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Quico, Célia (2004) “Cross-Media em emergência em

Portugal: o encontro entre a Televisão Digital Interactiva, as


Comunicações Móveis e a Internet”

É livre a reprodução para fins não comerciais, desde que o autor e a fonte sejam citados.

Citar como:
Quico, Célia (2004) “Cross-Media em emergência em Portugal: o encontro entre a Televisão Digital Interactiva, as
Comunicações Móveis e a Internet”, in AAVV, Televisão Interactiva: Conteúdos, Aplicações e Desafios, Lisboa: Edições
Universitárias Lusófonas/ MEDIA Program.
ISBN: 9728296975
“Cross-Media em emergência em Portugal: o encontro entre a Televisão Digital
Interactiva, as Comunicações Móveis e a Internet”

Celia Quico
(celia.quico@netcabo.pt)
Gestora de Projectos de Televisão Interactiva e Multimedia (TV Cabo/ PT Multimedia)
Doutoranda em Ciências da Comunicação (Universidade Nova de Lisboa – Faculdade de Ciências
Sociais e Humanas)

Palavras-Chave:
Cross-Media, Convergência dos Media, Televisão Digital e Interactiva, Comunicações Móveis.

Abstract:
Cross-Media em emergência em Portugal: tendo como ponto de partida o actual e futuro
desenvolvimento dos serviços digitais e interactivos da TV Cabo/ PT Multimedia, o principal objectivo
deste artigo é o de explorar a seguinte questão:
- assiste-se à emergência de estratégias de desenvolvimento de projectos Cross-Media em Portugal?
mais concretamente, podem ser considerados os novos produtos e serviços digitais e interactivos da
TV Cabo como uma primeira etapa da implementação de uma estratégia de desenvolvimento de
projectos Cross-Media?
Em conclusão, são apresentadas questões a serem objecto de investigação mais aprofundada
relacionadas com o desenvolvimento de projectos Cross-Media, bem como são sugeridas linhas de
orientação para empresas e outras entidades relacionadas com as indústrias da Comunicação em
Portugal.

2
0. Introdução
Cross-Media em emergência em Portugal: o encontro entre a televisão digital interactiva, as
comunicações móveis e a Internet. Tendo como ponto de partida o actual e futuro desenvolvimento dos
serviços digitais e interactivos da TV Cabo / PT Multimedia, o principal objectivo deste artigo é o de
explorar as seguintes questões:
- como se caracteriza o actual contexto das indústrias da Comunicação em Portugal? este
favorece a emergência de estratégias de desenvolvimento de projectos Cross-Media?
- como se caracteriza o actual consumo de Televisão, Telecomunicações Móveis e acesso à
Internet em Portugal? há grandes diferenças comparativamente com outros países da União
Europeia?
- estamos a assistir em Portugal à emergência de estratégias de desenvolvimento de projectos
Cross-Media? em particular, os novos serviços digitais e interactivos da TV Cabo podem ser
considerados como uma primeira etapa da implementação de uma estratégia concertada de
desenvolvimento de projectos Cross-Media?

Em conclusão, são apresentadas questões a serem objecto de investigação mais aprofundada


relacionadas com o desenvolvimento de projectos Cross-Media, bem como são sugeridas linhas de
orientação para empresas e outras entidades relacionadas em Portugal com as indústrias da
Comunicação (Media, Telecomunicações e Tecnologias da Informação e Comunicação).
Para os objectivos específicos deste documento, define-se Cross-Media como um produto e/ou
serviço interactivo que envolve mais do que um medium, nomeadamente, televisão, telemóveis e
computadores pessoais. Para as empresas envolvidas nas indústrias da Comunicação constitui um
verdadeiro desafio desenvolver produtos e serviços para mais do que um medium em simultâneo.
Create once, publish everywhere (COPE) é o objectivo a atingir: no entanto, há que superar os
obstáculos existentes do ponto de vista da compatibilidade das plataformas tecnológicas, gestão de
conteúdos, direitos de autor, entre outros.
O presente artigo é composto pelos seguintes capítulos:
1. Panorama das indústrias da Comunicação em Portugal em 2003
2. Caracterização do consumo de Televisão, Telemóveis e Internet em Portugal
3. Evolução da Televisão Digital e Interactiva em Portugal

3
4. Caracterização da oferta de Televisão Digital e Interactiva da TV Cabo até ao 1º semestre de 2003
5. Caso 1: programas “Vícios e Virtudes” e “Encontro Marcado” da SIC Mulher/ TV Cabo
6. Caso 2: portal para Telemóveis “TV Digital Mobile” da TV Cabo
7. Novos serviços e produtos digitais e interactivos da TV Cabo em finais de 2003 e 2004
8. Cross-Media em Portugal: linhas de orientação e questões finais

1. Panorama das indústrias da Comunicação em Portugal em 2003


Crise é a palavra que melhor define a situação que atravessam as indústrias da Comunicação em
Portugal desde 2001, em particular, a indústria dos Media. Os indícios de recuperação surgem agora de
forma quantificada, mas a serem alvo de confirmação ao longo de 2004, segundo as estimativas
apresentadas pelo Observatório da Comunicação (Obercom) no anuário da Comunicação de 2002-
20031. A Portugal Telecom e PT Multimédia encabeçam a lista dos principais grupos de comunicação
em termos de receitas, aos quais se seguem a Sonae.com, a Impresa, a Media Capital, a Cofina, a
Portugal Global e a Impala.
O sector dos Media em Portugal viveu no último biénio a mais grave crise económica das duas
últimas décadas, tal como é referido no último anuário do Obercom, em grande parte relacionada com a
quebra significativa das receitas de publicidade. Em contraste, no final da década de noventa as
expectativas e os investimentos no sector foram elevados, devido à emergência dos novos media, à
massificação da Internet e às expectativas geradas em redor da nova economia2. Os sectores mais
afectados pela crise foram a televisão, rádios locais e a imprensa regional, respectivamente com quedas
de 15%,11,1% e 13% em termos de volume de negócios entre 2000 e 2001, segundo o Obercom. De
notar que a televisão perdeu 12,4% das suas receitas de publicidade, tendo sido a SIC e a RTP os canais
mais penalizados.
No sector das Telecomunicações, a crise económica que o País atravessa também fez-se sentir,
contrariando as expectativas de crescimento. De referir que o operador de telemóveis Ony Way
encerrou portas em 2002, ainda antes de ter iniciado a sua actividade como quarto operador de
telemóveis. O lançamento da terceira geração de telemóveis – baseada no protocolo UMTS – continua

1
Obercom – Anuário da comunicação 2002-2003, Obercom – Observatório da Comunicação, 2003, pag. 10.
2
Obercom – Anuário da comunicação 2002-2003, Obercom – Observatório da Comunicação, 2003, pag. 68.

4
a ser adiado pelos operadores TMN, Vodafone e Optimus. A concorrência faz-se agora no negócio de
Internet de banda larga e nos serviços de mensagens e imagem no GPRS, enquanto não chega o UMTS.
Finalmente, no mercado de acessos à Internet, de referir a iniciativa da Media Capital, ao avançar no
domínio do acesso a conteúdos exclusivos pagos, a partir da ligação à rede via portal do grupo
(IOL.pt).
Já para 2003, o Obercom estima um crescimento do total do sector da comunicação entre os
1,4% e os 2,5% face a 2002 (incluindo cabo e anúncios classificados), considerando que “a retoma de
Portugal poderá acompanhar os mercados europeu e norte-americano, onde se estima no ano corrente
um crescimento que poderá atingir os 2%”3. Para o Obercom, o aumento do preço de tabela da
publicidade, a estabilização do mercado das televisões privadas, os efeitos do Euro 2004 serão os
factores determinantes na recuperação do sector.

2. Caracterização do consumo de Televisão, Telemóveis e acesso à Internet em Portugal


Caracterizando sucintamente o consumo de Televisão, Telemóveis e Internet, os Portugueses
estão a par da média europeia no que diz respeito às taxas de penetração da Televisão e Telemóveis,
mas estão aquém da média europeia em termos de acesso a um computador pessoal e à Internet no
próprio domicílio, apesar do crescimento acentuado registado nos últimos anos.

Tabela 1: Taxas de Penetração Televisão – União Europeia e Portugal


União Europeia (2002) 99%
Portugal (2001) 99%

Fonte: Eurobarometro 158 "Europeans' participation in cultural activities", Maio 2002


Disponível online em: http://europa.eu.int/comm/public_opinion/archives/eb/ebs_158_en.pdf

Tabela 2: Taxas de Penetração Telemóveis – União Europeia e Portugal


União Europeia (2002) 77,50%
Portugal (2002) 82,00%

Fonte: ITU "World Telecommunications Indicators", Outubro 2003


Disponível online em: http://www.itu.int/ITU-D/ict/statistics/at_glance/cellular02.pdf

3
Obercom – Anuário da comunicação 2002-2003, Obercom – Observatório da Comunicação, 2003, pag. 10.

5
Tabela 3: Taxas de Penetração Internet nos Lares – União Europeia e Portugal
União Europeia (2002) 43%
Portugal (2002) 31%

Fonte: Eurobarometro 135 "Internet and the public at large", Novembro 2002
Disponível online em: http://europa.eu.int/comm/public_opinion/flash/fl135_en.pdf

A reduzida penetração de equipamentos terminais (PC) em Portugal é apontado como um dos


principais factores inibidores que contribuem para este atraso - tal como é referido no documento
“Iniciativa Nacional para a Banda Larga” da Unidade Missão para a Inovação e Conhecimento -,
constituindo um verdadeiro obstáculo à massificação da Internet, à generalização da Banda Larga e, em
última análise, ao desenvolvimento da Sociedade da Informação em Portugal4.

2.1. Serviço de Televisão


Em termos de taxa de penetração da Televisão junto das famílias Portuguesas, considerando que
há 3.373.465 lares, segundo os últimos dados disponíveis pelo Instituto Nacional de Estatística, e que
há 3.258.598 televisores, aproximadamente 97% das famílias portuguesas possuem pelo menos um
televisor5, abrangendo assim 99% da população.
De acordo com os dados publicados pela ANACOM relativos ao segundo trimestre de 2003, em
Portugal registavam-se 1.620.000 subscritores de serviços de televisão por cabo e por satélite, ou seja,
16% da população é assinante de serviços de televisão6. Se considerarmos que em média há 3 pessoas
por domicílio, então 4.860.000 portugueses têm acesso a televisão por cabo e por satélite.

4
UMIC – ”Iniciativa Nacional para a Banda Larga”, UMIC (documento aprovado em Conselho de Ministros de 26 de
Junho de 2003), 2003, pag. 16. Disponível online em:
http://www.umic.pcm.gov.pt/UMIC/CentrodeRecursos/Publicacoes/banda_larga_pdf.htm
5
INE - “Inquérito à Ocupação do Tempo Livre”, ed. Instituto Nacional de Estatística, 2001.
Disponível online em: http://www.ine.pt/prodserv/quadros/mostra_quadro.asp
6
ANACOM – “Redes de Distribuição por Cabo - 2º Trimestre de 2003”, ANACOM – relatório trimestral, 28 de Agosto de
2003. Disponível online em: http://www.anacom.pt/template12.jsp?categoryId=75170

6
Tabela 4: "Redes de Distribuição por Cabo - 2º Trimestre de 2003
1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003*
Alojamentos fam. clássicos - milhares 4 475 4 547 4 622 4 714 4 821 4 821 5019 5019 5019
População nacional - milhares 9 921 9 934 9 957 9 980 9 998 10 023 10336 10336 10336
Aloj. cablados em % de alojamentos 8% 21% 32% 39% 47% 54% 60% 67% 68%
Assinantes cabo em % de alojamentos 1% 4% 8% 13% 16% 19% 22% 25% 26%
Assinantes cabo em % de aloj. cablados 15% 18% 26% 33% 34% 36% 37% 38% 38%
Assinantes cabo em % de população 1% 2% 4% 6% 8% 9% 11% 12% 13%
Assinantes DTH em % de alojamentos 0,60% 1,50% 2,70% 4,50% 5,80% 6,20%
Assinantes DTH em % de população 0,30% 0,70% 1,30% 2,20% 2,80% 3%

Fonte: ANACOM "Redes de Distribuição por Cabo - 2º Trim. 2003 / Evolução das taxas de penetração", Agosto 2003
Disponível online em: http://www.anacom.pt/template12.jsp?categoryId=75170

Do total de alojamentos, 68% encontram-se cablados no final do 2º trimestre de 2003, número


que corresponde a 3.423 mil alojamentos, de acordo com informação da ANACOM, sendo que 38% do
total de alojamentos cablados recebem o serviço de televisão por cabo, ou seja 13% da população é
assinante do serviço7. Relativamente aos assinantes do serviço de televisão via satélite, também
conhecido por Direct to Home (DTH), no final do segundo trimestre de 2003 registavam-se 313 mil
assinantes em Portugal, número que representa 3% da população8.

2.2. Serviço Móvel Terrestre


Relativamente à penetração dos Telemóveis junto dos consumidores Portugueses, em finais do
segundo trimestre de 2003 registavam-se 8.628.700 clientes de serviços móveis terrestres (SMT),
segundo dados recolhidos pela ANACOM9. Destes, cerca de 6.726,400 assinantes são detentores de

7
ANACOM – “Redes de Distribuição por Cabo - 2º Trimestre de 2003”, ANACOM – relatório trimestral, 28 de Agosto de
2003. Disponível online em: http://www.anacom.pt/template12.jsp?categoryId=75170
8
ANACOM – “Redes de Distribuição por Cabo - 2º Trimestre de 2003”, ANACOM – relatório trimestral, 28 de Agosto de
2003. Disponível online em: http://www.anacom.pt/template12.jsp?categoryId=75170
9
ANACOM – “Serviço Móvel Terrestre - 2º Trimestre de 2003”, ANACOM – relatório trimestral, 21 de Outubro de 2003.
Disponível online em: http://www.anacom.pt/template12.jsp?categoryId=31022

7
cartões pré-pagos, o que representa 78% do total de assinantes, sendo os restantes 1.900.200 assinantes
detentores de planos de assinatura.

Tabela 5: “Serviço Móvel Terrestre - 2º Trimestre de 2003,: evolução do número de assinantes”


2000 2001 2002 2003*
nº Assinantes SMT 6.665.000 7.977.500 8.528.900 8.628.700

Fonte: ANACOM, disponível online em: http://www.anacom.pt/template12.jsp?categoryId=31022

Tabela 6: “Serviço Móvel Terrestre - 2º Trimestre de 2003: dados gerais”

Assinantes (milhares)
Nº de assinantes no final do trimestre 8.628,7
Detentores de Planos de Assinatura 1.902,3
Detentores de Cartões Pré-pagos 6.726,4
Quantidade de números portados até final do trimestre 13.503

Fonte: ANACOM, disponível online em: http://www.anacom.pt/template12.jsp?categoryId=31022

Relativamente ao envio de mensagens escritas (SMS) originadas nas redes móveis, no segundo
trimestre de 2003 o número médio de mensagens por assinante foi de 64 mensagens, de acordo com a
ANACOM10.

Tabela 7: “Serviço Móvel Terrestre - 2º Trimestre de 2003,: Trafego de Dados” (em milhares)

Tráfego de Dados (milhares)


Mensagens escritas (SMS) originadas nas redes móveis 553.027,5
Chamadas Minutos
Acesso a serviços WAP 8079 7111
GSM
Outros serviços dados n.d. n.d.

Fonte: ANACOM, disponível online em: http://www.anacom.pt/template12.jsp?categoryId=31022

10
ANACOM – “Serviço Móvel Terrestre - 2º Trimestre de 2003”, ANACOM – relatório trimestral, 21 de Outubro de
2003. Disponível online em: http://www.anacom.pt/template12.jsp?categoryId=31022

8
2.3. Serviço de Acesso à Internet
O número de clientes do serviço de acesso à Internet atingiu os 6.158 mil clientes no final do
segundo trimestre de 2003 em Portugal, o que representa uma taxa de penetração de cerca de 59,6%,
segundo a ANACOM - que calculou a taxa com base no total de clientes do serviço,
independentemente do tipo de acesso utilizado. Cerca de 93,9% do total de clientes utilizaram a
modalidade de acesso dial-up, enquanto que os restantes 6,1% acederam à Internet via banda larga (375
mil clientes) nas modalidades de acesso por cabo (modem por cabo) e ADSL, o que representa um
crescimento de cerca de 148,4% face ao mesmo período em 200211.

Tabela 8: “Serviço de Acesso à Internet - 2º Trimestre de 2003: Taxa de Penetração”

2003
1998 1999 2000 2001 2002
1ºTrim 2ºTrim

N.º de clientes/100 Hab. 1,7% 6,5% 21,1% 33,5% 50,0% 55,5% 59,6%

Fonte: ANACOM, disponível online em: http://www.icp.pt/template12.jsp?categoryId=6247

Relativamente à penetração de computadores pessoais e Internet nos lares, de acordo com dados
do Instituto Nacional de Estatística (INE), 28% dos lares portugueses possuem um PC e 16% dos lares
já têm o PC com acesso à Internet12.

Tabela 9: INE “Posse de computador e ligação à Internet nos agregados domésticos, 2002”
1995 1997 1999 2000 2001 2002
Penetração PC 11% 14% 21% 22% 24% 28%
Penetração Internet 5% 9% 13% 16%

Fonte: Instituto Nacional de Estatística (INE), disponível online em: http://www.ine.pt/index.htm

11
ANACOM – “Serviços de Transmissão de Dados/ Serviço de Acesso à Internet - 2º Trimestre de 2003”, ANACOM –
relatório trimestral, 16 Setembro 2003. Disponível online em: http://www.icp.pt/template12.jsp?categoryId=6247
12
INE - “Posse de computador e ligação à Internet nos agregados domésticos, 2002”, Instituto Nacional de Estatística, 2002.
Disponível online em: http://www.ine.pt/index.htm

9
3. Evolução da Televisão Digital e Interactiva em Portugal
Em Junho de 2001, a TV Cabo tornou-se um dos primeiros operadores no mundo a lançar um
serviço de televisão digital interactiva, tendo sido o primeiro a nível mundial a oferecer a
funcionalidade de gravação de vídeo digital numa set-top box por cabo com bi-direccionalidade, com
base na plataforma Microsoft TV Advanced. Para além do pagamento de 150 Euros de entrada, os
clientes têm que desembolsar 15 Euros mensais pelo serviço e pelo aluguer da caixa, designada de
Smart Box.

Figura 1: Ecrã de Acolhimento dos Serviços Digitais e Interactivos da TV Cabo e Smart Box

Cerca de dois meses depois, a 7 de Agosto, a licença nacional para o estabelecimento e


exploração de uma plataforma de Televisão Digital Terrestre (TDT) foi concedida ao consórcio
Plataforma de Televisão Digital Portuguesa S.A (PTDP). Formado pelo Grupo Pereira Coutinho (80%),
RTP (10%) e SIC (10%), o consórcio anunciou que previa investir um total de 658 milhões de euros.

10
Na altura, ficou determinado que a exploração comercial da plataforma de TDT deveria ter início até
31 de Agosto de 2002, excepto por razões de força maior.
De regresso à TV Cabo, durante 2001 e 2002, de forma a catalizar o desenvolvimento de
conteúdos e serviços de televisão interactiva, a empresa criou os programas Content Developer e
Solution Provider, que forneceram formação especializada e apoio técnico a empresas e outras
entidades. O programa Solution Provider chegou a involver cerca de 80 empresas e entidades
interessadas em desenvolver conteúdos para TV Interactiva e explorar novas oportunidades de negócio.
À primeira vista, Portugal parecia reunir todas as condições para se tornar um centro internacional de
inovação no campo da televisão interactiva, com um serviço abençoado por nada mais nada menos do
que pela Microsoft e com a plataforma de DTT prestes a ser lançada e que envolvia parceiros
tecnológicos como a Lockheed Martin.
No entanto, se 2001 foi um ano de grandes expectativas, já 2002 se pode caracterizar como
tendo sido um ano de impasse e mesmo de alguma decepção. Em Junho de 2001, a TV Cabo anunciava
que o objectivo era atingir os 100.000 clientes do serviço de televisão interactiva até ao final desse ano.
No entanto, viria a atingir apenas 2.500 clientes em Dezembro de 200113. Se do lado da angariação de
clientes a realidade ficou muito aquém das expectativas, também as previsões pecaram por excesso
relativamente à consolidação da indústria. O mesmo fenómeno que se verificou em Inglaterra ocorreu
em Portugal neste sector durante 2002, com empresas dedicadas ao desenvolvimento de soluções para
TV interactiva a fecharem portas ou serem obrigadas a despedir pessoal, bem como foram encerrados
departamentos que estavam dedicados a este tipo de desenvolvimento em diversas empresas. Assim,
depois de um período inicial de grande entusiasmo, em meados de 2002, os investimentos em televisão
interactiva começaram a decrescer de forma significativa. Reduzir custos e investimentos tornaram-se
prioridades máximas para o Grupo Portugal Telecom (PT) e em particular para a PT Multimedia, o
braço do audiovisual e multimedia da PT. Como resultado destas medidas de contenção de custos e
investimento, pela primeira vez em 2002 a TV Cabo deu lucro: 5,1 milhões de Euros de lucros
líquidos14.

13
Casa dos Bits, "Serviço interactivo da TV Cabo "descola" a partir de Janeiro", Tek Sapo.pt, 22 de Novembro de 2001.
Disponível em: http://tek.sapo.pt/4O0/293115.html
14
Peralta, Helena - “Multimedia ou multi-risco”, revista “Exame”, July 9th 2003, page 30-34.

11
Em Portugal, tal como em outros países onde foram lançados serviços de televisão interactiva,
depois de um período de grandes expectativas para as empresas envolvidas no sector, os operadores de
televisão aperceberam-se que os espectadores não estavam interessados em pagar por serviços
avançados de televisão interactiva disponíveis na sua oferta15. A reacção da TV Cabo foi a de diminuir
o investimento em serviços e caixas avançadas e fornecer caixas de baixa gama (low-end), menos
sofisticadas mas também menos onerosas. De igual forma, o fornecedor da plataforma de televisão
interactiva da TV Cabo - Microsoft – concentrou o seu esforço no desenvolvimento e comercialização
de produtos mais simples e de maior confiança16, colocando em stand-by a evolução da plataforma
Microsoft TV Advanced - talvez de forma permanente. Umas das consequências desta revisão de
estratégia foi a dispensa de 229 trabalhadores da unidade de televisão interactiva durante 200217.
Em Janeiro de 2003, a TV Cabo viria a anunciar que o serviço de TV Interactiva high-end tinha
8.000 clientes18, um número que corresponderia a 24.000 utilizadores únicos. Ao fazer este anúncio, a
empresa afirmou ainda que tinha ultrapassado os problemas de ordem técnica da fase experimental e
que era sua intenção iniciar a distribuição massiva dos seus serviços interactivos. A TV Cabo também
anunciou o lançamento de novos serviços e produtos de televisão interactiva, nomeadamente, de uma
versão low-end do serviço, que deveria arrancar em meados de 200319.
Por outro lado, em Março de 2003, após alguns adiamentos do início da comercialização do
serviço de TDT, o estabelecimento e exploração de uma plataforma de televisão digital terrestre sofreu
um sério revés, já que o Ministro da Economia decidiu revogar a licença concedida ao consórcio
PTDT, após emissão de um parecer favorável por parte da ANACOM20. O consórcio solicitou por duas

15
Shim, Richard – “Microsoft: Layoffs, changes in TV groups”, Cnet News.com, April 24, 2002. Disponível online em:
http://rss.com.com/2100-1040-891413.html
16
Ferranti, Marc and Blau, John – “Microsoft changes channel on TV plans”, IDG News Service, February 20 2003.
Disponível online em: http://www.nwfusion.com/net.worker/news/2003/0220microchang.html
17
Hatton, Barry – “Interactive TV revolution gets off to a slow start”, The Associated press, published by Seattlepi.com,
October 14 2002. Disponível online em: http://seattlepi.nwsource.com/business/90983_msftinteractive14.shtml
18
Rodrigues, Sónia - "TV Interactiva Chegou a Oito Mil Lares em Ano e Meio", jornal "Público", 31 de Janeiro 2003.
19
Fonseca, Pedro - "Os Difíceis Caminhos da Inovação", supl. Computadores Jornal "Público", 2 de Fevereiro 2003.
20
ANACOM , “Revogação da licença da PDTP”, Março 2003. Disponível online em:
http://www.anacom.pt/template12.jsp?categoryId=61529

12
vezes o adiamento do lançamento comercial da operação, apresentando como justificação as
dificuldades técnicas relacionadas com a plataforma Multimedia Home Platform21.
Em resumo, o sector Português de televisão interactiva em 2003 está reduzido a um único
grande player – a TV Cabo – ainda sem competição por parte de outros operadores de televisão. Depois
de um período de grande entusiasmo por parte das empresas envolvida no sector, o serviço high-end da
TV Cabo enfrenta grandes dificuldades em impor-se e o seu futuro é incerto. Por outro lado, a TV Cabo
acabou por reconhecer que a sua oferta high-end não era adequada ao mercado e que a massificação da
televisão digital e interactiva será uma realidade em Portugal através de caixas de baixa gama.

4. Caracterização da oferta de Televisão Digital e Interactiva da TV Cabo até ao 1º semestre de


2003
Em Maio de 2003, a TV Cabo lançou oficialmente o seu serviço e caixas descodificadoras de
televisão digital e interactiva low-end – designadas Power Box -, disponível para clientes com DTH e
cabo. Logo no arranque do lançamento, cerca de 80.000 caixas permitiam o acesso a serviços digitais e
interactivos, já que os novos clientes da TV Cabo que subscreveram canais premium desde inícios de
2003 receberam a nova caixa descodificadora, bastando efectuar o necessário up-grade de software à
caixa. A maior novidade em termos de serviços digitais e interactivos foi o pay-per-view – que a TV
Cabo decidiu comercializar sob a designação “Video-on-Demand”. Este novo serviço irá permitir aos
utilizadores da Power Box, e ainda da Smart Box, alugar filmes através da descodificação de quatro
canais dedicados, bem como descodificar os filmes do canal de adultos “Sexy Hot”.
A Power Box permite ainda o acesso a conteúdos de notícias, resultados e classificações da
Super Liga, informação sobre o estado do tempo e do trânsito, entre outras informações úteis. De forma
semelhante à Smart Box, na Power Box os espectadores podem aceder a programas interactivos, tais
como jogos de futebol com multi-câmaras. Ainda, a maior parte dos canais oferecem através da
aplicação Barra iTV, conteúdos como a programação para o próprio dia, as mensagens dos fóruns de
debate e sondagens para envio de SMS. Já que a Power Box não tem canal de retorno próprio quer em
cabo quer em DTH, o telemóvel funciona como canal de retorno para a Power Box.

21
Leite, B - "Governo autoriza adiamento da TDT até Fevereiro de 2003", Negócios.pt, 26 de Agosto 2002. Disponível
online em: http://www.negocios.pt/noticias/NoticiaDetalhe.asp?CdDoc=77793

13
Figura 2: Canal de Acolhimento dos Serviços Digitais e Interactivos da TV Cabo e Power Box

5. Caso 1: “Vícios e Virtudes” e “Encontro Marcado” SIC Mulher/ TV Cabo


Em Junho de 2003, o canal temático SIC Mulher iniciou a transmissão de dois talk-shows:
“Encontro Marcado” e “Vícios e Virtudes”, emitidos em directo de segunda a sexta-feira, com a
duração de uma hora. Em termos de formato interactivo, estes dois programas podem ser considerados
como uma versão mais simples do talk-show “Noites Interactivas”, oferecendo a maior parte das suas
funcionalidades e conteúdos, com a excepção do mosaico de multi-câmaras. A equipa de produção de
ambos os programas e de desenvolvimento do video-grafismo e aplicações interactivas foi
essencialmente a mesma do programa “Noites Interactivas”: Panavídeo, TV Cabo, GO TV e
WTVision.

14
Figuras 3 e 4: Programa Interactivo “Vícios e Virtudes”, SIC Mulher

Os dois talk-shows interactivos “Encontro Marcado” and “Vícios e Virtudes” dão a


possibilidade aos espectadores de enviarem as suas perguntas e opiniões, bem como votar em
sondagens relacionadas com os temas discutidos nos programas. O feedback dos espectadores pode ser
visto no video-grafismo e na aplicação interactiva. Os espectadores podem interagir com os programas
recorrendo a diferentes aparelhos e serviços, nomeadamente, à Smart Box e Power Box da TV Cabo, o
video telefone da PT Comunicações, e os tradicionais emails, chamadas telefónicas e SMSs. O fórum
de debate está disponível para aos utilizadores da Smart Box e da Power Box, que podem ainda
consultar informação sobre as apresentadoras e os seus convidados. Finalmente, os utilizadores podem
ganhar créditos do serviço “Video-on-Demand” ao responder correctamente a questões relacionadas
com o tema de cada programa.
Se o talk-show “Noites Interactivas” foi importante e significativo como a primeira experiência
de produção de um programa verdadeiramente interactivo, já a importância destes dois programas
deve-se ao facto de constituírem um sinal de que os principais canais de televisão em Portugal estão
sensibilizados para o potencial das tecnologias interactivas para fidelizar e fixar audiências. Ainda,
ambos os programas podem ser considerados exemplos embrionários de produtos cross-media.

15
6. Caso 2: portal para telemóveis “TV Digital Mobile” da TV Cabo
Em Junho de 2003, a TV Cabo lançou a aplicação “TV Digital Mobile”,
desenvolvido para WAP – GPRS, que permite a interacção do telespectador com um conjunto de
serviços interactivos através do telemóvel, nomeadamente: aceder ao guia de programação dos
principais canais do pacote da TV Cabo, ver trailers de filmes, ver vídeos de notícias exibidas nos
canais generalistas, ver vídeos da principais jogadas dos desafions de futebol da Super Liga, agendar
alertas de programas, votar em sondagens e participar em fóruns, entre outras funcionalidades.
A aplicação “TV Digital Mobile” tem quatro áreas: Guia TV, Video-on-Demand, Programas
iTV e Vídeos. Os clientes da TMN com acesso permanente ao portal Inove acedem à aplicação “TV
Digital Mobile” através da categoria de Vídeos no ecrã principal do Inove.

Figuras 5, 6 e 7: Ecrãs da aplicação “TV Digital Mobile”, TV Cabo

Desde Agosto de 2003, a TV Cabo disponibiliza a funcionalidade de visionamento de vídeos


para clientes da TMN com telemóveis da rede GPRS. Os utilizadores poderão ver os vídeos das
principais notícias dos noticiários dos canais generalistas portugueses, bem como os traillers dos
filmes do serviço da TV Cabo “Vídeo-on-Demand” e nos canais Lusomundo.
No final do ano de 2003, TV Cabo lançou em associação com a TMN um pacote (bundling) que
incluía o telemóvel Nokia 3650 e uma Power Box, a um preço promocional, de forma a aumentar o

16
número de clientes com telemóveis que incluam o portal Inove e, consequentemente, incentivar a
utilização da aplicação “TV Digital Mobile”.

7. Novos serviços Digitais e Interactivos da TV Cabo em finais de 2003 e em 2004


Em finais do ano de 2003, a TV Cabo lançou novos serviços de televisão digitais e interactivos,
dos quais se destaca o serviço de Multi-Jogos da Champions League – que possibilita ver quatro jogos
em simultâneo, o Canal SMS – um novo canal de televisão em que os espectadores têm a oportunidade
de interagir via SMS com a programação-, os Jogos SMS e o serviço de time-shifting de canais
temáticos e generalistas – que permite ver alguns dos canais mais populares da oferta da TV Cabo com
três horas depois da sua transmissão.

Figuras 8 e 9: Canal SMS

Assim, verifica-se que a disponibilização de novos canais digitais e a interacção via SMS é o
foco das novas ofertas da TV Cabo. Desta forma, a empresa segue de perto receitas já testadas com
sucesso em outros mercados internacionais, sobretudo nos mercados Europeus. No caso particular da
interacção via SMS com a Televisão, nos últimos anos os operadores e canais de televisão passaram a
recorrer ao telemóvel como “canal de retorno” em alternativa ou em complemento às aplicações
disponíveis por intermédio de uma plataforma de televisão interactiva, tal como refere a analista de
novos media Ferhan Cook. Este fenómeno prevalece em países onde as plataformas de televisão digital

17
interactiva são de pouca relevância, como é o caso da Alemanha, Holanda, Finlândia e as Filipinas. A
interactividade por SMS dá a possibilidade aos operadores e canais de televisão de se relacionarem
com as audiências mais jovens, gerando receitas adicionais sem ter que fazer os avultados
investimentos necessários ao desenvolvimento de aplicações interactivas22. De notar os serviços mais
populares são a votação em sondagens, a participação em Chats-SMS e os jogos SMS-TV.
Sendo considerados o móvel e o multimédia como os motores de crescimento do grupo Portugal
Telecom (PT), o seu CEO Miguel Horta e Costa observou numa entrevista à revista “Visão” que
tecnologias como os telefones móveis de terceira geração, o UMTS, a voz sobre Internet e a
proliferação dos hotspots em tecnologia Wi-Fi, vão ser “sinais de um novo mundo que está aí à
espera”23. O lançamento do UMTS no segundo semestre de 2004 e o investimento na digitalização da
rede de cabo são dois dos projectos estratégicos para a PT. Em particular, a grande aposta para o
próximo ano será o lançamento de caixas digitais de forma massiva, segundo Miguel Horta e Costa. O
responsável máximo da PT referiu ainda que a PT endereçou um pedido de propostas a fabricantes de
caixas digitais, tendo concorrido 13 empresas para fornecer a TV Cabo. Assim, à partida já no primeiro
semestre de 2004, a TV Cabo irá oferecer diversos modelos de caixas – desde os simples modelos que
só descodificam os canais, aos mais avançados com a possibilidade de gravar a programação24.

8. Cross-Media em Portugal: linhas de orientação e questões finais


Mais do que dar uma resposta definitiva à questão “estamos a assistir à emergência de
estratégias de desenvolvimento de projectos Cross-Media em Portugal?” era intenção neste
artigo assinalar a existência de alguns produtos e serviços que já podem ser considerados como
Cross-Media. Ainda, tal como foi referido no início do artigo, houve também a intenção de
levantar algumas questões relacionadas com estratégias de desenvolvimento de projectos Cross-

22
Cook, Ferham -"Show me the Money”, C21 Media Networks website, Janeiro 2003. Disponível online em:
http://www.c21media.net/features/feat_dtl.asp?id=5173&t=10&terms=interactive+tv&curpage=2
23
Camacho, Pedro – “A revolução é em 2004”, Visão nº 554, 16 Outubro 2003. Disponível online em:
http://www.visaoonline.pt/paginas/Conteudo.asp?CdConteudo=33131
24
Camacho, Pedro – A revolução é em 2004, Visão nº 554, 16 Outubro 2003. Disponível online em:
http://www.visaoonline.pt/paginas/Conteudo.asp?CdConteudo=33131

18
Media a serem objecto de investigação mais aprofundada, bem como em sugerir linhas de
orientação para empresas e outras entidades relacionadas com as indústrias da Comunicação em
Portugal.
Assim, sendo verdade que as empresas que actuam nas indústrias dos Media, Telecomunicações
e Tecnologias da Informação e Comunicação enfrentam um mercado cada vez mais competitivo e de
inovação mais acelerada, a expansão para novos sectores de actividade é decisiva para estas empresas.
Se por um lado os operadores de televisão por cabo competem com as empresas de telecomunicação na
oferta de serviço de acesso à Internet e serviços telefónicos, por outro lado os canais de televisão
associam-se a operadores de televisão por cabo ou a empresas de telecomunicações para produzir e
distribuir conteúdos audiovisuais e multimedia. Em resumo, a definição e implementação de estratégias
de desenvolvimento de produtos e serviços Cross-Media é inevitável por parte das principais empresas
das indústrias da Comunicação.
No entanto, para que a implementação de estratégias de desenvolvimento de projectos Cross-
Media seja uma realidade e um sucesso, algumas condições que devem estar presentes
necessariamente:
• Disponibilidade de conteúdos e serviços apelativos que respondam a necessidades reais dos
utilizadores;
• Educação dos utilizadores dos benefícios dos novos Media;
• Presença de uma extensa base instalada de aparelhos receptores;
• Partilha de receitas adequada entre as empresas;
• Promoção de standards que permitam a transferência de conteúdos e a comunicação entre
serviços.

As empresas de Media com sucesso serão as que compreenderem que o contexto mudou e que
os espectadores querem consumir Media de formas diferentes, afirmou o director de novos Media e
tecnologia da BBCi - Ashley Highfield na conferência Next MEDIA que decorreu em finais de 2003,
acrescentando que “a indústria da televisão está a começar a perceber que a imagem tradicional da
família reunida à volta do televisor está ultrapassada”. Ainda, Ashley Highfield defende que a “killer
combination” será o acesso à Internet em banda-larga com televisão digital e gravação de vídeo digital,
mais a possibilidade de partilhar o vídeo digital com outros pares, recorrendo ao mesmo modelo peer-

19
to-peer popularizado pelo serviço Napster. Para o responsável da BBCi, não interessa se esta solução
estará disponível através de um PC, como é o caso do Media Centre da Microsoft, ou através da nova
PlayStation da Sony ou ainda através uma set top box de qualquer operador de televisão – o importante
é que chegue ao utilizador uma oferta sem paralelo de conteúdos de vídeo, televisão, jogos e
multimedia25.
De referir ainda os recentes estudos tornados públicos pela BBC, que revelaram existir quatro
novas e importantes tendências sociais que demonstram que a forma como consumimos televisão está a
mudar de forma irreversível. Daí que a BBC tenha começado a mudar os seus conteúdos e a procurar
esbater as fronteiras entre novos e “velhos” Media de maneira a que todos saiam beneficiados, como
referiu o director de novos Media e tecnologia da BBCi. Assim, há a assinalar as seguintes tendências
de fundo:
- as pessoas estão a assumir o controlo do seu consumo de Media,
- as pessoas querem cada vez mais participar e estar próximo dos Media,
- as pessoas consomem cada vez mais diversos Media em simultâneo,
- as pessoas querem partilhar conteúdos – vídeo, música, etc – com outros pares.

Relativamente a questões a serem objecto de investigação no que concerne à definição e


implementação de estratégias de desenvolvimento de projectos Cross-Media - que envolvam sobretudo
televisão digital e interactiva e comunicações móveis - sugerem-se as seguintes como base de trabalho:
• Como irão responder os utilizadores à necessidade de interagir com o televisor recorrendo ao
telecomando e ao telemóvel? A utilização do telemóvel como canal de retorno para interagir
com a televisão é percebida como vantajosa e útil por parte dos utilizadores?
• Os telemóveis vão contribuir para a melhoria da acessibilidade/ usabilidade dos serviços de
televisão digital e interactiva ou, pelo contrário, tornam a interacção mais difícil e complexa?
• Como irão reagir os utilizadores mais idosos, crianças e outros utilizadores com pouco ou
nenhum contacto com tecnologias a um modelo de TV Interactiva baseado na interacção através
do telemóvel?

25
Highfield, Ashley – “Adventures in integrated content”, discurso na conferência Next MEDIA Charlottetown, Canada,
C21 web site, 27 de Outubro 2003. Disponível online em:
http://www.c21media.net/features/detail.asp?area=2&article=17945

20
• O telecomando e ao telemóvel irão convergir num só aparelho: irá o telecomando passar a
incluir algumas funcionalidades básicas do telemóvel ou será o telemóvel a agregar
funcionalidades do telecomando?
• Que tipos de serviços destinados a serem acedidos por telemóvel os utilizadores estão dispostos
a pagar? No caso particular dos utilizadores dos novos serviços TV Digital Mobile da TV Cabo,
quais os serviços que são privilegiados pelos utilizadores ? (ver televisão no telemóvel?
comprar filmes e eventos pay-per-view? aceder ao guia de Programação? receber um alerta
para ver um programa? etc)
• A possibilidade de aceder a conteúdos de televisão através de meios como o telemóvel e o PC é
percebida como vantajosa e útil pelos utilizadores?

Ainda que haja com certeza espaço para divergência, assistimos desde há alguns anos ao
fenómeno de convergência: de redes, de aparelhos e ainda de Media. A emergência de estratégias de
desenvolvimento de projectos Cross-Media é irreversível e inevitável. Como observou Andrew Curry,
director da empresa de consultadoria estratégica de marketing “The Henley Centre”, os responsáveis
pelos canais de televisão devem abandonar os seus modelos tradicionais de produção de programas e
deixar que a interactividade funcione a seu favor, ou então que se contentem a lentamente se tornarem
irrelevantes26.

Anytime, anywhere and any how - se na década de noventa o "conteúdo era rei", a tendência do
início do século XXI aponta para que o "rei” seja o contexto. O desenvolvimento de produtos e
serviços deve gravitar em torno do contexto, não da tecnologia ou dos conteúdos. Desta forma, é
necessário ter presente em todo o processo de desenvolvimento de um produto ou serviço Cross-media
as necessidades e preferências dos utilizadores, compreendendo o seu comportamento e motivações no
consumo de diferentes Media em diferentes contextos.

Assistimos ao início da história do encontro entre a televisão digital, as comunicações móveis e


a Internet – como diria o filósofo norte-americano Eric Hoffer, a melhor forma de prever o futuro é ter
o poder de dar forma ao futuro. Portanto, mãos à obra!

26
Gawlinski, Mark – Interactive Television Production, Focal Press, Março 2003, pag.247.

21
BIBLIOGRAFIA

ANACOM – “Redes de Distribuição por Cabo - 2º Trimestre de 2003”, ANACOM – relatório trimestral, 28 de Agosto de
2003. Disponível online em: http://www.anacom.pt/template12.jsp?categoryId=75170

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de 2003), 2003, pag. 16. Disponível online em:
http://www.umic.pcm.gov.pt/UMIC/CentrodeRecursos/Publicacoes/banda_larga_pdf.htm

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