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Concurso de Pessoas nos Crimes

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Contra a Administração Pública
Gabriel Augusto Moreira de Faria
1- Concurso de
GECiP - UFOP
Pessoas

a) Conceito e teorias

- O concurso de pessoas é o cometimento da infração penal por mais de um pessoa. Tal


cooperação da prática da conduta delitiva pode se dar por meio da coautoria ou participação,

- Art. 29, CP- Quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este
cominadas, na medida de sua culpabilidade

1- Pluralidade de agentes
2- Conduta penalmente relevante
- Requisitos do concurso de pessoas: 3- Vínculo/Liame subjetivo
4- Unidade de infração penal

1- Pluralidade de agentes culpáveis


- O concurso de pessoas depende de pelo menos 2 pessoas, e, consequentemente, de ao
menos duas condutas penalmente relevantes (duas condutas principais: coautoria; uma
principal e outra acessória: autor e partícipe). Os coautores ou partícipes, entretanto, devem
ser culpáveis
Obs: A norma do art. 29 é uma norma de extensão que visa ajustar uma conduta que
aparentemente não é típica para caracterizá-la como tal, fenômeno que se denomina
“ADEQUAÇÃO TÍPICA MEDIATA”
Obs: A norma do art. 29 só se aplica aos crimes unissubjetivos (concurso eventual).
Nos crimes plurissubjetivos (concurso necessário), a tipicidade já está completa (vez
que o próprio tipo prevê o concurso. Ex: art. 288, associação criminosa)

2- Conduta penalmente relevante


- A expressão “de qualquer modo” deve ser compreendida como uma contribuição pessoal,
física ou moral direta ou indireta, comissiva ou omissiva
- A conduta individual deve influir efetivamente no resultado. A participação inócua é um
irrelevante penal.

3- Vínculo/Liame subjetivo

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- os agentes
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devem ser ligados entre si por um nexo psicológico, ou
então haverá vários crimes simultâneos, e não concurso de pessoas .
- Os agentes devem revelar VONTADE HOMOGÊNEA, visando a produção do mesmo
resultado (princípio da convergência). Logo, NÃO É POSSÍVEL A CONTRIBUIÇÃO DOLOSA
PARA UM CRIME CULPOSO, NEM A CONTRIBUIÇÃO CULPOSA PARA UM CRIME
DOLOSO
- O VÍNCULO SUBJETIVO NÃO DEPENDE DE PRÉVIO AJUSTE. Basta a ciência por parte de
um agente no tocante ao fato de concorrer para a conduta de outrem

4- Unidade de infração penal


- art. 29, CP: “quem, de qualquer modo, concorre para o crime incide nas penas a este
cominadas, na medida de sua culpabilidade”. Os agentes devem praticar a mesma infração
penal.
________________ // ________________

- Autoria

- Teorias sobre o concurso de pessoas:

a) teoria unitária/monista (adotada pelo Código Penal de maneira temperada – Teoria


Monista Temperada): quando mais de um agente concorre para a prática da infração penal,
mas cada um praticando conduta diversa do outro, obtendo, porém, um só resultado. Neste
caso, haverá somente um delito. Assim, todos os agentes incorrem no mesmo tipo
penal. Ex: roubo a banco

b) teoria pluralista: quando houver mais de um agente, praticando cada um conduta diversa
dos demais, ainda que obtendo apenas um resultado, cada qual responderá por um delito. Esta
teoria foi adotada pelo Código Penal ao tratar do aborto, pois quando praticado pela gestante,
esta incorrerá na pena do art. 124, se praticado por outrem, aplicar-se-á a pena do art. 126. O
mesmo procedimento ocorre na corrupção ativa e passiva.

- Todos os que concorrem para o mesmo crime devem receber tratamento igualitário no que diz
respeito à CLASSIFICAÇÃO JURÍDICA desse fato

- Há unidade de crime e pluralidade de agentes.

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- Abstratamente,
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autor e partícipe incorrem na mesma pena pois, em virtude
do art. 29, todos os que concorrem para o crime incidem nas penas a este cominadas.
- A aplicação correta da pena, todavia, variará tanto sobre os coautores quanto sobre os
partícipes em virtude da culpabilidade demonstrada por cada um.
Obs: A identidade de crime não importa automaticamente em identidade de penas (“na
medida de sua culpabilidade”), que devem ser individualizadas no caso concreto
- Luiz Regis Prado diz que o CP adotou a TEORIA MONISTA TEMPERADA, por conta dos
parágrafos do art. 29 que determinam a punibilidade diferenciada da participação

§ 1º - Se a participação for de menor importância, a pena pode ser


diminuída de um sexto a um terço.

§ 2º - Se algum dos concorrentes quis participar de crime menos


grave, ser-lhe-á aplicada a pena deste; essa pena será aumentada
até metade, na hipótese de ter sido previsível o resultado mais grave

- Principais exceções pluralísticas à teoria monista::

a) Crime de corrupção ativa (art. 333 do CP) e passiva (art. 317 do CP);
b) Crime de falso testemunho (art. 342 do CP) e corrupção de testemunha (art. 343 do
CP);
c) Crime de aborto cometido pela gestante (art. 124 do CP) e aquele cometido por
terceiro com o consentimento da gestante (art. 126 do CP).
d) Crime de corrupção ativa pelo particular que oferece ou promete vantagem indevida
ao funcionário público para que este deixe de lançar ou cobrar tributo (art. 333 do CP) e
crime contra a ordem tributária para o funcionário público (art. 3º, II, da Lei 8.137/90).

- Participação
- É a modalidade de concurso de pessoas em que O SUJEITO NÃO REALIZA DIRETAMENTE
O TIPO PENAL, MAS DE QUALQUER MODO CONCORRE PARA O CRIME

- Há PROPÓSITO DE COLABORAR (ELEMENTO SUBJETIVO) + COLABORAÇÃO EFETIVA


(PARTICIPAÇÃO MORAL OU MATERIAL)

- Incomunicabilidade de circunstâncias (art. 30, CP)

- Prevê o art. 30 do CP que, "não se comunicam as circunstâncias e as condições de caráter


pessoal, salvo quando elementares do crime".

- Não se comunicam entre coautores e partícipes as circunstâncias consideradas


individualmente no concurso de agentes.

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- Considera-se
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circunstância de caráter pessoal aquela situação
particular que envolve o agente, mas não é inerente à sua pessoa.

- Exemplo: A condição de caráter pessoal consiste em qualidade da pessoa, tais como


menoridade e reincidência, condições estas que também não se transferem aos demais
agentes do delito.

- As circunstâncias elementares do crime são componentes do tipo penal, que se transmitem


aos demais agentes da infração penal.

Assim, se uma funcionária pública furta bens da repartição com sua colega que não
exerce cargo público, ambas responderão por peculato-furto (art. 312, § 1º do CP)

2- Crimes Contra a Administração Pública (art. 312/359, CP)

- Os crimes previstos nesse capítulo constituem delitos próprios, uma vez que são praticados
exclusivamente por funcionário público. São os chamados delitos funcionais. Dividem-se em:

- Crimes funcionais próprios: a função pública é elemento essencial do crime. A


ausência da qualidade de funcionário público torna o fato atípico (crime de prevaricação).

- Crimes funcionais impróprios: ausente a qualidade de funcionário público, poderá


haver a caracterização de outro crime. Por exemplo: delito de peculato, em que uma de suas
modalidades é a apropriação indébita praticada por funcionário público em razão da função.

Obs: Nada impede que um indivíduo o qual não detenha a qualidade de funcionário público
responda por crime funcional, como coautor ou partícipe, em face do disposto no art. 30 do CP.
Exige-se, contudo, que esse terceiro saiba da qualidade de funcionário público do outro. Nessa
hipótese, o funcionário público é denominado intraneus e o não funcionário público é
denominado extraneus

- Funcionário Público (art. 327, CP): “Considera-se funcionário público, para os efeitos penais,
quem, embora transitoriamente ou sem remuneração, exerce cargo, emprego ou função
pública.”

- Alcança, assim, todas as espécies de agentes públicos, pois o que importa para o
Código Penal é o exercício, pela pessoa, de uma função de natureza e interesse público.

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- Não importa se
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o servidor é ocupante de cargo ou se foi apenas
investido no exercício de uma função. Do mesmo modo, é irrelevante se o seu vínculo com a
Administração é remunerado ou não, definitivo ou transitório. São denominados funcionários
públicos todos os que desempenham, de algum modo, função na Administração direta ou
indireta do Estado.

- A Administração indireta faz com que sejam compreendidos todos os agentes que
desempenhem funções em autarquias, empresas públicas, sociedades de economia mista,
fundações e agências reguladoras.

- São também atingidas pela extensão conceitual, feita pelo CP, as pessoas que
trabalham em entidades paraestatais, atualmente denominadas entidades do Terceiro Setor, e
que se situam, portanto, fora da Administração indireta (compreendem os serviços sociais
autônomos, entidades de apoio e organizações não governamentais, as chamadas ONGs).

- Como se não bastasse, estão também compreendidos no amplo conceito penal até os
que prestam serviços para empresas privadas contratadas ou conveniadas, para o fim de
execução de atividade típica da Administração (art. 327, § 1o, do CP).

- Exemplo: Peclulato-apropriação (mandar foto no grupo)

O peculato nada mais é do que uma apropriação indébita praticada em decorrência da função
pública. Trata-se de crime em que o funcionário torna seu ou desvia, em proveito próprio ou de
terceiro, o bem móvel, público ou privado, que possui em razão do cargo ou que esteja sob sua
guarda ou vigilância. Há quatro modalidades de crime de peculato:

- peculato-apropriação: 1a parte do caput do art. 312; peculato-desvio: 2a parte do


caput do art. 312; peculato-furto: § 1o do art. 312; peculato culposo: § 2o do art. 312

4- (MPE-SP- Promotor de Justiça- SP/2015) No caso de terceiro participar, mediante instigação e auxílio material, de um
crime de peculato-apropriação praticado por seu irmão funcionário público:

a) responderá por apropriação indébita, tendo em vista lhe faltar a qualidade de funcionário público.

Está errada assertiva. O estranho responderia por apropriação Indébita se não tivesse conhecimento da
condição de funcionário público daquele que cometeu o ato de apropriação, o que não é o caso do
exemplo do enunciado.

b) responderá por apropriação indébita, pois aplicável o disposto no§ 2' do art. 29 do Código Penal, já que
quis participar de crime menos grave.

Está errada a assertiva porque o estranho não quis participar de crime menos grave, pois instigou e
auxiliou o funcionário público a cometer o peculato.

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c) não responderá por
nenhum crime, pois, GECiP - UFOP
não sendo funcionário público, sua participação é
atípica nos chamados crimes funcionais.

Está errada a assertiva. Se o agente contribuiu de alguma forma para a consecução do crime de
peculato, deve ser responsabilizado juntamente com o funcionário público. O particular seria isento de
punição se, sozinho, cometesse um ato tipificado como crime funcional próprio, aquele que, faltando a
qualidade de funcionário público ao autor, passa a ser tratado como um indiferente penal, não se
subsumindo a nenhum outro tipo incriminador- atipicidade absoluta - v.g., a prevaricação (art. 319 do
CP).

d) responderá por peculato-apropriação, pois, apesar de não ser funcionário público. Esta
qualidade, por ser elementar do crime, a ele se comunica.

Está correta a assertiva. Apesar de próprio, o peculato admite o concurso de pessoas estranhas aos
quadros da administração, ex vi do disposto no art. 30 do CP. salientando-se apenas que deve a condição
pessoal do autor ingressar na esfera de conhecimento do terceiro, caso contrário responderá este por crime
outro, como, v.g., apropriação indébita. No exemplo citado, em que o estranho aos quadros da
Administração instigou e auxiliou materialmente o funcionário
público a cometer o delito funcional, ambos serão responsabilizados por peculato.

e) responderá por peculato-apropriação, pois, apesar de não ser funcionário público, esta qualidade, por
ser circunstância objetiva do crime, a ele se comunica.

Está errada porque a condição de funcionário público não é circunstância objetiva do crime de peculato,
mas sua elementar. Circunstâncias são elementos que se alojam no entorno do fato, isto é, não integram a
figura típica primária, mas agregam dados que podem significar o aumento ou a diminuição da pena. São
objetivas quando dizem respeito ao fato, como o rompimento de obstáculo no furto, e subjetivas quando
se referem ao agente ou aos motivos do crime, como o motivo torpe no homicídio ou a qualidade de
funcionário que sirva apenas para aumentar a pena (art. 297, § 1•). As elementares, por sua vez,
representam a própria figura criminosa em suas características constituintes, fundamentais. Assim como
as circunstâncias, podem ter caráter objetivo (como a posse ou a detenção na apropriação indébita) ou
subjetivo (como o exercício da função pública no crime de corrupção passiva).

- Exceção à regra do concurso de pessoas: corrupção ativa x corrupção passiva

- Poderia haver um só delito para corruptor e corrupto. O legislador brasileiro, entretanto, para que
uma infração não fique na dependência da outra, podendo punir separadamente os dois sujeitos,
ou um só, descreveu dois delitos de corrupção: passiva (do funcionário: art. 317 do CP) e ativa
(do terceiro: art. 333).
Ao contrário do que se afirma, há concurso de agentes entre corruptor e corrupto. Só que o
legislador, em vez de adotar o princípio unitário, resolveu aplicar o pluralista: um delito para cada
autor.

1- Corrupção passiva

- Prevê o art. 317: “Solicitar ou receber, para si ou para outrem, direta ou indiretamente, ainda
que fora da função, ou antes de assumi-la, mas em razão dela, vantagem indevida, ou aceitar
promessa de tal vantagem.

- Três são as condutas típicas:


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- Solicitar: pedir,
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manifestar o desejo de querer algo. O próprio funcionário
solicita a vantagem.

- Receber: aceitar, entrar na posse. Aqui a proposta à qual adere o funcionário parte de
terceiros (extraneus), ou seja, o agente não só aceita a proposta mas também recebe a
vantagem indevida.

- Aceitar promessa: concordar com o recebimento. A proposta à qual adere o funcionário


também parte de terceiros (extraneus), mediante a aceitação de receber a vantagem. Nesse
caso ainda não há o seu efetivo recebimento.

- A proposta pode ser realizada diretamente pelo corruptor ou indiretamente por pessoa
interposta. A aceitação da promessa de vantagem também pode ocorrer por meio de terceira
pessoa. É indispensável para a caracterização do ilícito em estudo que a solicitação,
recebimento ou aceitação de vantagem seja realizada pelo funcionário público em razão da
função (ainda que fora dela ou antes de assumi-la).

- A vantagem solicitada, recebida ou prometida consubstancia-se em uma contraprestação à


realização ou abstenção de algum ato de competência específica do funcionário público (ato de
ofício). Não exige a lei que o ato seja ilegítimo, ilícito ou injusto (é a chamada corrupção
própria). Também configura o crime a prática de ato legítimo, lícito e justo (é a chamada
corrupção imprópria)

- objeto do ilícito é a vantagem indevida, que pode ser patrimonial ou moral. Contém, portanto,
o tipo um elemento normativo: a vantagem deve ser indevida. Ausente esse requisito, o fato é
atípico ou então poderá configurar-se o crime de prevaricação. Ocorre uma espécie de troca
entre a vantagem indevida a que visa o agente e a ação ou omissão funcional que beneficiará
o terceiro.

Obs: Toda aceitação de presente por parte do funcionário público configura o crime de
corrupção passiva? Segundo a doutrina (HUNGRIA, 1959, v. 9, p. 369-370) e jurisprudência,
temos o seguinte quadro:

- Gratificações usuais de pequena monta por serviço extraordinário (não se


tratando de ato contrário à lei) não podem ser consideradas corrupção passiva.

- Pequenas doações ocasionais, como as costumeiras “Boas Festas” de Natal


ou Ano-Novo, não configuram crime. Nesses casos, não há consciência por parte
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do funcionário
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público de estar aceitando uma retribuição por
algum ato ou omissão. Não há dolo

2- Corrupção ativa
- Dispõe o art. 333, caput, do CP: Oferecer ou prometer vantagem indevida a funcionário público,
para determiná-lo a praticar, omitir ou retardar ato de ofício
- As ações nucleares do tipo estão consubstanciadas nos verbos:
a) “oferecer vantagem indevida”, isto é, colocar à disposição ou aceitação;
b) “prometer vantagem indevida”, isto é, comprometer-se, fazer promessa, garantir a entrega de
algo ao funcionário.
- É necessário que a oferta ou promessa seja feita diretamente ao servidor, nada impedindo que
seja ela efetuada por meio de interposta pessoa, coautor do crime em apreço.
- No caso em que o agente se limita a pedir para o funcionário dar um “jeitinho”, não há corrupção
ativa, pois o agente não ofereceu nem prometeu nenhuma vantagem indevida. Nesse caso, se o
funcionário dá o “jeitinho” e não pratica o ato de ofício, responde por corrupção passiva
privilegiada e o particular figura como partícipe. Se o funcionário público não dá o “jeitinho”, o fato
é atípico.
- A oferta ou promessa é realizada com o fim de incentivar o funcionário a praticar, omitir ou
retardar ato de ofício. Este compreende o ato de específica atribuição do agente público. É
dispensável para a configuração do crime que o funcionário visado aceite a oferta ou promessa de
vantagem. Não estamos diante de um crime bilateral. Se, contudo, aceitar a vantagem,
responderá pelo crime de corrupção passiva.

- O objeto material do crime é a vantagem, que pode ser de qualquer natureza (patrimonial ou
moral). Deve ela ser indevida (elemento normativo do tipo), isto é, ilícita, pois, se devida, o fato é
atípico.
- Não há corrupção ativa no caso de o sujeito dar ao funcionário pequenas gratificações ou
doações em agradecimento a comportamento funcional seu. Não se verifica também a ocorrência
do delito quando a vantagem é oferecida após o ato de ofício, pois, para que se configure o crime,
a vantagem deve ser oferecida ou prometida para que um ato seja realizado no futuro. Se o
corruptor oferecer alguma vantagem para evitar que o funcionário público pratique algum ato
ilegal contra ele, não há o crime em tela.

3- Teoria do Domínio do Fato x Teoria do Domínio de Organização

Contudo, após as ideias iniciais de Hans Welzel, a teoria do domínio do fato foi efetivamente
desenhada pela pena de Claus Roxin, que, no seio de uma visão funcionalista (o que significa
enxergar o direito penal a partir de sua função), trouxe uma nova roupagem ao instituto.

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Gabriel Augusto Moreira de Faria
Roxin (2000, p.
151) enxergava GECiP - UFOP
que o elemento diferenciador entre autor e partícipe estaria
no domínio da ação, sendo, pois, autor aquele que assume o protagonismo da realização típica –
logo, autor é aquele que pratica os elementos do tipo dependendo apenas de si e de seu atuar.
Porém, além dessa hipótese, Roxin vislumbrou outras duas possibilidades de se “dominar o fato”.

Uma delas está no domínio da vontade (ROXIN, 2000, p. 166-167), situação na qual o autor da
conduta não a pratica de mão própria, mas, sim, por meio da utilização de outro sujeito, que atua
em erro ou em estado de não culpabilidade, sendo o típico caso do “homem de trás”.

Enquanto a outra forma, também conhecida como domínio funcional do fato (ROXIN, 2000, p.
307-398), consiste em verdadeira divisão de tarefas entre os diversos protagonistas da ação
típica. Em suma, diversas pessoas possuem o mesmo objetivo em comum, a realização da ação
típica, mas, para alcançá-lo, dividem a execução da ação em tarefas, competindo a cada um uma
fração essencial do todo – tanto que a não execução de uma delas pode impossibilitar a
consecução do objetivo comum –, sendo os participantes da empreitada considerados coautores
do delito.

Com essa construção, Claus Roxin apresentou um conceito restritivo de autor e, de certa forma,
limitou e muito o alcance do conceito unitário de autoria, pelo qual autor é todo mundo que tenha,
de alguma forma, contribuído ao delito dando causa ao mesmo (teoria causal).

Todavia, o conceito mais interessante apresentado por Roxin vai além da mera teoria do domínio
do fato, mas deriva dela, e hoje se mostra como o fundamento preferido do Judiciário e do
Ministério Público brasileiros na “cruzada” contra a corrupção, principalmente na tarefa de
justificar a responsabilidade penal de diretores de empresas, chefes de órgãos públicos e demais
detentores de funções de chefia por crimes ocorridos no interior das respectivas instituições. O
conceito consiste no conceito de domínio da organização.

Mas ao contrário do que o cotidiano forense brasileiro aponta, a teoria do domínio da organização
não se reveste como fundamento adequado na punição de chefes, diretores, secretários e demais
ocupantes de cargos ditos de “direção” pela mera posição que ocupa.

A teoria exige o atendimento a alguns pressupostos bem restritivos. Para que se tenha um
domínio de organização o tal “homem de trás” deve:

i) dominar um aparato organizado de poder desvinculado da ordem jurídica (o que


significa que seu nascedouro seja fora da ordem jurídica regular – a exemplo de
grupos terroristas, máfias e Estados de Exceção);

ii) possuir poder de mando (ser chefe de algo); e

iii) poder emitir ordens que serão cumpridas por executores fungíveis – o que culmina
na certeza de execução da ordem, sem a necessidade de se ordenar algo
diretamente ao executor, pois a execução da ordem será decorrência lógica da
própria hierarquia da organização (LEITE, 2014, p. 139).

A responsabilidade penal, conforme essa teoria do domínio da organização, veda sua extensão
ao âmbito empresarial e dos órgãos públicos. Com relação aos órgãos públicos, porque possuem
organização e divisão de tarefas taxativamente previstas em leis e regulamentos, cujos
executores são nomeados em portarias e demais atos administrativos – o que põe em cheque o

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primeiro requisito
(organismo GECiP - UFOP
apartado da ordem jurídica) e o terceiro (certeza na execução
da ordem por executor fungível). No que toca às empresas, nunca é demais lembrar que são
constituídas por pessoas jurídicas, ou seja, o seu nascedouro depende da lei e não pode ser
apartado dela.

Outrossim, é de se ressaltar que a responsabilização, no caso empresarial, recairia fatalmente no


caráter funcional, ou seja, o gerente ou diretor de uma empresa estariam sendo responsáveis pela
simples posição que ocupam, sem refletir necessariamente na conduta que praticaram.

O problema é maior em empresas de estrutura complexa, pois o poder de decisão dificilmente


tem a força necessária para, por si, possibilitar a execução de ordem, vez que uma decisão
deverá ser “vista e revista” por diversos setores administrativos. Para resolver tal problema,
talvez, já se tenha passado da hora de discutirmos uma efetiva responsabilização penal da
pessoa jurídica.

Destaque-se que o próprio Roxin, noutras oportunidades, asseverou que sua teoria não se aplica
a organismos amparados na ordem jurídica.

Por fim, Jorge de Figueiredo Dias (2007, p. 799) ainda entende pela existência de uma teoria do
domínio da decisão, por meio da qual permite-se a responsabilização penal daquele que produz
ou cria de forma efetiva e cabal no executor (terceiro) o animus de atentar contra determinado
bem jurídico, dominando, assim, a decisão do executor, vez que inculca a ideia e ainda
acompanha de perto a tomada da decisão. O que é diferente, por suposto, da mera instigação, na
qual alguém sugere ou aconselha a prática delitiva, mas não detém o domínio da decisão do
executor, e, sim, mera influência.

Com isso, podemos dizer que teoria do domínio do fato não se resume numa fórmula simples
(como quis o STF) e, mais, desdobra-se em diversos derivados que com ela não se confundem,
como é típico caso da teoria do domínio da organização. O cotidiano forense, sobretudo quando
olhamos para as decisões judiciais que têm emergido, clama por uma revisão no modo de ver e
pensar o domínio do fato, pois estamos errando… e muito.

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