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592 - A Corporeidade Infantil Edificada Por Tempos e Espaços Escolares
592 - A Corporeidade Infantil Edificada Por Tempos e Espaços Escolares
ESCOLARES
RESUMO: O presente texto tem como tema a relação entre a corporeidade infantil e
a cultura escolar. Objetiva-se assim, problematizar a cultura escolar, em suas
dimensões relativas aos espaços e tempos escolares e refletir sobre a influência
destas dimensões no processo de construção da corporeidade de crianças que
155 frequentam a educação infantil e o primeiro ano do ensino fundamental de nove
anos.
PALAVRAS-CHAVE: Tempos escolares. Espaços escolares. Corporeidade infantil.
1
Doutora em Educação Escolar - UNESP – Universidade Estadual Paulista. Faculdade de Ciências e Letras.
Araraquara – SP – Brasil. 14800-001 - susezan@bol.com.br
cívicas, as festas, as experiências corporais, etc. (CANDAU, 2000,
p.68).
2
Mascioli (2012).
com as mudanças decorrentes do ensino fundamental de nove anos, esse contexto
ritualístico é cobrado cada vez mais cedo das crianças.
No interior das instituições, ainda presenciam-se práticas pedagógicas
guiadas pela ordenação dos espaços e tempos que visam manter o cerceamento
das ações corporais e espontâneas das crianças.
Por meio de atividades repetidas e rotineiras, impera o disciplinamento e
controle dos corpos infantis, impondo ritmos coletivos, posturas e movimentos
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padronizados, modelos de ações que devem ser seguidos e cumpridos por todos.
Na instituição de ensino fundamental, nota-se o distanciamento, por vezes o
abandono, das atividades voltadas para experiências com as diversas formas de
expressão e de linguagens de que o corpo infantil é dotado.
Mesmo na Educação Infantil - onde a atenção deveria voltar-se para o
desenvolvimento integral das crianças e a vivência plena de todas as dimensões da
infância, as experiências oferecidas não parecem ser suficientes para estimular e
desenvolver todas as habilidades psicomotoras infantis.
Podemos citar como exemplo de análise as brincadeiras cantadas, prática
consagrada na sociedade, peculiar à infância e, que, ludicamente, unifica o
movimento corporal e à expressão vocal, na forma de músicas, frases, palavras ou
sílabas ritmadas. Observou-se na referida tese de doutorado, que as mesmas não
são trabalhadas no ensino fundamental, e que quando propostas na rotina da
educação infantil, as crianças sempre permanecem sentadas, em fila, e
movimentando somente a parte superior do corpo (braços e rosto). Um exercício
mecanizado e repetitivo pautado na cópia dos modelos dos movimentos corporais
das professoras, que não permite o exercício da criação e da expressividade global
do corpo infantil.
No ensino fundamental a rotina predominante impõe ao corpo infantil que permaneça
no espaço da sala de aula sentado, imóvel e ereto, na maior parte do tempo, mesmo quando tal
exigência (por solicitar um controle das reações corporais impulsivas, e a presença do tônus
postural) contradiga seu desenvolvimento físico.
Trata-se de um tipo de ‘adestramento físico’, associado à antiga ideia de que é só pela
imobilidade corporal que se pode aprender.
As exigências quanto à disciplina corporal foram identificadas também no discurso
das professoras da educação infantil, ao alegarem que se sentem obrigadas a “preparar o corpo
das crianças” para as exigências que serão cobradas no ensino fundamental, mediante a busca
pelo rendimento das atividades escolares.
Os dados do estudo nos remetem a afirmação de Foucault (2002) de que um
dos objetivos da escola é controlar o corpo, através de atitudes de submissão e
docilidade que ocorrem nos exercícios que esquadrinham o tempo, o espaço, os
movimentos, gestos e atitudes dos alunos.
Ancorado por uma cultura escolar, o corpo da criança na classe, ainda parece ser
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subentendido nas instituições escolares, sob uma visão cartesiana. “Trata-se de um corpo
dividido, fragmentado em elementos justapostos, que perdeu a alma e a unidade.” (GIRARD;
CHALVIN, 2001, p.14).
O cenário da cultura escolar, repleto de ritos e signos que compõem as linguagens
verbais e não verbais, veicula valores que se expressam tanto pelo corpo do professor como
pelo corpo da criança/ aluno. Dessa maneira, o corpo do professor pode (consciente ou
inconscientemente) até em silêncio, impor regras, normas de conduta e atitudes, julgadas por
ele como corretas e desejáveis. “Sua aparência, suas roupas, o tom da voz, o ar que seu rosto
assume e seus gestos influenciam a transmissão dessas leis de funcionamento.” (GIRARD;
CHALVIN, 2001, p.115).
Por outro lado, o corpo da criança /aluno, quando não se rebela, submete-se a tensão
do ambiente escolar e, domestica-se em busca da assimilação das regras e condutas esperadas,
mesmo quê, por vezes, incompreendidas. Dóceis e conformados, os corpos infantis obrigam-
se a enquadrar-se ao modelo encaminhado e esperado pela escola e pelo professor, pois, “[...]
um aluno bem-comportado é modesto, é gentil, não fala, ouve bem, não faz barulho, senta-se
corretamente.” (GIRARD; CHALVIN, 2001, p.114).
A literatura presente na área de educação aponta para a tentativa atual de
compreender o período da infância em suas singularidades, procurando legitimar o
indivíduo, desde a mais tenra idade, como cidadão de direitos.
Ao abordar os vários aspectos do desenvolvimento humano como dimensões
interligadas e não áreas estanques, a nova Lei de Diretrizes e Bases “[...] evidencia
a necessidade de se considerar a criança como um todo, para promover seu
desenvolvimento integral e sua inserção na esfera pública.” (BRASIL, 2006, p.10).
A criança é atualmente entendida como ser social e histórico dotado de
diversas potencialidades e áreas de conhecimento. Necessita, portanto, de um
desenvolvimento integral, que englobe entre outras coisas o exercício de sua
capacidade criadora e sensorial e o estímulo as suas diferentes formas de
linguagens (verbal, plástica, corporal, lúdica etc.) e expressividades. O
desenvolvimento expressivo infantil resulta das elaborações de sensações,
sentimentos e percepções vivenciadas, motivado pelo desejo da descoberta.
Expressar é externalizar um repertório constituído de elementos cognitivos e
afetivos.
ABSTRACT: This paper has as its theme the relationship between child corporeity
and school culture. The purpose is thus to discuss the school culture, in its
dimensions to school times and spaces and to reflect on the influence of these
163 dimensions in the construction of children corporeity who attending primary and the
first grade of nine year elementary school.
KEY WORDS: School times. School spaces. Child corporeity.
REFERÊNCIAS
BRASIL. Decreto lei n° 11.274, 6 de fevereiro de 2006. Altera a redação dos arts. 29,
30, 32 e 87 da Lei no 9.394, de 20 de dezembro de 1996, que estabelece as
diretrizes e bases da educação nacional, dispondo sobre a duração de 9 (nove) anos
para o ensino fundamental, com matrícula obrigatória a partir dos 6 (seis) anos de
idade. Diário oficial da União, Brasília, DF, 7 fev. 2006. Disponível em:
<http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_Ato2004-2006/2006/Lei/L11274.htm>. Acesso
em: 18 mar. 2011.