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Para: Petra Olschowski (MdL)

Ministerin für Wissenschaft, Forschung und Kunst des Landes Baden-Württemberg


Königstraße 46
70173 Stuttgart

Assunto: Status legal de fósseis brasileiros nas coleções do Estado; repatriação do Irritator
challengeri

Prezada Sra. Olschowski,

Nós, os abaixo-assinados especialistas em Paleontologia, gostaríamos de chamar a vossa


atenção a um assunto que nos é de grande estima e que esperamos que ecoe em vossa pessoa.
Em primeiro lugar, permita-nos expressar a nossa apreciação pelos passos importantes que o
vosso ministério tem tomado até agora em relação à restituição de artefatos culturais de
proveniência colonial, tanto o acordo de repatriação com a Nigéria como a devolução de
restos humanos ao povo maori e aos nativos havaianos são importantes passos para retificar
erros passados. O mesmo é verdade também para a revolução do dinossauro “Ubirajara
jubatus”, ordenado pela sua predecessora e recentemente completado durante a sua
administração.

Na vossa resposta ao inquérito parlamentar do ano passado (Drs. 17/3222), VSa. justificou a
devolução do “Ubirajara”, baseado em, inter alia, as dúvidas concernentes à legalidade da
exportação, a proveniência incerta, o grande significado do holótipo para o Brasil (um fóssil
que representa uma nova espécie para a ciência), e o dano à reputação do Museu Estadual de
História Natural de Karlsruhe (SMNK), causado pela controvérsia. Gostaríamos de trazer ao
vosso conhecimento um caso que partilha de todas estas características. O Museu Estadual de
História Natural de Stuttgart (SMNS) possui nas suas coleções o holótipo de Irritator
challengeri (SMNS 58022), um dinossauro proveniente do território que atualmente é o
Brasil e que o museu adquiriu em 1991. Este é o único espécime conhecido e bem preservado
desta espécie e, assim, possui valor acadêmico, educacional e museográfico. Em maio de
2023, uma publicação científica que estudou o fóssil recebeu considerável retaliação
principalmente no que se refere à procedência ética e legal do fóssil. Isto acontece tendo
como plano de fundo uma tendência geral na Paleontologia e disciplinas aliadas de uma
maior sensibilidade a estas preocupações.

Apesar da grande visibilidade destes dois casos, o motivo da nossa preocupação é mais
amplo. As coleções públicas em Baden-Württemberg guardam milhares de fósseis do Brasil.
Isto nos preocupa na medida em que a lei Brasileira confere a propriedade dos fósseis à
Nação desde 1942, e proíbe a sua exportação permanente desde pelo menos 1990. Esta
designação de propriedade e restrição de exportação no mínimo levanta dúvidas sobre o
status legal dos fósseis nas coleções públicas de Baden-Würtemberg. Em relação ao
“Ubirajara”, V.S.ª tem reconhecido já que a repatriação dos fósseis pode ser justificada
quando essas dúvidas coincidem com incertezas sobre a proveniência de um espécime.
Gostaríamos de pedir para ir além da avaliação deste caso específico que V.S.ª fez em relação
ao “Ubirajara”. O caso do Irritator indica que não enfrentamos casos isolados, mas as
consequências de um padrão sistêmico. Por tanto, consideramos imperativo que o Ministério
efetue uma revisão sistemática da proveniência e da aquisição legal dos fósseis brasileiros nas
coleções do Estado, também à luz da legislação brasileira.

A legalidade, contudo, não é a nossa única preocupação. Gostaríamos de convidar o


Ministério a considerar as implicações éticas das coleções públicas alemãs que guardam
quantidades consideráveis de fósseis de um país que busca ativamente proteger o seu
patrimônio paleontológico por lei. Nossos colegas brasileiros da Sociedade Brasileira de
Paleontologia (SBP) recentemente publicaram um posicionamento relevante que gostaríamos
fosse levado em consideração pelo Ministério. Nas suas palavras “declaramos e enfatizamos
que a devolução de holótipos de táxons extintos é imperativa” ao tempo que reforçam a
importância da cooperação internacional. A SBP “está disponível para mediar, articular e/ou
colaborar em novos processos de repatriação”, tais como o que concerne ao Irritator
challengeri.

Estamos comprometidos a fazer com que a ciência da Paleontologia seja mais equitativa e
ética através de colaboração internacional e dos nossos trabalhos individuais, e receberíamos
de bom grado apoio ativo do Ministério nestes esforços. Isto aplica-se com força particular a
medidas que transcendem o nosso poder, mas que recaem no seu como ministra. Isto inclui,
principalmente, a restituição de fósseis que, como itens numa coleção pública, não podem ser
exportados sem uma autorização de acordo com o Ato de Proteção à Propriedade Cultural.
Dada a atenção e posterior controvérsia que recente estudo de Irritator challengeri atraiu, é a
nossa firme convicção que a repatriação deste espécime ao Brasil mandaria uma mensagem
importante —a mensagem de que as vozes dos nossos colegas brasileiros são ouvidas, que
estão sendo levados a sério, e que o Ministério está disposto a atuar da mesma maneira que o
fez quando cooperou com a Nigéria, os maori e os Hui Iwi Kuam‘o. Dado que outras
coleções públicas alemãs fora de Baden-Württember também possuem fósseis brasileiros, seu
seu estado tem a chance de estar na liderança de fazer o que é correto fazer.

Esforços conjuntos de paleontólogos, funcionários de museus e especialistas legais são


necessários para abordar as incertezas que afetam o estudo científico do fóssil de dinossauro
Irritator e de um grande número de espécimes em coleções públicas alemãs.

Seu ministério tem provado que está disposto e é capaz de abordar injustiças passadas e
atuais através de colaboração. Hoje, nós chamamos VSa. a abordar a coleção paleontológica
com esta mentalidade cooperativa. Clarificar o status legal dos fósseis brasileiros nas
coleções do Estado e repatriar o Irritator challengeri são passos cruciais para o futuro da
Paleontologia a que aspiramos, e que não podemos alcançar sem a sua participação ativa.

Com os melhores cumprimentos,


[Lista de firmas]

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