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UNIDADE 3

AS COMPETÊNCIAS
COMUNICACIONAIS DO
MEDIADOR

Taís Schilling Ferraz, Alessandra Balestieri


e Guilherme Ribeiro Baldan

Curso de Formação de Conciliadores e


Mediadores Judiciais
AS COMPETÊNCIAS COMUNICACIONAIS DO MEDIADOR

1. UM POUCO DE TEORIA DA COMUNICAÇÃO


O grande objetivo do uso de técnicas de comunicação é a mobilização dos interessados para
a reflexão e para o redimensionamento do conflito, e um dos grandes caminhos para isso é o
domínio de algumas técnicas interrogativas e assertivas.
É impossível não se comunicar. Esta é uma das principais máximas da comunicação. Elas foram
sistematizadas nos estudos de Paul Wattzlawiack e Gregory Bateson. Todo o comportamento é
uma forma de comunicação; por isso, mesmo quando não nos comunicamos de forma explícita,
estamos emitindo sinais passíveis de interpretação por quem nos observa.

Outra máxima é de que os seres humanos comunicam-se de forma digital e analógica, o que
significa que, para além das palavras ditas ou escritas (comunicação digital), há outras informa-
ções que podem ser colhidas nas atitudes, nos gestos, no tom de voz, nos silêncios, enfim, na
relação entre as pessoas que estão se comunicando (comunicação analógica).
No livro O Corpo Fala, Pierre Weil e Roland Tompakow analisam expressões, gestos e movimentos
e associam-nos a possíveis sentimentos.

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CURSO DE MEDIAÇÃO JUDICIAL

Conhecer aspectos comunicacionais auxilia o terceiro facilitador a identificar o que pode estar
por trás das palavras, das atitudes e das histórias que são trazidas nos discursos e nos gestos dos
interessados no curso de uma sessão de mediação ou audiência de conciliação.
Para o mediador e o conciliador é importante ter presente, também, que o seu próprio corpo,
seus gestos, sua voz, e suas expressões, falam algo para as partes, daí a importância de demons-
trar atenção, tranquilidade e segurança, olhar nos olhos, não ter postura ameaçadora, agir e falar
com elegância e naturalidade.

1.1. A IMPORTÂNCIA DA COMUNICAÇÃO NÃO VIOLENTA (CNV)

Ao se comunicar com as partes, será fundamental que o mediador ou o conciliador o faça de


forma não violenta, lembrando que seus atos, na condução desse processo, servem como espe-
lho para os interessados. Você influencia, com sua forma de falar, agir e mesmo não agir, a atitude
das pessoas que participam da mediação ou da conciliação.
A Comunicação Não Violenta (CNV) é um processo que permite acessar, conectar-se com a pró-
pria humanidade e a do outro, com aquilo que realmente acontece dentro de cada ser humano.
Segundo o psicólogo Marshall Rosemberg, que desenvolveu estudos que se mantêm extrema-
mente atuais, sobre o tema, a CNV ocorre de forma intrapessoal, quando sou capaz de identificar
e expressar de forma clara meus sentimentos e necessidades e interpessoal, quando sou capaz
de captar estes mesmos elementos, de forma empática, na relação com o outro.
Os elementos são: observação, sentimento, necessidade e pedido:
> O que percebo ao observar? (observação)

> O que sinto ao perceber? (sentimento)

> Por que sinto? (necessidade)

> O que pode ser feito? (pedido)

Essas mesmas perguntas podem ser feitas quando observo o outro.


O diálogo e a escuta empática são premissas fundamentais. Para Dominic Barter, pesquisador
social da CNV, não devemos temer o conflito, “o conflito é um mecanismo de retorno. Um aviso
de que alguma coisa mudou e que a situação está desatualizada”.
Com os recursos da CNV, encontramos caminhos para identificar esta situação, captar o seu real
significado e suas potencialidades, produzindo um ambiente em que os sentimentos e necessi-
dades possam ser acessados e trazidos de forma clara e sem receios.

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A CNV traz consigo alguns efeitos importantes: a escuta mais profunda, o respeito e a empatia
pelo outro, o comprometimento para a construção de soluções, a compassividade e maior pro-
fundidade nos relacionamentos.
Seguem algumas estratégias para o desenvolvimento desta importante competência do media-
dor e do conciliador:
> Ouça sem ofender;

> Traga à superfície, de forma objetiva, palavras e expressões corporais;

> Identifique o que está por traz das palavras ou das expressões utilizadas;

> Fale sem machucar;

> Crie uma ponte com o interlocutor;

> Identifique aspectos em comum;

> Procure sentir a dor do outro e suas necessidades não atendidas;

> Tenha resiliência e compaixão;

> Seja coerente;

> Procure traduzir o desejo (o pedido da pessoa) em palavras.

1.2. QUANDO A COMUNICAÇÃO É BLOQUEADORA

A comunicação pode ser bloqueadora, quando não observa as premissas da CNV. Algumas
atitudes criam barreiras à possibilidade de se estabelecer diálogo construtivo.
É comum a realização de julgamentos morais sobre as atitudes das pessoas, colocando-as na
defensiva e na necessidade de reagir, por culpa ou vergonha.
Veja um exemplo:
> Minha filha vive me pedindo mais atenção. Ela é carente!

> Preciso que minha filha me dê mais atenção. Ela é indiferente, insensível.

Você percebe que, ao fazer esses julgamentos, estou expressando, mesmo que por gestos, minha
censura ao sentimento do outro, seja ele qual for? Bloqueio a comunicação, deixo minha filha,

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no primeiro exemplo, com vergonha de se expressar, porque não quer ser tida como carente, e,
no segundo exemplo, condiciono-a a agir e me dar atenção por culpa, para não ser classificada
por mim como insensível.
Para evitar esses julgamentos, ao invés de classificar a atitude como certa ou errada, boa ou
ruim, posso recorrer aos elementos da CNV, buscando observar e identificar o sentimento, a
necessidade e o pedido que estão ocultos em mim e no outro.
Outra forma de bloquear a comunicação é por meio de comparações, que são, também, formas
de julgamento.
Negar responsabilidades ou atribuí-las a outras pessoas ou situações também dificulta o diálogo
empático. Quando digo “tive de fazer isso”, como se forças impessoais me impelissem, ou quando,
diante de um questionamento sobre as razões de determinada ação, digo que “sou assim”, é como
se interrompesse qualquer tentativa de construir caminhos. São expressões deterministas que,
quando surgem no curso da mediação ou da conciliação, talvez possam ser recontextualizadas
ou parafraseadas pelo terceiro facilitador, de forma a anular o efeito bloqueador que provocam.
Também dificulta o diálogo a expressão de desejos sob a forma de exigências, recorrendo a
argumentos de autoridade ou tentando impor uma única forma de superar impasses. São argu-
mentos que trazem implícito que a pessoa imagina ser sua tarefa mudar os outros. Essa forma
de se expressar não ocorre apenas nas falas dos interessados: pode surgir, inadvertidamente, em
manifestações ou na forma como o facilitador conduz o processo de mediação ou conciliação.
Quando isso ocorre, compromete o rapport e as condições para a retomada do diálogo entre
os interessados.
Rotular atitudes ou estabelecer merecimentos pelos atos que resultaram em consequências
ruins são movimentos que trazem consigo a censura, fazendo presumir que as pessoas agem
por maldade, razão pela qual devem ser evitados.

1.3. COMUNICAÇÃO ASSERTIVA

Para o conciliador ou o mediador é também importante fazer uso, em determinados momentos,


da chamada “comunicação assertiva”. Comunicar-se de forma assertiva é ser atento à própria
fala, transmitindo informações de maneira objetiva, afirmativa, honesta, com segurança, come-
dimento e com expressão corporal condizente.
Um exemplo: ao explicar o processo de mediação e conciliação na declaração de abertura, será
importante o uso da comunicação assertiva, explicitando como se dará o desenvolvimento dos
trabalhos, deixando clara sua expectativa em relação à escuta recíproca e ao comportamento
empático.
Ao usar a linguagem verbal, é importante ser objetivo, ter foco, usar argumentos de forma clara,
mantendo, porém, flexibilidade, estando aberto a receber argumentos em contrário.

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Ser assertivo não significa ser autoritário ou agressivo. Faça contato visual amigável. Mantenha
suas mãos preferencialmente abertas. Procure manter uma expressão corporal não intimida-
dora, relaxada e acolhedora. Ao transmitir a mensagem, pense em como se sentiria no lugar
das pessoas com quem está falando, ficando atento para saber se elas estão acompanhando
seu raciocínio.

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