada de racismo científico. A segunda fase é o ideal de branqueamento, nos anos 1920 e 1930, iniciando o mito brasileiro de que há democracia racial e igualdade entre brancos e negros. A terceira fase vem como um questionamento dessa democracia, após estudos da UNESCO no Brasil que investigaram as relações raciais, assim como outros intelectuais, como Florestan Fernandes, que vem de contramão ao pensamento da democracia racial. Portanto, saímos de um país que justifica o racismo cientificamente, para vender uma imagem de harmonia entre raças. Para no fim, após grandes lutas dos movimentos sociais e intelectuais, assumirmos a posição como país racista. Isso tudo repercute fortemente nas políticas educacionais, Iolanda apresenta uma série de dados sobre as disparidades do nível educacional entre brancos e negros. Sabemos hoje que 322 anos de colonização e escravidão repercutem ainda fortemente na cultura e sociedade brasileira, tanto que vivemos constantemente em luta antirracista. Leis como as das cotas raciais e da obrigatoriedade do ensino da educação das relações étnico raciais e o ensino da história e cultura afro-brasileiras e africanas, surgem para tentar diminuir as desigualdades raciais. No entanto, como a própria autora coloca, apesar da pequena diminuição ao longo de anos, ainda é presente a falta de equidade pedagógica em relação aos diferentes grupos raciais. E essa diferença aumenta quanto mais maior a qualificação do ensino. Acredito que conceituar esse cenário de desigualdade é importante para compreender os próximos textos, que falam sobre as infâncias. Ou seja, se nessa historicização do Brasil falamos em mudança do estatuto do sujeito, também falamos em mudança na forma de compreender o ser criança. No efervescer do racionalismo, a psicologia vê um solo fértil para tornar-se uma ciência. Ao passo que as teorias vão deixando de compreender a criança como um adulto pequeno e entendendo a infância como um período importante a ser estudado, definidor da formação humana, a criança passa por descrição do comportamento e mensuração da mente. Dessa necessidade, a psicologia vê a possibilidade de ser considerada como científica e vai se construindo pelo viés do evolucionismo e de ciência positivista de Comte. Baseando-se em valores como a mensuração, classificação, normatização e da ordem. Smolka traz uma longa discussão sobre os principais teóricos do desenvolvimento infantil: Piaget, Wallon e Vygotsky, mas não somente sobre quais são suas aproximações e diferenças, mas também a partir de qual contexto histórico-cultural e possibilidades materiais eles desenvolveram essas teorias (já que não tem neutralidade em fazer ciência). O que fica como importante para mim, é entender que o universo da infância é um universo construído socialmente e no qual as crianças estão imersas e participam dele. Elas se apropriam e significam as a materialidade e produções humanas, mas também nessa relação podem ser nomeadas, ensinadas, avaliadas, rotuladas, categorizadas, ou seja, são feitas adultas. O texto da Rizzini entra em consenso com essa perspectiva, pois a autora traz as diversas instituições nos quais as crianças tiveram nas mãos e, como anterior a criação do ECA, as crianças, principalmente as pobres, eram sujeitos sem direitos. A começar pelo período colonial, onde as crianças indígenas eram catequizadas, sendo disciplinadas e docilizadas a partir da moral e costumes cristãos (epistemicidio), ao mesmo passo em que as crianças negras estiveram nas mãos dos senhores e seu percentual de vida era mínimo (genocídio), pois eram vistas como produtos não lucrativos para o comércio da escravidão. Ainda assim, existiam crianças abandonadas que vagavam pelas ruas, essas foram acolhidas pelas chamadas: Santa Casas de Misericórdias. Porém o intuito estava em retirar das ruas, do visível, as crianças geradas fora do casamento. Numa política mais próxima de higienizar do que de cuidar dessas infâncias. Após o período colonial, as crianças continuavam sendo retiradas e afastadas da sociedade de diferentes formas, seja nos asilos, em instituições filantrópicas, em reformatórios e casas de correção. Além disso, as crianças e adolescentes pobres (e também negras) foram exploradas através do trabalho infantil. Somente com a constituição em 1988 foi assegurado o direito das crianças e adolescentes por meio do ECA. Esse período fica registrado como um novo paradigma jurídico, político e administrativo. A responsabilidade pela questão da infância e adolescência foi descentralizada e transferida para sociedade civil, para uma política social. Por fim, se estamos aqui falando da formação humana, estamos falando de ciclos da vida, como Oliveira define. Se o desenvolvimento é um processo de transformação, a transformação só acontece a partir de uma materialidade histórica, de uma cultura, não é algo dado e sim em relação com sujeitos e o mundo. Para a autora, as transformações mais relevantes para o desenvolvimento estão nas circunstâncias histórico culturais. Logo, se consideramos os processos de escolarização como um importante recurso para o desenvolvimento dos indivíduos, não podemos nos pautar em uma universalização, pois a historicização e apropriação da cultura não são e nunca serão universais. Neste ponto, retomamos para o início desta discussão, o cerne está em tentar universalizar processos e a humanidade, criar uma história única e com isso hierarquizar a diversidade humana. Como Oliveira brilhantemente afirma: temos muitas teorias sobre bebês, algumas sobre crianças e depois quase nada sobre os jovens, adultos e idosos, pois esse é claramente um modo de tentar colocar o desenvolvimento como algo universal, já que quanto mais novos, menos influência da cultura temos e mais próximos somos entre si, ou seja, mais fácil teorizar sobre uma universalidade do sujeito. Portanto, opor-se ao universalismo do desenvolvimento é levar em conta as multiplicidades e possibilidades da historicização do sujeito. Concluo essa narrativa tentando amarrar o que ficou para mim de mais importante: a escola, os processos educacionais, escolares, precisam ser um espaço que acolhe e celebra a diversidade, que vai em contramão a hierarquização e que para isso precisa escutar e validar a história e singularidade de cada um.