Escolar Documentos
Profissional Documentos
Cultura Documentos
Aula 4 - Broncoscopia Na UTI
Aula 4 - Broncoscopia Na UTI
26
Broncoscopia na Unidade
de Terapia Intensiva
Elnara Márcia Negri
Mauro Roberto Tucci
Wilson Leite Pedreira Jr.
A broncoscopia é uma poderosa arma na UTI, prin- artificial reduz seu calibre, aumenta a resistência do sis-
cipalmente nos pacientes ventilados mecanicamente, tema e pode impedir uma ventilação adequada ou, ain-
tanto no diagnóstico quanto na terapêutica de patolo- da, levar a barotrauma por mecanismos diversos.
gias do aparelho respiratório.
Há muita discussão sobre o tamanho mínimo de
O número de indicações para abordagem endoscó- tubo endotraqueal que pode ser utilizado sem que haja
pica do aparelho respiratório cresce continuamente. comprometimento da ventilação2. Sabe-se que em pa-
Diversas novas técnicas, assim como a utilização de cientes não intubados o broncoscópio ocupa, aproxi-
melhorias nas técnicas consagradas, permitem um ren- madamente, 10% da área de secção transversa da
dimento progressivamente melhor nas patologias pul- traquéia. Quando utilizamos um broncoscópio com ca-
monares e de vias aéreas, tanto do ponto de vista da libre de 5,7 mm, este ocupa, aproximadamente, 40%
avaliação direta e da coleta de material para análise da área de um cânula 9 mm e 66% de um cânula 7 mm,
diagnóstica quanto como arsenal terapêutico.
comprometendo, portanto, a ventilação do paciente.
Na Tabela 26.1 resumimos as sugestões do consen-
TÉCNICA E CARACTERÍSTICAS DA so para estudo de pneumonia nosocomial relacionada
REALIZAÇÃO DE BRONCOSCOPIA EM ao ventilador mecânico3 e de outros autores para pre-
PACIENTES INTUBADOS SOB paro e monitorização do paciente ventilado mecanica-
VENTILAÇÃO MECÂNICA mente que será submetido à broncoscopia flexível.
Tabela 26.1
Recomendações para Realização de Broncoscopia durante Ventilação
Mecânica (Utilizando-se Modo Volume Controlado)
ppFluxo inspiratório
nnFR (15-20 rpm)
Elevar alarme de pico de pressão
Observar volume corrente e Saturação de O2
FiO2 = 1
Sedação adequada com ou sem relaxante muscular de curta duração
Tubo: deve ter diâmetro de, no mínimo, 1,5 mm maior do que o endoscópio
Zerar ou reduzir a PEEP
Aspirar por curtos períodos
Afastar barotrauma com radiografia após exame
Adaptado de [Meduri, 1992, Dellinger, 1992 e Jolliet, 1992 (2,3,6)].
recentes recomendem que o broncoscópio deva ter Em relação à ventilação mecânica (VM), excluin-
calibre 1,5 a 2,5 mm menor do que a cânula traqueal do-se a padronização para o uso de fração inspirada de
empregada5. oxigênio (FIO2) de 1, durante a realização do procedi-
mento broncoscópico, não encontramos estudos refe-
Acreditamos que o uso de um broncoscópio com rentes à escolha do modo ventilatório (exemplo: volume
diâmetro 1,5 mm menor do que o tubo seja muito res- assistido/controlado (VAC), pressão controlada (PC)
trito, não só pela dificuldade de ventilarmos o paciente etc.) ou de diferentes ajustes do ventilador mecânico
(sendo seu uso adequado somente para exames de cur- (exemplo: volume corrente (VT), freqüência respirató-
ta duração, 60 a 120 segundos, como pode ser realiza- ria (FR), fluxo inspiratório (V’), relação entre tempo
do em alguns casos de coleta de material para inspiratório e expiratório (I:E) e pressão inspiratória)
diagnóstico de infecção associada ao ventilador mecâ- durante a realização da broncoscopia em pacientes ven-
nico), bem como pela dificuldade técnica do aparelho tilados mecanicamente. Portanto, muitas das recomen-
ser introduzido através da cânula. dações listadas na Tabela 1, apesar de serem difundidas
Em nossa prática clínica, certas vezes encontramos e aceitas, não têm qualquer suporte experimental.
dificuldade na passagem do aparelho de 5 mm através Os objetivos básicos da VM durante a broncosco-
de cânula orotraqueal de número 7,5, devido aos aco- pia são os mesmos de qualquer paciente em ventilação
tovelamentos que se fazem conforme a anatomia da via mecânica, portanto, conhecendo as alterações causadas
aérea do paciente, bem como pela presença de secre- pela introdução do broncoscópio no tubo endotraqueal,
ção ou sangue aderidos à superfície interna da cânula. entendemos que uma abordagem “intervencionista”
Após o procedimento não se deve utilizar PEEP A abordagem diagnóstica inicial do paciente de-
durante a ventilação mecânica. É indicada a biópsia penderá do grau de sangramento e de suas condições
sob radioscopia, ou na pior das hipóteses, com os clínicas.
Raios X no leito, já preparado para ser realizado e ana- As principais causas de hemoptise nos pacientes
lisado rapidamente. de terapia intensiva sofrem variações quanto à preva-
Insuflação
DILATAÇÃO ENDOSCÓPICA DE ESTENOSES
Os estudos que avaliam a eficácia da insuflação
broncoscópica para abordagem de atelectasias segmen- De uma maneira geral, a estenose traqueobrôn-
tares de resolução lenta são estudos não controlados e quica muitas vezes está relacionada com a própria
de difícil avaliação. A gênese destas atelectasias esta- intubação, sendo uma complicação da mesma. Para
ria relacionada com a quantidade e qualidade do sur- que a sintomatologia seja observada, ainda durante a
factante, que seria pouco afetada pela técnica de ventilação mecânica este processo deverá estar abai-
insuflação. Nos poucos casos onde o procedimento xo da extremidade distal da cânula orotraqueal ou de
poderia surtir efeito, deve-se ressaltar que os cuida- traqueostomia.
dos devem ser obedecidos: a insuflação segmentar Na maioria das vezes este quadro determina uma
deve ser realizada com a impactação do broncoscópio complicação grave que necessita resolução imediata,
em um segmento ou subsegmento, com pressão con- principalmente em se tratando de pacientes com insufi-
trolada e mantida de 20 mmHg a 30 mmHg, durante ciência de vários órgãos, muitas vezes instabilidade
um a dois minutos, evitando-se aumento da pressão e hemodinâmica, onde o procedimento cirúrgico é con-
risco de barotrauma. tra-indicado ou pelo menos deve ser postergado.
A conduta de escolha é a terapêutica broncoscópi-
INTUBAÇÃO ORIENTADA POR FIBROSCOPIA ca, que pode ser realizada à beira do leito, em caráter
(FIG. 26.5) de urgência. Os principais tipos de abordagem visam,
fundamentalmente, à dilatação e à manutenção da per-
A intubação orientada por broncocoscopia38 ou, ain- meabilidade das vias aéreas, podendo ser realizada atra-
da, a manipulação de cânulas orotraqueais nas unida- vés de:
des de terapia intensiva39 obedecem aos seguintes 1. dilatação com broncoscópio rígido;
grupos de indicações:
2. dilatação com válvulas (sondas) metálicas;
a. indicações prévias: onde existe suspeita de intu-
bação complicada pelo biótipo do paciente, por trauma 3. locação de cânulas (orotraqueal, traqueostomia ou
facial ou queimaduras, por impossibilidade de manipu- mesmo próteses) abaixo da estenose;
lação cervical (trauma de coluna), por problemas co- 4. ressecção endoscópica do segmento interno da este-
nhecidos de vias aéreas (estenoses, distorções, nose (mecânica, laser, eletrocautério etc.).
sinéquias) etc. Ainda existem indicações de auxílio
broncoscópico nos casos de intubação prévia difícil ou
em pacientes com baixa reserva respiratória, onde o HEMOPTISE
procedimento deve ser o menos traumático possível; Assim como a gênese da hemoptise é diferente no
b. indicações inesperadas: nos casos onde é feita paciente ventilado mecanicamente, a conduta terapêuti-
a tentativa de intubação usual com laringoscópio, sem ca também difere41. Enquanto a abordagem terapêutica
sucesso imediato, sendo necessária a orientação fibros- broncoscópica da hemoptise é realizada preferencial-
cópica com visualização direta das estruturas larínge- mente com tubo rígido (vide capítulo), no paciente de
as e traqueais. Essa indicação às vezes é dramática, terapia intensiva, pela condição respiratória do pacien-
pois, existindo a necessidade de assistência ventilató- te sob ventilação mecânica e pelos riscos de extubação,
ria onde o acesso imediato às vias aéreas pela larin- prefere-se a abordagem endoscópica, utilizando-se os
goscopia usual não é possível, ocorre uma urgência recursos da fibroscopia.
broncoscópica. Quando não existe disponibilidade Apesar de, em casos de hemoptise moderada, ser
imediata da orientação por fibroscopia, muitas vezes válida a tentativa de hemostasia através da injeção de
opta-se por traqueostomia; soro gelado ou soluções de substâncias vasoativas no
c. na locação de cânulas de duplo lúmen (sondas território sangrante, nas hemoptises maciças as princi-
de Carlens, Robertshaw etc.), sempre que se faz neces- pais técnicas visam, primariamente, à proteção dos ter-
sária ventilação pulmonar independente (padrões dife- ritórios não-sangrantes.
rentes para cada pulmão), bem como nas hemoptises As condutas importantes na hemoptise maciça fei-
maciças ou contínuas, etc.; tas pela fibrobroncoscopia são: intubação seletiva do
d. no auxílio à realização de traqueostomia percu- território não-sangrante (preferencialmente à esquer-
tânea realizada à beira do leito, sendo importante na da); a colocação de cateteres balonados ocluindo o ter-
Fig. 26.3 — Obstrução brônquica por coágulo (A) e por rolha de secreção (B).
A B
Fig. 26.4 — Rolhas de secreção mucóide espessa em árvore brônquica em paciente com doença pulmonar obstrutiva crônica.
ritório sangrante (Fogart); a colocação de cânulas de O lavado broncoalveolar pode ser utilizado como
duplo lúmen. arma terapêutica nas seguintes situações:
• proteinose alveolar: a lavagem broncoscópica dos
LAVADO BRONCOALVEOLAR TERAPÊUTICO alvéolos preenchidos pelo material proteináceo pode ser
realizada com volumes menores do que a técnica habi-
O lavado broncoalveolar (LBA) pode ser utilizado tual, com maior segurança e menor comprometimento
para retirada de substâncias das vias aéreas distais e do da função respiratória;
parênquima, ou, ainda, para aplicação de substâncias
nessas regiões42. Para cada uma das patologias que po- • asma brônquica: a utilização do LBA para remo-
dem se beneficiar do LBA terapêutico existe uma téc- ção de plugs mucosos distais tem se mostrado bastante
nica adequada, fugindo do objetivo deste capítulo o seu eficaz em alguns casos escolhidos de mal asmático, em
detalhamento. pacientes sob ventilação mecânica;
Fig. 26.5 — Seqüência de auxílio à intubação orotraqueal através da broncofibroscopia (Adaptado de Oho e Amemya).